RECURSO PARA FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
OPOSIÇÃO DE JULGADOS
QUESTÃO DE DIREITO
PRAZO DE PRESCRIÇÃO
CONTAGEM DE PRAZO
ACORDÃO FUNDAMENTO
PRESSUPOSTOS
INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE
Sumário


A fixação de jurisprudência pelo Supremo Tribunal de Justiça sobre a mesma questão jurídica em discussão nos presentes autos, antes de ser proferida decisão sobre a oposição de julgados e no exacto sentido do acórdão recorrido, resolve definitivamente a questão controversa nestes autos e torna o recurso inútil, verificando-se, por isso, inutilidade superveniente da lide, nos termos do artigo 277º, alínea e), do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 4º do Código de Processo Penal.

Texto Integral


Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça

1. Relatório

1. O Ministério Público no Tribunal da Relação do Porto veio interpor recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, nos termos dos artigos 437.º, n.ºs 1 e 3 a 5, e 438.º, do Código de Processo Penal, com fundamento na oposição de julgados entre o acórdão proferido no processo n.º 223/17.3GDAVR.P2 desse tribunal em 22 de Janeiro de 2025, alegando que a questão de direito nele decidida está em oposição com a apreciada e dirimida no acórdão de 21 de Maio de 2024, do Tribunal da Relação de Évora, proferido no processo n.º 557/08.8TAVNO.E1.

A questão de direito que colocou foi a de saber qual o prazo de prescrição de uma pena que seja declarada suspensa na sua execução – se o prazo de prescrição da pena substituída ou o da pena de substituição (caso em que seria sempre de 4 anos, por aplicação da previsão do artigo 122º, nº 1, al. d), do Código Penal).

Em ambos os processos, estava em causa a forma de contagem do prazo de prescrição da pena declarada suspensa na sua execução.

No acórdão recorrido aplicou-se à contagem do prazo prescricional a alínea d) do nº 1 do artigo 122º do Código Penal, entendendo-se que a pena suspensa constitui uma pena autónoma, não revestindo a natureza de pena de prisão e, por via disso, não podendo subordinar-se ao prazo de prescrição da pena de prisão que substituíra, ainda que esta tenha duração igual ou superior a 2 anos.

No acórdão fundamento entendeu-se que, apesar de a suspensão da pena constituir uma pena autónoma, uma pena só é de substituição enquanto subsiste e que, a partir do momento em que é revogada, ressurge a pena de prisão substituída, que é a pena originária, e é a esta que deve atender-se para efeitos de prescrição, aplicando-se-lhe as diversas alíneas do artigo 122º, nº 1, do Código Penal.

Termina pedindo que sejam reconhecidos pressupostos formais e substanciais do recurso de fixação de jurisprudência e que a final a questão controvertida seja decidida de acordo com o sentido decisório veiculado pelo acórdão fundamento.

2. O arguido AA, respondeu ao recurso reconhecendo que estão verificados os pressupostos exigidos para a fixação de jurisprudência, pugnando, contudo, que a mesma seja fixada no sentido decisório veiculado pelo acórdão recorrido.

3. Neste Supremo Tribunal de Justiça, o Senhor Procurador-geral Adjunto emitiu o seu douto parecer, concluindo “por se verificarem os requisitos formais e substanciais normativamente previstos nos artigos 437.º e 438.º do CPP, entende-se que o recurso extraordinário interposto pelo Ministério Público deverá prosseguir termos.”

4. Em 14 de Novembro de 2024, foi proferido acórdão pela 5.ª Secção Criminal deste Supremo Tribunal de Justiça, no Processo n.º 913/11.4PBEVR.E3-A.S1 em recurso de fixação de jurisprudência interposto pelo arguido BB, sobre a mesma questão jurídica em discussão nestes autos e o qual “julgou observados todos os requisitos formais e substanciais, incluindo a oposição de julgados entre os dois referenciados acórdãos (recorrido e fundamento) e, em consequência, determinou o prosseguimento do recurso, nos termos do art. 441.º n.º 1, II.ª Parte, do CPP.

Em 28 de Maio de 2025, no referido Processo n.º 913/11.4PBEVR.E3-A.S1 deste Supremo Tribunal de Justiça, foi proferido acórdão, o qual transitou em julgado, fixando jurisprudência no seguinte sentido:

«Decorrido o prazo de suspensão da execução de pena de prisão, sem que tenha sido prorrogada ou revogada, a mesma prescreve decorridos 4 (quatro) anos contados do termo daquele prazo, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 122.º, do Código Penal, salvo se ocorrerem causas suspensivas ou interruptivas desse prazo prescricional.»

De tudo resulta que o Supremo Tribunal de Justiça fixou jurisprudência no sentido do sustentado no acórdão recorrido nestes autos.

5. Efectuado o exame preliminar, o processo foi aos vistos e remetido à conferência, nos termos dos n.ºs 3 e 4 do artigo 440.º do Código de Processo Penal.

Cumpre apreciar e decidir.

6. Por força do estatuído no artigo 445º, nº 1 do Código de Processo Penal, a decisão que resolver o conflito tem eficácia no processo em que o recurso foi interposto e ainda nos processos cuja tramitação tiver sido suspensa nos termos do nº 2 do artigo 441º do Código de Processo Penal, o que ainda não se verificou nestes autos.

Porém, a fixação de jurisprudência pelo Supremo Tribunal de Justiça sobre a mesma questão jurídica, no exacto sentido do acórdão recorrido nestes autos, resolve definitivamente a questão controversa nestes autos e torna o presente recurso inútil.

Verifica-se, assim, uma inutilidade superveniente da lide, nos termos do artigo 277º, alínea e), do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 4º do Código de Processo Penal.

7. Assim, acordam os juízes da 3ª Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em declarar extinta a presente instância de recurso por inutilidade superveniente da lide, nos termos do artigo 277º alínea e), do Código de Processo Civil ex vi do artigo 4º do Código de Processo Penal, por força da supra referida decisão de fixação de jurisprudência, sem prejuízo da eficácia desta no presente processo nos termos do artigo 445º nº 1 do Código de Processo Penal.

Sem custas.

Lisboa, 01 de Outubro 2025.

Antero Luís (Relator)

Maria Margarida Almeida (1ª Adjunta)

Horácio Correia Pinto (2º Adjunto)