I. O crime de injúria previsto no artigo 181.º, § 1.º CP confere tutela penal ao direito das pessoas à respetiva integridade moral e ao seu bom nome e reputação, sendo o bem jurídico protegido a honra e a consideração de uma pessoa.
II. É através da valoração dos factos concretos, praticados no seu exato contexto, que se revela (ou não), o ilícito.
III. Para determinar se certa expressão, imputação ou formulação de juízos de valor são ofensivas da honra e consideração de outra pessoa, importa ter presente o contexto situacional de vivência humana em que as mesmas foram proferidas.
IV. Isto é, uma concreta conduta será ou não lesiva da honra se a carga ofensiva da mesma, medida pelas circunstâncias do caso, do tempo, modo lugar e da relação eventualmente existente entre pessoas envolvidas e até da condição destas (ainda que irrelevando a maior ou menor sensibilidade às ofensas), se revelar insuportável diante do valor jurídico tutelado pela norma incriminadora.
a. No ….º Juízo Local Criminal de …, procedeu-se a julgamento em processo comum, de AA, com os sinais dos autos, aos quais o assistente BB, também com os sinais dos autos, havia acusado da autoria, na forma consumada, de um crime de injúria, previsto no artigo 181.º, § 1.º do Código Penal (CP).
Contra o arguido foi também deduzido um pedido de indemnização, pelo qual o assistente/demandante reclamou o pagamento de 4 500€, a título de danos de natureza não patrimonial.
Sob impulso do arguido os autos seguiram para instrução, vindo a final o arguido a ser pronunciado pela prática do ilícito criminal já referido.
Na fase de julgamento o tribunal proferiu sentença, pela qual absolveu o arguido da prática do crime pelos qual havia sido pronunciado, bem assim como do pedido cível que contra o mesmo havido sido apresentado.
b. Inconformado com esta decisão recorreu o assistente, finalizando a sua motivação com um rol que denominou de «conclusões», mas que o não são realmente.
Efetivamente, no figurino normativo dos recursos as conclusões têm uma precisa função, que a lei justamente lhes assinala e que a doutrina e a jurisprudência vêm precisando.
As conclusões do recurso são: «um resumo das questões discutidas na motivação» (Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, Universidade Católica Editora, 2011, pp. 1136, nota 14); não podem constituir uma «reprodução mais ou menos fiel do corpo motivador, mas sim constituírem uma síntese essencial dos fundamentos do recurso» (Sérgio Gonçalves Poças, Processo penal quando o recurso incide sobre a decisão da matéria de facto, revista Julgar n.º 10, 2010, pp. 23; «devem ser concisas, precisas e claras (…)» (Germano Marques da Silva, Direito Processual Penal Português, vol. III, Do Procedimento - Marcha do Processo, Universidade Católica Editora, 2014, pp. 335). Neste mesmo sentido vem a jurisprudência decidindo: cf. acórdão deste Tribunal da Relação de Évora, de 1set2021, proc. 430/20.1GBSSB.E1, rel. Gomes de Sousa; acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 11jul2019, proc. 314/17.0GAPTL.G1, rel. Mário Silva; acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 5abr2019, proc. 349/17.3JDLSB.L1-9, rel. Filipa Costa Lourenço; e do mesmo Tribunal da Relação de Lisboa, acórdão de 9mar2023, proc. 135/18.3SMLSB.L2-9, rel. João Abrunhosa.
Ora o que o recorrente denominou de «conclusões» é deveras um arremedo repetitivo das considerações da motivação! Seguramente não o resumo das questões discutidas nessa motivação.
Conforme sagazmente refere o Supremo Tribunal de Justiça, no seu acórdão de 17/2/2005, de que foi relator o Cons. Pereira Madeira, processo n.º 05P1441, www.dgsi.pt , o recurso não deve ser serventuário do que sob o «título» de «conclusões» os recorrentes entendam ali colocar, havendo que proceder ao seu devido «aparo», para que apenas as que cumpram a função gizada na lei se aproveitem.
E assim procedendo, se considera serem as «conclusões» (com amplo critério), apenas as seguintes:
- a sentença recorrida encontra-se inquinada de nulidade, por violação de dever de fundamentação;
- padece também do de vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada [e de erro notório na apreciação da prova]1;
- o facto 4.º da acusação provou-se através das declarações do arguido (dia 26 de Março de 2025, das 10 horas e 43 minutos às 11 horas e 10 minutos), ali afirmando em relação à pessoa do assistente: “Sei que ele estava lá, penso que tinha contrato” [00:27-00:33], “Conheço de o ver lá” [01:17-01:19], “no escritório da …” [01:21-01:23], “ Eu não conheço a pessoa” [17:42-17:43], “se calhar durante esse mês viu-o dez ou quinze vezes”, a sua opinião era de natureza laboral “ de resto não faço a mínima ideia o que ele é” [24:18-24:19].
- a matéria dos pontos 4.º e 14.º da acusação mostra-se também provada através dos depoimentos das testemunhas CC (depoimento com início pelas 12 horas e 02 minutos e termo pelas 12 horas e 13 minutos), segundo a qual em relação à pessoa do assistente, declarou: “A relação era boa, era um pessoa cordial” [01:54-01:56] , “Comigo houve um problema, não foi um conflito, mas eu chamei-lhe a atenção e era cumpridor das regras e das ordens que lhe eram dadas! [02:05-02:15] “Não conheci qualquer tipo de conflitos com colegas” [02:46-02:49]; e o depoimento prestado pela testemunha DD (depoimento prestado audiência de discussão e julgamento realizada em 26 de Março de 2025 , registado entre as 12 horas e 14 minutos e as 12 horas e 23 minutos), que qualificou o relacionamento com a pessoa do assistente, como “uma relação normal com os colegas” [01:54-01:56],“ uma relação de cabal e de respeito recíproco” [02:50-02:53] e “Não tive conhecimento de nenhum incidente” [01:39-01:44]
- A Constituição da República afirma a dignidade penal da honra, como direito fundamental ao desenvolvimento da personalidade do indivíduo e valor axial e inderrogável da dimensão social - pessoal do homem numa determinada comunidade histórico-socialmente situada.
- Sendo a honra um bem jurídico complexo, que inclui quer o valor pessoal ou interior de cada indivíduo, radicado na sua dignidade e no apego a valores de probidades e de honestidade, que não se deseja ver manchados, quer a sua manifestação exterior - reputação ou consideração no seio da comunidade -, traduzida na estima e respeito que a personalidade moral de alguém infunde aos outros e que vai sendo adquirida ao longo dos anos (probidade e lealdade de carácter) a qual encontra o seu "fundamento essencial" na "irrenunciável dignidade pessoal".
- Para determinação do elemento objetivo do ilícito de injúria e difamação, releva o relacionamento existente entre o arguido e o ofendido e a adequação das expressões proferidas à realidade concreta existente entre os envolvidos (…) tem sempre de se fazer pelo recurso a um horizonte de contextualização , sopesando, para tanto, a valoração conjunta das expressões proferidas, o circunstancialismo de tempo, modo e de lugar em que as mesmas foram proferidas, tendo em conta as realidades sócio - culturais em que os sujeitos se movem, o maior ou menor adequação social do seu comportamento e o relacionamento entre o arguido e o ofendido;
- E o tipo subjetivo é necessariamente doloso, embora se baste com o dolo genérico (direto, necessário ou eventual);
- No inevitável conflito entre a honra e a liberdade de expressão, a solução há de ser encontrada por via da harmonização ou concordância prática dos bens em colisão, a sua otimização, traduzida numa mútua compressão por forma a atribuir a cada um a máxima eficácia possível, em face das circunstâncias do caso concreto, com recurso aos critérios da proporcionalidade, da necessidade e da adequação.
- A invetiva do arguido dirigida ao assistente dizendo-lhe: «o senhor é uma pessoa arrogante, sem princípios e mal-educada», naquele exato contexto contende objetivamente com a honra e a consideração profissional do assistente; extravasando o que é exercício legitimo do direito de critica e opinião.
- O arguido não padece de qualquer inabilidade, bem pelo contrário, é … e …, pelo que tem escolaridade suficiente para saber que tais juízos de valor contrariam a Lei e que estava consciente da proibição legal de tal conduta, como acontece todos os cidadãos integrados socialmente.
- Ao não tomar isso em consideração, a decisão recorrida violou, entre outros, o disposto nos artigos 1.º, 2.º, 18.º, n.º 2, 26.º, n.º1 e 37.º, n.º 3 da Constituição da Republica Portuguesa, artigos 340.º, n.º 1, 374.º, n.º 2, 379.º, n.º1, alínea a), 410.º, n.º 2, alínea a) e c) do Código de Processo Penal e artigos 14.º, n.º 1 e 180.º do Código Penal.
c. Admitido o recurso a ele respondeu o Ministério Público, pugnando pela improcedência do mesmo, nos seguintes termos:
1- Da motivação da decisão de facto da sentença fica-se a saber porque é que o arguido foi absolvido. A prova testemunhal e documental foram devidamente valoradas, bem como as declarações do arguido e do assistente
2- Do exame crítico das provas ficou-se claramente a saber porque é que se deram como não provados os factos que levaram à absolvição do arguido (sendo desnecessárias quaisquer outras considerações face à fundamentação constante da sentença).
3- A prova livre tem como pressupostos valorativos a obediência a critérios da experiência comum e da lógica do homem médio suposto pela ordem jurídica (dentro desses pressupostos se deve portanto colocar o julgador ao apreciar livremente a prova).
4- A regra de que a convicção do julgador se deve fundar na livre apreciação da prova implica a possibilidade de dar como demonstrado certo facto certificado por uma única testemunha.
5- A prova produzida em audiência de julgamento é manifestamente suficiente para dar como provados e não provados os factos constantes da sentença, não se verificando qualquer erro notório na apreciação da prova.
6- É de referir que apenas existe erro notório na apreciação da prova quando para a generalidade das pessoas, seja evidente uma conclusão contrária à exposta pelo tribunal, nisto se concretizando a limitação ao princípio da livre apreciação da prova estipulado no artigo 127 do C.P.P.
7- De salientar também que quando a atribuição de credibilidade a uma fonte de prova pelo julgador se basear em opção assente na imediação e na oralidade, o Tribunal de recurso só a poderá criticar se ficar demonstrado que essa opção é inadmissível face às regras da experiência comum.
8- A imediação e a oralidade é que transmitem com precisão o modo e convicção como as pessoas depuseram, nomeadamente a coerência e sequência lógica com que o fizeram, o tom de voz utilizado, o tempo e a forma de resposta, os gestos e as hesitações , a postura e as reações, o que não pode ser completamente transmitido para a gravação.
9- No caso em apreço, o tribunal a quo, na tarefa de valoração da prova e de reconstituição dos factos, tendo em vista alcançar a verdade – não a verdade absoluta e ontológica, mas uma verdade histórico-prática e processualmente válida, geradora de uma convicção que ultrapasse o patamar da dúvida razoável –, teve devidamente em conta as declarações prestadas em audiência de julgamento pelo arguido, assistente e testemunhas, bem como a prova documental.
10- As afirmações do arguido não têm idoneidade objetiva para preencher o crime de injúria.
11- Assim, face aos factos que foram provados não restam dúvidas de que o arguido não cometeu o ilícito pelo qual foi pronunciado, não se verificando qualquer nulidade.
12-Assim nenhum reparo nos merece a sentença recorrida.
13– Nenhuma disposição legal foi violada.
14 – Deve assim, manter-se a mesma fazendo-se assim Justiça.
d. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Ministério Público junto desta instância, na intervenção a que alude o artigo 416.° do CPP, secundou integralmente a posição já assumida pelo representante daquele órgão do Estado no Juízo de primeira instância.
e. Efetuado exame preliminar e colhidos os vistos legais, cumpre agora, em conferência, apreciar e decidir.
II – Fundamentação
1. Delimitação do objeto do recurso
O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões da recorrente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (artigo 412.º, § 1.º CPP)2. No presente suscitam-se as seguintes questões: i. nulidade da sentença por falta de fundamentação; ii. vícios da decisão recorrida (insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; e erro notório na apreciação da prova); iii. erro de julgamento da questão de facto – factos 4.º e 14.º da pronúncia (412.º, § 3.º CPP); iv. erro de julgamento da questão de direito (do conflito entre a honra e a liberdade de expressão).
2. A sentença recorrida 2.1 Na sentença recorrida, o tribunal a quo fez constar o seguinte quanto a factos provados, factos não provados e motivação da decisão de facto (transcrição):
«A) Matéria de Facto Provada, com importância para a decisão da causa e desprovida de factos narrativos ou conclusivos:
1. Em dia não concretamente apurado, o assistente e a …, Lda." celebraram entre si um denominado "Contrato de Consultadoria Imobiliária", pelo prazo de 6 meses, pela qual aquele se obrigou a prestar a favor desta, mediante o pagamento de eventual comissão, os serviços de angariação e apoio técnico no sector do imobiliário;
2. O Assistente exerceu primacialmente as suas funções nas instalações daquela empresa, sitas na Rua …, em ….
3. O arguido é amigo e associado do sócio-gerente da "…, Lda.", EE num outro projeto empresarial e, com a anuência deste, frequenta e utiliza em seu proveito as citadas instalações da empresa em …;
4. No dia 5 de abril de 2023, no período entre o final da manhã e o início da tarde, o arguido deslocou-se às citadas instalações da "…, Lda." em … e, na presença do assistente que que aí se encontrava, na companhia de FF, coordenadora comercial da região do … da aludida empresa, expressou à mesma que não queria que o assistente trabalhasse nas suas obras. porquanto “é uma pessoa arrogante, sem princípios e má educada";
5. Questionado pelo Assistente sobre o motivo das suas palavras, disse que não tinha que lhe dar explicações, mas que “É uma pessoa arrogante a falar com os clientes e que não queria a trabalhar nas suas obras porque precisa dos clientes”.
6. O Assistente retorquiu dizendo que não precisava daquele trabalho para nada, ao que o arguido respondeu dizendo que o assistente repetia sempre que “não precisava daquilo para nada, tendo-o chamando de "caga milhões";
8. Mais disse ao assistente que "se trabalhasse para mim já tinha sido despedido e esta proibido de entrar nas obras da minha empresa”;
9. As aludidas afirmações foram proferidas propositadamente na presença da citada FF, coordenadora comercial da região do … da "…, Lda.", no âmbito da justificação para que o mesmo não fosse colocado nas suas obras, nem lidasse com os seus clientes.
- O arguido não tem antecedentes criminais:
- O arguido exerce as funções de empresário e aufere mensalmente 6 000,00€;
- Mora em casa da filha menor pela qual é responsável.
B) Matéria de facto não provada
1. Atento o volume e o ruído com que foram proferidas as expressões, também foram audíveis por todas as pessoas que se encontravam em zona próxima da aludida loja.
2. O arguido dirigiu as expressões imputadas com o objetivo de lesar a honra e consideração pessoal do assistente.
3. Nas concretas circunstâncias e no exato contexto em que aquelas afirmações foram proferidas, conclui-se que o arguido agiu de forma livre, voluntaria e consciente com esse propósito concretizado de desqualificar o assistente como pessoa e como profissional.
4. Sabia o arguido que tais afirmações, além de falsas, são indubitavelmente lesivas da honra e consideração pessoal e profissional do assistente;
5. Sabia o arguido que a sua conduta era proibida e punida por Lei.
C) Motivação da Matéria de facto
O Tribunal fundou a sua convicção no que concerne à matéria dada como provada, nos seguintes meios de prova que passa a analisar de forma crítica.
O arguido no essencial assumiu as expressões imputadas tendo, no entanto esclarecido que o fez apenas para justificar o seu pedido de que o arguido não fosse colocado nas suas obras.
Na realidade, o arguido aproveitou o momento em que estava presente a pessoa responsável pela alocação de vendedores a obras e o assistente e disse a essa mesma pessoa – FF – que não queria o arguido alocado às suas obras e justificando a sua vontade descreveu o assistente nos termos constantes nos factos provados como pessoa altiva com os clientes, mal educada e de difícil trato.
Admitiu ter chamado o assistente de “caga-milhões”, justificando que circula a informação que o mesmo ganhou um prémio de euromilhões e que apenas o fez no âmbito daquela conversa em particular porquanto o assistente referiu (como já teria feito antes) que “não precisava daquilo - entenda-se trabalho – para nada”.
BB, assistente nos autos, conferiu credibilidade às declarações do arguido desde logo pela postura altiva que exibiu em audiência de julgamento, tendo confirmado também as expressões que o arguido admitiu lhe ter dirigido (negou que o arguido lhe tenha chamado pessoa sem princípios) e que retorquiu dizendo que “não precisava daquilo”.
Mais referiu que o arguido frisou que era a opinião que tinha sobre si.
No que concerne à postura altiva e com alguma vaidade excessiva sobre si mesmo, fundou o tribunal tal convicção não apenas na postura do arguido, mas também no facto do mesmo ter afirmado que nos 30 dias em que trabalhou na empresa celebrou dois negócios, sendo que quando foi para lá trabalhar lhe comunicaram que o tempo médio para começar a ter ganhos seria de 10 meses.
Ora, tal facto foi negado pela funcionária GG que ainda trabalha na empresa e não se lembrava de qualquer desempenho extraordinário por parte do assistente (lembrava-se de um contrato de arrendamento) e é também contrariado pelas mais elementares regras de bom sendo.
Com efeito é sabido que os vendedores imobiliários vivem sobretudo e na maioria de comissões dos contratos que celebram sobre os imóveis.
Se o tempo médio de realização de um negócio fosse 10 meses, perguntamo-nos como é que a pessoa vivia durante esse tempo.
Para além disso, apregoar que se demora um ano a iniciar a obtenção de rendimentos não será um dado atrativo para a profissão, uma vez que significa que, a menos que tenha um conforto financeiro elevado (eventualmente por ter ganho um prémio de euro milhões) estará 10 meses com gastos imprevisíveis (gasóleo nomeadamente) e sem rendimento.
FF de relevante referiu que o item fundamental da conversa foi o arguido não querer o assistente nas suas obras e lembrava-se que tinha argumentado que o mesmo era arrogante e tinha faltado ao respeito à GG. Lembrou-se também da expressão “caga-milhões”.
GG referiu que, de facto, tinha tido um problema com o Assistente no dia anterior uma vez que o mesmo contactou diretamente a responsável por um Fundo a qual ligou à testemunha manifestando o seu desagrado com tal.
Perante essa comunicação GG comunicou ao Assistente que não deveria voltar a fazê-lo e instada a descrever o assistente afirmou que ”é um bocadinho arrogante”.
DD e EE nada presenciaram, descreveram, no entanto, o arguido como uma pessoa que não levanta problemas e se relaciona bem como todos os funcionários.
Os factos considerados não provados foram-no por terem sido contrariados pelos depoimentos prestados em audiência de julgamento ou porque contrariam a convicção formulada pelo tribunal nomeadamente no que concerne à prova do elemento subjetivo.
A prova dos factos relativos à determinação da sanção decorreu do teor das declarações do arguido, das quais o tribunal não tem razão para duvidar e ainda do teor do certificado de registo criminal junto aos autos.
3. Apreciando
3.1 Da nulidade da sentença por falta de fundamentação
O recorrente assinala que a sentença é deficiente em matéria de fundamentação, aludindo concretamente à «violação de dever de fundamentação» e fazendo-o com referência ao facto de nela se não ter julgado «provada» ou «não provada» a factualidade constante nos pontos 4.º e 14.º da pronúncia3, os quais têm o seguinte teor: «o arguido pessoa com quem o assistente nunca teve especial contacto ou qualquer tipo de animosidade» e que «o assistente é um bom profissional, pelo que desde o primeiro dia de serviço que manteve com todos os demais colegas e colaboradores um salutar relacionamento pessoal e profissional», considerando o recorrente que tal matéria se reputa da maior importância para o apuramento da responsabilidade jurídico - penal do arguido. Sobre este aspeto o Ministério Público na sua resposta, nada refere!
Pois bem.
A fundamentação das decisões judiciais encontra esteio normativo no texto da Lei Fundamental (artigo 205.º, § 1, da Constituição), onde se consagra o princípio da fundamentação (obrigatória) das decisões que não sejam de mero expediente. Este dever de fundamentação advém igualmente do princípio do processo equitativo, a que se reportam os artigos 20.º, § 4.º da Constituição da República; 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem; 14.º do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e 47.º da Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia (todos inspirados no artigo 10.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem).
«A exigência da fundamentação é, simultaneamente, um ato de transparência democrática do exercício da função jurisdicional, que a legitima, e das diversas garantias constitucionais da motivação decisória, com destaque para os direitos da defesa, de forma a aferir-se da sua razoabilidade e a obstar a decisões arbitrárias.»4
Para cumprir os valores assinalados a fundamentação das sentenças deve ser clara, lógica e suficiente, pois só desse modo permite a sua compreensão e aceitação pelos seus destinatários; mas também a sua impugnação, sendo ainda (indiretamente) um meio para disciplinar o juiz na ponderação que lhe cabe realizar e na estruturação da sua decisão.
Fundamentar é, pois, justificar, apresentar as razões que estruturaram a convicção formada pelo julgador naquele sentido e não noutro e que foram determinantes para a prova de uns factos e o juízo de não provado relativamente a outros, com base na valoração dos meios de prova disponíveis, de forma coerente e objetiva. Abarcando esta fundamentação quer a decisão sobre os factos quer a solução jurídica encontrada e aplicada.
Tal explicitação deverá ser feita de modo a possibilitar aos destinatários dessa decisão a reconstrução do percurso mental efetuado pelo julgador, que se apresenta como sustentador do juízo efetuado, permitindo-lhes, ademais, verificar que a decisão tomada não foi arbitrária.5
Sucede que a descrição factológica que a sentença deve conter prescinde dos factos contextualmente irrelevantes. Neste perímetro se incluindo aqueles que não sendo integradores da prática do ilícito em referência, também nada de relevante aportam quanto à compreensão do sucedido.
E é justamente isso que sucede com o facto 4.º da pronúncia («O arguido é pessoa com quem o assistente nunca teve especial contacto ou qualquer tipo de animosidade»). E o mesmo se diria do alegado ponto 14.º da acusação particular. Só que este nem sequer integrou a pronúncia! Sendo que esta – e só esta – é que define o objeto do julgamento. Razões pelas quais consideramos não assistir nenhuma razão ao recorrente quanto à alegada «violação de dever de fundamentação», não se verificando a invocada nulidade da sentença.
3.2 Dos vícios da decisão recorrida
Neste segmento, desconsiderando deveras a natureza dos vícios que alega, o recorrente volta aos factos que plasmou na acusação particular e que no seu entender deveriam constar dos factos provados! Benevolamente poderá também entender-se que a desconsideração do ponto 4.º da pronúncia constitui, para o recorrente - também por isso - um ou mesmo os dois vícios que aponta à sentença recorrida: insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e erro notório na apreciação da prova (artigo 410.º, § 2.º, al. a) CPP; e artigo 410.º, § 2.º, al. c) do mesmo código)! Entendamo-nos. Os vícios previstos no referido artigo 410.º do CPP têm que ver com a perfeição formal da decisão da matéria de facto, cuja verificação haverá necessariamente de ressaltar do texto do próprio texto da decisão recorrida, por si ou conjugada com as regras da experiência comum, sem possibilidade de apelo a outros elementos que lhe sejam estranhos, mesmo que constem do processo, sendo os referidos vícios intrínsecos à decisão como peça autónoma.6 Sendo, pois, coisa distinta quer das nulidades quer da impugnação da matéria de facto (e da sua conexão desta com as provas e com o juízo que destas se extraiu). Concretamente o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto emerge da própria sentença ou acórdão. E ocorre nas situações em que da sua simples leitura, só por si ou conjugada com as regras da experiência comum, se permite concluir que a matéria de facto julgada provada não suporta a decisão de direito, quer quanto à culpabilidade quer quanto à determinação da pena ou da medida desta. Isto é, ocorre lá quando, da factualidade vertida na decisão em recurso, se colhe que faltam elementos que, podendo e devendo ser indagados, são necessários para se poder formular um juízo seguro de condenação ou de absolvição e decorre da circunstância do tribunal não ter dado como provados ou não provados todos os factos que, sendo relevantes para a decisão da causa, tenham sido alegados ou resultado da discussão; daí que aquela alínea se refira à insuficiência da matéria de facto provada para a decisão de direito e não à insuficiência da prova para a matéria de facto provada, questão do âmbito do princípio da livre apreciação da prova (artigo 127.º), que é insindicável em reexame da matéria de direito».7 O Supremo Tribunal de Justiça vem entendendo, uniformemente, que o conceito de insuficiência da matéria de facto provada significa que os factos apurados e constantes da decisão recorrida são insuficientes para a decisão de direito, do ponto de vista das várias soluções que se perfilem - absolvição, condenação, existência de causa de exclusão da ilicitude, da culpa ou da pena, circunstâncias relevantes para a determinação desta última, etc. - e isto porque o tribunal deixou de apurar ou de se pronunciar sobre factos relevantes alegados pela acusação ou pela defesa ou resultantes da discussão da causa, ou ainda porque não investigou factos que deviam ter sido apurados na audiência, vista a sua importância para a decisão.8 Indo ao cerne da alegação do recorrente logo constatamos que ele não se refere ao vício em referência em termos técnicos. Antes a uma certa interpretação do seu nomen juris. E por esta via o que o recorrente verdadeiramente pretende é voltar aos factos da acusação já assinalados (4.º e 14.º), que em seu entender deveriam ter sido julgados provados. Sucede que o vício alegado – que é um vício formal da sentença – nada tem que ver com a impugnação da decisão de facto relativamente aos referidos segmentos da acusação particular (aos quais nos referimos no ponto anterior). O mesmo sucedendo relativamente ao vício do erro notório na apreciação da prova. O qual, conforme também já deixámos referido, se reporta a vício de lógica jurídica ao nível da matéria de facto, que torna impossível uma decisão logicamente correta e conforme à lei. Haverá erro notório por exemplo «... quando se retira de um facto dado como provado uma conclusão logicamente inaceitável, quando se dá como provado algo que notoriamente está errado, que não podia ter acontecido, ou quando, usando um processo racional e lógico, se retira de um facto dado como provado uma conclusão ilógica, arbitrária e contraditória ou notoriamente violadora das regras da experiência comum, ou ainda quando determinado facto provado é incompatível ou irremediavelmente contraditório com outro dado facto (positivo ou negativo) contido no texto da decisão recorrida».9 Também ocorrendo quando se violam as regras sobre prova vinculada ou das leges artis. Nas circunstâncias do caso presente, não só o arguido não aponta onde mora o vício que invoca (que princípios ou leis formuladas cientificamente a sentença recorrida ofende? Que princípios gerais da experiência comum das pessoas ela contraria? Que princípio ou regra fundamental em matéria de prova ela viola ou posterga?). Também nós o não vislumbramos! O que só confirma a ideia já referida da impropriedade da menção no recurso ao nomen juris do referido vício.
Efetivamente, percorrendo as páginas da sentença recorrida, não constatamos os vícios que o recorrente lhe assinala, pelo que falece totalmente este fundamento do recurso.
3.3 Do erro de julgamento da questão de facto
O recurso do assistente estrutura-se, pois, em redor do que considera ser o erro de julgamento da questão de facto, cingido aos factos «4.º e 14.º da acusação particular»! E na consideração de que se deveriam julgar provados os factos respetivos (devendo como tal figurar na sentença como sendo os 10.º e 11.º factos provados):
«10. Com o referido comportamento, o arguido ofendeu a honra e consideração a assistente»
«11. O arguido agiu voluntária, livre e conscientemente, com o propósito de ofender a honra e consideração do assistente, o que conseguiu, apesar de bem saber que a sua conduta era proibida e punível por Lei.»
Vejamos cada aspeto por sua vez.
Em primeiro lugar, nos termos sobreditos, a impugnação factológica visada pelo recorrente relativamente ao ponto 4.º da pronúncia (o mesmo que constava do ponto 4.º da acusação particular), o qual tem o seguinte teor: «O arguido é pessoa com quem o assistente nunca teve um especial contacto ou qualquer tipo de animosidade.»
Este facto, que o tribunal recorrido considerou irrelevante para o objeto do processo, única razão pela qual o não integrou nos factos provados nem nos não provados, é mesmo irrelevante. Na exata medida em que o mesmo nada contribui para a integração dos elementos do tipo de ilícito de ilícito imputado ao arguido, sendo também irrelevante para a medida da pena (para o caso de o arguido vir a ser condenado).
A mais eloquente forma de demonstrar essa irrelevância advém do facto de o recorrente se não ter dado ao trabalho de a evidenciar! Mas afinal relevante porquê e para quê? O recorrente não esclarece!
Admitamos, por mero exercício retórico, que esse facto teria sido julgado provado. Isso mudaria alguma coisa no juízo a fazer sobre o conjunto dos factos provados? Sendo mais direto: daí resultaria a possibilidade de condenação do arguido?
Não. Não resultaria.
Talvez por isso mesmo o recorrente também considera que o tribunal deveria ter julgado provados os factos 22. e 23. da pronúncia - ainda que o dizendo de modo arrevesado, com formulação algo diversa (designando-a de «novos pontos 10. e 11.» do acervo fáctico provado).
Em bom rigor o que o recorrente deveria ter feito era impugnar os pontos 2.º e 3.º dos factos julgados não provados na sentença, por ser essencialmente neles que consta a matéria que agora indica com referência aos tais «novos» pontos 10. e 11. Mas não o fez!
Lembremos que em conformidade com o que preceitua o artigo 431.º al. a) CPP, havendo documentação da prova - como sucede no presente caso - a decisão do tribunal de 1.ª instância só pode ser modificada se esta tiver sido impugnada, nos termos do artigo 412.º, § 3.º e 4.º CPP.
Ora, dispõe-se neste § 3.º que: «quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, o recorrente deve especificar:
a) os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida;
c) as provas que devem ser renovadas.»
E preceitua o aludido § 4.º que:
«Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na ata, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 364.º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que funda a impugnação.»
No presente caso o assistente não concretizou – na motivação nem nas conclusões - os factos que preconiza impugnar (fazendo antes menção a dois artigos da acusação particular!) nem as concretas provas que em relação a cada um deles impõem decisão diversa da que foi tomada pelo tribunal recorrido (artigo 412.º, § 3.º, al. b) CPP). Também não realizando a transcrição nos termos exigidos pela lei (artigo 412.º, § 4.º CPP).
Não tendo manifestado ter a pretensão de impugnar os factos julgados não provados nos pontos 2. a 5.10 da sentença, nem tendo indicado as provas que imporiam decisão diversa da constante da sentença recorrida (al. b) do § 3.º do artigo 412.º CPP).
E, por assim ser, essa insuficiência é inultrapassável, devendo concluir-se pela inexistência da impugnação11, pelo que nada há a alterar à matéria de facto julgada provada e não provada na sentença recorrida.
O que nos leva para a última das questões a conhecer.
3.4 Do erro de julgamento da questão de direito
Pretende o recorrente que na sequência da alteração da decisão de facto que preconizava – e que como visto não ocorre –, isto é, aditando-se à matéria de facto provada na sentença o facto constante do ponto 4.º da pronúncia e os factos julgados não provados nos pontos 2. a 5 da sentença, estariam verificados os elementos constitutivos do ilícito de injúria, previsto no artigo 181.º, § 1.º CP, devendo por conseguinte ser o arguido por ele condenado. Efetivamente no artigo 181.º, § 1.º CP dispõe-se que:
«1. Quem injuriar outra pessoa, imputando-lhe factos, mesmo sob a forma de suspeita, ou dirigindo-lhe palavras, ofensivos da sua honra ou consideração, é punido com pena de prisão até 3 meses ou com pena de multa até 120 dias.
2. Tratando-se da imputação de factos, é correspondentemente aplicável o disposto nos nºs 2, 3 e 4 do artigo anterior.»
Através deste retábulo normativo confere-se tutela penal ao direito das pessoas à respetiva integridade moral e aos seus bom nome e reputação.
O bem jurídico protegido é a honra e a consideração de uma pessoa.
Para determinar se certa expressão, imputação ou formulação de juízos de valor são ofensivas da honra e consideração de outra pessoa, importa, em primeiro lugar, ter presente o contexto situacional de vivência humana em que as mesmas foram proferidas.12
Para Faria Costa13 «o significado das palavras, para mais quando nos movemos no mundo da razão prática, tem um valor de uso. Valor que se aprecia, justamente, no contexto situacional e que ao deixar intocado o significante ganha ou adquire intencionalidades bem diversas no momento em que apreciamos o significado», o que não significa que não haja palavras «cujo sentido primeiro e último é tido, por toda a comunidade falante, como ofensivo da honra e consideração.»
É, pois, no desvalor da ação que se acentua a tónica do direito penal, sendo a valoração dos factos concretos, praticados no seu exato contexto, que se revela (ou não), o ilícito típico.
A jurisprudência vem entendendo que para se concluir se uma conduta é ou não lesiva da honra deverá o julgador orientar-se por um critério objetivo, tendo em conta, nomeadamente, o valor social da honra, a carga ofensiva da conduta em função das circunstâncias, a condição da pessoa, a relação entre o agente e o ofendido, o costume. Sendo irrelevante a maior ou menor sensibilidade às ofensas. Ora, tendo naufragado a preconizada alteração da matéria de facto, constata-se perante os factos efetivamente provados da sentença, que os mesmos não sustentam a condenação que o recorrente reclama, por os mesmos não serem integradores dos elementos objetivos e subjetivo do ilícito criminal em referência. E ante o exposto restará concluir que o recurso não é merecedor de provimento, devendo em conformidade confirmar-se a decisão recorrida.
III – Dispositivo
Destarte e por todo o exposto, acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora, em:
a) Negar provimento ao recurso e, em consequência, manter a sentença recorrida;
b) As custas ficam a cargo da assistente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC’s.
Évora, 30 de setembro de 2025
J. F. Moreira das Neves (relator)
Jorge Antunes
Carla Oliveira
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1 Atenta a referência feita ao artigo 410.º, § 2.º als. a) e c) CPP.
2 Cf. acórdão do STJ n.º 7/95, de 19/10/1995 (Fixação de Jurisprudência), publicado no DR, I-A, de 28/12/1995.
3 Na verdade, o recorrente/assistente refere-se à «acusação particular»! Sucede que tendo havido instrução e despacho de pronúncia, é neste (deveras) que se passou a conter o acervo factual (o libelo) que seguiu para julgamento (artigo 308.º, § 1.º e 2.º CPP) – no qual justamente se contém a matéria em referência, nos pontos 4.º e 14.º.
4 Joaquim Correia Gomes, A motivação judicial em processo penal e as suas garantias constitucionais, revista JULGAR, n.º 6, 2008.
5 Cf. a este propósito, entre outros, o Acórdão do STJ proferido no proc. 733/17.2JAPRT.G1.S1 e disponível em www.dgsi.pt.
6 Neste sentido se pronunciando Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, vol. III (ed. 2014), Universidade Católica Editora, p. 323/326; e Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado, 16.ª ed., Almedina, p. 873.
7 Acórdão Supremo Tribunal de Justiça, de 21jun2007, Cons. Simas Santos, proc. 07P2268.
8 Cf. acórdão STJ, de 3jul2002, proc. 1748/02-5.ª, citado no CPP, Notas e Comentários, Vinício A. P. Ribeiro, 3.ª ed., 2020, Quid Juris, p. 979.
9 Acórdão do STJ, 4out.2001 (CJ/AcSTJ, IX, T. III, 182).
10 Tais pontos 2. a 5. desse segmento da sentença contêm, no essencial, os factos em referência nos «novos» pontos 10. e 11. indicados pelo recorrente.
11 Veja-se neste preciso sentido o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 685/2020, de 26nov2020, em que foi rel. Pedro Machete.
12 Cf. TRLisboa, de 20jun2024, proc. 631/20.2T9SXL.L1-9, rel. Micaela Rodrigues.
13 Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo II, p. 906 ss.