HONORÁRIOS
ADVOGADO
LAUDO
FORÇA PROBATÓRIA
Sumário

Sumário: (elaborado pela relatora)
I. Na fixação dos factos a considerar na sentença não pode constar “não provado”, pois tal enunciação constitui um non liquet, que estará sempre afastado das decisões, dada a obrigação de julgar que se impõe ao juiz, mas nesta tarefa não pode considerar no facto que não existiu prova, mas sim tirar as consequências de tal circunstância, tendo por base o ónus de prova ou o previsto no artº 414º do Código de Processo Civil.
II. A acção de honorários a Advogado implica a emissão de um juízo com certa componente de discricionariedade já que, para além da ponderação dos elementos do Estatuto, impõe-se que se considere o Laudo emitido pela Ordem dos Advogados e se considerem critérios de equidade.
III. Porém, quanto ao laudo, ainda que sujeito ao princípio da livre apreciação do tribunal (arts. 389.º do CC e 611.º e 655.º, n.º1, ambos do Código de Processo Civil), não pode negar-se-lhe o valor informativo particular, dada a especial qualificação de quem o emite.

Texto Integral

Acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. Relatório:
AA intentou procedimento de injunção que deu lugar à presente acção declarativa com processo especial (AECOP), contra Trustful Support - Lda, pedindo a condenação desta última no pagamento da quantia de € 11.725,94, sendo € 11.461,46 de capital e € 264,48 de juros de mora vencidos.
Fundamentou a sua pretensão no facto de ter prestado serviços jurídicos à Ré, em vários dossiers, nomeadamente, a assessoria aos procedimentos de alterações societárias (alteração da gerência, cessão de quotas e alteração de contabilista), a actualização de Registo de Beneficiários Efectivos, o acompanhamento da auditoria interna às contas da sociedade e da elaboração de um Relatório Financeiro, a assessoria à preparação da redacção do contrato-promessa de compra e venda de um imóvel sito na Avenida 1 , tendo emitido as respectivas Notas de Honorários e Despesas em Julho e Agosto de 2020, no valor global supra mencionado a título de capital, ao qual acresce o IVA devido, que a Ré não pagou, apesar das sucessivas interpelações que discrimina.
Após citação, a ré contestou, impugnando a factualidade contida no requerimento inicial de injunção, confirmando apenas a relação de mandato entre as partes, a qual considera que não foi integralmente cumprida pelo A, ficando “muito aquém do contratado”, concluindo que os pagamentos por si efectuados, no valor total de 2.800,00€, satisfazem o trabalho efectivamente prestado pelo A., pelo que “não existe qualquer obrigação de qualquer pagamento além dos valores que já liquidou.”
Notificado para o efeito, o A. respondeu à oposição apresentada, pugnando pela improcedência da defesa da Ré.
Procedeu-se a julgamento, findo o qual foi suspensa a audiência, tendo em vista solicitar laudo da Ordem dos Advogados, após o elenco dos factos a considerar.
Junto que foi o laudo, foi a acção julgada parcialmente procedente tendo a ré sido condenada a pagar ao A., a quantia de € 7.113,80, a título de honorários, acrescida de juros de mora, à taxa supletiva legal para juros civis, desde a data de transito em julgado da presente sentença até integral pagamento, absolvendo-se a Ré do demais peticionado.
Inconformada veio a Autora recorrer, formulando as seguintes conclusões:
«A. Tem o presente recurso por objecto a douta Sentença prolatada pelo Tribunal a quo, versando sobre a matéria de facto e direito, recorrendo à prova gravada, que julgou a ação
parcialmente procedente.
B. Tendo em atenção o explanado na motivação do recurso, resulta cristalino que a ação não se subsume aos requisitos exigidos no art. 1º e sgs. do DL 269/98, pelo que estaria afastado o recurso ao processo de injunção para obter um título executivo com vista à obtenção do cumprimento coercivo da obrigação pecuniária.
C. Assim, no caso, o recurso à Injunção não é legalmente admissível, uma vez que o processado simplificado da Injunção não se coaduna com a indagação quanto ao tipo de serviços prestados e adequação dos valores cobrados.
D. Ou seja, o uso indevido e inadequado do processo de injunção é motivo de recusa do
requerimento injuntivo e, nesse sentido, configura uma excepção dilatória nominada, a qual verificada impunha a consequente absolvição da então Ré da instância, cfr. artigo 11.º, n.º 1, al. h) do Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro.
E. Nem mesmo a transmutação do procedimento de injunção, por via da oposição deduzida, em ação declarativa de condenação, pode legitimar a utilização indevida do procedimento injuntivo, derivada da falta de pressupostos que o possibilitariam.
F. E assim, nos termos já expostos, e sendo a existência de erro na forma de processo de
conhecimento oficioso, deveria ser julgada verificada pelo douto Tribunal a quo a excepção dilatória de uso indevido de Requerimento de Injunção.
G. E, em consequência, deverá a Sentença recorrida ser revogada e substituída por outra
que absolva a Apelante da instância, o que se requer.
H. Quanto à legitimidade activa do Apelado, como alegado na motivação, é manifesto, por não demonstrado, que carece o Apelado de interesse processual activo, o constitui um pressuposto processual relativo às partes, e a sua falta integra excepção dilatória inominada, de conhecimento oficioso, que conduz à absolvição da instância, cfr. al. e), do nº1, do art. 278º, nº2, do art. 576º, art. 577º e art. 578º, todos do CPC, o que se requer.
I. Relativamente aos factos considerados incorrectamente julgados pelo douto Tribunal a quo, devem os mesmos ser alterados na sua redação nos termos e com os fundamentos descritos na motivação de recurso, como segue:
J. O facto provado 10.º deve ser alterado, passando a ter a seguinte redação:
10 - Relativamente a este dossier de alteração de gerência, o A. e a sua colaboradora Dra. BB executaram diversas diligencias junto dos sócios da requerida e de entidades oficiais, não tendo sido apurado e provado pelo A. o número total de horas despendidas na concretização de tal tarefa.
K. O facto provado 14.º deve ser alterado, passando a ter a seguinte redação:
14- No âmbito do acompanhamento deste processo de aquisição de um imóvel sito na Av.
Miguel Bombarda em Lisboa, designadamente negociações com os vendedores e elaboração de um CPCV, o Requerente não fez prova do tempo que despendeu com tal serviço.
L. O facto provado 18.º deve ser alterado, passando a ter a seguinte redação:
18- A requerida, através de CC nomeada gerente da mesma, solicitou ainda ao Requerente , em data anterior a 15.6.2020, a realização de uma cessão de quotas, de forma a retirar da sociedade os antigos sócios, com quem se encontrava em conflito, trabalhos que decorreram entre 15.6. e 17.6, nada se provando quanto à duração de tais serviços.
M. O facto provado 20.º deve ser alterado, passando a ter a seguinte redação:
20- Os serviços pedidos pela requerida foram assim divididos pelo A., em diferentes dossiers, por tratarem de assuntos diversos, a saber, “alterações à gerência”, já referido em 10-, “CPCV do imóvel sito na Av. Miguel Bombarda”, já referido em 14-, procedimentos para cessão de quotas, já referido em 18-, e por fim, um dossier geral (que incluía outros assuntos, como a actualização do Registo de Beneficiários Efectivos, o acompanhamento da auditoria interna as contas da sociedade e da elaboração de um Relatório Financeiro e ainda os aludidos em e 16-), constando também nesse dossier , a discriminação de todas as diligencias realizadas contactos havidos com a nova gerente da requerida, os seus sócios, o Banco onde a requerida tinha a sua conta sediada e terceiros,
a fim de resolver os assuntos pendentes, dossier esse relativamente ao qual embora se encontrem registados um total de 37 horas de trabalho, tal duração não foi provada.
N. O douto Tribunal a quo, ao solicitar tal parecer técnico, fê-lo incidir sobre os factos que havia dado como provados, isto é, a emissão do Laudo, partiu do pressuposto de que os serviços advocaticios e comunicações referenciados na nota de honorários, como tendo sido todos efectivamente prestados, bem como importaram no dispêndio das horas constantes nos respectivos factos dados como provados, o que necessária mente limita e condiciona a análise a efectuar.
O. Ao afastar assim a verificação por parte da Ordem dos Advogados da razoabilidade dos tempos registados como despendidos na nota submetida à sua apreciação, e tal em relação a cada serviço, o que com o devido respeito, não se pode afigurar como acertado, ou equitativo.
P. O Laudo em causa não distingue o trabalho intelectual complexo que geralmente caracteriza a actividade do advogado, do meramente administrativo, como o empregue no preenchimento de formulários de registo, ou outros de reduzida complexidade como é caso da generalidade das comunicações telefónicas e comunicações via e-mails, o que se verifica do ponto V.3 do Laudo, ao aplicar à horas ditas como despendidas o mesmo valor hora, não se devendo ou podendo remunerar pelo mesmo valor/hora o trabalho meramente administrativo, burocrático e comunicacional, no que também a douta Sentença não andou bem, ao decidir como decidiu.
Q. O depoimento de uma só testemunha, a Dr.ª BB, que claramente tem interesse no desfecho da causa, não pode ser o único meio de prova, como foi, nem é seguro para determinar, ou estimar o tempo despendido numa prestação de serviços forenses.
R. O Laudo emitido pelo Conselho Superior da Ordem dos Advogados não tem um valor
vinculativo e constitui meio de prova a apreciar livremente pelo Tribunal, uma prova pericial que deve ser valorada com os restantes elementos dos autos.
S. No caso de fixação de honorários é essencial interpretar a declaração das partes de acordo com os limites legais aplicáveis que implicam que os honorários devam ser fixados de acordo com a dificuldade da causa e trabalho e não pelo número de actos praticados
T. Provando-se que foram prestados determinados serviços, mas sem ter sido demonstrado o tempo despendido nesse trabalho, nem já se afigurando possível vir a fazer essa prova, deveria o douto Tribunal a quo, por analogia com o disposto no Art. 566.º n.º 3 do C.C., julgar qual o valor devido, dentro dos limites que tiver por provados, fixando a remuneração devida de forma equitativa, o que com o devido respeito se entende que não fez.».
O Autor apresentou resposta, com as seguintes conclusões:
«A – Veio a R. apresentar as suas Alegações de Recurso, alegando que o Tribunal a quo veria ter (a) julgado verificada a excepção dilatória de uso indevido de Requerimento de Injunção; (b) Absolvido a R. da instância por falta de interesse processual activo do A.; e (c) considerado não ter sido apurado e provado pelo A. o número total de horas despendidas na concretização de cada tarefa.
B - O processo é regular não se verificando qualquer erro ou nulidade quanto à forma de
processo, pois i) o acordo prévio quanto aos honorários não é elemento essencial de legitimidade no recurso ao procedimento de injunção; ii) no entanto, houve, efectivamente, acordo prévio quanto à fixação dos honorários e estamos perante uma obrigação pecuniária, emergente de um contrato não superior ao montante de 15.000,00€; iii) mesmo que não tivesse havido acordo prévio e se considerasse verificado um vício quanto ao recurso ao procedimento de injunção, este vício não teria como consequência a absolvição da instância do réu mas sim a repetição dos actos necessários para que o processo se ajuste àquela forma; iv) o processo assegurou todas as garantias processuais de defesa à R. pelo que não se verificaria necessário repetir quaisquer actos.
C – As partes acordaram que a R. havia procurado o A. para a prestação de serviços jurídicos, pelo que não restam dúvidas de que o A. tem interesse processual activo;
D – A invocação de uma alegada relação profissional entre a R. e uma terceira entidade não foi invocada em primeira instância pelo que não pode ser objecto deste recurso, sob pena de violação do princípio da concentração da defesa.
E – A argumentação e conclusões vertidas no ponto VI das Alagações de Recurso da R., assentam no facto de que a Dra. BB é colaboradora do A., e que por isso é parte interessada, o que não corresponde à verdade, na medida em que não está evidenciado qualquer interesse directo da Dra. BB nesta demanda.
F - Tendo considerado o tribunal que a Dra. BB prestou um depoimento claro, isento e credível, e que esse depoimento foi determinante na formação da sua convicção sobre algumas das decisões sobre a matéria de facto, devem considerar-se improcedente o recurso quanto à decisão a respeito dos factos dados como provados n. 10.º, 14.º, 18.º e 20.º, mantendo-se a decisão do Tribunal a quo.».
Admitido o recurso e colhidos os vistos, cumpre decidir.
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Questões a decidir:
O objecto do recurso é definido pelas conclusões do recorrente (art.ºs 5.º, 635.º n.º3 e 639.º n.ºs 1 e 3, do CPC), para além do que é de conhecimento oficioso, e porque os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, ele é delimitado pelo conteúdo da decisão recorrida.
Importa, assim, saber no caso concreto:
- Se é de considerar que se verifica o uso indevido e inadequado do processo de injunção, sendo este motivo de recusa do requerimento injuntivo e, uma vez transmutado, face à oposição, em ação declarativa de condenação, ocorre erro na forma de processo com a consequente absolvição da Apelante da instância;
- Se ocorre a falta de interesse processual activo do Autor, o constitui um pressuposto processual relativo às partes, e a sua falta integra excepção dilatória inominada, de conhecimento oficioso, que conduz à absolvição da instância da ré;
- Se a prova permite alterar a resposta contida nos pontos 3º e 4º( estes apenas referidos no corpo das alegações, estando ausente a pretendida alteração nas conclusões, o que será abordado infra), 10º, 14º, 18º e 20º dos factos provados;
- Considerar o Laudo emitido pelo Conselho Superior da Ordem dos Advogados como meio de prova a apreciar livremente pelo Tribunal, pelo que não ficando demonstrado o número de horas despendido, fixar a remuneração devida de forma equitativa, nos termos do artº 566º nº 3 do CC.
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II. Fundamentação:
No Tribunal recorrido foram considerados provados os seguintes Factos:
1 – O Requerente é Advogado, tendo escritório na Rua 2.
2- A requerida exerce a actividade de compra e venda de bens imobiliários, consultadoria e promoção imobiliária.
3- No exercício da sua actividade, a Requerida contactou o Dr. AA, para a representar na resolução de algumas questões da sua vida societária, nomeadamente no que diz respeito ao relacionamento com a sociedade comercial “Spark Capital, Lda.”, detentora de 40% do seu capital social e concretamente na alteração da gerência e respectivo registo comercial.
4 – O contrato de Mandato aludido em 3-, tinha assim por escopo a prestação de diversos serviços jurídicos, sendo o primeiro deles, a alteração da gerência da Ré de forma a CC passar a figurar como única gerente, em substituição da anterior.
5- Em 31.3.2020, o A. remeteu uma primeira proposta de honorários, na qual consta que, para a execução de todos os actos legais necessários à mudança de gerência (o que inclui: preparação da carta de renuncia da actual gerente; registo comercial da renuncia; preparação da Assembleia Geral e respectiva Acta de nomeação de nova gerente, registo comercial da nomeação de nova gerente, apoio na possível mudança de sede da requerida e respectivo registo comercial, e apoio na possível mudança de TOC), propõe a quantia de € 1500,00 de honorários (até um máximo de 11 horas de trabalho), quantia essa estimada face à experiencia em assuntos similares e de acordo com o tempo e esforço normalmente requeridos para o efeito, esclarecendo ainda que a tal quantia acresce o IVA devido e não inclui despesas.
6- Perante a solicitação da requerida em fixar os honorários devidos na referida quantia de € 1500,00, foi pelo Autor explicado, através de e-mail datado de 8.4.2020, que: “Relativamente ao tema da alteração da proposta, reitero o que lhe transmiti na nossa conferencia telefónica de ontem, de que não podemos fixar o valor nos 1500,00€ acrescido de IVA para este serviço, pois não sabemos se vai ou não haver resistência dos sócios portugueses à transferência de domínio sobre a sociedade…”
7- Em 15.4.2020, a requerida procedeu ao pagamento da quantia de € 1500,00.
8- Após o pagamento referido em 7-, o A. afirmou em e-mail de 16.4.2020 que: “Iremos de imediato proceder ao início dos trabalhos.”
9- Em 18.4.2020, o A. executou as tarefas de “notificação à mandatária anterior. Análise das renuncias às procurações anteriores”.
10- Relativamente a este dossier de alteração de gerência, o A. e a sua colaboradora Dra. BB executaram diversas diligencias junto dos sócios da requerida e de entidades oficiais, tendo despendido um total de 21h.50m., na concretização de tal tarefa, total ao qual deve ser abatido as 11 horas já pagas, nos termos referidos em 5- a 7-.
11- Em 28.5.2020, foi registada a alteração de gerência da requerida.
12- Concomitante ao serviço em curso supramencionado, a Requerida solicitou proposta para a prestação de serviços de advocacia num outro assunto relacionado com a aquisição de um imóvel sito na Localização 1 em Lisboa.
13- Em resposta, o A. apresentou a proposta de honorários datada de 20.5.2020, junta como documento nº 3 com a oposição, cujo teor se dá aqui por reproduzido.
14- No âmbito do acompanhamento deste processo de aquisição de um imóvel sito na Localização 1, designadamente negociações com os vendedores e elaboração de um CPCV, o Requerente despendeu com tal serviço, 15h20m.
15 - O CPCV referido em 14- não foi formalizado por razões não apuradas.
16- A Requerida solicitou também proposta para prestação de serviços de advocacia num assunto relacionado com a alteração da titularidade da conta bancária da requerida e elaboração de acta de Assembleia Geral, para a remuneração da nova gerente.
17- Á solicitação referida em 16-, o A. apresentou a proposta de honorários junta como documento nº 4 com a oposição , datada de 29.5.2020, na qual refere que, para os dois assuntos mencionados em 16-, propõe a quantia de € 900,00, acrescidos de IVA e excluindo despesas.
18- A requerida, através de CC nomeada gerente da mesma, solicitou ainda ao Requerente, em data anterior a 15.6.2020, a realização de uma cessão de quotas, de forma a retirar da sociedade os antigos sócios, com quem se encontrava em conflito, trabalhos que decorreram entre 15.6. e 17.6, tendo o Requerente despendido 12h14m em tal serviço.
19- Em 16/7/2020, o Requerente despendeu 1h25m em conferencia telefónica com o novo advogado da Sra. Z… para passagem dos dossiers pendentes da cliente, ora Ré.
20- Os serviços pedidos pela requerida foram assim divididos pelo A., em diferentes dossiers, por tratarem de assuntos diversos, a saber , “alterações à gerência”, já referido em 10-, “CPCV do imóvel sito na Localização 1”, já referido em 14-, procedimentos para cessão de quotas, já referido em 18-, e por fim, um dossier geral (que incluía outros assuntos, como a actualização do Registo de Beneficiários Efectivos, o acompanhamento da auditoria interna às contas da sociedade e da elaboração de um Relatório Financeiro e ainda os aludidos em 16-), constando também nesse dossier , a discriminação de todas as diligencias realizadas e contactos havidos com a nova gerente da requerida, os seus sócios, o Banco onde a requerida tinha a sua conta sediada e terceiros, a fim de resolver os assuntos pendentes, dossier esse relativamente ao qual se encontra registado um total de 37 horas de trabalho.
21- Para realização de todos estes serviços, o Requerente e a sua colaboradora, Dr.ª BB, analisaram e elaboraram documentos, prepararam e submeteram registos, reuniram com a Srª. CC, nova gerente da Requerida, realizaram contactos telefónicos e via e-mail com a mesma, e ainda com a SPARK CAPITAL, Lda, então sócia da Requerida, conforme consta discriminado na Nota de Honorários nº 164/2020 emitida em 21.8.2020 e junta aos autos em julgamento.
22- Devido às dificuldades de comunicação entre a Requerida e o Requerente, resultantes da incapacidade da Requerida de falar ou compreender o Português ou o Inglês e à incapacidade do Requerente de falar ou compreender o Mandarim, os contactos foram sempre bastante mais demorados do que o que seria de esperar, sendo sempre necessária a intervenção do Sr. DD como intérprete/tradutor.
23- A prestação de serviços acima relatada findou a 15.7.2020, por iniciativa da requerida.
24- A 8 de Julho de 2020, foi emitida Nota de honorários 131/2020, no valor de € 150,00 (+ € 34,50 de IVA), referente a serviços de alteração no RCBE.
25- A 21 de Agosto de 2020, foi emitida Nota de honorários 164/2020, no valor de € 11.311,46 (+ € 2.946,64 de IVA), referente aos restantes serviços prestados pelo A., supra discriminados em 20-, nota essa na qual foi atendido o pagamento realizado pela requerida de € 1500,00, acima mencionado em 7- e 10-.
26- A requerida tomou conhecimento de tal Nota de Honorários em data não apurada, anterior a 10.10.2020, tendo respondido nos termos dos docs. 7 e 8 juntos com a contestação.
27- A requerida não pagou as Notas de Honorários referidas em 24 e 25.
28- A requerida, para além do pagamento referido em 7-, pagou ainda as quantias de 565,00 e de 735,00, respectivamente, em 2.6.2020 e em 22.6.2020.
*
Foram considerados como não provados os seguintes factos:
a)- A Requerida foi interpelada para pagamento da NH131/2020, por carta registada datada de 11 de Dezembro de 2020, à qual o Requerente não obteve qualquer resposta.
b)- A Requerida foi novamente interpelada para pagamento da NH131/2020, através de carta registada datada de 05 de Março de 2021.
c)- A Requerida foi também interpelada para pagamento da NH164/2020, por carta registada datada de 05 de Março de 2021.
d)- A estas últimas interpelações a Requerida respondeu por carta de 15 de Março de 2021, afirmando “não lhe poderem ser imputados quaisquer honorários ou despesas além dos que já foram liquidados”.
e)- O A. suportou custos de € 250,00 para cobrança da presente dívida , até à data de apresentação da injunção.
f)- Foram acordados entre as partes, os valores por hora de € 136,36 e de € 150,00 para pagamento de honorários, valores esses constantes das Notas de Honorários supra mencionadas.
g) foi acordado um valor fixo de honorários de 1500,00 € para os serviços de transferência de gerência e conclusão de alteração do Registo Comercial, sendo estipulado este limite de honorários e acordado que no caso de haver valores adicionais necessários, seria necessário obter o consentimento da Requerida com antecedência.
h) no início da relação, os contactos foram estabelecidos com o Requerente e foram os seus serviços que foram contratados, sendo que a partir de determinado momento, a Requerida viu o Requerente ser substituído pela sua colaboradora, a Dra. BB, o que desde cedo criou alguns problemas, e constitui uma alteração do mandato.
i)os esclarecimentos pedidos eram prestados pela colaboradora e não pelo Requerente, o que violou o acordo de prestação de serviços e comprometeu definitivamente os serviços contratados.
j) a Dra. BB, talvez por alguma inexperiência, “deixava-se levar” pelos mandatários da sócia Spark Capital , Lda. , comprometendo a representação adequada da Requerida e não defendendo os seus interesses.
l) tal situação teve enorme peso, quando na Assembleia Geral da sociedade, realizada a 27 de maio de 2020, a Requerida não viu os seus interesses defendidos, nomeadamente levando a Sra. CC e demais sócios chineses a aceitar que não efectuariam quaisquer movimentos bancários quando existiam inúmeras situações pendentes e o que veio a penalizar grandemente a Requerida.
m) uma vez que a Dra. BB negociou e apresentou propostas à gerente da Requerida que nunca defenderam os seus interesses e que inclusivamente a faziam aceitar a inclusão na contabilidade de 3 faturas no valor total de 111.600,00 €, pagas indevidamente a entidades sediadas em paraísos fiscais e relativas a hipotéticos serviços de marketing que na realidade não existiram, situação que agora levou à origem do processo judicial nº 9766/20.0T9LSB que corre termos no DIAP – 3ª Sessão de Lisboa, o que por si só, , acarreta avultadíssimos prejuízos para a Requerida.
n) a Requerida foi amplamente prejudicada em muitas dezenas de milhares de euros, pela má gestão das negociações de um negócio de compra e venda de um imóvel sito na sito em Avenida 1,Lisboa, sendo que a minuta do Contrato-Promessa de Compra e venda nunca foi alterada conforme as instruções da Requerida, e o negócio veio a fracassar devido à inabilidade profissional da colaboradora do Requerente , ou ainda o processo de actualização do RCBE - Registo Central de Beneficiário Efectivo da Requerida, que demorou semanas a ser resolvido e que impediu o acesso da gerente da Requerida à conta bancária.
o) o pagamento do mandato foi acordado mediante um valor correspondente a uma ou várias tarefas concluídas com sucesso, o que não sucedeu.
p) o custo adicional de 735,00 €, pago pela Requerida, correspondia ao valor pedido pelo Requerente pelas questões sobre investimentos de acionistas, peculato e distribuição de lucros e a análise dos números financeiros com o auditor, ficando portanto, pago totalmente por todo o mandato.
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Da impugnação da decisão de matéria de facto:
A recorrente a par das alterações do contido nos pontos 10, 14, 18 e 20, devidamente invocados no âmbito das suas conclusões, veio em sede de alegada falta de interesse em agir do Autor requerer a alteração dos pontos 3 e 4, por forma a constar dos mesmos que:
3- No exercício da sua atividade, a Requerida contactou a sociedade de advogados denominada EE, na pessoa do Dr . AA, na qual é sócio, para a resolução de algumas questões da sua vida societária, nomeadamente no que diz respeito ao relacionamento com a sociedade comercial “Spark Capital, Lda.”, detentora de 40% do seu capital social e concretamente na alteração da gerência e respetivo registo comercial.
4 - O contrato de Mandato aludido em 3-, tinha assim por escopo a prestação de diversos serviços jurídicos, sendo o primeiro deles, a alteração da gerência da Ré de forma a CC passar a figurar como única gerente, em substituição da anterior, serviços que foram adstritos e desempenhados por equipas de advogados do aludido escritório. Concluindo, de forma a sustentar a excepção dilatória cujo conhecimento solicita em sede de recurso, que resulta inequivocamente que os serviços em causa nos presentes autos não foram prestados à Apelante pelo Apelado a título de prática individual, mas sim pela sociedade de advogados da qual é sócio em que se encontra inserido.
Ora, como deixámos aludido o objecto do recurso é definido pelas conclusões do recorrente, estando omisso das mesmas tal pretensão. Acresce que como refere Abrantes Geraldes ( in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª Ed., Almedina, 2017, pp. 158-159): «A rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto deve verificar-se em algumas das seguintes situações: a) Falta de conclusão sobre a impugnação da decisão da matéria de facto (arts. 635.º, n.º 4, e 641.º, n.º 2, al. b)); b) Falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados (art. 640.º, n.º 1, al. a));c) Falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.); d) Falta de indicação exacta, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda; e) Falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação».
Donde, falhará desde logo a indicação adjectiva eficaz para que se conheça de tal alteração. No entanto, sempre cumprirá referir que a prova do ponto 3 advém da confissão da ré, tal como se refere na sentença, face à aceitação do mesmo no seu ponto 16 e o previsto no artº 574º nº 2 do Código de Processo Civil. E o ponto 4 tem como pressuposto o aludido no mesmo ponto 3, sendo de todo irrelevante a parte cujo aditamento (a itálico) ora se pretende.
Mantêm-se, assim, inalterados os pontos 3 e 4.
No mais, além das normas adjectivas que decorrem do artº 640º do Código de Processo Civil, a alteração tem na sua base o princípio da liberdade de julgamento ou da livre convicção, face ao qual o tribunal aprecia livremente as provas, sem qualquer grau de hierarquização e fixa a matéria de facto em sintonia com a convicção firmada acerca de cada facto controvertido, tendo porém presente o princípio a observar em casos de dúvida, consagrado no artigo 414º do C.P.C., de que a «dúvida sobre a realidade de um facto e sobre a repartição do ónus da prova resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita». Conforme é realçado por Ana Luísa Geraldes («Impugnação», in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor José Lebre de Freitas, Vol. I. Coimbra, 2013, pág. 609 e 610), em «caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela 1ª instância, em observância dos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte». E mais à frente remata: «O que o controlo de facto em sede de recurso não pode fazer é, sem mais, e infundadamente, aniquilar a livre apreciação da prova do julgador construída dialecticamente na base dos referidos princípios da imediação e da oralidade.»
Assim, apesar de se garantir um duplo grau de jurisdição, tal deve ser enquadrado com o princípio da livre apreciação da prova pelo julgador, previsto no artº 607 nº 5 do C. P. Civil, sendo certo que decorrendo a produção de prova perante o juiz de 1ª instância, este beneficia dos princípios da oralidade e da mediação, a que o tribunal de recurso não pode já recorrer.
De acordo com Miguel Teixeira de Sousa, in “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, pág. 347, “Algumas das provas que permitem o julgamento da matéria de facto controvertida e a generalidade daquelas que são produzidas na audiência final (…) estão sujeitas à livre apreciação do Tribunal (…) Esta apreciação baseia-se na prudente convicção do Tribunal sobre a prova produzida (art.º 655.º, n.º1), ou seja, as regras da ciência e do raciocínio e em máximas da experiência”.
Donde, para que a decisão da 1ª instância seja alterada haverá que averiguar se algo de “anormal” se passou na formação dessa apontada “convicção”, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção do julgador de 1ª instância, retratada nas respostas que se deram aos factos, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, ou com outros factos que deu como assentes.
Porém, e apesar da apreciação em primeira instância construída com recurso à imediação e oralidade, tal não impede a «Relação de formar a sua própria convicção, no gozo pleno do princípio da livre apreciação das provas, tal como a 1ª instância, sem estar de modo algum limitada pela convicção que serviu de base à decisão recorrida(…) Dito de outra forma, impõe-se à Relação que analise criticamente as provas indicadas em fundamento da impugnação, de modo a apreciar a sua convicção autónoma, que deve ser devidamente fundamentada» (Luís Filipe Sousa, Prova Testemunhal, Alm. 2013, pág. 389).
Importa ainda ter presente que caso a recorrente impugne determinados pontos da matéria de facto, mas não impugne outros pontos da mesma matéria, estes não poderão ser alterados, sob pena de a decisão da Relação ficar a padecer de nulidade, nos termos do art. 615.º, n.º 1, al. d), 2ª parte, do C.P.C. É, assim, dentro destes limites objectivos que o art. 662.º do C.P.C. atribui à Relação competências vinculadas de exercício oficioso quanto aos termos em que pode ser feita a alteração da matéria de facto, o mesmo é dizer, quanto ao modus operandi de tal alteração. Por outro lado, não se deverá proceder à reapreciação da matéria de facto quando os factos objecto de impugnação não forem susceptíveis, face às circunstâncias próprias do caso em apreciação, de ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe ser inútil, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processuais (arts. 2º, nº 1, 137º e 138º, todos do C.P.C.)
Feito este enquadramento, haverá que aferir quais os pontos concretos que devem ser apreciados por este tribunal.
O recorrente pretende que se alterem os pontos 10., 14., 18. e 20., sendo que em todos os pontos se aludia especificamente a um número de horas, pretendendo que ao invés de tal indicação, passasse a constar: no ponto 10. que “não tendo sido apurado e provado pelo A. o número total de horas despendido na concretização de tal tarefa”; no ponto 14. Que “o Requerente não fez prova do tempo que despendeu com tal serviço”; no ponto 18. que “nada se provando quanto à duração de tais serviços”; e no ponto 20. “tal duração não foi provada”.
Entende que a resposta especificamente quanto à horas contidas em tais pontos não pode ter por base o depoimento da testemunha BB, pois entende que a mesma é “colaboradora” e “subordinada” do Apelado, por ser advogada associada do escritório de Advogados em que o Apelado é sócio, como associada do escritório em que este é sócio, mas não tendo autonomia por si só para desenvolver conversações individuais com a legal representante da Apelante, como se verifica e declarou no seu depoimento. Mas reconhecendo que o seu conhecimento dos factos lhe advém dos serviços que executou por conta do escritório, na sua condição de Advogada associada, o que, inquestionavelmente terá de ter, e tem, interesse directo no desfecho da causa. Mais dizendo que tal depoimento mais não é do que uma verdadeira “declaração de parte”, não existindo suficiente segurança para se aceitar e dar por provado a prestação dos serviços e sua duração como consta da Nota de Honorários entregue em sede de audiência.
Ouvido tal depoimento, a testemunha BB, explicou de que forma tinha conhecimento dos actos praticados a pedido da ré pelo Autor, pois exerce funções no escritório desde 2014, nunca tendo, porém, sido mandatária neste caso. Explicou como ocorreu o contacto e a aceitação do serviço, pretendendo a ré uma fixação prévia de valor, mas seguidamente invocava outros serviços que pretendia (deu o exemplo de uma acta, mas se seguida exigia reuniões para a resolução de questões). Confrontada com um email de 8/04/2020, afirmando ser do conhecimento da ré o teor do mesmo, pois o destinatário do email estava sempre presente com a legal representante, dado que servia de interprete (falava português).
Logo, confirmou o teor do ponto 6. do qual resulta afastado a fixação prévia de um valor de honorários, não tendo sido impugnado em sede de recurso tal facto.
A testemunha foi peremptória em afirmar que o serviço era solicitado, mas sempre a ré invocava outras questões que implicavam outras informações e serviços, sem que pretenda que tal seja cobrado, alongando-se sempre no número de horas que dedicavam à legal representante da ré na resolução das suas questões ou dúvidas. Explicou os vários actos praticados e a dificuldade que advinha face ás solicitações constante da ré, bem como a complexidade que existia nas questões. O depoimento foi prestado de forma minuciosa quanto a todas as questões tratadas e de que forma, evidenciando o número de horas exigidas em tais tarefas, explicando que a singeleza que parecem inculcar os assuntos não se reflectia na prática. Deste modo somos em corroborar a motivação contida na sentença quanto refere que “Os factos provados 9- e 10- resultaram da análise da Nota de Honorários datada de 22.8.2020, junta pelo A. em julgamento, sendo o facto 9- correspondente à menção de execução da 1ª tarefa pelo A., em termos de data e conteúdo. Quanto ao facto 10-, atendeu-se ainda ao depoimento da testemunha BB que revelou conhecimento directo dos factos sobre que depôs, por ter tido intervenção directa nos mesmos, tendo prestado declarações claras e integralmente conciliáveis com o teor da Nota sob análise. Saliente-se ainda, quanto à parte final do facto 10-, que se trata de um silogismo lógico atendendo à factualidade dada como provada em 5- e 7- e à circunstancia da Nota de Honorários em causa, contabilizar as horas desde o inicio dos trabalhos por parte do A.. O facto provado 14- decorre da análise crítica e pormenorizada da Nota de Honorários, junta em audiência de julgamento. Quanto ao facto 18-, o mesmo decorre da análise crítica e comparativa do teor da Nota de Honorários de 22.8.2020, junta em julgamento, que foi conjugado com o depoimento da testemunha BB que apresentou declarações objectivas e pormenorizadas sobre tal segmento fáctico.
Os factos 20- e 21- resultaram , não só da análise da Nota de honorários acima referida, mas também das declarações explicativas e pormenorizadas prestadas pela testemunha BB, as quais foram conjugadas com a restante factualidade apurada, referente às solicitações da Ré, sendo que a legal representante da R., em sede de declarações de parte, também aludiu a tal factualidade, apesar de o ter feito de forma insipiente e parcial, tentando desvalorizar o trabalho do A. e da sua colaboradora.”.
Acresce que não se vislumbra qualquer subalternidade da testemunha em relação ao apelado, sendo que tal afirmação é contrária ao afirmado pela apelante que afinal a testemunha tem interesse na causa, por ser advogada do mesmo escritório. Com efeito, a testemunha trabalha com o Autor no mesmo escritório, porém, os honorários são devidos a este, como resulta manifesto da nota de honorários, pelo que em nada beneficiam a testemunha. Porém, outra ordem de razão determinaria desde logo a improcedência, e esta prende-se com a forma como a recorrente pretende que se considere a alteração, prendendo que conste dos factos “não provado” o número de horas, sem indicar que número entende que resulta da prova, ou sequer o que determina que se considere que esse número é excessivo. Ora, por lado, não pode pretender que tal excesso resulta do laudo, pois este foi elaborado após a fixação dos factos e não como fundamento destes. Por outro lado, a resposta factual como sendo de “não provado”, constitui um non liquet, que estará sempre afastado das decisões. Pois, a obrigação de julgar a causa (proibição do non liquet), consagrada no artº 3º, nº 3 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, com expressão no artº 152º, nº 1 do CPC, impõe ao juiz que administre justiça e nessa administração impõe-lhe a análise da prova e a enunciação dos factos que resulte da mesma, mas nesta tarefa não pode considerar no facto que não existiu prova, mas sim tirar as consequências de tal circunstância, tendo por base o ónus de prova ou o previsto no artº 414º do Código de Processo Civil. No caso, a prova impõe sim que se mantenham os factos tal como foram considerados, pois nada nos autos nos permite pôr em causa a credibilidade da testemunha, nem a resposta contrária ou diferenciada resulta de qualquer outra prova.
Improcede, deste modo, o recurso, nesta parte.
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III. O Direito:
Consolidados os factos a subsumir ao direito, importará apreciar as questões suscitadas em sede de recurso, as primeiras relativas às excepções invocadas apenas em sede de recurso: a falta de interesse do Autor, e o uso indevido do processo injuntivo.
Quanto ao primeiro argumento recursório, entende a recorrente na sua conclusão H. que “(q)uanto à legitimidade activa do Apelado, como alegado na motivação, é manifesto, por não demonstrado, que carece o Apelado de interesse processual activo, o constitui um pressuposto processual relativo às partes, e a sua falta integra excepção dilatória inominada, de conhecimento oficioso, que conduz à absolvição da instância, cfr. al. e), do nº1, do art. 278º, nº2, do art. 576º, art. 577º e art. 578º, todos do CPC, o que se requer.”.
Manifestamente não lhe assiste razão, pois não há que olvidar que a apelante não impugnou o que resulta dos pontos 3. e 4. e dos quais advém que a ré contratou os serviços do Autor, e que foi celebrado um “contrato de mandato”. Pelo que sem necessidade de maior análise não se verifica qualquer excepção dilatória nos termos enunciados.
No que concerne à excepção dilatória de uso indevido de Requerimento de Injunção, que a apelante acaba por apelidar de erro na forma de processo. Não há que olvidar que tal procedimento injuntivo foi transmutado em acção comum, pelo que a existir erro nos termos pretendido o mesmo deixou de existir. Mas mesmo que se entendesse existir tal vício a verificação do mesmo não tem como consequência a absolvição da instância do réu, pois o Art. 193º do Código de Processo Civil determina que se mande observar a forma correcta, repetindo-se os actos necessários para que o processo se ajuste àquela forma, o que neste caso não se verifica, pois, os autos seguiram a forma correcta, de processo comum.
Outrossim, o Acórdão convocado pelo apelado – Ac. da RP proferido no proc. nº7271/20.4YIPRT.P1, a 24/05/2021-decide de forma contrária à posição assumida pela apelante, concluindo-se sim que: “Pode lançar mão do processo de injunção, tendo por base a nota de despesas e honorários que enviou à requerida, o requerente que pretende exigir o pagamento de determinada quantia em dinheiro devida pelo cumprimento de mandato judicial acordado com aquela, pois em causa está o cumprimento de uma obrigação pecuniária emergente de um contrato celebrado entre as partes.”. Bem como no sentido supra referido: “O erro na forma do processo é uma nulidade processual, não se tratando da exceção dilatória prevista no art. 577.º b) CPC, nem conduzindo, por isso, à absolvição da instância.”.
Desta forma, improcedem tais argumentos processuais invocados em sede de recurso.
Resta analisar o mérito do recurso.
Não é posto em causa pelas partes nos autos ou neste recurso (ainda que apelante tenha argumentado nos termos supra aludidos quanto à identidade do mandatário, mas sem sucesso) a identificação do contrato como sendo de prestação de serviços jurídicos por parte do A..
É elemento essencial do contrato de mandato, tal como o define o art. 1157º do Código Civil, que o mandatário esteja obrigado, por força do contrato, à prática de um ou mais actos jurídicos. “Normalmente, os actos praticados pelo mandatário, em consequência do mandato, são negócios jurídicos” (Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, vol. II, 3.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 1986, pg. 706). “Mas podem não o ser; podem ser simples actos jurídicos (cfr. art. 295.º)» (ibidem). Temos, pois, que - como bem observa Manuel Januário Gomes, in Contrato de Mandato, Direito das Obrigações, 3.º vol., Contratos em Especial, Lex, Lisboa, 1991, pg. 276) -, “quer os actos jurídicos stricto sensu, quer os negócios jurídicos - figuras em que se desdobra o acto jurídico - podem ser objecto de mandato, estando definitivamente afastada a doutrina que circunscrevia os actos jurídicos, objecto de mandato, aos actos negociais”.
Por outro lado, «a circunstância de o mandatário ficar adstrito à prática de actos jurídicos não significa que não possa - ou que não deva - praticar actos materiais; essencial é que estes se encontrem numa relação de acessoriedade ou dependência em relação aos primeiros porque, a não ser assim, haveria a descaracterização da operação de mandato no seu conjunto, que passaria a ser uma relação de cooperação de outro tipo” (A. e ob. ultim. cit., pg. 277). Com efeito, como diz Galvão Telles (citado por Pires de Lima e Antunes Varela in Código Civil Anotado, vol. II, 3ª ed., p. 707).
O mandato, que constitui, como se viu, uma modalidade dentro dos contratos de prestação de serviços, é disciplinado pelos arts. 1157º a 1184º do Cód. Civil.
O autor reclama o pagamento de uma determinada quantia pela actuação que teve enquanto mandatário.
Ora, muito embora o mandato se presuma gratuito (1ª parte do n.º 1 do art. 1158.º do Código Civil, doravante CC), quando ele tem por objecto actos que o mandatário pratica por profissão, a lei (na 2.ª parte do cit. n.º1 do art. 1158.º), pelo contrário, estabelece uma presunção de onerosidade. No caso decidendo, a ré não discute o caracter oneroso do mandato, mas sim o que determinou a fixação dos montanes peticionados.
Como bem se afirma na sentença recorrida “Constitui obrigação fundamental do mandatário a prática de actos compreendidos no mandato, segundo instruções do mandante, e dever correlativo deste o pagamento da retribuição que ao caso competir, a prestação de provisão por conta desta e o reembolso das despesas efectuadas [artigos 1161º, alínea a), e 1167º, alíneas b) e c), do Código Civil].
Ou seja, numa acção que tenha por objecto os honorários devidos ao advogado pelo exercício do mandato forense (como é o caso destes autos), compete-lhe fazer prova, desde logo, da existência do mandato e da existência de acordo sobre o valor dos honorários e, na falta desse acordo, ou da prova dele, recai ainda sobre o autor o ónus de demonstrar todos os factos relevantes para uma adequada concretização e densificação dos critérios legais de fixação desses mesmos honorários (cf. neste sentido, Acs. STJ de 24.4.2011 e de RC de 20.6.2012, ambos disponíveis in www.dgsi.pt ).
Assim, no caso em apreço, e como acima já se referiu, cabia ao A. provar a prestação de serviços jurídicos realizada a pedido da ré e a existência de acordo quanto ao valor dos honorários devidos por tal trabalho intelectual.
Tendo em conta o ónus de prova que incumbia à A., acima delimitado, pode-se desde já afirmar que o A. logrou apenas provar a existência do mandato mas não de um acordo quanto ao valor global dos honorários, nem sequer quanto ao valor/hora a cobrar –cf. al.f) dos Factos não provados-
Saliente-se que se tem entendido que o acordo prévio sobre honorários de advogado está sujeito à forma escrita, e a redução a escrito desse acordo constitui uma “formalidade ad substantiam”, razão pela qual o mesmo só pode provar-se por meio de documento ou por meio de prova de valor superior , nomeadamente confissão (cf. Ac. RL de 15.12.2020 e demais jurisprudência aí citada, disponível in www.dgsi.pt ), o que não ocorreu no caso em apreço, para além da factualidade vertida em 5- a 18-.
No caso, não se tendo apurado que tenham sido convencionados os honorários devidos pela ré, e atenta a discordância com o valor de honorários pedidos, por parte da ré, o tribunal optou por sujeitar a questão à apreciação da Ordem dos Advogados.
No parecer aprovado por Acórdão do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, junto aos autos, considerou-se que:
- o valor hora de € 150,00 a título de honorários é razoável, tendo em conta os critérios legais a ponderar;
- considerando os assuntos tratados e mesmo tendo em conta a dificuldade de comunicação com a gerente da ré, o numero de horas registado como tendo sido despendido é exagerado;
- o tempo despendido com a passagem de informações ao novo mandatário não deve ser cobrado;
- concluindo que o valor de honorários correspondentes aos serviços prestados deve ser fixado em € 8.060,00.
Refira-se que o laudo da Ordem dos Advogados constitui um parecer sujeito à livre apreciação do julgador.
Sujeito esse laudo ao geral e comum princípio da livre apreciação do tribunal (artigos.389º do Código Civil, 611º e 655º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil), não pode negar-se-lhe o valor informativo, nem, de todo o modo, arredar-se o respeito e atenção que deve merecer, dada a especial qualificação de quem o emite.
Tal entidade também entendeu que não deve ser concedido laudo favorável às Notas de Honorários apresentadas, pelo valor de € 150,00 e de € 11.311,46 (+ IVA), mas já o seria pelo valor de € 8060,00, acrescidos do IVA devido.
É verdade que o laudo carece de força vinculativa já que reveste a natureza de mero “parecer técnico e juízo sobre a qualificação e valorização dos serviços prestados pelos advogados” (cfr. artigo 2º do Regulamento dos Laudos de Honorários).
Deve, assim, ser considerado como um parecer - peça escrita, sem eficácia probatória, cuja função útil é a de poder contribuir para esclarecer o julgador (neste sentido, Acórdão da Relação do Porto de 28.11.2002, disponível in www.dgsi.pt).
Os laudos do Conselho Geral da Ordem dos Advogados sobre honorários são elaborados por profissionais do mesmo ramo de actividade do agente cujos serviços prestados se pretendeu quantificar sob o ponto de vista económico, e é manifesto que ninguém melhor do que os seus subscritores têm conhecimentos técnicos susceptíveis de permitir aferir, com um elevado grau de precisão, o valor económico àqueles correspondente (cf. , neste sentido, Ac.RL de 15.12.2020, já supra citado, e ainda os mais recentes Acs.RE de 9.2.2023 e da RP de 12.4.2021, também disponíveis in www.dgsi.pt)
Analisado o Laudo e bem assim atendendo à factualidade provada, verifica-se que o mesmo analisa os contornos do caso concretamente apurado e aplica-lhe os critérios legais de fixação de honorários, inexistindo pois qualquer razão para afastar tal juízo pericial.
Na verdade, o A. não logrou provar a prestação de serviços, nos termos constantes na descrição da Nota de Honorários, designadamente quanto ao numero de horas registadas e cobradas em relação a cada dossier. Aliás, a metodologia utilizada na sua elaboração não é clara, nem rigorosa, nomeadamente no que se refere à descrição das tarefas realizadas em relação a cada dossier, justificativas do numero de horas cobrado, podendo assim dar azo a diferentes interpretações, face ao caracter genérico e vago daquela descrição, que engloba (ou pode englobar) diferentes dossiers/assuntos distintos.
Assim, considerando, que, por um lado, não foram atingidos os objectivos pretendidos pela cliente ora ré em alguns dos dossiers (aquisição de um prédio e cessão de quotas) e , por outro lado, atendendo ao teor do Laudo emitido sobre o trabalho efectivamente realizado pelo A., advogado com escritório em Lisboa, comarca de grande dimensão, sendo suposto existir prática de praxe do foro de honorários pautados em padrões elevados, conclui-se que inexiste fundamento para discordar da orientação avançada pelo parecer aprovado pelo acórdão do Conselho Superior da Ordem Dos Advogados, pelo que se entende como justo e adequado fixar a título de honorários devidos pela Ré ao Autor, a quantia de € 8.060,00 (+IVA), montante este que se encontra já parcialmente liquidado por força dos pagamentos dados como provados em 7- e 28- (no valor global de € 2800,00).”.
Insurge-se a recorrente argumentado que o Tribunal a quo, ao solicitar tal parecer técnico, fê-lo incidir sobre os factos que havia dado como provados, isto é, a emissão do Laudo, partiu do pressuposto de que os serviços e comunicações referenciados na nota de honorários, como tendo sido todos efectivamente prestados, bem como importaram no dispêndio das horas constantes nos respectivos factos dados como provados, o que necessariamente limita e condiciona a análise a efectuar.
Neste ponto não lhe assiste razão, pois não almejou a recorrente alterar os factos a subsumir ao direito.
Acresce que é no laudo que se opera já uma redução, tal como consta da motivação da sentença supra transcrita. Arguiu ainda que o laudo não distingue o trabalho intelectual complexo que geralmente caracteriza a actividade do advogado, do meramente administrativo, como o empregue no preenchimento de formulários de registo, ou outros de reduzida complexidade como é caso da generalidade das comunicações telefónicas e comunicações via e-mails, o que se verifica do ponto V.3 do Laudo, ao aplicar à horas ditas como despendidas o mesmo valor hora, não se devendo ou podendo remunerar pelo mesmo valor/hora o trabalho meramente administrativo, burocrático e comunicacional, no que também a douta Sentença não andou bem, ao decidir como decidiu. Por outro lado, conclui que o Laudo emitido pelo Conselho Superior da Ordem dos Advogados não tem um valor vinculativo e constitui meio de prova a apreciar livremente pelo Tribunal, uma prova pericial que deve ser valorada com os restantes elementos dos autos. Acabando por partir de um pressuposto errado – não ter ficado demonstrado o tempo despendido nesse trabalho – para concluir que deveria o Tribunal a quo, por analogia com o disposto no Art. 566.º n.º 3 do C.C., julgar qual o valor devido, dentro dos limites que tiver por provados, fixando a remuneração devida de forma equitativa.
Na verdade, resulta do artº 1158º nº 2 do CC, quanto aos honorários propriamente ditos, que sendo o mandato oneroso, quer por convenção, quer por presunção legal, a medida da retribuição é, em primeiro lugar, a que resultar do ajuste das partes. E na falta de ajuste, recorrer-se-á às tarifas profissionais; não havendo tarifas, ela é determinada pelos usos; não havendo usos, e como último recurso, por juízos de equidade. Quanto a este último critério, diz Jacinto Rodrigues Bastos, in ob. e vol. citt., pg. 269, que “se tiver de recorrer-se à equidade deverá ter-se em conta a qualidade do serviço prestado, o tempo que obrigou a despender-se com ele, e o resultado útil conseguido”.
Importa aludir ao decidido no Acórdão do STJ, de 11/05/2023 ( proc. nº552/07.4TVPRT.P2.S2, in www.dgsi.pt/jstj), ainda que reportada ao Estatuto da Ordem dos Advogados aprovado pela Lei nº 15/2005 de 26.01, vigorando actualmento o EOA aprovado pela Lei n.º 145/2015, de 09 de Setembro, aplicando-se acerca desta matéria o Artigo 105.º, mas que manda atender no seu nº 3 igualmente à importância dos serviços prestados, à dificuldade e urgência do assunto, ao grau de criatividade intelectual da sua prestação, ao resultado obtido, ao tempo despendido, às responsabilidades por ele assumidas e aos demais usos profissionais, expondo-se em tal aresto “Daqui resulta (…) que a lei, nomeadamente o EOA, não estabelece uma forma de matematicamente fixar os honorários do advogado, estabelecendo antes critérios referenciais de carácter deontológico. No pressuposto de que tais critérios são devidamente ponderados nos laudos pedidos à Ordem dos Advogados (…) vem a jurisprudência (…) atribuindo a esses laudos uma função orientadora, de valor informativo próprio de qualquer perícia ou de “parecer técnico”. (…) o que implica uma certa “discricionariedade”, no sentido civilístico, por parte do tribunal na fixação daqueles honorários. Cremos que, mais do que propriamente discricionariedade, do que se trata é da fixação dos honorários com recurso a critérios ou “juízos de equidade”, ao abrigo da referida regra geral do nº 2 do art.º 1158º do CC.”.
Logo, é tendo por base o disposto no artº 105º do EOA, mas igualmente com o princípio da boa fé, por o mesmo presidir a toda a relação contratual (artigo 762.º, n.º 2 do Código Civil), e, por conseguinte, também ao contrato de mandato, que se deve seguir neste caso. É certo que o artº 105º nº 3 do EOA encerra um conjunto de conceitos indeterminados que apenas em concreto podem ser operacionalizados, ou seja, em face dos concretos contornos da realidade provada nos autos. Mas apesar de assumirem natureza meramente indicativa, tais elementos não poderão deixar de ser tidos em consideração pelo julgador, no justo cálculo do montante de honorários.
É na análise de tais elementos e, frise-se, perante os factos já tidos em conta pelo Tribunal e que resultam inalterados nesta decisão, que o laudo conclui nos termos sobreditos.
Com efeito, a acção de honorários a Advogado implica, nos termos vistos, a emissão de um juízo com certa componente de discricionariedade já que, para além da ponderação dos Elementos do Estatuto, impõe-se que se considere o Laudo emitido pela Ordem dos Advogados e se considerem critérios de equidade. Porém, quanto ao laudo, ainda que sujeito ao princípio da livre apreciação do tribunal (arts. 389.º do CC e 611.º e 655.º, n.º1, ambos do Código de Processo Civil), não pode negar-se-lhe o valor informativo particular, dada a especial qualificação de quem o emite.
Considerando, por um lado, os factos dados como provados, mormente os que atinem à natureza, número e tipo das intervenções demonstradamente realizadas pelo autor, bem como os usos e costumes da comarca, nada nos permite afastar-nos do valor considerado pela 1ª instância, nem a apelante indica em concreto que item terá sido sobre valorizado em concreto no laudo, pois o número de horas considerado mantém-se inalterado.
É certo que tal como se alude em abundante jurisprudência, como aludimos, os laudos emitidos pelo Conselho Superior da Ordem dos Advogados não têm um valor vinculativo e constituem meios de prova a apreciar livremente pelo Tribunal. Porém, como contrapeso, a credibilidade que merece o laudo de honorários só deve ser posta em causa quando ocorram factos suficientemente fortes que abalem aquela credibilidade ( neste sentido Ac. da RG proferido no proc. nº974/14.4TBBRG.G1, datado de 11/02/2021, in www.dgsi.pt).
Somos em corroborar que em matéria de fixação de honorários a advogado, haverá sempre um espaço, um momento, de inevitável, discricionariedade, no sentido civilístico, que muito tem a ver com a boa fé que impregna toda a relação contratual e com os poderes do juiz, sendo o critério mais adequado a equidade, que tem a sua dinâmica na conjugação e interligação de todos os elementos relevantes disponíveis, à luz da experiência comum de vida, da realidade e razão das coisas, do justo equilíbrio e da serena ponderação e bom senso que o julgador usará com a larga margem de discricionariedade que a lei lhe confere.
Porém, sempre nestes elementos de ponderação podem ou não ser mais decisivo o tempo despendido, ora a apelante ao exigir que, por recurso à equidade, se fixem os honorários devidos ao autor em montante distinto do alcançado no aludido parecer ou laudo, tal não foi acompanhado com factos que pudessem retirar importância a tal critério. Como se sumariou no Acórdão desta Relação, no proc. nº 83436/18.3YIPRT-A.L1-7, de 15/12/2020 ( endereço da net a que vemos fazendo referência): iii. «A credibilidade que merece o laudo de honorários, só deve ser posta em causa quando ocorram factos suficientemente fortes que abalem aquela credibilidade.». Mais se dizendo que “(…) nas expressivas palavras do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15.4.2015, Oliveira Vasconcelos, 4538/09, «O laudo da Ordem dos Advogados está sujeito à livre apreciação do julgador. Para determinação do seu valor probatório não pode deixar de se tomar em conta que foi elaborado por profissionais do mesmo ramo de atividade, eleitos pela assembleia geral da mesma Ordem, o que faz pressupor que possuem elevados conhecimentos técnicos para aferir, sob o ponto de vista económico, sobre o montante dos honorários devidos. / A credibilidade que merece o laudo de honorários, só deve ser posta em causa quando ocorram factos suficientemente fortes que abalem aquela credibilidade» (bold nosso). No mesmo sentido, cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 13.2.2020, Tomé Carvalho, 4495/15”.
De tudo o exposto, à míngua de critérios que resultem dos factos e que afastem o que foi considerado no parecer, sendo que este já teve por base os factos provados, não há nos autos ( nem a apelante faz menção) do que permitiria a margem de discricionariedade que ao julgador é consentida, por forma a afastar o juízo contido no laudo e, logo decidir de form difente quanto ao valor fixado na 1ª Instância.
Improcede assim, a apelação.
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IV. Decisão:
Por todo o exposto, Acorda-se em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pela Ré e, consequentemente, mantém-se a decisão recorrida nos seus precisos termos.
Custas pela apelante.
Registe e notifique.

Lisboa, 9 de Outubro de 2025
Gabriela de Fátima Marques
Elsa Melo
Nuno Gonçalves