SUBSTABELECIMENTO
NOTIFICAÇÃO
DESPACHO SANEADOR
Sumário

SUMÁRIO.
Existindo três mandatárias a representar a parte, sendo uma delas substabelecida apenas para a representar na audiência prévia, o saneador sentença, que se seguiu a tal audiência, não tinha de ser notificado à mandatária com substabelecimento para intervir apenas na audiência, mas sim apenas a uma das outras duas mandatárias representantes da parte, não sendo necessário notificar as duas.

Texto Integral

Acordam na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa.
RELATÓRIO.

Por apenso à execução que o N…, SA intentou contra F… e FF… e contra V… e VV…, apresentando como título executivo um contrato de mútuo que celebrou em 8 de Novembro de 2000 com os dois primeiros executados na qualidade de mutuários e com os dois segundos executados na qualidade de fiadores, para pagamento da quantia certa no montante de 60 196,06 euros, correspondente a prestações não pagas desse contrato, veio o primeiro executado, F…, deduzir oposição à execução, alegando, em síntese, que não é verdade o alegado no requerimento executivo de que a partir de 8 de Fevereiro de 2016 os mutuários deixaram de pagar as prestações do empréstimo, pois estas têm sido sempre pagas sem queixas do banco mutuante e o contrato mantém-se em vigor.
Concluiu pedindo a extinção da execução.
O exequente contestou alegando, em síntese, que mantém o alegado no requerimento executivo, cabendo ao embargante o ónus de provar o pagamento, alegando ainda que foi comunicada a resolução do contrato de mútuo, sendo que, de qualquer forma, se assim não se entendesse, sempre se teriam de considerar vencidas todas as prestações por força do artigo 781º do CC.
Concluiu pedindo a improcedência dos embargos e o prosseguimento da execução.
Teve lugar a audiência prévia, onde se entendeu que os autos já continham os elementos necessários para decidir e se fixou prazo para as partes alegarem por escrito, o que ambas as parte fizeram, tendo o embargante, para além do mais, juntado documentos e formulado o pedido de condenação do embargado como litigante de má fé em multa e indemnização de 5 000,00 euros.
Após as alegações escritas foi proferido despacho que não admitiu os documentos juntos com as alegações do embargante, nem o pedido de condenação do embargado como litigante de má fé, a que se seguiu a sentença que julgou improcedente a oposição.
Interposto recurso pelo embargante da sentença e do despacho que não admitiu os documentos e não admitiu o pedido de condenação do embargado por litigância de má fé, veio a ser proferido acórdão nesta Relação de Lisboa que: 1) não admitiu o recurso do despacho que não admitiu os documentos, por intempestivo, determinando, porém, que os documentos não fossem desentranhados, pois já constavam no citius, 2) julgou procedente o recurso de não admissão do pedido de condenação do embargado como litigante de má fé, admitindo o mesmo e 3) anulou a sentença recorrida, determinando a remessa dos autos à 1ª instância para prosseguimento dos autos com a reabertura da audiência prévia a fim de convidar ambas as partes a aperfeiçoarem os respectivos articulados.
Remetidos os autos à 1ª instância, foi reaberta a audiência prévia que deu a palavra a cada uma das partes, convidando-as a alegar os factos indicados no acórdão da Relação, tendo ambas usado da palavra para se pronunciar.
Após, foi dada a palavra a cada um dos mandatários das partes sobre a possibilidade de decisão de mérito a ser proferida de imediato por escrito, em virtude de os autos já conterem todos os elementos para o efeito, uma vez que a matéria ora alegada constitui matéria de direito, não carecendo de prova, ao que ambos os mandatários declararam não ter nada a opor ou a requerer.
Foi então ordenada a conclusão dos autos e proferido saneador sentença em 22 de Março de 2024, que julgou procedente a oposição e extinta a execução e julgou improcedente o pedido de condenação do embargado por litigância de má fé.
Em 5 de Junho de 2024, o executado embargante apresentou requerimento, alegando que na acta da audiência prévia consta como presente a Dra A… em representação do embargado, quando quem esteve presente para o representar foi a Dra C…, mas esta advogada e a Dra B…, também mandatadas pelo embargado, não foram notificadas da sentença, pelo que a mesma não transitou em julgado, ao contrário de certidão já emitida que indica a data de 2/5/2024 como a do trânsito em julgado, sendo também errónea a decisão do Sr. Agente de 3/6/2024 que declarou a extinção da execução.
Concluiu pedindo a suprimento da omissão de notificação da sentença às Dras B… e C….
O embargado respondeu, alegando que foi notificado da sentença na pessoa da sua mandatária (a signatária do requerimento, Dra A…) tendo sido a Dra C… mandatada só para representar o embargado na audiência e sendo apenas a signatária e a Dra B… as suas mandatárias com procuração conjunta.
Sobre este requerimento e resposta foi proferido o seguinte despacho:
Novo Banco, SA, exequente nos autos acima identificados, conforme o mesmo alega em nome da sua mandatária, foi notificado para da sentença conforme consta do citius.
Quanto à Dra C… mandatária substabelecida com reserva conforme consta dos autos qual esteve mandatada apenas para representar a exequente em sede de audiência.
Quanto às Ilustres mandatárias Dra B… e a signatária da resposta da exequente, ambas têm procuração conjunta.
Pelo exposto julga-se validamente verificadas as notificações.
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Inconformado, o executado embargante interpôs recurso e alegou, formulando as seguintes conclusões:
1. Nos autos e sem prejuízo pelo disposto no artº 47º nºs 1 e 2 CPC, o alegado pelo requerimento do embargante da ref. 39564636, de 05/06/2024 e o disposto em qualquer dos artºs 44º nºs 1 e 4 e 45º nº 1 CPC, mostram-se com o efeito de, quanto mais não seja pela segurança a que obriga o artº 839º nºs 1 e 3 CPC, conduzir a que tanto a Drª C… - com o substabelecimento dos autos não revogado - como a Drª B…, enquanto mandatária do exequente com as várias intervenções dos autos, ambas elas com a desvalorização da notificação seguida pelo despacho recorrido, mas ainda não notificadas, sejam de notificar, como pede.
2. Como reconhecido até pelo despacho recorrido, a Drª C…, que é a advogada com o substabelecimento não revogado junto e associado pela Drª A… pelo requerimento da ref. 38494512, de 16.02.2024, aqui dado por reproduzido, representou o exequente e esteve presente na audiência da ata da referência 433077417, mas, por lamentável erro da secretaria, ela mostra-se omitida pela tal referência da ata, que indevidamente a substituiu pela Drª A…, que entretanto não comparecera ao ato e nele nem esteve presente.
3. Na situação dos autos, o embargante contava com a notificação da Drª C…. E, contra o decidido pelo despacho recorrido, que desvalorizou a sua notificação, o erro da secretaria referido em 2, mostrou-se com influência na notificação em causa, levando a que, com influência no exame da causa, a falta importasse irregularidade e, por força do artº 195º nº 1 CPC, a nulidade dessa notificação, com o efeito dela ser de repetir, como pede.
4. Nos embargos em causa, a Drª B…, na qualidade de mandatária do embargado/exequente, realizou as várias intervenções averbadas pelo processo, nomeadamente, as relativas à notificação da ref. 415137755, de 21/04/2022, feita para o efeito da contestação do nº 2 artº 732º CPC; à notificação da ref. 20668979, de 27/10/2023, relativa ao acórdão a que faz referência; à notificação da ref. 431095493, de 07/12/2023, relativa à Audiência Prévia do art º 151º e na notificação da ref. 431131749, de 11/12/2023 relativa também à Audiência Prévia do artº 151º CPC, mas igualmente não se mostra notificada pela sentença e isso com influência no exame da causa, importando a falta irregularidade e, por força do artº 195º nº 1 CPC, a nulidade dessa notificação, com o efeito dela ser de repetir, como pede.
5. Nos autos, foi o embargado - e não outrem! - a escolher e seguir o modo da sua intervenção nos autos, através das advogadas e dos mandatos indicados. E, sem prejuízo pela faculdade de revogação do mandato – entretanto inexistente - a intervenção de qualquer dessas advogadas nos autos mostra-se normal, regular e efetiva, não parecendo de admitir a posição do despacho recorrido de limitar os seus efeitos, como será normal e até já foi seguido, nomeadamente, pelo Ac. Rel. Lisboa de 28/03/2017 tirado no Processo nº 54020/15.5YIPRT.1-7:- havendo mandatos e, indistintamente, a intervenção de qualquer das mandatárias dos autos, fica assegurada a legitimidade da intervenção de qualquer delas, do mesmo modo que parece normal a obrigação de notificação de qualquer delas para os termos dos autos. Com o efeito de que, no caso, a falta de notificação de qualquer delas representará irregularidade com influência no exame ou na decisão da causa, que integrará a nulidade prevista no artº 195º nº1 CPC, e importa apreciar e decidir, pela realização da notificação em falta, com a natural revogação do despacho recorrido,
Como pede e a bem do Direito e da Justiça espera ser decidido.
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O embargado contra-alegou pedindo a improcedência do recurso e foi proferido despacho que o admitiu como apelação com subida imediata, nos autos e efeito devolutivo e desatendeu as nulidades invocadas na respectivas alegações.
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A questão a decidir é a de saber se a notificação da sentença às partes, não tendo sido feita a todas as mandatárias do embargado, constitui uma nulidade prevista no artigo 195º nº1 do CPC e obsta ao trânsito em julgado da sentença.
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FACTOS.
Os factos a atender são os descritos no relatório que antecede, aditando-se ainda o seguinte processado que consta nos autos:
Em 24/6/2021 foi junto no processo principal de execução um substabelecimento sem reserva subscrito pelos anteriores procuradores do exequente embargado, a favor da Dra A… e da Dra B…, que se mantêm actualmente como mandatárias do embargado.
Nos presentes embargos de executado foi marcada para o dia 20/2/2024 a reabertura da audiência prévia após o acórdão da Relação.
Em 16/2/2024 a Dra A… juntou um substabelecimento com reserva a favor da Dra C…, para a representar na audiência prévia de 20/2/2024.
Nos autos, a acta da referida audiência prévia consigna a presença da Dra C… como representante do embargado.
A sentença de 22/3/2024 foi notificada às partes na mesma data e em 2/4/2024, ao Ministério Público, tendo sido notificada apenas a Dra A… em representação do embargado.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO.
Estabelece o artigo 44º do CPC: nº1- o mandato atribui poderes ao mandatário para representar a parte em todos os actos e termos do processo principal e respectivos incidentes, mesmo perante os tribunais superiores, sem prejuízo das disposições que exijam a outorga de poderes especiais por parte do mandante; nº2- Nos poderes que a lei presume conferidos ao mandatário está incluído o de substabelecer o mandato; nº3- O substabelecimento sem reserva implica a exclusão do anterior mandatário; nº4 – (…).
Como decorre dos factos acima descritos, os anteriores mandatários do exequente substabeleceram, sem reserva, na Dra A… e na Dra B…, pelo que foram excluídos os anteriores mandatários e são estas duas advogadas que representam o embargado nos autos.
Antes da audiência prévia que antecedeu a sentença, a Dra A… juntou substabelecimento, com reserva, a favor da Dra C… para a representar nessa audiência prévia.
O apelante alega que, embora a Dra C… estivesse na audiência prévia, na acta consignou-se a presença da Dra A…, do que resultou que fosse esta a ser notificada da sentença, em vez da Dra C…, o que constitui nulidade prevista no artigo 195º do CPC e teve como consequência que o ora apelante ficasse à espera da notificação da Dra C… e que a sentença não transitou em julgado.
Contudo, ao contrário do alegado pelo apelante, na acta da audiência prévia consta a presença da Dra C… e não da Dra A…, pelo que a alegação do apelante parece decorrer de uma confusão resultante do facto de, no citius, a indicação da peça processual “acta” constar o nome da Dra A…, sendo, porem, que bastaria abrir o ficheiro que contém a acta para se constatar que aí consta a presença da Dra C….
E essa discrepância não constitui qualquer irregularidade.
Na verdade, do substabelecimento com reserva resulta que o mandatário emitente do substabelecimento subsiste nos autos em pé de igualdade com o mandatário substabelecido, com os mesmos poderes do nº1 do artigo 44º, o que já não sucederá se o substabelecimento contiver uma limitação para a intervenção do mandatário substabelecido, como é o caso dos autos, em que a Dra C… foi mandatada apenas para representar o embargado na audiência prévia.
Sendo assim, a notificação da sentença não tinha de lhe ser feita à Dra C…, mas sim a uma das duas mandatárias que representam o embargado, sendo esse o sentido da indicação no citius da Dra A…, como aquela que iria receber a notificação.
Defende ainda o apelante que a notificação deveria ter sido efectuada a todas as mandatárias do embargado, não transitando a sentença enquanto tal não suceder.
Mas não lhe assiste razão.
Quanto à Dra C…, a notificação não lhe tinha de ser efectuada, como acima se expôs.
Quanto às duas mandatárias que representam o embargado (a Dra A… e a Dra B…), nada no conteúdo do artigo 44º (nem do artigo 45º invocado pelo apelante) impõe que as notificações têm de ser efectuadas a todos os mandatários constituídos, bastando que seja notificado apenas um deles.
O facto de existir mais do que um mandatário a representar a mesma parte só diz respeito à relação entre mandante e mandatário(s), mas, no que diz respeito ao tribunal, qualquer um dos mandatários representa a parte e qualquer um deles está apto a receber a notificação que produzirá todos os seus efeitos, sem necessidade de notificação dos restantes, sendo certo que o ac. da RL de 28/3/2017, p. 54020 invocado pela apelante confirma esta posição e não o defendido pelo apelante.
Notificar todos os mandatários da mesma parte redundaria num acto inútil e poderia causar confusão na contagem dos prazos decorrentes da notificação, caso fossem efectuadas em datas diferentes.
Conclui-se, portanto, que a notificação da Dra A… produziu todos os seus efeitos em relação ao embargado, inexistindo qualquer nulidade processual.
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DECISÃO.
Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação e mantém-se o despacho recorrido.
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Custas pelo apelante.
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Lisboa, 09 de outubro de 2025
Maria Teresa Pardal
Anabela Calafate
António Santos