RECURSO SUBORDINADO
COMPETÊNCIA
APENSAÇÃO
Sumário

Sumário: (Sumário elaborado pela Relatora)
I. - O recurso subordinado terá de ser apreciado pelo mesmo Tribunal Colectivo que conheceu do recurso principal.
II - A ordenar a subida dos autos de recurso subordinado ter-se-ia de remeter o recurso para o colectivo que apreciou o recurso principal.
III - Proferido o acórdão no âmbito do recurso principal, fica esgotado o poder jurisdicional, mas tal não significa que o acórdão transitou em julgado.

Texto Integral

Acordam, em conferência, os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. RELATÓRIO
SPACELAND – Sociedade Imobiliária, Lda., não se conformando com o teor da decisão proferida pela relatora sobre a reclamação apresentada, veio dela reclamar para a presente conferência.
*
Por despacho proferido pela 1ª Instância foi determinado que:
“a. Nestes autos foi proferida a sentença com a refª 58265855, datada de 25.11.2024, que logo foi notificada às partes.
b. Dessa sentença, para o que aqui importa, recorreu a A., através de peça que fez chegar ao processo em 23.1.2025, peça essa que logo foi notificada à contraparte.
c. Por seu turno a R., através da peça que aqui fez chegar em 23.1.2025, apresentou as suas contra-alegações ao recurso interposto pela A. d. Através do despacho de 3.3.2025, o recurso da A. foi admitido e determinada a subida dos autos ao TRL, coisa que foi feita.
e. Já com o processo sob a alçada do TRL, a R. apresentou recurso subordinado através da peça aqui chegada em 12.3.2025, peça essa que mereceu a apreciação que está explanada no despacho com a refª 58995819…e no sentido de não ser aqui possível, nesta altura, com os autos sob a alçada do TRL tomar qualquer posição acerta deste recurso.
f. Mau grado isso, a A. contra-alegou a esse recurso subordinado através da peça aqui chegada em 25.4.2025.
g. Através da peça com a refª 6278241, de 2.5.2025, a R. veio ao processo avançar com a nulidade de omissão de pronúncia por não se ter apreciado o recurso referido em e., peça essa que, porque os autos estão sob a alçada do TRL, para esse tribunal foi encaminhada.
h. Chega agora ao processo, através da peça com a refª 6284137, o despacho do Sr. Desembargador Eduardo Petersen Silva, proferido no processo que tem sob a sua alçada, que refere que a questão relacionada com o recuso subordinado e com a nulidade avançada pela R. (acima alíneas e. e g), devem ser apreciados aqui na primeira instância…não esclarecendo se isso deve suceder já, quando os autos não estão sob a nossa alçada, ou quando o processo houver de descer.
Para que a decisão das questões não se protele no tempo, e mau grado o processo estar sob a alçada do TRL, parece que o que se pretende é que aqui se toma posição quanto às questões referidas.
Assim…no que toca à questão e., ou seja, acerca da admissibilidade do recurso subordinado interposto pela R.
Diz a lei, artº.633º, nº.2 do CPC, que o para a interposição do recurso subordinado conta-se a partir da notificação da interposição do recurso da parte contrária.
Assim…o recurso interposto pela A. da sentença, como decorre da alínea b. acima, foi notificado à R. no dia 23.1.2025, pelo que é a partir dessa data como decorre da norma citada, que se conta o prazo para a interposição do recurso subordinado. O ponto charneira para se iniciar o prazo para o recurso subordinado não é o da notificação do despacho de admissão do recurso principal…mas sim o da notificação do recurso interposto pela parte contrário e ao qual a contraparte deve responde e/ou recorrer subordinadamente.
Assim, alinhando na ideia de que o recurso subordinado pretendia ver a matéria de facto reapreciada, a R. tinha o prazo de 40 dias a contar do dia 23.1.2025 para interpor o seu recurso subordinado…os quais terminaram em 5.3.2025.
Tendo o recurso subordinado chegado aos autos em 12.3.2025 tal como acima na alínea e. se aponta, é manifesta a sua extemporaneidade, razão pela qual o não admito.
Com o presente despacho sana-se a nulidade apontada acima na al.g.
Notifique.”
*
Por apenso, veio a Reclamante dele reclamar, ao abrigo do disposto no artigo 643º do Código de Processo Civil.
*
2. Pela relatora foi proferida decisão sobre a reclamação nos seguintes termos:
Pelo exposto, julgo procedente a reclamação e, em consequência revoga-se o despacho de não admissão de recurso, admitindo-se o recurso subordinado e determinando-se que os presentes autos desçam à 1ª Instância a aguardar a prolação de acórdão pelo Supremo Tribunal de Justiça, ficando, por ora, prejudicada a subida dos autos de recurso a este Tribunal da Relação.
*
Notificada desta decisão, veio a Reclamante requerer, nos termos do artigo 652º, nº 3 do Código de Processo Civil, que sobre o despacho recaia um acórdão, alegando que:
“(…)
A presente impugnação versa sobre a parte decisória, onde se determina que o recurso subordinado desça à 1.ª Instância, apesar da sua admissão.
O artigo 643.º n.º 4 do CPC dispõe o seguinte:
“A reclamação, logo que distribuída, é apresentada ao relator, que, em 10 dias, profere decisão que admita o recurso ou o mande subir ou mantenha o despacho reclamado, a qual é suscetível de impugnação, nos termos previstos no n.º 3 do artigo 652.º.”.
O n.º 6 do mesmo artigo refere que:
“Se a reclamação for deferida, o relator requisita o processo principal ao tribunal recorrido, que o fará subir no prazo de 10 dias.”.
O tribunal superior após receber a reclamação contra o indeferimento, só tem duas opções, ou mantém o despacho reclamado e não admite o recurso, ou no caso da sua admissão tem que mandar subir o mesmo.
Ora, não pode o tribunal admitir o recurso e não o mandar subir, sob pena de violação da lei.
A ora Reclamante interpôs recurso subordinado, tempestivamente, o mesmo foi admitido e, no entanto, não pode ser apreciado, ora tal consubstancia uma denegação da justiça.
Do mesmo modo, a não subida do recurso subordinado para este tribunal e a consequente falta de apreciação do mesmo, após a sua admissão, consubstancia uma violação do princípio de acesso à justiça, constitucionalmente consagrado no artigo 20.º da CRP.
A lei processual, não prevê a hipótese de admitir o recurso e não o mandar subir, pois tal previsão seria o mesmo que não admitir o recurso, e no caso dos autos não existem fundamentos legais para a sua não admissão e a sua falta de apreciação.
Ao contrário do estabelecido na decisão reclamada, o poder jurisdicional do tribunal da Relação não está esgotado, pois nenhuma decisão transitou em julgado.
Ora, não pode a ora Reclamante não ver o seu recurso subordinado apreciado, pois fez tudo como legalmente lhe competia.
Acresce que tal situação só aconteceu porque o tribunal da 1.ª Instância não informou o tribunal da Relação da tinha sido interposto recurso subordinado.
Face ao exposto deve o presente recurso subordinado subir nos termos do artigo 643.º n.º 6 do CPC.
Assim, deve a decisão proferida por este douto tribunal ser revogada e ser substituída por Acórdão que não mande descer o recurso subordinado, dando cumprimento ao disposto no n.º 6 do artigo 643.º do CPC.”
*
No Tribunal de 1ª Instância correram termos os autos principais no âmbito dos quais foi, em 25 de Novembro de 2024, proferida sentença.
A sentença foi notificada às partes no dia 25 de Novembro de 2024.
No dia 23 de Janeiro de 2025 veio a Autora interpor recurso de apelação da sentença proferida, tendo a Recorrida sido notificada electronicamente neste mesmo dia.
A Recorrente veio impugnar a matéria de facto.
No dia 03 de Março de 2025 foi proferido despacho de admissão do recurso e ordenada a remessa dos autos para este Tribunal da Relação de Lisboa.
Os autos principais foram remetidos ao Tribunal da Relação de Lisboa em 11 de Março de 2025.
No dia 19 de Março de 2025 foi ordenado que os autos fossem aos vistos e foi ordenada a inscrição em tabela.
No dia 10 de Abril de 2024 foi proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação de Lisboa (do qual a presente foi adjunta).
No dia 11 de Abril de 2024 veio a Ré nos autos principais, invocar a nulidade do Acórdão proferido em virtude de ter interposto recurso subordinado e de no Tribunal de 1ª Instância ter sido proferido despacho onde se lê que “Vi. Nada a dizer, pois o processo já está sob a alçada do TRL… havendo de ser este a tomar posição”.
No dia 28 de Abril de 2024 veio o Tribunal de 1ª Instância informar que foi interposto recurso subordinado e remete ao Tribunal da Relação o requerimento de interposição de recurso subordinado, alegações e contra-alegações.
Pelo relator do Acórdão deste Tribunal da Relação foi proferido em 11 de Maio de 2025 o seguinte despacho:
“Requerimento que antecede, com a comunicação de que foi invocada junto da primeira instância a nulidade por omissão relativamente à admissão do recurso subordinado:
- visto, nada temos a decidir, sendo que os requerimentos dirigidos à primeira instância têm de ser por ela apreciados.
Comunique isto mesmo - nada temos a decidir, sendo que os requerimentos dirigidos à primeira instância têm de ser por ela apreciados - ao tribunal de primeira instância, como resposta às informações que nos fez pelas referências Citius que antecedem: - 59313390 e 59275857.
Arguição de nulidade do acórdão por omissão de pronúncia – inscreva em tabela para a sessão de 08.05.2025, com dispensa de vistos.”
No dia 08 de Maio de 2025 foi proferido Acórdão que julgou improcedentes as nulidade suscitadas.
Foi interposto recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça.
*
II. FUNDAMENTAÇÃO
Os factos a considerar são os reproduzidos no relatório que antecede.
*
No âmbito da presente reclamação não houve pronúncia da parte contrária.
*
III. DIREITO
Não estando em causa a decisão quanto à tempestividade do recurso subordinado e consequente revogação do despacho de não admissão de recurso proferido pela 1ª instância, apenas está em apreciação a consequência decorrente da admissibilidade do recurso, defendendo a Reclamante que deve ser ordenada a subida do recurso subordinado nos termos do artigo 643º, nº 6 do Código de Processo Civil.
Efectivamente, admitido o recurso, cumpria, nos termos do disposto no artigo 643º, nº 6 do Código de Processo Civil, requisitar o processo principal ao Tribunal recorrido que o faria subir no prazo de 10 dias.
A situação que ocorreu nos autos é uma situação anómala e que se distancia das situações legalmente previstas.
Não se trata de um recurso principal, mas sim um recurso subordinado, sendo certo que o recurso principal já foi apreciado por este Tribunal da Relação, foi proferido acórdão e foi interposto recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.
Obviamente que o recurso subordinado terá de ser apreciado pelo mesmo Tribunal Colectivo que conheceu do recurso principal, ou seja, a ordenar a subida dos autos o recurso subordinado teria de ter como relator e adjuntos os mesmos Juízes Desembargadores que conheceram do recurso principal, o que não ocorre no presente caso.
A aqui relatora foi, por coincidência da distribuição, adjunta no recurso principal.
A ordenar a subida dos autos de recurso subordinado ter-se-ia de remeter o recurso para o colectivo que apreciou o recurso principal.
Quando nos referimos ao facto de proferido o acórdão no âmbito do recurso principal ficou esgotado o poder jurisdicional, tal não significa que o acórdão transitou em julgado, pois, como bem sabemos, tal não ocorreu por ter sido interposto recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça. O poder do colectivo deste Tribunal da Relação, proferido o acórdão, apenas subsiste quanto ao eventual conhecimento de nulidades supríveis, não cabendo qualquer decisão de revogação do acórdão proferido para que seja conhecido o recurso subordinado porquanto esse poder cabe ao Supremo Tribunal de Justiça.
Nestes termos, não cremos ser congruente e razoável ordenar a remessa dos autos de recurso subordinado quando a relatora e respectivos adjuntos não podem por força da lei conhecer do recurso subordinado.
Todavia, como nos autos principais foi interposto recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, deve o recurso subordinado ser remetido para o Supremo Tribunal de Justiça.
Tudo visto, defere-se a reclamação apresentada e consequentemente deve o recurso subordinado ser requisitado ao Tribunal de 1ª Instância e remessa dos mesmo ao Supremo Tribunal de Justiça para os efeitos tidos por convenientes, a subir juntamente com o recurso de revista que foi interposto nos autos principais.
*
IV. DECISÃO
Pelo exposto, os Juízes da 6.ª Secção da Relação de Lisboa, em conferência, acordam em deferir a reclamação apresentada e consequentemente deve o recurso subordinado ser requisitado ao Tribunal de 1ª Instância e, após ser remetido ao Supremo Tribunal de Justiça para os efeitos tidos por convenientes, a subir juntamente com o recurso de revista que foi interposto nos autos principais.
Sem custas.
Notifique.

Lisboa, 09 de Outubro de 2025
Cláudia Barata
Anabela Calafate
Nuno Gonçalves