APRESENTAÇÃO DE NOVOS MEIOS DE PROVA
FACTOS SUPERVENIENTES
CREDOR PIGNORATÍCIO
ASSEMBLEIA GERAL
DIREITO DE VOTO
Sumário

1 – Os documentos apresentados em sede de recurso hão-de sempre referir-se a factos já trazidos ao processo, ou nos articulados normais ou nos articulados supervenientes, pois que o objeto do recurso tem sempre de se limitar aos factos e às questões já processualmente adquiridas, isto é, alegadas oportunamente perante o tribunal recorrido e consideradas por este último. Dito de outro modo, o tribunal da relação não pode conhecer de factos ou questões que ocorreram depois do encerramento da discussão, donde não ser admissível a junção de documentos, em sede de recurso, que vise comprovar factos supervenientes.
2 – O credor pignoratício deve utilizar o direito de voto «como forma de tutela de um interesse próprio como credor» que é o de salvaguardar a consistência económica do objeto da sua garantia.
3 – Pese embora as deliberações sociais impugnadas, a saber, a destituição de uma Administração, com justa causa e com efeitos imediatos, e a nomeação de novos membros do Conselho de Administração, interfira com a estrutura societária na medida em que da mesma resultou uma alteração da composição do Conselho de Administração, parecendo à partida que a credora pignoratícia extravasou o âmbito da tutela da sua garantia ao votar tais deliberações, no caso estando suficientemente indiciado que a anterior administração da requerida incumpriu obrigações legais, concretamente relatar a gestão, apresentar contas dos exercícios reportados aos anos de 2021 a 2023 e sujeitá-las à aprovação dos sócios, dever previsto designadamente no artigo 65.º do CSC, e que, em consequência de tal incumprimento, os sócios e terceiros ficaram privados de informação sobre a situação económica e financeira da requerida, para além de que com essa atuação a anterior administração da requerida arriscou a que fosse promovida a dissolução administrativa da requerida (artigo 143.º, alínea a), do CSC) e que aquela administração estava a efetuar uma gestão ruinosa para o interesse social da requerida, havendo dívidas ao Estado (Autoridade Tributária e Segurança Social) de valor global muito elevado que, se não satisfeitas, implicam risco de insolvência e, consequentemente, a desvalorização da empresa, logo das participações sociais objeto de penhor, justificava-se a intervenção da credora pignoratícia no sentido de participar na assembleia geral de 15.01.2025 e de exercer o direito social de voto, aprovando as deliberações sociais em causa nos autos, não apenas ao abrigo de um dever de administrar diligentemente o objeto do penhor, mas para salvaguardar o valor económico do objeto da garantia.
(Sumário da Relatora)

Texto Integral

Apelação n.º 68/25.7.8T8OLH.E1
(2.ª Secção)

Relatora: Cristina Dá Mesquita
Adjuntos: José Manuel Tomé de Carvalho
Isabel Maria Peixoto Imaginário

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Évora:

I. RELATÓRIO
I.1.
(…), requerente do procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais que moveu contra a Sociedade Hoteleira (…), S.A., sociedade comercial com o número de pessoa coletiva (…), com sede no Hotel (…) – Vale do Lobo, 8135-034 Almancil, interpôs recurso da sentença proferida pelo Juízo de Comércio de Olhão, Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, o qual julgou totalmente improcedente, por não provado, o procedimento cautelar em causa.

I.2.
O recorrente formula alegações que culminam com as seguintes conclusões:
«1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença datada de 29/05/2025 e que decidiu negar o decretamento do procedimento cautelar desencadeado pelo Recorrente.
2. Entende o Recorrente que a decisão recorrida errou no plano fáctico e no plano jurídico.
3. No plano fáctico, errou ao dar como provados os factos 41º e 44º – factos que ora se impugnam.
4. Tal como errou ao dar como não provados os factos a) a c) e g) a i) – que também se impugnam.
5. Impondo, quanto à dita factualidade, decisão diversa da recorrida os seguintes elementos de prova: (i) declarações prestadas pela testemunha (…) na sessão de julgamento do dia 27/03/2025, com início pelas 10h12min e fim às 12h01min, gravadas através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal e conforme acta do mesmo dia; (ii) declarações de parte da Requerida, prestadas na pessoa do seu administrador (…) na sessão de julgamento do dia 28/03/2025, com início pelas 10h09min e fim às 10h42min, gravadas através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal e conforme acta do mesmo dia; (iii) Documentos 5 e 7 juntos com a P.I.; (iv) Documentos 1, 2 e 3 que ora se juntam nos termos conjugados dos artigos 651.º/1 e 425.º do C.P.C..
6. Quanto ao facto provado em 64º, verifica-se que o tribunal recorrido não concretiza / explicita porque e como se convenceu de tal facto, o que cremos configurar a situação de insuficiência de fundamentação a que alude o artigo 662.º/2/d), C.P.C. – vício que deve ser reconhecido com as devidas consequências.
7. Sendo que da mera análise da sentença recorrida (leia-se, do resumo ali feito da prova produzida) resulta claro inexistir qualquer elemento de prova donde o mesmo pudesse ser
retirado.
8. Com efeito, apenas a testemunha … (no seu depoimento devidamente indicado e parcialmente transcrito no corpo deste recurso) se referiu à questão abordada no facto 64º (relativa a um alegado corte de acesso ao correio electrónico de alguns trabalhadores da Requerida e à impossibilidade de anexação de documentos a mensagens de email e à retirada da informação existente nos computadores para discos externos), mas negando-a!
9. … (cfr. trechos de min. 30:06 a 46:16 da gravação do depoimento) declarou ser falso que tivesse sido cortado ou ordenado que fosse cortado o acesso a emails aos trabalhadores do Golf (…) após a mudança de administração, como declarou inexistir a impossibilidade de anexar ficheiros/documentos a emails, tendo afirmado que a impossibilidade de retirada de informação dos computadores do campo de golfe para discos externos resulta, não de qualquer actuação sua ou de qualquer dos seus colaboradores do departamento informático do Grupo (…), mas da própria configuração de segurança do sistema que visa impedir a retirada não autorizada de informações – configuração de segurança essa que já se encontrava em vigor mesmo antes da alteração da administração.
10. Inexistindo prova donde se pudesse extrair o facto provado em 64º, mas apenas que o contraria, é manifesto que se impõe a passagem do referido facto para a matéria não provada.
11. No que toca ao facto 61º, também sobressai a insuficiência de fundamentação a que alude o artigo 662.º/2/d), do C.P.C. – vício que deve ser reconhecido com as devidas consequências.
12. É que tendo sido produzida prova em sentidos diferentes; concretamente a consistente no depoimento da testemunha … (que declarou estar convencido que o corte na ligação ao sistema “Golf (…)” se deveu a uma “acção concertada” da anterior administração”) e a resultante do depoimento da testemunha … (que negou qualquer intervenção sua ou da sua equipa informática sobre tal sistema), o tribunal a quo não explica porque preferiu um destes elementos em relação ao outro.
13. Em concreto (e conforme trecho de min. 24:18 a 27:53 da gravação do depoimento da
testemunha identificado no corpo do recurso e parcialmente transcrito), (…) explicou que o dito corte não se ficou a dever a qualquer intervenção da …, mas ao desligamento físico de algum cabo nas instalações do campo de golfe (às quais a … já não tinha acesso).
14. Escrutinados ambos os elementos de prova à luz da normalidade e das regras da ciência,
parece-nos evidente que nunca poderia prevalecer aquilo que é a mera opinião da testemunha …, quando é claramente contrariada pelo depoimento com conhecimento de causa (fáctico e técnico) da testemunha (…).
15. Até porque não tem qualquer sentido que só cerca de um mês depois da alteração da administração é que a anterior administração promovesse o corte desse sistema…
16. De todo o modo, (…) não declarou quem teria sido o responsável efectivo por essa perturbação no acesso ao “Golf …”!
17. Ou seja, quem pudessem ter sido os concretos autores materiais ou morais desse corte.
18. Sendo certo que a anterior administração (como está provado em 5º) era composta por
quatro pessoas e (como resulta do depoimento de …) a equipa informática (…) por mais que uma pessoa…
19. Mais uma vez, dá o tribunal recorrido como provado um facto num determinado sentido
quando nenhuma prova foi produzida que suporte tal conclusão – pelo que se impõe alterar a formulação do facto em apreço, que deverá passar a ser a seguinte: “61º No dia 9 de fevereiro de 2025, durante a manhã, foram cortados os acessos da Requerida ao sistema informático de reservas e faturação e contabilidade do Golf (…), denominado “Golf …”.
20. Relativamente ao facto não provado c), não se pode aceitar a desvalorização que o tribunal recorrido acaba por fazer da avaliação que consiste no doc. 7 junto com a P.I..
21. É que não pondo o tribunal em causa (como não põe) nem que tal avaliação foi feita pela (reputada) entidade que a subscreve (a …), nem que se trate duma análise completa e exaustiva dos imóveis ali escrutinados, nem os valores constantes da avaliação, nem a data de elaboração da mesma (Maio de 2024), não tem nexo desconsiderá-la só porque faltaria prova que demonstrasse a respectiva actualidade!
22. Se a avaliação data de Maio de 2024 (portanto, cerca de 1 ano antes da prolação da sentença aqui recorrida) e tendo em conta que é do conhecimento geral que, de então para
cá, os preços do imobiliário só têm vindo a subir, como se pode desconsiderar a mencionada avaliação e dar como não provado que o património descrito em 13º dos factos provados não vale, pelo menos, quatro vezes mais que o valor reclamado pela (…) ao Grupo (…)?!
23. Assim, não se podendo afastar o dito doc. 7 da P.I., impõe-se a passagem do facto não provado em c) para os factos provados.
24. No tocante aos demais factos não provados que foram tidos por incorrectamente julgados, respalda-se o Recorrente nos docs. 1 a 4 cuja junção, nos termos conjugados dos artigos 651.º/1 e 425.º do C.P.C., ora se efectua.
25. Os docs. em causa demonstram que, no passado dia 18 de Junho de 2025 (data posterior à da sentença recorrida), a … (leia-se o Grupo …) começou a concretizar o seu plano de tomada do património que pertencia ao Grupo (…)!
26. Nessa data, a aqui Recorrida e a sociedade (…), ambas representadas pelos mesmos administradores que lhes foram nomeados pela (…), procederam à venda do imóvel correspondente ao campo de golfe de São (…) à sociedade (…), Lda. (cfr. doc. 1 ora junto).
27. Sendo que a compradora (…), Lda. é, desde o dia 03/06/2025, detida a 100% pela própria … (cfr. certidão do registo comercial com o código de acesso 2007- 8664-4373 e aqui junta como doc. 2)!
28. Mais se constatando (cfr. docs. 3 e 4 juntos) que os Beneficiários Efectivos da (…), S.A. e da (…), Lda. são, sem tirar nem por, os mesmíssimos.
29. Ou seja, através dos administradores que conseguiu nomear para as sociedades vendedoras, logrou a (…) que fosse tal imóvel transferido para a sua esfera…
30. Ainda para mais por um preço muitíssimo inferior ao do seu real valor – o imóvel em causa foi transacionado por € 9.000.000,00 quando, de acordo com a avaliação que configura o doc. 7 junto com a P.I. (cfr. respectiva página 14) vale, pelo menos, € 56.000.000.
31. Pelo que não pode deixar de se ter por demonstrado definitivamente a verdadeira motivação da … (leia-se, do Grupo …) ao passar a dominar a gerência/administração das empresas que compõem o Grupo (…), a mesma ficou agora totalmente a descoberto: Passar os Activos Titulados pelo Grupo (…) para o Grupo (…).
32. Tal como demonstrado está que os ditos administradores (também nomeados para a Recorrida) prosseguem o interesse da (…) (leia-se, do Grupo …) e não das empresas que passaram a administrar!
33. Perante a prova que vem de se indicar, impõe-se a passagem dos factos dados como não provados em a) e g) a i) para a matéria de facto dada como provada.
34. Alterada a matéria de facto nos termos acima apontados, crê o Recorrente pelo cabal cumprimento dos requisitos impostos pelo artigo 380.º do C.P.C. para o decretamento da providência requerida.
35. Desde logo, porque entende que terá que ser feito um pré-juízo favorável quanto à verificação da invalidade da deliberação objecto dos autos.
36. Pois que entende que o n.º 5 do artigo 7.º do Pacto Social da Requerida impõe que os acionistas da Requerida sejam notificados da realização de quaisquer assembleias gerais por carta registada (com A/R) ou por email (com recibo de leitura) – o que, in casu, não se verificou, importando a violação, pela sentença recorrida, dos n.ºs 2 e 3 do artigo 377.º do Código das Sociedades Comerciais.
37. E se a AG em que foi tomada a deliberação aqui em causa não foi convocada como deveria ter sido, então, na verdade, não foi legalmente convocada.
38. O que importa a nulidade de tais deliberações nos termos do artigo 56.º/1/a), do C.S.C., ou, no limite, a respectiva anulabilidade nos termos do artigo 58.º/1/a), do mesmo diploma legal – normas violadas pela sentença recorrida.
39. Ainda que assim não fosse, também diversamente à sentença recorrida, entende o Recorrente que a deliberação em causa sempre é anulável nos termos do artigo 58.º/1/a), do C.S.C., por clara violação dos artigos 22.º, 23.º/3, 54.º/1, 384.º/1, 391.º e 2.º, a), todos do C.S.C. (normas violadas pela sentença a quo).
40. Isto porquanto, ainda que se aceitasse que a (…) gozava de penhor sobre as acções correspondentes ao capital social da Requerida (com o que não se concorda) e que o contrato de penhor autorizava o credor pignoratício a requerer a convocação judicial de AGs da Requerida (o que também não se aceita), se entende que deve tal credor abster-se de intervir em matérias alheias ao interesse específico de assegurar a integridade patrimonial da garantia, razão pela qual sempre lhe estaria subtraída a possibilidade de votar as deliberações em causa relativas à nomeação de administradores e nomeação de fiscal único da sociedade.
41. Do mesmo passo, verificado está o requisito da existência de dano considerável.
42. Pois que a deliberação aqui em crise mais não visou que a tomada de controlo de mais uma das empresas do Grupo (…) por parte da (…), tomada de controlo essa que importa um manifesto conflito de interesses no próprio âmbito dos processos executivos que a (…) desencadeou contra as empresas do Grupo … (pois que, directa e indirectamente através dos administradores por si nomeados, passa a figurar em tais processos como Exequente e Executada).
43. Podendo, no limite e como já determinou que fosse feito noutras acções desencadeadas contra os seus interesses (ou os interesses dos administradores/gerentes por si nomeados para diversas empresas do Grupo …), desistir dos embargos de executadas deduzidos…
44. Além de, no plano comercial, lhe permitir tomar conhecimento de matérias confidenciais e cruciais para o negócio de empresas suas concorrentes no sector hoteleiro na zona do Algarve.
45. E importando, como demonstrado ficou, o início da concretização da derradeira fase do plano delineado pela (…) – a passagem do património das empresas do Grupo (…) para o Grupo (…)!
46. Sendo que os danos que se entende terem resultado demonstrados não só são reais, como são consideráveis.
47. Tendo a sentença recorrida violado, ainda, o artigo 380.º do Código de Processo Civil.
48. Assim, deverá a sentença de 1ª Instância ser substituída por outra que decrete a suspensão da eficácia da deliberação social da Requerida datada de 13/01/2025, tal como peticionado pelo Recorrente.
Nestes termos e nos melhores de Direito, deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente, com as devidas consequências.»

I.3.
A recorrida apresentou resposta às alegações de recurso, as quais culminam com as seguintes conclusões:
«1.º O recurso interposto incide sobre a douta sentença que, estribada na ampla e expressiva factualidade provada, nos preceitos legais aí citados e pelos fundamentos expostos, julgou o procedimento cautelar totalmente improcedente, por não provado, não decretando a suspensão das deliberações tomadas na Assembleia Geral de 13-01-2025, a saber: a destituição dos cargos de administrador, com justa causa, do Requerente (…) e de seus filhos (…), (…) e (…), e a nomeação, como membros do Conselho de Administração para o mandato de 2024/2027, de (…), para Presidente do Conselho de Administração, de (…), para Vogal do Conselho de Administração e de (…), para Vogal do Conselho de Administração (nenhuma deliberação tendo sido tomada relativamente ao Fiscal Único Efetivo e ao Fiscal Único Suplente da Recorrida, contrariamente ao alegado, certamente por lapso, pelo Recorrente);
2.º A iníqua e rebuscada estória fabricada pelo Apelante antes permitiu apurar que, tal como fez com a Recorrida, o Recorrente e os anteriores administradores e diretores por ele escolhidos, em preterição dos deveres legais e contratuais a que estavam adstritos, deixaram descapitalizadas e fortemente endividadas as empresas em questão, em resultado de gestão ruinosa, que incluiu o desvio de avultadas verbas para contas pessoais dos mesmos ex-gestores e de pessoas e entidades com eles relacionadas, fundos esses que permanecem por devolver à Recorrida e demais empresas. E que tem sido a atual administração da Recorrida que tem reposto a legalidade, saldado e renegociado dívidas, em escrupuloso cumprimento dos deveres que sobre si impendem, em defesa do interesse social da Recorrida e das demais empresas por si administradas, salvaguardando os direitos dos credores, entre eles a Segurança Social e a Autoridade Tributária, bem como dos seus trabalhadores e accionistas;
3.º Insurge-se o Apelante contra o julgamento da matéria factual, defendendo, nas Conclusões do recurso, que o Tribunal de 1ª instância errou ao dar como provados os factos 41º e 44º (cfr. Ponto 3 das Conclusões), reportando-se, na realidade, aos factos 61º e 64º. Tal como, ainda segundo o Recorrente, errou ao dar como não provados os factos a) a c) e g) a i);
4.º Mesmo que ao Recorrente fosse dada razão na impugnação da matéria de facto – o que não se concede, antes se refuta – a decisão de indeferimento da tutela cautelar não poderia, ainda assim, ser revogada ou alterada, atenta a restante factualidade julgada provada e não provada e a aplicação do direito a esses factos;
5.º É que o Tribunal de 1ª instância, na sentença, considerou encontrar-se demonstrado que a eventual suspensão da execução das deliberações da Requerida de 13-01-2025 causaria prejuízo manifestamente superior à respetiva execução e a verificação desse requisito negativo do decretamento da suspensão não foi colocada em crise nas Conclusões do Apelante;
6.º O Tribunal ad quem não deve apreciar as questões suscitadas pelo Recorrente, sob pena de incorrer em atos inúteis, prática que a lei proíbe (cfr., v. g., jurisprudência desse Venerando TRE);
7.º Deve, pois, ser indeferido o recurso sobre a matéria de facto, com fundamento na sua inutilidade para o mérito da decisão proferida e as legais consequências;
Caso assim não se entenda – o que por mero dever de patrocínio se conjectura – sempre se dirá que:
8.º A efabulação que o Apelante não logrou, minimamente, demonstrar, apenas serviu para evidenciar a responsabilidade do Apelante (e dos demais anteriores administradores e diretores por este escolhidos) pelos profundos constrangimentos financeiros e económicos em que deixou as empresas pelas quais passou, assim como pelos constantes atropelos à lei em que incorreu e, como se vê, pretende perpetuar;
9.º Sejam as elevadas dívidas à Segurança Social e à Autoridade Tributária, a não apresentação e depósito de contas anuais, que podem arrastar as empresas, como a Recorrida, para a insolvência ou para a dissolução administrativa, entre várias outras, configuram falhas graves, com relevo civil e possivelmente também criminal, que ficaram provadas nos autos e que o Recorrente, tampouco, ensaia impugnar, ciente das práticas ilícitas que caraterizaram a sua administração;
10.º Face a tudo quanto se deu por assente no processo, é significativo que o Recorrente não ponha em causa os demais factos, por ação e por omissão, praticados pela sua administração e pelos gestores que escolheu, cuja ilicitude e danosidade são elucidativas do que causaram e do que seriam capazes de causar, caso voltassem a assumir a gestão de sociedades comerciais como a aqui Apelada;
11.º O Apelante apenas se insurge contra darem-se como provados os factos 41º e 44º (cfr. Ponto 3 das Conclusões), reportando-se, na realidade, aos factos 61º e 64º, já que não existe conexão entre os meios probatórios enunciados nas Conclusões de recurso e os dois pontos referidos e, ademais, verificando-se que os pontos 41º e 44º da matéria de facto considerada provada, identificados – provavelmente, por lapso de escrita – nas Conclusões do recurso, não constam impugnados pelo Recorrente no corpo das Alegações;
12.º Vigora, nesta sede, a jurisprudência constante dos Tribunais Superiores, que impede o conhecimento de questões ínsitas nas Conclusões que não hajam sido tratadas nas Alegações;
13.º Sendo os Pontos 61º e 64º os pontos da factualidade julgada assente que o Apelante pretende impugnar nas Conclusões, é manifesto que, ainda que fossem excluídos os factos constantes dos dois pontos que o Recorrente impugna – o que a Recorrida não aceita – a restante matéria dada como provada e não provada determinaria a manutenção da decisão de indeferimento da providência cautelar;
14.º Encontra-se devidamente exarado na douta sentença, em sede de motivação da decisão de facto, de que modo se formou a convicção do Tribunal recorrido quanto aos factos provados e não provados, tendo sido considerado o teor e a força probatória dos documentos carreados para os autos (incluindo os mencionados pelo Recorrente), conjugados com os depoimentos prestados no decurso da audiência de julgamento;
15.º A motivação da decisão sobre a matéria de facto apenas apresenta uma súmula do modo como se formou a livre convicção do Meritíssimo Juiz acerca da veracidade, verosimilhança e isenção do depoimento, fruto do cotejo com os depoimentos de outra(s) testemunhas(s) e com os demais meios de prova, corolários dos princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova;
16.º O Tribunal de 1ª instância cumpriu todas as regras que a lei processual lhe impõe na fundamentação da sentença Cfr.: declarou quais os factos que julgou provados e não provados, analisou criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, tomando em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documentos, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência;
17.º O Exmo. Juiz apreciou livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, com respeito pelas regras probatórias às quais se encontra vinculado, não merecendo a sentença qualquer reparo;
18.º Não se verifica, igualmente, a invocada insuficiência de fundamentação, nos moldes definidos na alínea d) do n.º 2 do artigo 662.º do CPC: por um lado, não estão em causa factos essenciais para o julgamento da causa, porquanto a factualidade impugnada não tem relevância determinante no thema decidendum nestes autos, o preenchimento dos requisitos para suspensão das deliberações sociais tomadas na Assembleia Geral de 13-01-2025; e, por outro lado, a fundamentação constante da sentença é bastante para justificar a decisão tomada;
19.º Como admite o próprio Apelante, na motivação da decisão de facto espelhada na sentença a respeito dos pontos impugnados, pode ler-se que, do depoimento da testemunha (…) foi apurado:
Quanto à perda de acesso ao sistema informático “Golf (…)” a partir de 9 de fevereiro de 2025, declarou a testemunha que existiu impacto na gestão do campo, reservas, faturação e cumprimento de obrigações fiscais. Acredita que foi uma ação concertada e intervenção remota pelos quadros da (…) Portugal porquanto a atual administração contratou uma equipa de técnicos informáticos que testemunhou a formatação automática de computadores (D. … a 10, … a 11) após ganharem acesso temporário à internet;
Em razão da perda dos sistemas informáticos a operação está a decorrer em circunstâncias difíceis, com a implementação de um novo sistema (Golf …) e o trabalho penoso de reintroduzir as reservas perdidas, pelo que se formou convicção quanto ao mencionado em 61º, 62º, 63º, 64º, 65º, 66º e 67º.;
20.º Neste particular, relevam os seguintes segmentos da motivação da decisão sobre a matéria de facto:
Os factos referidos em 59º a 67º, para além dos já mencionados, resultaram ainda dos depoimentos prestados por (…), que explicou as dificuldades sentidas em face da impossibilidade de recorrer ao programa informático de gestão de reservas e emissão de faturas (…).
(…) A testemunha (…), trabalhador da Requerida, referiu exercer funções na receção do campo de golfe desde 1998. Explicou que o campo se encontra a funcionar, com atividade normal, apesar de terem perdido o acesso ao sistema de gestão “Golf (…)” a 10 de fevereiro de 2025, ficando sem informação das reservas.
Solicitou assistência ao departamento de IT e diretamente ao eng. (…), mas não foi prestada.
O impacto na gestão dos “starting times” e os constrangimentos causados por não saber quem tinha reserva, levando a overbooking e dificuldades. Perderam todas as reservas feitas com antecedência pelo que uma colega tem agora por função contactar agências para tentar recuperar as reservas, mas as reservas diretas dos clientes estão perdidas. (…);
21.º Sendo certo que os factos elencados na motivação da decisão sobre a matéria de facto correspondem a uma apertada síntese do que foram as declarações de cada uma das testemunhas;
22.º Dado que o Tribunal a quo funda a sua convicção relativa aos factos constantes de 61º e 64º, em especial, no testemunho de (…), não se compreende como o Recorrente pretende inverter o julgamento desta matéria ignorando o depoimento prestado pela testemunha mencionada;
23.º Para mais, socorrendo-se o Recorrente, para o efeito, do depoimento de pessoas como o ex-diretor da Requerida, (…), a quem, justamente, são imputados os comportamentos censuráveis em apreço, a par de outros comportamentos censuráveis;
24.º À semelhança do que ocorre com as outras duas testemunhas arroladas e efetivamente apresentadas pelo Requerente da providência cautelar, (…) continua a exercer cargos nas empresas do Requerente/Recorrente, foi nomeado pelos administradores destituídos, entre os quais se encontra o próprio Requerente/Recorrente e, tal como este, retém e não devolve documentos e informação pertencentes apenas à aqui Recorrida, assim como beneficiou, no período temporal correspondente ao mandato do Apelante, de transferências injustificadas de montantes pecuniários avultados, provindos de receitas da Recorrida (cfr. Pontos 27º e 47º dos factos provados). Em matéria de credibilidade, isenção e imparcialidade da testemunha em questão, tal como das demais arroladas e efetivamente apresentadas pelo Apelante, (…) e (…), a factualidade provada e não impugnada no processo é assaz reveladora;
25.º Mais, segundo a própria testemunha (…), em excerto sumariado na motivação da decisão de facto, descrevendo a utilização do sistema informático “Golf (…)” para gestão de reservas, faturação, etc., que pertence à (…) e requer licença, referiu não ter havido qualquer corte de acesso a este sistema da sua parte ou da sua equipa após 7 de fevereiro de 2025, ainda que tenha tido conhecimento de problemas de utilização do software e desligamentos físicos após essa data, nomeadamente no dia 11 de fevereiro. A este respeito mais referiu que a infraestrutura de TI do grupo é integrada, com segregação de acessos por privilégios de utilizador;
26.º À luz das regras da experiência e considerando a restante factualidade que ficou demonstrada no processo, sobretudo as condutas adotadas por (…), bem como pelos anteriores administradores e diretores da Recorrida, que continuam a ser trabalhadores das empresas do Recorrente – como acontece com (…) – é manifesto que, confrontado com o insucesso das tentativas de retoma do controlo da atividade da Apelada, não deixaria, tal lhe sendo ordenado pelo Recorrente, de cortar os acessos dos computadores da receção do golfe ao sistema “Golf (…)”, bem como o acesso dos trabalhadores ao correio eletrónico, por si geridos;
27.º Não procede a impugnação do Recorrente quanto à factualidade provada em 61º e 64º, já que tal matéria deve ser considerada provada, nos moldes constantes da decisão sub judice;
28.º No que respeita aos factos não provados, vertidos em a) a c) e g) a i), também não pode acompanhar-se a tese do Recorrente, quando aduz que o Tribunal recorrido ignorou os documentos que o Apelante juntou com o Requerimento Inicial ou quaisquer outros meios probatórios;
29.º Insiste o Recorrente, sem que tenha logrado fazer prova – o que não se estranha, por tal ser falso e descabido – em procurar transformar o presente diferendo num litígio entre, de um lado, o suposto “Grupo …”, que, na tese fantasiosa do Recorrente, seria liderado por si próprio, integrando a sociedade comercial Requerida e, de outro lado, o Fundo (…) Global;
30.º Da prova produzida decorre, com clareza, que esta lide opõe, a título individual, o Requerente/Recorrente, (…), titular de 100 ações, representativas de 0,014% do capital social da Requerida/Recorrida, e a própria Requerida/Recorrida, representada pela sua nova administração e sendo detida, indiretamente, em 99,97% pela sociedade (…) Limited (In Liquidation) (cfr. Pontos 1º e 34º dos factos provados); e que a Requerida não integra o invocado “Grupo …” supostamente liderado pelo Requerente, tal como não integra o Fundo (…) Global, antes estando focada no seu interesse social, sendo a nova administração da Requerida profissional e independente, pelo que orienta a sua atividade para a prossecução do interesse social da Requerida;
31.º Nada há a censurar ao Meritíssimo Juiz, quando entendeu que não se provaram quaisquer outros pretensos factos com interesse para a decisão da causa, nomeadamente os que o Recorrente agora impugna;
32.º Na passagem relativa à motivação da factualidade julgada não provada, o Meritíssimo Juiz fez notar, acertadamente, que:
Não se produziu qualquer prova credível quanto ao mencionado em a), para além do que se provou quanto à aquisição de empreendimentos hoteleiros por parte de empresas ligadas ao mencionado Grupo (…).
O facto referido em b) é conclusivo, não sendo passível de se considerar como provado.
Pese embora documentada nos autos a avaliação mencionada em 13º, não se produziu qualquer prova credível que permita concluir que tais valores são os efetivos valores de mercado atuais e que, por via disso, não se provou o mencionado em c).
(…)
Da prova produzida não resultou que os atuais administradores da sociedade requerida visem assegurar o interesse da Credora (…), S.A. e que esta enquanto veículo do Grupo (…) tenha estritamente interesses especulativos, concorrenciais e conflituantes com os interesses daquele grupo e da própria Requerida [não provado em g)] considerando os vários atos de gestão praticados pelos atuais administradores no sentido de manter a atividade, tendo ocorrido incremento no investimento.
Também não se provou o referido em h), quanto à intenção da Credora ao nomear os administradores das várias sociedades. Diz que teria intenção de se apropriar do Grupo … e dos respetivos ativos, por um valor muito inferior ao valor de mercado, fazendo um excelente negócio, sob o ponto de vista dos seus interesses e com intenção de revenda, de modo a obter lucros substanciais. Não se vê como a nomeação dos administradores, que têm mantido a atividade, pagando dívidas vencidas; assegurando o pagamento de impostos e contribuições e evitando a saída de rendimentos avultados, poderá levar a uma compra por baixo preço. Tal circunstância, a ocorrer, mais facilmente aconteceria num ambiente de liquidação em insolvência, momento em que a manutenção dos estabelecimentos em funcionamento seria extremamente difícil, o que acarretaria elevada perda de valor para os credores e para a própria devedora.
O facto referido em i), para além de conclusivo, atento o supra exposto, não se prova visto as condutas dos atuais administradores terem o sentido da manutenção da garantia patrimonial;
33.º Bem entendeu o Tribunal recorrido que não foi feita prova da matéria que o Recorrente pretende agora, sem fundamento, ver declarada provada, para além de a mesma matéria – a dar-se como provada, o que não se admite, antes se repudia – não ser passível, conforme antes se viu, de alterar a decisão em crise, de indeferimento da suspensão das deliberações sociais da Requerida: mormente, não foi feita qualquer prova de que a Credora (…), S.A. ou o Grupo (…) tenham tomado e exercido o controlo da Requerida/Recorrida ou das sociedades (…) Portugal, Unipessoal, Lda. (doravante, “…”), (…) Portugal III, Unipessoal, Lda. (doravante, “…”), (…) – Comércio Internacional e Serviços, Lda. (doravante, “…”), (…), S.A. (doravante, “…”) e (…) – Indústria Hoteleira, S.A. (doravante, “…”); nem de que a Credora (…), S.A. ou o Grupo (…) fazem parte dos órgãos de gestão da Requerida e das demais sociedades acima identificadas; nem, tampouco, que a Credora (…), S.A. ou o Grupo (…) controlam a administração da Requerida/Recorrida e das sociedades acima identificadas;
34.º O que foi apurado nos presentes autos é que os atuais administradores da Requerida e das sociedades acima identificadas são gestores independentes que se disponibilizaram a assegurar a gestão da Requerida e demais sociedades com zelo, diligência e em cumprimento das normas legais, tendo em vista a prossecução do interesse social da Requerida e das mencionadas sociedades;
35.º Quanto à (…), S.A., o que consta em b) da matéria não provada – que a Credora (…), SA tenha colocado em marcha um plano de tomada de controlo das sociedades do grupo (…), fazendo um uso manifestamente abusivo da garantia de penhor – traduz alegação ostensivamente conclusiva, conforme foi entendimento da 1ª instância, o que veda a sua integração nos factos provados, como deseja o Apelante;
36.º O Requerente/Recorrente não alegou factos, menos ainda apresentou prova, que permitisse indiciar que o penhor existente a favor da (…), S.A. sobre as ações da Requerida não é válido e eficaz, uma vez que, analisado o doc. 5 junto com o Requerimento Inicial, o requerimento executivo da (…), S.A., antes resultou evidenciado que:
(i) para além da cessão dos créditos do Banco (…) à (…), S.A., foi celebrado um Contrato de Financiamento com as Executadas (vide capítulo IV do aludido requerimento executivo);
(ii) aquando da cessão dos créditos do Banco (…) à (…), S.A., foi subscrito adicionalmente um denominado Acordo de Coordenação no âmbito do qual as Executadas reconheceram ser devedoras da (…), S.A. no montante de € 74.504.281,08, correspondente à dívida emergente dos créditos cedidos pelo Banco (…) e do Contrato de Financiamento e declararam que as garantias prestadas se mantinham válidas (vide artigos 143º a 145º do capítulo V do mencionado requerimento executivo); e
(iii) os penhores de 1º grau constituídos sobre 100.200 ações da Requerida mostram-se registados nos respetivos títulos que se encontram depositados no Banco (…) e foi averbada a sua transmissão a favor da (…), S.A. (vide artigos 68º e 69º do capítulo II do dito requerimento executivo);
37.º Da factualidade dada como provada e não provada, considerando os meios de prova ponderados e corretamente apreciados pelo Tribunal, decorre que a documentação junta pelo Requerente do procedimento cautelar e agora Recorrente, não demonstra os propósitos que o Requerente, aqui Apelante, assaca à sociedade (…), S.A. e à nova administração da Requerida, que voltam a impugnar-se, com veemência, por serem falsos e infundados;
38.º É, também, infundada, a suposta desconsideração, no tocante ao facto não provado c), da dita avaliação junta como doc. 7 do Requerimento Inicial: a mera leitura do doc. 7 junto pelo aqui Apelante permite concluir que o documento em questão é uma avaliação solicitada pelo Requerente em nome e representação da (…), U.K. Limited (cfr. pág. 2), elaborada de acordo com as instruções do mesmo Requerente (cfr. pág. 5), for financing purposes (cfr. pág. 8), ou seja, com a finalidade de obter financiamento, e, logo, condicionada e não isenta. Além do mais, o doc. 7 não contempla os ónus existentes sobre os bens em apreço, nem se os mesmos se encontram ou não arrendados (cfr. ponto 5 da pág. 12);
39.º A avaliação constante do doc. 7 não é fidedigna, razão pela qual andou bem a 1ª instância ao considerar não provadas as alegações do Requerente;
40.º Decorre, ainda, da documentação que a Requerida juntou aos autos com a Oposição ao procedimento cautelar – cfr. doc. 2 junto com a Oposição, que aqui dá por reproduzido, correspondente à Contestação aos Embargos apresentada pela (…), S.A. na ação executiva com o n.º 1741/24.2T8LLE, que corre termos no Juízo de Execução de Loulé - Juiz 2 e, em particular, os respetivos artigos 158º a 161º e os docs. 1 e 2 anexos – e foi, desde logo, alegado pela Requerida (cfr. artigos 38º a 43.º da Oposição), que o valor dos imóveis das sociedades é matéria controvertida;
41.º Nos docs. 1 e 2 anexos ao doc. 2 junto com a Oposição da Apelada, que constituem dois relatórios de avaliação, são atribuídos aos imóveis penhorados valores muito inferiores aos que o Recorrente indica. Por exemplo, ao campo de golfe de São (…) os ditos relatórios atribuem os valores de € 13.900.000,00 (treze milhões e novecentos mil euros), no caso do doc. 1 (relatório de avaliação da …, pág. 7) e de € 7.510.000,00 (sete milhões e quinhentos e dez mil euros), no caso do doc. 2 (relatório de avaliação da …, pág. 3);
42.º Daí que a aqui Recorrida tenha impugnado, em 1.ª instância, a suposta avaliação dos imóveis aludida pelo aqui Recorrente e constante do mencionado doc. 7, avaliação essa que, por falta de verosimilhança e credibilidade, o Tribunal, acertadamente, rejeitou, nos seguintes termos:
Pese embora documentada nos autos a avaliação mencionada em 13º, não se produziu qualquer prova credível que permita concluir que tais valores são os efetivos valores de mercado atuais e que, por via disso, não se provou o mencionado em c);
43.º Contrariamente ao alegado pelo Recorrente nas Conclusões do recurso (cfr. Pontos 21 e 22 das Conclusões), é manifesto que a 1ª instância considerou não provado o mencionado em c) não apenas porque a avaliação dos imóveis constante do mencionado doc. 7 não é actual mas também porque “não se produziu qualquer prova credível que permita concluir que tais valores são os efetivos valores de mercado”;
44.º Na falta da mencionada prova credível e conclusiva, nada habilitava a 1ª instância a privilegiar o relatório produzido, para mais no acima indicado contexto, pela (…), em detrimento do relatório da (…) e do relatório da (…); logo, os referidos documentos 5 e 7 juntos com o Requerimento Inicial não foram ignorados, tendo sido, ao invés, objeto de valoração pelo Tribunal a quo;
45.º Da análise da prova testemunhal e documental oferecida pelo Recorrente em 1ª instância – bem como da documentação junta por este em sede recursiva – retira-se que os elementos probatórios em causa não permitem que os factos provados impugnados pelo Apelante possam ser dados como não provados, tal como não permitem que os factos dados como não provados e impugnados pelo Apelante possam passar a integrar a matéria factual fixada no processo, dado que não foram, de todo, demonstrados;
46.º Inversamente ao que o Apelante alega, a atuação da administração da sociedade comercial Recorrida em exercício de funções sempre prosseguiu, e prosseguirá, o interesse social da Requerida, procurando encontrar forma, lícita, de regularizar e honrar os respetivos compromissos, de proteger e valorizar os seus bens, de proteger a posição de credores, trabalhadores e accionistas e de cumprir a Lei, tendo sido esse o propósito dos atuais administradores da Requerida quando aceitaram as suas designações e o propósito que se mantém na presente data;
47.º Pretende o Recorrente juntar, na fase de recurso, quatro novos documentos, escudando-se, segundo aduz, nos termos conjugados do n.º 1 do artigo 651.º e no artigo 425.º, ambos do CPC, para justificar a impugnação da matéria factual e a aplicação do direito aos factos provados;
48.º No entanto, não é de mera junção de documentos que se trata, antes de encapotada e inadmissível alteração da causa de pedir sem o acordo da Requerida/Recorrida e contra a vontade expressa desta, atendendo a que o aditamento dos pretensos novos factos perturba objetivamente a instrução, discussão e julgamento do pleito, exigindo, ademais, no caso da respetiva admissão – que apenas por dever de patrocínio se conjetura – a salvaguarda da oportunidade de exercer contraditório pleno, da qual a Recorrida não prescinde, incluindo para efeitos da junção de documentos essenciais à compreensão do negócio de venda do campo de golfe de São (…) pela sociedade (…), S.A. e respetiva motivação e do apuramento dos montantes globais envolvidos, da audição dos intervenientes e de outras testemunhas, além do depoimento dos administradores da Apelada e da (…), S.A., por forma a contextualizar devidamente o negócio e assegurar o esclarecimento da verdade material;
49.º A Apelada não pode aceitar a integração, na fase de recurso, de nova matéria, por a mesma extravasar o âmbito e a tramitação simplificada própria do procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais e porque, concomitantemente, a referida matéria não corresponde a factualidade alegada e apreciada na sentença recorrida, para efeitos da requerida suspensão das deliberações sociais tomadas em assembleia que se realizou a 13-01-2025;
50.º Em abono da tese sufragada pela Apelada, pronunciou-se o Supremo Tribunal de Justiça, entre outros, em Acórdão datado de 29-02-202443, assim como, em data anterior, já a Relação de Lisboa tinha seguido a mesma orientação, v.g., em Acórdão proferido a 19-11-2015;
51.º Na doutrina processualista, vários autores sustentam a mesma tese, segundo a qual os recursos ordinários não visam conhecer de novo da causa, mas antes controlar a decisão recorrida, já que o Tribunal de recurso não reaprecia ou reexamina a causa, antes aprecia ou repondera a decisão sobre a causa: os recursos seriam de reponderação, não de reexame. Por isso, os poderes da 2ª instância são, na essência, circunscritos às questões decididas pelo Tribunal a quo (salvo quanto às de conhecimento oficioso) e ao acervo fáctico com base no qual este decidiu;
52.º Em consonância com a noção de que os recursos visam modificar decisões e não criar soluções sobre matéria nova, militam a estabilidade da instância e preclusão, princípios processuais que desaconselham o conhecimento de factos supervenientes pelo tribunal de recurso;
53.º Atento o que, a nova pretensa factualidade alegada pelo Recorrente, assim como os documentos juntos com o recurso, não devem ser admitidos, com todas as legais consequências;
54.º Sem conceder seja o que for a respeito da mencionada inadmissibilidade da nova pretensa factualidade alegada pelo Recorrente e dos documentos juntos com o recurso, é forçoso concluir, inversamente ao que afirma o Recorrente – designadamente, no Ponto 24 das Conclusões – que os documentos juntos por este, à semelhança dos dois outros documentos que já tinha junto e que chama à colação no recurso (os docs. 5 e 7, anexos ao Requerimento Inicial), em nada contendem ou afetam a matéria assente na sentença nem a factualidade aí julgada não provada;
55.º Não estando aqui em causa a eventual destituição dos atuais administradores da Recorrida – nem aliás existe motivo que o justifique – não faz sentido que comportamentos ulteriores à nomeação destes, ocorridos mais de cinco meses volvidos, pudessem contaminar retroativamente com uma putativa ilicitude o ato deliberativo que os designou e, menos ainda, pudessem invalidar a justa destituição dos anteriores administradores, o aqui Recorrente e seus filhos, repondo-os em funções, com as dramáticas consequências para a sociedade recorrida que foram antecipadas pelo Tribunal a quo;
56.º Admitir essa absurda interpretação abriria a porta a que, até ter expirado o prazo para apresentação de Alegações de recurso, pudessem ser invocados factos novos e juntos novos documentos – porventura, fruto da mera discordância de um acionista em relação a atos praticados pelos administradores no normal exercício das suas funções de gestão – legitimando, por essa via, a admissão de tutela cautelar em casos em que o Requerente não preencha, até à data da sentença, os pressupostos para decretamento do procedimento cautelar especificado em apreço, desde que, na fase recursória e perante um Tribunal de recurso, este se proponha demonstrar que, após a sentença, finalmente estarão reunidos os requisitos factuais e jurídicos para que o Tribunal Superior inverta a decisão tomada em 1ª instância, em colisão, entre outros princípios e normas jurídicas, com o estipulado no n.º 1 do artigo 380.º do CPC;
57.º Esta solução introduziria um inadmissível grau de imprevisibilidade e de incerteza na vida mercantil, que não encontra nem na letra nem no escopo da lei qualquer correspondência mínima, em violação do disposto no artigo 9.º do Código Civil;
58.º Sobre a não admissão de documentos, fruto da sua intempestividade e falta de pertinência face à matéria probatória, já se pronunciaram, bastas vezes, os Tribunais Superiores (vide, por todos, o sumário de aresto prolatado a 23-01-2023 pelo Tribunal da Relação do Porto);
59.º Ressalvando o que se enunciou, sempre se dirá que, nos Pontos 20 a 33 das Conclusões, o Apelante volta a deturpar fantasiosamente o sucedido, sob a aparência de um putativo volte-face respeitante à matéria julgada (e bem) como não provada, pois são totalmente falsas e impugnam-se, categoricamente, as alegações e imputações que o Recorrente aí produz: não é verdade que a (…), S.A., o Grupo (…) ou quaisquer outras sociedades se tenham apropriado abusivamente de património da Apelada ou sequer da sociedade (…), S.A.; não é verdade que a administração da Apelada ou que a administração da sociedade (…), S.A. tenha alienado património por montante inferior ao correspondente valor real; assim como não é verdade que os administradores nomeados atuem em conflito de interesses com a Recorrida ou que privilegiem os seus próprios interesses ou os interesses da (…), S.A. em detrimento do interesse social da Recorrida ou do interesse social das demais sociedades por si administradas; nem é verdade que os administradores da Recorrida sejam manipulados ou controlados por terceiros ou por interesses de terceiros, já que os interesses que sempre nortearam, e norteiam, a atual administração da Apelada, são o respeito pela lei e a prossecução do interesse social desta sociedade e das demais sociedades por si administradas, que, de resto, o Recorrente e os demais administradores destituídos deixaram endividadas e descapitalizadas, obrigando a nova administração a atuação diligente e célere, visando impedir a então iminente insolvência;
60.º O que se encontra comprovado no processo não corrobora a tese descabida do Recorrente, antes evidencia o trabalho de reestruturação e defesa do interesse social e do património da Apelada e demais sociedades administradas, no qual se enquadra a atuação objecto da documentação que o Recorrente ora pretende juntar;
61.º Foi no intuito de prosseguir o interesse social da Recorrida e demais sociedades por si administradas, procurando encontrar forma, lícita, de regularizar e honrar os respetivos compromissos, de proteger e valorizar os seus bens, de proteger a posição de credores, trabalhadores e accionistas e de cumprir a Lei, que os atuais administradores da Recorrida e demais sociedades aceitaram as suas designações e exercem os seus mandatos, intervindo, v.g., no ato formalizado no documento ora apresentado pelo Apelante;
62.º O ato formalizado no documento ora apresentado pelo Apelante não constitui apropriação abusiva de património da Apelada ou sequer da sociedade (…), S.A. pela (…), S.A., pelo Grupo (…) ou por qualquer outra entidade, continuando a ser falso que a atual administração da Apelada ou da sociedade (…), S.A. tenha alienado património por montante inferior ao correspondente valor real; assim como não é verdade que o ato em apreço tenha sido formalizado em conflito de interesses com a Recorrida ou com a sociedade (…), S.A. ou que os atuais administradores tenham privilegiado os seus próprios interesses ou os interesses da (…), S.A. em detrimento do interesse social da Recorrida ou das demais sociedades por si administradas. O ato formalizado no documento ora apresentado pelo Apelante constitui, isso sim, ato de prossecução do interesse social da Recorrida e demais sociedades administradas pela atual administração e foi determinado pela situação em que o Recorrente e os demais administradores destituídos deixaram as sociedades em apreço, endividadas, descapitalizadas e à beira da insolvência;
63.º Pelo que, mesmo que a sua junção viesse a ser permitida, os quatro documentos apresentados pelo Recorrente não são passíveis de inverter a decisão recorrida, incluindo quanto aos factos julgados provados e não provados;
64.º A acrescer, os ditos quatro documentos e a pretensa nova factualidade tampouco foram objecto do contraditório próprio da 1ª instância ou do cotejo direto com os restantes meios de prova, estando totalmente despojados do contexto fáctico respetivo, o que imporia, pelo menos, a audição dos intervenientes e de outras testemunhas, o depoimento dos administradores da Apelada e da (…), S.A. e a junção de novos documentos;
65.º Mantêm-se, assim, válidas, não obstante a venda ao Grupo (…), por preço não inferior ao valor real, de um dos ativos mencionados em 9.º dos factos provados, as considerações tecidas na sentença, em particular no que tange à matéria não provada e impugnada na Apelação, os pretensos factos vertidos em a) a c) e g) a i), ou seja:
Não se produziu qualquer prova credível quanto ao mencionado em a) 47, para além do que se provou quanto à aquisição de empreendimentos hoteleiros por parte de empresas ligadas ao mencionado Grupo (…).
O facto referido em b) é conclusivo, não sendo passível de se considerar como provado.
Pese embora documentada nos autos a avaliação mencionada em 13º, não se produziu qualquer prova credível que permita concluir que tais valores são os efetivos valores de mercado atuais e que, por via disso, não se provou o mencionado em c).
(…).
Da prova produzida não resultou que os atuais administradores da sociedade requerida visem assegurar o interesse da Credora (…), S.A. e que esta enquanto veículo do Grupo (…) tenha estritamente interesses especulativos, concorrenciais e conflituantes com os interesses daquele grupo e da própria Requerida [não provado em g)], considerando os vários atos de gestão praticados pelos atuais administradores no sentido de manter a atividade, tendo ocorrido incremento no investimento.
Também não se provou o referido em h), quanto à intenção da Credora ao nomear os administradores das várias sociedades. Diz que teria intenção de se apropriar do Grupo (…) e dos respetivos ativos, por um valor muito interior ao valor de mercado, fazendo um excelente negócio, sob o ponto de vista dos seus interesses e com intenção de revenda, de modo a obter lucros substanciais. Não se vê como a nomeação dos administradores, que têm mantido a atividade, pagando dívidas vencidas; assegurando o pagamento de impostos e contribuições e evitando a saída de rendimentos avultados, poderá levar a uma compra por baixo preço. Tal circunstância, a ocorrer, mais facilmente aconteceria num ambiente de liquidação em insolvência, momento em que a manutenção dos estabelecimentos em funcionamento seria extremamente difícil, o que acarretaria elevada perda de valor para os credores e para a própria devedora.
O facto referido em i), para além de conclusivo, atento o supra exposto, não se prova visto as condutas dos atuais administradores terem o sentido da manutenção da garantia patrimonial;
66.º Resulta, também, da sentença, não tendo sido objeto de impugnação, que:
Não se produziu qualquer prova quanto à circunstância dos atuais administradores, nomeados pelas deliberações aqui em crise, dificultarem ou impedirem os esforços feitos pelas sociedades devedoras e pelo Requerente de reunir capital para proceder ao pagamento da Credora. Pelo contrário, o que poderá dificultar tais diligências do Requerente será o mencionado em 28º, 29º, 30º, 31º, 32º, 33º, 34º, 35º, 36º e 37º visto o controlo da sociedade (…) Limited (In Liquidation) não caber ao ora Requerente, não podendo por isso praticar negócios em nome desta sociedade, razão pela qual se considerou não provado o referido em d), f) e j);
67.º Sem prejuízo de entender não ser admissível a alegação de putativa factualidade superveniente à sentença, nem a junção, com a pretensão recursiva, de quatro novos documentos, considera a Recorrida que, mesmo que tal factualidade se provasse – o que não se concede – a mesma não seria suscetível de fazer revogar ou alterar a decisão de indeferimento da providência cautelar requerida, pois continuariam a não se verificar os requisitos legais, positivos (n.º 1 do artigo 380.º do CPC) e negativo (n.º 2 do artigo 381.º do CPC), que a lei adjetiva impõe para o deferimento dessa suspensão;
68.º Não corresponde à realidade o que se afirma nos Pontos 33 e 34 das Conclusões do Recorrente, não ocorrendo motivos válidos que imponham ao Tribunal de recurso alterar a decisão do Tribunal recorrido no que toca ao julgamento da matéria de facto, o que importa, no caso em análise, que não pode, igualmente, ser posta em causa a interpretação e aplicação do Direito à factualidade provada;
69.º Em linha com o que foi enfatizado no sumário de Acórdão da Relação de Guimarães de 02-11-2017, temos que:
I. O uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª Instância sobre a matéria de facto só deve ser usado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados, nomeadamente por os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, imporem uma conclusão diferente (prevalecendo, em caso contrário, os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova).
II. O recorrente que pretenda contrariar a apreciação crítica da prova feita pelo Tribunal a quo terá de apresentar razões objectivas para contrariar a prevalência dada a um meio de prova sobre outro de sinal oposto, ou o maior crédito dado a um depoimento sobre outro contrário, não sendo suficiente para o efeito a mera transcrição de excertos de alguns dos depoimentos prestados, já antes ouvidos pelo julgador sindicado e ponderados na sua decisão recorrida (artigo 640.º do C.P.C.).
III. Por força dos princípios da utilidade, da economia e da celeridade processual, o Tribunal ad quem não deve reapreciar a matéria de facto quando o(s) facto(s) concreto(s) objecto da impugnação for(em) insusceptível(eis) de, face às circunstância próprias do caso em apreciação e às diversas soluções plausíveis de direito, ter(em) relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe ser inútil (artigos 2.º, n.º 1 e 130.º, ambos do C.P.C.).
IV. Dependendo a apreciação do recurso pertinente à interpretação e aplicação do Direito ao caso concreto, do prévio sucesso do simultâneo recurso interposto sobre a matéria de facto fixada, sendo este rejeitado, fica necessariamente prejudicado o conhecimento daquele primeiro (artigo 608.º, n.º 2, I parte, aplicável ex vi do artigo 663.º, n.º 2, ambos do C.P.C.);
Em suma: nada há a alterar quanto ao julgamento da matéria de facto colhida em 1ª instância, o que conduz à improcedência simultânea quer do recurso sobre a matéria de facto, quer do recurso sobre a interpretação e aplicação do Direito à factualidade provada, dado o segundo depender da procedência do primeiro, conforme reconhece o próprio Recorrente;
Caso assim não se entenda – o que por mero dever de patrocínio se conjetura – sempre se dirá que:
71.º A Recorrida discorda da argumentação apresentada pelo Apelante, por entender que não só não existe fundamento para pôr em causa o julgamento relativo à matéria de facto, como por considerar que ainda que fosse alterada a factualidade dada como provada, a decisão relativa ao presente procedimento cautelar ter-se-ia de manter;
72.º Perscrutada a sentença, ressalta a clareza, ponderação e rigor, quer na apreciação dos factos, quer na aplicação do Direito ao caso concreto, fruto do labor do Tribunal de 1ª instância: as questões suscitadas no recurso encontram-se devidamente enunciadas e resolvidas na decisão aqui impugnada, pouco mais restando à Recorrida senão dar por reproduzido o teor da douta sentença;
73.º Não pode aceitar-se, desde logo, a conclusão de que se encontram satisfeitos os requisitos estabelecidos no artigo 380.º do CPC para o decretamento da providência de suspensão de deliberação social;
74.º Em primeiro lugar, porque a deliberação social em apreço não padece de ilegalidade ou de quaisquer outros vícios que permitam determinar a respetiva suspensão;
75.º Compete invocar, neste ponto, o facto dessa Veneranda Relação de Évora (2.ª Secção Cível), ter-se pronunciado, em Decisão Singular já transitada em julgado, proferida a 07-04-2025, mercê de recurso interposto no Processo n.º 915/24.0T8OLH.E1 58 (ação especial de convocação de assembleia de sócios), acerca, precisamente, da convocação da Assembleia da Recorrida de 13-01-2025, cujas deliberações o Recorrente pretende ver suspensas;
76.º Igualmente infundadas, são as alegações que constam dos Pontos 35 a 38 das Conclusões do Recorrente, já que este preconiza uma interpretação errada do convencionado no artigo 7.º, n.º 5, do estatuto da Requerida, que não exige outra forma de comunicação aos acionistas para além da publicação, nem impõe a substituição da publicação por carta registada com aviso de receção, ou por correio eletrónico com recibo de leitura;
77.º Resulta evidente da letra da norma estatutária invocada, que está em causa uma mera faculdade («pode ser») e não uma exigência, pelo que quem convoca a assembleia geral da Requerida pode optar entre a publicação do aviso convocatório (ao abrigo do artigo 377.º, n.º 2, do CSC e do artigo 7.º, n.º 4, do estatuto social da Requerida 60) e o seu envio por carta registada com aviso de receção ou por correio eletrónico com recibo de leitura para os acionistas que o consentirem previamente (conforme admitido pelo artigo 7.º, n.º 5, do estatuto da Requerida);
78.º Na situação que nos ocupa, a convocatória da assembleia geral da Requerida de 13-01-2025 foi oportuna e devidamente publicada em https://publicacoes.mj.pt (disponível desde 12-12-2024), conforme doc. 1, junto com a Oposição;
79.º Ademais, o aqui Recorrente teve conhecimento prévio da convocação da assembleia geral da Requerida de 13-01-2025, pois, anteriormente ao início da sessão, o Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Requerida de 13-01-2025 – nomeado por decisão judicial proferida no Processo n.º 915/24.0T8OLH do Juízo de Comércio de Olhão, Juiz 2, a que se aludiu supra – recebeu, por e-mail, cópia em PDF da carta que lhe foi dirigida e assinada pelo Requerente, como comprova o doc. 3, junto pelo próprio Requerente com o seu petitório inicial. Donde se retira que foi o Requerente/Recorrente que optou, livre e conscientemente, por não estar presente nem se fazer representar na assembleia geral da Requerida de 13-01-2025;
80.º Ao replicar, em fase de recurso, a sua inconsistente tese – ensaiada no capítulo III) i. do Requerimento Inicial – o Recorrente volta a incorrer em manifesta e censurável postura de abuso do direito, na modalidade de venire contra factum proprium, pelo que tal argumentação nunca poderá proceder, denotando má-fé processual;
81.º Inexiste qualquer vício de procedimento que pudesse determinar a invalidade das deliberações da Requerida de 13-01-2025, assim como não ocorre violação dos preceitos normativos que o Recorrente convoca ou de outros. O mesmo se aplica quanto ao alegado nos Pontos 39 e 40 das Conclusões do recurso, quanto à putativa, mas inexistente, anulabilidade da deliberação impugnada;
82.º Inversamente ao que defende o Recorrente, não se vislumbra qualquer facto alegado nos autos, menos ainda comprovado, que permita supor que os administradores da Recorrida nomeados pelas deliberações de 13-01-2025 não atuaram ou não continuarão a atuar conforme a Lei;
83.º Também não se provou que a (…), S.A. fez um uso manifestamente abusivo da garantia de penhor pois, conforme deflui do teor do doc. 3 junto com o Requerimento Inicial, a (…), S.A. limitou-se a exercer o direito de voto relativamente à Requerida, não estando em causa qualquer apropriação das 700.200 ações dadas em penhor;
84.º Repudia-se, também, a alegação segundo a qual está verificado o requisito da existência de dano, menos ainda dano considerável (Pontos 41 a 47 das Conclusões do Recorrente);
85.º Conforme se encontra enunciado e devidamente justificado na sentença, não se provou, nem é verdade, que a deliberação aqui em crise mais não visou que a tomada de controlo de mais uma das empresas do Grupo (…) por parte da (…), tomada de controlo essa que importa um manifesto conflito de interesses no próprio âmbito dos processos executivos que a (…) desencadeou contra as empresas do Grupo … (pois que, directa e indirectamente através dos administradores por si nomeados, passa a figurar em tais processos como Exequente e Executada), assim como não são se provaram, nem são verdadeiras, as restantes atuações que o Requerente imputa, sem qualquer fundamento, à (…), S.A. e à atual administração da Requerida;
86.º Pode ler-se na sentença:
Também alega o Requerente que as deliberações em crise apenas servem os interesses da credora, existindo o interesse de apropriação das várias sociedades que integram o denominado gripo (…), por um valor muito inferior ao valor de mercado, obtendo um ganho ilegítimo.
A este respeito, para além de não se terem provado factos concretos relevantes para apreciar este alegado dano apreciável, desde logo se considera ser destituído de sentido que as deliberações em crise permitam a apropriação da Requerida pela Credora;
87.º Considerando que não se demonstraram, nem existem, os supostos danos invocados pelo aqui Recorrente, é notório que não se mostra preenchido o requisito do periculum in mora, o que sempre conduziria ao indeferimento da providência cautelar requerida;
88.º O que ficou sobejamente provado, foram os efeitos nocivos e danosos da gestão da sociedade Recorrida pelo Recorrente e pelos demais administradores destituídos, como consta assinalado em diversas passagens da sentença, como a que se transcreve de seguida:
(…) apurou-se que a administração assegurada pelo Requerente e demais administradores destituídos não assegurou a preparação, aprovação e registo das contas por vários anos (provado em 19º). Tal circunstância constitui um risco de liquidação administrativa (por falta de preparação, auditoria, aprovação e registo das contas relativas aos exercícios de 2021, 2022 e 2023, nos termos do disposto no artigo 143.º, alínea a), do Código das Sociedades Comerciais).
A existência de passivos avultados, nomeadamente perante Segurança Social e Administração Tributária (provado em 57º e 58º), implicam um elevado risco de insolvência e acentuada perda da garantia patrimonial, levando à desvalorização do estabelecimento, da marca e à perda de reputação e clientela.
Como se provou, estes riscos passaram a atenuar-se após o início da gestão dos negócios da requerida pelos atuais administradores.
Por outro lado, o Requerente alega que, estando pendentes vários litígios entre a Credora (…), S.A. e as várias sociedades do denominado “Grupo (…)”, entre as quais a Requerida, mantendo-se as deliberações em crise, poderia ocorrer uma confusão de interesses entre a Exequente e as sociedades Executadas, protegendo-se os interesses da primeira em detrimento dos interesses das segundas. (…).
A este respeito não se fez prova, ou sequer se alegou, que tenha ocorrido, em concreto, uma qualquer situação em que administradores nomeados à Requerida tenham praticado quaisquer atos em ações judiciais no sentido de ofender os interesses da Requerida. De resto, ainda que a Requerida, através da atuação dos atuais administradores, deixasse de defender as suas posições jurídicas nos autos de execução mencionados em 18.º, nem todas as sociedades devedoras e executadas são representadas pelos atuais administradores da Requerida. Assim, conforme afirma a Requerida, os alegados embargos de executado deduzidos pelas demais embargantes, incluindo a (…) Portugal, S.A., aproveitariam às demais executadas, incluindo à aqui Requerida, pelo que o argumento esgrimido pelo Requerente não pode colher. (…);
89.º A acrescer, o Recorrente e demais administradores destituídos retiveram e retêm os documentos e informação pertencentes à Requerida, conforme se comprova no Ponto 27º dos factos provados e, ainda, com enorme gravidade, o Recorrente e demais administradores destituídos ordenaram ou permitiram o desvio de receitas da atividade da Requerida em benefício do Recorrente, demais administradores destituídos e pessoas e entidades relacionadas e, logo, em detrimento da Requerida, tal como provado em 42º a 55º;
90.º A sentença recorrida não violou qualquer disposição legal aplicável, em particular as identificadas pelo Recorrente: a realidade é que não foi produzida qualquer prova que sustentasse as alegações do agora Recorrente, pelo que mais não resta senão deixar incólume a decisão judicial em análise, que concluiu, fundadamente, não estarem preenchidos os pressupostos para o decretamento da providência cautelar;
91.º Sem nada conceder quanto à alegada, mas inexistente, ilegalidade das deliberações da Requerida de 13-01-2025 ou quanto à alegada, mas inexistente, suscetibilidade de verificação de dano decorrente da respetiva execução, e considerando (i) o incumprimento de obrigações da Requerida no quadro da sua anterior gestão, incluindo perante a Autoridade Tributária e perante a Segurança Social, fornecedores e credores; (ii) a não aprovação nem publicação das contas da Requerida nos últimos 3 (três) anos; (iii) a necessidade de obter financiamento destinado a solver as dívidas da Requerida, situações estas imputáveis aos anteriores administradores e à gestão desastrosa que nos últimos anos têm conferido à Requerida, é evidente que a eventual suspensão da execução das deliberações da Requerida de 13-01-2025 causaria prejuízo manifestamente superior à respetiva execução, incluindo à Requerida, situação salvaguardada pelo n.º 2 do artigo 381.º do CPC que, uma vez mais, se invoca;
92.º Porquanto tal matéria foi sopesada na sentença sob escrutínio e não foi sequer impugnada nas Conclusões do recurso, ficou inequivocamente demonstrado que a eventual suspensão da execução das deliberações da Requerida de 13-01-2025 causaria prejuízo manifestamente superior à respetiva execução, o que sempre bastaria para recusar o decretamento da providência;
93.º O Meritíssimo Juiz faz notar, nesse âmbito:
Acresce que, considerando os factos de que partimos, apura-se que a eventual suspensão da execução das deliberações da Requerida de 13 de janeiro de 2025 causaria prejuízo manifestamente superior à respetiva execução, incluindo à Requerida. Esta conclusão decorre da prova de que existia confusão entre as receitas obtidas pelas várias sociedades, todas reunidas numa única conta (provado em 42º), ato de gestão muito duvidoso e incompreensível quanto ao seu fim, passando ainda pela prova de que de tal conta saíram valores muito avultados, para as pessoas e empresas indicadas nos factos 44º a 55º, os quais não têm aparentemente uma justificação razoável (tanto que essa explicação não foi apresentada nos presentes autos).
A anterior administração da Requerida permitiu ainda que se acumulassem dívidas elevadas, em especial à Segurança Social e Administração Tributária (provado em 57º e 58º), para além de dívidas a fornecedores (provado em 59º).
Atento o exposto, encontra-se suficientemente indiciado que a eventual suspensão da execução das deliberações da Requerida de 13 de janeiro de 2025 causaria prejuízo manifestamente superior à respetiva execução, o que também seria suficiente para afastar o decretamento da providência.
Nestes termos, julga-se não estarem preenchidos quaisquer dos pressupostos para o decretamento da providência requerida;
94.º Pelos motivos enunciados, não existe fundamento para alterar ou revogar a decisão provinda da 1ª instância, antes deve a sentença ser integralmente confirmada por esse Venerando Tribunal da Relação, negando provimento ao recurso.

V. PEDIDO

Por todo o exposto, requer que esse Venerando Tribunal ad quem julgue o recurso integralmente improcedente, negando-lhe provimento e, em conformidade, confirme a decisão judicial proferida pelo Tribunal a quo, com as legais consequências.
Pois só assim se fará JUSTIÇA!»

1.4.
O tribunal recorrido recebeu o recurso.
Corridos os vistos em conformidade com o disposto no artigo 657.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, cumpre decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO
II.1.
As conclusões das alegações de recurso (cfr. supra I.2) delimitam o respetivo objeto de acordo com o disposto nas disposições conjugadas dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, ambos do CPC, sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2 e artigo 663.º, n.º 2, ambos do CPC), não havendo lugar à apreciação de questões cuja análise se torne irrelevante por força do tratamento empreendido no acórdão (artigos 608.º, n.º 2, e 663.º, n.º 2, do CPC).

II.2.
No caso as questões que cumpre apreciar são as seguintes:
1 – Questão prévia: avaliar da (in)admissibilidade dos documentos juntos em sede de recurso.
2 – Avaliar se houve erro de julgamento de facto e de direito.

II.3.
FACTOS
II.3.1.
O tribunal a quo julgou provada a seguinte factualidade:
«1.º O Requerente (…) é acionista da sociedade Requerida, sendo titular de 100 ações representativas do capital social da Requerida Sociedade Hoteleira (…), S.A., correspondendo a 0,014% do capital social da Requerida e, para além de outras sociedades, foi presidente do conselho de administração da sociedade Requerida.

2.º A Requerida integra um grupo de empresas denominado “Grupo … Portugal”, o qual apresenta a seguinte configuração de sociedades e participações, conforme o seguinte quadro:
(…)
3.º A Credora (…), S. A. participou e exerceu o direito de voto na assembleia geral de 13 de janeiro, na sequência de convocatória da assembleia geral da Requerida publicada em https://publicacoes.mj.pt, disponível desde 12/12/2024, conforme doc. 1, junto com a oposição.

4.º O Requerente teve conhecimento de que foi realizada uma assembleia geral extraordinária da Requerida no passado dia 13 de janeiro tendo enviado comunicação ao Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Requerida, nomeado por decisão proferida nos autos do processo n.º 915/24.0T8OLH, conforme doc. 3, junto com o requerimento inicial.

5.º Conforme resulta da certidão de registo comercial da sociedade Requerida, no dia 13 de janeiro de 2013 foram apresentados dois registos: (i) Destituição do cargo de administrador, com efeitos imediatos e com justa causa, (…), (…), (…) e (…); (ii) Nomeação como membros do Conselho de Administração para o mandato de 2025/2027: nomeação de (…) para o cargo de Presidente do Conselho de Administração, nomeação de (…) para o cargo de Vogal do Conselho de Administração e nomeação de (…) para o cargo de Vogal do Conselho de Administração; (iii) Eleição do Fiscal Único da Sociedade para o mandato 2025-2027: (…) Associados, SROC, S.A. como Fiscal Único Efectivo e (…) como Fiscal Único Suplente.

6.º Os estatutos da Requerida, a propósito da constituição, composição, convocação e funcionamento da assembleia geral, dispõem, no seu artigo 7.º, que: “5. e todas as acções forem nominativas, pode ser convocada a Assembleia Geral apenas por carta registada com aviso de receção, ou por correio eletrónico com recibo de leitura para os accionistas que o consentirem previamente, enviado com a antecedência de, pelo menos, vinte e um dias»”, conforme documento n.º 4, junto com o requerimento inicial.

7.º A (…) publicitou em página de internet a seguinte notícia, por referência a 30 de junho de 2023: «A (…), gestora europeia de ativos integrados verticalmente, concluiu a aquisição dos principais ativos do Grupo (…). Os ativos, agora na posse de fundos geridos pela (…), incluem três hotéis de (…) – (…), (…) e (…), juntamente com cinco campos de golfe emblemáticos de (…) – (…), (…), (…), (…) e (…). O negócio engloba ainda o (…) e dois hotéis na (…): o (…) e o (…). O hotel (…), no entanto, não está incluído no negócio e continuará a ser propriedade da (…), S.A..
“Adquirida em nome de fundos geridos pela (…), a compra dos hotéis (…) aumenta significativamente os ativos imobiliários sob gestão da (…) e valoriza o potencial robusto que vemos neste destino altamente atrativo”, explica (…), Principal dos Fundos (…), acrescentando que “Estamos muito satisfeitos que o sr. (…), um pioneiro no desenvolvimento de (…), nos tenha confiado a aquisição da maioria dos ativos da (…) em Portugal. Estamos empenhados em continuar a trabalhar com uma marca de grande tradição e significado para o país. Ao colocar os ativos (…) sob nossa gestão, juntamente com a anterior aquisição de (…), expressamos a nossa dedicação inabalável em posicionar (…) e Portugal como um destino líder global”», conforme publicação nesta data disponível em https://www.(...).pt/artigo/fundos-(...)-global-concluem-aquisicao-dos-hoteis-(...)/
8.º O jornal económico on-line (…) publicou notícia relativa ao grupo (…) donde resulta o seguinte excerto: «Os fundos do grupo (…) fecharam, esta terça-feira, negócio com espanhola (…) para a compra do resort de luxo (…) e Golf, localizado em (…), no Algarve, com um investimento de 400 milhões de euros. A transação – realizada em parceria com uma construtora portuguesa – tinha sido comunicada à Autoridade da Concorrência em setembro e o (…) sabe que do total de 400 milhões de investimento, 100 milhões foram para a aquisição do terreno com 200 hectares. As restantes verbas são para requalificar os imóveis do resort localizado entre o estuário de (…) e (…), onde se encontra um boutique hotel de cinco estrelas, um campo de golfe com 27 buracos e um club house onde funciona o restaurante … (com estrela Michelin).(…)», nesta data disponível em https://(...).pt/2023/11/28/fundos-da-(...)-investem-400-milhoes-em-resort-de-luxo-no-algarve/
9.º A Requerida e demais sociedades do denominado “Grupo (…)” dedicam-se, entre outras, à atividade de hotelaria e turismo, detendo os Hotéis (…), (…), o Golfe (…), o (…) Park, entre outros ativos.

10.º Os ativos referidos em 9º encontram-se penhorados no âmbito da ação executiva (processo 1741/24.2T8LLE, pendente no Juízo de Execução de Loulé, Juiz 2), encontrando-se ainda pendentes embargos de executado deduzidos pelos executados.

11.º Invocando a qualidade de credora pignoratícia a Credora (…) tomou as seguintes deliberações: i. Em 29.08.2024 deliberaram a destituição da gerência da sociedade (…) II, Unipessoal, Lda. de (…), (…) e (…), e a nomeação, em substituição, de (…) e (…); ii. Nessa mesma data, deliberaram a destituição da gerência da sociedade (…) III, Unipessoal, Lda. de (…), (…) e (…), e a nomeação, em substituição, de (…) e (…); iii. E ainda no mesmo dia, deliberaram a destituição da gerência da sociedade (…) – Comércio Internacional de Serviços, Lda. de (…), (…) e (…), e a nomeação, em substituição, de (…) e (…); iv. Em 13.11.2024, deliberaram a nomeação de (…) como Presidente do CA e (…) e (…) como vogais do CA e da (…) como fiscal único na sociedade (…), S.A.; v. Em 13.01.2025, repetiram mais uma vez o procedimento, nomeando as mesmas pessoas quer na sociedade Requerida, quer na (…) – Indústria Hoteleira, Lda..

12.º As deliberações referidas em 11º foram tomadas na sequência das seguintes ações:

a) Processo n.º 249/24.0T8LGA, no qual pedem a destituição do cargo de administrador com efeitos imediatos e com justa causa, (…), (…), (…) e (…) e eleição do Conselho de Administração indicando exatamente as mesmas pessoas acima identificadas, (…) e (…), na Sociedade (…), S.A.;

b) Processo n.º 915/24.0T8OLH, no qual pedem a destituição do cargo de administrador com efeitos imediatos e com justa causa, (…), (…), (…) e (…) e eleição do Conselho de Administração indicando exatamente as mesmas pessoas acima identificadas, (…) e (…), na Sociedade Hoteleira (…), S.A.;

c) Processo n.º 917/24.7T8OLH, no qual pedem a destituição do cargo de administrador com efeitos imediatos e com justa causa, (…), (…), (…) e (…) e eleição do Conselho de Administração indicando exatamente as mesmas pessoas acima identificadas, (…) e (…), na sociedade (…) – Indústria Hoteleira, Lda.

13.º Os imóveis referidos em 9º foram avaliados, por solicitação de “(…) U.K. Limited, (…), 78-80 (…) Street, London, W1U 2SJ, United Kingdom”, por “(…)”, melhor identificada no documento nº 7 junto com o requerimento inicial, para “propósitos de financiamento”.

14.º A validade e eficácia do penhor, como o seu exercício, são objeto de disputa, nomeadamente nos embargos apresentados no processo de execução 1741/24.2T8LLE.

15.º Resulta do documento n.º 5 junto com o Requerimento Inicial que o Banco (…), S.A. celebrou com a sociedade (…), S.A. contrato de cessão de créditos mediante os qual aquele cedeu a esta os créditos que detinha sobre as várias sociedades que integram o denominado “Grupo (…)”.

16.º As referidas sociedades – Sociedade Turística da (…), S.A., (…) II, Unipessoal, Lda., (…) III, Unipessoal, Lda., (…) – Comércio Internacional e Serviços, Lda., Sociedade Hoteleira (…), S.A., (…) Portugal, S.A., (…) – Indústria Hoteleira, S.A. e (…), S.A., detidas direta ou indiretamente pela sociedade (…) Limited, sociedade constituída nos termos das leis de Guernsey e atualmente insolvente e representada por liquidatários nomeados por decisão judicial e o ora Requerente – celebraram, conforme o mesmo requerimento executivo e não foram impugnados:

a) Um denominado “Contrato de Financiamento” (Capítulo IV do requerimento executivo);

b) Acordo de Coordenação no âmbito do qual as Executadas terão reconhecido ser devedoras da (…), S.A. do capital de Euros 74.504.281,08 correspondente à dívida emergente dos créditos cedidos pelo Banco (…) e do Contrato de Financiamento e declararam que as garantias se mantinham válidas;

c) Os penhores de 1º grau constituídos sobre 700.200 ações da Requerida mostram-se registados nos respetivos títulos que se encontram depositados no Banco (…) e foi averbada a sua transmissão a favor da (…), S.A..

17.º Do denominado “Contrato de Penhor de Acções representativas do capital social da Sociedade Hoteleira de (…), S.A. e da (…) – Indústria Hoteleira, S.A.” resulta da cláusula 5ª, n.º 6, que “A partir do momento em que (i) qualquer um dos Accionistas entre em mora ou incumpra qualquer uma das obrigações para si emergentes do presente Contrato e/ou (ii) se verifique qualquer situação de incumprimento ou de vencimento antecipado do Acordo, transmitir-se-ão automaticamente para o Banco (…) todos os direitos sociais, incluindo o direito de voto, inerentes às Acções.”

18.º O crédito da Credora (…), S.A. tem múltiplas garantias reais imobiliárias já penhoradas à ordem do processo de execução que corre termos no Juízo de Execução de Loulé, Juiz 2, processo 1741/24.2T8LLE.

19.º Os anteriores administradores da Requerida não prepararam, não obtiveram aprovação, nem registaram as contas da Requerida relativas aos exercícios de 2021, 2022 e 2023, que se encontram em falta – conforme “doc. 1” junto com o Requerimento da Requerida de 10/02/2025, com a Ref.ª citius 51319469.

20.º No dia 15 de janeiro de 2025 os atuais administradores da Requerida, acompanhados por (…), deslocaram-se à sede social da Requerida, sita no Hotel (…), com o intuito de, na qualidade de novos administradores, exercerem as suas funções, incluindo consultar e analisar documentos e recolher informações.

21.º Aí chegados, invocando a sua qualidade de novos administradores da Requerida, transmitiram instruções e formularam pedidos de entrega da documentação e informação necessários ao cabal exercício das respetivas funções de administração e deram indicações para que fosse dado conhecimento aos novos administradores da Requerida de toda a correspondência ou contacto presencial dirigido à Requerida.

22.º No mesmo dia 15 de janeiro deste ano, a (…), que inicialmente se apresentou aos atuais administradores da Requerida como diretora do Hotel (…), declarou recusar qualquer colaboração, referindo dever obediência à sua entidade patronal (…) Portugal, S.A., pelo que os administradores da Requerida solicitaram-lhe que se passasse a apresentar ao trabalho na sede da sua entidade empregadora.

23.º No dia 20 de janeiro de 2025 a Requerida remeteu à (…), Portugal, S.A., a (…), a (…), a (…), a (…) e a (…) a comunicação que constitui o doc. 4 junto com oposição.

24.º No dia 22 de janeiro de 2025 o administrador da Requerida (…) remeteu a (…) a comunicação que constitui o doc. 5, que junta.

25.º No próprio dia 22 de janeiro de 2025, a atual administração da Requerida recebeu da (…) Portugal, S.A. a comunicação que constitui o doc. 6, junta com a oposição.

26.º Em resposta à aludida missiva de 22 de janeiro de 2025, no dia 23 de janeiro de 2025, os administradores da Requerida (…) e (…) remeteram à (…) Portugal, S.A. a comunicação que constitui o doc. 7, junta com a oposição.

27.º A atitude do Requerente, (…), e dos demais anteriores administradores da Requerida, da (…) Portugal, S.A. e dos diretores ou trabalhadores da (…) Portugal, S.A., de desconsideração pelas instruções transmitidas e de retenção, não disponibilização e apropriação de documentos e informação pertencentes apenas à aqui Requerida, mantém-se na presente data.

28.º A (…) Portugal, S.A. não detém qualquer participação social na Requerida.

29.º O Requerente, (…), e demais anteriores administradores da Requerida, detêm, em conjunto, apenas 200 ações, representativas de 0,03% do capital social da Requerida – conforme “doc. 1” junto com o R.I..

30.º Conforme decorre do “doc. 1” junto com o Requerimento Inicial, as sociedades (…) II, (…) III e (…) detêm, em conjunto, 700.100 ações, representativas de 99,97% do capital social da Requerida.

31.º A (…) tem, por seu turno, como únicas sócias as sociedades (…) II e (…) III – conforme certidão permanente do registo comercial com o código (…), doc. 8, junta com a oposição.

32.º A sociedade (…) II tem como única sócia a sociedade (…) Limited (In Liquidation) – conforme certidão permanente do registo comercial com o código (…), doc. 9 junta com a oposição.

33.º A sociedade (…) III tem como única sócia a sociedade … Limited (In Liquidation) – conforme certidão permanente do registo comercial com o código (…), doc. 10, junta com a oposição.

34.º A propriedade das ações representativas do capital social da Requerida é, por conseguinte, detida, indiretamente, em 99,97% pela sociedade … Limited (In Liquidation).

35.º A … Limited (In Liquidation) é uma sociedade com sede em Guernsey, cuja dissolução forçada e entrada em processo de liquidação (compulsory winding up), foi decretada por sentença proferida em 31 de julho de 2020 pelo Tribunal competente da Ilha de Guernsey (Royal Court of the Island of Guernsey) – conforme doc. 11, junto com a oposição.

36.º No âmbito de tal processo, equivalente a um processo de insolvência, foram nomeados dois liquidatários, a saber: (i) … e (ii) …, que, assim, passaram a ter poderes exclusivos de representação e vinculação da … Limited (In Liquidation) – conforme doc. 11, junto com a oposição.

37.º A sentença que decretou a dissolução forçada da … Limited (In Liquidation) por insolvência e a nomeação dos seus liquidatários foi reconhecida e publicada em Portugal – conforme doc. 12, junto com a oposição.

38.º Por carta anexa à ata da assembleia geral da Requerida de 13 de janeiro de 2025 o Requerente juntou uma declaração da (…) datada de 10 de janeiro de 2025, emitida a pedido do Requerente, com o seguinte teor: (…)

39.º A Credora (…), S.A. não aceitou suspender a reunião da assembleia geral da Requerida de 13 de janeiro de 2025 por causa daquela comunicação do Requerente.

40.º Os administradores da Requerida (…) e (…) foram nomeados gerentes da (…) II, da (…) III e da (…) em 29 de agosto de 2024 (conforme Docs. 9, 10 e 8, juntos com a oposição).

41.º Os atuais administradores da Requerida foram nomeados administradores da (…) em 13 de novembro de 2024 (conforme certidão permanente do registo comercial com o código (…), doc. 14, junto com oposição).

42.º A atual administração da Requerida apurou que, sob a anterior gestão, os pagamentos destinados à Requerida foram canalizados para uma conta bancária da sociedade (…), S.A., com o número (…), aberta junto da CCAM de (…), C.R.L..

43.º Consultados os extratos bancários da referida conta bancária relativos ao ano de 2024 e ao mês de janeiro de 2025 foi possível apurar, preliminarmente, alguns movimentos bancários a débito sem justificação aparente que indiciam gestão ruinosa da Requerida e prejuízo para os credores AT, SS, outros credores e demais pessoas e entidades que legitimamente se relacionam com a Requerida.

44.º Para a (…), Lda., sociedade detida pelo Diretor Financeiro da (…) Portugal, S.A., (…) e sua mulher (conforme doc. 15, junto com a oposição), existiram, em 2024, transferências no valor total de € 4.929.151,62 (quatro milhões, novecentos e vinte e nove mil, cento e cinquenta e um euros e sessenta e dois cêntimos) e, em janeiro de 2025, transferências no valor total de € 148.791,00 (cento e quarenta e oito mil, setecentos e noventa e um euros) – conforme o doc. 16 e conforme quadro de síntese que constitui o doc. 17, junto com a oposição.

45.º Para (…), Diretor Financeiro da (…) Portugal, S.A., existiram, em 2024, transferências no valor total de € 779.001,09 (setecentos e setenta e nove mil e um euros e nove cêntimos) e, em janeiro de 2025, transferências no valor total de € 159.998,45 (cento e cinquenta e nove mil e novecentos e noventa e oito euros e quarenta e cinco cêntimos) – conforme o doc. 16 e conforme quadro de síntese que constitui o doc. 18, junto com a oposição.

46.º Para (…), Diretor Geral da (…) Portugal, S.A., existiram, em 2024, transferências no valor total de € 187.911,76 (cento e oitenta e sete mil e novecentos e onze euros e setenta e seis cêntimos) e, em janeiro de 2025, transferências no valor total de € 11.474,26 (onze mil e quatrocentos e setenta e quatro euros e vinte e seis cêntimos) – conforme o doc. 16 e conforme quadro de síntese que constitui o doc. 19, junto com a oposição.

47.º Para (…), Diretor Informático da (…) Portugal, SA, existiram, em 2024, transferências no valor total de € 336.053,77 (trezentos e trinta e seis mil e cinquenta e três euros e setenta e sete cêntimos) e, em janeiro de 2025, transferências no valor total de € 12.117,52 (doze mil e cento e dezassete euros e cinquenta e dois cêntimos) – conforme o doc. 16 e conforme quadro de síntese que constitui o doc. 20, junto com a oposição.

48.º Para (…), governanta e pessoa de confiança pessoal do Requerente, existiram, em 2024, transferências no valor total de € 97.686,05 (noventa e sete mil, seiscentos e oitenta e seis euros e cinco cêntimos) e, em janeiro de 2025, transferências no valor total de € 6.706,16 (seis mil e setecentos e seis euros e dezasseis cêntimos) – conforme o doc. 16, e conforme quadro de síntese que constitui o doc. 21, junto com a oposição.
49.º Para o aqui Requerente existiram, em 2024, transferências no valor total de € 163.500,00 (cento e sessenta e três mil, quinhentos euros) e, em janeiro de 2025, transferências no valor total de € 11.645,42 (onze mil, seiscentos e quarenta e cinco euros e quarenta e dois cêntimos) – conforme o doc. 16 e conforme quadro de síntese que constitui o doc. 22, junto com a oposição.
50.º Para (…) existiram em 2024 transferências no valor total de € 227.447,00 (duzentos e vinte e sete mil e quatrocentos e quarenta e sete euros) e, em janeiro de 2025, transferências no valor total de € 16.680,00 (dezasseis mil e seiscentos e oitenta euros) – conforme o doc. 16 e conforme quadro de síntese que constitui o doc. 23, junto com a oposição.
51.º Para (…)existiu em 2024 uma transferência no valor de € 30.000,00 (trinta mil euros) – conforme doc. 16 e conforme quadro de síntese que constitui o doc. 24, junto com a oposição.
52.º Para advogados não portugueses existiram, em 2024, transferências no valor total de € 1.532.246,58 (um milhão e quinhentos e trinta e dois mil, duzentos e quarenta e seis euros e cinquenta e oito cêntimos), sem que a Requerida tenha litígios ou ações judiciais fora do país – conforme quadro de síntese que constitui o doc. 25, junto com a oposição.
53.º Para a … (…, Unipessoal, Lda., com o NIF …), loja de (…), ou por sua ordem para terceiros, realizaram-se em 2024 transferências no valor total € 354.430,13 (trezentos e cinquenta e quatro mil, quatrocentos e trinta euros e treze cêntimos) – conforme quadro de síntese que constitui o doc. 26, junto com a oposição.
54.º Para a (…) – Contabilidade, Informação e Gestão, Lda., com o NIF (…), existiram em 2024 transferências no valor total de € 275.438,63 (duzentos e setenta e cinco mil, quatrocentos e trinta e oito euros e sessenta e três cêntimos) e, em janeiro de 2025, transferências no valor total de € 2.287,90 (dois mil e duzentos e oitenta e sete euros e noventa cêntimos), conforme o doc. 16 e conforme quadro de síntese que constitui o doc. 27, juntos com a oposição.
55.º Apenas as transferências para o Diretor Financeiro da (…) Portugal, S.A., (…), e para a empresa deste e sua mulher, em 2024, perfizeram um total de € 5.708.152,71 (cinco milhões e setecentos e oito mil, cento e cinquenta e dois euros e setenta e um cêntimos), conforme doc. 15, doc. 16, doc. 17 e doc. 18.
56.º A atividade da Requerida, se gerida em condições de normalidade, é lucrativa, apesar de o Golf (…) carecer de investimentos significativos de modernização (como sejam, a aquisição de areia para manter os greens apelativos para os clientes, bem como a aquisição de equipamentos necessários à correta manutenção do campo de golfe, como sejam máquinas de corte de relva, tratores e outros equipamentos) que a anterior administração escolheu não fazer.
57.º A Requerida tem dívidas significativas, incluindo perante a AT e a SS.

58.º Segundo a atual administração conseguiu apurar junto da AT e da SS, no fim de fevereiro de 2025, com origem na ação e omissões da anterior administração, a Requerida era devedora da AT e da Segurança Social no montante global de cerca de € 1.585.000,00 (um milhão e quinhentos e oitenta e cinco mil euros).

59.º Também se apurou, com base em comunicações de fornecedores, que a Requerida tinha pagamentos em atraso a fornecedores, conforme doc. 28, que junta.

60.º No dia 7 de fevereiro de 2025 a (…) Portugal, S.A. contactou os operadores turísticos com quem a Requerida trabalha e deu-lhes indicações para que os pagamentos destinados à Requerida fossem desviados para conta bancária da titularidade da sociedade (…) – Mediação Imobiliária, Unipessoal, Lda., com o NIF (…), da qual (…) e (…) são gerentes, conforme doc. 29, junto com a oposição.

61.º No dia 9 de fevereiro de 2025, durante a manhã, (…), diretor da (…) Portugal, S.A., atuando a mando do aqui Requerente e demais administradores destituídos da Requerida, cortou os acessos da Requerida ao sistema informático de reservas e faturação e contabilidade do Golf (…), denominado “Golf (…)”.

62.º Os trabalhadores do Golf (…) deixaram, por conseguinte, de conseguir visualizar as reservas feitas e de emitir faturas.

63.º Tal como todos os trabalhadores do Golf (…) ficaram sem acesso ao correio eletrónico profissional.

64.º Após o início de funções da atual administração, a anterior administração, que reteve e recusou entregar o controlo da infraestrutura tecnológica do Golf (…), já havia, remotamente, cortado o acesso ao correio eletrónico a alguns trabalhadores do Golf (…), impedindo que anexassem documentos a mensagens de correio eletrónico e que a informação arquivada nos computadores pudesse ser retirada para discos externos.

65.º Pelo que, durante algumas horas, o trabalho inerente ao normal funcionamento do Golf (…) teve de passar a ser feito prescindindo do recurso a meios informáticos.

66.º O trabalho no Golf (…) não deixou, porém, de ser feito.

67.º A nova administração da Requerida encontra-se a proceder já à substituição dos acessos e funcionalidades em apreço.

II.3.2.
O tribunal de primeira instância julgou não provada a seguinte factualidade:
«a) Que o Grupo (…), através de alguma das suas participadas, tenha interesse na aquisição dos ativos mencionados em 9º dos factos provados para os acrescentar ao seu já vasto portfólio neste segmento;
b) Que a Credora (…), S. A. tenha colocado em marcha um plano de tomada de controlo das sociedades do grupo (…), fazendo um uso manifestamente abusivo da garantia de penhor;
c) Que o valor referido em 13º seja quatro vezes superior ao reclamado pela Credora (…), S.A., nos autos do processo executivo mencionado nos factos provados;
d) Que a administração realizada pelos atuais administradores da Requerida dificulte ou impeça os esforços feitos pelas sociedades devedoras e pelo Requerente de reunir capital para proceder ao pagamento da Credora;
e) Que na visita referida em 20º e 21º, os administradores tenham perturbado a atividade do estabelecimento Hotel (…) ou que tenham provocado burburinho entre hóspedes e ansiedade e confusão a todos os que ali prestam funções;
f) Que o Requerente represente atualmente os interesses do denominado “Grupo …”;
g) Que os administradores nomeados na deliberação impugnada visem assegurar o interesse da Credora e esta enquanto veículo do Grupo (…) tenha estritamente interesses especulativos, concorrenciais e conflituantes com os interesses daquele grupo e da própria Requerida;
h) Que a intenção da Credora ao nomear os administradores das várias sociedades tenha intenção de se apropriar do Grupo (…) e dos respetivos ativos, por um valor muito interior ao valor de mercado, fazendo um excelente negócio, sob o ponto de vista dos seus interesses e com intenção de revenda, de modo a obter lucros substanciais;
i) Que a nomeação de uma nova administração seja apenas uma forma de pressão sobre a Requerida e o Grupo (…) ou que não vise a proteção da garantia patrimonial;
j) Que o Requerente esteja em condições de realizar um encaixe financeiro substancial no valor e mil e duzentos milhões de euros, dos quais cento e vinte e dois milhões de euros estejam alocados ao pagamento integral de dívidas das sociedades do Grupo (…) com sede em Portugal, incluindo a sociedade Requerida, nomeadamente, dos montantes devidos à (…), S.A. ou que tal acordo se preveja concluído em março de 2025.

II.4.
Questão prévia: junção de documentos em sede de recurso
Invocando o disposto nos artigos 651.º/ 1 e 425.º. ambos do CPC, pretende a apelante juntar nesta sede de recurso os seguintes documentos: i. escritura pública de um contrato de compra e venda; ii. certidão do registo comercial da sociedade (…), Lda.; iii. cópia do Registo Central do Beneficiário Efetivo (RCBE) da sociedade (…), Lda.; iv. cópia do Registo Central do Beneficiário Efetivo (RCBE) da sociedade (…), Lda..
Todos estes documentos foram efetivamente formados posteriormente ao encerramento da discussão em 1ª instância, ou seja, trata-se de documentos supervenientes. Porém, tais documentos visam a prova de factos não alegados perante o tribunal recorrido e que são, eles próprios, factos supervenientes. Acontece que os documentos apresentados em sede de recurso hão-de sempre referir-se a factos já trazidos ao processo, ou nos articulados normais ou nos articulados supervenientes, pois que o objeto do recurso tem sempre de se limitar aos factos e às questões já processualmente adquiridas, isto é, alegadas oportunamente perante o tribunal recorrido e consideradas por este último. Dito de outro modo, o tribunal da relação não pode conhecer de factos ou questões que ocorreram depois do encerramento da discussão, donde não ser admissível a junção de documentos, em sede de recurso, que vise comprovar factos supervenientes.
Pelo exposto, não se admite a junção dos documentos em causa.
As custas do incidente são da responsabilidade do apelante, fixando-se a taxa de justiça devida em quatro UC`s.

*
II.5.
Apreciação do objeto do recurso
II.5.1.
Impugnação da decisão de facto
Prescreve o artigo 662.º, n.º 1, do Código de Processo civil que «A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa».
Na impugnação da decisão de facto visa-se obter uma reapreciação da decisão proferida pelo tribunal de primeira instância de forma a apurar se determinados factos foram incorretamente julgados, ou por terem sido considerados assentes quando deveriam julgar-se não provados, ou por terem sido considerados não provados quando deveriam ter sido julgados assentes.
Neste segmento do seu recurso o apelante impugna o julgamento do tribunal de primeira instância relativamente aos factos provados n.ºs 61 e 64º e, bem assim, os enunciados constantes das alíneas a) a c) e g) a i) do elenco dos factos não provados.
Vejamos se lhe assiste razão.
A. Factos provados n.ºs 61º - No dia 9 de fevereiro de 2025, durante a manhã, (…), diretor da (…) Portugal, SA, atuando a mando do aqui Requerente e demais administradores destituídos da Requerida, cortou os acessos da Requerida ao sistema informático de reservas e faturação e contabilidade do Golf (…), denominado “Golf (…)” – e 64º - Após o início de funções da atual administração, a anterior administração, que reteve e recusou entregar o controlo da infraestrutura tecnológica do Golf (…), já havia, remotamente, cortado o acesso ao correio eletrónico a alguns trabalhadores do Golf (…), impedindo que anexassem documentos a mensagens de correio eletrónico e que a informação arquivada nos computadores pudesse ser retirada para discos externos.

Nas suas conclusões de recurso o apelante refere no ponto n.º 3 que “o tribunal errou ao dar como provados os factos n.ºs 41º e 44º”. Trata-se de evidente lapso de escrita pois que logo depois, nos pontos n.ºs 11 e 10 (das conclusões), o apelante refere os pontos n.ºs 61 e 64, respetivamente, como sendo a factualidade que pretende impugnar e nas alegações de recurso refere-se sempre aos pontos de facto provados n.ºs 61 e 64 (e nunca aos factos julgados provados sob os n.ºs 41 e 44). Por conseguinte, não se nos suscitam dúvidas de que o apelante pretendeu impugnar efetivamente aqueles pontos de facto n.ºs 61 e 64, tratando-se a referência acima mencionada aos pontos de factos n.ºs 41 e 44 um mero lapso de escrita. Impõe-se , pois, avaliar se existiu erro de julgamento quanto aos pontos de facto n.ºs 61 e 64 do elenco dos factos provados.

No que respeita ao ponto de facto provado n.º 61 o apelante sustenta a “insuficiência” da fundamentação do tribunal, alegando, para tal desiderato, que foi produzida prova testemunhal em sentidos diferentes e o tribunal a quo não justificou de forma suficiente porque optou por fundar a sua decisão no depoimento de uma determinada testemunha em detrimento daquela que foi arrolada pela apelante (a qual identifica).
Previamente se dirá que à luz do disposto no artigo 662.º do CPC, para alterar o julgamento de facto da primeira instância, não basta que os meios de prova que fundamentam a impugnação tornem possível a solução defendida pelo impugnante; é, ao invés, necessário que a imponham. E essa imposição não pode traduzir-se na mera substituição da convicção do julgador pela convicção do apelante fundada no depoimento de uma determinada testemunha por si arrolada. De facto, e como se afirmou no Tribunal da Relação de Évora de 23-11-2027[1] «a impugnação da matéria de facto não visa derrogar o princípio da livre apreciação das provas pelo juiz, consagrado, entre outros, no artigo 607.º, n.º 5, do CPC e, assim, a (re)apreciação da prova na 2ª instância, deve conciliar-se com este princípio, o que significa que a impugnação da matéria de facto não se basta com a simples evocação de uma convicção probatória formada pelo impugnante que divirja da ajuizada em 1ª instância, é necessário a especificação de concretos meios probatórios que imponham decisão diversa da decisão recorrida (artigo 640.º, n.º 1, alínea b), do CPC), o que não se verifica quando o fundamento da impugnação consiste numa avaliação diferente da prova produzida a propósito do facto impugnado”.
No caso em apreço o que a apelante pretende é substituir a convicção do julgador quanto ao julgamento do facto provado nº 61 que se fundou nos depoimentos das testemunhas (…) e (…), pela sua própria convicção fundada no depoimento da testemunha (…). Ouvidos os depoimentos das testemunhas (…) e (…), julgamos não merecer censura a credibilidade que o julgador a quo lhes atribuiu, não impondo o depoimento da testemunha (…) um diferente julgamento do ponto de facto provado em apreço. Aquelas duas testemunhas revelaram conhecimento direto dos factos em causa e os respetivos depoimentos foram prestados de forma credível; em particular a testemunha (…) depôs de forma escorreita, sem contradições e foi incisiva, explicando para que servia o “Golf (…)”, os constrangimentos gerados pelo corte de acesso ao mesmo por banda da apelada/requerida e as razões em que funda a sua convicção de que o corte de acesso àquele sistema informático foi efetuado pelos quadros técnicos da (…) Portugal e a mando desta. Acresce que o julgamento efetuado pelo julgador a quo justifica-se, também, à luz das máximas da experiência, considerando que a mudança de administração da requerida não ocorreu num espírito de cooperação por parte da anterior administração – cfr. facto n.º 27 não impugnado – sendo, assim, plausível que a anterior administração tivesse tentado criar obstáculos à atividade da requerida, como de facto veio a acontecer, pois resultou do depoimento daquelas duas testemunhas que a falta de acesso a esse sistema impediu a requerida de saber quem tinha reserva no campo de golf de (…), levou a situações de overbooking e de perda de reservas feitas (cfr. depoimento da testemunha …) e «a uma situação caótica na gestão do campo de golf …» (sic), o qual constitui o principal ativo da requerida / apelada – cfr. depoimento da testemunha (…).
Não existe, porém, prova suficiente de que tivesse sido a testemunha (…) quem cortou aquele acesso ao sistema informático “Golf (…)”; de facto, a testemunha (…) nunca imputou concretamente àquele a execução do corte de acesso da requerida ao “Golf (…)”, limitando-se a referir que tal corte terá sido efetuado remotamente pelos “quadros técnicos da (…) Portugal”.
Por conseguinte, e em face do exposto, o ponto de facto em apreço deverá passar a ter a seguinte redação: «61º No dia 9 de fevereiro de 2025, durante a manhã, alguém, atuando a mando do aqui Requerente, cortou os acessos da Requerida ao sistema informático de reservas e faturação e contabilidade do Golf (…), denominado “Golf (…)”».

*
No que respeita ao ponto de facto provado n.º 64, a apelante defende que que o mesmo deve ser julgado não provado porquanto «a única prova que se produziu quanto a esta matéria foi em sentido contrário àquele que o tribunal veio a dar como provado».
O julgador a quo fundou a sua convicção quanto a este facto provado referindo os depoimentos das testemunhas (…) e (…).
Relativamente ao ponto de facto provado n.º 64, julgamos não resultar dos depoimentos das testemunhas – ou de qualquer outra prova oral – a factualidade em causa, pelo que a mesma deve transitar para o elenco dos factos não provados, o que se ordenará infra.

B. Factos não provados enunciados sob as alíneas a) O Grupo (…), através de alguma das suas participadas, tem interesse na aquisição dos ativos mencionados em 9º dos factos provados para os acrescentar ao seu já vasto portfólio neste segmento – b) A Credora (…), S.A. colocou em marcha um plano de tomada de controlo das sociedades do grupo (…), fazendo um uso manifestamente abusivo da garantia de penhorc) O valor referido em 13º é quatro vezes superior ao reclamado pela Credora (…), S.A., nos autos do processo executivo mencionado nos factos provadosg) Os administradores nomeados na deliberação impugnada visam assegurar o interesse da Credora e esta enquanto veículo do Grupo (…) tem estritamente interesses especulativos, concorrenciais e conflituantes com os interesses daquele grupo e da própria Requerida -, h) A intenção da Credora ao nomear os administradores das várias sociedades é de se apropriar do Grupo (…) e dos respetivos ativos por um valor muito interior ao valor de mercado, fazendo um excelente negócio, sob o ponto de vista dos seus interesses e com intenção de revenda, de modo a obter lucros substanciais – e i) A nomeação de uma nova administração é apenas uma forma de pressão sobre a Requerida e o Grupo (…) ou que não visa a proteção da garantia patrimonial.
Defende a apelante que todos estes enunciados deverão ser julgados provados.
Desde já se dirá que no que respeita aos enunciados constantes das alíneas a), b), g), h) e i), a apelante “respalda-se” nos documentos que pretendeu juntar em sede de recurso e que não foram admitidos por este tribunal, pelo que fica prejudicada a apreciação deste segmento da impugnação do julgamento de facto.
Ainda assim sempre diremos, a respeito deste segmento da impugnação da decisão de facto, que de acordo com o disposto no artigo 607.º/4, do CPC o juiz deve declarar quais os factos que julga provados e os factos que julga não provados, pelo que não devem figurar, quer no elenco dos factos provados, quer do elenco dos factos não provados, juízos de valor ou conclusivos que não estejam suportados em factos materiais, concretos e precisos que tenham sido alegados e sobre os quais tenha recaído prova que suporte o sentido dessas alegações. Dito de outro modo, só os factos materiais são suscetíveis de prova e, como tal, podem considerar-se provados e as conclusões, envolvam elas juízos valorativos ou um juízo jurídico, devem decorrer dos factos provados, não podendo elas mesmas serem objeto de prova – neste sentido, entre outros, Acórdão do STJ de 23.9.2009, proc. n.º 238/06.7TTBGR.S1, Ac. STJ de 19.4.2012, proc. n.º 30/08.4TTLSB.L1.S1, Ac. STJ de 23/05/2012, proc. n.º 240/10.4TTLMG.P1.S1, Ac. STJ de 29/04/2015, proc. 306/12.6TTCVL.C1.S1, Ac. STJ de 14/01/2015, proc. 488/11.4TTVFR.P1.S1, Ac. STJ de 14/01/2015, proc. 497/12.6TTVRL.P1.S1, todos consultáveis em www.dgsi.pt. É também jurisprudência pacífica dos tribunais superiores que os enunciados de facto (provados e não provados) não devem conter afirmações de natureza conclusiva que integrem o thema decidendum, entendendo-se, como tal, o conjunto de questões de natureza jurídica que constituem o objeto do processo. E que sempre que um ponto da matéria de facto integre uma afirmação ou valoração de factos que se insira na análise das questões jurídicas a decidir, comportando uma resposta, ou componente de resposta, àquelas questões, tal ponto do enunciado deve ser eliminado – neste sentido, entre outros, Ac. RP de 09.03.2020, processo n.º 3789/15.9T8VFR.P1, consultável em www.dgsi.pt. Embora não conste do Código de Processo Civil vigente uma norma como a do artigo 646.º, n.º 4, do Código de Processo Civil de 1961, que considerava não escritas as respostas do tribunal coletivo sobre questões de direito», decorre do disposto no artigo 607.º, n.º 4, do CPC que na sentença são de afastar expressões de conteúdo puramente valorativo ou conclusivo, destituídas de qualquer suporte factual e resulta do disposto no artigo 662.º, n.º 2, alínea c), do CPC que o tribunal da relação deve considerar não escritos os enunciados da matéria de facto que contenham juízos conclusivos e genéricos e matéria de direito.

No caso em apreço, todos os enunciados em causa – os constantes das alíneas a), b), g), h) e i) – encerram em si mesmos juízos de valor que, in casu, não têm substrato factual, isto é, não decorrem de qualquer facto(s) contido(s) na redação de cada um dos enunciados em apreço ou daqueles que os antecedem, para além de que tais juízos de valor se reportam a questões que integram o thema decidendum, pelo que, em face do exposto supra, nunca poderiam transitar para o elenco dos factos provados, como pretende a apelante.


*

Relativamente ao enunciado de facto não provado constante da alínea c) - Que o valor referido em 13º seja quatro vezes superior ao reclamado pela Credora (…), S.A., nos autos do processo executivo mencionado nos factos provados – o julgador a quo fundamentou da seguinte forma o seu julgamento: «pese embora documentada nos autos a avaliação mencionada em 13º, não se produziu qualquer prova credível que permita concluir que tais valores são os efetivos valores de mercado atuais (…)».
Da conjugação do referido enunciado com o enunciado n.º 13 do elenco dos factos provados[2] conclui-se que aquilo que a apelante pretende ver julgado provado é que os imóveis referidos no ponto n.º 9 do elenco dos factos[3] provados têm um valor três vez superior àquele que foi reclamado pela (…), S.A. nos autos do processo executivo n.º 1741/24.2T8LLE, pendente no Juízo de Execução de Loulé – cfr. ponto n.º 10 do elenco dos factos provados.
Ora, uma vez mais a apelante pretende que seja julgado provado um juízo de valor que não tem suporte factual, quer no enunciado concretamente impugnado, quer em qualquer dos enunciados julgados provados. Ainda que assim não fosse, a apelante sustenta o julgamento que preconiza numa avaliação (doc. n.º 7 junto com o requerimento inicial) que foi elaborado, a pedido nomeadamente do ora apelante, e para “propósitos de financiamento”, ou sejas, trata-se de uma avaliação que foi condicionada por um determinado fim, para além de que dos documentos juntos pela apelada, na sua oposição, concluírem por valores diferentes daqueles que são apontados no doc. n.º 7 invocado pela apelante.
Tudo ponderado, não merece, pois, censura o julgamento empreendido pelo julgador a quo quanto a este concreto enunciado.
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DECISÃO
Em face do exposto, julga-se a impugnação parcialmente procedente, ordenando-se:
1 – A alteração da redação do ponto de facto provado n.º 61, que passará a ser a seguinte: «No dia 9 de fevereiro de 2025, durante a manhã, alguém, atuando a mando do aqui Requerente, cortou os acessos da Requerida ao sistema informático de reservas e faturação e contabilidade do Golf (…), denominado “Golf (…)”».
2 – A transferência do ponto de facto de facto provado n.º 64 para o elenco dos factos não provados.

II.5.3.
O DIREITO
No presente recurso está em causa uma decisão do tribunal de primeira instância que julgou improcedente o procedimento cautelar especificado de suspensão de deliberação social, a saber, de deliberações votadas e aprovadas na assembleia geral da requerida/apelada realizada no dia 13 de janeiro de 2025 no sentido da destituição dos cargos de administrador da Sociedade Hoteleira de (…), SA, com efeitos imediatos e com justa causa, de (…), (…), (…) e (…) e a nomeação, como membros do Conselho de Administração para o mandato de 2024/2027, de … (Presidente do Conselho de Administração), … e … (vogais do Conselho de Administração).
A suspensão de deliberações sociais consiste numa providência que permite antecipar certos efeitos derivados da sentença declarativa de nulidade ou de anulabilidade, obstando à execução de uma deliberação inválida do ponto de vista formal ou substancial e cuja execução poderia ter repercussões negativas na esfera jurídica da pessoa coletiva ou do sócio[4].
Trata-se, por conseguinte, de uma providência cautelar de natureza antecipatória que permite uma apreciação tão rápida quanto possível da eventual desconformidade da deliberação social, evitando a concretização de uma deliberação social (inválida) que seja suscetível de produzir efeitos negativos na esfera jurídica do requerente da providência cautelar ou da pessoa coletiva.
Dispõe o artigo 380.º do Código de Processo Civil, epigrafado de Pressupostos e Formalidades, o seguinte:
«1 – Se alguma associação ou sociedade, seja qual for a sua espécie, tomar deliberações contrárias à lei, aos estatutos ou ao contrato, qualquer sócio pode requerer, no prazo de 10 dias, que a execução dessas deliberações seja suspensa, justificando a qualidade de sócio e mostrando que essa execução pode causar dano apreciável.
2 – O sócio instrui o requerimento com cópia da ata em que as deliberações foram tomadas e que a direção deve fornecer ao requerente dentro de vinte e quatro horas; quando a lei dispense reunião de assembleia, a cópia data é substituída por documento comprovativo da deliberação.
3 – O prazo fixado para o requerimento da suspensão conta-se da data da assembleia em que as deliberações foram tomadas ou, se o requerente não tiver sido regularmente convocado para a assembleia, da data em que ele teve conhecimento das deliberações».

Resulta do dispositivo legal acima transcrito que a admissibilidade do recurso a este concreto procedimento cautelar depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos:
1) Ter o requerente a qualidade de sócio ou de associado da pessoa coletiva em causa;
2) Tratar-se de uma deliberação societária inválida, por violar a lei, os estatutos ou o contrato;
3) Não ter a deliberação sido ainda executada;
4) Resultar da execução da deliberação inválida a produção de um dano apreciável para a pessoa coletiva.
A falta de verificação de algum destes requisitos impede o decretamento da providência.
Por sua vez estatui o artigo 381.º, n.º 2, do mesmo diploma normativo que «Ainda que a deliberação seja contrária à lei, aos estatutos ou ao contrato, o juiz pode deixar de suspendê-la, desde que o prejuízo resultante da suspensão seja superior ao que pode derivar da execução». Assim, à luz deste normativo legal o julgador tem de ponderar os benefícios potenciados pela suspensão das deliberações com os prejuízos que dela podem derivar para a pessoa coletiva, determinando a rejeição da pretensão do requerente quando os segundos superem os primeiros. É a consagração do princípio da proporcionalidade. A seu propósito diz Lopes do Rego[5] que não se exige que a desproporção entre os prejuízos emergentes da procedência e os consequentes à execução da deliberação questionada seja manifesta ou considerável, como o faz, em geral o artigo 387.º/2 (atual 368.º/2, do CPC), gozando o julgador, no âmbito deste procedimento, de uma mais ampla margem de discricionariedade na concretização do princípio da proporcionalidade.
É sobre a requerida que recai o ónus de prova de tal desproporcionalidade (artigo 342.º, n.º 2, do Código Civil), como facto impeditivo da providência que é. A lei contenta-se, aqui, com um excesso “superior” do prejuízo decorrente do decretamento da providência cautelar em relação ao prejuízo que se pretende evitar.
Exercendo a providência cautelar em apreço uma função instrumental relativamente às ações de invalidade de deliberações sociais, apenas faz sentido o recurso a ela quando a situação litigiosa tenha origem numa deliberação e se pretenda evitar a sua execução com a alegação dos prejuízos que daquela possam decorrer[6]. Dito de outro modo, a providência cautelar de suspensão das deliberações sociais visa paralisar uma deliberação que ainda não tenha sido executada, impedindo, dessa forma, a produção de danos futuros. A propósito deste requisito, escreveram Lebre de Freitas/Isabel Alexandre[7]que «Visando-se suspender a execução da deliberação, esta não pode, por definição, ter sido já inteiramente executada, pois nada há então já que possa ser suspenso; assim, designadamente, as deliberações de execução instantânea só podem ser objeto do procedimento cautelar de suspensão se essa execução for diferida e não se tiver ainda verificado. Podem, porém, ser suspensas deliberações cuja execução tenha tido início, mas deva, ainda prosseguir, por ser continuada: a providência evitará, neste caso, a continuação da execução em curso.»; e os mesmos autores, citando Lobo Xavier, acrescentam que este «demonstrou que no procedimento de suspensão de deliberação social não está apenas em causa suspender a eficácia executiva da deliberação social que, de qualquer modo, se traduz em atos que vão até à publicidade e ao registo) mas toda a sua eficácia, tratando-se assim antes duma suspensão de eficácia, que abrange efeitos indirectos (por exemplo, a negação ao titular da quota amortizada do exercício dos direitos sociais (…), laterais ou secundários (por exemplo, a celebração de escritura pública ou certas notificações que condicionam a eficácia da deliberação tomada (…) e reflexos (por exemplo, o pagamento ao sócio do lucro que se deliberou distribuir ou o exercício da atividade de gerente pela pessoa como tal nomeada (…) do que duma mera suspensão da execução propriamente dita (…). Atendendo a que a providência cautelar visa garantir a eficácia da decisão definitiva a proferir, só este conceito lato de execução se coaduna com essa sua função». Também Abrantes Geraldes, ob. cit., págs. 75-76 refere que «(…) a suspensão das deliberações sociais não deve entender-se no seu sentido mais restrito, como simples impedimento da atividade dos órgãos sociais destinada a executá-la, antes deve estender-se à paralisação dos efeitos jurídicos que a deliberação seja suscetível de produzir. Nesta base, enquanto a deliberação não estiver totalmente executada ou enquanto se protraírem no tempo os respetivos efeitos, diretos, laterais, secundários ou reflexos, suficientemente graves para serem causadores de dano apreciável, será viável obter a suspensão da sua execução, através da específica providência criada pelo legislador».
No que respeita ao requisito “receio de produção de um dano apreciável”, diz Abrantes Geraldes, ob. cit., pág. 87: «Quanto ao periculum in mora, supõe a lei a verificação, em termos de probabilidade, de perigo de ocorrência de dano apreciável decorrente da execução da deliberação inválida. Dentro da “paleta de cores” que o legislador utilizou para configurar, em abstrato, as situações da vida real carentes de tutela cautelar, considerou desnecessário que se evidenciem danos irreparáveis ou de difícil reparação, como sucede no procedimento cautelar comum. Mas, ao contrário do que ocorre com outros procedimentos, não prescindiu da demonstração, em concreto, de um certo perigo de ocorrência de consequências prejudiciais. Ou seja, não dispensou a verificação de danos, nem presumiu a sua existência, antes impôs ao requerente o ónus de convencer o tribunal de que a suspensão da deliberação é condição essencial para impedir a verificação de um “dano apreciável”. Esta expressão integra um conceito indeterminado, carecido de densificação através da alegação e comprovação de factos de onde possa extrair-se a conclusão de que a execução do deliberado acarretará um prejuízo significativo, de importância relevante, muito longe dos danos irrisórios ou insignificantes, embora sem se confundir com as situações de irrecuperabilidade ou de grave danosidade. (…)»
Regressando ao caso em apreço as deliberações sociais que foram votadas e aprovadas na assembleia geral da requerida realizada no dia 15 de janeiro de 2025 foram uma deliberação de destituição do cargo de administrador da Sociedade Hoteleira de (…), SA, com efeitos imediatos, de (…), (…), (…) e (…) e uma deliberação de nomeação de (…), (…) e (…), respetivamente, como Presidente e vogais do Conselho de Administração da requerida para o mandato de 2025/2027.
Não vem posto em causa a verificação do requisito da atualidade da providência cautelar, apesar de a destituição da antiga administração e a nomeação dos novos membros do Conselho de Administração da requerida já terem sido levadas a registo. De qualquer modo, perfilhando nós um conceito lato de “execução da deliberação” julgamos estar verificado tal requisito.
No que respeita ao requisito “invalidade da deliberação social” a requerente começou por alegar, em sede de primeira instância, um vício do procedimento respeitante à convocação da assembleia geral; segundo ela a assembleia geral não foi convocada nos termos exigidos pelos estatutos da requerida, ou seja, por carta registada ou email, o que a torna nula, nos termos do artigo 56.º, n.º 1, alínea a), do CSC, ou, pelo menos, anulável, ao abrigo do disposto no artigo 58.º, n.º 1, alínea a), do mesmo diploma normativo.
Na sentença sob recurso, e no que respeita à alegada preterição de formalidades na convocação para a assembleia geral de 15.01.2025, o julgador a quo concluiu pela regularidade da convocação. Daquela decisão extrai-se o seguinte trecho: «os estatutos da requerida, a propósito da constituição, composição, convocação e funcionamento da assembleia geral, dispõem no seu artigo 7.º que “5. Se todas as ações forem nominativas, pode ser convocada a Assembleia Geral apenas por carta registada, com aviso de receção, ou por correio eletrónico com recibo de leitura para os acionistas que o consentirem previamente, enviado com a antecedência de, pelo menos, vinte e um dias”. Nestes termos, julga-se que a interpretação correta dos estatutos será a seguinte: o artigo 7.º, n.º 5, não exige outra forma de comunicação aos acionistas para além da publicação ou impõe que se substitua a publicação por carta registada com aviso de receção ou mensagem de correio eletrónico com recibo de assinatura, mas antes prevê uma possibilidade de se convocarem, por algum daqueles modos, os acionistas titulares de ações nominativas. Nestes termos, quem convoca a assembleia geral da requerida pode optar entre a publicação do aviso convocatório (ao abrigo do artigo 377.º, n.º 2, do Código das Sociedades Comerciais e do artigo 7.º, n.º 4, dos estatutos sociais da requerida) e o seu envio por carta registada com aviso de receção ou por correio eletrónico com recibo de leitura para os acionistas que o consentirem previamente (conforme admitido pelo artigo 7.º, n.º 5, dos estatutos da requerida).»
Insurge-se a apelante contra este entendimento do tribunal recorrido, reafirmando que o artigo 7.º, n.º 5, do pacto social da requerida impõe que os acionistas sejam convocados para quaisquer assembleias gerais por carta registada com aviso de receção ou por email, com recibo de leitura – o que não se verificou in casu – e que a convocatória efetuada viola o artigo 377.º, n.ºs 2 e 3, do Código das Sociedades Comerciais.
Mas a apelante carece de razão, tendo sido acertada a decisão da primeira instância.
No que concerne à convocação dos sócios em sede de sociedades anónimas resulta do disposto no artigo 377.º, n.º 2, do Código das Sociedades Comerciais que aquela deve ser realizada por anúncio publicado em sítio de acesso público (artigo 377.º, n.º 2). Porém, a lei permite que estatutariamente possam ser estipuladas outras exigências, a saber, carta registada ou por meio de correio eletrónico (artigo 377.º, n.º 3).
Está provado que os estatutos da requerida dispõem no seu artigo 7.º que se todas as ações forem nominativas a assembleia geral pode ser convocada apenas por carta registada com aviso de receção ou por correio eletrónico com recibo de leitura para os acionistas que o consentirem previamente.
Resulta da letra do artigo 7.º dos estatutos da requerida que o envio de carta registada com aviso de receção ou de email, com recibo de leitura, são apenas meios de convocação alternativos à publicação em sítio de acesso público, e não uma exigência adicional à forma de convocação prevista no artigo 377.º, n.º 2, do CSC.
A convocação dos sócios para a assembleia geral de 15.01.2025 foi realizada mediante publicação no sítio do Ministério na Internet, pelo que, não impondo os estatutos da requerida que a convocação dos sócios fosse concretizada através de carta regista ou por meio de correio eletrónico, a mesma foi validamente realizada, improcedendo este segmento do recurso.
*
A requerente do presente procedimento cautelar alegou, ainda, que as deliberações em causa são ilícitas porquanto a credora que participou e votou as deliberações que são objeto da providência é uma sociedade pertencente ao Fundo (…) Global o qual tem interesse na aquisição de ativos imobiliários ligados ao turismo e hotelaria, sobretudo na região do Algarve, nomeadamente nos hotéis detidos pelo Grupo (…), no qual a requerida está integrada, tendo a credora (…) colocado em marcha um plano de tomada de controlo das sociedades do grupo (…), «fazendo um uso manifestamente abusivo da garantia de penhor» (sic), pois que esse controlo não é absolutamente necessário para preservar a garantia patrimonial do direito de crédito daquela credora. Acrescentou, ainda, que tanto a validade como a eficácia do penhor e bem assim o respetivo exercício são objeto de disputa judicial. Concluiu, afirmando que o credor pignoratício deve abster-se de intervir em matérias alheias ao interesse específico de assegurar a integridade patrimonial da garantia, razão pela qual sempre lhe estaria subtraída a possibilidade de votar as deliberações em causa e que as decisões de nomeação de nossos órgãos sociais estão somente relacionadas com a gestão interna da sociedade e não com a proteção de ativos vinculados à garantia do crédito.
A requerente do presente procedimento cautelar assentou a sua argumentação, fundamentalmente, em dois vetores: i. a credora (…), SA ao participar na assembleia geral de 15.01.2025 e ao votar no sentido em que votou, agiu com o único intuito de beneficiar o Fundo (…) Global, no qual está inserida, em execução de um plano concebido com vista à tomada de controlo, por parte daquele Fundo, das várias sociedades do grupo (…), inclusive dos ativos da requerida; ii. aquela sociedade, enquanto titular do direito de garantia constituído pelo penhor sobre as ações correspondentes ao capital social da requerida, «deveria ter-se abstido de intervir em matérias alheias ao interesse específico de assegurar a integridade patrimonial da garantia, estando-lhe vedada a possibilidade de votar as deliberações em causa relativas à nomeação de administradores, as quais dizem respeito à gestão interna da sociedade e não com a proteção de ativos vinculados à garantia do crédito, ainda para mais quando o credor pignoratício não invoca, no pedido de convocação da assembleia geral da requerida, qualquer facto do qual resulte o risco iminente de desvalorização da sua garantia».
No seu recurso a apelante volta a reafirmar que está demonstrada «a verdadeira motivação da … (leia-se, do Grupo …) ao passar a dominar a gerência/administração das empresas que compõem o Grupo (…), a mesma ficou agora totalmente a descoberto: passar os ativos titulados pelo Grupo (…) para o grupo (…). Tal como está demonstrado que os ditos administradores (também nomeados para a recorrida prosseguem o interesse da … (leia-se, do grupo …) e não das empresas que passaram a administrar» (conclusões 31 e 32). Em suma, a apelante defende que a deliberação em causa é abusiva, na medida em que através dela a credora (…) visou satisfazer o seu (dela) propósito de alcançar uma vantagem especial para outrem, em prejuízo da sociedade (artigo 58.º, n.º 1, alínea b), do CSC).
Sucede, porém, que a improcedência da impugnação do julgamento de facto quanto aos enunciados julgados não provados pelo tribunal de primeira instância prejudica aquela fundamentação da apelante. Com efeito, a apelante não logrou provar, como lhe competia, que aquela sociedade tem, enquanto sociedade da esfera do Fundo (…) Global, um “especial interesse na aquisição e controlo da requerida” e que ao votar, como votou, atuou de forma incompatível com o interesse social da requerida/apelada. Dito de outro modo, não se mostra provado qualquer interesse material e objetivo da natureza extra social da credora pignoratícia (…), SA que pudesse conflituar com o interesse da sociedade requerida. Aliás, o que resulta da factualidade provada é que o sentido de voto daquela credora acompanha o interesse social da requerida, como veremos de seguida.
A apelante volta a questionar a intervenção da credora (…) nas deliberações em causa nos presentes autos, alegando que aquela sociedade, enquanto titular do direito de garantia constituído pelo penhor sobre as ações correspondentes ao capital social da requerida, «deveria ter-se abstido de intervir em matérias alheias ao interesse específico de assegurar a integridade patrimonial da garantia, estando-lhe vedada a possibilidade de votar as deliberações em causa relativas à nomeação de administradores, as quais dizem respeito à gestão interna da sociedade e não com a proteção de ativos vinculados à garantia do crédito, ainda para mais quando o credor pignoratício não invoca, no pedido de convocação da assembleia geral da requerida, qualquer facto do qual resulte o risco iminente de desvalorização da sua garantia».
O julgador a quo considerou que o penhor constituído a favor da credora (…), SA é válido e que dessa garantia real decorre, in casu, para aquela credora o direito de voto porque tal foi convencionado no contrato de prestação de garantias. Julgou também que a requerente não logrou provar, como lhe competia, que aquela sociedade tem, enquanto sociedade da esfera do Fundo (…), um “especial interesse na aquisição e controlo de estabelecimentos turístico, para além de resultar da factualidade julgada indiciada que os administradores nomeados na sequência da deliberação da credora (…), SA «passaram a gerir a sociedade requerida, ao que tudo indica, estritamente de acordo com o seu interesse social, procurando regulariza e honrar obrigações, valorizar património, clientela, marca e diligenciando por cumprir obrigações legais, em especial, o dever de aprovar e registar contas (…)».
Está provado que:
1) O Banco (…), SA celebrou com as várias sociedades do Grupo (…), entre elas a requerida / apelada, um contrato de financiamento e que mediante contrato de cessão de créditos que aquele celebrou com a sociedade (…), SA cedeu a esta os créditos que detinha sobre aquelas sociedades;
2) Foi celebrado um “Acordo de Coordenação” no âmbito do qual as referidas sociedades (que integram o Grupo …) terão reconhecido ser devedoras da (…), SA do capital de € 74.504.281,08 correspondente à dívida emergente dos créditos cedidos pelo Banco (…) e do Contrato de Financiamento e declararam que as garantias se mantinham válidas; e
3) A credora (…), SA tem penhores de 1º grau constituídos sobre 700.200 ações da requerida / apelada, mostrando-se registados nos respetivos títulos que se encontram depositado no Banco (…) e que a sua transmissão a favor da (…), SA se encontra averbada.
Por conseguinte, a credora (…), SA é credora pignoratícia da requerida.
Dispõe o artigo 23.º, n.º 4, do Código das Sociedades Comerciais que «Os direitos inerentes à participação, em especial o direito aos lucros, só podem ser exercidos pelo credor pignoratício quando assim for convencionado pelas partes».
Resulta do preceito legal supra transcrito que quando as partes, no acordo de constituição do penhor, nada disponham sobre a distribuição dos direitos sociais todos eles serão exercidos pelo devedor pignoratício.
No caso, porém, foi julgado indiciado que do contrato de penhor de ações representativas do capital social da Sociedade Hoteleira de (…) resulta da cláusula 5ª, n.º 6, que «A partir do momento em que: i. qualquer um dos acionistas entre em mora ou incumpra qualquer uma das obrigações para si emergentes do presente contrato, e/ou ii se verifique qualquer situação de incumprimento ou de vencimento antecipado do acordo, transmitir-se-ão automaticamente para o Banco (…) todos os direitos sociais, incluindo o direito de voto, inerentes às ações». Donde, de acordo com o teor daquela cláusula, a partir do momento em que o autor do penhor incumpra a obrigação garantida, o exercício dos direitos sociais, incluindo o direito de voto, transfere-se para a esfera jurídica do credor pignoratício. O que não vem posto em causa no presente recurso.
A credora (…), SA, credora pignoratícia das participações sociais da requerida/apelada por força do contrato de cessão de créditos que celebrou com o Banco (…), votou as deliberações sociais da assembleia geral de 15.01.2025.
Nada se provou quanto a uma eventual regulação, no contrato de penhor, quanto ao exercício desse direito por parte do credor pignoratício. A propósito, ensina Miguel Pestana de Vasconcelos[8]: «Nada tendo sido acordado quanto aos termos do exercício do direito de voto, ele será regulado pelo princípio da boa fé iluminado pelo fim do contrato. Visa-se aqui criar uma posição privilegiada do credor sobre um bem do devedor (ou de terceiro), permitindo-lhe satisfazer-se preferencialmente pela quantia decorrente da sua alienação. Por isso, o que para ele releva é, menos o objeto em si, e mais o respetivo valor. O seu interesse assenta na consistência e valor da participação social como bem transacional. É nesse quadro que se tem que inserir a atribuição do exercício do direito de voto ao credor. (…)» (itálicos nossos). Dito de outro modo, o credor pignoratício deve utilizar o direito de voto «como forma de tutela de um interesse próprio como credor» que é o de salvaguardar a consistência económica do objeto da sua garantia.
As deliberações sociais em causa – destituição de uma Administração, com justa causa e com efeitos imediatos, e a nomeação de novos membros do Conselho de Administração – interfere com a estrutura societária na medida em que da mesma resultou uma alteração da composição do Conselho de Administração. À partida, parecerá que a credora (…), SA extravasou o âmbito da tutela da sua garantia. Mas será assim?
À luz do artigo 671.º, alínea a), do Código Civil, o credor pignoratício está obrigado a administrar, como um proprietário diligente, a coisa empenhada.
No caso, está julgado indiciado que:
1) Os anteriores administradores da requerida não prepararam, não obtiveram aprovação, nem registaram as contas da requerida relativas aos exercícios de 2021, 2022 e 2023, que se encontram em falta;
2) No final de fevereiro de 2025, com origem na ação e omissões da anterior administração, a requerida era devedora da Autoridade Tributária e da Segurança Social no montante global de cerca de € 1.585.000,00 e tinha pagamentos em atraso a fornecedores.
3) No ano de 2024 e no mês de janeiro de 2025, foram efetuados movimentos bancários a débito, no valor global de milhares de euros, sem justificação aparente e que indiciam gestão ruinosa da requerida e prejuízo para os credores.
Está, portanto, suficientemente indiciado que a anterior administração da requerida:
i. incumpriu obrigações legais, concretamente relatar a gestão, apresentar contas dos exercícios reportados aos anos de 2021 a 2023 e sujeitá-las à aprovação dos sócios, dever previsto designadamente no artigo 65.º do CSC. Em consequência de tal incumprimento, os sócios e terceiros ficaram privados de informação sobre a situação económica e financeira da requerida, para além de que com essa atuação a anterior administração da requerida arriscou a que fosse promovida a dissolução administrativa da requerida (artigo 143.º, alínea a), do CSC);
ii. estava a efetuar uma gestão ruinosa para o interesse social da requerida, havendo dívidas ao Estado (Autoridade Tributária e Segurança Social) de valor global muito elevado que, se não satisfeitas, implicam risco de insolvência e, consequentemente, a desvalorização da empresa, logo das participações sociais objeto de penhor.
Estas circunstâncias justificam, em nosso entender, a intervenção da credora (…), SA no sentido de participar na assembleia geral de 15.01.2025 e de exercer o direito social de voto, aprovando as deliberações sociais em causa nos autos, não apenas ao abrigo de um dever de administrar diligentemente o objeto do penhor, mas para salvaguardar o valor económico do objeto da garantia. Pelo que não se mostra comprovada a ilicitude da deliberação, como alega a apelante.
Mas, ainda que assim não se entendesse, a requerente não logrou provar, como lhe competia (artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil), que a suspensão da deliberação é condição essencial para impedir a verificação de um dano apreciável. Diz a apelante, no seu recurso, que esse dano se consubstancia, numa tomada de controlo de mais uma empresa do Grupo … pela (…), SA, que lhe permitirá passar o património das empresas do Grupo … para o Grupo …, no plano processual, na possibilidade de a (…), SA passar a figurar nos processos executivos que instaurou contra o grupo … simultaneamente como exequente e executada, podendo vir a desistir dos embargos ali deduzidos (o que causaria grande prejuízo quer para a requerida, quer para os sócios) e no plano comercial no acesso a informação comercial sensível e segredos de negócio de uma concorrente.
Contudo, o alegado não passa de um arrazoado de meras especulações, de conjeturas daquilo que poderá vir a acontecer, não tendo qualquer substrato factual. Como bem se refere na sentença sob recurso: «(…) não se fez prova, ou sequer se alegou, que tenha ocorrido, em concreto, uma qualquer situação em que os administradores nomeados à requerida tenham praticado quaisquer atos em ações judiciais no sentido de ofender os interesses da Requerida. De resto, ainda que a Requerida, através da atuação dos atuais administradores, deixasse de defender as suas posições jurídicas nos autos de execução mencionados em 18º, nem todas as sociedades devedoras e executadas são representadas pelos atuais administradores da Requerida. Assim, conforme afirma a requerida, os alegados embargos de executado deduzidos pelas demais embargantes, incluindo a (…) Portugal, SA, aproveitariam às demais executadas, incluindo à aqui requerida, pelo que o argumento esgrimido pelo Requerente não pode colher. (…)». Ao invés, provou-se que sob a alçada da anterior administração da requerida, as dívidas à Autoridade Tributária e à Segurança Social ascenderam ao montante global de um milhão e quinhentos e oitenta e cinco mil euros, que a requerida tinha pagamentos em atraso a fornecedores, que o golf (…), principal ativo da requerida carece de investimentos significativos de modernização que a anterior administração escolheu não fazer e que sob a anterior gestão os pagamentos destinados à requerida foram canalizados para uma conta bancária de uma outra sociedade do grupo …, a sociedade (…), SA, melhor identificada nos autos, na qual se registaram, no ano de 2024 e no mês de janeiro de 2025, movimentos bancários a débito sem justificação aparente, de alguns milhões de euros (cfr. factos n.ºs 42º a 55º do elenco dos factos julgados indiciados pelo tribunal a quo). Ou seja, resulta de tal factualidade que uma eventual suspensão da execução das deliberações da requerida votadas e aprovadas na assembleia geral de 13 de janeiro de 2025 permitiria, ela sim, a perpetuação de uma gestão ruinosa para a requerida. Concorda-se, pois, integralmente, com a fundamentação do tribunal a quo contida no seguinte trecho: «(…) considerando os factos de que partimos, apura-se que a eventual suspensão da execução das deliberações da requerida de 13 de janeiro de 2025 causaria prejuízo manifestamente superior à respetiva execução, incluindo à Requerida. Esta conclusão decorre da prova de que existia confusão entre as receitas obtidas pelas várias sociedades, todas reunidas numa única conta (provado em 42º), ato de gestão muito duvidoso e incompreensível quanto ao seu fim, passando ainda pela prova de que de tal conta saíram valores muito avultados, para as pessoas e empresas indicadas nos factos 44 a 55, os quais não têm aparentemente uma justificação razoável (tanto que essa explicação não foi apresentada nos autos). A anterior administração da Requerida permitiu ainda que se acumulassem dívidas elevadas, em especial à Segurança Social e Administração Tributária (provado em 57º e 58º), para além de dívidas a fornecedores (provado em 59º). Atento o exposto, encontra-se suficientemente indiciado que a eventual suspensão da execução das deliberações da requerida de 13 de janeiro de 2025 causaria prejuízo manifestamente superior à respetiva execução, o que também seria suficiente para afastar o decretamento da providência».
Em face de todo o exposto, improcede a apelação, mantendo-se a sentença recorrida.

Sumário: (…)


III. DECISÃO
Em face do exposto, acordam em julgar improcedente a Apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
As custas na presente instância de recurso são da responsabilidade da recorrente sendo que apenas são devidas custas de parte porquanto a recorrente pagou a taxa de justiça devida pelo impulso processual (artigos 607.º, n.º 6, 527.º, n.º 1 e 2, 529.º, 533.º, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil).

Notifique.
DN.
Évora, 18 de setembro de 2025
Cristina Dá Mesquita
José Manuel Tomé de Carvalho
Isabel Maria Peixoto Imaginário

__________________________________________________
[1] Proc. n.º 7334/16.0T8STB.E1, relator sr. desembargador Francisco Matos, consultável em www.dgsi.pt.
[2] Que tem a seguinte redação: «Os imóveis referidos em 9º foram avaliados, por solicitação de “(…) U.K. Limited, (…), 78-80 … Street, London, W1U 2SJ, United Kingdom”, por “(…)”, melhor identificada no doc. nº 7 junto com o requerimento inicial, para “propósitos de financiamento”».
[3] Que são os Hotéis (…), (…), o Golfe (…) e o (…) Park.
[4] Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, IV Volume, 2001, Almedina, pág. 68.
[5] Comentários ao Código de Processo Civil, Volume I, 2004, Almedina, pág. 366.
[6] Abrantes Geraldes, ob. cit., pág. 71.
[7] Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 3.ª Edição, Almedina, pág. 108.
[8] Direito das Garantias, 4.ª Edição, Almedina, pág. 358.