É manifestamente improcedente a acção proposta por advogada contra um condomínio cuja administração deixou de exercer em virtude da eleição de uma nova administração, reclamando o pagamento da remuneração da administração, com o fundamento de que na sequência da impugnação judicial da deliberação da eleição e da anulação da deliberação pelo tribunal, o condomínio não deliberou novamente sobre a eleição da administração, impedindo a autora de se candidatar ao exercício da administração, que se viesse a exercer lhe daria a remuneração pedida.
SUMÁRIO:
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ACORDAM OS JUÍZES DA 3.ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:
I. Relatório:
AA, advogada em causa própria, com domicílio profissional no Porto, instaurou acção judicial contra o Condomínio do Edifício ..., contribuinte n.º ...72, sito na Rua ... e na Avenida ..., Porto, representado pela respectiva administradora A..., Lda., contribuinte n.º ...04, com sede em ..., pedindo a condenação do réu a pagar-lhe a quantia de € 19.376,17, as quantias mensais vincendas até integral pagamento e juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento.
Conforme consta da petição inicial, os fundamentos da acção são estritamente os seguintes:
«1. A autora entre 20.02.2018 a 3.11.2020 foi eleita administradora do condomínio …
2. A autora entre 3.11.2020 a 29.04.2021 foi reeleita administradora do condomínio….
3. … a autora, pelos serviços de administração do condomínio, auferia a quantia mensal de Euros: 480,00
4. A sociedade A..., Lda. foi eleita administradora, de facto, do réu Condomínio ... - Acta n.º 43 e n.º44 ….
5. Em 3/04/2021 foi convocada assembleia de condomínio para o dia 13/04/2021 … com a seguinte ordem de trabalhos: … Ponto 2 – Eleição da Administração para o ano de 2021 …
6. No dia 13/04/2021 decorreu a aludida assembleia, da qual foi lavrada a Acta n.º 43 ….
[…] 8. Por limitação temporal não foi possível terminar esta assembleia e, em 19/04/2021 foi convocada a continuação da assembleia de condomínio para o dia 29/04/2021 … com a seguinte ordem de trabalhos: … Ponto 2 – Eleição da Administração para o ano de 2021 …
9. No dia 29/04/2021 decorreu a … continuação da assembleia, da qual foi lavrada a Acta n.º 44 …
[…] 11. Da Acta n.º 44 … resultou a eleição da sociedade A..., Lda. … como Administração do Condomínio … para o ano de 2021 ….
12. Em 14/06/2021 um condómino impugnou a Acta n.º 44 … no que … se refere a “Eleição da Administração para o ano de 2021 …” … e, em 27/11/2023, foi proferida sentença, transitada em julgado, a qual, anulou as deliberações tomadas em Assembleia Geral de Condomínios dos dias 13/04/2021 e 29/04/2021 …
13. Em consequência da execução da deliberação de 29/04/2021, que veio a ser anulada … a autora, desde aquela data, viu-se impedida de proceder à administração do réu condomínio … e, em consequência, não auferiu a quantia mensal em conformidade, o que consubstancia um dano para a sua esfera patrimonial.
14. … o réu condomínio, através da A..., até à presente data, não convocou nem realizou efectivamente qualquer assembleia de condóminos onde fosse analisado, discutido, votado e deliberado os assuntos de ordem de trabalhos relativos a eleição da Administração para o ano de 2021, … o relatório e contas do ano de 2021, bem como dos anos subsequentes de 2022, 2023 e 2024 até à presente data.
15. Pelo que, a autora foi impedida de se recandidatar à eleição da administração de condomínio nos anos aludidos, bem como de apresentar o relatório e contas de Janeiro de 2021 a Abril de 2021.
[…] 21. … os danos patrimoniais devidos pelo réu … à autora são [a] quantia mensal de Euros: 480,00, desde 29/05/2021 a 29/06/2024.
22. Pelo que, a autora é credora do réu … da quantia de Euros: 17.760,00, bem como das quantias mensais vincendas até efectivo e integral pagamento, cuja condenação ao pagamento peticiona.
23. Acresce que, a autora tem ainda direito a haver do réu … juros de mora, à taxa legal, desde a data de vencimento de cada mensalidade, até efectivo e integral pagamento.
24. Tais juros totalizam, na presente data, a quantia de Euros: 1.136,17. […]»
O réu foi citado e apresentou contestação, impugnando parte dos factos alegados e defendendo a improcedência da acção.
Após julgamento foi proferida sentença, tendo a acção sido julgada improcedente e o réu absolvido do pedido.
Do assim decidido, a autora interpôs recurso de apelação, terminando as respectivas alegações com as seguintes conclusões:
[…] E. … a Exma. Juiz a quo errou no seu processo mental, na construção do seu silogismo judiciário, consubstanciado em erro de julgamento ou vicio da decisão de facto pela Exma. Juiz a quo que acarreta a sua modificabilidade e, caso se considere indispensável, a ampliação da matéria de facto dada como provada, pelo Juízo ad quem, Tribunal da Relação do Porto, nos termos do art. 662º n.º1 do CPC.
F. Bem como, entende que a mesma é nula, nos termos do art. 615º n.º 1 alíneas c) e d) do CPC.
G. Pois que, conforme resulta dos presentes autos, a autora, ora recorrente foi administradora do réu Condomínio, ora recorrido, entre 20.02.2018 a 29.04.2021, auferindo pelos serviços de administração do condomínio a quantia mensal de Euros: 480,00, sendo anualmente, a quantia de Euros:5.760,00 (Acta n.º 35, de 20.02.2018 e Acta n.º 41, de 3.11.2020 - doc. 1, 2 junto com a PI).
H. Para o réu Condomínio, ora recorrido foi, de facto, eleita administradora de condomínio em 29/04/2021 para o ano de 2021 a sociedade A... (Acta n.º 43 e n.º44, de 13.04.2021 e 29.04.2021 – doc. 3 e 4 juntos com a PI), mas, não de direito.
I. Pois que, tal Acta n.º 44 de 29/04/2021 foi impugnada por um condómino (…) e neste Proc. n.º ...8/2021 dos Julgados de Paz do Porto, tendo sido proferida sentença em 27/11/2023, transitada em julgado, a qual, anulou as deliberações tomadas em Assembleia Geral de Condomínios dos dias 13/04/2021 e 29/04/2021 (doc. 5 junto com a PI), ou seja, a eleição para o ano de 2021 da sociedade A... como administradora do réu Condomínio, ora recorrido.
J. Na pendência do Proc. n.º ...8/2021, o ora recorrido, através de convocatória enviada para o efeito, realizou assembleia de condomínio em 28/02/2023, onde fez constar na ordem de trabalhos, sob ponto 2, ratificação da deliberação proferida no ponto 2 da Acta n.º 44 (datada de 29/04/2021), o que, pretensamente, foi aprovado em Acta de 28/02/2023 (doc. 2 junto com a contestação).
K. Perante tal, a Exma. Juiz a quo entendeu que a anulabilidade pode ser sanada mediante confirmação nos termos do art. 288º do Cód. Civil e do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no processo n.º 7441/19.8T8ALM.L1-2, considerando que, não resultar dos autos que esta deliberação de ratificação tenha sido judicialmente impugnada. Permanecendo, como tal, válida.
L. Ao decidir como decidiu a Exma. Juiz a quo, ab initio, laborou em erro de julgamento, considerando a prova documental junta aos autos conjugada com o depoimento prestado em audiência de julgamento pela testemunha da autora, ora recorrente, os factos acima indicados foram pela Exma. Juiz a quo incorrectamente valorados, erradamente julgados, coarctados, desviados e desvirtuados, ao contradição com o preconizado no Acórdão do STJ de 19.Jan.2017 - Processo nº 873/10.9T2AVR.P1.S1 (Relator Tomé Gomes), in www.dgsi.pt
M. Simultânea e cumulativamente, ocorreu ambiguidade ou obscuridade que tornou a sentença a quo ininteligível, bem como a Exma. Juiz deixou de se pronunciar sobre questões que devia apreciar, nos termos do art. 615º n.º1 alínea c), d) do CPC, ao dar como provado o ponto 8 dos factos provados, o qual, deveria ter sido dado como facto não provado.
N. Pois que, a pretensa deliberação (ratificação) de 28/02/2023 foi tomada em data anterior à sentença proferida em 27/11/2023 no proc. n.º...8/2021 dos Julgados de Paz do Porto, a qual, transitou em julgado, sem recurso do réu condomínio, ora recorrido.
O. Tal sentença adquiriu a eficácia de caso julgado, nos termos do art.628º do CPC, que se invoca.
P. No proc. n.º ...8/2021 dos Julgados de Paz do Porto, o réu condomínio, ora recorrido, nunca alegou ou deu conhecimento a esses autos dessa ratificação para obter a sua absolvição da instância ou do pedido ou a extinção por inutilidade superveniente da lide, com custas a seu cargo, pelo contrário, foi o impugnante condómino (…) que requereu a junção daquela acta de 28/02/2023 a esses autos do proc. n.º ...8/2021.
Q. Nos presentes autos, a autora, ora recorrente, no seu art. 15º e 16º do requerimento / resposta de 8/10/2024, sobre pronúncia ao doc. 2 junto com a contestação (Acta de 28/02/2023), protestou juntar as actas das audiências de julgamento do processo nº ...8/2021 dos Julgados de Paz do Porto, caso não fosse admitido como verdadeiro pelo réu Condomínio, ora recorrido e se revele essencial para a descoberta da verdade material, sendo que, este nada contrapôs, nem nada impugnou especificadamente acerca do alegado.
R. Pelo que, nos termos do art. 574º n.º 2 do CPC tal deveria ter sido admitido por acordo e dado como provado pela Exma. Juiz a quo, como enuncia na sua motivação, mas o que se verifica é que não o considerou como provado, nem sequer enuncia / especifica, mínima e inteligivelmente, quais os factos provados que admitiu por acordo, nem os valora na sua decisão, omitindo-os em absoluto.
S. Salvo o devido respeito, a Exma. Juiz a quo, ao abrigo do princípio da cooperação previsto no art. 7º n.º 2 do CPC e do princípio do inquisitório, previsto no art. 411º do CPC poderia e deveria ter ordenado a protestada junção, pelo menos, da acta da audiência de julgamento do processo nº...8/2021 dos Julgados de Paz do Porto, ocorrida em 24/03/2023, em que o impugnante condómino (…) juntou e deu conhecimento da acta de 28/02/2023.
T. Ora, considerando que a Exma. Juiz a quo não sindicou como lhe competia por essa junção aos autos e uma vez que a autora, ora recorrente, o protestou juntar caso não fosse admitido como verdadeiro pelo réu Condomínio, ora recorrido, tal junção tornou-se agora, superveniente e excepcionalmente, necessária e essencial em virtude da sentença proferida pela Exma. Juiz a quo, impondo-se à ora recorrente a ora junção desse documento nesta sua instância de recurso, através do disposto no art.651º do CPC, o que se Requer sob doc. 1 (acta de julgamento de 24/03/2023 no processo nº...8/2021 dos Julgados de Paz do Porto).
U. Tal documento revela e comprova-se, por um lado, ter sido o impugnante condómino (…), ao que o réu Condomínio, ora recorrido disse nada ter opor e não pretender pronunciar-se quanto a ele e, por outro lado, conhecendo, desconsiderando e desvalorizando aquela Acta de 28/02/2023 - pretensa ratificação, o Tribunal de Julgados de Paz do Porto proferiu a sentença de 27/11/2023, a qual, anulou a deliberação de 29/04/2021 e, em consequência, anulou a eleição para o ano de 2021 da sociedade A... como administradora do réu Condomínio, ora recorrido.
V. Ora, em erro de julgamento e incompreensível sentido inexplicável, a Exma. Juiz a quo faz tábua rasa e ignorou em absoluto a junção daquela acta de 28/02/2023 ao processo n.º...8/2021 dos Julgados de Paz do Porto, bem como do conhecimento, desconsideração e desvalorização pela Exma. Juiz do Tribunal dos Julgados de Paz do Porto, para colocar em crise o que aí foi decidido e transitado em julgado, até porque, salvo melhor entendimento, uma sentença judicial tem superior força probatória plena do que uma acta de assembleia de condomínio, contendo uma pretensa ratificação.
W. Mais refere a Exma. Juiz a quo que “não resultando dos autos que esta deliberação de ratificação tenha sido judicialmente impugnada”, o que não corresponde à verdade, na medida em que, conforme foi alegado e consta do depoimento prestado pela testemunha da autora, ora recorrente, nos presentes autos – que o refere expressamente no seu depoimento acima transcrito), o mesmo impugnante condómino intentou uma Acção de Impugnação da Acta de Assembleia de Condomínio de 28/02/2023 - Proc. n.º ...6/2023 no Julgado de Paz do Porto e proferida sentença em 27/02/2024, a qual, em virtude desse condómino ter vendido a sua fracção de que era proprietário, foi julgada como excepção dilatória de verificação da falta de interesse em agir desse condómino, tendo sido a Ré absolvida da Instância (e não do pedido), não se pronunciando sobre o mérito da causa.
X. O que, de igual modo, deveria ter sido admitido por acordo e dado como provado pela Exma. Juiz a quo, nos termos do art. 574º n.º 2 do CPC, conforme alegado pela autora, ora recorrente, no seu art. 19º e 20º do requerimento / resposta de 10/09/2024 e não contraposto, nem impugnado especificadamente pelo réu condomínio, ora recorrido.
Y. Porquanto, para além abundante prova documental já supra enumerada, importa considerar e reanalisar pelo Juízo ad quem, Tribunal da Relação do Porto o meio de prova testemunhal da testemunha da autora, ora recorrente nos presentes autos e o que refere expressamente no seu depoimento acima transcrito.
Z. Ao contrário do desconsiderado e omitido em absoluto pela Exma. Juiz a quo, a autora, ora recorrente alegou e invocou no seu art. 17º e 18º do requerimento / resposta de 8/10/2024 (e mais uma vez, não contraposto, nem impugnado especificadamente pelo réu condomínio, ora recorrido), a falsidade da Acta de 28/02/2023 (doc. 2 junto com a contestação), nos termos do art.372º do CC, impugnando-a por despudoradamente falsa, bem como arguiu a sua nulidade, nos termos do art.286º do CC.
AA. O que, de igual modo, deveria ter sido admitido por acordo e dado como provado pela Exma. Juiz a quo, nos termos do art. 574º n.º 2 do CPC, conforme alegado pela autora, ora recorrente, no seu art. 17º e 18º do requerimento / resposta de 8/10/2024 e não contraposto, nem impugnado especificadamente pelo réu condomínio, ora recorrido que, aliás, juntou na sua contestação esse próprio documento - Acta de 28/02/2023, com o requerimento do condómino (…) ditado e junto a essa mesma acta.
BB. O que é de extrema relevância e que a Exma. Juiz a quo deixou de se pronunciar sobre a questão da falsidade, alegada e invocada pela autora, ora recorrente, nos termos do art. 372º do CC e que deveria ter apreciado, o que era essencial para considerar ou não a ratificação válida e como provada, sendo que sobre esta matéria a Exma. Juiz a quo nada aduz, configurando-se assim a nulidade do art.615º n.º 1 alínea d) do CPC.
CC. Mais refere a Exma. Juiz a quo que “também nada resulta relativamente aos alegados prejuízos, nada resultando em concreto que permita concluir pelo alegado impedimento da autora em candidatar-se à administração do Condomínio réu. Pelo exposto, improcede a presente acção.”, o que é uma conjugação perfeitamente parca, descabida e surrealista.
DD. A Exma. Juiz a quo bastou-se com a inverdade de que a autora, ora recorrente não foi impedida de se candidatar à administração de condomínio para estranha e incompreensível sentido inexplicável apressar-se a concluir que nada resulta relativamente aos alegados prejuízos.
EE. Quanto ao alegado impedimento da autora, ora recorrente em candidatar-se à administração do condomínio, em conjugação com a abundante prova testemunhal da autora, ora recorrente (e o que se refere expressamente no seu depoimento acima transcrito e prova documental dos autos, resulta suficientemente provado que, o regulamento do condomínio, no seu art. 4º n.º 2 - alterado e exarado por Acta n.º 30, de 26/07/2017 (…) refere que: “O cargo de Administrador será exercido por um condómino ou terceiro, podendo ser remunerado e terá duração anual” e dos documentos / Actas de Assembleias de Condomínio de 9/11/2021 (…), de 27/01/2022 (…), de 7/04/2022, (…), de 28/04/2022, (…), de 28/02/2023, (…) e de 21/03/2024, (…), resulta evidentemente provado que, a sociedade pretensamente eleita como administradora e representante do condomínio, ora recorrido, nunca convocou, nem realizou efectivamente qualquer assembleia de condóminos onde fosse analisado, discutido, votado e deliberado os assuntos de ordem de trabalhos relativos a eleição da Administração para o ano de 2021, bem como, igualmente não o fez, nos anos subsequentes de 2022, 2023 e 2024 (pelo menos, até à recente assembleia de condóminos de 21/03/2024 – doc. 1 junto pelo réu Condomínio, ora recorrido, na contestação, onde foi, finalmente, de facto e de direito, deliberada e nomeada administradora do condomínio réu, ora recorrido, a sociedade A...).
FF. Assim, afigura-se indubitavelmente resultar provado nos autos (e, como tal deveria ter sido dado como provado) que, desde aquela assembleia de condóminos de 29/04/2021, pretensamente ratificada, mas anulada por sentença proferida em 27/11/2023 até à assembleia de condóminos de 21/03/2024, a autora, ora recorrente foi impedida de se candidatar à administração de condomínio, por ausência de convocatória e realização de assembleia de condomínio para esse efeito dessa eleição.
GG. E foi impedida por quem tinha o poder-dever de, anualmente e pretensamente em funções, convocar assembleia de condomínio, o réu Condomínio, através da pretensa administradora do mesmo a sociedade A..., nos termos dos arts. 1432º n.º 1 e 4 e 1436º n.º 1 alínea a) do CC.
HH. Ora, uma vez que a autora, ora recorrente não era condómina, por ausência de convocatória com ordem de trabalhos referente a eleição da administração de condomínio e realização de assembleia de condóminos para esse efeito nunca se poderia ter candidatado, tendo por isso, sido impedida por acto e omissão do réu Condomínio, ora recorrido.
II. Constatando-se resultar provado nos autos (e, como tal deveria ter sido dado como provado) que, em virtude de ter sido impedida e ter visto lograr as suas legitimas expectativas de prosseguir a execução dos projectos no âmbito da administração de condomínio, deixou de auferir a quantia que auferiu entre 3.11.2020 a 29.04.2021, pelos serviços de administração do condomínio, na quantia mensal de Euros: 480,00 e, anualmente, na quantia de Euros:5.760,00 (Acta n.º 41, de 3.11.2020 …) e conforme os quatro últimos recibos de prestação de serviços - de Janeiro a Março de 2021 e Abril de 2021 (…).
JJ. Tal consubstancia indubitavelmente, um dano para a sua esfera patrimonial que merece a tutela do direito, nos termos dos arts. 562.º, 566.º, 563.º, 564.º do Código Civil.
KK. Pois que, no caso concreto dos autos, para a autora, ora recorrente, a reconstituição natural não é possível, em virtude não só os prejuízos causados pela lesão, mas também os benefícios não obtidos em consequência dessa lesão, sendo, por isso, devida pelo réu Condomínio, ora recorrido a indemnização pelos danos patrimoniais da autora, ora recorrente, que se consubstancia na quantia mensal de Euros: 480,00, que deixou de auferir, desde 29/05/2021 a 29/06/2024, ou seja, na quantia de € 19.376,17, das quantias mensais vincendas até efectivo e integral pagamento e respectivos juros de mora, o que se peticiona com a procedência do presente recurso.
LL. A sentença proferida violou os arts. 628º do CPC, art. 372º e 286º do CC 615º n.º 1 do CPC, 562.º, 563º, 564º, 566.º do CC e fez errada interpretação e aplicação do art. 288º do CC, 574º n.º 2 do CPC, 7º n.º 2 do CPC, 411º do CPC, 1432º n.º 1 e 4 e 1436º n.º 1 alínea a) do CC.
Nestes termos e nos melhores de direito, dando-se integral provimento ao presente recurso, admitida a junção do documento ao abrigo do art. 651º do CPC, ser modificada pelo Juízo ad quem, Tribunal da Relação do Porto a sentença proferida sobre a matéria de facto, reanalisando-se a prova documental e testemunhal aos factos tidos como provados e não provados, caso se considere indispensável a ampliação da matéria de facto dada como provada, nos termos e com os fundamentos supra aduzidos, ao abrigo do art. 662º do CPC, bem como, ser declarada nula a sentença ao abrigo do art. 615º alínea b) e c) do CPC e, em substituição, proferir Acórdão que julgue a acção julgada procedente, por provada, concluindo como na PI.
O recorrido respondeu a estas alegações defendendo a falta de razão dos fundamentos do recurso e pugnando pela manutenção do julgado.
Após os vistos legais, cumpre decidir.
II. Questões a decidir:
As conclusões das alegações de recurso demandam desta Relação que decida as seguintes questões:
i. Se a decisão recorrida é nula.
ii. Se deve ser modificada e/ou ampliada a matéria de facto
iii. Se estão preenchidos os pressupostos do direito de indemnização invocado pela autora.
III. Questão prévia:
Como referido, nas suas alegações de recurso a recorrente argui a nulidade da sentença recorrida, impugna a decisão sobre a matéria de facto e/ou requer a ampliação desta.
Estas questões são prévias ao conhecimento do mérito da causa, mas, no caso, o conhecimento das mesmas é absolutamente inútil e desnecessário, uma vez que pela razões que abaixo serão indicadas a improcedência total da acção se impõe desde logo em função do alegado pela autora, razão pela qual, sendo possível confirmar de imediato a decisão de improcedência da acção, o conhecimento daquelas questões encontra-se prejudicado e não deve ter sequer lugar.
IV. Fundamentação de facto:
Na decisão recorrida foram julgados provados os seguintes factos:
1. Na Assembleia de Condóminos realizada no dia 20 de Fevereiro de 2018 foi deliberado nomear a autora administradora do Condomínio réu para o ano em curso.
2. Na Assembleia de Condóminos de 3 de Novembro de 2020 foi deliberado nomear a autora como administradora do condomínio réu para o ano de 2020.
3. Foi realizada a Assembleia de Condóminos datada de 13 de Abril de 2021 cujos trabalhos foram suspensos.
4. A autora, pelos serviços de administração do condomínio, auferia a quantia mensal de € 480,00.
5. Na Assembleia de Condóminos de 29 de Abril de 2021 foi deliberado nomear administradora do condomínio para o ano de 2021 a sociedade A..., Lda.
6. No processo n.º ...8/2021-JPPRT que correu termos no Julgado de Paz do Porto foi proferida sentença, em 27 de Novembro de 2023, que decidiu julgar a acção intentada por BB, parcialmente procedente e em consequência: a)Declarou a anulabilidade das deliberações tomadas em Assembleia geral de condóminos de dias 13/04/2021 e 29/04/2021, por violação do artigo 7.º n.º 2 do Regulamento de condomínio; b)Improcedente o demais peticionado.
7. Por deliberação da Assembleia de Condóminos de 21/03/2024 foi nomeada administradora do Condomínio Réu a sociedade A..., Lda.
8. Na Assembleia de Condóminos realizada no dia 28/02/2023, foi deliberado ratificar a deliberação proferida no ponto n.º 2 da acta 44 datada de 29 de Abril de 2021 de nomeação da sociedade “A..., LDA.”, administradora do condomínio.
Na mesma decisão foi ainda julgado não provado o seguinte facto:
- A Autora foi impedida de se recandidatar à eleição da administração de condomínio Réu nos anos de 2022 e seguintes..
V. Matéria de Direito:
Conforme já se referiu, a presente acção enferma de um manifesto equívoco na interpretação e aplicação das normas jurídicas aplicáveis, sendo, face ao alegado na petição inicial, manifestamente improcedente, pelo que bem podia ter terminado com um despacho de indeferimento liminar.
Antes de instaurar uma acção destinada a exigir de terceiro a indemnização de determinados danos, todo o prático do direito deve perguntar-se se a acção terá por fundamento a responsabilidade contratual ou a responsabilidade extracontratual e apurar o acto que imputa ao terceiro, que esse acto é ilícito e culposo e que há nexo de causalidade entre o acto do terceiro e os danos.
Com efeito, ainda que na origem dos danos esteja uma actuação de um terceiro, nem todos nem sempre os danos sofridos por alguém são indemnizáveis pelo terceiro.
Para fundar a sua acção na responsabilidade contratual, o lesado necessita de alegar a existência de uma relação contratual que tenha como partes o lesado e o terceiro que pretende demandar. A responsabilidade contratual é a responsabilidade pelo incumprimento das obrigações a que a contraparte se obrigou perante o lesado no âmbito de um contrato entre ambos celebrado. A ilicitude que gera a obrigação de indemnizar é a violação dos deveres de prestação correspondentes a essas obrigações contratuais.
Como é fácil de constatar não é isso que a autora tinha em mente ou elegeu para fundamentar a sua acção.
A autora não alegou existir entre ela e o condomínio qualquer relação contratual cujo incumprimento estivesse na génese da acção. Aliás, reconhece mesmo que não existia, porque o contrato de prestação de serviços de administração terminou e para fazer a administração foi escolhida outra pessoa. A anulação de uma deliberação apenas tem como consequências tornar inválida e ineficaz a deliberação aprovada …, não acarreta a imediata adopção, por efeito da deliberação, de uma deliberação … oposta ou diferente; por isso é que a assembleia de condóminos necessita de deliberar de novo num procedimento … sem os vícios do anterior).
O que alegou para sustentar a sua pretensão é somente o facto de não lhe ter sido permitido candidatar-se de novo para exercer a administração do condomínio, sendo que só depois de se candidatar e caso fosse eleita passaria a existir novamente uma relação contratual entre ela e o réu (de recordar que em 2021, na deliberação depois anulada, a autora candidatou-se mas … não foi eleita!).
O que nos leva, por exclusão de partes, para a responsabilidade civil.
É sabido que na definição do âmbito da responsabilidade civil (artigo 483.º do Código Civil), a nossa legislação divide a ilicitude em duas modalidades básicas: a violação de um direito de outrem e a violação de qualquer disposição legal destinada à protecção de interesses alheios.
No primeiro caso, a ilicitude advém da ofensa perpetrada a um determinado bem jurídico que a lei protege mediante a qualificação desse interesse como um verdadeiro direito da pessoa. No outro, a ilicitude provém de uma actuação desconforme com a regra de conduta que a lei impõe como forma de tutela de interesses de outrem.
A melhor doutrina considera, com apoio no elemento histórico e de coerência sistemática, que o direito de outrem que a norma tem em vista tem de pertencer à categoria dos direitos subjectivos (cf. Vaz Serra, in Requisitos da Responsabilidade Civil, Boletim do Ministério da Justiça, 92, pág. 37 e seg.; Rui de Alarcão, in Direito das Obrigações, Coimbra, 1983, pág. 242; Almeida Costa, in Direito das Obrigações, 4ª edição, Coimbra, 1984, pág. 369; Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, Vol. I, 5ª edição, pág. 486; Sinde Monteiro, loc. cit, pág. 182; Carneiro da Frada, in Teoria da Confiança e Responsabilidade Civil, Almedina, 2004, pág. 239. Diferentemente, considerando que o artigo 483.º, nº 1, do Código Civil, permite o ressarcimento de danos decorrentes da violação de qualquer direito, cf. Pessoa Jorge, in Ensaio sobre os Pressuposto da Responsabilidade Civil, Almedina, Coimbra, 1999, pág. 298, ou António Menezes Cordeiro, in Da Responsabilidade Civil dos Administradores das Sociedades Comerciais, Lex, Lisboa, 1997, pág. 468 e seguintes. Sinde Monteiro, in Comemorações dos 35 Anos do Código Civil e dos 25 Anos da Reforma de 1977 - Vol. III Direito das Obrigações, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, pág. 465, afirma contudo que a restrição dos direitos de outrem aos direitos subjectivos absolutos “não consta do texto da lei”, tendo sido suprimida a disposição do anteprojecto que, no caso de violação de direitos de crédito por terceiros, apenas permitia uma indemnização se existisse abuso do direito, de modos que “o intérprete ficou pois com liberdade para aceitar que, ao menos algumas formas de interferência de terceiros numa relação obrigacional, com prejuízo para o credor, possam ser consideradas ilícitas”. Nesse sentido, E. Santos Júnior, in Da Responsabilidade Civil de Terceiro por Lesão do Direito de Crédito, Almedina, Coimbra, 2003).
Como quer que se defina o conceito de direito subjectivo, há-de reconhecer-se que o mesmo não se confunde com os meros interesses jurídicos nem com os direitos relativos ou de crédito cuja violação importa responsabilidade contratual.
Para Orlando de Carvalho, in Teoria Geral do Direito Civil, Sumários para o 2º Ano, Centelha, 1981, pág. 31, o direito subjectivo é em simultâneo um instrumento do poder de autodeterminação da pessoa e um mecanismo de tutela dessa autodeterminação, é, de uma forma mais precisa, o mecanismo de regulamentação adoptado pelo Direito, que consiste na concreta situação de poder que faculta a uma pessoa em sentido jurídico intervir autonomamente na esfera jurídica de outrem, seja porque lhe faculta o poder de exigir de outra um determinado comportamento positivo ou negativo seja porque lhe faculta o poder de por um acto de vontade seu produzir determinados efeitos jurídicos que se impõem inelutavelmente a outra pessoa.
Esta delimitação legal dos direitos cuja violação gera responsabilidade civil tem como consequência que a violação de um direito de crédito de uma pessoa não gera responsabilidade civil por parte do incumpridor, melhor dizendo, que o titular de um direito de crédito não pode exigir indemnização pelos danos gerados pela insatisfação do seu crédito de qualquer outra pessoa cuja actuação possa ter contribuído ou mesmo gerado esse incumprimento. Ele dispõe somente da possibilidade de responsabilizar o próprio devedor, em sede de responsabilidade contratual.
No domínio das relações negociais vigora o princípio da relatividade (artigo 406.º, nº 2, do Código Civil), por oposição aos direitos absolutos ou subjectivos que já são dotados de eficácia erga omnes. A natureza relativa das obrigações significa que os contratos apenas produzem efeitos entre as partes, que apenas o credor tem o direito de exigir o cumprimento da obrigação do devedor e que o devedor só está vinculado a esse cumprimento perante o credor. A consequência lógica da relatividade da obrigação é a de que o devedor só responde pelas consequências do não cumprimento ou do cumprimento defeituoso da prestação causadas ao credor e só este lhe pode exigir a reparação das consequências danosas.
A definição do âmbito da responsabilidade civil convoca a questão dos chamados danos económicos puros. Com essa designação têm-se em vista as situações em que a perda patrimonial ocorre sem que tenha havido uma violação de um direito subjectivo absoluto, em que o dano se dá sem o lesado ter visto ofendido um seu direito subjectivo ou possa reclamar ressarcimento dos danos com fundamento na tutela de um seu direito ou de uma disposição legal de protecção .
Quando limita a ilicitude aos casos de violação de um direito subjectivo ou à infracção a uma disposição legal de protecção, a lei, mais que do criar um critério de ponderação do valor do direito ou bem que possa ser violado, preocupa-se em fixar balizas claras de delimitação da extensão da responsabilidade.
A vida em sociedade seria, com efeito, intolerável e o desenvolvimento económico praticamente impossível se não fosse possível saber com antecipação e com um grau de rigor mínimo o âmbito de responsabilidade que determinada actividade pode desencadear ou implicar. Não é possível a responsabilidade delitual cobrir a totalidade das manifestações da vida em sociedade, sob pena de esta se tornar impossível, tais os riscos que qualquer acto poderia desencadear.
A título de exemplo e demonstrando o absurdo jurídico da tese da autora: se fosse como ela pretende então qualquer pessoa habilitada e capaz de exercer a administração de condomínios podia accionar o réu porque qualquer uma dela poderia, na assembleia convocada para deliberar sobre o exercício da administração no ano de 2021 (se é que isso seria possível, porque se o ano já decorreu inelutavelmente e não irá decorrer de novo em circunstância alguma, não se vislumbra qual a necessidade de eleger uma nova administração para esse ano ou para qualquer outro dos anos já decorridos!), candidatar-se e aspirar a ser eleita para o exercício da administração e ambicionar a remuneração respectiva (por uma administração que não teria conteúdo porque os anos estão decorridos e esgotados)!
A delimitação das situações de ilicitude que gera responsabilidade delitual permite a qualquer um ter a noção da extensão da responsabilidade que lhe pode ser assacada: se a sua actuação viola direitos subjectivos de outrem, pode exigir-lhe responsabilidade o titular do direito subjectivo violado; se o seu comportamento ofende disposições legais de protecção, são os titulares da posição que justifica a protecção da lei e que viram os seus interesses afectados que lhe podem exigir responsabilidade.
A técnica usada para determinar os danos ressarcíveis é fruto, portanto, de uma lógica de segurança e certeza jurídicas e serve o objectivo de obstar a um “alargamento indeterminado da área do ilícito” ou ao “surgimento de espirais de responsabilidade” que adviriam da admissibilidade genérica da ressarcibilidade dos danos económicos puros, mesmo os sofridos por vítimas com que o agente não podia contar ou prever, mesmo os que atinjam interesses com falta de visibilidade ou aparência social.
Por outro lado, não existe um direito subjectivo à intangibilidade do património de uma pessoa. Em face do direito, a vida oferece oportunidades a qualquer pessoa e oferece as mesmas oportunidades a todas as pessoas. O que significa que cada um pode livremente desencadear uma actividade concorrente da que outra pessoa desenvolve, não sendo responsável pelos danos que essa sua actividade possa causar a outrem com a diminuição dos rendimentos ou com a perda de clientela.
A regra básica de distribuição dos riscos e que constitui um dos princípios básicos da responsabilidade traduz-se na máxima casum sensit dominus. A imputação delitual dos danos a outrem pressupõe a lesão de direitos subjectivos, de posições jurídicas que mereçam ser protegidas de qualquer agressão.
Não é legítimo subverter a opção do legislador de delimitação das situações dignas de tutela aquilina, adaptando o conceito de direito de outrem a situações concretas em que o dano não resulta da violação do direito subjectivo ou de disposição de protecção, só porque o dano resultou de uma actuação voluntária do agente.
O que não significa que a lei não reconheça justamente situações em que se justifica a ressarcibilidade de danos económicos puros, como sucede no caso do artigo 495.º do Código Civil relativamente a danos sofridos por terceiros em consequência da violação de direitos de personalidade. Significa somente que à face da lei essas são as excepções expressamente previstas.
Deve assim concluir-se que nos casos de violações de direitos de crédito (em que a responsabilidade é contratual e perante a outra parte no contrato, o credor) ou nos casos de violação de outras posições jurídicas ou ainda nos casos de danos causados não ao titular do direito subjectivo violado mas a terceiros, em regra está excluída a responsabilidade civil.
Só não será assim se esses danos estiverem cobertos por uma previsão específica de responsabilidade (v.g. 495.º), se estiveram abrangidos pelo âmbito de tutela de uma disposição legal de protecção (ou seja, existir uma norma jurídica que proíba o comportamento gerador do dano com a intenção de conferir uma protecção ao menos também ao grupo qualificado de pessoas em que se compreende o lesado concreto) ou ainda se, em concreto, os danos tiverem sido causados dolosamente com ofensa dos bons costumes (reclamando, portanto, a tutela do abuso do direito ou do mínimo ético-jurídico).
Assentes estas ideias básicas sobre a responsabilidade civil, recordamos que a tese peregrina da autora é a de que o réu deve pagar-lhe o valor da retribuição que ela auferiria pelo exercício da respectiva administração em anos transactos (!) se o réu lhe tivesse dado a oportunidade de se candidatar para exercer essas funções, convocando nova assembleia para deliberar sobre a nomeação do administrador para esses anos já que a anterior deliberação foi anulada judicialmente!
A autora, ou qualquer outra pessoa no lugar dela, não é titular de nenhum direito subjectivo (leia-se, de nenhum interesse ao qual a lei confira a natureza de direito subjectivo) de se candidatar ao exercício dessas ou de quaisquer outras funções, como, por exemplo, de se candidatar ao que quer que seja, a exercer a advocacia, a criar um negócio ou …ir de férias. Goza da liberdade de o fazer, mas não tem o direito de exigir de quem quer que seja que essa possibilidade lhe seja proporcionada. Tudo isso são meras faculdades, prerrogativas, possibilidades que decorrem da liberdade de agir, mas não são direitos subjectivos tal como estes são concebidos no âmbito do direito. Logo, a omissão da criação de condições para que essa candidatura tenha lugar jamais pode configurar um ilícito gerador de responsabilidade civil.
Também o condomínio, como pessoa de direito privado, não sujeita a regras de direito administrativo e aos correspondentes deveres ao nível da contratação, goza de liberdade de agir e de decidir, podendo adoptar ou deixar de adoptar as deliberações que entender.
Esse comportamento apenas contende com a esfera jurídica do próprio condomínio e dos respectivos condóminos, qualidade que a autora não possui pelo que esta não tem nunca o direito, sequer a legitimidade, de exigir ao condomínio que delibere e, sobretudo, que delibere de uma determinada forma ou conteúdo.
E isso em nada é prejudicado pela circunstância de deliberações anteriores com o mesmo objecto terem sido anuladas; o condomínio continua a poder fazer o que entender quanto aos interesses jurídicos que lhe estão confiados e a responder por isso apenas perante os condóminos, nos termos em que a lei o permite.
O que impediu a autora de exercer a administração do réu não foi o vício da deliberação que elegeu outra pessoa para essa função, nem tão pouco a respectiva invalidade ou invalidação. Foi sim a preterição da autora e a escolha de outra pessoa para exercer essa função, escolha essa feita pelos condóminos no exercício da sua liberdade de acção e da capacidade de exercício dos respectivos direitos. Não sendo condómina, a autora não possui legitimidade para questionar as deliberações tomadas por estes e/ou o processo de tomada das mesmas, nem adquiriu qualquer direito próprio por ter sido economicamente afectada pelo facto de não ter sido escolhida e/ou por alguém com legitimidade ter impugnado deliberações do condomínio.
Por outro lado, mesmo que a autora se pudesse candidatar, nada garantia que viesse a ser a escolhida para exercer a administração! A circunstância de na anterior assembleia que elegeu a administração, mediante deliberação que veio a ser anulada, a autora e uma empresa se terem disponibilizado para exercer a administração e a escolha ter recaído sobre uma delas, tendo sido escolhida a empresa, não impede que na nova assembleia que eventualmente o condomínio entenda realizar com o mesmo objecto (o que repete-se não se vê, nem como nem porquê, até por já ter convalidado a deliberação anulada) se apresentem quaisquer outros interessados que tenham conhecimento da oportunidade e, particularmente, não impõe que a autora tenha de ser a eleita pela maioria dos condóminos … quando antes foi rejeitada!
Nesse sentido é um erro jurídico crasso pretender que por não ter podido candidatar-se de novo a autora perdeu a remuneração correspondente ao cargo. Quando muito perdeu a oportunidade de se candidatar a uma actividade no desenvolvimento da qual, caso a sua candidatura viesse a ser aceite e eleita, seria ser paga, isto é, a autora só teria um dano correspondente à perda da remuneração … se de facto viesse ser eleita e desse modo (e só nessa circunstância) ser tornasse (contratualmente) credora dessa remuneração.
Em suma, a decisão de julgar a acção improcedente não só é forçosa face aos dados do nosso sistema jurídico, como podia ser sido proferida logo no despacho liminar. O recurso é pois necessariamente improcedente.
VI. Dispositivo:
Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação julgar o recurso improcedente e, em consequência, negando provimento à apelação, confirmam a sentença recorrida.
Custas do recurso pela advogada recorrente, a qual as não paga por estar dispensada do pagamento de custas, motivo pelo que cabe ao IGFEJ reembolsar o recorrido, a título de custas de parte, do valor da taxa de justiça que suportou.
[a presente peça processual foi produzida pelo Relator com o uso de meios informáticos e tem assinaturas electrónicas qualificadas]