Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
PROCEDIMENTO CAUTELAR
RESOLUÇÃO ILÍCITA DO CONTRATO
EXCEPÇÃO DE INCUMPRIMENTO
Sumário
Sumário:1 1 - Quer se entenda que a resolução ilícita de um contrato é, em regra, ineficaz, devendo a parte que a exerceu responder pelo prejuízo causado à contraparte (reconstituição da situação), quer se considere que, desde que formalmente declarada, a resolução é eficaz, mas sendo declarada indevida implica um incumprimento presumidamente culposo, dando lugar à obrigação de indemnização, que, nos contratos patrimoniais comuns ou de prestações fungíveis, equivalerá à execução do contrato, deve reconhecer-se que a resolução ilícita não determina sempre a cessação do vínculo negocial. 2 – As providências cautelares podem ser conservatórias ou antecipatórias, visando estas obstar ao prejuízo decorrente do retardamento na satisfação do direito ameaçado, através de uma provisória antecipação no tempo dos efeitos da decisão a proferir na acção principal. 3 – No contexto do contrato celebrado entre as partes, alegando a requerente a verificação da excepção de não cumprimento do contrato, que lhe permitia suspender o pagamento da remuneração mensal devida, facto que constituiu fundamento para a resolução promovida pela requerida, que tem por ilícita e que pode vir a causar uma perda de oportunidade do negócio e de competitividade no mercado, a solicitação do impedimento da resolução (ou a suspensão dos seus efeitos), não se revela medida desadequada a acautelar o direito ameaçado. _________________________________________________ 1. Elaborado pela relatora e da sua inteira responsabilidade – cf. artigo 663º, n.º 7 do Código de Processo Civil.
Texto Integral
Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
* I – RELATÓRIO PRIMORDIAL TOMORROW, LDA.2 intentou contra DAJRISE PORTUGAL, S.A.3 e DEUTSCHE BANK AG SUCURSAL EM PORTUGAL4 o presente procedimento cautelar comum requerendo que seja decretada providência cautelar que:
i. Condene a requerida Dajrise, na qualidade de proprietária, a reconhecer a sua responsabilidade pela elaboração do Relatório de Análise de Vulnerabilidade Sísmica (RAVS) e pelas correspondentes obras de reforço estrutural;
ii. Impeça a requerida Dajrise de solicitar o accionamento do valor remanescente da garantia bancária n.º BGA…302 ou proceda com qualquer outra forma de cobrança de quaisquer valores por referência ao Contrato, designadamente do valor das rendas mensais;
iii. Impeça o Deutsche Bank de proceder ao pagamento à requerida de quaisquer montantes remanescentes da garantia bancária n.º BGA…302; e
iv. Impeça a requerida Dajrise de resolver o Contrato com fundamento no não pagamento das rendas mensais previstas no Contrato e respectivo Aditamento e bem assim de solicitar o reforço ou substituição da garantia bancária até que as obras de reforço estrutural do imóvel estejam concluídas e a requerente possa, efectivamente, iniciar as obras de adaptação da Área Utilizável;
v. Reconheça o direito da requerente em suspender o pagamento das rendas até que as obras de reforço estrutural do imóvel estejam concluídas e a requerente possa, efectivamente, iniciar as obras de adaptação da Área Utilizável.
Alegou, para tanto, muito em síntese, o seguinte:
• A requerente, para desenvolvimento da sua actividade de venda a retalho, celebrou com a requerida, em 1 de Junho de 2023, um contrato com vista, entre o mais, à utilização dos pisos -2, -1, rés-do-chão e primeiro andar do prédio urbano sito na ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º ..., da freguesia da ..., e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ... sob o artigo ..., de que esta é proprietária, mediante o pagamento de uma renda anual, tendo assumido a responsabilidade pela adaptação do local objecto do contrato (obras de fit out), a realizar em função das necessidades da sua actividade;
• Para garantia do cumprimento pontual das suas obrigações, a requerente entregou à requerida uma garantia bancária autónoma, irrevogável e à primeira solicitação, no valor de 500 000,00 € (quinhentos mil euros);
• Em 30 de Novembro de 2023, em virtude de um atraso na obtenção, pela requerente, das licenças necessárias aos trabalhos de adaptação, as Partes celebraram um aditamento ao Contrato, nos termos do qual acordaram na concessão de um desconto de 25% no valor da renda a pagar pela requerente durante o primeiro ano de vigência do Contrato, no pressuposto de que não existiriam quaisquer outras limitações ou entraves à execução das obras e de que no final deste prazo a requerente já estaria a usufruir da Área Utilizável na sua integralidade;
• Nos trabalhos a realizar de adaptação da Área Utilizável incluía-se a conexão entre os diferentes pisos desta área, por via de escadas e elevador;
• Em Maio de 2024, no âmbito dos trabalhos preliminares, os empreiteiros depararam-se com o que seria uma antiga galeria vertical/poço que se estenderia, da parte central, até ao topo do imóvel, passando pelos vários pisos, fechada com uma estrutura metálica em perfis I e H, cobertas por chapas de aço de perfil trapezoidal em cada piso, materiais que não são adequados a suportar carga mínima de espaços comerciais, nem a suportar a carga mínima exigida para espaços de uso administrativo;
• A execução dos trabalhos de fit out previstos para a adaptação da loja implicam a abertura da antiga galeria de modo a permitir a conexão entre os diferentes pisos da Área Utilizável, o que não é possível face à fragilidade da estrutura, sendo necessária a alteração da laje de piso e comportamento estrutural do edifício, sendo necessária uma intervenção de reforço sísmico, o que não estava previsto no contrato, nem foi ponderado pelas partes;
• A requerente suspendeu os trabalhos e informou a requerida da necessidade e urgência da intervenção e requereu que esta aceitasse a suspensão do pagamento da renda;
• A requerida negou qualquer responsabilidade pela execução das obras de reforço estrutural e continuou a exigir o pagamento das rendas e perante a situação de incumprimento informou que havia procedido, no dia 7 de Novembro de 2024, ao accionamento da garantia bancária, para pagamento do montante de 369 730,02 € e exigiu o pagamento das rendas posteriormente vencidas e o reforço da garantia bancária, sob pena de proceder à resolução do Contrato;
• A requerente insistiu que a requerida deveria proceder à elaboração do RAVS do edifício, conforme é sua obrigação contratual, solicitando igualmente que desenvolvesse, a expensas próprias, o correspondente projecto de reforço sísmico para todo o edifício, condição indispensável para que aquela pudesse definir o projecto técnico de adaptação do imóvel, obter as licenças necessárias e dar início às obras previstas da Área Utilizável, devendo ser suspensa a obrigação de pagamento da renda até que estivessem criadas as condições efectivas para iniciar as obras, tendo a requerida mantido, por carta datada de 9 de Janeiro de 2025, que não existiam motivos para a suspensão da obrigação de pagamento da renda e insistindo no pedido de reconstituição integral da garantia bancária;
• A requerida advertiu que findo o prazo de 30 dias - que terminou no dia 9 de Fevereiro de 2025 - sem que os valores fossem liquidados, procederia à resolução do Contrato;
• Existe, assim, um risco sério e iminente de vir a ser indevidamente accionado o remanescente do valor da garantia bancária, e, posteriormente, de resolução ilícita do contrato, o que impede a requerente de desenvolver o seu projecto comercial na Área Utilizável, o que acarretará para si prejuízos sérios e irreversíveis;
• O accionamento do remanescente da garantia bancária obrigaria a requerente a devolver ao Deutsche Bank o montante integral da garantia 500 000,00 € (quinhentos mil euros), acrescido de juros;
• A resolução do Contrato implicaria a impossibilidade de a requerente desenvolver o seu projecto na Área Utilizável, o que resultaria em prejuízos irrecuperáveis, pois que já fez investimentos significativos na Área Utilizável, nomeadamente em rendas já pagas – 584 250,00 €, que incluem as rendas de Outubro de 2023 a Maio de 2024 -, mas sem usufruto do local, e também em obras – com um custo de 379 254,57 € - e relatórios técnicos – no valor de 8 800,00 € e 11 106,90 € -, que se revelariam inúteis no caso de a requerida proceder à resolução do Contrato;
• O projecto comercial em curso depende da continuidade da sua instalação na Área Utilizável em causa, sendo impossível substituir este espaço por outro equivalente em tão curto espaço de tempo e os novos investimentos necessários resultariam em custos elevados, o que prejudicaria a sua competitividade no mercado, com impacto nas suas receitas e na sua viabilidade económica;
• Os atrasos na abertura ao público da loja, causados pelo impasse descrito, terão impedido, no período entre Novembro de 2023 até Janeiro de 2025 (considerando que a entrega da Área Utilizável ocorreu em Junho de 2023, com o prazo de 5 meses para instalação e adaptação da loja) a facturação de cerca de 22 800 000,00 € (vinte e dois milhões e oitocentos mil euros), o que corresponderia a um lucro cessante de aproximadamente de 2 300 000,00 € (dois milhões e trezentos mil euros), com base nos resultados históricos registados pela marca ...;
• Estando suspensa a obrigação do pagamento da renda desde Junho de 2024, até que a requerida cumpra a sua obrigação de proceder à elaboração de um RAVS e, consequentemente, às obras de reforço estrutural no imóvel, também a garantia bancária prestada, cuja existência depende daquela obrigação (a sua causa), tem de ser suspensa, assim se evitando que venha a ser indevidamente accionada pelo seu valor remanescente;
• O banco deve recusar o pagamento da garantia bancária sempre que exista um comportamento fraudulento ou abusivo por parte da Dajrise;
• Com a resolução do Contrato, a requerente sofrerá um dano irreversível, correspondente à inviabilização do seu projecto de negócio, com a consequente frustração de todos os investimentos já realizados e perda da oportunidade de negócio.
Em 13 de Fevereiro de 2025 foi proferido despacho a ordenar a citação das requeridas.5
O Deutsche Bank Akitengesellschaft – Sucursal em Portugal veio deduzir oposição suscitando a sua ilegitimidade e, quanto ao mais, referiu desconhecer os factos alegados, sem ter a obrigação de os conhecer.6
Opôs-se também a requerida Dajrise Portugal, S. A. alegando, em síntese, o seguinte:7
• O imóvel a que se reporta o contrato está localizado na área da Baixa Pombalina e, por isso, existem várias restrições às obras que nele podem ser efectuadas, o que é público e notório quanto aos edifícios ali situados;
• A requerida adquiriu o imóvel com uma finalidade de investimento, tendo estabelecido negociações com a requerente entre Setembro de 2022 e Junho de 2023, período durante o qual esta teve a possibilidade de examinar o imóvel, nos seus aspectos físicos e jurídicos, tendo-lhe sido facultada toda a documentação solicitada;
• A requerente comunicou à requerida que seria importante para si construir uma comunicação vertical, escada e elevador, entre os diferentes pisos do imóvel, nomeadamente entre o rés-do-chão e o primeiro andar, tendo-lhe sido dito que seria da sua responsabilidade quer a avaliação da viabilidade da construção quer a execução da escada e do elevador;
• Conforme a cláusula 1.ª do contrato, a requerida obrigou-se a prestar um conjunto de serviços à requerente, incluindo facultar-lhe o uso temporário de determinados espaços dos pisos -2, -1, rés-do-chão e primeiro andar do imóvel (“área utilizável”), mediante o pagamento de uma remuneração anual e certas despesas, que não dependia do início da utilização do imóvel;
• A requerente aceitou o imóvel e a área utilizável no estado em que se encontravam no momento da assinatura do contrato;
• Ficou estipulado no contrato que quaisquer obras e intervenções a realizar e o respectivo licenciamento, entre elas as obras de construção do acesso entre o rés-do-chão e o primeiro andar e a alteração da utilização permitida seriam exclusivamente por conta e risco da requerente e deveriam ser precedidas da aprovação escrita da requerida, com prévia apresentação dos respectivos projectos;
• No dia 22 de Junho de 2023, a requerida entregou o imóvel à requerente;
• A 26 de Setembro de 2023, a requerente comunicou que estava a ter problemas com o Departamento de Património da Câmara Municipal de Lisboa, dos quais decorreria a possível impossibilidade de instalar a loja pretendida e o contrato foi objecto de um aditamento, em 30 de Novembro de 2023;
• Em Janeiro de 2024 a requerente comunicou novamente dificuldades levantadas pela Câmara Municipal de Lisboa atinentes a restrições próprias da protecção do valor arquitectónico do edifício, o que era expectável para a requerente e foi atendido no contrato;
• No relatório elaborado pela PPE - Planeamento e Projectos de Engenharia Lda., para introdução das escadas e elevador, propôs-se a reparação e reforço do pavimento de fecho do antigo saguão ao nível do piso 1, mas considerou-se que a referida intervenção não acarretaria a necessidade de elaboração de um relatório de análise de vulnerabilidade sísmica;
• A existência do saguão e as características da carga da sua cobertura no primeiro andar resultavam de documentos disponíveis para consulta na Câmara Municipal de Lisboa;
• Perante o reiterado incumprimento pela requerente da sua obrigação de pagamento da remuneração e despesas devidas ao abrigo do contrato, a requerida interpelou-a, por diversas vezes, para pagar as quantias em dívida e accionou a garantia bancária;
• Na presente data, a requerente deve à requerida a quantia de 524 031,55 €, acrescidos de juros de mora;
• No dia 7 de Março de 2025, a requerida enviou à requerente uma comunicação de resolução do contrato, que por esta foi recebida no dia 11 de Março;
• As despesas invocadas não decorrem da resolução do contrato e do eventual accionamento da garantia bancária;
• A requerente enuncia, de forma vaga, putativos danos, nenhum dos quais grave ou irreparável, sem nunca concretizar em que consiste o “perigo” de aguardar pela decisão final;
• Não existe qualquer lesão grave e dificilmente reparável que justifique o recurso à tutela cautelar.
Termina pugnando pelo indeferimento liminar do procedimento cautelar e, assim se não entendendo, pela sua improcedência.
Por requerimento de 27 de Março de 2025, a requerente veio modificar um dos pedidos formulados – o (iv) -, que ficou sem utilidade face à resolução do contrato promovida pela requerida, pelo que veio requerer que seja declarada “a suspensão dos efeitos da resolução do contrato até que seja proferida decisão cautelar”.8
A requerida Dajrise Portugal, S. A. veio pugnar pela inadmissibilidade da modificação do pedido, por não se traduzir num desenvolvimento ou consequência do pedido primitivo, mas sim numa sua substituição, pugnando, de todo o modo, pela sua improcedência por não se verificarem os pressupostos da probabilidade do direito e da existência de perigo pela demora da decisão na acção final.9
Em 29 de Maio de 2025 foi proferido despacho ordenando a notificação das partes para se pronunciarem, querendo, sobre a eventual improcedência do procedimento cautelar, por se entender que a resolução, lícita ou ilícita, determina a extinção do contrato e a requerente apenas poderá obter uma indemnização, o que não é fundamento para a tutela cautelar visada.10
Por requerimento de 12 de Junho de 2025, a requerente veio sustentar que a resolução ilícita, sendo um acto nulo, não produz os efeitos jurídicos próprios de uma resolução válida, pelo que se mantém o vínculo contratual, sendo que, neste caso, a manutenção do contrato é possível e constitui a via adequada para garantir a efectiva tutela do direito da requerente, concluindo pela procedência do procedimento cautelar.11
Por sua vez, a requerida Djarise Portugal, S. A. defendeu a improcedência imediata do procedimento alertando para o facto de a própria requerente ter admitido que a resolução, ainda que ilícita, podia ser apta a produzir os seus efeitos, sendo acto já consumado, não havendo fundamento para o impedir, nem para determinar a suspensão dos seus efeitos, não se verificando também o periculum in mora; mais referiu que os demais pedidos pressupõem que o contrato se mantenha em vigor, o que não se verifica.12
Em 17 de Junho de 2025 foi proferida decisão final que indeferiu a providência cautelar comum por “inadequação da providência cautelar” requerida.13
A requerente veio interpor o presente recurso, cuja motivação concluiu do seguinte modo:14
a. O presente recurso de apelação vem interposto da Decisão proferida pelo Tribunal a quo, em 18.06.2025, que indeferiu a providência cautelar instaurada por inadequação da mesma.
b. A Decisão em causa assenta no errado entendimento de que os efeitos da resolução do Contrato, no que respeita à cessação do vínculo contratual, se produzem invariavelmente e os efeitos da ilicitude da resolução por ausência de fundamento se restringem à mera constituição de um eventual direito indemnizatório a favor da Recorrente.
c. As concretas pretensões formuladas pela Recorrente, impunham ao Tribunal a quo uma apreciação indiciária da (i)licitude da resolução, sendo certo que não foi concedida às partes qualquer oportunidade de produção de prova em sede de audiência de julgamento para demonstração deste facto.
d. A pretensão da Recorrente consiste, precisamente, na manutenção do contrato em face da resolução ilícita operada pela Recorrida – efeito este que encontra respaldo na doutrina e na jurisprudência nacionais caso a resolução seja considerada infundada.
e. Não corresponde à verdade jurídica afirmar, de forma perentória, que a única consequência de uma resolução ilícita do contrato seja a constituição de um mero crédito indemnizatório a favor da parte lesada. É hoje amplamente reconhecido que, em determinadas circunstâncias, a parte cumpridora pode optar pela manutenção do contrato e, consequentemente, a vigência de outras obrigações dele emergentes.
f. A providência cautelar requerida constitui a solução antecipatória e conservadora que assiste à Recorrente para evitar que, com o decurso do tempo, se concretizem prejuízos irreversíveis. O que está em causa é a necessidade de obviar à criação de um esforço financeiro desproporcionado, injustificado e irreparável para a Recorrente, que se veria colocada numa situação insustentável sem que, para tal, exista base contratual ou legal válida. DO ERRO DE JULGAMENTO DO TRIBUNAL A QUO Enquadramento: a resolução operada pela Recorrida é ilícita
g. A Recorrente celebrou o Contrato com a Recorrida com o intuito de instalar, na Área Utilizável do imóvel desta, um estabelecimento comercial, beneficiando de um conjunto de serviços e condições previamente acordados, mediante o pagamento de uma renda anual.
h. Atenta a especificidade das obras de adaptação, e previamente à celebração do Contrato, a Recorrente contratou uma vistoria por parte da Câmara Municipal de Lisboa, com base na qual a Recorrente antecipou a necessidade de realizar obras simples de adaptação da Área Utilizável para o exercício da sua atividade.
i. Nos trabalhos a realizar na adaptação da Área Utilizável incluía-se, como bem sabia a Recorrida, a conexão entre os diferentes pisos desta área, por via de escadas e elevador, tendo sido estipulado que esta não poderia recusar ou negar injustificadamente a aprovação dessas mesmas obras e que a Recorrente seria apenas responsável pelos “trabalhos iniciais de remodelação e decoração que se revelem necessários até à abertura ao público” – Cf. Cláusula 9.2. do Contrato.
j. Não era do conhecimento da Recorrente que o prédio precisava de obras de reforço estrutural para garantir a segurança do mesmo, muito menos que as obras adaptação não poderiam ser realizadas sem que o dito reforço estrutural fosse realizado.
k. Seria sempre responsabilidade da Recorrida a realização de obras de reforço estrutural de todo o imóvel, nos termos do artigo 1074.º do CC, mais a mais considerando que a ausência dessa mesma intervenção impede a Recorrida do gozo da Área Utilizável – cujo dever de proporcionar recai sobre o locador, ora Recorrida, nos termos do artigo 1031.º, al. b) do CC.
l. Foi nesse pressuposto que a Recorrente celebrou o Contrato e, uma vez na posse do imóvel, deu início aos trabalhos preliminares de demolição e limpeza na Área Utilizável.
m. Foi no âmbito dos trabalhos preliminares que os empreiteiros contratados pela Recorrente se depararam com o que seria uma antiga galeria vertical/poço que se estenderia, da parte central, até ao topo do Imóvel, passando pelos vários pisos – galeria esta coberta com materiais que não são adequados a suportar a carga mínima de espaços comerciais, nem a suportar a carga mínima exigida para espaços de uso administrativo e não são, portanto, aptos a suportar a carga de todo o imóvel.
n. Perante a descoberta deste defeito estrutural oculto, a Recorrente foi surpreendida com a necessidade de realização de obras estruturais a executar na totalidade do Imóvel e sem as quais fica comprometida a segurança das pessoas e bens que nele se encontrem, sendo certo que as obras em apreço extravasam manifestamente a Área Utilizável, e, bem assim, a intervenção exigível à Recorrente, atenta a dimensão das intervenções a realizar e o dispêndio económico que as mesmas importariam.
o. A Recorrente suspendeu, por isso, o pagamento das rendas devidas ao abrigo do Contrato e informou devidamente a Recorrida da necessidade e urgência destas intervenções, através de carta remetida no dia 09.07.2024, requerendo, entre o mais, que esta aceitasse a suspensão do pagamento da renda em virtude da rotura do sinalagma que se traduziria na continuação do pagamento das rendas pela Recorrente sem que conseguisse, por sua vez, obter qualquer aproveitamento da Área Utilizável, alertando, nomeadamente, para o facto de as obras estruturais a realizar implicarem não só intervenções na Área Utilizável, como nos demais pisos superiores do Imóvel.
p. A Recorrida, de forma intransigente, continuou a exigir o pagamento das rendas pretensamente vencidas, fazendo tábua rasa do circunstancialismo invocado pela Recorrente e rejeitando qualquer responsabilidade pela execução das obras de reforço estrutural.
q. A Recorrente realizou uma vistoria à Área Utilizável previamente à celebração do Contrato, sem que tivesse sido detetado o defeito, já que era invisível aos olhos – o que demonstra estarmos perante um defeito oculto, que não poder ser oponível à Recorrente, sob pena de subversão dos mais elementares princípios de distribuição de risco vigentes na ordem jurídica.
r. Este fundamento afasta igualmente a aplicabilidade da Cláusula 2.3 do Contrato, nos termos da qual a Recorrente aceitou as condições do imóvel “As is”, sendo desproporcional exigir à Recorrente que suporte todos os custos associados à reparação de um defeito estrutural oculto que, para além de afetar de forma substancial a boa execução do Contrato, por condicionar os projetos a executar na Área Utilizável, afeta a segurança de todo o Imóvel e não só da Área Utilizável.
s. Quando a Recorrente assentiu que “O Utilizador está plenamente consciente do estado e condição da Área Utilizada”, estava a referir-se ao estado e condição da área utilizada que lhe foi dada a conhecer, e que era cognoscível, antes de celebrar o contrato, e não a um defeito que só foi revelado depois de iniciarem as obras de fit out e que respeita à estrutura e segurança do próprio prédio.
t. Dita o regime legal do contrato de arrendamento que é obrigação do locador assegurar o gozo do imóvel para os fins a que se destina (al. b) do artigo 1031.º e 1032.º do CC).
u. A Recorrida nunca declarou desconhecer o vício, nem muito menos fez prova disso. Em contrapartida, também não fez prova de que a Recorrente sabia ao tempo da celebração do contrato da existência do referido defeito – logo, a responsabilidade pela eliminação do defeito oculto, com reflexos na estrutura de todo o imóvel, nunca poderia impender sobre a Recorrente, especialmente considerando que os benefícios das mesmas apenas aproveitam ao proprietário atual, sob pena de enriquecimento indevido deste.
v. O objetivo das obras é garantir o reforço estrutural de todo o edifício – e não apenas da Área Utilizável – como condição indispensável à segurança da sua utilização (artigos 1074.º e 1031.º, ambos do CC).
w. Também o disposto no artigo 1111.º, n.º 2 do CC é plenamente aplicável nos presentes autos, dado que as partes não atribuíram à Recorrente a exclusiva responsabilidade pela realização das obras estruturais exigidas.
x. Foi esta conduta da Recorrida intransigente, de falta de cooperação e má-fé, assente no repúdio de toda e qualquer responsabilidade relativamente às obras de reforço estrutural do imóvel, que impossibilitou objetivamente o gozo da área Utilizável por parte da Recorrente.
y. Perante o incumprimento do Contrato pela Recorrida, a suspensão do pagamento das rendas devidas pela Recorrente assentou legitimamente na necessária reposição da proporcionalidade e equilíbrio das prestações, nos termos do n.º 1 do artigo 1040.º do CC.
z. A suspensão do pagamento das rendas mensais por parte da Recorrente não configura um qualquer incumprimento contratual, não podendo tal ser invocado pela Recorrida para acionar o valor remanescente da garantia bancária ou proceder a qualquer outra tentativa de cobrança desses valores, nem legitima a resolução contratual operada unilateralmente pela Recorrida - não restando outra conclusão que não a de que a resolução operada pela Recorrida é ilícita, por preterição dos pressupostos legais da resolução contratual.
aa. A Recorrente agiu em conformidade com a lei e com o Contrato ao suspender o pagamento das rendas, em virtude da impossibilidade de utilização e fruição da Área Utilizável. A resolução contratual promovida pela Recorrida foi prematura, infundada e juridicamente ilícita e, em consequência, não pode produzir efeitos jurídicos válidos e deverá ser considerada ineficaz, mantendo-se, portanto, em vigor o vínculo contratual. Em qualquer caso, a resolução ilícita do Contrato não tem a virtualidade de destruir a relação contratual entre as partes
bb. O Tribunal a quo perfilhou, na Decisão Recorrida, a posição segundo a qual a resolução do Contrato, ainda que ilícita, é plenamente válida, produzindo os seus efeitos extintivos, restando à contraparte apenas a possibilidade de reclamar uma indemnização pelos danos sofridos.
cc. A Recorrente discorda frontalmente, quer das premissas que sustentam esse entendimento, quer da conclusão a que o Tribunal a quo chegou, desde logo por força do disposto nos artigos 432.º, n.º 1 e artigo 566.º, n.º 1 do CC, uma vez que, caso a resolução ilegal operada pela Recorrida produzisse qualquer efeito, sempre seria o da reconstituição natural do Contrato – e nunca o da extinção do Contrato com a consequente indemnização pecuniária – já que a reparação está na disponibilidade da Recorrida, não sendo excessivamente onerosa.
dd. A resolução contratual constitui um meio unilateral de extinção do contrato, cuja admissibilidade e eficácia estão dependentes da verificação de um fundamento legal ou contratualmente estipulado – entendimento esse pacificamente aceite tanto na doutrina como na jurisprudência nacionais.
ee. Tais restrições resultam igualmente do princípio da pontualidade dos contratos, o qual não permite que a resolução possa ser usada como instrumento puramente arbitrário e discricionário, fora das hipóteses em que a lei o permite, sob pena de os vínculos obrigacionais se poderem dissolver, na prática, ad nutum (artigo 406.º, n.º 1 do CC).
ff. Conforme refere José Brandão Proença, uma vez preenchidos os pressupostos legais ou contratuais, o direito de resolução constitui um direito potestativo, de exercício unilateral, colocando a contraparte numa situação de sujeição jurídica. Porém, o Tribunal a quo parece desconsiderar que tal direito apenas se consolida após a verificação de um fundamento que, à luz da boa-fé e da equidade, torne manifestamente insustentável a manutenção do vínculo contratual.
gg. A resolução apenas poderá ser atendida quando, em concreto, e considerando os deveres de lealdade e colaboração que vinculam as partes, se demonstre que não é razoável exigir à parte resolvente o cumprimento das obrigações contratuais assumidas.
hh. O incumprimento que legitima a resolução do contrato deve revestir uma gravidade tal que torne inexigível à contraparte o cumprimento das suas obrigações contratuais – juízo esse de inexigibilidade que deve ser tanto mais exigente quanto mais intensa for a natureza da relação contratual em causa.
ii. Em contratos de execução duradoura – em regra pautados por exigências superiores de confiança mútua e, por vezes, por um certo desequilíbrio estrutural entre as partes -, a verificação do fundamento invocado pelo resolvente está sujeita a um escrutínio particularmente vincado.
jj. No caso do contrato de arrendamento, como o é o caso dos autos, seria juridicamente inadmissível - e profundamente lesivo do equilíbrio contratual - permitir que o senhorio pudesse resolver o contrato com base em critérios mínimos e sem escrutínio, promovendo a extinção sem mais da relação contratual e colocando em causa a estabilidade da posição do arrendatário.
kk. A resolução operada pela Recorrida ocorreu já na pendência da presente providência e após a citação da Recorrida para se opor, evidenciando-se como um ato processualmente abusivo e materialmente infundado.
ll. Sendo a resolução ilícita, a primeira consequência jurídica que dela resulta é a sua ineficácia, ou mesmo a sua nulidade, com todas as consequências legais daí advenientes.
mm. É este o entendimento perfilhado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 07.02.2008 e 13.12.2007, no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 21.01.2020, no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 28.10.2021 e no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 17.03.2015.
nn. Do ponto de vista doutrinário, as posições convergem no sentido de que o direito de resolução é um direito potestativo extintivo dependente da verificação de pressupostos legais objetivos, designadamente a existência de um incumprimento contratual relevante, nos termos do artigo 432.º, n.º 1, do CC. Neste sentido, ensinam de João Baptista Machado, João Calvão da Silva, Joana Farrajota e Paulo Mota Pinto.
oo. Embora a resolução constitua, como corretamente entendeu o Tribunal a quo, um direito potestativo, tal direito apenas se forma quando se encontram verificados os respetivos pressupostos legais.
pp. Admitir que uma resolução ilícita produza unicamente efeitos extintivos do Contrato, para além de violar o princípio da boa-fé consagrado no artigo 762.º, n.º 2 do CC, seria equivalente a legitimar a má-fé contratual, premiando comportamentos violadores do direito com consequências jurídicas que apenas deveriam ser reconhecidas a quem age legitimamente.
qq. Mais, resulta do disposto no artigo 280.º, n.º 1 do CC, que a resolução ilícita, apesar de conter um significado negocial e a intenção de produzir a extinção do contrato, não produz efeitos jurídicos válidos, pois, sendo a declaração resolutiva contrária à lei, não pode ser considerada, no plano do Direito, um ato eficaz e idóneo para extinguir o contrato.
rr. A posição de António Pinto Monteiro não é extensível aos presentes autos já que é expressa a propósito do contrato de agência que, apesar de ser um contrato duradouro, diverge substancialmente do contrato de arrendamento urbano para fins não habitacionais.
ss. Já no que toca à doutrina de Pedro Romano Martinez, e contrariamente ao afirmado pelo Tribunal a quo, este admite a subsistência da relação contratual desde que verificados os seguintes pressupostos: (i) o cumprimento do contrato ainda seja possível, (ii) o credor tenha interesse em que o devedor realize as prestações prometidas e (iii) o devedor que exerceu ilicitamente o direito potestativo de resolução do contrato não enfrente dificuldades desproporcionadas na execução da prestação.
tt. Como tal, mesmo à luz da posição de Pedro Romano Martinez, a presente situação preencheria sem dificuldades os três pressupostos acima elencados: a Recorrente mantém expressamente o seu interesse na manutenção do arrendamento e o cumprimento da prestação locativa é, ainda, possível, condicionada à realização das intervenções devidas pela Recorrida, cuja execução não se revela de dificuldade desproporcionada.
uu. Por fim, quanto ao Acórdão da Relação do Porto de 13.03.1997, citado pelo Tribunal a quo, o mesmo tem uma base fáctica substancialmente diferente da constante dos autos, versando sobre um contrato de agência e não sobre arrendamento, sendo a sua aplicação aos presentes autos totalmente desadequada.
vv. À luz da doutrina e jurisprudência amplamente maioritárias e ora elencadas, a resolução infundada não é apenas ilícita, mas nula, e como tal inoperante e insuscetível de extinguir validamente o Contrato.
ww. Consequentemente, deveria o Tribunal a quo ter dado oportunidade à Recorrente de demonstrar a subsistência das suas pretensões, mesmo perante a resolução operada pela Recorrida, já que se verificam todos os requisitos para que o Contrato se mantenha válido e eficaz. O Tribunal a quo coartou à Recorrente a possibilidade de obter uma decisão de mérito
xx. A Decisão Recorrida incorre numa violação grave dos direitos processuais da Recorrente, nomeadamente no que toca à obtenção de uma tutela jurisdicional efetiva, consagrado no artigo 20.º da CRP, porquanto impediu, por via de uma análise redutora das circunstâncias que compõem os autos, a apreciação do mérito das suas pretensões cautelares.
yy. A pretensão da Recorrente não é obter a declaração de ilicitude da resolução do Contrato e, consequentemente, a repristinação do Contrato: a Recorrente está consciente que tal juízo compete, como é natural, à ação principal a intentar numa fase subsequente. O que se pretende é acautelar de forma provisória e urgente o efeito útil dessa ação principal – impedindo, por via da suspensão dos efeitos da resolução contratual, que se produzam danos irreversíveis na esfera jurídica da Recorrente, enquanto não houver uma decisão definitiva sobre a validade ou ilicitude da resolução operada.
zz. A providência requerida traduz-se, pois, no exercício legítimo do direito processual conferido pelos artigos 362.º e seguintes do CPC, sendo, assim, adequada a preservar o efeito útil da ação principal – e não antecipar o seu desfecho.
aaa. Não obstante o caráter indiciário da prova exigida nesta fase processual, o Tribunal a quo recusou liminarmente a apreciação do mérito da pretensão cautelar da Recorrente, considerando, desde logo, que o meio utilizado seria “inadequado” em face da resolução, entretanto, levada a cabo pela Recorrida, antecipando o julgamento sobre a (in)eficácia da resolução contratual, assumindo que, ainda que ilícita, a resolução sempre produziria os seus efeitos, cabendo à Recorrente apenas reclamar uma eventual indemnização em sede própria.
bbb. Tal entendimento não só carece de base legal, como colide com princípios fundamentais do processo civil, nomeadamente, o princípio do contraditório (artigo 3.º CPC), o princípio da adequação formal (artigo 547.º CPC) e o direito à produção de prova (artigos 5.º e 410.º CPC).
ccc. A Decisão Recorrida, ao considerar desde logo inadmissível a via cautelar, impediu a Recorrente de demonstrar o fumus boni iuris e o periculum in mora que sustentam a sua pretensão, frustrando o acesso à justiça num momento em que a urgência da proteção é manifesta.
ddd. Não se pode afirmar que a pretensão da Recorrente é manifestamente improcedente – tanto mais que, para além de apresentar fundamento jurídico, está alicerçada numa descrição factual pormenorizada e consistente dos danos que a resolução, se mantida, poderá acarretar, a par do potencial acionamento indevido do remanescente da garantia bancária contratada.
eee. O Tribunal a quo não só afastou a apreciação da pretensão de suspensão dos efeitos da resolução, como ignorou indevidamente as restantes medidas cautelares peticionadas pela Recorrente, frustrando por completo o fim útil da presente providência.
fff. Deve, por isso, a Decisão Recorrida ser revogada, e substituída por outra que ordene o prosseguimento dos autos, com designação de audiência e produção da prova necessária à apreciação das pretensões cautelares formuladas, permitindo-se assim uma decisão fundada e justa - só desta forma poderá ser assegurado o respeito pelo princípio da tutela jurisdicional efetiva e garantido o equilíbrio processual entre as partes.
DA SUBSISTÊNCIA DAS PRETENSÕES DA RECORRENTE
ggg. A resolução ilícita não tem como consequência (automática e/ou necessária) a extinção da relação contratual existente entre as partes. Ainda que assim se entendesse, no que não se concede, sempre o Tribunal tinha o dever de se pronunciar, pelo menos, acerca das pretensões da Recorrente referentes ao acionamento do remanescente da garantia bancária n.º BGA…302 por parte da Recorrida e correspondente pagamento por parte do Deutsche Bank. A pretensão da Recorrente é ver o seu direito de exigir o cumprimento integral e pontual das obrigações da Recorrida em conformidade com o Contrato, e não a obtenção de um crédito indemnizatório por via da resolução ilegal do Contrato operada pela Recorrente
hhh. Assiste à Recorrente o direito de exigir que a Recorrida, enquanto parte contratualmente vinculada, cumpra as obrigações por si assumidas de forma pontual, integral e em conformidade com os princípios da boa-fé e da cooperação (cf. artigo 762.º do CC).
iii. Tal obrigação implica o reconhecimento pela Recorrida da sua responsabilidade pela execução das obras de reforço estrutural do imóvel – indispensáveis à instalação, funcionamento e gozo do estabelecimento comercial da Recorrente – e, cumulativamente, o direito desta de impedir a prática de atos contratuais abusivos, tais como o acionamento indevido do remanescente da garantia bancária e a cessação do Contrato por via de uma resolução unilateral e injustificada do mesmo.
jjj. A Recorrente sempre se limitou a exigir da Recorrida o cumprimento das obrigações legais e contratuais que sobre esta impendem: enquanto proprietária, sempre lhe seria exigível suportar obras estruturais que afetam todo o imóvel, garantindo que o mesmo se encontrava em condições adequadas à finalidade contratada, nomeadamente no que toca à sua segurança estrutural do mesmo (cf. artigo 1074.º do CC).
kkk. O próprio Contrato celebrado entre as partes consagra o dever da Recorrida de entregar o imóvel em condições adequadas à instalação do estabelecimento da Recorrente, pelo menos, na Área Utilizável (cf. artigo 1.º do Contrato) - obrigação essa que não se compadece com a existência de vícios ocultos que inviabilizam o gozo e a utilização do imóvel como um todo.
lll. Não pode ser imputada à Recorrente qualquer responsabilidade pelo desconhecimento deste defeito oculto, nem lhe pode ser oposta uma alegada aceitação das condições do imóvel em estado “as is”, porque essa aceitação implica um conhecimento de certas condições que não está demonstrado que existissem à data da celebração do Contrato.
mmm. Perante um defeito oculto sobre o qual a Recorrente tomou conhecimento posteriormente à celebração do Contrato, a Recorrida impôs à Recorrente o pagamento das rendas contratadas sem a devida contrapartida, traduzindo-se numa clara violação do sinalagma contratual e numa tentativa de enriquecimento sem causa por parte da Recorrida.
nnn. Relembre-se, ainda, que a Recorrente peticionou que a Recorrida fosse impedida de solicitar o reforço ou a substituição da garantia bancária até que as obras de reforço estrutural do Imóvel estivessem concluídas e a Recorrente pudesse, de forma efetiva e legítima, iniciar as obras de adaptação da Área Utilizável - pretensão esta que se fundamenta, uma vez mais, na necessidade de restabelecer e preservar o equilíbrio contratual entre as partes, numa lógica de boa-fé objetiva (artigo 762.º, n.º 2 do CC).
ooo. Recorde-se também que o acionamento parcial da garantia bancária, no valor de EUR 369.730,02, carece de qualquer fundamento material ou jurídico, tendo sido promovido de forma abusiva e desproporcionada.
ppp. É precisamente para obviar a esta desproporção e evitar uma inversão injusta dos encargos contratuais durante o decurso da lide que a Recorrente peticionou que a obrigação de reforço ou substituição da garantia bancária fosse, desde logo, suspensa – ou, no limite, condicionada ao momento em que estivesse efetivamente assegurado o uso do imóvel para os fins contratualmente previstos.
qqq. No requerimento inicial, a Recorrente havia solicitado a adoção de medida cautelar que impedisse a Recorrida de resolver o Contrato com fundamento na suposta falta de pagamento das rendas mensais, invocando – como continua a invocar – a impossibilidade objetiva de uso do imóvel, circunstância que justifica legitimamente a suspensão da obrigação de pagamento.
rrr. Em face da resolução operada pela Recorrida posteriormente à formulação do requerimento inicial, a Recorrente viu-se forçada a reformular a sua pretensão, solicitando a suspensão dos efeitos dessa resolução e que, a partir do momento em que esses efeitos fossem suspensos, fossem atendidos os pedidos inicialmente formulados no requerimento inicial.
sss. Quando a Recorrente restringe o alcance temporal dessa suspensão, apenas até à decisão sobre a providência cautelar, fá-lo porque aquilo que pretende – e continua a pretender – é a não produção de efeitos da resolução e que, na sequência do reconhecimento da não produção dos efeitos da resolução na decisão cautelar, lhe sejam reconhecidos todos os pedidos formulados no requerimento inicial até à decisão definitiva da ação principal, que venha a confirmar, ou não, os efeitos da medida provisória.
ttt. A função do segundo pedido é, precisamente, assegurar a utilidade prática da decisão final, nos termos do artigo 362.º, n.º 1 do CPC.
uuu. Restringir a suspensão dos efeitos da resolução apenas até à decisão sobre a providência cautelar seria ilógico, ineficaz e contrário à função cautelar, transformando a medida num mecanismo desprovido de qualquer capacidade de proteção efetiva e não reflete, de todo, aquela que é a efetiva pretensão da Recorrente.
vvv. Assim, é evidente que a restrição do pedido de suspensão apenas até à decisão sobre a providência cautelar pressupõe que, depois de suspendidos os efeitos da resolução em virtude da sua ilicitude, os pedidos constantes do requerimento inicial se mantenham e sejam julgados procedentes, sendo clara a intenção da Recorrente de assegurar o status quo contratual até que seja proferida decisão definitiva em sede de ação principal, sob pena de tornar inócua a própria medida cautelar.
www. O n.º 1 do artigo 364.º do CPC estabelece o carácter instrumental da providência cautelar perante a ação principal, pelo que é contraditório e violador da própria ratio legis deste instituto que o Tribunal a quo, reconhecendo essa função protetora da providência, venha admitir que os efeitos da medida possam cessar antes da apreciação final do direito invocado, prejudicando irreversivelmente a posição da Recorrente e frustrando o efeito útil do processo principal.
xxx. Ainda que se entendesse ser de manter a literalidade do pedido, o Tribunal a quo deveria, nos termos do artigo 590.º, n.º 2, alínea b), do CPC, ter convidado a Recorrente ao aperfeiçoamento ou esclarecimento da sua pretensão, ao abrigo do princípio do contraditório e do dever de colaboração processual (cf. artigos 3.º e 590.º, n.º 2, al. b), ambos do CPC).
yyy. Assim, impõe-se que a medida requerida seja interpretada conforme a sua real e manifesta intenção, visando a suspensão dos efeitos da resolução e a consequente manutenção dos pedidos iniciais até à prolação da decisão final no processo principal, sob pena de frustrar o direito da Recorrente à tutela jurisdicional efectiva, consagrado no artigo 20º da CRP, esvaziando o efeito útil da providência cautelar requerida.
zzz. No que toca ao periculum in mora, o Tribunal a quo cinge a obrigatoriedade de verificação de um fundado receio de lesão grave e irreparável ou de difícil reparação do direito à assunção de que o direito da Recorrente perante a resolução do Contrato será apenas um direito a ser indemnizada,
aaaa. No entanto, a Recorrente não visa obter qualquer indemnização por parte da Recorrida nos presentes autos por via da resolução ilegítima do Contrato, tendo, ainda, deixado patente que o fundado receio de ocorrência de uma lesão grave e irreparável ao seu direito à manutenção e execução do Contrato, que se estima ascender a 1.483.411,47 (um milhão, quatrocentos e oitenta e três mil, quatrocentos e onze euros e quarenta e sete cêntimos), assenta: (i) No indevido acionamento da garantia bancária junto do Requerido Deutsch Bank; (ii) Na possibilidade de a Recorrida acionar o remanescente da garantia bancária no valor de 500.000,00, impondo à Recorrente a devolução imediata do montante integral da garantia ao Requerido Deutsch Bank; (iii) Na impossibilidade de desenvolver o projeto, perdendo os significativos investimentos já feitos, nomeadamente em rendas já pagas, mas sem usufruto do local, e em obras e relatórios técnicos, que se revelariam inúteis caso a relação contratual cessasse; e (iv) Na impossibilidade de substituir o espaço por outro com as mesmas características, localização e condições acordadas, num curto espaço de tempo, ficando prejudicada a sua competitividade no mercado, com impacto nas suas receitas e viabilidade económica.
bbbb. A pretensão da Recorrente prende-se com a preservação da relação contratual vigente, e não com a tutela de um eventual crédito indemnizatório futuro.
cccc. O periculum in mora invocado não se traduz, pois, no risco de perda de uma garantia patrimonial, mas sim na ameaça de um desequilíbrio insustentável e injustificado da posição contratual da Recorrente, com efeitos concretos, imediatos e irreversíveis no seu funcionamento e estabilidade financeira.
dddd. O entendimento do Tribunal a quo enferma de erro de direito ao exigir da Recorrente a demonstração da situação económica da Recorrida como condição para a admissibilidade da providência, porquanto desconsidera a natureza e função da tutela cautelar que aqui se invoca, sendo certo que o periculum in mora se encontra cabalmente demonstrado. Sem prejuízo de tudo o que se deixou supra exposto, e sem conceder, sempre o Tribunal a quo se deveria ter pronunciado expressamente quanto ao direito da Recorrente de exigir a suspensão do acionamento do remanescente da garantia bancária n.º BGA…302
eeee. A questão da suspensão do acionamento da garantia bancária subsiste independentemente da eficácia da resolução contratual, sendo certo que, em qualquer caso, a Recorrente requereu expressamente a suspensão dos efeitos da resolução do contrato.
ffff. Ainda que estejamos perante uma garantia bancária autónoma à primeira solicitação, nem por isso a sua autonomia dispensa a necessidade de ter uma causa, que, por sua vez, reflete a sua função económico-social: a garantia bancária n.º BGA…302 visa assegurar as obrigações contratuais da Recorrente perante a Recorrida, concretamente o pagamento da renda.
gggg. Perante o incumprimento do Contrato por parte da Recorrida, a suspensão do pagamento das rendas devidas pela Recorrente assentou legitimamente na necessária reposição da proporcionalidade ou equilíbrio das prestações, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 1040.º do CC.
hhhh. Assim, perante a impossibilidade objetiva de utilização e fruição do imóvel, criada pela Recorrida, a Recorrente limitou-se a exercer legitimamente uma prerrogativa que lhe é atribuída por lei de não proceder ao pagamento das rendas. Estas constituem uma retribuição ou contraprestação somente devida pelo gozo de uma coisa, gozo esse que não sendo assegurado, não tem de ser pago.
iiii. É, portanto, evidente que a Recorrida não tem direito a exigir o pagamento das rendas mensais vencidas desde que a Recorrente tomou conhecimento da necessidade de realização de obras de reforço estrutural no edifício (ou seja, desde junho de 2024), nem das rendas que se venham a vencer – uma vez decretada a manutenção do Contrato - até que essas obras estejam concluídas e a Recorrente possa, efetivamente, iniciar as obras de adaptação do Imóvel.
jjjj. Decorre igualmente do que antecede que a atual suspensão do pagamento das rendas mensais não legitima o acionamento da garantia bancária ou qualquer outra tentativa de cobrança coerciva por parte da Recorrida.
kkkk. Tem vindo a ser reconhecido pela doutrina e jurisprudência nacionais que, mesmo sendo autónoma, as garantias bancárias não podem ser exigidas de forma ilimitada ou irrestrita pelo respetivo beneficiário, encontrando limites quando existam indícios claros de má-fé, fraude manifesta, abuso de direito ou quando se verifique, de forma inequívoca, o incumprimento do contrato-base (cf. artigos 334.º e 762.º, n.º 2 do CC).
llll. O dever de recusa do garante funda-se na existência de um dever de proteção que, assente no princípio da boa-fé, impõe ao banco garante um dever de tutela da esfera jurídica do mandante, onde se repercute o sacrifício económico da entrega da soma objeto da garantia.
mmmm. É este precisamente o caso: a Recorrida sabe que não é exigível o pagamento de rendas sem que esteja assegurado à Recorrente o uso e fruição do imóvel — o que não sucede em virtude da omissão da Recorrida quanto à realização das obras estruturais a que está vinculada.
nnnn. O acionamento do remanescente da garantia bancária por falta de pagamento de rendas, em contexto de incumprimento contratual por parte da Recorrida, consubstancia uma conduta abusiva e de má-fé, desprovida de qualquer suporte legal – o que sempre se verificaria mesmo que se viesse a concluir que os efeitos extintivos da resolução se produzem apesar da ilicitude da resolução – o que não se concede.
oooo. Para que não subsistam dúvidas: a Recorrente não pretende a extinção da obrigação de pagamento das rendas, mas tão-só que, enquanto subsistir a causa que a torna inexigível (i.e., a inexecução das obras pela Recorrida), o cumprimento dessa obrigação se encontre legitimamente suspenso, incluindo a correspondente execução da garantia bancária.
pppp. Assim, tratando-se de um caso evidente de abuso de direito, vedado pelos artigos 334.º, 344.º e 792.º do Código Civil, conclui-se que a Recorrente tem o direito de se opor ao acionamento da garantia e de exigir a respetiva suspensão.
Termina pedindo a revogação da decisão recorrida, que deve ser substituída por outra que ordene o prosseguimento dos autos, com designação de audiência e produção da prova necessária à apreciação das pretensões cautelares formuladas pela recorrente.
A requerida Dajrise Portugal, S. A. apresentou contra-alegações pugnando pela manutenção da decisão recorrida.15
Em 5 de Agosto de 2025 a recorrente juntou aos autos um parecer jurídico, tecendo considerações sobre o seu conteúdo, a que a recorrida se opôs e que aqui não serão consideradas.16
Em 18 de Agosto de 2025, a recorrida veio solicitar a declaração da extinção parcial da instância, por impossibilidade superveniente da lide, por se ter tornado impossível que o Tribunal impeça o accionamento do valor remanescente da garantia bancária n.º BGA…302 e que o Deutsche Bank AG, Sucursal em Portugal seja impedido de proceder ao pagamento à requerida de quaisquer montantes remanescentes dessa garantia, porquanto em 25 de Julho de 2025 solicitou àquele banco o pagamento da quantia de 424 093,75 €, ou todo o valor remanescente, se menor, tendo o banco pagado, em 1 de Agosto de 2025, a quantia de 130 269,98 €.17
Por requerimento de 1 de Setembro de 2025, suscita a má-fé processual da recorrida que, na pendência do recurso, com efeito suspensivo, procedeu ao accionamento do remanescente da garantia bancária.18
A requerida respondeu por requerimento de 11 de Setembro de 2025.
* Questão Prévia – Extinção parcial da instância por impossibilidade superveniente da lide
Conforme decorre do relatório supra uma das providências solicitadas pela requerente consiste em fazer recair sobre a requerida Dajrise Portugal, S. A. a obrigação de se abster de solicitar o accionamento do valor remanescente da garantia bancária n.º BGA…302 e sobre a Deutsche Bank AG – Sucursal em Portugal a obrigação de se abster de proceder ao pagamento de quaisquer montantes remanescentes da referida garantia bancária (pontos (ii) e (iii) do requerimento inicial).
Por requerimento de 18 de Agosto de 2025, a recorrida requereu a extinção parcial da presente instância, por impossibilidade superveniente da lide, por se ter tornado impossível o pedido de não accionamento do valor remanescente da garantia bancária n.º BGA…302 e de que o Deutsche Bank AG, Sucursal em Portugal seja impedido de proceder ao pagamento precisamente porque em 25 de Julho de 2025 solicitou àquele banco o pagamento da quantia de 424 093,75 €, ou todo o remanescente, se menor e em 1 de Agosto de 2025, o banco pagou-lhe a quantia de 130 269,98 €.
Em resposta, a recorrente limitou-se a suscitar a litigância de má-fé por parte da recorrida, por entender que tendo o recurso sido admitido com efeito suspensivo, não poderia a recorrida ter accionado a garantia bancária, embora nada tenha oposto à pretensão de extinção parcial da instância.
Em face dos documentos juntos pela recorrida com o seu requerimento de 18 de Agosto de 2025 afere-se o seguinte:
i. Por carta com data de 24 de Julho de 2025 a requerida solicitou ao Deutsche Bank AG - Sucursal em Portugal a execução imediata da garantia bancária autónoma, irrevogável e à primeira solicitação n.º BGA…302, emitida a pedido da Primordial Tomorrow, Lda. em benefício da Dajrise Portugal, S. A., com o inerente pagamento da quantia de 424 094,75 €, ou todo o valor remanescente, se for menor, por estarem verificados os pressupostos da sua execução, consistentes na falta de pagamento pela Primordial das remunerações mensais e custos que respeitam às facturas, que identificou, relativas ao contrato de prestação de serviços celebrado em 1 de Junho de 2023, apesar de ter sido interpelada para as pagar;19
ii. Em 1 de Agosto de 2025, o Deutsche Bank AG – Sucursal em Portugal procedeu ao pagamento à requerida Dajrise Portugal, S. A. do valor remanescente disponível atinente à garantia bancária n.º BGA…302, no montante de 130 269,98 €.20
O modo normal de extinção da instância é o trânsito em julgado da sentença final ou do acórdão, seja uma decisão sobre a relação material controvertida, seja uma decisão de absolvição da instância.
No entanto, entre os fundamentos para a extinção da instância figura, nos termos do disposto na alínea e) do art.º 277.º do CPC, a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide.
Esta dá-se “quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da providência requerida. Num e noutro caso, a solução do litígio deixa de interessar – além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por ele já ter sido atingido por outro meio.” – cf. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 3ª Edição, pág. 546.
Está-se perante uma situação de impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, quando devido a novos factos, verificados na pendência do processo, não existe qualquer efeito útil na decisão a proferir, quando já não é possível o pedido ter acolhimento ou quando o fim visado com a acção foi atingido por outro meio – cf. Prof. José Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. 3º, Coimbra 1946, pp. 368-369.21
Sobre esta questão o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 19-10-2015,122702/13.5YIPRT.P122 discorreu do seguinte modo:
“Em síntese, a instância extingue-se por impossibilidade superveniente da lide, quando uma ocorrência processual torna a instância desnecessária.
E parece claro que o exemplo mais flagrante de impossibilidade superveniente ocorre quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não possa subsistir por motivos atinentes ao objecto do processo, na pendência da causa, independentemente ou antes da decisão judicial.
A instância extingue-se sempre que se torne supervenientemente impossível, ou seja, sempre que a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento do objecto do processo, determinando impossibilidade de atingir o resultado visado.
Assim, sempre que não é possível dar satisfação à pretensão que o demandante quer fazer valer na acção, é claro que o processo não deve continuar, mas antes cessar.
A instância extingue-se porque se tornou impossível o prosseguimento da lide.
Verificado o facto, o Tribunal não conhece do mérito da causa, limitando-se a declarar aquela extinção.
Face a este breve enunciado é apodíctico adiantar que o facto susceptível de determinar a extinção da instância por impossibilidade de lide além de dever ser superveniente, ou seja, de verificação ulterior, deve importar impossibilidade de atingir o resultado visado.
Para a integração do conceito em causa é, pois, necessário averiguar, antes de tudo o mais, qual é o objecto da lide, determinado em razão da pretensão ou pretensões deduzidas pelo autor na sua petição inicial.”
Também na decisão sumária singular do Tribunal da Relação de Coimbra de 5-12-2012, 1124/11.4TBTMR.C1 refere-se a respeito da inutilidade superveniente da lide:
“A instância extingue-se ou finda de forma anormal de todas as vezes que, ou por motivo atinente ao sujeito, ou por motivo atinente ao objecto, ou por motivo atinente à causa, a respectiva relação jurídica substancial se torne inútil, i.e. deixe de interessar a sua apreciação.
A inutilidade da lide é, portanto, simples reflexo, no plano processual, da inutilidade da relação jurídica substancial, quer esta inutilidade diga respeito ao sujeito, ao objecto ou à causa.
Sempre que o efeito jurídico que se pretendia obter com a acção se mostre supervenientemente inútil, é claro que o processo não deve continuar – mas antes cessar.”
No contexto dos recursos ordinários, os factos supervenientes são aqueles que ocorreram ou foram conhecidos pela parte depois do encerramento da discussão em 1ª instância, ou seja, num momento em que a sua alegação já não era admissível (cf. art. 588º, n.º 3, c) do CPC).
Como explica o Professor Miguel Teixeira de Sousa, “Os factos supervenientes podem relevar no procedimento de recurso em duas situações: esses factos podem integrar-se na matéria considerada na instância recorrida; esses factos podem respeitar a matéria específica dos recursos.” – cf. Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lisboa 1997, pág. 455.
Quanto aos factos relativos a matéria específica dos recursos não se colocam dúvidas quanto à possibilidade da sua alegação na instância de recurso (por exemplo, factos que implicam a suspensão da instância pelo falecimento da parte).
No que diz respeito aos factos supervenientes relativos à matéria apreciada na instância recorrida, a solução não se afigura tão indiscutível. No entanto, o Prof. Miguel Teixeira de Sousa propugna pela sua admissibilidade referindo que pode ser alegado um facto superveniente e apresentada a respectiva prova documental, tanto quando aquele facto e esta prova conduzam à confirmação da decisão impugnada, como quando impliquem a sua revogação - cf. op. cit., pág. 457.
E neste contexto, admite também a invocação de factos supervenientes relativos à apreciação dos pressupostos processuais, exemplificando, precisamente, a situação em que durante o recurso o interesse processual desaparece por uma circunstância que implica a inutilidade superveniente da lide, afirmando que “sempre que ocorra qualquer facto superveniente com relevância para a apreciação dos pressupostos processuais, ele não pode deixar de ser considerado na instância de recurso.” – cf. op. cit., pág. 458.
É precisamente o que sucede no caso em apreço.
Com efeito, visa a recorrente com o presente recurso obter a revogação da decisão que indeferiu todas as providências solicitadas pela sua inadequação face ao direito invocado e obter o prosseguimento do procedimento cautelar e a apreciação dos diversos pedidos formulados, designadamente os descritos sob os pontos (ii) e (iii) do requerimento inicial.
Sucede que, após a prolação de tal decisão de indeferimento e ainda antes do seu trânsito em julgado, na pendência já desta instância de recurso, a requerida Dajrise Portugal, S. A. solicitou ao Deutsche Bank AG - Sucursal em Portugal a execução da garantia bancária autónoma n.º BGA…302, que procedeu ao pagamento da totalidade da quantia remanescente.
Ora, esse pagamento, como é evidente, tornou inútil a lide quanto às providências requeridas nos pontos (ii) e (iii).
É sabido que o procedimento cautelar visa a tutela provisória de um direito ameaçado, através da adopção de medidas adequadas a evitar o risco do perecimento desse direito, decorrente da demora no processamento da acção principal.
O periculum in mora, pressuposto essencial para o decretamento de providências cautelares não especificadas (cf. art.º 362.º, n.º 1 do CPC), consiste no perigo de ocorrência de lesão ou dano para o requerente resultante da demora da tutela do seu direito na acção principal e constitui o fundamento que legitima a concessão de uma medida cautelar.
Com as providências requeridas nos pontos (ii) e (iii), a recorrente pretendia garantir que, até à decisão final a proferir na acção principal, não se concretizasse o pagamento do remanescente da mencionada garantia bancária.
Tendo-se verificado o comportamento que se visava impedir, que é de execução imediata (não continuada ou repetida), há que concluir que já se verificou o dano que justificou o pedido, estando consumada a lesão.
Concretizado o pagamento e consumada a lesão, as referidas providências não têm razão de ser, sendo que os eventuais efeitos que se possam prolongar no tempo, não poderão ser evitados com as providências concretamente requeridas.
Verificada a lesão que se pretendia evitar, desapareceu o fundamento da providência e resulta frustrada a utilidade do procedimento cautelar, extinguindo-se a instância, nessa parte, por inutilidade superveniente da lide – cf. neste sentido, Marco Carvalho Gonçalves, Providências Cautelares, 4ª Edição, pág. 211; acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 13-07-2023, 2809/22.5T8CSC.L1-8.
A lide fica inútil se ocorreu um facto ou uma situação posterior à sua inauguração que implique a impertinência, ou seja a desnecessidade, de sobre ela recair pronúncia judicial, por ausência de efeito útil.
A inutilidade superveniente da lide ocorre precisamente pela falta superveniente de interesse processual, designadamente, de interesse processual do recorrente na apreciação da impugnação que dirigiu contra a decisão que indeferiu as providências requeridas, o que determina a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, nos termos do art. 277º, e) do CPC, quando aos pedidos formulados nos pontos (ii) e (iii) do requerimento inicial, em virtude do pagamento do remanescente da garantia bancária n.º BGA…302.
Como tal, resulta prejudicada, por inútil, a apreciação de parte do objecto do presente recurso.
Custas, nesta parte, a cargo da requerida Dajrise Portugal, Lda. que, optando por accionar o remanescente da garantia bancária, sem aguardar pelo trânsito em julgado da decisão da primeira instância, deu causa à inutilidade da lide (cf. art.º 536.º, n.º 3 e 4 ex vi art.ºs 607.º, n.º 6, e 663.º, n.º 2, todos do CPC).
* II – OBJECTO DO RECURSO
Nos termos dos art.ºs 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1 do Código de Processo Civil23 é pelas conclusões do recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do presente recurso, sem prejuízo das questões de que este tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Assim, perante as conclusões da alegação da requerente/recorrente há que apreciar se se verifica a manifesta improcedência das providências não especificadas requeridas.
Colhidos que se mostram os vistos, cumpre apreciar e decidir.
* III - FUNDAMENTAÇÃO
3.1. – FUNDAMENTOS DE FACTO
O tribunal recorrido não fixou os factos indiciados e não indiciados, pelo que os factos relevantes para a decisão são os que constam da tramitação processual descrita no relatório supra.
*
3.2. – APRECIAÇÃO DO MÉRITO DO RECURSO Dos requisitos da providência cautelar não especificada
A decisão sob recurso contém o seguinte dispositivo: “Em face do exposto, por inadequação da providência cautelar, indefiro a providência cautelar comum instaurada por PRIMORDIAL TOMORROW, LDA. contra DAJRISE PORTUGAL, S.A e DEUTSCHE BANK AG SUCURSAL EM PORTUGAL. Custas a cargo da requerente (cfr. art. 539.º do CPC).”
Independentemente da correcção formal desta formulação, afigura-se claro que na decisão em referência o Tribunal se absteve de conhecer, em concreto, dos factos alegados, aferindo, antes, uma manifesta improcedência da pretensão cautelar deduzida, que identificou como “inadequação” das concretas medidas solicitadas, concluindo pela sua inviabilidade, sendo que apenas a circunstância de se ter identificado uma “falta de pressupostos” da providência justifica a não pronúncia sobre os factos indiciados e não indiciados, pois que esta apenas seria necessária para apreciar o mérito dos pedidos.
Na verdade, não tendo ocorrido um indeferimento liminar do requerimento inicial – cf. art.ºs 226º, n.º 4, b) e 590º, n.º 1 do CPC -, tal não obsta a que se julgue, posteriormente, que o mesmo é improcedente pelas mesmas razões que poderiam ter conduzido à decisão liminar – cf. neste sentido, António Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil – III Volume – Procedimento Cautelar Comum, 1998, pág. 179, referindo não existir razão para, verificadas circunstâncias que impedem o conhecimento do mérito da providência, se prosseguir com a prática de actos sem qualquer utilidade; cf. acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 24-02-2025, 1281/24.0T8PNF-A.P1.
A decisão recorrida indeferiu as providências solicitadas pela requerente, considerando-as inviáveis, com a seguinte argumentação (na parte que releva para as providências solicitadas não afectadas pela inutilidade superveniente supra decretada):
“O caso em apreço remete-nos para a questão respeitante às consequências da resolução ilegítima, isto é, se a mesma determina ou não a cessação do vínculo contratual estabelecido.
“A resolução é a destruição da relação contratual (validamente constituída) operada por um dos contraentes, com base num facto posterior à celebração do contrato” – Antunes Varela, “Das Obrigações”, 2º-242. […]
A resolução contratual configura pois um acto jurídico unilateral que opera através de uma decisão de um dos contraentes e que não carece do (nem fica sujeita ao) consentimento da contraparte (Vaz Serra: «Resolução do Contrato» —Trabalhos Preparatórios do Código Civil, in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 68, 1957, página 236).
Assim sendo, a resolução assume-se como um direito potestativo que um dos contraentes pode impor à sua contraparte (neste sentido, Romano Martinez: in Da Cessação do Contrato, 2.ª Edição (Almedina), Coimbra, 2006, página 144, e Brandão Proença: in A Resolução do Contrato no Direito Civil, Reimpressão, Coimbra, 2006, página 152).
Não se desconhecendo a tese seguida por Fernando de Gravato Morais (págs. 164 e 165 do Contrato-Promessa em Geral e Contratos-Promessa em Especial, Almedina, 2009) e Calvão da Silva (págs. 134 e 158 d’A declaração da intenção de não cumprir e pressupostos da resolução por incumprimento, in Estudos de Direito Civil e Processo Civil, Almedina, 1999), que consideram que a resolução ilegítima não determina a cessação do contrato, não se concorda com a mesma, antes com a posição contrária.
No sentido afirmativo de que a resolução infundada é operante, posicionam-se Romano Martinez (pág. 221 da obra citada), Pinto Monteiro (pág. 128 do Contrato de Agência, Anotação, Almedina, 5.ª edição, 2004 e o Ac. da Relação de Lisboa de 10/12/2009, proc. 6240.05.9TVLSB.L1-7. […]
Neste mesmo sentido, no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 13 de Março de 1997, foi decidido que «A resolução, sem justa causa do contrato de concessão comercial apenas motiva o dever de indemnizar por dano e não a obrigação de continuar a relação contratual resolvida» (in Colectânea de Jurisprudência, Tomo II, páginas 196 e seguintes).
Também o Ac. do STJ de 4-4-2006, revista 205-06 decidiu “I - Operando a resolução do contrato por mero efeito da declaração unilateral à outra parte, como é próprio das declarações de vontade recetícias - arts. 436º-1 e 224º-1 C. Civil -, ao controlo judiciário da existência de fundamento ou da regularidade do respetivo exercício só interessa o desenvolvimento das relações negociais até ao momento da produção dos efeitos da declaração resolutiva. II - Destruído o contrato, há incumprimento definitivo e só poderá interessar saber a qual dos contraentes é imputável esse incumprimento, o que depende da existência ou não de fundamento para a resolução.”
Os pedidos da requerente nestes autos de procedimento cautelar são os seguintes: […]
Decorre do contrato junto aos autos que a requerida observou a forma de resolução prevista, enviando missiva em 9.1.2025 para sanação do suposto incumprimento a qual, não tendo obtido acolhimento, gerou a comunicação de 7.3.3025. O próprio contrato prevê as consequências de incumprimento, com indemnização – cl. 15.
Por outro lado, da declaração de ilicitude não decorre qualquer efeito prático para a requerente, a nível de atuação cautelar. Não poderá, por via dessa declaração, obter o repristinar do contrato, o que parece ser essa a sua pretensão.
No âmbito das relações comerciais as partes são livres de resolver os contratos. Essa resolução pode vir a ser considerada ilícita e se o for, então, a parte contrária tem apenas direito a ser indemnizada pelo prejuízo decorrente dessa resolução.
Assim, o mais que poderá alcançar é uma indemnização pelos danos, a obter em sede própria, ou seja, em sede de ação declarativa, sendo certo que atendendo à disposição conjugada dos arts. 366.º, n.º 7 e 564.º, ambos do CPC, a requerida se considerará citada com a apresentação da petição inicial, com os efeitos inerentes, no que tange à opção de resolução após a citação, apreciação que apenas pode ter lugar também em sede de ação principal.
Não se vislumbra assim que o pedido formulado permita à requerente alcançar qualquer tipo de tutela ao abrigo de providência cautelar.
Entretanto, como já se referiu, ocorreu a resolução extrajudicial e, por isso, a requerente pede a modificação do pedido para a suspensão dos efeitos da mesma até à decisão da providência cautelar, sob pena de inutilidade, que a mesma reconhece.
Mas ainda que fosse procedente este pedido, bem se vê que os efeitos de tal suspensão teriam um efeito temporal limitado e não permitiriam acautelar qualquer eventual direito, ainda que existisse, porquanto seria sempre necessário que existisse definição do mesmo por via da ação principal que, necessariamente, não tem os tempos da providência cautelar, não estando, de resto, ainda sequer intentada. Ainda que se decretasse a suspensão até à decisão da providência cautelar, a mesma cessaria os seus efeitos com esta decisão, e estaríamos na mesma posição em que nos encontramos na atualidade, com o contrato resolvido.
Acresce que o decretamento de uma providência cautelar depende sempre da verificação de fundado receio de lesão grave e irreparável ou de difícil reparação do direito –art.º 362.º,1 CPC.
Não foram alegados factos donde se possa concluir que os danos sofridos e a sofrer pela requerente, em resultado da resolução ilícita, não possam ser reparados pela requerida.
Assente que o direito da requerente será apenas um direito a ser indemnizada, só se justificaria uma providência destinada a salvaguardar esse mesmo direito, ou seja, só se a requerida estivesse em situação económica de fazer perigar o direito à indemnização (matéria que não foi alegada), sendo providências adequadas o arrolamento ou o arresto. […]
Todos os demais pedidos dependiam da subsistência contratual: a realização das obras, a suspensão do pagamento de rendas, a impossibilidade de pedido de reforço de garantias ou acionamento do remanescente da garantia.
Com efeito, atentos os pedidos formulados, bem se vê que esta providência não pode ser antecipatória nem conservatória dos direitos ali invocados nem se destina a assegurar, provisoriamente, uma qualquer decisão final que vise a realização do direito acautelado.
O pedido consiste em fazer com que a requerida proceda a diligências que permita a utilização do espaço e sua exploração, para poder justificar a suspensão de pagamento de rendas, bem como que se impeça a requerida de proceder à destruição dos efeitos contratuais e acionar a garantia, e, agora, através do último requerimento que se suspenda os efeitos da resolução até à decisão da providência.
Em suma, a providência cautelar não acautela nem antecipa provisoriamente os efeitos da providência definitiva, na pressuposição de que pudesse ser favorável ao requerente a decisão a proferir no processo principal.
É que o processo da providência cautelar terá de conter o esboço da ação a propor ou já proposta, de modo que o direito que se pretenda acautelar seja objeto dessa ação (“Providências Cautelares não especificadas, “O Direito”, ano 94º, p. 113, citado por Abrantes Geraldes na obra já supra mencionada, p. 129).
Por fim, diga-se que, apesar de a Requerida ter procedido no prazo de oposição à resolução, baseou-se no contrato e em norma legal, pelo que não se considera existir uma lide integrante de má fé; coisa diversa é se lhe assistia fundamento, o que apenas em ação própria poderá verificar-se, como acima se consignou.”
A decisão recorrida assentou, pois, na seguinte ordem de fundamentos:
= Estão em causa as consequências de uma resolução ilegítima do contrato, adoptando o tribunal recorrido a posição de que, apesar de ilícita, a resolução determina a cessação do contrato;
= A eventual declaração de ilicitude da resolução não pode conduzir à repristinação do contrato, que é a pretensão da requerente, mas apenas a uma indemnização pelos danos causados;
= Os pedidos cautelares deduzidos não podem conferir qualquer tutela a esse direito indemnizatório;
= Mesmo a admitir o pedido de suspensão dos efeitos da declaração de resolução, este teria um efeito temporal limitado (até à prolação da decisão cautelar), sendo que não existiria definição do direito, por via principal, até esse momento, pelo que perante uma eventual decretação da suspensão a situação seria a mesma: o contrato resolvido;
= Não foram alegados factos que evidenciem que os danos não possam ser reparados, sendo que o direito da requerente sempre seria apenas o direito a ser indemnizada, não tendo sido alegado que a requerida esteja em situação económica que coloque em crise a sua efectivação.
Adianta-se, desde já, que a decisão recorrida não pode subsistir.
Na verdade, a conclusão pela inviabilidade das providências requeridas assentou, sobremaneira, no entendimento do tribunal a quo de que uma resolução contratual ilícita determina sempre a cessação do contrato e que todas as providências solicitadas dependem da subsistência do vínculo contratual.
Não se acompanha este entendimento.
A existência do direito de resolução, que tem por objectivo a extinção total ou parcial do vínculo contratual, pressupõe, por norma, a verificação de um fundamento que será, na maioria dos casos, o incumprimento culposo de uma obrigação, sendo que a culpa apenas excepcionalmente poderá ser dispensada - cf. art.ºs 432º, 798º e 808º do Código Civil.
Enquanto declaração receptícia, a declaração de resolução produz os seus efeitos quando chega ao poder do destinatário ou quando dele é conhecida – cf. art.ºs 436º e 224º, n.º 1 do Código Civil.
Como tal, em regra, por decisão unilateral de uma das partes no contrato, produz-se a imediata extinção do vínculo. Os efeitos da resolução, em resultado da natureza potestativa do direito, produzem-se independentemente do acordo da contraparte que se encontra numa posição de sujeição.
É sabido que os efeitos da declaração de resolução, emitida em desconformidade com a lei ou a convenção das partes, não se encontram consensualmente identificados na doutrina e jurisprudência nacionais.
Parte da doutrina nacional tende a reconhecer eficácia extintiva à declaração resolutiva ilícita. Assim, não obstante a desconformidade daquela declaração com a lei, o contrato que dela fosse objecto seria extinto. Outra parte da doutrina faz corresponder a declaração de resolução infundada a um incumprimento do contrato.
No acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 5-06-2014, 23/10.1TBBGC.P1 efectua-se uma breve resenha das posições doutrinais mais conhecidas, que reconduzem a declaração de resolução sem fundamento:
i. a uma recusa a cumprir:
“a possibilidade da recondução de uma resolução baseada numa causa que não se prova, desde que conjugada com outras circunstâncias, a uma recusa categórica de cumprimento, pode ser vista, por exemplo, em Brandão Proença: “É do entendimento comum que, em regra, a decisão do devedor é revelada de forma expressa mediante uma declaração dirigida ao credor e em que faz saber – como seu conteúdo – a vontade de não cumprir o chamado ‘programa contratual’. No seu desiderato de anunciar essa intenção, a declaração do devedor pode manifestar-se obliquamente com alegações de inexistência ou invalidade contratual, sob a forma de motivações subjectivas de desinteresse […] e pretensões sem justificação contratual, ou ir implícita na atitude mais radical de repúdio ou rejeição do próprio contrato, revelada através de pedidos de anulação, resolução (potenciada com um pedido indemnizatório) […] denúncia ou impugnação do vínculo assumido. […] contudo […], também não se afasta que o desejo desvinculativo possa repousar num fundamento excludente da ilicitude, numa circunstância desculpável […] Nuno Manuel Pinto Oliveira […] defende a relevância da recusa de cumprimento […] “O devedor que declarasse actuar o direito potestativo [de] resolver um contrato bilateral, não podendo fazê-lo, por não estarem preenchidos os requisitos da resolução […] estaria a atribuir ao seu credor o direito potestativo de o resolver.
[…] Pedro Romano Martinez: “quando o devedor declara expressamente – de modo significativo – não pretender cumprir a prestação a que está adstrito, não se torna necessário que o credor lhe estabeleça um prazo suplementar para haver incumprimento definitivo. A declaração do devedor é suficiente, por exemplo, no caso em que, sem fundamento, resolve o contrato ou afirma, de forma inequívoca, que não realizará a sua prestação”
ii. ou a uma denúncia sem pré-aviso:
“Esta via – da recondução da resolução (com fundamento que não se vem a provar) numa denúncia com imediato efeito extintivo – pode ser vista em Pinto Monteiro: “duas soluções se perfilam à partida: declarar que o contrato […] se mantém, tendo a outra parte direito a ser indemnizada pelos danos causados pela suspensão do contrato […]; ou partir do princípio de que o contrato se extinguiu, traduzindo-se a falta de fundamento da resolução, apurada posteriormente, numa situação de não cumprimento do contrato pelo contraente que indevidamente lhe pôs termo, com a consequente obrigação de indemnização. A primeira solução seria no plano dos princípios a mais correcta, pois a resolução sem fundamento é um exercício ilícito do respectivo direito: caso contrário conseguir-se-ia obter o resultado pretendido, de extinção do contrato, em violação da lei. […] Argumenta[…]-se ainda, no sentido da extinção imediata do contrato […] “com a possibilidade de equiparar uma resolução sem fundamento a uma declaração de não cumprir, que se vem considerando equivalente ao não cumprimento definitivo”. E não deixa ainda de notar que acresce “que o contraente que resolve o contrato sem fundamento sempre poderia denunciá-lo (tratando-se de contrato por tempo indeterminado), uma vez que a denúncia não carece de ser motivada […]”
iii. ou ainda a uma resolução ineficaz:
Ou em Paulo Mota Pinto: “a resolução sem fundamento é […] ineficaz”, “por não possuir fundamento jurídico e o resolvente não ser titular do correspondente direito potestativo. […D]a tentativa de exercício de um direito de que se não era titular não pode resultar qualquer efeito extintivo da relação contratual”. Este autor aceita, no entanto, que isto não será assim nos casos de contratos em relação aos quais o resolvente tinha o direito de pôr termo ao contrato mediante denúncia ad libitum [=ad nutum - (discricionária, sem necessidade de invocação de um motivo)], hipóteses em que admite a equiparação da declaração de resolução sem fundamento a uma denúncia sem pré-aviso ou mesmo a possibilidade de converter a resolução em denúncia ou numa declaração de anulação do contrato, se este for anulável (Interesse Contratual Negativo e Interesse Contratual Positivo, Coimbra Editora, 2008, nota 4861, págs. 1674/1677).
E em Nuno Manuel Pinto de Oliveira diz que: a resolução ilegal, ilegítima ou ilícita não é eficaz, isto é não tem efeitos liberatórios e restituitórios; “a resolução sem fundamento traduz um exercício ilícito do respectivo direito” (Pinto Monteiro); admitir que o autor de uma resolução sem fundamento se desvinculasse significaria atribuir-lhe o efeito querido, contra a lei. O exercício ilícito do direito seria tratado como se de um exercício lícito se tratasse. E depois distingue consoante o autor da declaração de resolução tinha um direito potestativo de denúncia discricionária (ad libitum ou ad nutum) e os casos em que não o tinha. Quando tinha, aquela declaração de resolução deverá interpretar-se como uma declaração de denúncia e o contrato extinguir-se-á, com eventual direito de indemnização da contraparte […]”.
Joana Farrajota, inOs Efeitos da Resolução Infundada por Incumprimento do Contrato24, 2013, após longo excurso sobre as posições doutrinárias existentes, análise de direito comparado e dos diversos tipos contratuais no direito nacional que contemplam a possibilidade de resolução/denúncia, propende para a ineficácia da declaração resolutiva sem fundamento, mas admite (pela ponderação, nomeadamente, de normas que parecem atribuir relevo à denúncia injustificada, como a do art.º 1103º, n.º 9 do Código Civil) que, em determinados casos, muito embora a resolução seja ineficaz, o contrato poderá ainda vir a ser extinto, por meio da respectiva equiparação à denúncia realizada sem respeito pelo pré-aviso, o que dependerá da verificação dos pressupostos da denúncia, designadamente, do contrato em causa ser de duração indeterminada, bem como do dever de pré-aviso não constituir, in casu, um requisito de eficácia da declaração de denúncia.
Quanto ao direito da contraparte de manutenção do vínculo em face de uma resolução ilícita, refere aquela autora que haverá sempre que avaliar se “atendendo às circunstâncias do caso concreto e à luz do princípio da boa fé, é exigível ao devedor, que exprimiu a sua vontade de pôr termo ao contrato, que se mantenha vinculado ao mesmo. Neste juízo há que ponderar, por um lado, o interesse do credor no cumprimento e, por outro, o esforço de cumprimento do devedor. Este esforço, note-se, não é necessariamente mensurável apenas em termos meramente económicos. Não se trata aqui de apreciar somente o agravamento do custo financeiro da execução da prestação, mas também o esforço moral da manutenção do contrato pelo devedor inadimplente. Na avaliação deste, dever-se-á atender não só aos fundamentos subjacentes à declaração de resolução infundada, mas igualmente ao impacto que a própria declaração tenha tido na relação entre as partes, já que os próprios acontecimentos desencadeados por aquela podem ter tornado insustentável a manutenção do vínculo.”25
E quanto a saber se o vício do acto de resolução lhe retira a eficácia ou torna esta precária (nulidade ou anulabilidade), refere Joana Farrajota26 que:
“[…] a maioria da doutrina e jurisprudência, que se pronuncia sobre a invalidade da declaração de resolução infundada, tende a reconduzi-la à figura da nulidade, por referência ao artigo 280.º, n.º 1 do CC, na parte em que sanciona com nulidade o “negócio jurídico cujo objecto seja […] contrário à lei”. A declaração de resolução infundada, na medida em que contraria o disposto no n.º 1 do artigo 432.º do CC, seria assim nula por força da conjugação desta disposição com o n.º 1 do artigo 280.º – consoante a posição adoptada quanto à qualificação da declaração de resolução, poder-se-á ainda ter de recorrer ao artigo 295.º. Não é necessário, com efeito, recorrer aqui à previsão do artigo 294.º do CC, já que esta, como refere HÖRSTER, “(…) traduz um princípio básico e cede o seu lugar, sempre que os haja, a preceitos específicos”, in casu, o n.º 1 do artigo 280.º. Este artigo é, de facto, uma concretização da norma geral do artigo 294.º, propondo critérios mais pormenorizados para identificar os conteúdos de negócios jurídicos desconformes à lei. A conjugação das disposições constantes dos artigos 432.º, n.º 1, e 280.º, n.º 1, do CC, in fine, conduzem-nos, no nosso entender, de forma inequívoca, à conclusão de que a resolução a que falte o pressuposto do incumprimento é nula e, desta forma, insusceptível de destruir o contrato. [...].
Em conclusão, pode-se afirmar que a sanção-regra da declaração de resolução desprovida de fundamento é a nulidade, por força do disposto no artigo 432.º, n.º 1, conjugado com o n.º 1 do artigo 280.º, do CC. Não se trata todavia de uma regra absoluta, como já tivemos oportunidade de constatar, a propósito da análise dos regimes jurídicos de alguns contratos em particular, designadamente o regime do contrato de trabalho, em que o despedimento infundado é sancionado com a anulabilidade. De facto, outros interesses reconhecidos pela ordem jurídica poderão conduzir a um afastamento pela lei daquela regra, em detrimento da protecção do vínculo contratual. [...].
A declaração de resolução infundada, mais não é do que um “tigre de papel”. Donde, apesar da existência de um significado negocial do acto – a destruição do contrato, este, em razão da respectiva invalidade, não é juridicamente atendível enquanto acto dirigido à extinção do contrato. Embora em abstracto a declaração de resolução realizada à contraparte fosse, por força dos artigos 436.º, n.º 1 e 224.º, n.º 1 do CC, adequada à composição de um negócio jurídico, não produz os efeitos correspondentes ao seu significado, porque se encontra viciada. Tal, como salienta FERREIRA DE ALMEIDA, não põe em causa o princípio performativo, já que este só se aplica a negócios e outros actos jurídicos e, no caso da resolução infundada, em bom rigor, não há um negócio jurídico. No mesmo sentido se pronuncia na doutrina alemã BECKMANN, ao afirmar que as consequências jurídicas de uma declaração de resolução podem realizar-se apenas quando esteja esclarecido que a declaração de resolução do credor foi efectuada legalmente, em particular, que existe um fundamento para a resolução. De facto, como chama a atenção Paulo Mota Pinto, é importante manter presente a distinção entre os pressupostos do direito potestativo de resolução de um lado e, de outro, o modo como se produzem os efeitos do direito, isto é, por mera declaração à contraparte – sem a necessidade de intervenção judicial. Inexistindo os referidos pressupostos – no caso, o incumprimento – não há direito de resolução, sendo a declaração pretensamente resolutiva ilícita e, em regra, ineficaz. Neste contexto, a sentença, que reconheça a inexistência de fundamento da declaração resolutiva, declara, na realidade, que o contrato não se extinguiu.”
A jurisprudência parece orientar-se no sentido assim expendido, de que é exemplo o acórdão do Tribunal da elação de Lisboa de 21-01-2020, 9518/18.8T8SNT.L1-7, onde se afirma que a resolução ilícita a que falte o pressuposto do incumprimento definitivo, não estando o contrato definitivamente incumprido por qualquer das partes, nem tendo estas perdido o interesse na sua execução, não acarreta a destruição do negócio, por o vício que a afecta a destituir de fundamento jurídico, não sendo, portanto, o resolvente titular do correspondente direito potestativo.
O Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão de 8-05-2013, 13/09.7TVPRT.P2.S1 parece pender para a eficácia extintiva da resolução ilícita referindo que “Quando a declaração resolutória não preenche os respectivos pressupostos legais consubstancia uma resolução ilícita, a qual, muito embora fora dos parâmetros em que é admitida, não é inválida ou ineficaz, pelo que, mesmo injustificada, produz efeitos, ou seja, determina a cessação do vínculo, representando o incumprimento do contrato, com a consequente responsabilidade do seu autor pelo prejuízo causado à contraparte”, mas acaba por admitir a subsistência da relação contratual, ilicitamente extinta por resolução, o que “depende do preenchimento cumulativo de três pressupostos, que operam, separadamente, isto é, o cumprimento das prestações contratuais ainda é possível, a parte lesada mantém interesse na execução do contrato e esta não é, excessivamente, onerosa para aquele que o resolveu, ilicitamente”, delineando a execução do contrato como obrigação de indemnização na vertente da reconstituição natural (art. 566º do Código Civil) – cf. ainda, no sentido propendido, acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 28-09-2021, 344/18.5T8AVR.P1.S1; de 27-02-2020, 18232/18.3T8LSB.L1.S1 e de 8-06-2017, 7461/14.9T8SNT.L1.S1; do Tribunal da Relação de Lisboa de 23-03-2023, 2916/20.9T8PDL.L1-6, do Tribunal da Relação do Porto de 24- 03-2022, 3275/18.5T8OAZ.P1.
Mencione-se ainda que, diversamente do que se sustenta na decisão recorrida, esta posição surge acolhida por Pedro Romano Martinez, in Da Cessação do Contrato, 2017. 3ª Edição, pp. 209-210, quando refere que a resolução ilícita pode ser contestada pela contraparte e sendo julgada injustificada, logo ilícita, o autor da declaração responde pelo prejuízo causado e, de acordo com o princípio geral da obrigação de indemnizar, deve ser reconstituída a situação que existiria (cf. art.º 562º do Código Civil; caso não se verifique a sua impossibilidade – cf. art.º 566º), daí que da declaração de ilicitude resulte a subsistência do vínculo, que, afinal, não cessou. A subsistência do vínculo ilicitamente resolvido depende do preenchimento cumulativo de três pressupostos: o cumprimento das prestações contratuais ainda é possível; a parte lesada mantém interesse na execução do contrato; a execução do contrato não é excessivamente onerosa para aquele que o resolveu ilicitamente.
António Menezes Cordeiro27, por sua vez, aduz que, na pureza dos princípios, a resolução indevida é ineficaz, mas, atento o disposto no art.º 436º, n.º 1 do Código Civil28, que deixa à apreciação do resolvente a ponderação dos requisitos em jogo, conclui que caberá à contraparte provar em tribunal que não se verificam os pressupostos, pelo que “até que haja uma sentença com trânsito em julgado, a resolução deve produzir os seus efeitos: ou seria inútil”. E afirma que a resolução formalmente declarada deve ser tida como eficaz, acrescentando:
“Hoje, sabemos que a resolução tem uma eficácia modificativa da obrigação. Ela suprime as prestações principais, mantendo eventualmente as secundárias e, necessariamente, as acessórias. A resolução indevida substitui a prestação principal por uma prestação indemnizatória: não sendo fundada, ela implica um incumprimento presumivelmente culposo (799º/1). A prestação indemnizatória toma feições diferentes consoante o tipo de contrato em causa. Assim: (1) contratos patrimoniais comuns ou de prestações fungíveis; sendo a resolução indevida, a indemnização equivalerá à execução do contrato, com eventual indemnização pela mora ou por danos colaterais; (2) contratos pessoais ou que envolvam prestações não-fungíveis: a resolução indevida pode determinar a extinção por impossibilidade imputável ao credor (795º/2): segue-se o competente regime; (3) contratos que exijam uma relação de confiança mútua, do tipo dos acordos parassociais ou de relações intuitu personae: a resolução indevida impossibilita o cumprimento; o contrato cessa, seguindo-se o regime da impossibilidade imputável ao devedor (801º/1), equiparada ao inadimplemento.”
Daqui decorre que, diversamente do que entendeu a 1ª instância, pode admitir-se que, caso venha a ser proferida, na acção principal, uma decisão judicial que reconheça a inexistência de fundamento da declaração resolutiva promovida pela requerida, tal poderá equivaler a uma declaração de que o contrato não se extinguiu, verificados que sejam os pressupostos supra mencionados. Ou ainda, estando em causa um contrato patrimonial de natureza comum, a declaração de ilicitude da resolução poderá implicar o reconhecimento de um incumprimento contratual presumidamente culposo, que origina um direito a indemnização, que se traduzirá na execução do contrato.
Sendo este o enquadramento jurídico que se afigura mais adequado, a decisão recorrida é manifestamente prematura e não teve em atenção as diversas soluções plausíveis para litígio, em face dos factos alegados.
As medidas cautelares pressupõem, em regra, a existência, sumariamente comprovada, de um direito subjectivo inscrito na esfera jurídica do requerente no momento em que deduz a pretensão.
Sucede que o risco de lesão decorrente de certos comportamentos pode afectar, e fazê-lo irreversivelmente, o efeito derivado do exercício judicial de direitos potestativos através dos quais se pretende alterar uma determinada relação jurídica (cf. art. 362º, n.º 2 do CPC) – cf. neste sentido, António Abrantes Geraldes, Temas…, pág. 75.
Nestas circunstâncias, e na falta de providência especificamente prevista que tutele tal periculum in mora, afigura-se legítima a imposição ao requerido de que se abstenha de actos que afectem o referido direito potestativo na sua consistência prática ou jurídica ou, por outro lado, que pratique os actos necessários a acautelá-lo.
A composição provisória visada através das providências cautelares pode prosseguir uma de três finalidades: necessidade de garantir um direito, de definir uma regulação provisória ou de antecipar a tutela pretendida ou requerida – cf. Miguel Teixeira de Sousa, Estudos…, pág. 227.
No entanto, o efeito definitivo pretendido com a acção a intentar com vista ao exercício do direito potestativo, em regra, não pode ser atingido, desde logo, no âmbito do procedimento cautelar, atenta a sua natureza provisória e instrumental relativamente à acção principal, mas podem, já nesse momento, ser decretados efeitos que se manterão até que seja proferida a decisão final - cf. art.ºs 364º e 373º do CPC.
A procedência de um procedimento cautelar inominado implica, nos termos dos art.ºs 362º, n.º 1 e 368º, n.º 1 do CPC, que se verifiquem, cumulativamente, os seguintes pressupostos:
a. que muito provavelmente exista o direito tido por ameaçado – objecto de acção declarativa ou que venha a surgir de decisão a proferir em acção constitutiva, já proposta ou a propor;
b. existência de fundado receio de que outrem, antes de proferida decisão de mérito, ou porque a acção ainda nem foi interposta, ou tendo-o sido já, ainda se encontra pendente, cause lesão grave e dificilmente reparável a tal direito;
c. a não existência de providência nominada para acautelar esse direito;
d. adequação da providência requerida para remover o periculum in mora concretamente apurado e para assegurar a efectividade do direito ameaçado;
e. que o prejuízo resultante da providência não exceda o dano que com ela se quis evitar.
A instrumentalidade típica dos procedimentos cautelares tanto pode envolver o decretamento de uma providência conservatória, como de uma providência antecipatória dos efeitos da decisão de mérito.
Enquanto as providências conservatórias «visam manter inalterada a situação de facto que pré-existe à acção, tornando-a imune à possível ocorrência de efeitos prejudiciais», as providências «antecipatórias visam obstar ao prejuízo decorrente do retardamento na satisfação do direito ameaçado, através de uma provisória antecipação no tempo dos efeitos da decisão a proferir sobre o mérito da causa».
Assim, o “objecto da providência cautelar não é a situação jurídica acautelada ou titulada, mas, consoante a sua finalidade, a garantia da situação, a regulação provisória ou a antecipação da tutela que for requerida no respectivo procedimento. Esta verificação é clara quando a providência visa garantir um direito ou regular provisoriamente uma situação: distinta do exercício judicial de um direito é a solicitação de uma garantia ou de uma regulação transitória até à sua apreciação definitiva. Mas essa distinção também se justifica quando a providência cautelar antecipa a tutela jurisdicional: neste caso, o objecto da providência não é a situação cuja tutela se antecipa, mas a própria antecipação da tutela para essa situação.“ – cf. Miguel Teixeira de Sousa, op. cit., pág. 229.
De entre os pedidos cautelares formulados cuja utilidade subsiste cumpre destacar que a requerente pretende que a requerida, enquanto proprietária do imóvel cujo gozo foi cedido, assuma a responsabilidade pela elaboração do RAVS e pelas obras de reforço estrutural e que não possa resolver o contrato com fundamento no não pagamento das rendas até que tais obras estejam concluídas, o que implica o reconhecimento do direito da requerente a suspender esse pagamento.
Estas pretensões encontram respaldo na alegação factual efectuada pela requerente.
Com efeito, a requerente alegou a celebração de um contrato com a requerida - designado contrato de prestação de serviços, mas em que figura a concessão pela requerida à requerente do gozo de uma parte de um imóvel, mediante retribuição -, mediante o qual esta, segundo o seu entendimento, estava obrigada a facultar-lhe o imóvel em condições de permitir a realização das obras de adaptação para a sua actividade, previstas no contrato, sendo que, devido a um defeito oculto, estas obras não são possíveis, para além de estar em causa a segurança do edifício, pelo que entende que o cumprimento da prestação a cargo da requerida exige que esta elabore um Relatório de Análise de Vulnerabilidade Sísmica (RAVS) do edifício e que proceda ao projecto de reforço sísmico para todo o edifício, o que esta rejeitou.
Perante este seu posicionamento, a requerente suspendeu o pagamento das rendas, invocando a verificação de excepção de não cumprimento do contrato, daí que pretenda que esse seu direito seja reconhecido e, por força disso, que a requerida seja impedida de resolver o contrato por falta de pagamento das rendas e que seja compelida a executar as mencionadas obras, que serão da sua responsabilidade.
Mais alegou que a resolução do contrato a impediria de desenvolver o seu projecto comercial na Área Utilizável, o que lhe causará prejuízos sérios e irreversíveis, pela perda de oportunidade de negócio, pelo investimento por si já efectuado, pela dificuldade em encontrar um outro local para estabelecer a sua loja e pela perda de facturação.
Em primeiro lugar, como bem refere a recorrente nas suas alegações, esta não formulou qualquer pretensão no sentido de lhe ser reconhecido um crédito indemnizatório, mas sim o direito de exigir da requerida o cumprimento integral das obrigações que, no seu entender, para ela emergem da relação contratual estabelecida entre as partes.
Assim, reconhecendo-se que a ilicitude da resolução nem sempre determina a extinção do vínculo contratual, tal argumento é insuficiente para concluir que as providências requeridas são inadequadas à salvaguarda do direito que a requerente alega deter e cujo exercício pretende garantir.
Em segundo lugar, não foi, por ora, produzida qualquer prova, pelo que não é possível afirmar que a requerente não lograria demonstrar a probabilidade de lhe vir a ser reconhecido o direito a suspender o pagamento das rendas, o que pode suceder caso logre demonstrar, em termos indiciários, que o imóvel cujo gozo lhe foi cedido padece de um defeito estrutural que o torna inapto para a instalação do seu estabelecimento por falta de segurança do próprio imóvel.
Vindo a ser demonstrada a probabilidade de vir a ser reconhecida a excepção de não cumprimento do contrato alegada pela requerente, estaria esta autorizada a suspender o pagamento das rendas e demais encargos, pelo que a validade da resolução do contrato com base naquela falta de pagamento estaria inquinada, sendo possível configurar a subsistência do vínculo contratual.
Em terceiro lugar, como decorre do acima expendido, as providências cautelares podem ser conservatórias – o objectivo será manter ou preservar a situação existente, assegurando a manutenção da titularidade ou do exercício de um direito ou gozo de um bem, que está ameaçado de perder – ou antecipatórias – visam prevenir a ocorrência de um dano obtendo adiantadamente a disponibilidade de um bem ou o gozo de um beneficio, ou seja, visam impedir o prejuízo que o prolongamento de uma situação antijurídica seria susceptível de causar ao titular de um determinado direito. Sob o ponto de vista da sua finalidade, a providência cautelar pode ter por objecto a garantia de um direito, a regulação provisória de uma situação jurídica ou a antecipação provisória de um determinado efeito jurídico – cf. Marco Carvalho Gonçalves, op. cit., pp. 93-97.
As pretensões da apelante, seja o reconhecimento pela requerida de que deve elaborar o RAVS e assegurar as obras de reforço estrutural, seja o inerente reconhecimento de que podia suspender o pagamento das rendas face à recusa da requerida em proporcionar o imóvel nessas condições e consequente falta de fundamento da resolução promovida (a admitir-se a modificação do pedido inicial de impedimento de promover a resolução), assumem a natureza de providências antecipatórias dos efeitos jurídicos da tutela jurisdicional definitiva a alcançar na acção principal, sendo que, como se viu, nada obsta a que o objecto da providência seja a própria antecipação da tutela para a situação.
Por esta razão, não se vê que se evidencie uma inadequação das providências requeridas, mesmo sob a perspectiva da suspensão dos efeitos da resolução, que, a ter lugar, antecipa os efeitos de um eventual reconhecimento da sua falta de fundamento, e, reunidos os respectivos pressupostos, conduzirá à execução do contrato pela via indemnizatória de reconstituição em espécie.
Em quarto lugar, a circunstância de, entretanto, já na pendência do presente processo, a requerida ter promovido a resolução do contrato, não erradica a utilidade da providência, pois que, tal como se deu conta no relatório supra, por requerimento de 27 de Março de 2025, a requerente veio modificar um dos pedidos formulados – o (iv) -, requerendo que seja declarada “a suspensão dos efeitos da resolução do contrato até que seja proferida decisão cautelar”.
Apesar de a requerida ter pugnado pela sua inadmissibilidade e não obstante na decisão recorrida se ter ponderado que, mesmo a ser admitida tal modificação, os efeitos da suspensão seriam sempre limitados ao momento da própria decisão, certo é que o tribunal recorrido não se pronunciou expressamente sobre a admissibilidade da modificação.
Note-se que a interpretação literal do pedido formulado, no segmento “até que seja proferida decisão cautelar” afigura-se pouco escorreita por ser manifesta a falta de clareza de tal formulação. Na verdade, apenas uma visão estritamente formalista poderá acolher o entendimento de que a requerente pretendeu que a providência solicitada de suspensão dos efeitos da resolução se cingisse ao próprio momento em que essa decisão fosse tomada.
À partida, a pretensão de suspensão dos efeitos da resolução, suscitada em face da resolução entretanto promovida, atentos os factos alegados no requerimento inicial e a finalidade visada com a providência – evitar os efeitos de uma paralisação das obrigações emergentes do contrato decorrentes de uma possível resolução e consequente não execução das prestações assumidas pela requerida –, pode ser vista como um mero ajustamento do pedido à alteração factual ocorrida, e, como tal, como mero desenvolvimento lógico do pedido inicialmente formulado, pois que o resultado visado é precisamente o mesmo, ou seja, suspendendo-se os efeitos da resolução, subsiste o contrato e as respectivas prestações, até que, na acção principal, seja definitivamente avaliado se a requerente podia suspender o pagamento das rendas por a requerida estar obrigada a facultar o gozo de um prédio cuja estrutura permita as obras de adaptação que aquela ali pretendia introduzir – cf. art.º 265º, n.º 2 do CPC; para além de o tribunal não estar adstrito à providência cautelar concretamente requerida, podendo decretar uma diversa da pedida, conforme art.º 376º, n.º 3 do CPC.
Todavia, competia ao Tribunal recorrido tomar posição expressa sobre essa pretensão processual deduzida pela requerente e, em caso de dúvida, sempre poderia convidá-la a esclarecer a amplitude do pedido formulado, sendo o argumento do limite temporal – único convocado na decisão recorrida - insuficiente para concluir pela manifesta improcedência da providência – cf. no sentido de que o dever de gestão processual vertido no art.º 6º do CPC, também na sua vertente material, permite o convite ao esclarecimento do pedido, ver Miguel Mesquita, Princípio da Gestão Processual: O «Santo Graal» do Novo Processo Civil?29
Em quinto lugar, o requerimento inicial contém a alegação de um conjunto mínimo de factos passíveis de integrarem o justo receio de lesão grave e dificilmente reparável, enquanto requisito para o deferimento das providências solicitadas, traduzido na demora da decisão definitiva e no dano decorrente dessa demora, sendo que o dano de difícil reparação não corresponde apenas a um dano irressarcível, pois quem solicita tutela cautelar pretende, antes de mais, que o direito tutelado permaneça íntegro e não o pagamento de uma indemnização. Além disso, não tem de ser irreparável em termos absolutos, sendo suficiente que implique uma reconstituição difícil do status quo ante – cf. Marco Carvalho Gonçalves, op. cit., pág. 207.
Configurando-se possível a admissão da modificação do pedido, haverá que ponderar os prejuízos advenientes da não decretação da pretensão cautelar de suspensão de eficácia da resolução e a sua eventual irreversibilidade por ser extremamente difícil a reposição da situação anterior à lesão, gerando danos, pese embora susceptíveis de quantificação pecuniária, cuja compensação se apresente insuficiente para repor ou reintegrar a esfera jurídica da requerente, devolvendo-lhe a situação em que se encontraria não fora a resolução indevida do contrato – cf. neste sentido, acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 2-08-2022, processo n.º 00639/22.3BEPRT.
A requerente invocou os prejuízos já suportados por via da impossibilidade de efectuar as obras de adaptação para a abertura da loja ao público, a perda de facturação e, sobremaneira, a inviabilização do seu projecto de negócio e frustração de todos os investimentos realizados, o que, assumindo uma vertente manifestamente patrimonial, tem, contudo, uma abrangência que extravasa o ressarcimento patrimonial, seja por via da eventual dificuldade em executar o projecto de negócio num outro local, seja pela afectação da sua competitividade no mercado, o que será de difícil reparação pecuniária.
Na aferição da existência de um periculum in mora na tutela do direito, o juiz deve fazer um juízo de prognose, ponderando a situação futura de uma possível sentença de provimento vir a revelar-se inútil, por entretanto se ter consumado uma situação de facto incompatível com ela ou por se terem produzido prejuízos de difícil reparação para quem dela deva beneficiar, o que obsta à reintegração específica da sua esfera jurídica.
Ora, a própria natureza do direito que se pretende acautelar faz pressupor que a demora da apreciação da acção principal conduzirá a uma consolidação dos efeitos da resolução do contrato celebrado entre as partes que e, ao momento de um eventual reconhecimento da sua invalidade, poderá já não ser possível a execução do contrato (enquanto indemnização por reconstituição), por o prédio poder vir a ser objecto de venda ou locação a outrem ou pela própria inviabilidade de execução do projecto noutro local.
Atenta a natureza dos danos invocados, não estando em causa apenas um direito indemnizatório – que nem sequer foi reclamado pela requerente –, a falta de alegação de factos referentes à situação económica da requerida não torna, por si só, inviável a procedência das providências requeridas, devendo considerar-se estarem, em termos fácticos, minimamente descritos os danos que a eficácia da resolução poderá causar.
De todo o modo, ainda que assim se não entenda, sempre poderia o Tribunal a quo convidar a requerente a suprir eventuais insuficiências na exposição ou concretização da matéria de facto alegada. Com efeito, apesar de não estar prevista uma fase de saneamento dos autos (cf. art.º 595º do CPC), nada obsta à aplicação das normas relativas ao processo declarativo, em concreto as atinentes à gestão inicial do processo (cf. art.º 590º do CPC), com as adaptações necessárias. Na verdade, trata-se de um verdadeiro dever legal do juiz – despacho de aperfeiçoamento vinculado – no sentido de identificar os aspectos que importa corrigir, quando se está perante um articulado que, cumprindo os requisitos mínimos, se revele, contudo, insuficiente, deficiente ou impreciso em termos de fundamentação da pretensão – cf. António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I – Parte Geral e Processo de Declaração, 2018, pág. 678.
Em face do que se deixa explanado, não se pode concordar com a decisão recorrida quando conclui pela inviabilidade das pretensões cautelares deduzidas pela recorrente, com base numa inadequação face ao direito que se arroga, inadequação que, neste momento, face aos factos alegados e ao enquadramento jurídico que podem vir a merecer, caso sejam demonstrados, não se detecta.
Por este motivo, importa que os autos prossigam, devendo o tribunal recorrido emitir pronúncia expressa sobre a admissibilidade da alteração/ampliação do pedido vertido no ponto (iv) do requerimento inicial e, posteriormente, sendo esse o caso, produza as provas tidas por necessárias para apuramento dos factos e profira decisão sobre o mérito do procedimento cautelar.
Procede, assim, a presente apelação, devendo a decisão recorrida ser revogada, determinando-se o prosseguimento dos autos.
*
Litigante de má-fé será aquele que, com dolo ou negligência grave, tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar; tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa; tiver praticado omissão grave do dever de cooperação; tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão – cf. n.º 2 do art. 542º do CPC.
Apesar do efeito suspensivo atribuído ao recurso interposto da decisão de indeferimento do procedimento cautelar, seguro é que não recaía sobre a requerida qualquer obrigação de se abster de solicitar o pagamento do remanescente da garantia bancária, sucedendo apenas, que, tendo-o feito, retirou efeito útil a parte do objecto do presente recurso, pelo que, nessa parte, suportará as custas.
Além disso, os autos não espelham dados objectivos que integrem, por banda de qualquer uma das partes, a violação do dever de boa-fé processual, que não se deve confundir com a mera dedução de pretensão ou oposição cujo decaimento sobreveio, pelo que não se descortinam fundamentos que justifiquem a condenação de qualquer uma das partes como litigantes de má-fé.
* Das Custas
De acordo com o disposto no art. 527º, n.º 1 do CPC, a decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito. O n.º 2 acrescenta que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.
Nos termos do art. 1º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais, considera-se processo autónomo para efeitos de custas, cada recurso, desde que origine tributação própria.
A pretensão que a apelante trouxe a juízo merece provimento. Dado que a apelada Dajrise Portugal, S. A. é parte vencida, as custas (na vertente de custas de parte) ficam a seu cargo.
* IV – DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes desta 7.ª Secção do Tribunal de Relação de Lisboa, em julgar procedente a apelação, e, em consequência:
a. Revogar a decisão recorrida e ordenar o prosseguimento dos autos, para prolação de decisão sobre o requerimento de modificação do pedido apresentado em 27 de Março de 2025 e, sendo o caso, subsequente produção de prova e decisão sobre o mérito do procedimento cautelar.
Custas a cargo da apelada.
*
Lisboa, 23 de Setembro de 202530 Micaela Sousa Edgar Taborda Lopes Alexandra de Castro Rocha
_____________________________________________________
2. Pessoa colectiva ....
3. Pessoa colectiva ....
4. Pessoa colectiva ....
5. Ref. Elect. 442731236.
6. Ref. Elect. 42099401.
7. Ref. Elect. 42238854.
8. Ref. Elect. 42390077.
9. Ref. Elect. 42539218.
10. Ref. Elect. 445817342.
11. Ref. Elect. 43114623.
12. Ref. Elect. 43118803.
13. Ref. Elect. 446322585.
14. Ref. Elect. 43346612.
15. Ref. Elect. 43532750.
16. Ref. Elect. 43562977.
17. Ref. Elect. 773817.
18. Ref. Elect. 774614.
19. Documento n.º 1 junto com o requerimento de 18 de Agosto de 2025, Ref. Elect. 773817.
20. Documentos n.ºs 2 e 3 juntos com o requerimento de 18 de Agosto de 2025, Ref. Elect. 773817.
21. “A impossibilidade da relação jurídica substancial cessa quando desaparece um dos seus elementos essenciais e não se pode operar a substituição dele por outro. E assim temos: a) Impossibilidade da relação jurídica por extinção do sujeito; b) Impossibilidade da relação jurídica por extinção do objecto; c) Impossibilidade da relação jurídica por extinção da causa. […] Quando a lide se torna impossível por alguma das causas descritas e por isso se extingue, é evidente que o processo não pode continuar.”
22. Acessível na Base de Dados Jurídico-documentais do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP em www.dgsi.pt, onde se encontram disponíveis os arestos adiante mencionados sem indicação de origem.
23. Adiante designado pela sigla CPC.
24. Dissertação para Doutoramento em Direito Privado pela Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, disponível em https://run.unl.pt/bitstream/10362/18555/1/Farrajota_2013.pdf, consultado em 4 de Setembro de 2025.
25. Cf. Op. cit., pág. 446.
26. Cf. Op. Cit., pág. 218 e seguintes.
27. Código Civil Comentado, II – Das Obrigações em Geral, CIDP 2021, pp. 267-268.
28. “A resolução do contrato pode fazer-se mediante declaração à outra parte.”
29. Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 145º, n.º 3995, pág. 94 e seguintes.
30. Acórdão assinado digitalmente – cf. certificados apostos no canto superior esquerdo da primeira página.