RECURSO PER SALTUM
CÚMULO JURÍDICO
CONHECIMENTO SUPERVENIENTE
ROUBO AGRAVADO
TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTES
COAÇÃO
DETENÇÃO DE ARMA PROIBIDA
EVASÃO
PERDÃO
AMNISTIA
MEDIDA CONCRETA DA PENA
PENA ÚNICA
IMPROCEDÊNCIA
Sumário


I. No artº 3º da Lei nº 38-A/23, de 2 de Agosto, estipula-se que (1) é perdoado 1 ano de prisão a todas as penas de prisão até 8 anos, bem como que, (4) em caso de condenação em cúmulo jurídico, o perdão incide sobre a pena única.
II. Sendo alguns dos crimes em concurso passíveis de perdão de penas, mas o mesmo não sucedendo com os restantes, há que proceder à aplicação conciliadora de tais normativos legais, entendendo-se aqui aplicável a solução jurídica alcançada, em igual sede, ao abrigo da Lei nº29/99, de 12.05.
III. A solução consiste na realização de um cúmulo jurídico ficcionado, entre penas parcelares incluídas no perdão, obtenção de uma pena única e, consoante o seu quantum, apuramento do perdão final que haveria de aplicar. De seguida, procede-se ao cúmulo de todas as penas em concurso (incluindo as que haviam sido consideradas para o ficcionado cúmulo parcelar) e sobre a pena única alcançada, faz-se a aplicação do perdão, sendo que o máximo legal corresponde a um ano.
IV. No caso presente, mantendo-se inalterada a pena única fixada pelo tribunal “a quo”, essa operação ficcionada de apuramento do perdão a aplicar a final, acaba por redundar num acto inútil, pela singela razão de que a Lei n.º 38-A/2023 impõe, como limite para a aplicação de tal medida de clemência, que a pena única imposta não exceda os 8 anos de prisão.
V. Esse limite é imperativo e aplica-se em todo e qualquer caso, em que se tenha de ponderar a aplicação de perdão, ao abrigo de tal previsão legal, sendo indiferente (porque a lei o não distingue ou excepciona), se todas as penas que se mostram incluídas em cúmulo jurídico, se mostram abrangidas pela Lei da Amnistia ou se apenas em relação a algumas tal sucede.
V. Seria, aliás, um contra-senso jurídico, seria ilógico, violador do princípio da igualdade, bem como contrário à imperatividade, sem excepções, que o legislador claramente expressou na Lei n.º 38-A/2023, defender-se que, pela circunstância de o arguido ter cometido crimes que nem sequer se mostram incluídos na Lei da Amnistia, daí resultaria, para si, um tratamento mais favorável (por inexistência, neste caso, do limite de 8 anos) do que no caso de um agente, cujos ilícitos por si praticados se mostrariam integralmente abrangidos na dita lei de clemência e que, sendo-lhe imposta uma pena superior a 8 anos de prisão, não poderia ter direito à aplicação de tal perdão.

Texto Integral

Acordam em conferência na 3ª secção do Supremo Tribunal de Justiça


*


I – relatório

1. Por acórdão de 28 de Março de 2025, foi o arguido AA condenado, nos seguintes termos:

Em cúmulo jurídico superveniente das penas parcelares aplicadas no Processo Comum Coletivo n.° 71/19.6PFBRG, do Juízo Central Criminal de Braga - Juiz 3, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga; no Processo Comum Coletivo n.° 1025/20.5JAAVR, do Juízo Central Criminal de Aveiro - Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro; no Processo Comum Singular n.° 394/21.4PBAVR, do Juízo Local Criminal de Aveiro - Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro; e no Processo Comum Singular n.° 42/19.2PEBRG, do Juízo Local Criminal de Braga - Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, na pena única de 8 (oito) anos e 3 (três) meses de prisão.

2. Inconformado, veio o arguido apresentar recurso, invocando que:

- O acórdão cumulatório deveria ter deixado intocados os perdões aplicados a algumas das penas parcelares que compõem o cúmulo efectuado, as quais já tinham beneficiado desse perdão.

- A medida concreta da pena unitária é excessiva.

- O tribunal da condenação não considerou em conjunto os factos e a personalidade do agente, bastando–se com a invocação abstracta dessa personalidade, invocando a nulidade prevista no artigo 379.º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Penal.

3. O recurso foi admitido.

4. O Ministério Público respondeu à motivação apresentada, defendendo a improcedência do recurso.

5. Neste tribunal, o Sr. Procurador-Geral Adjunto deu parecer em idêntico sentido.

6. O recorrente respondeu, reiterando a sua argumentação já constante no recurso.

II – questões a decidir.

A. Nulidades do acórdão.

B. Perdão de penas em sede de cúmulo.

C. Errada dosimetria da pena única.

iii – fundamentação.

A. Nulidades do acórdão.

1. O tribunal “a quo” deu como assentes os seguintes factos:

1. Factos provados

Discutida a causa provaram-se os seguintes factos com relevo para a decisão:

1.1. – Por acórdão proferido em 25/10/2023, transitado em julgado em 24/11/2023, nos autos de Processo Comum Coletivo n.° 71/19.6PFBRG, do Juízo Central Criminal de Braga - Juiz 3, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, foi o arguido AA condenado pela prática, em 06/2019, em coautoria material e na forma consumada, nos termos dos artigos 14.°, n.° 1 e 26.°, ambos do Código Penal, de 1 (um) crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, previsto e punido pelo artigo 25.°, al. a) do Decreto-Lei n.° 15/93, de 22 de Janeiro, por referência ao disposto no artigo 21.°, n.° 1 do mesmo diploma legal e à Tabela Anexa I-A e I-B, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão (efetiva), sendo-lhe perdoado a essa pena 1 ano de prisão nos termos da Lei n.° 38¬A/2023, de 2 de agosto.

1.2. – No Processo Comum Coletivo n.° 71/19.6PFBRG, do Juízo Central Criminal de Braga - Juiz 3, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, provou-se quanto ao arguido AA (condenado em coautoria) o seguinte:

“(...) 2. O arguido AA dedicou-se à venda de estupefacientes, pelo menos desde Agosto de 2019 até fim do ano de 2019 (altura em que foi detido), sob as orientações e em execução de um plano gizado com a mãe, a arguida BB.

3. Os arguidos AA e BB desenvolviam essa actividade de tráfico de estupefacientes a partir da sua residência, sita no Complexo Habitacional ..., Localização 1.

4. Estes arguidos para desenvolverem a actividade de tráfico de estupefacientes recorriam ao uso de aparelhos telefónicos para comunicarem entre si e com terceiros abastecedores desses produtos: (...)

b. O arguido AA usou um cartão telefónico com o n.º .........87 da operadora NOS; (...)

6. No dia 05.06.2019, pelas 16h30m, nas Bombas de Gasolina da BP, na Avenida 2, em Braga, encontravam-se o arguido CC, acompanhado da arguida DD e do arguido AA, sendo que os dois primeiros arguidos seguiam no veículo da marca BMW, com a matrícula V1.

7. Na circunstância, a arguida DD trazia consigo:

a. - 49,081 gramas de cocaína (éster metílico), correspondentes a 1388 doses individuais, que havia adquirido em local não concretamente apurado e que a arguida DD arremessou para debaixo da viatura ao aperceber-se da intervenção policial;

b. – dois cartões pré-pagos, da Vodafone ainda não usados;

c. - € 470,00, em numerário, dividido em 3 notas de € 50,00, 2 notas de € 10,00 e 15 notas de € 20,00, dinheiro este que consistia no troco após o pagamento de € 30,00, em combustível, com uma nota de € 500,00.

8. No dia 04.11.2020, pelas 9h20m, o arguido CC tinha no interior da sua residência, sita na Rua 3, 0,53 gramas de canábis (resina), correspondente a 2 doses, que se encontrava na mesa da cozinha da habitação.

9. Por sua vez, a arguida BB, desde data não concretamente apurada, mas pelo menos o mês de Agosto do ano de 2019 e até ao dia 27.04.2022, directamente ou por via de intermediários, dedicou-se à venda a terceiros, mediante contrapartida monetária ou outra, para consumo directo ou revenda, de heroína e cocaína.

10. Desenvolveu essa actividade a partir do Complexo Habitacional ..., em Braga, onde residem várias famílias de etnia romani, que se dedicam à actividade de tráfico de estupefacientes, alternadamente e com uma periodicidade pré-estabelecida, num plano previamente gizado.

11. Faziam, inicialmente, pelo menos, parte deste plano de venda de estupefacientes, a arguida BB que comprava o produto estupefaciente que comercializava e, AA, filho desta arguida, que era responsável pela venda directa do mesmo aos consumidores.

12. O dinheiro resultante da venda de estupefaciente era, inicialmente, guardado na casa 31, do Complexo Habitacional ..., pela EE, conhecida por EE, residente nessa morada. (...)

14. Em 24 de Dezembro de 2020, o arguido FF e o arguido AA deslocaram-se para o distrito da Guarda e recorreram ao serviço de táxi para regressarem a Braga.

15. Durante a viagem de regresso, munidos de uma arma de fogo, sequestraram e ameaçaram o taxista, vindo a ser detidos no distrito de Aveiro.

16. Sujeitos a primeiro interrogatório judicial, no âmbito do processo 1025/20.5JAAVR, ficaram sujeitos à medida de coacção de prisão preventiva. (...)

34. No período considerado nos autos, entre outros, os arguidos venderam produtos estupefacientes, cocaína e heroína, em quantidades não concretamente apuradas, por € 10,00 a pedra de cocaína e € 5,00 o pacote de heroína, aos seguintes indivíduos:

a. GG;

b. HH;

c. II;

d. JJ;

e. KK;

f. LL;

g. MM;

h. NN;

i. OO;

j. PP;

k. QQ;

l. RR;

m. SS.

35. A quantia monetária em referência apreendida aos arguidos foi obtida como contrapartida da venda a terceiros de substâncias estupefacientes.

36. Os arguidos AA, BB, DD, TT, UU e VV sem que, para tanto, estivessem autorizados, destinavam as substâncias estupefacientes que lhes foram apreendidas à venda a terceiros, mediante contrapartida monetária ou outra.

37. Os arguidos AA, BB, DD, TT, UU, VV conheciam a natureza e as características das substâncias estupefacientes que compravam e/ou vendiam e/ou guardavam/detinham e não ignoravam que a respectiva compra e/ou detenção e/ou venda lhes estavam legalmente vedadas.

38. A actividade de venda de produtos estupefacientes constituía a única fonte de receita dos arguidos AA, BB e UU, que faziam da mesma seu modo de vida.

39. Agiram os arguidos AA, BB, TT, UU, VV concertada, deliberada, livre e conscientemente, muito embora conhecesse o carácter proibido e criminalmente punível da sua conduta. (...)

45. O arguido AA tem averbados antecedentes criminais no seu registo criminal, designadamente:

- Foi condenado no âmbito do processo comum singular n° 803/15.1PBBRG, por decisão datada de 03/05/2016, transitada em 2/06/2016, por 1 crime de condução sem habilitação legal, por factos ocorridos em 29/04/2015, na pena de 90 dias de multa à taxa diária de 5,00€, no total de 450,00€. Tal pena já se encontra extinta.

- Foi condenado no âmbito do processo comum singular n° 52/18.7GAAMR, por decisão datada de 2019/03/20, transitada em 2019/05/17, por 1 crime de furto qualificado na forma tentada, por factos ocorridos em 02/2018, na pena de 10 meses de prisão substituída por 200 dias de multa à taxa diária de 5,00€, no total de 1000,00€. Tal pena se substituição foi revogada, e o arguido condenado a cumprir 10 meses de pena de prisão efectiva.

- Foi condenado no âmbito do processo sumário n° 32/20.2GTVCT, por decisão datada de 2020/09/09, transitada em 2020/10/09, por 1 crime de condução sem habilitação legal, por factos ocorridos em 2020/09/08, na pena de 160 dias de multa à taxa diária de 5,00€, no total de 800,00€. Tal pena de multa foi convertida em 106 dias de prisão subsidiária. Tal pena já se encontra extinta.

- Foi condenado no âmbito do processo comum colectivo n° 1025/20.5JAAVR, por decisão datada de 2022/01/07, transitada em 2022/07/13, por 1 crime de coação agravada, um crime de detenção ilegal de arma e um crime de roubo qualificado, por factos ocorridos em 2020/12/24, na pena de 6 anos de prisão.

- Foi condenado no âmbito do processo comum singular n° 532/19.7GBBCL, por decisão datada de 2022/05/09, transitada em 2022/06/08, por 1 crime de condução sem habilitação legal, por factos ocorridos em 2019/06/09, na pena de 100 dias de multa à taxa diária de 5,00€, no total de 500,00€.

No âmbito deste processo foi efectuado o cúmulo jurídico, entre a pena aplicada nestes autos e as penas aplicadas nos processos 32/20.2GTVCT e 1133/20.2GBBCL, sendo que por decisão datada de 2022/12/07, transitada em 2023/01/26, foi-lhe aplicada a pena única de 80 dias de multa à taxa diária de 5,00€, no total de 400,00€.

- Foi condenado no âmbito do processo abreviado n° 1133/20.2GBBCL, por decisão datada de 2021/01/21, transitada em 2021/02/22, por 1 crime de desobediência, por factos ocorridos em 2020/09/13, na pena de 60 dias de multa à taxa diária de 5,00€, no total de 300,00€.

- Foi condenado no âmbito do processo comum singular n° 376/14.2GAPVZ, por decisão datada de 2021/10/12, transitada em 2021/11/11, por 1 crime de furto qualificado, por factos ocorridos em 2014/10/13, na pena de 8 meses de prisão suspensa por 2 anos com regime de prova. (...)

Dos factos relativos à personalidade e condições pessoais dos arguidos

51. Consta no relatório social elaborado pela Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP), quanto à inserção familiar e socioprofissional do arguido AA, com o objetivo de auxiliar no conhecimento da personalidade do arguido e na correta determinação da sanção que eventualmente possa vir a ser aplicada, além do mais, o seguinte:

“I - Dados relevantes do processo de socialização

AA descende de uma família numerosa, o seu processo de crescimento decorreu junto da mãe e avós maternos, em ..., sendo que durante o período de cumprimento de uma pena de prisão por parte da mãe, o arguido e os irmãos uterinos ficaram aos cuidados destes avós.

Contudo, na sequência da prisão desses, foram colocados no Centro de Acolhimento da Associação Social Cultural e Recreativa de ... (ASCR...) ..., onde permaneceram desde janeiro de 2009 a setembro de 2011, altura em que por ordem do Tribunal de Menores, reintegraram o agregado dos avós maternos.

AA frequentou a escola e concluiu o 4° ano de escolaridade na referida instituição, tendo vindo a abandonar a escolarização durante a frequência do 5° ano. A nível profissional não apresenta experiência significativa, sendo apenas salientada a atividade de ..., junto dos avós maternos. Ainda em criança, AA começou a apresentar comportamentos de alguma instabilidade emocional, que levou os familiares a recorrem a apoio médico e desde então se encontra medicado por diagnóstico de crises de ansiedade e epilepsia.

Neste contexto surgiram os seus contactos com o Sistema de Justiça Penal, tendo sido condenado em várias penas e medidas de execução na comunidade, que não surtiram o efeito dissuasor pretendido, mantendo o arguido a comportamentos criminais.

O arguido estabeleceu um relacionamento afetivo, com WW, em 2017, do qual nasceu um descendente, atualmente com 4 anos de idade.

II - Condições sociais e pessoais

À data dos factos a que se reportam os presentes autos, segundo o arguido, residia no bairro social ..., em ..., conotado com graves problemáticas sociais e grande incidência criminal, onde residiam outros familiares, alguns dos quais, de igual forma, associados à prática de ilícitos criminais, nomeadamente tráfico de estupefacientes.

O quotidiano do arguido era passado junto do agregado constituído e da família alargada, não desenvolvia qualquer atividade laboral, bem como a companheira, sendo a subsistência dos mesmos assegurada pelo rendimento social de inserção no valor de 417 EUR e pelo abono de família relativo ao descendente no valor de 97 EUR.

Mantinha uma relação próxima e de interajuda com estes familiares, assim como, com a mãe e avós maternos, residentes em ... – ..., local para onde se deslocava regularmente.

A relação com os coarguidos era prosseguida em regime de convívio entre pares, sendo pessoas das suas relações familiares, nomeadamente a progenitora e o irmão.

III - Impacto da situação jurídico-penal

Relativamente à tipologia criminal pelo qual é acusado no presente processo e quando analisados em abstrato, AA reconhece a ilicitude e gravidade dos mesmos.

AA foi preso preventivamente no Estabelecimento Prisional (EP) de Coimbra em 24.12.2020, à ordem do processo 1025/20.5JAAVR, nos quais ainda se mantém. Durante o período de reclusão protagonizou uma evasão em 02.05.2021 do (EP) de Aveiro para onde foi transferido em 10.03.2021, tendo-se apresentado voluntariamente no (EP) de Vale de Sousa em 05.05.2021, justificando esta conduta pelo desgaste provocado pelo distanciamento físico do filho. Nessa sequência foi colocado na secção/regime de segurança do (EP) de Paços de Ferreira em 27.05.2021.

A nível disciplinar, registou uma sanção de internamento em cela disciplinar pelo período de 21 dias e ainda uma outra punição anterior, por “intimidar ou estabelecer relação de poder ou autoridade sobre outros reclusos” factos ocorridos em 06.04.2021, tendo sido decretada a sua permanência obrigatória no alojamento, pelo período de 12 dias.

Face ao supracitado, durante a sua permanência em regime de segurança era referenciado pelos elementos da vigilância como um indivíduo impulsivo e com dificuldade em assumir uma comunicação assertiva, por vezes com os familiares e outros reclusos.

Em 30.11.2021 foi transferido para o EP de Monsanto, onde permaneceu em regime de segurança até 27.05.2022, altura em que lhe foi decretada a cessação do regime de segurança e consequente transferência para o EP de Vale do Sousa. Nesse hiato temporal revelou uma maior estabilidade comportamental e maior adequação às regras e normas institucionais.

Desde a sua entrada no EP de Vale do Sousa tem mantido um comportamento tendencialmente ajustado, isento de sanções disciplinares e investido a nível formativo, consubstanciado pela frequência do curso EFA B1 e B2 com equivalência ao 5° e 6° ano de escolaridade.

Mantém acompanhamento clínico especializado no âmbito dos problemas de saúde supramencionados com suporte medicamentoso.

Possui, como referências afetivas, a progenitora, a companheira e filho com os quais conserva contactos telefónicos regulares. Relativamente à família alargada, refere uma quebra de laços afetivos e relacionais, alegando divergências resultantes de outros processo criminais.

IV - Conclusão

O processo de desenvolvimento de AA decorreu no seio de uma família disfuncional, marcada pelo contacto com o sistema de justiça penal por parte das figuras de maior referência afetiva, nomeadamente da progenitora e avós e pela institucionalização daí decorrente.

Regista abandono do percurso escolar em idade precoce e não apresenta experiência profissional relevante.

AA, encontra-se recluído pela primeira vez, tendo numa fase inicial da sua reclusão registado uma conduta contrária ao normativo vigente salientando-se um incumprimento grave ao ter-se evadido do Estabelecimento Prisional e na sequência do qual foi colocado em regime de segurança, situação que no presente aparenta ter sofrido uma inversão.

Face ao exposto, consideramos que AA necessita de intervenção, que vise essencialmente a sua mobilização para um projeto de vida que priorize uma integração laboral e/ou formativa, o desenvolvimento de competências pessoais e sociais, designadamente a capacidade de autorregulação comportamental e emocional e o afastamento de pares promotores de condutas desviantes/ilícitas, condições que poderão contribuir para a inversão do seu percurso vivencial, por forma a reger-se de acordo com as normas sociais e jurídicas vigentes.”.”

1.3. – Por acórdão proferido em 07/01/2022, transitado em julgado em 13/07/2022, nos autos de Processo Comum Coletivo n.° 1025/20.5JAAVR, do Juízo Central Criminal de Aveiro - Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, foi o arguido AA condenado pela prática, em 2020/12/24, em coautoria material e na forma consumada, de um crime de roubo agravado, previsto e punível nos termos do artigo 210°, n.° 2, al. b), por referência ao artigo 204.°, n.° 2, alínea f), ambos do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão; pela prática, em 2020/12/24, em coautoria material e na forma consumada, de um crime de coação agravada, previsto e punível pelos artigos 154.°, n.° 1 e 155.°, n.° 1, al. a), ambos do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão; pela prática, em 2020/12/24, em coautoria material e na forma consumada, de um crime de detenção de arma proibida previsto e punível pelo artigo 86.°, n.° 1 al. c), da Lei n.° 5/2006, de 23/2, na pena de 2 (dois) anos de prisão. Em cúmulo jurídico foi o arguido AA condenado na pena única de 6 (seis) anos de prisão (efetiva), sendo perdoado a essa pena 1 (um) ano de prisão nos termos da Lei n.° 38-A/2023, de 2 de agosto.

1.4. – No Processo Comum Coletivo n.° 1025/20.5JAAVR, do Juízo Central Criminal de Aveiro - Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, provou-se quanto ao arguido AA (condenado em coautoria) o seguinte:

“1. O ofendido XX, exerce as funções de motorista de táxi, ao serviço da empresa T....., sita em ..., localidade onde presta serviço.

2. No dia 24 de dezembro de 2020, cerca das 04 horas e 50 minutos, foi contactado telefonicamente pelos arguidos solicitando os seus serviços e indicando-lhe o local onde estes se encontravam.

3. Seguindo as indicações que estes lhe deram, o ofendido dirigiu-se então, conduzindo o veículo matrícula V2, à “Rua 4”, em ... (que localizou pelo GPS), onde encontrou, na via pública, os arguidos, os quais detinham consigo malas e sacos, sendo que, a arguida WW tinha consigo um bebé ao colo.

4. Após ter ajudado os arguidos a arrumar os seus pertences na bagageira, os arguidos entraram para o veículo, ocupando o banco traseiro, altura em que o ofendido os informou que não poderia transportar três pessoas para Castelo Branco devido à situação de pandemia atual, oferecendo-se para chamar outro táxi para dividir os passageiros.

5. Perante isto, os arguidos disseram que o transporte não era para Castelo Branco, mas sim para Braga e que tinham dinheiro para pagar a viagem, tendo o ofendido recusado a viagem.

6. Face à recusa do ofendido, os arguidos insistiram de forma reiterada para que este os transportasse, sendo que, o arguido AA, ao aperceber-se que o ofendido estava a estabelecer contactos telefónicos, com o seu patrão e com o 112, efetuou-lhe um golpe “mata-leão” e desferiu-lhe pelo menos duas chapadas.

7. De seguida, o arguido FF saiu da viatura e sentou-se no lugar do passageiro, segurando a arma de fogo modificada, tendo por base uma espingarda caçadeira da marca RFM Brescia de origem italiana, com o número de série 15823, dois canos sobrepostos/justapostos com alma lisa, de calibre 12 (12 gauge), com comprimento total de aproximadamente 66,5 cm e cerca de 45 cm de cano, melhor descrita no auto de exame de fls. 313 e ss., que aqui se dá por reproduzido, que, de imediato, apontou à zona superior do peito do ofendido, ao mesmo tempo que dizia “ou arrancas ou levas um tiro.”

8. Perante a ameaça iminente e temendo pela sua vida, o ofendido iniciou a marcha do veículo, continuando o arguido FF no lugar do passageiro e os outros dois arguidos sentados no banco traseiro.

9. Durante o percurso, o arguido AA pegou na indicada arma, partindo, com a mesma, o monitor de rádio, bem como, o contador/taxímetro da viatura, após o que voltou a entregá-la ao arguido FF.

10. Simultaneamente, a arguida WW ia dando as indicações sobre a direção a seguir, sendo que, o arguido AA desferiu pelo menos uma chapada no ofendido, dizendo-lhe para conduzir mais depressa, enquanto que o arguido FF mantinha a arma apontada ao mesmo.

11. Ao chegar à zona de acesso à A 23, o arguido AA ordenou ao ofendido que parasse o veículo, a fim de trocar consigo, pois conduzia muito devagar, passando, então, aquele a conduzir a viatura até ao KM 125 da A25, o que fez.

12. Durante tal percurso e continuando a obedecer a ordens do arguido AA, o ofendido seguiu no banco traseiro com a máscara a tapar a cara e as mãos na cabeça, seguindo a arguida WW ao seu lado direito, a qual ia fornecendo as direções.

13. Durante o percurso, os arguidos mantiveram a arma apontada ao ofendido, dizendo-lhe que o matariam, caso não obedecesse às suas ordens, exigindo-lhe que lhes entregasse todo o dinheiro que tivesse consigo, o que este fez, dando-lhes todo o dinheiro que tinha consigo (várias notas e moedas) no montante de €125.

14. Ao chegarem ao KM 125, os arguidos ordenaram ao ofendido que voltasse para o lugar do condutor e que conduzisse o veículo, voltando o arguido AA para o banco traseiro.

15. A partir de então e continuando a obedecer a ordens dos arguidos, o ofendido, temendo pela sua integridade física e pela sua vida, passou novamente a conduzir o veículo, seguindo pela A25 em direção a Aveiro até ao momento em que foram intercetados pela GNR de Aveiro, nas portagens de Albergaria-a-Velha, em direção à A1, por volta das 07 horas e 50 minutos.

16. Apesar de o ofendido ter pedido diversas vezes para pararem e o libertarem, tais pedidos não foram atendidos.

17. No momento da detenção, os arguidos detinham também na sua posse um canivete, de abertura manual por báscula, com travão/mola fixadora, possuindo uma lâmina do tipo corto-perfurante, de um só gume, com serrilhado na parte de cima, com comprimento total de 22,5 cm, melhor descrito no exame de fls. 313 e ss., que aqui se dá por reproduzido.

18. Os arguidos eram conhecedores das características da arma apreendida e dos requisitos legais para a sua detenção, mais sabendo que não possuem qualquer licença para o uso e porte das mesma e que, por isso, lhes estava vedada tal detenção.

19. Os arguidos, agiram de forma livre, deliberada e consciente, em comunhão de esforços e intentos, na execução de plano comum, bem sabendo que as suas condutas são proibidas e punidas por lei.

20. Bem sabiam igualmente que ao fazer uso da indicada arma caçadeira, nas circunstâncias em que o fizeram e ao dirigirem ao ofendido expressões ameaçadoras, lhe provocavam medo pela sua integridade física e até vida e o colocavam na impossibilidade de lhes resistir, resultado que todos previram, quiseram e lograram atingir.

21. Mais quiseram e conseguiram sujeitar o ofendido a conduzi-los ao destino pretendido, privando-o da respetiva liberdade e mantendo-o nessa situação durante várias horas, sabendo que tal era contrário à sua vontade.

22. Os arguidos agindo da forma supra descrita fizeram-no com o propósito de causar medo e receio ao ofendido caso este não cedesse aos seus intentos, como efetivamente sucedeu, forçando-o, contra a sua vontade a transportar os arguidos ao destino pretendido.

23. Quiseram, ainda, fazer sua quantia monetária que sabiam não lhes pertencer e que agiam contra a vontade do respetivo dono.

(...) Do percurso de vida dos arguidos, suas condições socioeconómicas e antecedentes criminais:

AA descende de uma família numerosa cujo processo educativo foi orientado por valores, tais como, os fortes laços afetivos e de proteção entre os seus elementos, mas de desvalorização académica.

O seu processo de crescimento decorreu junto da mãe e avós maternos, em ..., ..., sendo que durante o período de cumprimento de uma pena de prisão por parte da mãe, o arguido e os irmãos uterinos ficaram entregues aos cuidados destes avós. Contudo, na sequência da prisão destes, foram colocados no Centro de Acolhimento da Associação Social Cultural e Recreativa de ... (ASCR...) ..., onde permaneceram entre janeiro de 2009 a setembro de 2011, altura em que por ordem do Tribunal de Menores, foram entregues novamente, aos cuidados dos avós maternos.

AA frequentou a escola e concluiu o 4° ano de escolaridade na referida instituição, tendo vindo a abandonar a escolarização durante a frequência do 5° ano.

A nível profissional não apresenta experiência significativa, sendo apenas salientada a atividade de ..., junto dos avós maternos.

Ainda em criança, AA começou a apresentar comportamentos de alguma instabilidade emocional, que levou os familiares a recorrem a apoio médico e desde então que se encontra medicado por diagnóstico de crises de ansiedade e epilepsia.

O arguido estabeleceu um relacionamento afetivo, com WW, em 2017, do qual nasceu um descendente, atualmente com 2 anos e 9 meses de idade. Fixou residência no bairro social ..., em Braga, conotado com graves problemáticas sociais e grande incidência criminal, onde residiam outros familiares.

O quotidiano do arguido era passado junto do agregado constituído e da família alargada, não desenvolvia qualquer atividade laboral, assim como a companheira, sendo a subsistência dos mesmos assegurada pelo rendimento social de inserção no valor de 417 EUR e pelo abono de família relativo ao descendente no valor de 97 EUR.

Mantinha uma relação próxima e de interajuda com estes familiares, assim como, com a mãe e avós maternos, residentes em ... – ..., local para onde se deslocava regularmente.

Relativamente à tipologia criminal pelo qual é acusado no presente processo e quando analisados em abstrato, AA reconhece a ilicitude e gravidade, processo face ao qual não demonstra preocupação sobre o desfecho do mesmo.

AA foi preso preventivamente no Estabelecimento Prisional (EP) de Coimbra em 24.12.2020, à ordem dos presentes autos, nos quais ainda se mantém.

Durante o período de reclusão protagonizou uma evasão em 02.05.2021 do (EP) de Aveiro para onde foi transferido em 10.03.2021, tendo-se apresentado voluntariamente no (EP) de Vale de Sousa em 05.05.2021, justificando esta conduta pelo desgaste provocado pelo distanciamento físico do filho. Face a esta conduta foi colocado na secção de segurança do (EP) de Paços de Ferreira em 27.05.2021 e sancionado com medida disciplinar de internamento em cela disciplinar pelo período de 21 dias.

Regista ainda uma outra punição anterior, por “intimidar ou estabelecer relação de poder ou autoridade sobre outros reclusos” factos ocorridos em 06.04.2021, tendo sido decretada a sua permanência obrigatória no alojamento, pelo período de 12 dias.

No âmbito do regime onde se encontra é referenciado pelos elementos da vigilância como um individuo impulsivo e com dificuldade em assumir uma comunicação assertiva, por vezes com os familiares e outros reclusos.

Mantem acompanhamento clínico especializado no âmbito dos problemas de saúde supramencionados e toma de medicação.

Possui, como referências afetivas, a mãe, a companheira, filho e família alargada com quem mantem contactos telefónicos.

(...)O arguido AA foi condenado:

ProcessoTipos Legais de crimeData FactosData
Condenação
Trânsito em JulgadoPena(s)Extinção
803/15.1PBBRGCondução
sem
habilitação
legal
2015/04/292016/05/03
2016/06/02
90 dias de multa, à taxa diária de €5,002016/12/14
52/18.7GAAMRFurto
qualificado na forma tentada
2018/022019/03/20
2019/05/17
10 meses de prisão, substituída por 200 dias de multa, à taxa diária de €5,00-
960/17.2GAEPSFurto qualificado na forma tentada dano qualificado furto simples2017/11/032019/07/04
2020/06/12
190 dias de multa, à taxa diária de €5,50 e 1 ano de prisão, suspensa por 1 ano-
32/20.2GTVCTCondução
sem
habilitação
legal
2020/09/082020/09/09
2020/10/09
160 dias de multa, à taxa diária de €5,00-
1133/20.2GBBCLDesobediênci a2020/09/132021/01/21
2021/02/22
60 dias de multa, à taxa diária de €5,00-

(...)”

1.5. – Por sentença proferida em 24/01/2024, transitada em julgado em 23/02/2024, nos autos de Processo Comum Singular n.° 394/21.4PBAVR, do Juízo Local Criminal de Aveiro - Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, foi o arguido AA condenado pela prática, em 02/05/2021, em autoria material e na forma continuada e consumada, de 1 (um) crime de evasão, previsto e punível pelo artigo 352.°, n.° 1 e 2 do Código Penal, na pena de 9 (nove) meses de prisão (efetiva).

1.6. – No Processo Comum Singular n.° 394/21.4PBAVR, do Juízo Local Criminal de Aveiro - Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, provou-se o seguinte:

“1. Por despacho judicial proferido em 24 de Dezembro de 2020, no âmbito do processo de inquérito com o NUIPC 1025/20.5JAAVR, que correu termos no Departamento de Investigação e Acção Penal - Secção de Albergaria-A-Velha, foi determinado que AA ali aguardasse os ulteriores trâmites processuais sujeito à medida de coacção de prisão preventiva.

2. No âmbito do primeiro interrogatório judicial de arguido detido, AA tomou, então, pessoalmente, conhecimento de que se encontrava privado da sua liberdade e que, assim, não se podia ausentar do Estabelecimento Prisional para onde seria conduzido.

3. No entanto, no dia 02-05-2021, cerca das 15h 12m, aproveitando o facto de se encontrar no pátio do Estabelecimento Prisional de Aveiro juntamente com outros reclusos, AA deslocou-se até uma parede ali existente e, agarrando-se às grades de duas janelas e a um tubo de PVC, logrou trepar uma parede com altura não concretamente apurada, mas não inferior a 5 metros, até atingir o telhado.

4. Aí, AA percorreu distância não concretamente determinada e seguindo percurso não apurado até conseguir saltar de um muro para o exterior do Estabelecimento Prisional.

5. De seguida, AA encetou fuga, apeado, pela Rua 5 em direcção à zona do Hospital.

6. Não obstante as diligências encetadas pelo Estabelecimento Prisional de Aveiro, AA não foi encontrado até que, no dia 05-05-2021, cerca das 23h 30m, se apresentou no Estabelecimento Prisional de Vale de Sousa.

7. O arguido sabia que que não se poderia ausentar, por qualquer forma, daquele Estabelecimento Prisional sem prévia autorização, a qual, naquele momento, não detinha.

8. Ao agir da forma descrita, agiu o arguido bem sabendo que lhe havia sido aplicada medida de coacção privativa da liberdade e com o propósito de se furtar à estrita permanência no estabelecimento prisional, e, consequentemente, à privação da sua plena liberdade pessoal, válida e legalmente imposta por decisão judicial, o que logrou alcançar, violando, com a sua conduta, a autoridade pública do sistema estadual.

9. O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era prevista e punida por lei.

10. O arguido é solteiro, mas mantém relação de união de facto, beneficiando de visitas conjugais no Estabelecimento Prisional, para além de visitas regulares da companheira e seus familiares.

11. O arguido tem um filho menor de idade.

12. O arguido, antes de iniciar o cumprimento de prisão preventiva à ordem do processo identificado em 1, dedicava-se à actividade profissional de ....

13. Como habilitações literárias, o arguido tem o 5.° ano de escolaridade, encontrando-se a frequentar o sistema de ensino, em âmbito prisional, para adquirir competências equivalentes às do 6.° e 7.° anos de escolaridade.

14. Em data não concretamente determinado, o arguido solicitou ao sr. Director do Estabelecimento Prisional onde se encontra a cumprir pena a sua integração em actividade remunerada, estando a aguardar vaga para o efeito.

15. Desde data não concretamente apurada, anterior a 24-12-2020, o arguido consumiu estupefacientes, concretamente cocaína, estando integrado em tratamento de desabituação com apoio psiquiátrico e com controlo por análises de urina para garantir que se mantém abstinente.

16. Em virtude dos factos dados como provados 3 a 6, o arguido foi sujeito a processo disciplinar em que lhe foi imposta a medida sancionatória de 21 dias de internamento em cela disciplinar.

17. Não existe registo de outros incidentes disciplinares.

18. O arguido já foi condenado na pena de:

a) 90 dias de multa, por sentença transitada em julgado em 02-06-2016, proferida no âmbito do processo n.°803/15.1PBBRG, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Local Criminal de Braga – Juiz 3, pela prática, em 29-04-2015, de um crime de condução sem habilitação legal;

b) 10 meses de prisão, substituída por 200 dias de multa, por sentença transitada em julgado em 17-05-2019, proferida no âmbito do processo n.°52/18.7GAAMR, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Local Criminal de Amares, pela prática, em Fevereiro de 2018, de um crime de furto qualificado na forma tentada, sendo que, por despacho transitado em julgado em 07-03-2022, foi revogada a pena de substituição e determinado o cumprimento da pena em regime de prisão efectiva e, subsequentemente, perdoado o seu cumprimento ao abrigo da Lei n.°38-A/2023, de 02 de Agosto;

c) 190 dias de multa e na pena de 1 ano de prisão, suspensa na execução por igual período de tempo, por sentença transitada em julgado em 12-06-2020, proferida no âmbito do processo n.°960/17.2GAEPS, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo de Competência Genérica de Esposende - Juiz 1, pela prática, em 03-11-2017, de um crime de furto qualificado na forma tentada, de um crime de dano qualificado e de um crime de furto;

d) 160 dias de multa, por sentença transitada em julgado em 09-10-2020, proferida no âmbito do processo n.°32/20.2GTVCT, do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo Local Criminal da Póvoa de Varzim, pela prática, em 08-09-2020, de um crime de condução sem habilitação legal;

e) 6 anos de prisão, por acórdão transitado em julgado em 13-07-2022, proferido no âmbito do processo n.°1025/20.5JAAVR, do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Juízo Central Criminal de Aveiro - Juiz 1, pela prática, em 24-12-2020, de um crime de coacção agravada, de um crime de detenção de arma proibida e de um crime de roubo qualificado, tendo o mesmo beneficiado de perdão de 1 ano de prisão ao abrigo da lei n.°38-A/2023, de 02 de Agosto;

f) 100 dias de multa, por sentença transitada em julgado em 08-06-2022, proferida no âmbito do processo n.°532/19.7GBBCL, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Local Criminal de Barcelos - Juiz 2, pela prática, em 09-06-2019, de um crime de condução sem habilitação legal;

g) 60 dias de multa, por sentença transitada em julgado em 22-02-2021, proferida no âmbito do processo n.°1133/20.2GBBCL, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Local Criminal de Barcelos - Juiz 2, pela prática, em 13-09-2020, de um crime de desobediência;

h) 8 meses de prisão, suspensa na execução pelo prazo de 2 anos, com regime de prova, por sentença transitada em julgado em 11-11-2022, proferida no âmbito do processo n.°376/14.2GAPVZ, do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo Local Criminal da Póvoa de Varzim, pela prática, em 13-10-2014, de um crime de furto qualificado.”

1.7. – Por sentença proferida em 15/10/2024, transitada em julgado em 14/11/2024, nos autos de Processo Comum Singular n.° 42/19.2PEBRG, do Juízo Local Criminal de Braga - Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, foi o arguido AA condenado pela prática, em 25/05/2019, em autoria material e na forma continuada e consumada, de 1 (um) roubo, previsto e punido pelo artigo 210.°, n.° 1, do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de prisão (efetiva).

1.8. – No Processo Comum Singular n.° 42/19.2PEBRG, do Juízo Local Criminal de Braga - Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, provou-se o seguinte:

“1. No dia 20 de Maio de 2019, pelas 12h30m, na Rua 6, em Braga, o arguido avistou YY, que caminha na referida artéria.

2. De imediato decidiu abordá-la usando se necessário de violência para se apoderar de objectos que aquela trouxesse consigo.

3. Assim, o arguido abordou, por trás, a ofendida e arrancou-lhe, com gesto brusco e violento, um fio em ouro e uma medalha com a letra “R” que aquela trazia ao pescoço.

4. Dada a força exercida, o arguido arrebentou com o fio em ouro ficando apenas com parte do mesmo, de valor não concretamente apurado, mas seguramente superior a € 102,00.

5. Ao proceder conforme o descrito, o arguido agiu com a intenção de se apoderar do fio em ouro e medalha, fazendo seu, integrando parte do fio e a medalha na sua esfera patrimonial, em prejuízo do seu legítimo dono e em seu único e em exclusivo proveito.

6. Quis o arguido, usando de força física, apoderar-se do fio em ouro e medalha, coarctando, para o efeito, qualquer possibilidade de resistência à ofendida.

7. Agiu o arguido de forma livre, voluntaria e conscientemente, sabendo ser a descrita conduta proibida e punida por lei.

Mais se provou que:

8. À data dos factos pelos quais se encontra acusado no presente processo, o arguido permanecia junto do agregado familiar constituído, composto pela sua companheira, WW e pelo filho de ambos, à data com 2 anos de idade, bem como pela sua progenitora, BB e pelo seu irmão ZZ, à data com 15 anos de idade. O domicílio do referido agregado, uma habitação camarária de tipologia 3, situava-se no complexo habitacional “...” na cidade de Braga.

9. O arguido geria o seu quotidiano em função do consumo substâncias estupefacientes e no convívio com pares associados a comportamentos criminais.

10. AA descende de uma família numerosa, o seu processo de crescimento decorreu junto da mãe e avós maternos, em ..., ..., sendo que durante o período de cumprimento de uma pena de prisão efectiva por parte da mãe, o arguido e os irmãos uterinos ficaram entregues aos cuidados destes avós. Contudo, na sequência da prisão efectiva destes, foram colocados no Centro de Acolhimento da Associação Social Cultural e Recreativa de ... (ASCR...) ..., onde permaneceram desde janeiro de 2009 a setembro de 2011, altura em que por ordem do Tribunal de Menores, foram entregues novamente, aos cuidados dos avós maternos.

11. AA frequentou a escola e concluiu o 4° ano de escolaridade na referida instituição, tendo vindo a abandonar a escolarização durante a frequência do 5° ano. A nível profissional não apresenta experiência significativa, sendo apenas salientada a actividade de ..., junto dos avós maternos.

12. Ainda em criança, AA começou a apresentar comportamentos de alguma instabilidade emocional, que levou os familiares a recorrem a apoio médico e desde então que se encontra medicado por diagnóstico de crises de ansiedade e epilepsia.

13. Neste contexto surgiram os seus contactos com o Sistema de Justiça Penal, tendo sido condenado em várias penas e medidas não privativas da liberdade, que não surtiram o efeito dissuasor pretendido, mantendo o arguido a comportamentos criminais.

14. No presente, possui como referências afectivas, a progenitora e respectivo companheiro, a companheira e filho, actualmente com 4 anos de idade, com os quais mantem contactos telefónicos regulares.

15. Relativamente à família alargada, refere uma quebra de laços afectivos e relacionais, alegando divergências resultantes de outros processos criminais. AA foi preso preventivamente no Estabelecimento Prisional (EP) de Coimbra em 24.12.2020, durante o período de reclusão protagonizou uma evasão em 02.05.2021 do EP de Aveiro para onde foi transferido em 10.03.2021, tendo-se apresentado voluntariamente no EP de Vale de Sousa em 05.05.2021, justificando esta conduta pelo desgaste provocado pelo distanciamento físico do filho. Face a esta conduta foi colocado na secção/regime de segurança do EP de Paços de Ferreira em 27.05.2021.

16. A nível disciplinar, registou uma sanção de internamento em cela disciplinar pelo período de 21 dias e ainda uma outra punição anterior, por “intimidar ou estabelecer relação de poder ou autoridade sobre outros reclusos” factos ocorridos em 06.04.2021, tendo sido decretada a sua permanência obrigatória no alojamento, pelo período de 12 dias, factos estes que resultaram nos presentes autos.

17. Face ao supracitado, durante a sua permanência em regime de segurança era referenciado pelos elementos da vigilância como um indivíduo impulsivo e dificuldade em assumir uma comunicação assertiva, por vezes com os familiares e outros reclusos.

18. Em 30.11.2021 foi transferido para o EP de Monsanto, onde permaneceu em regime de segurança até 27.05.2022, altura em que lhe foi decretada a cessação do regime de segurança e consequente transferência para o EP de Vale do Sousa. Nesse hiato temporal revelou uma maior estabilidade comportamental e maior adequação às regras e normas institucionais.

19. Desde a sua entrada no EP de Vale do Sousa tem mantido um comportamento tendencialmente ajustado, isento de sanções disciplinares e investido a nível formativo, consubstanciado pela frequência do curso EFA B1 e B2 com equivalência ao 5° e 6° ano de escolaridade.

20. Mantém acompanhamento clínico especializado no âmbito dos problemas de saúde supramencionados com suporte medicamentoso.

21. Como principais repercussões da sua situação de reclusão, AA refere os transtornos inerentes à privação da liberdade, nomeadamente, o afastamento do seu núcleo familiar e as consequências afectivas e relacionais que daí resultam.

22. O arguido tem averbadas as seguintes condenações:

- PCS n.° 803/15.1PBBRG, por sentença transitada em julgado em 02.06.2016, pela prática em 29.04.2015, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 90 dias de multa, à taxa diária de € 5,00, já declara extinta pelo cumprimento em 14.12.2016;

- PCS n.° 52/18.7GAAMR, por sentença transitada em julgado em 17.05.2019, pela prática em Fevereiro de 2018, de um crime de furto qualificado na forma tentada, na pena de 10 meses de prisão, substituída por 200 dias de multa à taxa diária de € 5,00. Por despacho datado de 07.03.2022 foi determinado o cumprimento de 10 meses de prisão efectiva, a qual foi declarada extinta em 13.09.2023, tendo o arguido beneficiado de amnistia;

- PCS n.° 960/17.2GAEPS, por sentença transitada em julgado em 12.06.2020, pela prática em 03.011.2017, de um crime de furto qualificado na forma tentada, um crime de dano e um crime de furto simples, na pena de 190 dias de multa, à taxa diária de € 5,50 e na pena de 1 ano de prisão, suspensa na sua execução, por igual período;

- PS n.° 32/20.2GTVCT, por sentença transitada em julgado em 09.10.2020, pela prática em 08.09.2020 de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 160 dias de multa à taxa diária de € 5,00, declarado extinto pelo cumprimento de 106 dias de prisão subsidiária, em 04.04.2022;

- PCC n.° 1025/20.5JAAVR, por acórdão transitado em julgado em 13.07.2022, pela prática, em 24.12.2020, de um crime de coação agravada, um crime de detenção de arma proibida e um crime de roubo qualificado, na pena de 6 anos de prisão, tendo-lhe sido perdoado 1 ano;

- PCS n.° 532/19.7GBBCL, por sentença transitada em julgado em 08.06.2022, pela prática, em 09.06.2019, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 100 dias de multa, à taxa diária de € 5,00;

- PA n.° 1133/20.25GBBCL, por sentença transitada em julgado em 22.02.2021, pela prática em, 13.09.2020, de um crime de desobediência, na pena de 60 dias de multa, à taxa diária de € 5,00;

- PCS n.° 376/14.2GAPVZ, por sentença transitada em julgado em 11.11.2021, pela prática, em 13.010.2014, de um crime de furto qualificado, na pena de 8 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 anos, com regime de prova, declarada extinta pelo cumprimento em 11.11.2023;

- PCS n.° 394/21.4PBAVR, por sentença transitada em julgado em 23.2.2024, pela prática em 02.05.2021, de um crime de evasão, na pena de 9 meses de prisão;

- PCC n.° 71/19.6PFBRG, pro acórdão transitado em julgado em 24.11.2023, pela prática, em Junho de 2016, de um crime de tráfico de quantidades diminutas e de menor gravidade, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão efectiva, tendo sido declarado o perdão de 1 ano sob condição resolutiva.

23. O arguido não denotou qualquer arrependimento, nem juízo de auto-censura quanto à prática dos factos que lhe são imputados nos autos.”

1.9. – O arguido tem registadas no seu certificado do registo criminal as condenações supra referidas.

1.10. – Consta no relatório social elaborado pela Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP), quanto à inserção familiar e socioprofissional do arguido AA, com o objetivo de auxiliar no conhecimento da personalidade do arguido e na correta determinação da sanção que eventualmente possa vir a ser aplicada (cfr. Ref. 17420201), além do mais, o seguinte:

“I - Condições pessoais e sociais

À data da reclusão o arguido vivia com a companheira, WW e o filho de ambos, integrava, ainda, o agregado a sua progenitora, BB e o seu irmão ZZ. O domicílio do referido agregado, uma habitação camarária de tipologia 3, situava-se no complexo habitacional “...” na cidade de Braga. O arguido geria o seu quotidiano em função do consumo substâncias estupefacientes e no convívio com pares associados a comportamentos criminais.

No presente o arguido conta com o apoio da companheira, mãe e companheiro desta.

Os avós maternos do arguido construíram habitações para os filhos na freguesia de ..., em .... Contudo, a casa que a mãe ocupava, sofreu um incêndio no verão transato (curto-circuito) e terá ficado danificada, encontrando-se a ser reparada, pelo que a mãe e o seu companheiro, vivem temporariamente na casa ao lado, onde a avó materna vivia, habitação que terá sido doada ao arguido e, onde este pretende fixar residência com a companheira e o filho menor de idade quando for libertado. Durante o período de reclusão de AA a sua companheira e filho têm permanecido junto da família daquela, residente na zona de ....

A mãe do arguido e o seu companheiro, trabalham no transporte particular de passageiros (TVDE) e na venda ambulante, através de uma roulotte, referindo esta que quando o filho for libertado poderá trabalhar com ela, na venda ambulante na referida roulotte.

No lugar onde família vive não se colocam problemas quanto a uma eventual presença de AA, não existindo muita proximidade com outros residentes da freguesia (trata-se de um local isolado).

AA descende de uma família numerosa, tendo o seu processo de desenvolvimento decorrido junto da mãe e avós maternos, em ..., ..., sendo que durante o período de cumprimento de uma pena de prisão efetiva por parte da mãe, o arguido e os irmãos uterinos ficaram entregues aos cuidados destes avós. Contudo, na sequência da prisão efetiva destes, foram colocados no Centro de Acolhimento da Associação Social Cultural e Recreativa de ... (ASCR...) Esposende, onde permaneceram entre janeiro de 2009 e setembro de 2011, altura em que por ordem do Tribunal de Menores, foram entregues novamente, aos cuidados dos avós maternos.

AA frequentou a escola e concluiu o 4° ano de escolaridade na referida instituição, tendo vindo a abandonar a escolarização durante a frequência do 5° ano. A nível profissional não apresenta experiência significativa, sendo apenas salientada a atividade de ..., junto dos avós maternos.

Ainda em criança, AA começou a apresentar comportamentos de alguma instabilidade emocional, que levou os familiares a recorrem a apoio médico e desde então encontra-se medicado, por diagnóstico de crises de ansiedade e epilepsia.

Neste contexto de instabilidade comportamental surgiram os seus primeiros contactos com o Sistema de Justiça Penal, tendo sido condenado em várias penas e medidas não privativas da liberdade, que não surtiram o efeito dissuasor pretendido, mantendo o arguido comportamentos criminais.

II - Repercussões da situação jurídico-penal do arguido

AA cumpre pela primeira vez pena de prisão, tendo dado entrada no Estabelecimento Prisional de Coimbra em 24.12.2020 e foi transferido para o EP de Aveiro em 10.03.2021 de onde protagonizou uma evasão em 02.05.2021, tendo-se apresentado voluntariamente no EP de Vale de Sousa em 05.05.2021, justificando esta conduta pelo desgaste provocado pelo distanciamento físico do filho. Face a esta conduta foi colocado na secção/regime de segurança do EP de Paços de Ferreira em 27.05.2021. A nível disciplinar, registou uma sanção de internamento em cela disciplinar pelo período de 21 dias e ainda uma outra punição, por “intimidar ou estabelecer relação de poder ou autoridade sobre outros reclusos” factos ocorridos em 06.04.2021, tendo sido decretada a sua permanência obrigatória no alojamento, pelo período de 12 dias.

Durante a sua permanência em regime de segurança era referenciado pelos elementos da vigilância como um indivíduo impulsivo e com dificuldade em assumir uma comunicação assertiva, por vezes com os familiares e outros reclusos.

Em 30.11.2021 foi transferido para o EP de Monsanto, onde permaneceu em regime de segurança até 27.05.2022, altura em que lhe foi decretada a cessação do regime de segurança e consequente transferência para o EP de Vale do Sousa. Nesse hiato temporal revelou uma maior estabilidade comportamental e maior adequação às regras e normas institucionais.

No EP de Vale do Sousa manteve um comportamento tendencialmente ajustado, isento de sanções disciplinares e investido a nível formativo, consubstanciado pela frequência do curso EFA B1 e B2 com equivalência ao 5° e 6° ano de escolaridade.

Manteve acompanhamento clinico especializado no âmbito dos problemas de saúde supramencionados com suporte medicamentoso.

No EP de Coimbra onde se encontra desde junho de 2024 tem vindo a manter comportamento de acordo com as normas da instituição e encontra-se a frequentar a escola no nível B3, com assiduidade e empenho.

Como principais repercussões da sua situação de reclusão, AA refere os transtornos inerentes à privação da liberdade, nomeadamente, o afastamento do seu núcleo familiar e as consequências afetivas e relacionais que daí resultam. Manifesta ainda que a reclusão veio travar a sua escalada delinquente, levando-o a refletir sobre os seus comportamentos e suas consequências.

Apresenta alguma ansiedade e preocupação em ver a sua situação jurídica totalmente definida.

Em abstrato e tendo em conta a natureza dos factos subjacentes às suas condenações, o arguido demonstra capacidade de análise crítica na avaliação da ilicitude e gravidade de crimes desta ou de outra natureza.

III - Conclusão

Não obstante várias condenações AA, encontra-se recluído pela primeira vez, tendo numa fase inicial da sua reclusão registado uma conduta contrária ao normativo vigente salientando-se um incumprimento grave ao ter-se evadido do Estabelecimento Prisional e na sequência do qual foi colocado na secção de segurança, situação que no presente aparenta ter sofrido uma inversão.

Face ao exposto, consideramos que AA necessita de intervenção, que vise essencialmente a sua mobilização para um projeto de vida, que priorize uma integração laboral e/ou formativa, o desenvolvimento de competências pessoais e sociais, designadamente a capacidade de autorregulação comportamental e emocional e o afastamento de pares promotores de condutas desviantes/ilícitas, condições que poderão contribuir para a inversão do seu percurso vivencial, por forma a reger-se de acordo com as normas sociais e jurídicas vigentes.”

2. O tribunal “a quo” fundamentou o direito aplicável, nos seguintes termos:

1. Enquadramento jurídico-criminal

No sistema português, a punição dos agentes por uma pluralidade de crimes, numa primeira fase do processo lógico subjacente à decisão judicial, dá lugar a uma pluralidade de penas. O concurso de penas é, pois, um dos casos de aplicação a um agente de uma pluralidade de penas parcelares em virtude de concurso de crimes, com uma especificidade: em virtude do disposto no artigo 77.° do Código Penal, não se adicionam materialmente as penas, mas procede-se a um cúmulo jurídico como forma de encontrar uma pena conjunta.

Para que se proceda ao cúmulo jurídico de penas é necessário que estas, para além de estarem em concurso, sejam da mesma espécie. Caso as penas sejam de espécie diversa, a lei abandona o sistema da pena conjunta e impõe a acumulação material.

Estipula o artigo 77.° (Regras da punição do concurso), do Código Penal, que “1. - Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente. 2. - A pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes. 3 - Se as penas aplicadas aos crimes em concurso forem umas de prisão e outras de multa, a diferente natureza destas mantém-se na pena única resultante da aplicação dos critérios estabelecidos nos números anteriores. 4. - As penas acessórias e as medidas de segurança são sempre aplicadas ao agente, ainda que previstas por uma só das leis aplicáveis.”

Por sua vez, estipula o artigo 78.° (Conhecimento superveniente do concurso), n.°s 1 e 2 do Código Penal, que “1 - Se, depois de uma condenação transitada em julgado, se mostrar que o agente praticou, anteriormente àquela condenação, outro ou outros crimes, são aplicáveis as regras do artigo anterior, sendo a pena que já tiver sido cumprida descontada no cumprimento da pena única aplicada ao concurso de crimes. 2 - O disposto no número anterior só é aplicável relativamente aos crimes cuja condenação transitou em julgado.”

De acordo com o artigo 471.° (Conhecimento superveniente do concurso) do Código de Processo Penal, “1 - Para o efeito do disposto nos n.°s 1 e 2 do artigo 78.° do Código Penal é competente, conforme os casos, o tribunal colectivo ou o tribunal singular. É correspondentemente aplicável a alínea b) do n.° 2 do artigo 14.° 2 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, é territorialmente competente o tribunal da última condenação.”

Determina o artigo 472.º (Tramitação) do Código de Processo Penal, que “1 – Para o efeito do disposto no n.° 2 do artigo 78.° do Código Penal, o tribunal designa dia para a realização da audiência ordenando, oficiosamente ou a requerimento, as diligências que se lhe afigurem necessárias para a decisão. 2 - É obrigatória a presença do defensor e do Ministério Público, a quem são concedidos quinze minutos para alegações finais. O tribunal determina os casos em que o arguido deve estar presente.”

Cumpre recordar que a realização do concurso (cúmulo) de penas corresponde a um verdadeiro julgamento de mérito em que o tribunal profere uma decisão final que se sobrepõe às decisões anteriormente proferidas relativamente a cada crime a que respeitam as penas parcelares (cfr. Ac. do TRL de 15/07/2009, proc. n.° 1323/05.8PEAMD-A.L1-3; Ac. do TRL de 34/10/2011, proc. n.° 160/10.2TCLS-A.L1-9; todos in wwwÁgsi.pt), com a presença obrigatória do Ministério Público e do Defensor do arguido, no qual são levadas a cabo todas as diligências julgadas necessárias e que termina com alegações orais (cfr. artigo 472.°, n.°s 1 e 2 do Código de Processo Penal), e do qual dimana, necessariamente, uma condenação numa pena única.

Por outras palavras, o Tribunal não se limita a efetuar uma simples operação aritmética, procede antes à análise de todas as penas a cumular, bem como à apreciação conjunta dos factos praticados pelo arguido e à personalidade deste, conforme dispõe o artigo 77.°, n.° 1 do Código Penal.

O instituto jurídico do concurso de penas foi criado no propósito de ser feita uma apreciação global, e tanto quanto possível atualizada, do arguido e da sua conduta, segundo a qual o tribunal está colocado a final dos vários factos praticados pelo agente e, tanto quanto possível, vai julgá-lo numa apreciação conjunta de todos eles.

“O cúmulo jurídico não engloba os crimes praticados depois do trânsito em julgado de uma decisão. A lei admite o cúmulo de crimes cujo conhecimento seja superveniente ao trânsito em julgado de uma decisão, mas o que é superveniente é o conhecimento dos pressupostos do cúmulo” (...) sendo que, “a efectivação do cúmulo jurídico constitui um verdadeiro e autêntico julgamento e a decisão proferida constitui uma deliberação consubstanciadora também de uma verdadeira e autêntica decisão condenatória: pois o Tribunal não se limita a efectuar uma simples operação aritmética, procede antes à análise jurídica de todas as penas a cumular, bem como à apreciação conjunta dos factos praticadas pelo arguido e da personalidade deste” (vide o Ac. do TRP de 14/07/2008, in wwwÁgsi.pt). A aplicação deste critério permite-nos distinguir as situações de concurso de crimes, daquelas em que apenas se verifica uma sucessão de crimes.

Efetivamente, como explica Paulo Dá Mesquita, o “sistema de cúmulo jurídico das penas não pode ser aplicado em todos os casos em que um agente tenha em diversas ocasiões sido condenado em diferentes penas parcelares, mas tão só no caso de concurso de penas e já não nos de sucessão de penas”, o que vale por dizer que não se verifica a existência de concurso de infrações quando a condenação por um dos crimes anteriormente praticados já transitou antes da prática do seguinte (cfr. Paulo Dá Mesquita, “O Concurso de Penas”, págs. 56-72).

Por acórdão de uniformização de jurisprudência (publicado no Diário da República n.° 111/2016, Série I, de 09-06-2016), o STJ fixou a seguinte jurisprudência: “O momento temporal a ter em conta para a verificação dos pressupostos do concurso de crimes, com conhecimento superveniente, é o do trânsito em julgado da primeira condenação por qualquer dos crimes em concurso”.

A competência material para o conhecimento superveniente do concurso é atribuída ao tribunal singular ou ao tribunal coletivo consoante os critérios substantivo-processuais definidos nos artigos 77.° e 78.°, ambos do Código Penal e artigos 14.°, 471.° e 472.°, todos do Código de Processo Penal.

2. Realização de cúmulo superveniente no caso concreto

Revertendo ao caso concreto sub judice verificamos que se impõe a realização de cúmulo das penas aplicadas ao arguido nos seguintes processos de natureza criminal:

- Processo Comum Coletivo n.° 71/19.6PFBRG, do Juízo Central Criminal de Braga - Juiz 3, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga (relativamente a factos praticados em 06/2019, com decisão condenatória datada de 25/10/2023, transitada em julgado em 24/11/2023), cfr. Ref. ......17;

- Processo Comum Coletivo n.° 1025/20.5JAAVR, do Juízo Central Criminal de Aveiro - Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro (relativamente a factos praticados em 24/12/2020, com decisão condenatória datada de 07/01/2022, transitada em julgado em 13/07/2022), cfr. Ref. ......46;

- Processo Comum Singular n.° 394/21.4PBAVR, do Juízo Local Criminal de Aveiro - Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro (relativamente a factos praticados em 02/05/2021, com decisão condenatória datada de 24/01/2024, transitada em julgado em 23/02/2024), cfr. Ref. ......50; e

- Processo Comum Singular n.° 42/19.2PEBRG, do Juízo Local Criminal de Braga - Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga (relativamente a factos praticados em 25/05/2019, com decisão condenatória datada de 15/10/2024, transitada em julgado em 14/11/2024), cfr. Ref. ......17.

Com efeito, compulsado o certificado do registo criminal do condenado AA e analisadas as decisões condenatórias proferidas nos autos supramencionados, no que para o que aqui importa, resulta que:

– Por acórdão proferido em 25/10/2023, transitado em julgado em 24/11/2023, nos autos de Processo Comum Coletivo n.° 71/19.6PFBRG, do Juízo Central Criminal de Braga - Juiz 3, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, foi o arguido AA condenado pela prática, em 06/2019, em coautoria material e na forma consumada, nos termos dos artigos 14.°, n.° 1 e 26.°, ambos do Código Penal, de 1 (um) crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, previsto e punido pelo artigo 25.°, al. a) do Decreto-Lei n.° 15/93, de 22 de Janeiro, por referência ao disposto no artigo 21.°, n.° 1 do mesmo diploma legal e à Tabela Anexa I-A e I-B, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão (efetiva), sendo-lhe perdoado a essa pena 1 ano de prisão nos termos da Lei n.° 38-A/2023, de 2 de agosto;

– Por acórdão proferido em 07/01/2022, transitado em julgado em 13/07/2022, nos autos de Processo Comum Coletivo n.° 1025/20.5JAAVR, do Juízo Central Criminal de Aveiro - Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, foi o arguido AA condenado pela prática, em 2020/12/24, em coautoria material e na forma consumada, de um crime de roubo agravado, previsto e punível nos termos do artigo 210.°, n.° 2, al. b), por referência ao artigo 204.°, n.° 2, alínea f), ambos do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão; pela prática, em 2020/12/24, em coautoria material e na forma consumada, de um crime de coação agravada, previsto e punível pelos artigos 154.°, n.° 1 e 155.°, n.° 1, al. a), ambos do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão; pela prática, em 2020/12/24, em coautoria material e na forma consumada, de um crime de detenção de arma proibida previsto e punível pelo artigo 86.°, n.° 1 al. c), da Lei n.° 5/2006, de 23/2, na pena de 2 (dois) anos de prisão. Em cúmulo jurídico foi o arguido AA condenado na pena única de 6 (seis) anos de prisão (efetiva), sendo perdoado a essa pena 1 (um) ano de prisão nos termos da Lei n.° 38-A/2023, de 2 de agosto;

– Por sentença proferida em 24/01/2024, transitada em julgado em 23/02/2024, nos autos de Processo Comum Singular n.° 394/21.4PBAVR, do Juízo Local Criminal de Aveiro - Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, foi o arguido AA condenado pela prática, em 02/05/2021, em autoria material e na forma continuada e consumada, de 1 (um) crime de evasão, previsto e punível pelo artigo 352.°, n.° 1 e 2 do Código Penal, na pena de 9 (nove) meses de prisão (efetiva); e

– Por sentença proferida em 15/10/2024, transitada em julgado em 14/11/2024, nos autos de Processo Comum Singular n.° 42/19.2PEBRG, do Juízo Local Criminal de Braga - Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, foi o arguido AA condenado pela prática, em 25/05/2019, em autoria material e na forma continuada e consumada, de 1 (um) roubo, previsto e punido pelo artigo 210.°, n.° 1, do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de prisão (efetiva).

Por outras palavras, no cúmulo jurídico superveniente ora a efetuar serão consideradas todas as penas parcelares (todas de prisão efetiva) proferidas nos autos supramencionados.

Tal como refere o acórdão do STJ de 04/01/2017, proc. n.° 6547/06.8SWLSB-H.L1.S1, “(...) V - Na realização de cúmulo jurídico por conhecimento superveniente há que desfazer os cúmulos intercalares entretanto feitos. VI - A pena conjunta visa corresponder ao sancionamento de um determinado trecho de vida do arguido condenado por pluralidade de infrações. VII - Há que valorar o ilícito global perpetrado, ponderando em conjunto a gravidade dos factos e a sua relacionação com a personalidade do recorrente, em todas as suas facetas. VIII - À fixação da pena conjunta deve presidir o respeito pelos princípios da proporcionalidade, da adequação e da proibição do excesso, tomando-se fundamental a necessidade de ponderação entre a gravidade do facto global e a gravidade da pena conjunta. (...) Ao integrar um novo cúmulo, os cúmulos anteriormente feitos não subsistem, são desfeitos, em ordem a refazer-se o novo cúmulo, readquirindo as penas parcelares autonomia, contribuindo com os factos sancionados por tais penas em conjugação com o que reflectem da personalidade do arguido para a imagem global presente na composição de nova pena única.”

Constatando-se a existência do circunstancialismo previsto no artigo 78.° do Código Penal, há então que efetuar o correspondente cúmulo jurídico.

Este Juízo Central Criminal de Braga do Tribunal Judicial da Comarca de Braga é o competente para o efeito (cfr. artigo 471.°, n.° 2 do Código de Processo Penal).

De acordo com o n.° 1, do artigo 40.°, do mesmo diploma legal, “a aplicação de penas e medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade”. A pena justifica-se sempre pela finalidade prosseguida, estando assim superadas, na atualidade, as conceções que faziam dela um fim em si mesmo.

Quanto às finalidades da punição, devemos ter em consideração quer razões de prevenção geral (considerada sob um ponto de vista de prevenção geral positiva para a tutela da confiança e das expectativas da comunidade na manutenção - ou mesmo reforço - da vigência da norma violada, conceito que decorre do princípio político-criminal básico da necessidade da pena - cfr. artigo 18.°, n.° 2 da Constituição da República Portuguesa -; que, in casu, são elevadas atento o número de crimes praticados nesta comarca contra os bens jurídicos em causa), quer razões de prevenção especial (que obedece à necessidade de reintegração do agente do crime na sociedade).

No dizer de Fernanda Palma (in “As Alterações Reformadoras da Parte Geral do Código Penal na Revisão de 1995: Desmantelamento, Reforço e Paralisia da Sociedade Punitiva”, nas “Jornadas sobre a Revisão do Código Penal”, ed. 1998, AAFDL, pág. 25), “a protecção de bens jurídicos implica a utilização da pena para dissuadir a prática de crimes pelos cidadãos (prevenção geral negativa), incentivar a convicção de que as normas penais são válidas e eficazes e aprofundar a consciência dos valores jurídicos por parte dos cidadãos (prevenção geral positiva). A protecção de bens jurídicos significa ainda prevenção especial como dissuasão do próprio delinquente potencial”. Em jeito de síntese, e como refere Figueiredo Dias (in “Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime”, Editorial Notícias, ed. 1993, pág. 214), “culpa e prevenção são assim os dois termos do binómio com auxílio do qual há-de ser construído o modelo da medida da pena (em sentido estrito ou de determinação concreta da pena)”.

O ordenamento jurídico-penal português assenta na conceção de que a pena privativa da liberdade deve constituir a ultima ratio da política criminal, utilizando as palavras de Figueiredo Dias, “em medida não facilmente ultrapassável no momento presente, aos princípios político criminais da necessidade, da proporcionalidade e da subsidiariedade da pena de prisão” (Jorge de Figueiredo Dias, “Direito penal português. Parte geral II. As consequências jurídicas do crime”, Aequitas Editorial Notícias, Coimbra, 1993, pág. 53).

Dentro dos limites consentidos pela prevenção geral positiva – entre o ponto ótimo e o ponto ainda comunitariamente suportável – podem e devem atuar pontos de vista de prevenção especial de socialização, sendo eles que vão determinar, em último termo, a medida da pena.

A determinação da medida concreta da pena será efetuada nos termos equacionados no artigo 71.°, n.° 1 do Código Penal, em função da culpa do agente - que constitui limite inultrapassável, nos termos do artigo 40.°, n.° 2 do Código Penal - e tendo ainda em conta as exigências de prevenção de futuros crimes, devendo o Tribunal atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor dele ou contra ele (nomeadamente: a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente; b) A intensidade do dolo ou da negligência; c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram; d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica; e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime; f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena – cfr. artigo 71.°, n.° 2 do Código Penal).

As exigências de prevenção geral apresentam-se de crucial importância nos tipos legais em causa, porquanto a verificação destes crimes é bastante frequente (i.e., de furto, de roubo e de coação), causando elevada inquietude social (considerando o elevado número dessa natureza que ocorrem no país e na presente comarca).

In casu, considerando agora os factos e a personalidade do arguido, nos termos do artigo 77.°, n.° 1 do Código Penal, importa salientar:

- o grau de ilicitude dos factos praticados pelo arguido e as exigências de prevenção especial são: elevadas (no Processo Comum Coletivo n.° 71/19.6PFBRG, considerando a concreta atuação do arguido, o modo, duração de execução da conduta ilícita, o método pouco sofisticado/ elaborado da conduta e as quantidades efetivamente traficadas e o tipo de estupefaciente); elevadas (no Processo Comum Coletivo n.° 1025/20.5JAAVR, considerando a concreta atuação do arguido, o modo, duração de execução das condutas ilícitas, o método pouco sofisticado/ elaborado das condutas e a circunstância nada ter feito para reparar o mal dos ilícitos praticados, concretamente, através da reparação moral ou patrimonial dos danos suportados pela vítima); elevadas (no Processo Comum Singular n.° 394/21.4PBAVR, considerando a concreta atuação do arguido, o modo, duração de execução da conduta ilícita, o método pouco sofisticado/ elaborado da conduta e a circunstância dos factos que haviam sido comunicados em sede de primeiro interrogatório se poder prever a imposição de pena de prisão efetiva, e, caso não se tivesse apresentado voluntariamente, poderia ter causado maior dano à autonomia funcional do Estado); medianas (no Processo Comum Singular n.° 42/19.2PEBRG, considerando a concreta atuação do arguido, o modo, duração de execução da conduta ilícita, o método pouco sofisticado/ elaborado da conduta, a circunstância de não terem resultado consequências físicas para a ofendida e o valor do objeto subtraído à sua legítima proprietária).

De atender à circunstância do arguido não estar bem inserido social e profissionalmente (cfr. relatório da DGRSP); e ao o dolo intenso (direto) que pautou as suas condutas.

Impõe-se agora encontrar uma pena única, cuja medida permita satisfazer as exigências de prevenção geral e especial que o caso e a personalidade do arguido reclamam, ou seja, considerando os factos e a personalidade do arguido, a ressonância ética que está associada aos factos ilícito-típicos, o impacto que os factos praticados produzem no universo das representações coletivas, a necessidade de acautelar as expetativas comunitárias na validade e vigência das normas violadas e a necessidade de ressocialização do arguido, seja suficiente e adequada, tendo sempre em conta ainda o teor do relatório social elaborado pela Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP).

De acordo com os critérios enunciados no n.° 2, do artigo 77.° do Código Penal, a pena de prisão a aplicar terá como limite máximo a soma das penas de prisão concretamente aplicadas aos vários crimes e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.

Assim, no caso concreto, o limite máximo será de 15 (quinze) anos e 7 (sete) meses de prisão (ou seja, a soma das seguintes penas de prisão: 2 anos e 6 meses + 4 anos e 6 meses + 2 anos e 6 meses + 2 anos + 9 meses + 3 anos e 4 meses) e o limite mínimo é a pena mais grave aplicada, que, no caso concreto, é de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão.

Tendo em consideração os fatores de determinação da medida da pena que já foram postos em evidência decide-se aplicar ao arguido AA a pena única de 8 (oito) anos e 3 (três) meses de prisão.

O arguido AA, nasceu a D/M/1997, ou, seja, tinha menos de 30 anos à data da prática dos factos em análise neste processo, no entanto nada temos a determinar nos termos da Lei n.° 38-A/2023, de 02/08 (lei que estabelece um perdão de penas e uma amnistia de infrações por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude), por falta de preenchimento no caso concreto dos pressupostos legais, uma vez que o artigo 3.º, n.º 1, da referida lei, estabelece que “Sem prejuízo do disposto no artigo 4.º, é perdoado 1 ano de prisão a todas as penas de prisão até 8 anos”, e no caso concreto foi aplicada pena única superior a oito anos de prisão.

3. Alega o recorrente, em sede de conclusões, o seguinte:

17-O Acórdão ora recorrido, e para cálculo da correspondente “única pena” (cujo limite mínimo é sempre a mais elevada das penas parcelares de prisão aplicadas e o limite máximo a soma de todas elas), o que se fez foi, “adicionar” à maior das penas parcelares de prisão uma “fracção” do somatório das demais penas, assim, no entender da aqui Recorrente, o que falhou na decisão do Tribunal “a quo”, foi precisamente a determinação dessa “fracção”, dado que, haveria que considerar em conjunto os factos constitutivos dos crimes que praticou e a personalidade do agente.

18-No Artº. 77 nº. 1 do Código Penal, na sua referida parte final, indica-se que “na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente”, ou seja, seria desejável para o recorrente, que a decisão tomada, não se imponha só em razão da autoridade do órgão que a tomou, mas acima de tudo pela sua racionalidade, não podendo a mesma fundamentação ser parca, ao ponto que não habilite um Tribunal Superior a uma avaliação cabal e segura do porquê da decisão e do seu suporte “lógico–mental”, pois só desta forma se asseguram as garantias constitucionais de defesa.

19-O acórdão recorrido, salvo melhor opinião, não contém uma enumeração suficiente dos factos que conduziram à aplicação da penas única aplicadas ao aqui Recorrente, e mais importante do que isso, o processo lógico que conduziu a essa pena e não outra

20-Seria desejável que o Tribunal “a quo”, pelo menos tivesse feito um comentário ao resumo sucinto desses factos, de forma a habilitar os destinatários do Acordão, incluindo o Tribunal Superior, a perceber qual a realidade concreta dos crimes anteriormente cometidos, cujo mero enunciado legal, em abstracto, não é bastante, como também deve descrever, os factos anteriormente provados que demonstrem qual a personalidade, modo de vida e inserção social do agente.

21-No caso presente, pelo Acórdão recorrido podemos saber o número dos crimes cometidos e o tempo decorrido, mas não sabemos qual a interpretação assacada pelo Tribunal “a quo”, da natureza e gravidade de cada um dos crimes, a qual, está apenas “adivinhada” pela exposição das penas parcelares respectivas.

22-Parece evidente também, que não foi efectuada uma exposição completa, ainda que concisa, dos motivos que fundamentam a decisão, mas isso sim e salvo melhor opinião, algumas expressões vazias de conteúdo, não permitindo uma correcta e segura avaliação global, quer da ilicitude dos factos, quer da personalidade do Arguido, que constituem pressuposto imprescindível da decisão sobre a medida de pena conjunta.

23-O arguido/recorrente já vai a caminho dos 5 anos de reclusão, já não será hoje a mesma pessoa que praticou todos os crimes pelos quais foi condenado, a menos que se duvide da eficácia da execução das penas.

24-Não se recorda a arguida aqui recorrente, de ter sido recentemente ouvido em elaboração de relatórios para que o Tribunal pudesse com segurança assim o classificar.

25-Desta forma, e dado o “deficit” de fundamentação, entende o recorrente que o Acórdão recorrido violou o disposto no n.º 1 do art.º 77.º do Código Penal e no n.º 2 do art.º 374.º do Código de Processo Penal, padecendo, assim, da nulidade (Acórdão do S.T.J, C.J, ano VIII, Tomo I – 2000, pag. 206) prevista no art.º 379º nº.1 alínea a) do referido Código de Processo Penal.

Nulidade esta, que não é insuprível, podendo ser arguida em recurso (Acórdãos para fixação de jurisprudência do S.T.J. de 1992/05/06, in D.R. de 1992/08/06 e de 1993/12/02, in DR de 1994/02/11).

4. Apreciando.

No que toca ao vício de insuficiente fundamentação, por violação do disposto no artº 374 nº2 e 379 nº1 al. a), ambos do C.P.Penal, que o recorrente invoca, este ocorrerá quando, com base no texto decisório, não sejam perceptíveis as razões de facto e/ou de direito que levaram o tribunal a decidir como decidiu.

Ora, lido o acórdão alvo de recurso, é manifesto não assistir razão ao recorrente, no que concerne ao vício que a este título lhe imputa. Na verdade, do mesmo constam todos os elementos necessários para que se possa proceder à análise das circunstâncias do caso, sendo igualmente perfeitamente compreensível o raciocínio lógico e os fundamentos que levaram o julgador a decidir como decidiu. E tanto assim é, que o próprio recorrente bem demonstra, ao longo do seu recurso, ter compreendido os fundamentos e as razões que levaram à elaboração do cúmulo jurídico, bem como as circunstâncias que foram atendidas para efeitos de determinação da pena única. Sucede apenas que com os mesmos não concorda, mas essa posição não enquadra qualquer vício, mas antes discórdia ao nível da eventual existência de erro de direito, que também invoca e que infra abordaremos.

Face ao que se deixa dito, mostra-se manifesto que inexiste a nulidade que o recorrente assaca ao decidido pelo que, nesta parte, deve o recurso improceder.

B. Perdão de penas em sede de cúmulo.

1. Invoca o recorrente, a este propósito, o seguinte:

1-No Acórdão de que se recorre, não foi efetuado o perdão de penas ao abrigo da Lei n.º 38-A/2023, de 2 Agosto, tudo, na razão de que, essa pena única foi superior ao limite legal dos 8 anos (artigo 3 nº.1 da Lei nº. 38-A/2023 de 2 de Agosto), ocorre que, incidiu sobre esse cúmulo jurídico de penas e, integraram esse mesmo cúmulo jurídico, penas parcelares perdoáveis e outras imperdoáveis.

2-As penas parcelares perdoáveis, tinham sido objecto de perdão nos seus autónomos processos, para o que, o Tribunal “a quo” fez total tábua raza, conforme se pode ler/entender da leitura do Acordão de que se recorre, designadamente, aquando da explicitação dos critérios enunciados no nº. 2 do Artº. 77 do Código Penal, para o que, na contagem do limite máximo, erradamente o mesmo fixa em 15 anos e 7 meses de prisão, quando, efectivamente deveria fixar-se o mesmo, nos 13 anos e 7 meses de prisão, tudo, obviamente com prejudicial consequência na pena única aplicável (8 anos e 3 meses) e, pasme-se também tornando essa mesma pena única, por superior a 8 anos, imperdoável ao abrigo do diploma aplicável.

3-No que tange a pena parcelares / única que vieram a compor o cúmulo jurídico de que ora se recorre, designadamente a pena de 2 anos e 6 meses (Processo Comum Colectivo nº. 71/19. 6 PFBRG – Juízo Central Criminal de Braga – Juiz 3) e, a de 6 anos (Processo Comum Colectivo nº. 1025/20. 5 JAAVR – Juízo Central Criminal de Aveiro – Juiz 1 – cúmulo entre pena de 4 anos e 6 meses, 2 anos e 6 meses e 2 anos) em que estão pois em causa penas parcelares relativos a crimes perdoáveis, o Tribunal “a quo”, o que fez, mal sublinhe-se, foi “anular” os perdões já nesses processos efectivados e, contabilizar para efeito do cúmulo a efectuar, essas penas sem o desconto do perdão.

4-A exclusão do perdão quanto a alguns crimes que compõem o cúmulo, designadamente, as penas penas parcelares de 9 meses (Processo 394/21.4 PBAVR – Juízo Local Criminal de Aveiro – Juiz 1) e, de 3 anos e 4 meses (Processo 42/19. 2 PEBRG – juízo Local Criminal de Braga – Juiz 2), não prejudica a aplicação deste quanto a outros crimes que compõem esse mesmo cúmulo, tudo o que, ocorreu no Acordão de que se recorre.

5-O perdão previsto no artigo 3º desta lei, em caso de condenação em cúmulo jurídico, incide sobre a pena única (artigo 3º, nº 4 da lei em referência) e, apenas pode ser aplicada à pena única, mas apenas se todos os crimes forem perdoáveis, pois que, se um dos crimes que integrar a pena única, não for perdoável há que desfazer o cúmulo jurídico e aplicar o perdão às penas perdoáveis deixando de fora (e intocadas) as penas imperdoáveis.

6-Na efectivação do cúmulo “in casu” efectuado, por forma a aplicar o perdão, o Tribunal “a quo” deveria ter considerado as penas perdoáveis, mantendo as imperdoáveis intocadas, assim não o tendo feito, prejudicou duplamente o aqui Recorrente, pois que, não tendo aplicado o perdão nas penas perdoáveis, as quais, pasme-se, já tinham sido objecto desse mesmo perdão, tornou o limite máximo do cúmulo efetuado substancialemente mais alto, que resultou numa pena única não perdoável, por superior ao limite dos 8 anos de prisão.

7-Conjugados todos os normativos legais aplicáveis, outra conclusão não pode extrair-se senão a de que o perdão incide única e exclusivamente sobre a pena única quando esta é composta exclusivamente por penas parcelares que beneficiam do perdão, tudo o que, não ocorreu na situação em apreciação neste Acórdão de que se recorre, impondo-se pois desfazer o cúmulo jurídico efectuado e, aplicar efectivamente o perdão às penas perdoáveis (como aliás já tinham sido objecto nos processos das respectivas condenações), deixando intocáveis as não perdoáveis, daí se partindo sim, para a efectivação de uma pena única de acordo com os critérios enunciados no nº. 2 do Artigo 77 do Código Penal Português.

8-O “quantum“ da penas unitária aplicada (8 anos e 3 meses de prisão), na modesta opinião do ora Recorrente é injusta demasiadamente penalizante, Desde logo, quando no ponto último de chegada desse mesmo cúmulo jurídico efectuado (limite máximo aplicável), respeitando os critérios enunciados no nº. 2 do Artº. 77 do Código Penal, ás mesmas penas parcelares perdoáveis que tinham sido objecto de perdão nos seus autónomos processos (para o que o Tribunal “a quo” fez total tábua raza), foi-lhes retirado esse perdão (como no ponto anterior se explanou, num total de 2 anos) aquando da “busca” do limite máximo aplicável, para o que, na contagem do limite máximo, erradamente o mesmo fixa em 15 anos e 7 meses de prisão, quando, efectivamente deveria fixar-se o mesmo, nos 13 anos e 7 meses de prisão, tudo, obviamente com prejudicial consequência na pena única aplicável (8 anos e 3 meses) e, pasme-se também tornando essa mesma pena única, por superior a 8 anos, imperdoável ao abrigo do diploma aplicável.

9-No que tange a pena parcelares / única que vieram a compor o cúmulo jurídico de que ora se recorre, designadamente a pena de 2 anos e 6 meses (Processo Comum Colectivo nº. 71/19. 6 PFBRG – Juízo Central Criminal de Braga – Juiz 3) e, a de 6 anos (Processo Comum Colectivo nº. 1025/20. 5 JAAVR – Juízo Central Criminal de Aveiro – Juiz 1 – cúmulo entre pena de 4 anos e 6 meses, 2 anos e 6 meses e 2 anos) em que estão pois em causa penas parcelares relativos a crimes perdoáveis, o Tribunal “a quo”, o que fez, mal sublinhe-se, foi “anular” os perdões já nesses processos efectivados e, contabilizar para efeito do cúmulo a efectuar, essas penas sem o desconto do perdão.

2. Apreciando.

Tanto quanto nos é perceptível, entende o recorrente que o tribunal “a quo” deveria ter mantido os perdões que foram concedidos, relativamente a penas agora também incluídas no presente cúmulo jurídico, perdões esses que foram declarados em anteriores cúmulos, agora desfeitos.

Desde logo e salvo o devido respeito, não explica o recorrente a matemática da operação; isto é, como é que propõe que se processe a consideração de tais perdões, que seriam apenas aplicáveis a parte das condenações incluídas no presente cúmulo jurídico, em que existem, igualmente, penas parcelares que se não mostram abrangidas pela Lei n.º 38-A/2023 como, aliás, o próprio admite (atenta a circunstância de, dada a natureza do ilícito, se mostrarem excluídas do âmbito de aplicação do perdão previsto em tal normativo legal).

Todavia, essa é questão que, efectivamente, se mostra há muito tratada, a propósito de amnistias anteriores, que apresentavam situações similares.

E, adianta-se desde já, há efectivamente modo de proceder a tal cálculo, no caso de concurso de penas sujeitas e não sujeitas a perdão, quando se elabora um cúmulo jurídico, pelo que, em tese, até assistiria razão ao recorrente (embora não com base nos argumentos que aduz), quando defende a aplicação de tal Lei, no âmbito do presente processo.

Sucede, todavia, que no caso que ora nos ocupa, a aplicação do perdão se mostra afastada, não pela impossibilidade de cálculo do mesmo, em relação às penas em que a Lei n.º 38-A/2023 é aplicável, mas tão somente pela circunstância de a pena imposta em cúmulo jurídico ser superior a 8 anos de prisão.

3. Vejamos então.

O disposto na Lei nº 38-A/23, de 2 de Agosto é aplicável a algumas das penas parcelares pelas quais o arguido foi condenado, incluídas neste recurso, designadamente aquelas que o recorrente refere e outras não o são.

Quanto a este ponto, o recorrente mostra-se de acordo com a decisão proferida.

Todavia, o mesmo já não sucede quanto ao modo como deve ser aplicado tal perdão, previsto no artº 3º de tal lei.

Aí se estipula que (1) é perdoado 1 ano de prisão a todas as penas de prisão até 8 anos, bem como que, (4) em caso de condenação em cúmulo jurídico, o perdão incide sobre a pena única.

Ora, sendo alguns dos crimes em concurso passíveis de perdão de penas, mas o mesmo não sucedendo com os restantes, há que proceder à aplicação conciliadora de tais normativos legais.

4. Este problema surgiu já anteriormente, no âmbito de outras leis da amnistia, designadamente da Lei nº 29/99, de 12 de Maio, uma vez que o seu artº 1º nº4 igualmente estipulava a aplicação do perdão à pena única, em caso de cúmulo jurídico e nesse diploma vinham identicamente consignadas excepções à aplicação de tal perdão, atendendo quer a condições subjectivas, quer objectivas (tipos de ilícitos praticados).

Perfilaram-se então, em termos jurisprudenciais, várias soluções jurídicas, tendo em vista a conciliação, por um lado, da admissibilidade de perdão em relação a um ou mais crimes englobados em cúmulo jurídico – que implicava a forçosa necessidade de aplicar tal benefício ao condenado – e, por outro, da proibição da sua aplicação aos restantes ilícitos, excluídos de tal benesse, como nos dá conta Pedro José Esteves de Brito, in Notas práticas referentes à Lei n.º 38-A/20023, de 2 de Agosto, que estabelece um perdão de penas e uma amnistia de infrações por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude, Julgar Online, Agosto de 2023, nº 52, ponto 10:

10. Do perdão em caso de condenação em cúmulo jurídico de penas (n.º 4):

A partir da Lei n.º 16/86, de 11 de junho, nas várias leis de amnistia e perdão, sempre foi estipulado que, em caso de cúmulo jurídico, o perdão incide sobre a pena única e não sobre as penas parcelares24. No entanto, relativamente aos cúmulos jurídicos englobando várias penas, em que umas beneficiam do perdão e outras não, as soluções foram variando ao longo do tempo. Inicialmente efetuava-se um cúmulo jurídico das penas parcelares abrangidas pelo perdão e calculava-se a respetiva pena única, a que se aplicava o perdão a que houvesse lugar e, depois, realizava-se outro cúmulo jurídico com o remanescente daquela pena única e todas as outras penas parcelares que não beneficiavam do perdão. Posteriormente, uma corrente jurisprudencial foi-se formando em sentido diferente até se tornar maioritária, senão unânime. Segundo a mesma efetuava-se um cúmulo jurídico das penas parcelares perdoáveis, segundo as regras dos arts. 77.º e 78.º do C.P. (cúmulo parcial) só para o efeito de calcular a extensão do perdão (em relação à pena encontrada25) e, seguidamente, cumulavam-se juridicamente, levando sempre em conta aquelas regras, todas as penas parcelares que faziam parte do concurso de crimes, quer as perdoáveis, quer as não abrangidas pelo perdão, e determinava-se a pena única, sobre a qual incidiria o perdão. Na verdade, num cúmulo jurídico de penas, só devem ser englobadas penas parcelares e não penas que tenham sido construídas já a partir de uma operação de cúmulo, e o perdão deve incidir sobre a pena única obtida a partir do cúmulo jurídico de todas as penas parcelares26. 11.

24 “O perdão referido no n.º 1 abrange as penas de prisão fixadas em alternativa a penas de multa e, em caso de cúmulo jurídico, incide sobre a pena unitária, sendo materialmente adicionável a perdões anteriores.” (cfr. art.º 13.º, n.º 2, da Lei n.º 16/86, de 11 de junho); “O perdão referido nas alíneas a) e b) do n.º 1 abrange as penas de prisão fixadas em alternativa a penas de multa e, em caso de cúmulo jurídico, incide sobre a pena unitária, sendo materialmente adicionável a perdões anteriores” (cfr. art.º 14.º, n.º 3, da Lei n.º 23/91, de 04 de julho); “Em caso de cúmulo jurídico, o perdão incide sobre a pena única e é materialmente adicionável a perdões anteriores, sem prejuízo do disposto no artigo 10.º” (cfr. art.º 8.º, n.º 4, da Lei n.º 15/94, de 11 de maio); e “Em caso de cúmulo jurídico, o perdão incide sobre a pena única e é materialmente adicionável a perdões anteriores, sem prejuízo do disposto no artigo 3.º” (cfr. art.º 1.º, n.º 4, da Lei n.º 29/99, de 12 de maio); e

“O perdão referido nos números anteriores abrange a prisão subsidiária resultante da conversão da pena de multa e a execução da pena de prisão por não cumprimento da pena de multa de substituição e, em caso de cúmulo jurídico, incide sobre a pena única” (cfr. art.º 2.º, n.º 3, da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril).

25 Na verdade, ao contrário da Lei em análise, a medida do perdão das penas de prisão na Lei n.º 16/86, de 11 de junho (cfr. art.º 13.º, n.º 1, al. b), na Lei n.º 23/91, de 04 de julho (cfr. art.º 14.º, n.º 1, al. b), na Lei n.º 15/94, de 11 de maio (cfr. art.º 8.º, n.º 1, al. d) e na Lei n.º 29/99, de 12 de maio (cfr. art.º 1.º, n.º 1) era variável em função da medida concreta da pena de prisão aplicada.

5. Como se mostra defendido no acórdão do STJ, de 24-10-2006 processo 06P2941, nº convencional JSTJ000, relator Santos Carvalho, nº do documento SJ200610240029415 (acessível em www.dgsi.pt):

II - Para proceder ao cúmulo jurídico de penas em concurso de infracções quando só algumas beneficiam de perdão, há que seguir estes passos:

- 1.° efectua-se o cúmulo jurídico de todas as penas em concurso, independentemente de alguma delas beneficiarem de perdão e, assim, obtém-se a pena única;

- 2.° calcula-se o perdão, após se ficcionar um cúmulo jurídico parcelar das penas que por ele estão abrangidas;

- 3.° faz-se incidir o perdão assim calculado sobre a pena única inicial, mas o perdão tem como limite máximo a soma das parcelas das penas "perdoáveis", tal como encontradas na operação de cálculo dessa pena única inicial.

III - Rejeita-se, assim, a fórmula que há anos era a jurisprudencialmente consagrada: na situação apontada, havendo que cumular penas abrangidas por perdão com penas por ele não abrangidas, entendia-se que haveria que efectuar um cúmulo jurídico provisório das penas.

abrangidas pelo perdão, aplicar o perdão à pena única parcelar provisória e, depois, efectuar o cúmulo final entre o remanescente desta e as restantes penas não abrangidas pelo perdão.

IV - Ora, esta fórmula é passível, pelo menos, de duas críticas pertinentes:

- por um lado, dela resulta uma dupla compressão injustificada de certas penas. Como se sabe, para a formação de um cúmulo jurídico, todas as penas, com excepção da mais grave, sofrem uma determinada compressão, maior ou menor consoante a ponderação que é feita dos factos e da personalidade do agente, visto que, em regra, não é aplicada a pena máxima do concurso (a soma material de todas as penas). Daí decorre que na fórmula em apreço há uma primeira compressão na formação do cúmulo jurídico provisório para calcular o perdão e uma segunda no cúmulo jurídico definitivo. E, como facilmente se percebe, é uma dupla compressão injustificada, pois há só um cúmulo jurídico real, já que o outro é meramente ficcionado tendo em vista o cálculo do perdão;

- a outra crítica é a de que, com este método, o perdão fica diluído e não transparece na pena única definitiva, pelo que, por um lado, o arguido mal se apercebe de que beneficiou de um perdão no meio das contas do cúmulo, por outro, não se sabe ao certo que desconto efectivo foi feito na pena única final, por fim, perde-se o efeito dissuasor da condição resolutiva a que está sujeito o perdão (art. 4.º da Lei 29/99).

6. Explicita no seu texto, tal acórdão, o raciocínio e mecanismo de realização desse cúmulo, nos seguintes termos:

Como proceder ao cúmulo jurídico de penas num concurso de infracções quando só algumas delas beneficiam de perdão?

Como se sabe, o perdão das penas por crimes em concurso incide sobre a pena única (art.º 1.º, n.º 4, da Lei n.º 29/99, de 12 de Maio). Por isso, não se pode aplicar o perdão a cada uma das penas parcelares abrangidas pela lei, mas também não se pode fazê-lo sobre a pena única, visto nela concorrerem crimes que não foram abarcados pelo perdão.

Para resolver este problema, cuja solução não decorre apenas da lei, o tribunal recorrido socorreu-se da fórmula que há uns anos era a jurisprudencialmente consagrada, que consiste em efectuar um cúmulo jurídico provisório das penas abrangidas pelo perdão, aplicar o perdão à pena única parcelar provisória e, depois, efectuar o cúmulo final entre o remanescente desta e as restantes penas não abrangidas pelo perdão.

Ora, esta fórmula é passível, pelo menos, de duas críticas pertinentes.

Por um lado, dela resulta uma dupla compressão injustificada de certas penas. Como se sabe, para a formação de um cúmulo jurídico, todas as penas, com excepção da mais grave, sofrem uma determinada compressão, maior ou menor consoante a ponderação que é feita dos factos e da personalidade do agente, visto que, em regra, não é aplicada a pena máxima do concurso (a soma material de todas as penas). Daí decorre que na fórmula em apreço há uma primeira compressão na formação do cúmulo jurídico provisório para calcular o perdão e uma segunda no cúmulo jurídico definitivo. E, como facilmente se percebe, é uma dupla compressão injustificada, pois há só um cúmulo jurídico real, já que o outro é meramente ficcionado tendo em vista o cálculo do perdão.

A outra crítica é a de que, com este método, o perdão fica diluído e não transparece na pena única definitiva, pelo que, por um lado, o arguido mal se apercebe de que beneficiou de um perdão no meio das contas do cúmulo, por outro, não se sabe ao certo que desconto efectivo foi feito na pena única final, por fim, perde-se o efeito dissuasor da condição resolutiva a que está sujeito o perdão (art.º 4.º da Lei 29/99).

Daí que tenha surgido uma outra corrente jurisprudencial, cujo método consiste em começar por fazer o cúmulo jurídico de todas as penas em concurso para assim obter a pena única, independentemente do perdão. Depois e tão só para cálculo do perdão, efectua-se um cúmulo jurídico parcelar das penas que beneficiam do perdão. Finalmente, incide-se o perdão assim calculado sobre a pena única que se formou inicialmente.

Esta solução contorna totalmente as críticas apontadas ao primeiro método e, portanto, é a que consideramos preferível. Mas há que lhe estabelecer um limite.

É que, sendo o cúmulo jurídico formado por uma soma entre a pena mais elevada e parcelas de cada uma das penas restantes, a aplicação do perdão feita nestes moldes pode levar a que o perdão beneficie também as parcelas das penas que legalmente por ele não estão abrangidas, o que sucederá quando, nessa operação, a soma das parcelas das penas “perdoáveis” for inferior ao montante do perdão.

Um simples exemplo ajuda a compreender esta situação. Se o cúmulo abrange três penas de um ano de prisão, das quais só duas beneficiam de perdão, a pena única será, por hipótese, de 1 ano e 8 meses de prisão (somando-se à pena mais grave um terço da soma das restantes). Para cálculo do perdão, obtém-se uma pena única parcelar das penas perdoáveis, com o mesmo critério, de 1 ano e 4 meses de prisão, pelo que o perdão será fixado em um ano de prisão. Fazendo incidir este perdão sobre a pena única inicial, o arguido terá de cumprir um remanescente de 8 meses de prisão, o qual é inferior à pena parcelar não perdoada e inferior mesmo ao limite mínimo abstracto do cúmulo, que é o da pena mais grave (um ano de prisão, não perdoado). Chegamos a um resultado que contraria a lei que concedeu o perdão de penas e também o art.º 77.º, n.º 2, do CP.

Daí que se possa concluir que, para proceder ao cúmulo jurídico de penas em concurso de infracções quando só algumas beneficiam de perdão, há que seguir estes passos:

1º- efectua-se o cúmulo jurídico de todas as penas em concurso, independentemente de alguma delas beneficiarem de perdão e, assim, obtém-se a pena única;

2º- calcula-se o perdão, após se ficcionar um cúmulo jurídico parcelar das penas que por ele estão abrangidas;

3º- faz-se incidir o perdão assim calculado sobre a pena única inicial, mas o perdão tem como limite máximo a soma das parcelas das penas “perdoáveis”, tal como encontradas na operação de cálculo dessa pena única inicial.

No exemplo anterior, o limite máximo do perdão seria de 8 meses de prisão, correspondente ao “peso” que tiveram as penas que beneficiavam de perdão na formação da pena única. Portanto, o arguido, em tal exemplo, seria condenado na pena única de 1 ano e 8 meses de prisão, da qual se descontaria o perdão de 8 meses.

O cúmulo jurídico das penas em que foi condenado o recorrente varia entre 4 anos (pena parcelar mais grave) e 9 anos (soma de todas as penas parcelares), conforme dispõe o art.º 77.º, n.º 2, do CP.

Na formação da pena única têm de se avaliar, em conjunto, os factos e a personalidade do arguido.

O tribunal recorrido usou de um critério excessivo, já que na operação do cúmulo foi somada à pena mais grave mais de metade da soma das restantes penas.

Ora, sendo o arguido delinquente primário e inserido socialmente, tendo decorrido entretanto mais de 7 anos sem registo de outra actividade criminosa, é de admitir que os crimes que cometeu foram fruto de circunstâncias quiçá irrepetíveis, pelo que se considera mais ajustado fixar a pena única em 5 anos, acrescentando-se à pena mais alta (quatro anos) um quinto da soma das restantes penas(1/5 de 5 anos = 1 ano), o que está mais de acordo com os critérios que este STJ tem seguido em casos semelhantes (2).

As duas penas abrangidas pelo perdão são de um ano e meio e de um ano, pelo que em cúmulo, usando o mesmo critério, formariam a pena única de 1 ano e 8 meses e 12 dias de prisão, sobre o qual incidiria o perdão de 1 ano, nos termos do artigo 1º, nº 1, da Lei nº 29/99, de 12/05. Contudo, como as duas penas somaram, aquando da formação do cúmulo de todas as penas, a parcela global de 6 meses (1/5 de 2 anos e 6 meses = 6 meses), é este o montante do perdão aplicável.

Termos em que o recurso merece provimento parcial.

7. Seguindo esta linha de raciocínio, que anteriormente perfilhámos, a propósito da questão suscitada no âmbito da dita Lei nº 29/99 e da qual não vislumbramos razões para divergir, na aplicação da actual lei da amnistia, temos que, em tese, haveria que proceder a um cúmulo ficcionado, entre penas parcelares incluídas no perdão, alcançar-se uma pena única e, consoante o seu quantum, determinar-se o perdão final que haveria de aplicar.

De seguida, proceder-se-ia ao cúmulo de todas as penas em concurso (incluindo as que haviam sido consideradas para o ficcionado cúmulo parcelar, pois este teria servido apenas para a obtenção do quantum de perdão a aplicar a final) e sobre a pena única alcançada, far-se-ia a aplicação do perdão, sendo que o máximo legal corresponderia a um ano.

Sucede, todavia, que no caso presente, em se mantendo inalterada a pena única fixada pelo tribunal “a quo”, essa operação ficcionada de apuramento do perdão a aplicar a final, acabaria por redundar num acto inútil, pela singela razão de que a Lei n.º 38-A/2023 impõe, como limite para a aplicação de tal medida de clemência, que a pena única imposta não exceda os 8 anos de prisão.

8. Ora, e ao contrário do que o recorrente parece querer defender, esse limite é imperativo e aplica-se em todo e qualquer caso, em que se tenha de ponderar a aplicação de perdão, ao abrigo de tal previsão legal.

Efectivamente, é indiferente (porque a lei o não distingue ou excepciona), se todas as penas que se mostram incluídas em cúmulo jurídico, se mostram abrangidas pela Lei da Amnistia ou se apenas em relação a algumas tal sucede.

O limite legal de aplicação do perdão é sempre o mesmo – a pena única não pode exceder os 8 anos de prisão.

E bem se entende que assim seja.

De facto, o limite de 8 anos aplica-se quer todas as penas incluídas no cúmulo jurídico se mostrem abrangidas pela Lei da Amnistia, quer apenas algumas delas o sejam. Seria, aliás, um contra-senso jurídico defender-se que, pela circunstância de o arguido ter cometido crimes que nem sequer se mostram incluídos na Lei da Amnistia, daí resultaria, para si, um tratamento mais favorável (por inexistência, neste caso, do limite de 8 anos) do que no caso de um agente, cujos ilícitos por si praticados se mostrariam integralmente abrangidos na dita lei de clemência e que, sendo-lhe imposta uma pena superior a 8 anos de prisão, não poderia ter direito à aplicação de tal perdão.

Não só seria ilógico, como violador do princípio da igualdade como, em bom rigor, contrário à imperatividade, sem excepções, que o legislador claramente expressou na Lei n.º 38-A/2023; isto é, o que resulta da lei, de modo claro, é que o legislador não quis possibilitar a possibilidade de aplicação de perdão, em relação a penas superiores a 8 anos de prisão, sejam elas penas singulares ou penas únicas, obtidas em cúmulo jurídico, integralmente abrangidas no escopo da dita lei ou apenas em parte.

Não existe qualquer suporte legislativo que permita outro tipo de interpretação, sendo certo que, para além do mais, as leis de amnistia não comportam nem analogia, nem interpretação extensiva.

9. Temos, pois, em síntese final, que embora em tese assista razão ao arguido, quando defende a possibilidade teórica de lhe ser aplicado perdão de penas, no que toca a algumas das suas condenações, a verdade é que apenas haverá que apurar o seu quantum, no caso de se vir a entender que a pena única imposta se mostra - como o recorrente defende – excessiva e, como tal, deve ser reduzida, concluindo-se pela aplicação de uma pena inferior a 8 anos de prisão.

Assim, apenas após procedermos à análise de tal questão (a que nos dedicaremos infra, de seguida), poderemos concluir, em definitivo, pela aplicação ou não, ao caso presente, do perdão previsto na Lei n.º 38-A/2023.

C. Errada dosimetria da pena única.

1. O recorrente apresenta, a este respeito, as seguintes conclusões:

10- Não obstante toda a factualidade criminal apurada, patente até nas certidões judiciais juntas aos presentes autos com vista à elaboração do competente cúmulo, a pena única aplicada ao aqui Recorrente no douto Acórdão recorrido, não deixam de ser “per si” excessivamente penalizante, não tendo tido o Tribunal “a quo” em conta, desde logo, a própria degradação de “valores” existentes em grande parte dos Estabelecimentos Prisionais em Portugal (autênticas escolas do crime), que também infelizmente explica, as fortes taxas de reincidência existentes, não esquecendo que tal também contribui para o excesso da população prisional, tudo o que, por certo, sublinhe-se, em nada irá contribuir para a sua desejada ressocialização.

11-O aqui recorrente aquando do cometimento dos mesmos, encontrava-se no limiar da sua maturidade.

12-Não se descura que será necessário ter em conta que do outro lado da balança estão os interesses fundamentais de uma comunidade, no entanto, com facilidade essa mesma comunidade entenderia perfeitamente, que mesmo sendo previstas penas efectivas de prisão, estas, na sua aplicação poderiam e/ou deveriam ter sido bem mais atenuadas, tendo o Tribunal “a quo”, em demasia se preocupado com a protecção dos bens jurídicos em geral, descurando sobremaneira, a já aqui referenciada e importante reintegração da ora recorrente na sociedade.

13-Seria de evitar uma reclusão desnecessariamente grande e, atenuar-se as penas aquando da operação do cúmulo jurídico, de forma a aproximá-las mais dos seus limites mínimos (4 anos e 6 meses), não se vendo que com isso, de alguma forma o Tribunal “a quo”, estivesse a desrespeitar toda(s) e/ou quaisquer, exigências de prevenção especial e/ou geral (no que respeita aos crimes cometidos).

14-São imensos os pressupostos que se devem considerar reunidos no caso em apreço, para na determinação das medida da pena, optar-se por uma eventual atenuação que, venha a resultar em que a penas única a cumprir, de forma alguma possa ultrapassar os 6 anos de prisão, ademais, e tendo como perspectiva a ressocialização do ora Recorrente, tudo deveria tratar-se de um dever a que o tribunal de forma alguma poderia sequer subtrair-se, dado “in casu”, existirem circunstancialismos prático-processuais especiais, que deveriam conduzir a uma acentuada diminuição da utilidade e necessidade das penas.

15-O ora Recorrente praticou todos os seus crimes num período relativamente curto da sua estadia vivencial e, é a primeira vez que se encontra recluído.

Acresce que,

16-Dada a pendência processual a “conta gotas” a que o Arguido foi sendo julgado nos seus diferentes processos e, só agora possa ver a sua situação processual estabilizada, que fez com que, o mesmo vá já a caminho dos 5 anos de reclusão, sem ter usufruído de uma única medida de flexibilização da sua pena, designadamente saídas jurisdicionais, tudo o que, tem tornada a sua pena, e torna, ainda mais penalizante, não sendo hoje certamente a mesma pessoa que praticou todos os crimes pelos quais foi condenado, a menos que se duvide da eficácia da execução das penas.

17-O Acórdão ora recorrido, e para cálculo da correspondente “única pena” (cujo limite mínimo é sempre a mais elevada das penas parcelares de prisão aplicadas e o limite máximo a soma de todas elas), o que se fez foi, “adicionar” à maior das penas parcelares de prisão uma “fracção” do somatório das demais penas, assim, no entender da aqui Recorrente, o que falhou na decisão do Tribunal “a quo”, foi precisamente a determinação dessa “fracção”, dado que, haveria que considerar em conjunto os factos constitutivos dos crimes que praticou e a personalidade do agente.

2. Apreciando.

A este respeito, o recorrente assenta a sua discórdia quanto ao decidido, no que toca à dosimetria da pena única imposta, que considera excessiva, essencialmente nas seguintes razões:

- a degradação de “valores” existentes em grande parte dos Estabelecimentos Prisionais em Portugal (autênticas escolas do crime), que também infelizmente explica, as fortes taxas de reincidência existentes, em nada irá contribuir para a sua desejada ressocialização, factor que o tribunal “a quo” desconsiderou;

- o arguido encontrava-se, à data da prática dos crimes, no limiar da sua maturidade;

- o arguido praticou todos os seus crimes num período relativamente curto da sua estadia vivencial e, é a primeira vez que se encontra recluído;

- dada a pendência processual a “conta gotas” a que o arguido foi sendo julgado nos seus diferentes processos, só agora viu a sua situação processual estabilizada, estando já a caminho dos 5 anos de reclusão, sem ter usufruído de uma única medida de flexibilização da sua pena, designadamente saídas jurisdicionais;

Assim, pese embora as fortes exigências a nível de prevenção geral, o mesmo se não pode já afirmar no que toca à prevenção especial.

Por todas estas razões, peticiona a aplicação de uma pena de 4 anos e 6 meses ou, no limite nunca superior a 6 anos de prisão.

2. Vejamos então.

Cabe começar por realçar que, a respeito da determinação da pena (seja esta a pena parcelar ou única), rege o princípio da pessoalidade. Tal princípio impõe que a pena seja aplicada de um modo individualizado, tendo em conta a situação pessoal, económica, social específica da pessoa visada, bem como a apreciação crítica de todo o seu circunstancialismo actuativo. Assim, a pessoalidade e individualização da pena são uma consequência do princípio da culpa e valem para qualquer sanção penal.

As penas devem ser impostas atendendo a três vértices fundamentais, designadamente:

- adequação - a pena deve ser apropriada para atingir os fins pretendidos pela lei, como prevenção, repressão ou ressocialização;

- necessidade - a opção punitiva deverá recair pela medida menos gravosa que ainda seja capaz de atingir o objectivo pretendido;

- e proporcionalidade - que constitui um limite ao poder punitivo do Estado, protegendo a dignidade humana e os direitos fundamentais do próprio arguido.

Assim, a pena deve ser proporcional ao mal causado pelo crime, mas não pode exceder a culpa do agente.

Importa igualmente atender às exigências de prevenção geral e especial, que regem igualmente os fins das penas.

Na prevenção geral utiliza-se a pena para dissuadir a prática de crimes pelos cidadãos - prevenção geral negativa – e para incentivar a convicção na sociedade, de que as normas penais são válidas, eficazes e devem ser cumpridas, – prevenção geral positiva.

Na prevenção especial, a pena é utilizada no intuito de dissuadir o próprio delinquente de praticar novos crimes e com o fim de auxiliar a sua reintegração na sociedade.

3 Na determinação da pena única haverá que atender-se ao conjunto dos factos dados como provados, pois estes fornecem o quadro que permite avaliar a gravidade do ilícito global cometido, mostrando-se especialmente valiosa para a sua apreciação a verificação de qual o tipo de conexão que ocorre entre os factos concorrentes.

No que se refere à avaliação da personalidade do agente, esta deve debruçar-se sobre se, face ao conjunto dos factos praticados, estaremos perante uma tendência criminosa ou tão-só, perante uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade. Esta distinção tem revelo porque, no primeiro caso, terá de se considerar que o cometimento de uma pluralidade de crimes constitui uma agravante em sede da moldura penal conjunta.

Como refere Souto Moura (A jurisprudência do STJ sobre Fundamentação e Critérios de Escolha e Medida da Pena, comunicação proferida em acção de formação do CEJ que teve lugar na Faculdade de Direito do Porto em 4 de Março de 2011, acessível em www.stj.pt/ficheiros/estudos), a propósito da pena conjunta aplicável ao concurso de crimes, ponderar em conjunto os factos é atender, fundamentalmente, à ilicitude global de toda a conduta do agente em análise (….) A conexão entre os factos, e a abordagem destes, independentemente de quem os praticou, releva sobretudo para efeitos de prevenção geral. A gravidade dos vários crimes cometidos, a frequência com que eles ocorrem na comunidade e o próprio impacto que têm nessa comunidade, terão, pois, que ser tidos em conta.

4. Temos pois, em breve síntese, que a pena a impor deverá, por um lado, atender à tutela dos bens jurídicos, na medida do possível à reinserção do agente na comunidade e o seu limite mostra-se tabelado pela culpa do agente (artº 40 do C.Penal), o que bem se entende, uma vez que qualquer pena corresponde a uma sanção, uma acção punitiva do Estado, que se tem de revelar adequada, necessária e proporcional.

E a baliza máxima da culpa, referida pelo legislador, não tendo por fim a imposição de um mal ou sofrimento equivalente ao mal cometido ou sofrimento causado (como refere o Prof. Cavaleiro de Ferreira, in Direito Penal Português, II, Lisboa, 1982, pgs. 309 e 310), é, todavia, a expressão de que a punição que o Estado pode impor a um seu cidadão, não pode exceder a própria culpa com que este actuou.

A entender-se de outro modo – isto é, que outros fins das penas, designadamente a nível de prevenção geral ou especial, se sobrepusessem a esse limite máximo de culpa própria – estar-se-ia a viabilizar que, por eventual pressão societária, se mostrasse possível cercear um direito fundamental do cidadão, o direito à liberdade, sem imposição de um limite constitucional e ético, dentro dos padrões que regem a nossa vida em sociedade; isto é, viabilizar-se-ia a imposição de uma sanção, que tem um efeito punitivo associado, já que restringe os direitos consagrados no nº1 do artº 27 da CRP, desproporcional à culpa com a qual o agente actuou.

5. De facto e em última análise, é a existência de culpa geradora de um comportamento violador de um bem juridicamente tutelado, em sede criminal – manifeste-se esta na forma de dolo ou de negligência – que viabiliza, que legitima, num estado de direito, que o Estado possa assumir um direito punitivo sobre um seu cidadão.

Esse direito punitivo assume a característica de uma sanção, de uma pena, cujo cumprimento forçado é imposto ao agente causador de um mal, que atentou contra bens jurídicos alvos de tutela legal.

E é precisamente dentro deste contexto, de uma actuação que provoca culposamente um mal ilegítimo, que se sustém e funda a legitimidade de o Estado poder, por seu turno, vir a sancionar o agente prevaricador, com a imposição de algo que, em última análise, é também ele um mal, já que a imposição de uma pena cerceia sempre, em alguma medida, algum dos direitos, liberdades e garantias constitucionalmente estabelecidos.

6. Acresce que, consubstanciando-se o instituto do recurso num remédio jurídico, no sentido de permitir a colmatação de eventuais erros de apreciação, imputáveis aos tribunais hierarquicamente inferiores, daqui decorre que a alteração das penas que se mostram já definidas só deverá ocorrer se, de facto, um erro assinalável, a reclamar reparação, se venha a constatar existir.

A este respeito veja-se, por todos, o acórdão do STJ, processo nº19/08.3PSPRT, 3ª secção, relator Raúl Borges, de 14-05-2009, disponível em www.dgsi.pt:

Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, págs. 196/7, § 255, após dar conta de que se revela uma tendência para alargar os limites em que a questão da determinação da pena é susceptível de revista, afirma estarem todos de acordo em que é susceptível de revista a correcção do procedimento ou das operações de determinação, o desconhecimento pelo tribunal ou a errónea aplicação dos princípios gerais de determinação, a falta de indicação de factores relevantes para aquela, ou, pelo contrário, a indicação de factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis. Defende ainda estar plenamente sujeita a revista a questão do limite ou da moldura da culpa, assim como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, e relativamente à determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto de pena, esta será controlável no caso de violação das regras da experiência ou se a quantificação se revelar de todo desproporcionada.

A intervenção do Supremo Tribunal em sede de concretização da medida da pena, ou melhor, do controle da proporcionalidade no respeitante à fixação concreta da pena, tem de ser necessariamente parcimoniosa, sendo entendido de forma uniforme e reiterada que “no recurso de revista pode sindicar-se a decisão de determinação da medida da pena, quer quanto à correcção das operações de determinação ou do procedimento, à indicação dos factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, à falta de indicação de factores relevantes, ao desconhecimento pelo tribunal ou à errada aplicação dos princípios gerais de determinação, quer quanto à questão do limite da moldura da culpa, bem como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, mas já não a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto da pena, salvo perante a violação das regras de experiência, ou a sua desproporção da quantificação efectuada”- cfr. acórdãos de 09-11-2000, in Sumários, de 30-10-2003, CJSTJ 2003, 3, 208, de 11-12-2003, processo 3399/03-5ª, de 04-03-2004, processo 456/04-5ª, in CJSTJ 2004, tomo 1, 220, de 07-12-2005 e de 15-12-2005, CJSTJ 2005, tomo 3, 229 e 235, de 15-11-2006, 2555/06-3ª, de 14-02-2007, processo 249/07-3ª, de 08-03-2007, processo 4590/06-5ª, de 12-04-2007, processo 1228/07-5ª, de 19-04-2007, processo 445/07-5ª, de 10-05-2007, processo 1500/07-5ª.

7. Posto este intróito, cumpre apreciar.

Em breve síntese, temos que no âmbito da decisão ora alvo de recurso, coube fazer a apreciação global da actuação do arguido, que se estendeu dentro do período temporal de Maio de 2019 a Dezembro de 2020 – ou seja, a actividade criminosa aqui em análise estendeu-se por um período de cerca de 1 ano e meio.

À data do cometimento destes ilícitos, o arguido tinha entre 22 e 23 anos, pelo que estamos perante um jovem adulto.

Nesse período temporal, o arguido cometeu:

- 2 crimes de roubo, um deles na forma agravada;

- um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade;

- 1 crime de coacção agravada,

- um crime de detenção de arma proibida;

- 1 crime de evasão.

Em termos de moldura penal, para efeitos de determinação da pena única, a mesma situa-se entre 15 anos e 7 meses de prisão (ou seja, a soma das seguintes penas de prisão: 2 anos e 6 meses + 4 anos e 6 meses + 2 anos e 6 meses + 2 anos + 9 meses + 3 anos e 4 meses) e 4 anos e 6 meses de prisão.

8. O recorrente começa por afirmar que o tribunal “a quo” não levou em linha de conta o efeito potencialmente pernicioso das prisões, para efeitos de ressocialização do arguido.

Sucede, todavia que, como o CRC do arguido demonstra (com condenações pela prática de crimes, desde 2015, tendo sido punido com penas todas não privativas da liberdade, até à sua detenção preventiva, pela prática dos crimes de coacção, roubo e detenção de arma proibida), não pode o mesmo fundar a prossecução da sua actividade criminosa, numa putativa aprendizagem em meio prisional, uma vez que, de facto, todos os ilícitos em apreciação neste processo (com excepção do crime de evasão), foram por si praticados quando vivia em liberdade, sem nunca antes ter estado preso.

E, se é verdade que era ainda novo quando cometeu tais crimes, embora já adulto, o que a análise dos factos revela é que os episódios ora em apreciação não se mostram actos isolados, decorrentes de uma situação única e irrepetível, resultante de algum grau de imaturidade ou situação externa irrepetível.

9. De facto, não só o arguido tem já anteriores condenações, como lhe foi imposta pena de prisão, suspensa na sua execução, tendo nas restantes a pena sido substituída por multa. Esta linha de actuação delituosa, iniciou-se em 2015 e persistiu até 2020, em paralelo, neste segmento final, com os crimes de que os presentes autos tratam.

Assim, é manifesto que as anteriores condenações se mostraram incapazes de dissuadir o recorrente de persistir numa postura contumazmente violadora dos normativos mínimos que nos regem em sociedade – e que se resumem a não cometer crimes – não tendo as oportunidades de refazer a sua vida em liberdade, que lhe foram dadas, de modo a amparar a sua eventual resolução de mudança de rumo de vida, surtido qualquer efeito útil.

10. Os factos acima narrados e que se mostram assentes revelam uma assinalável persistência criminosa, ao longo de quase 1 ano e meio, no decurso dos quais o arguido não exerceu qualquer actividade profissional remunerada e se mostrou incapaz de se estruturar a nível pessoal, pese embora tivesse – como tem agora – entorno familiar.

E a estrutura a nível pessoal, que determina uma inserção social efectiva, não se reconduz apenas à manutenção de laços familiares apoiantes, antes reside numa decisão pessoal de observância das regras que nos regem em sociedade, designadamente a abstenção de prática de actos de natureza criminal e a prossecução de uma actividade que permita o sustento próprio, ao invés do caminho prosseguido pelo arguido, em que optou por se sustentar a si e à sua dependência aditiva, através do desapossamento – muitas vezes por meios violentos – de terceiros que, aliás, nem sequer teve a mínima preocupação de ressarcir.

11. Temos pois, face ao que se deixa dito, que ao inverso do que o recorrente afirma, a concentração e o número de crimes que praticou, a natureza dos mesmos e o facto de não ter exercido qualquer actividade laboral, nesse período temporal (e não só, pois já assim sucedia nos anos anteriores ao cometimento dos ilícitos ora incluídos neste cúmulo), não demonstram uma culpa abaixo da média, que impusesse a conclusão de se mostrar a pena imposta fixada acima desse limite.

Ao inverso – a sua culpa é seguramente superior ao patamar em que foi apurada a pena única, razão pela qual não ocorre a violação do disposto no artº 40 do C. Penal.

Acresce que, também ao inverso do que o recorrente afirma, o arguido revela uma personalidade com dificuldades evidentes na integração social e laboral, como demonstram, sem margem para dúvidas, os factos dados como assentes, acima enunciados, sendo certo que a existência de laços afetivos familiares se mostra absolutamente insuficiente para o preenchimento do conceito de inserção.

12. Acresce que, em termos de detenção em estabelecimento prisional, o arguido não demonstra um percurso muito adequado, nem propriamente vocacionado para a reinserção, já que registou uma sanção de internamento em cela disciplinar pelo período de 21 dias e ainda uma outra punição anterior, por “intimidar ou estabelecer relação de poder ou autoridade sobre outros reclusos”, tudo por factos ocorridos em 06.04.2021.

13. Os crimes que cometeu e que se mostram abrangidos neste cúmulo, demonstram uma personalidade que não se coíbe do uso de violência física significativa (incluindo uma manobra de “mata-leão”, executada contra uma das vítimas), sendo certo que nada nos autos demonstra um percurso de reavaliação do mal cometido ou de arrependimento pelos actos praticados.

14. Estamos assim perante uma actuação que, na sua globalidade, revela um elevado grau de ilicitude, mostrando-se as exigências de prevenção especial igualmente elevadas.

15. No que toca à questão da ausência de medidas de flexibilização da sua pena, a verdade é que se ignora se assim é, pois tal não se mostra demonstrado nos autos, sendo certo, não obstante, que esse é tema que se mostra excluído da apreciação a realizar neste acórdão, uma vez que não é matéria decorrente da avaliação do acerto ou desacerto da dosimetria da pena única imposta.

16. Atento o que se deixa dito, a que acresce o que o tribunal “a quo” já deixou exarado no acórdão que proferiu, cujo teor acima se mostra transcrito e cujo conteúdo subscrevemos, não se vislumbra que a pena única imposta ao arguido mereça a crítica que aquele lhe dirige, antes se revelando adequadamente fixada, atentas as circunstâncias do caso.

Efectivamente, o recorrente assentava o seu ponto de discórdia no que toca ao quantitativo da mesma, na inexistência de fortes razões de prevenção especial. Ora, como acima se referiu, tal não é de todo o caso.

Assim, e consequentemente, mantendo-se a pena única fixada em medida superior a 8 anos de prisão, pelas razões já acima expostas, não se mostra aplicável ao caso o perdão previsto na Lei nº 38-A/2023.

Nestes termos, a pretensão do recorrente, tem forçosamente, de soçobrar na íntegra.

iv – decisão.

Pelo exposto, acorda-se em considerar improcedente o recurso interposto pelo arguido AA e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente, fixando-se a TJ em 5 UC.

Dê imediato conhecimento ao tribunal “a quo” do teor deste acórdão, advertindo que a decisão ainda se não mostra transitada em julgado.

Lisboa, 17 de Setembro de 2025

Maria Margarida Almeida (relatora)

Antero Luís

José Carreto