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TÍTULO EXECUTIVO
LIVRANÇA
LEGITIMIDADE DO EXEQUENTE
CESSÃO DE CRÉDITO
ÓNUS DA PROVA
DOCUMENT DUMP
Sumário
Sumário: 1. A lei processual civil não habilita o juiz a, oficiosamente, apurar o tempo, o modo e a autoria da inscrição dos dizeres da livrança (apresentada como título executivo), verificando depois se o seu preenchimento observa os termos acordo sobre o mesmo. 2. Não desqualifica a livrança, enquanto título executivo, a circunstância de na mesma se encontrar aposta a cláusula “não à ordem”, mesmo quando é executada por quem nela não figura como credor. 3. Neste caso, a aposição desta cláusula apenas obriga à satisfação do ónus de demonstração da legitimidade do exequente (provando documentalmente a cessão do crédito cambiário), nos termos previstos no n.º 1 do art. 54.º do Cód. Proc. Civil (habilitação-legitimidade). 4. Uma livrança apenas subscrita pelo devedor (na relação subjacente) não é uma garantia do crédito, dado que não amplia o património que responde pela dívida.
Texto Integral
Acordam na 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
A. Relatório
A.A. Identificação das partes e indicação do objeto do litígio
Scalabis – Stc, S.A., instaurou a presente ação executiva, com processo comum, na forma sumaria, contra BBB, para pagamento da quantia de € 9 401,67.
Para tanto, alegou que: a) “A exequente é dona, possuidora e legítima portadora de uma livrança subscrita em 17.11.2010 por BBB, no montante total de € 9.354,90”, “subscrita no âmbito do contrato de financiamento n.º …816 – n.º AA…806”, celebrado com o “Banco Espírito Santo, S.A.”. b) “O executado não pagou o montante inscrito na livrança na data do respetivo vencimento, apesar de ter sido instado para o fazer”.
Após convidar a exequente a “liquidar os créditos alegadamente cedidos e pronunciar-se quanto à sua ilegitimidade ativa”, o tribunal a quo proferiu despacho de indeferimento do requerimento executivo, concluindo nos seguintes termos:
«Verifica-se que a exequente não foi parte no “pacto de preenchimento” (…), e não existiu qualquer “cessão da posição contratual” – concluindo-se, assim, que, não tendo a ora exequente legitimidade para preencher a livrança (…), o documento não pode valer como título executivo.
Motivo por que se indefere liminarmente o requerimento executivo».
Inconformada, a exequente apelou desta decisão, concluindo, no essencial:
“B. (…) [A] recorrente considera ser nula a decisão constante do despacho objeto do presente recurso, nos termos do art. 615.º, n.º 1, c).
C (…) [A] decisão é obscura, não permitindo saber a qual dos fundamentos de indeferimento liminar do Requerimento executivo, constantes do art. 726.º, n.º 2 do C.P.C., se reconduz. (…)
N. (…) [A] legitimidade que motivou a decisão recorrida é uma questão diversa, que se prende já com uma questão de legitimidade substantiva – a efetiva titularidade, por parte do recorrente, de um direito de crédito sobre os executados. (…)
O. Tal questão (…) não diz respeito a nenhum pressuposto processual (…), sendo um problema de fundo, que se prende com o mérito da ação. Não está em causa uma exceção dilatória. (…)
Y. (…) [A] atual credora tem plena legitimidade para intervir nos autos, na qualidade de exequente, em virtude das cessões de créditos que operaram,
Z. Acrescendo que, com a transmissão dos créditos, são, concomitantemente, transmitidas todas as garantias subjacentes, nomeadamente, as livranças (em branco), as quais podem ser preenchidas pelos cessionários (…)”. A.B. Questões que ao tribunal cumpre solucionar
Não há questões de facto a decidir.
As questões de direito a tratar – em torno da regularidade da instância executiva – serão mais desenvolvidamente enunciadas no início do capítulo dedicado à análise dos factos e à aplicação da lei.
*
B. Fundamentação B.A. Factos processuais assentes
1. Desenvolvimento processual perante a 1.ª instância
1 – Em 29 de junho de 2024, deu entrada a presente execução contra BBB, para pagamento da quantia de € 9 401,67, alegando a exequente que:
a) Em 17 de novembro de 2010, “por BBB” foi subscrita uma livrança, “no montante total de € 9.354,90 (…), a qual se venceu em 04.06.2024”, “no âmbito do contrato de financiamento n.º …816 – n.º AA…806”, celebrado com o “Banco Espírito Santo, S.A.”;
b) Em 3 de agosto de 2014, “foi constituído o Novo Banco, S.A., tendo-se determinado a transferência para o mesmo, dos ativos, passivos e elementos extrapatrimoniais sob gestão do Banco Espírito Santo, S.A.”;
c) Em 22 de dezembro de 2018, “o Novo Banco, S.A. cedeu à sociedade LX INVESTMENT PARTNERS II, S.A.R.L. os créditos que detinha BBB, bem como todas as garantias e acessórios a eles inerentes”;
d) Em 3 de abril de 2020 (com uma alteração em 31 de março de 2021), “a LX INVESTMENT PARTNERS II, S.A.R.L. cedeu-o à sociedade SCALABIS STC, S.A., ora exequente”;
e) “O executado não pagou o montante inscrito na livrança na data do respetivo vencimento, apesar de ter sido instado para o fazer”.
2 – Com o requerimento executivo, a exequente juntou aos autos, como título executivo, um documento com os dizeres “Nº …569” e, além do mais que aqui se dá por transcrito:
LOCAL E DATA DE EMISSÃO
IMPORTÂNCIA (EM EUROS)
Monte Estoril
(ANO)
(MÊS)
(DIA)
9
3
5
4
9
0
€
2010
11
17
VALOR
VENCIMENTO (ANO MÊS DIA)
Contrato n.º …816
2
0
2
4
0
6
0
4
NO SEU VENCIMENTO PAGAREI(EMOS) POR ESTA ÚNICA VIA DE LIVRANÇA AO BANCO ESPÍRITO SANTO, S.A., OU À SUA ORDEM, A QUANTIA DE NÃO À ORDEM NOVE MIL, TREZENTOS E CINQUENTA E QUATRO EUROS E NOVENTA CÊNTIMOS
ASSINATURA(S)
DO(S)
SUBSCRITOR(ES)
BBB
3 – Com o requerimento executivo, a exequente juntou um documento pdf (portable document format), com 353 páginas em formato A4, intitulado “Doc. 1 – Outro DOC's 1 a 4”, no qual consta [em reprodução intencionalmente fac-símile], além do mais que aqui se dá por transcrito:
(…)
(…)
(…)
4 – Em 25 de setembro de 2024, pelo tribunal a quo foi proferido o seguinte despacho:
“Notifique a exequente para, querendo e em dez dias, liquidar os créditos alegadamente cedidos, e pronunciar-se quanto à sua ilegitimidade ativa (CPC 53.º/1).”.
5 – Em 10 de outubro de 2024, pela exequente foi apresentado o seguinte requerimento:
“1. Conforme alegado e demonstrado no Requerimento Executivo, os créditos cujo cumprimento coercivo se peticiona nos presentes autos foram transmitidos, por cessão, a favor da ora Exequente;
2. À data da referida cessão, a livrança encontrava-se, ainda, por preencher, pelo que (…) diligenciou o agora titular do crédito pelo seu preenchimento, nos estritos termos do pacto firmado para o efeito entre a Contraparte e o Credor Originário; (…)
8. No que respeita à liquidação dos créditos cedidos, salvo melhor entendimento, verifica-se que todos os cálculos efetuados constam da carta de interpelação remetida para o Executado em 20/05/2024, anexa ao Requerimento Executivo como doc. 4;
9. Não obstante, sempre se dirá que o valor de capital tido em conta foi o capital em dívida à data da cessão (de € 3.264,76) e que sobre o mesmo foram calculados juros, à taxa contratual, desde a data de incumprimento até ao preenchimento da livrança, no valor de € 6.090,14.”.
6 – Em 13 de novembro de 2024, pelo tribunal a quo foi proferido despacho de indeferimento liminar, no qual consta, além do mais:
“Notificada para liquidar os créditos e pronunciar-se quanto à sua ilegitimidade ativa, em 16-X-24 a exequente não juntou qualquer parte de qualquer dos contratos (com identificação do executado, e liquidação do crédito alegadamente cedido), e declarou ter preenchido a livrança (invocando os artigos 11.º § 2 e 77.º § 1 da L.U.L.L.).
Verifica-se que a exequente não foi parte no “pacto de preenchimento” (alegadamente constante no ‘contrato’ mencionado na livrança), e não existiu qualquer “cessão da posição contratual” – concluindo-se, assim, que, não tendo a ora exequente legitimidade para preencher a livrança (que lhe foi entregue parcialmente em branco), o documento não pode valer como título executivo.
Motivo por que se indefere liminarmente o requerimento executivo”.
7 – Em 8 de abril de 2024, pelo tribunal a quo foi proferido despacho para os efeitos previstos no art. 617.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil, no qual consta, além do mais:
“O despacho liminar recorrido considerou que, não tendo existido cessão da posição contratual (CC 424º/1), a exequente não podia ter preenchido a livrança (admitindo-se que fosse a legítima portadora, por força da cessão do “crédito”, apesar de uma livrança em branco não constituir qualquer “garantia”), por não ser parte no “pacto de preenchimento”; preenchendo-a ilicitamente (L.U.L.L. 10.º), o título é nulo.
Motivo por que se considera não ter sido cometida qualquer nulidade”.
2. Desenvolvimento processual perante o tribunal ‘ad quem’
8 – Em 11 de julho de 2025 (ref. 23436057), pelo relator foi proferido o seguinte despacho:
“No requerimento executivo e na alegação de recurso, a apelante mencionou o conteúdo de diversos documentos.
Verifica-se, no entanto, que, com o requerimento executivo, a exequente não procedeu a uma junção discriminada dos documentos apresentados. Num único documento pdf, intitulado “Doc. 1 – Outro DOC's 1 a 4”, amontoou todos os documentos que entendeu – sendo alguns deles uma digitalização de uma fotocópia, de uma fotocópia, de uma fotocópia…, pelo que se encontram parcialmente ilegíveis. Em face do exposto, deverá a apelante, no prazo de 5 dias: a) sinalizar no referido documento pdf “Doc. 1 – Outro DOC's 1 a 4” a cláusula ou cláusulas contratuais nas quais se encontra expressamente identificado o executado ou (pelo seu número individual) o contrato de crédito que este celebrou com a instituição bancária (BES) – mediante a indicação do número da cláusula e da folha do mencionado documento pdf “Doc. 1 – Outro DOC's 1 a 4” na qual se encontra enunciada. b) sinalizar no referido documento pdf “Doc. 1 – Outro DOC's 1 a 4” a junção do concreto contrato (de mútuo ou outro) que o executado celebrou com a instituição bancária (BES), no qual constem, designadamente, as cláusulas referidas na alegação de recurso, bem como o respetivo plano prestacional (no caso de ser um contrato de mútuo), com indicação das prestações incumpridas e suas datas – mediante a indicação da folha do mencionado documento pdf “Doc. 1 – Outro DOC's 1 a 4” onde se encontra tal contrato”.
9 – Em 14 de agosto de 2025 (refs. 773672 e 53111228), pela exequente foi apresentado o seguinte requerimento:
“1. Notificada que foi para vir indicar qual a cláusula ou cláusulas contratuais nas quais se encontra expressamente identificado o executado ou (pelo seu número individual) o contrato de crédito que este celebrou com a instituição bancária (BES), cumpre informar que,
2. da Fl. 19, nomeadamente dos pontos 2.1.1 e 2.1.2 retira-se que “(…) os Vendedores (cada um relativamente à respetiva Carteira de Crédito, ou seja, Novo Banco em relação à Carteira 1 e Banco BEST em relação é Carteira 2) comprometem-se a vender a transferir e os Compradores, Lx InvestmentPartners II, S.A., R.L, (…) comprometem-se a comprar e adquirir, em cada data de encerramento, acarteira de crédito. A Carteira de Crédito será vendida, respetivamente, por cada um dos vendedores, juntamente com todos os direitos, títulos e interesses relevantes”.
3. Do mesmo modo, na fl. 274 resulta que a sociedade Lx Investment Partners II, S.A., R.Lcedeu àScalabis- STC, S.A, mediante contrato de cessão de créditos, todos os créditos, bem como todas as garantias e acessórios a ele inerentes., conforme parágrafo 2.3, “a venda e cessão da carteira inclui a transferência para o comprador do título relacionado, a documentação do processo judicial, a documentação e os direitos acessórios relativos aos empréstimos enumerados no Anexo 3 (…)”.
Mais
4. Em conformidade, os créditos acionados nestes autos integram o perímetro de ambas as cessões,encontrando-se identificado na linha 74092 da base de dados extraída do CD do Anexo 1(“Empréstimos”) do “Contrato de Compra e Venda” celebrado entre o Novo Banco, S.A. e a LxInvestment Partners II, S.À R.L e Anexo 3 (“Empréstimos”) do “Contrato de Compra e Venda” celebradoentre a Lx Investment Partners II, S.A, R.L e a Scalabis – STC, SA., ora Recorrente:
5. Destarte, a aqui Recorrente é legítima portadora da livrança (Fl. 351) por força das cessões de crédito operadas, a qual foi legitimamente preenchida aquando do incumprimento por parte do Executado BBB, no que concerne ao contrato n.º …816 (IDRBES), correspondente ao Loan ID AA…806 ínsito na linha 74092, valendo, portanto, como título executivo.
6. Neste contexto, sendo a livrança um título executivo autónomo, literal e abstrato, valendo per si, nãohavia nem há necessidade de fazer prova do contrato a que subjaz (por imperatividade da lei queapenas exige que tal facto se verifique quando se reporta a uma livrança enquanto mero quirógrafo),sublinhado nosso, não obstante a referência, na mesma, ao respetivo número, …816 (IDRBES), o qual corresponde ao Loan ID AA…806 ínsito na linha 74092, conforme descrito supra”.
10 – Em 6 de setembro de 2025 (ref. 23540481), pelo relator foi proferido o seguinte despacho:
“A apelante continua a fazer referência a documentos cuja junção aos autos não é evidente para o tribunal.
Assim, convida-se a apelante a, no prazo de 2 dias, esclarecer a que “CD do Anexo 1 (…) e Anexo 3 (…)” se refere no ponto 4 do seu último requerimento, esclarecendo quando foi o documento em questão (o CD será o suporte, não o documento) total ou parcialmente junto aos autos (referência eletrónica)”.
11 – Em 15 de setembro de 2024 (refs. 776651 e 53317817), pela exequente foi apresentado o seguinte requerimento:
SCALABIS – STC, S.A, Recorrente nos suprarreferenciados autos, vem, na sequência de notificação citius para o efeito, esclarecer o «CD do Anexo 1 (…) e Anexo 3 (…)» referido no requerimento com referência citius n.º 773672 corresponde a toda carteira de crédito cedida do Novo Banco, S.A. à Lx Investment Partners II, S.A., R.L, (…) (CD do Anexo 1) e da sociedade Lx Investment Partners II, S.A., R.L à Scalabis- STC, S.A. (Anexo 3).
Em conformidade, tal foi junto no requerimento executivo (referência citius n.º 25928550) a 29.06.2024 como Documento n.º 1.
3. Outros factos relevantes
12 – No documento referido no ponto 3 – factos assentes – consta, ainda, além do mais que aqui se dá por transcrito [em reprodução intencionalmente fac-símile]:
(…)
(…)
(…)
(…)
(…)
(…)
(…)
(…)
13 – Com o requerimento executivo, a exequente não juntou nenhum CD-ROM nem qualquer listagem impressa contendo a identificação individualizada dos devedores nem dos créditos cedidos, apenas constando do documento referido no ponto 3 – factos assentes – uma página, no mais em branco, com os dizeres [em reprodução intencionalmente fac-símile]:
* B.B. Análise dos factos e aplicação da lei
São as seguintes as questões de direito parcelares a abordar: 1. Idoneidade formal do título executivo apresentado 1.1. Iniciativa inquisitória do tribunal ‘a quo’ 1.2. Conclusão: a invalidade do despacho impugnado 2. Legitimidade ativa para a execução 2.1. Legitimidade do adquirente que não figura no título 2.2. Satisfação do ónus de demonstrar a legitimidade 3. Sucessão na posição da pessoa que no título figura como credor 3.1. Transmissão das garantias e de outros acessórios do direito 3.2. Transmissão de um crédito cambiário embrionário 3.3. Transmissão do direito de preenchimento do título 4. Análise do caso concreto 4.1. Instrução do requerimento executivo com cópia do contrato de cessão 4.2. Junção de um extrato da listagem de créditos cedidos 5. Conclusão final 6. Responsabilidade pelas custas
1. Idoneidade formal do título executivo apresentado
Toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da ação executiva (art. 10.º, n.º 5, do Cód. Proc. Civil). À execução apenas podem servir de base os títulos executivos previstos, diretamente ou por remissão, no art. 703.º do Cód. Proc. Civil.
Instaurou a exequente a presente ação executiva, alegando “é dona, possuidora e legítima portadora de uma livrança subscrita” pelo executado. Com o requerimento executivo, juntou aos autos um impresso de livrança preenchido – isto é, a sua cópia digitalizada –, não estando em discussão no processo as características deste documento nem a sua qualificação à luz do art. 75.º da Lei Uniforme relativa a letras e livranças (estabelecida por Convenção assinada em Genebra, em 7 de Junho de 1930, aprovada por Portugal pelo Decreto-Lei n.º 23721, de 29 de março de 1934, e ratificada pela Carta de 21 de junho de 1934; adiante LULL).
O título dado à execução é, pois, uma livrança. Este tipo de instrumento financeiro (que constitui uma declaração de dívida) pode servir de base à execução, conforme dispõe a al. c) do n.º 1 do art. 703.º do Cód. Proc. Civil.
1.1. Iniciativa inquisitória do tribunal ‘a quo’
O juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (art. 5.º, n.º 3, do Cód. Proc. Civil). No entanto, nesta atividade, só se pode servir dos factos alegados pelas partes e daqueles que são notórios ou de que tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções (art. 5.º, n.os 1 e 2, al. c), do Cód. Proc. Civil).
É certo que o tribunal pode, ainda, tomar em consideração factos que tenham resultado da instrução da causa (art. 5.º, n.º 2, als. a) e b), do Cód. Proc. Civil). No entanto, não lhe é lícita a iniciativa inquisitória no sentido de descobrir outros factos (art. 411.º do Cód. Proc. Civil), procurando justificar o conhecimento de matéria não alegada com uma aquisição processual por via da instrução (oficiosamente determinada). Esta postura não tem cobertura legal na jurisdição contenciosa e representa uma ofensa ao princípio dispositivo.
Ao tribunal a quo era lícito conhecer os factos alegados pela exequente para fundar a sua legitimidade ativa – os contratos de cessão de crédito. Quanto a estes factos, podia “realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio” (art. 411.º do Cód. Proc. Civil) – designadamente, a junção de cópias ou de cópias mais legíveis dos contratos de cessão invocados.
No entanto, a iniciativa do tribunal a quo extravasou este âmbito, enredando-se em investigações e considerações sobre as circunstâncias do preenchimento da livrança. É esta uma questão cujo conhecimento oficioso lhe está vedado (art. 3.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil).
Em conclusão, contrariamente ao sustentado pelo tribunal recorrido, considerando os factos que ao juiz é lícito conhecer, a livrança junta pode, efetivamente, “valer como título executivo”, não sendo o título “nulo” (sic). A putativa irregularidade no preenchimento do título, que o tribunal a quo, por sua iniciativa, decidiu investigar, não podia ter sido por este conhecida.
1.2. Conclusão: a invalidade do despacho impugnado
Resulta do disposto nos arts. 608.º, n.º 2, 2.ª parte, 613.º, n.º 3, 615.º, n.º 1, al. d), do Cód. Proc. Civil, que o juiz não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras. Ora, repisa-se, em parte alguma da lei se estabelece que o juiz deve, oficiosamente, apurar o tempo, o modo e a autoria da inscrição dos dizeres do impresso da livrança, verificando depois se o preenchimento observa acordo sobre o mesmo.
À luz das referidas disposições legais, é nulo o despacho quando o juiz conheça de questões de que não podia tomar conhecimento. Ainda assim, não podemos dar razão à apelante, quando sustenta ser a decisão impugnada nula. É que o concreto fundamento por esta invocado é outro – o previsto na al. c) do n.º 1 do art. 615.º do Cód. Proc. Civil –, sendo a sua apreciação um ano inútil (art. 130.º do Cód. Proc. Civil).
Determina o n.º 1 do art. 665.º do Cód. Proc. Civil que, “ainda que declare nula a decisão que põe termo ao processo, o tribunal de recurso deve conhecer do objeto da apelação”. Esta norma impõe, no caso, conhecer, quer da legitimidade processual da exequente – questão que é de conhecimento oficioso (arts. 551.º, n.º 1, 577.º, al. e), e 578.º do Cód. Proc. Civil) – quer, se nos for lícito, da sua legitimidade substantiva – questão que se encontra abrangida pela autonomia privada, estando, pois, dependente de arguição.
Conforme se refere no Ac. do TRP de 25-03-2021 (59/21.7T8VCD.P1), “[p]or força da regra da substituição ao tribunal recorrido (artigo 665.º do Cód. Proc. Civil), quando a nulidade da sentença recorrida é apenas um dos vários fundamentos de impugnação dessa decisão, a arguição da nulidade é um ato inútil e não necessita sequer de ser apreciada pela Relação se a sentença puder ser confirmada ou revogada por outras razões”.
2. Legitimidade ativa para a execução
A execução tem de ser promovida pela pessoa que no título executivo figura como credora e deve ser instaurada contra a pessoa que no título tenha a posição de devedora (art. 53.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil). Sendo o título dado à execução uma livrança, na mesma figurando como credora entidade distinta da exequente – cfr. o facto assente 2 –, é incontornável a ilegitimidade ativa desta, salvo se uma norma especial estabelecer um desvio à referida regra geral de determinação da legitimidade.
2.1. Legitimidade do adquirente que não figura no título
Dispõe o n.º 1 do art. 54.º do Cód. Proc. Civil que, “tendo havido sucessão no direito ou na obrigação, deve a execução correr entre os sucessores das pessoas que no título figuram como credor ou devedor da obrigação exequenda; no próprio requerimento para a execução o exequente deduz os factos constitutivos da sucessão”. A segunda parte deste enunciado estabelece a chamada habilitação-legitimidade – cfr. o Ac. do STJ de 30-03-1982 (070021). A norma transcrita não onera o exequente com a junção de prova documental do que alega, mas apenas com a alegação dos factos dos quais se extrai que sucedeu na posição do credor que figura no título. No entanto, nem por isso se encontra o exequente dispensado de juntar prova documental de tais factos – com o requerimento executivo ou na sequência de convite que lhe seja dirigido para o efeito –, pois só assim poderá ultrapassar a insuficiência do título (arts. 10.º, n.º 5, e 703.º do Cód. Civil) – cfr. os Acs. do TRL de 15-03-2011 (24649/05.6YYLSB.L1-1) e do TRP de 23-05-2022 (372/20.0T8AGD-B.P1).
Não desqualifica a livrança, enquanto título executivo, a circunstância de na mesma se encontrar aposta a cláusula “não à ordem”, mesmo quando é executada por quem nela não figura como credor (pessoa a quem deve ser paga a quantia aposta), embora os endossos eventualmente inscritos apenas valham como quirógrafos de cessões ordinárias de créditos (art. 11.º, § 2, da LULL) – cfr. A. Ferrer Correia, Lições de Direito Comercial, Vol III, Letra de Câmbio, Coimbra, Universidade de Coimbra, 1975, pp. 24 e 199, e Pedro C. de Morais Sarmento, «Da admissibilidade e do valor da cláusula “não à ordem” nas letras», ROA, Ano 13, 1953, n.os 3 e 4, p. 182 e segs.; em sentido não coincidente, cfr. o Ac. do TRL de 26-06-2025 (802/24.2T8OER.L1-2). Processualmente, a aposição desta cláusula apenas obriga à satisfação do ónus de demonstração da legitimidade do exequente (provando documentalmente a cessão do crédito cambiário); substantivamente, para além de outros efeitos, da sua inscrição pelo sacador resulta serem oponíveis ao cessionário todas as exceções que poderiam ser opostas ao cedente (inexistência de autonomia do direito do cessionário) – com a ressalva prevista no art. 585.º do Cód. Civil.
No caso dos autos, exercendo a exequente um crédito cambiário, tinha o ónus de alegar os factos que revelam que, direta ou indiretamente, adquiriu validamente esse direito da entidade que na livrança consta como credora. Vejamos se o fez.
2.2. Satisfação do ónus de demonstrar a legitimidade
Não se discute (oficiosamente) a autoria do preenchimento do título – isto é, a legitimação para o efeito – nem a conformidade, ou não, dos seus dizeres inscritos aos acordos realizados. Não se discute (oficiosamente), igualmente, em si mesma, a data em que o impresso de livrança foi completado com as referências previstas no art. 75.º da LULL. Apenas se discute isto: entidade que na livrança consta como credora da assunção de dívida transmitiu, direta ou indiretamente, o crédito cambiário à exequente?
Posto isto, é isento de controvérsia que, de acordo com os dizeres do título executivo, o crédito cambiário nasceu na esfera jurídica da entidade que na livrança consta como credora – o Banco Espírito Santo S.A. (atualmente, como é público, o Banco Espírito Santo S.A. Em Liquidação). Ou seja, independentemente da mão que o efetuou e do procedimento que culminou no preenchimento da livrança, encerra esta uma assunção de dívida do executado perante o Banco Espírito Santo S.A..
Procurando satisfazer o seu ónus previsto no n.º 1 do art. 54.º do Cód. Proc. Civil (habilitação-legitimidade), a exequente alegou que para o Novo Banco, S.A., foram transmitidos os “ativos, passivos e elementos extrapatrimoniais sob gestão do Banco Espírito Santo, S.A.”. Prossegue a exequente alegando que o “Novo Banco, S.A. cedeu à sociedade LX INVESTMENT (…) os créditos que detinha (…), bem como todas as garantias e acessórios a eles inerentes”, e que a “LX INVESTMENT (…) cedeu-o à (…) exequente”.
Sendo um crédito cambiário um ativo, devemos aceitar que foi alegada uma transmissão do crédito exequendo. Ao nível da pura alegação de factos, mostra-se satisfeito o ónus previsto no n.º 1 do art. 54.º do Cód. Proc. Civil (habilitação-legitimidade) – cfr., ainda, os arts. 11.º, § 2.º, e 77.º da LULL. Se a legitimidade ativa para a execução é assegurada com a alegação e prova da existência do acordo de cessão de crédito, então só poderemos concluir pela legitimidade da apelante se dos documentos juntos resultar ter adquirido o crédito exequendo de quem no título figura como credor.
3. Sucessão na posição da pessoa que no título figura como credor
Afigura-se-nos útil esclarecer uma afirmação acabada de produzir: sendo o crédito cambiário um ativo, pode ele ficar imediatamente abrangido por uma transmissão de parte ou da totalidade dos ativos do credor. Desta asserção retira-se que, à luz dos factos que é lícito ao tribunal conhecer (arts. 5.º e 726.º do Cód. Proc. Civil), o crédito adquirido pela exequente, e que esta executa, é o crédito cambiário.
Não desenvolvemos, pois, aqui nenhum raciocínio em torno da ideia de que a livrança – completamente preenchida, ou não – constituiu um acessório do (distinto) crédito efetivamente transmitido, sendo este, no caso, no essencial, o direito ao reembolso de uma quantia mutuada. Pelo contrário, reafirmamos, à luz dos factos que é lícito ao tribunal conhecer, o crédito cambiário incorporado no título é, imediatamente, o ativo cedido à exequente, isto é, o crédito objeto da execução.
3.1. Transmissão das garantias e de outros acessórios do direito
Dispõe o art. 577.º, n.º 1, do Cód. Civil: “O credor pode ceder a terceiro uma parte ou a totalidade do crédito, independentemente do consentimento do devedor, contanto que a cessão não seja interdita por determinação da lei ou convenção das partes e o crédito não esteja, pela própria natureza da prestação, ligado à pessoa do credor”. Estabelece o art. 578.º, n.º 1, do Cód. Civil que “[o]s requisitos e efeitos da cessão entre as partes definem‐se em função do tipo de negócio que lhe serve de base”.
Na falta de convenção em contrário, a cessão do crédito importa a transmissão, para o cessionário, das garantias e outros acessórios do direito transmitido, que não sejam inseparáveis da pessoa do cedente (art. 582.º do Cód. Civil). Uma livrança apenas subscrita pelo devedor (na relação subjacente) não é, manifestamente, uma garantia do crédito, em sentido próprio.
“Falar de garantia, num sentido que ultrapasse o domínio não só da linguagem comum como também da conveniência da própria linguagem técnico-jurídica de recorrer à utilização de designações qualificativas, supõe necessariamente que haja um aumento da possibilidade ou da probabilidade de satisfação do crédito, seja através do alargamento da massa de bens responsáveis, seja através duma certa reserva de determinado bem, para servir de base (de novo) à satisfação do crédito, o que, manifestamente, só acontece após a penhora. A garantia supõe, ou assume (…) um significado (ou um reforço) quantitativo ou qualitativo (ou, a um tempo, quantitativo e qualitativo), tendo em vista a satisfação do crédito. Trata-se de um aumento, isto é, de algo que acresce; é um plus relativamente à complexa relação credor-devedor e à caracterização consequente do direito do credor como um direito subjetivo, caracterização essa que (…) carrega já em si, intrinsecamente, o poder de executar o património do devedor, recorrendo para tal à força do Estado” – cfr. Manuel Januário da Costa Gomes, Assunção Fidejussória de Dívida, Coimbra, Almedina, 2000, pp. 18 e 19.
Poder-se-á discutir, à luz do concreto acordo celebrado entre o subscritor e o credor, se a livrança – completa ou não – subscrita pelo mesmo devedor é um acessório (mas não uma garantia) de outro crédito – máxime, do direito ao reembolso do mútuo. No entanto, esta discussão não é processualmente admissível, pois só poderia ser desenvolvida sobre factos não alegados pela exequente, que não são de conhecimento oficioso. Não podemos nós cair no mesmo vício em que incorreu a decisão apelada.
3.2. Transmissão de um crédito cambiário embrionário
Sob diferente perspetiva, poder-se-á entender que a livrança parcialmente incompleta, mas assinada pelo subscritor, e existindo acordo que caucione o seu preenchimento – uma “livrança em branco”, portanto –, constitui já um ativo financeiro, diretamente abrangido pelas cessões alegadas – cfr. o Ac. do STJ de 10-10-2023 (478/21.9T8PDL.L1.S1) –, não sendo, assim, um mero acessório de outro direito.
De acordo com este entendimento, “embora a eficácia da livrança fique dependente do seu preenchimento, a obrigação cambiária por ela titulada considera-se constituída, desde o momento da sua assinatura e entrega” – cfr. o Ac. do TRC de 11-07-2006 (1998/06). Isto significa que, desde o momento da subscrição, pode o crédito correspondente à obrigação cambiária ser transmitido – pode o título ser endossado (não existindo cláusula “não à ordem”) ou cedido o crédito cambiário –, embora seja insuscetível de efetivação, enquanto for indeterminado (sendo determinável) – cfr., A. Ferrer Correia, Lições de Direito Comercial, Vol. III: Letra de Câmbio, Coimbra, polic., 1975, pp. 134 a 136.
3.3. Transmissão do direito de preenchimento do título
Quanto ao pacto de preenchimento, salvo estipulação especial em contrário, poderá ser visto como um acessório, abrangido pela transmissão, seja do crédito subjacente – nos termos referidos no ponto anterior –, seja do crédito cambiário embrionário – cfr. os Acs. do STJ de 06-12-2018 (653/14.2TBGMR-B.G1.S2) e do TRG de 03-11-2022 (4496/20.6T8VNF-A.G2).
No entanto, porventura até com maior propriedade e frequência casuística, do teor do acordo de preenchimento e dos demais dizeres do contrato em que se insere – designadamente, do contrato de mútuo – poder-se-á retirar que a transmissão do direito ao preenchimento do título (legitimidade substantiva) ocorre por força de uma transmissão da posição contratual do credor no próprio pacto de preenchimento – que tem natureza contratual –, antecipadamente consentida pela contraparte, conforme admitido pelas normas enunciadas nos n.os 1 e 2 do art. 424.º do Cód. Civil.
Mas, também aqui, o desenvolvimento desta apreciação impõe o conhecimento de factos não alegados pela exequente, dos quais o tribunal não pode tomar conhecimento oficiosamente.
4. Análise do caso concreto
Feito o enquadramento jurídico do caso concreto, resta-nos verificar se a apelante satisfez o ónus de demonstrar a sua legitimidade (habilitação-legitimidade). Recorde-se que a exequente tem de provar que sucedeu na posição do credor cambiário, mas não que este tinha legitimidade substantiva para preencher a livrança; aliás, nem se discute oficiosamente se a livrança foi emitida em branco ou não.
4.1. Instrução do requerimento executivo com cópia do contrato de cessão
Em ponto algum dos documentos (ou documento único) juntos com o requerimento executivo para demonstração da sucessão na titularidade do crédito cambiário consta o nome do executado; em ponto algum consta a descrição de uma qualquer relação contratual entre o cedente (credor) e um terceiro (devedor). Em especial, em tal documento não está identificada, nem a livrança – recorde-se que o crédito exequendo é o crédito cambiário, e não o emergente do contrato de mútuo ou do incumprimento deste – nem mesmo o crédito emergente do mútuo que terá justificado a sua emissão. Ou seja, não está minimamente demonstrada uma transmissão do concreto crédito cambiário exercido nesta ação para a aqui exequente – ou para quem putativamente lhe cedeu o crédito.
Aliás, o primeiro documento que alegadamente revelaria a transmissão do crédito – primeiro na cadeia de supostas transmissões contratuais do crédito – não parece, sequer, documentar uma cessão de créditos, mas apenas uma promessa de cessão – cfr. o facto n.º 3 –, a ter esta lugar e a ser documentada ulteriormente, na futura “Data de Encerramento”. Não se justifica, pois, verificar se consta do documento que titula a segunda cessão de créditos – e, efetivamente, não consta – a identificação do crédito exequendo – valendo o a máxima “nemo plus iuris ad alium transferre potest quam ipse habet”.
Em vez de apresentar, para além do título executivo, os segmentos dos documentos pertinentes contendo os conteúdos contratuais dos quais poderia resultar a sua legitimidade, a exequente juntou, num único pdf 353 páginas, uma amálgama de documentos de leitura difícil, alguns redigidos em língua inglesa (sem exata correspondência na transcrição para português apresentada), acompanhados de dezenas de anexos irrelevantes. Em sentido oposto, não foram juntos documentos relevantes – como o contrato de mútuo e os registos que permitiriam relacionar os elementos de identificação da livrança (título executivo) ou do contrato de mútuo com os elementos de identificação do crédito cedido (supostamente inscrito numa listagem dita anexa).
Dado que, no meio de tanto papel, não constam nenhuns enunciados dos quais se poderia concluir, com a mínima segurança, ter ocorrido a transmissão do concreto crédito exequendo, parece que o tribunal a quo foi vítima de “document dump”. Em vez de cooperar “para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio” (art. 7.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil), a exequente enterrou esta “justa composição” sob resmas de papel e adjudicou ao assoberbado em trabalho Juízo de Execução a tarefa de nelas mergulhar e encontrar os dados relevantes – que, afinal, neles não contam (pelo que a exagerada junção de documentos não representa um mero excesso de zelo, pois também peca por defeito). Não fora a proibição prevista no art. 635.º, n.º 5, do Cód. Proc. Civil e de outra atenção esta conduta seria merecedora (art. 542.º, n.º 2, al. c), do Cód. Proc. Civil).
4.2. Junção de um extrato da listagem de créditos cedidos
Apenas perante o tribunal ad quem, apresentou a exequente, como imagem aposta entre o texto de um requerimento, um extrato de uma listagem contendo o nome do executado. Podemos aceitar que, na satisfação do seu ónus de garantir a habilitação-legitimidade, baste ao exequente juntar um extrato da listagem dos créditos cedidos – sendo dispensável (e mesmo inconveniente) a junção da lista completa. No entanto, justifica-se que também junte o segmento do documento que permite relacionar tal listagem com a cópia do contrato de cessão de créditos a que diz respeito.
Seja como for, no caso dos autos, os dados constantes do extrato da listagem dos créditos cedidos apresentado não têm correspondência com os elementos de identificação do crédito exequendo. A livrança dada à execução tem o n.º …569. No extrato da lista de créditos transmitidos consta “Loan ID” [identificação do empréstimo] “AA…894” e “AA…806”. Os elementos de identificação não batem certo. Nem mesmo correspondem ao crédito subjacente (que não é o exequendo), já que o mútuo referido na livrança tem o número …816.
Em suma, a exequente não demonstrou documentalmente, mesmo após lhe serem dirigidos diversos convites para o efeito, que tenha adquirido o concreto crédito cambiário exequendo.
5. Conclusão final
Na satisfação do ónus de demonstração documental da sua legitimidade, nos termos previstos no n.º 1 do art. 54.º do Cód. Proc. Civil (habilitação-legitimidade), tem o exequente de provar que sucedeu na posição daquele que no título executivo figura como credor. Não o logrando fazer, deve o requerimento executivo ser indeferido, por ilegitimidade do demandante.
A decisão recorrida de indeferimento do requerimento executivo deve ser mantida, por falta de legitimidade ativa por parte da apelante (art. 726.º, n.º 2, al. b), do Cód. Proc. Civil). À face do título, falece a sua legitimidade processual, sendo certo que não demonstrou ter sucedido na posição do credor cambiário. Improcede a apelação.
6. Responsabilidade pelas custas
A responsabilidade pelas custas cabe à apelante (art. 527.º do Cód. Proc. Civil), por ter ficado vencida.
C. Dispositivo C.A. Do mérito do recurso
Em face do exposto, na improcedência da apelação, acorda-se em manter a decisão recorrida. C.B. Das custas
Custas a cargo da apelante. * Notifique.
Lisboa, 23 de setembro de 2025
Paulo Ramos de Faria
José Capacete
Rute Alexandra da Silva Sabino Lopes (com declaração de voto)
Declaração de voto Em processo de natureza semelhante, a signatária salientou ali a conduta aqui apropriadamente denominada de “document dump”. Sem prejuízo, em tal processo concluiu a signatária naquele caso concreto pela suficiência da prova produzida.