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VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
PREVENÇÃO GERAL
ARBITRAMENTO
INDEMNIZAÇÃO
Sumário
(da responsabilidade da Relatora) I. A violência conjugal assume proporções alarmantes na nossa sociedade, apesar do novo milénio, com grandes avanços técnico-científicos inigualáveis noutros estádios anteriores da nossa civilização. Mas apesar disso, o homem mantém em certos casos uma inexplicável regressão em termos afectivos e emocionais, apresentando comportamentos que em nada os distanciam dos nossos mais longínquos antepassados. II. Se ao longo de 8 anos, o agente dirigiu à sua mulher atitudes, comportamentos e palavras que, considerados em separado podem ser inócuos, mas cuja repetição os torna destruidores, aquele comete o crime de violência doméstica, já que lhe infligiu maus tratos, consubstanciados numa vivência de permanente subjugação, medo e tensão. III. Não tendo sido deduzido um pedido de indemnização civil no processo penal pela ofendida, nem, tanto quanto se sabe, em separado e também não se opôs expressamente a que lhe fosse arbitrada quantia reparadora, o tribunal terá obrigatoriamente que fixar uma quantia a título de reparação dos prejuízos sofridos.
Texto Integral
Acordam, em conferência, as Juízas Desembargadoras da 9.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:
I. RELATÓRIO
No processo comum singular n.º 832/23.1... do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte, Juízo Local Criminal de Loures - Juiz 3, consta, da parte decisória da sentença, datada de ........2025, o seguinte: «Pelo exposto, na improcedência da acusação, decide-se absolver o arguido AA da prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art.º 152º, n.º 1, als. b) e c), e n.ºs 2, al. a), 4 e 5 do Código Penal, em concurso aparente (consunção) com um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos art.ºs 143º, n.º 1, 145º, n.º 1, al. a), 132º, n.º 2, al. b) do Código Penal.».
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Inconformado com a decisão absolutória, veio o MINISTÉRIO PÚBLICO interpor recurso, pugnando, em síntese, pela condenação do arguido pelo crime de violência doméstica por que vinha acusado.
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O recurso foi admitido para este Tribunal da Relação de Lisboa, por despacho datado de ........2025, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
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O arguido apresentou resposta ao recurso, pugnando pela improcedência do recurso.
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Nesta Relação, a Exm.ª Sr.ª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de o recurso dever ser julgado procedente.
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Foi cumprido o estabelecido no art. 417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal (doravante CPP).
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Proferido despacho liminar e colhidos os vistos, teve lugar a conferência.
Cumpre apreciar e decidir.
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II. OBJECTO DO RECURSO
Face às conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, cumpre apreciar:
a. se a sentença é nula por omissão de pronúncia.
b. se em face da factualidade provada, existe erro de direito, devendo a conduta do arguido ser enquadrada no crime de violência doméstica por que vinha acusado;
c. se a resposta for afirmativa, qual a medida concreta da pena e da penas acessórias a aplicar; e,
d. determinar qual o valor a arbitrar em termos indemnizatórios;
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III. FUNDAMENTAÇÃO
A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos, a motivação e enquadramento jurídico (transcrição na parte que releva): «1. O arguido e a vítima BB passaram a coabitar, como se casados um com o outro fossem, desde data não apurada do ano de .... 2. Arguido e vítima são progenitores comuns de CC, nascido em ... de ... de 2015. 3. Ao longo de todo o período compreendido entre pelo menos ... de ... de 2015 e ... de ... de 2023, em múltiplas ocasiões, de número não apurado, em alguns trechos com frequência diária, no domicílio comum, o arguido dirigiu apodos e expressões à vítima como“ÉS UMA MERDA, ÉS UMA MÃE DE MERDA, LINGUARUDA, NÃO SABES FALAR, NÃO TENS MODOS, ÉS UMA ESTÚPIDA, UMA MALCRIADA”. 4. Nesse contexto, em ocasiões de número apurado, de viva voz e com foros de seriedade, o arguido declarou à vítima “EU VOU-TE BATER”, expressões de que a mesma ficou sempre bem ciente. 5. No dia ... de ... de 2023, pelas 12H, arguido e vítima encontravam-se no domicílio comum, sito na ... 6. Então, no contexto de discussão, o arguido, fazendo uso de um fio de material não apurado, com aptidão vulnerante, desferiu uma pancada no braço esquerdo da vítima, enquanto lhe dizia “TU TENS A LÍNGUA AFIADA, ÉS UMA MÃE DE MERDA”. 7. Como consequência de tal agressão por banda do arguido, ocorrida em ... de ... de 2023, a vítima sofreu dores, e bem assim um vinco na zona atingida, observável a olho nu. 8. Ao agir da forma descrita, teve o arguido o propósito logrado e reiterado de maltratar a vítima BB, apesar de saber que lhe devia particular respeito e consideração, na qualidade de sua companheira e da de mãe de seu filho CC, não se coibindo de assim actuar no domicílio comum. 9. Para o efeito, não se coibiu o arguido de, no dia ..., molestar a integridade física da vítima, o que quis e logrou, bem sabendo que assim procedia contra sua companheira e mãe de seu filho. 10. Agiu sempre de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo serem as suas condutas proibidas e punidas por lei. Quanto às condições sociais e económicas do arguido provou-se que: 11. AA vive num imóvel arrendado, sito na morada inscrita nos autos, meio habitacional e sociocomunitário no qual se sente enquadrado. 12. Todavia, no presente, experiencia inquietude ante o facto de o contrato de arrendamento ter terminado, em ... do ano .... 13. Segundo o mesmo, vem sendo intimidado para abandonar a habitação por mandantes do senhorio, não obstante manter os pagamento mensais até encontrar alternativa habitacional, alegando que cumpre uma orientação do seu mandatário. 14. O agregado de AA integra a ofendida (48 anos) e o filho em comum (09 anos). 15. Ambos os elementos do casal verbalizam uma dinâmica relacional estável, sem interações pontuadas por comportamentos análogos aos retratados na acusação. 16. Porém, é de assinalar que o discurso do arguido remete para desentendimentos associados a diferenças no exercício da parentalidade, fator no qual ancora a génese das suas condutas, ora em análise. 17. O relato da ofendida recai na perceção do arguido como trabalhador, bom pai e companheiro, referindo-se aos factos ora em apreço como um episódio, minimizando as ofensas verbais e negando agressões físicas no passado. 18. É sob esta égide que assevera não vivenciar sentimentos de risco à sua integridade. 19. Em termos profissionais, AA não está inscrito no Centro de Emprego. 20. Todavia, avalia esta dimensão como estável, na medida em que alega conseguir subsistir com os trabalhos pontuais como ..., bem como na reparação de automóveis para posterior venda. 21. AA não concretiza os montantes mínimos mensais que aufere das ocupações mencionadas supra. 22. Contudo, relata serem suficientes para fazer face às principais necessidades do agregado. 23. Ao orçamento familiar acresce o abono atribuído ao menor (48 euros) e os lucros [não concretamente especificados] provindos do estabelecimento que a ofendida explora, há quase dez anos (...). 24. Ainda na esfera económica, AA indica como principais despesas a renda da habitação (285 euros), atividade desportiva do filho (45 euros, atualmente com o acréscimo de 50 euros referente à participação num torneio de futebol) e consumíveis quotidianos. 25. A ofendida confirma que o arguido assegura estes encargos. 26. Em termos ocupacionais, AA destaca o acompanhamento da atividade desportiva do filho (treinos e jogos). 27. Do processo de desenvolvimento e socialização releva-se que AA cresceu com cinco irmãos germanos, num seio familiar cuja dinâmica não terá sido marcada por conflitualidade de relevo, com e entre os elementos do agregado. 28. Foi no país de origem (...) que concluiu o 12.º ano de escolaridade e iniciou-se no mercado de trabalho, como ... e ..., ofícios aos quais deu continuidade no seu percurso laboral em Portugal, em paralelo com a compra e venda de veículos automóveis. 29. As repercussões da situação jurídico-penal assinaladas por AA concernem ao facto de estar referenciado no sistema de justiça penal por práticas que reitera não representarem o modo como se relaciona com as pessoas em geral e com a ofendida em particular. 30. Reiterando que não é uma pessoa agressiva e/ou violenta, AA atribui o presente processo judicial ao desacordo com a ofendida quanto à permissividade da mesma face ao filho de ambos, numa ocasião em que o menor iria participar num evento desportivo. 31. Apesar do posicionamento acima mencionado, AA não verbaliza uma atitude negativa ante uma eventual condenação numa medida a executar em meio livre. 32. Contudo, é notória a sua resistência face intervenções estruturadas nas quais perceciona um rótulo de ofensor nas relações de intimidade. 33. Nas informações policiais constata-se que, depois dos factos em apreço, AA está associado como suspeito em crimes contra a liberdade pessoal (NUIPC 610/24.0... PGLRS, em .../.../2024). 34. Confrontado, enquadra a ocorrência num desentendimento com o cunhado. Quantos aos antecedentes criminais provou-se que: 35. O arguido não tem averbado no último CRC que foi junto aos autos, quaisquer antecedentes criminais. (…) * Convicção do Tribunal O tribunal formou a sua convicção com base na análise crítica e valoração da prova produzida e examinada em audiência, conjugada com a prova documental junta aos autos, e as regras da experiência. Assim, e no que concerne aos factos dados como provados nos pontos 1 a 10 o tribunal alicerçou a sua convicção, desde logo nas declarações do arguido, que confessou integralmente e sem reservais tais factos, bem como na seguinte prova documental: auto de denúncia de fls. 2 a 6 e o teor de fls. 9; reportagem fotográfica de fls. 17, frente e verso, e assento de nascimento de fls. 73 a 74. No que concerne às condições sociais e económicas teve-se em consideração o relatório social do arguido junto aos autos. (…) O Direito O arguido vem acusado da prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art.º 152º, n.º 1, als. b) e c), e n.ºs 2, al. a), 4 e 5 do Código Penal, em concurso aparente (consunção) com um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos art.ºs 143º, n.º 1, 145º, n.º 1, al. a), 132º, n.º 2, al. b) do Código Penal (factos de ... de ... de 2023). Dispõe o artigo 152º, nº 1 do Código Penal, que: “1 - Quem, de modo reiterado ou não, infligir maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais: a) Ao cônjuge ou ex-cônjuge; b) A pessoa de outro ou do mesmo sexo com quem o agente mantenha ou tenha mantido uma relação de namoro ou uma relação análoga à dos cônjuges, ainda que sem coabitação; c) A progenitor de descendente comum em 1.º grau; ou d) A pessoa particularmente indefesa, nomeadamente em razão da idade, deficiência, doença, gravidez ou dependência económica, que com ele coabite; é punido com pena de prisão de um a cinco anos, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal”. Nos termos do nº 2 – “No caso previsto no número anterior, se o agente: a) Praticar o facto contra menor, na presença de menor, no domicílio comum ou no domicílio da vítima; ou b) Difundir através da Internet ou de outros meios de difusão pública generalizada, dados pessoais, designadamente imagem ou som, relativos à intimidade da vida privada de uma das vítimas sem o seu consentimento; é punido com pena de prisão de dois a cinco anos”. Estatui o nº 4 do citado preceito legal que: “Nos casos previstos nos números anteriores, podem ser aplicadas ao arguido as penas acessórias de proibição de contacto com a vítima e de proibição de uso e porte de armas, pelo período de seis meses a cinco anos, e de obrigação de frequência de programas específicos de prevenção da violência doméstica. Por sua vez, dispõe o nº 5 que: “A pena acessória de proibição de contacto com a vítima deve incluir o afastamento da residência ou do local de trabalho desta e o seu cumprimento deve ser fiscalizado por meios técnicos de controlo à distância”. O crime em análise pode realizar-se através de uma pluralidade de actos, ou através de um único acto, que atinja a saúde física, psíquica ou moral da vítima, que, para o caso que aqui releva, se encontre nas circunstâncias mencionadas na referida alínea d), e afecte a sua dignidade pessoal. As condutas previstas e punidas pelo citado artigo podem ser de várias espécies: maus tratos físicos (isto é, ofensas corporais simples), maus tratos psíquicos (humilhações, provocações, molestações, ameaças mesmo que não configuradoras em si do crime de ameaça, entre outros), tratamento cruel, isto é, desumano. Mister é, porém que, em casos em que não ocorra reiteração da conduta a mesma se restrinja a casos de especial violência. No que concerne ao elemento subjectivo, para que este se verifique exige a lei o dolo, embora já não o específico traduzido na actuação por malvadez ou egoísmo. Ora, no caso vertente cumpre desde logo referir que os factos dados como provados, designadamente nos pontos 1 a 10, não revelam a prática pelo arguido do crime de violência doméstica de que vem acusado. Com efeito, não é por o agente ter atingido uma ou várias vezes o outro elemento do casal que, necessariamente, se configura uma situação de maus tratos que leve a condenação pelo crime de violência doméstica do art. 152.º, do CP. Conforme se refere no Acórdão da Relação de Guimarães, de 3.5.2011: “... II – Os maus tratos constituem ofensa do corpo ou da saúde de outrem. Contudo, nem toda aquela ofensa representa maus tratos, pois estes pressupõem que o agente ofenda a integridade física ou psíquica de um modo especialmente desvalioso e, por isso, particularmente censurável. A ocorrência deste crime pressupõe uma agressão capaz de afectar a dignidade pessoal do cônjuge enquanto tal"]. Não é por a(s) agressão(ões) físicas terem sido praticadas no seio da vida familiar/doméstica que, imediatamente, se mostra excedida a previsão do crime de ofensas à integridade física simples, do artigo 143.º, do CP - tanto mais que, como bem salienta o Acórdão desta Relação de 26.5.2010 [Joaquim Gomes], este tipo de crime acolhe variáveis que têm em conta não só com as especificidades da relação entre agressor e vítima mas também níveis distintos de gravidade e reiteração das agressões [artigos 144.º e 145.º, do CP]”. Conforme refere ainda no Acórdão da Relação do Porto de 13.01.2021, disponível in www.dgsi.pt, que por tão claro se transcreve, “…Há que identificar um traço distintivo entre o crime de violência doméstica e os crimes de ofensas à integridade física, injúrias, ameaças ou outros, praticados contra as potenciais vítimas desse crime. Esse traço distintivo dependerá da perspectiva adotada a respeito do bem jurídico protegido através da incriminação em apreço, De acordo com Plácido Conde Fernandes, esse bem jurídico é «a saúde enquanto manifestação da dignidade da pessoa humana e da garantia da integridade pessoal contra os tratos cruéis, degradantes ou desumanos, num bem jurídico complexo que abrange a tutela da sua saúde física, psíquica, emocional e moral». Para que uma conduta integre o crime em questão, exige-se «uma intensidade do desvalor, da acção e do resultado, que seja apta e bastante a molestar o bem jurídico protegido – mediante ofensa da saúde física, psíquica, emocional ou moral, de modo incompatível com a dignidade da pessoa humana» (in «Violência doméstica – novo quadro penal e processual penal», Revista do CEJ, nº 8 (especial), 1º semestre de 2008, p. 304 a 308). Para André Lamas Leite, «o fundamento último das acções abrangidas pelo tipo reconduz-se ao asseguramento das condições de livre desenvolvimento da personalidade de um indivíduo no âmbito de uma relação interpessoal próxima, de tipo familiar ou análogo» (in «A violência relacional íntima», Julgar, nº 12 (especial), Novembro de 2010, p. 49) (…) Tudo está em saber se, no caso em apreço, estamos perante uma situação de maus tratos psíquicos. Sendo certo que uma qualquer injúria, difamação ou ameaça praticada por ex-cônjuge não configura necessariamente um mau trato psíquico e, portanto, um crime de violência doméstica (…) Podemos afirmar que a conduta do arguido (que não deixa de configura crimes de injúria, difamação e tentativa de coação através de ameaça) não representa um aviltamento da dignidade humana da vítima com a sua “coisificação” que é própria do crime de violência doméstica. E não provocou, por outro lado, danos na saúde psíquica da vítima. Segundo os critérios acima expostos, não estaremos perante um crime de violência doméstica p. e p. pelo artigo 152.º, n.º 1, a), do Código Penal.” No caso vertente os episódios retratados nos factos provados, não representam um potencial de agressão que supere (transcenda) a protecção oferecida pelos crimes de ofensa à integridade física e de injúrias, na medida em que não descrevem uma situação de maus tratos da qual resulte ou seja susceptível de resultar sérios riscos para a integridade física e/ou psíquica da vítima. Não existindo qualquer relação de domínio ou de ascendência do arguido para com a ofendida ou de dependência emocional, ou submissão desta para com aquele, não representando a conduta do arguido um aviltamento da dignidade humana e não sendo a mesma suscpetível de provocar danos na saúde física ou psíquica da ofendida, para além das dores e humilhação sentidas no momento da prática dos factos, afigura-se-nos que a conduta do arguido não é passível de preencher o tipo de violência doméstica. Assim sendo, o arguido terá que ser absolvido da prática do crime pelo qual vem acusado. Entendemos, assim, que a descrita conduta do arguido não é idónea ou suficiente para lesar o bem jurídico protegido no crime de violência doméstica, pelo que deve o mesmo ser absolvido da prática de tal crime. É certo que a descrita conduta poderia eventualmente integrar a prática pelo arguido dos crimes de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143.º, nº 1, do CP (e não qualificada, sendo certo que o episódio retratado nos factos provados referente ao dia ... de ... de 2023 não revela uma especial censurabilidade ou perversidade) e de injúrias, p. e p. pelo artigo 181º do CP. Todavia, importa aqui assinalar, que os crimes de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143.º, nº 1, do CP, e de injúrias, previstos pelo artigo 181º, do CP, estão dependentes de desejo de procedimento criminal por parte da alegada ofendida (queixa – crime), sendo que o crime de injúrias, está ainda dependente de constituição como assistente e de acusação particular (cfr. artigos 143º, nº 2, 188º, nº 1 do CP e 50º, nº 1 do CPP). Ora, no caso vertente a alegada ofendida não se constituiu assistente, nem formulou acusação particular, e nem sequer manifestou o desejo de procedimento criminal contra o arguido. Assim sendo, não pode o arguido ser condenado pela prática de qualquer crime de ofensa à integridade física simples ou de injúria.»
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IV. APRECIAÇÃO DO RECURSO
O âmbito do recurso, conforme jurisprudência corrente, é delimitado pelas suas conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, sem prejuízo naturalmente das questões de conhecimento oficioso do tribunal, cfr. arts. 402.º, 403.º, e 412.º, n.º 1, todos do CPP.
Não tendo sido impugnada a factualidade provada (que acolheu a acusação pública), em decorrência da confissão integral e sem reservas do arguido, a matéria de facto está, agora, definitivamente fixada.
Passemos, então, à apreciação de cada uma das questões de direito processual e substantivo suscitadas.
a. Da alegada omissão de pronúncia:
Na óptica do recorrente, o tribunal de 1.ª instância, atendendo ao enquadramento por si efectuado, deveria ter tomado posição quanto à eventual verificação de outros ilícitos típicos, designadamente, os crimes de injúria, ofensa à integridade física e ameaça.
Dispõe o art. 379.º, n.º 1, al. c) do CPP: «1. É nula a sentença: (…) c) Quando o tribunal deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento».
O tribunal tem o dever de se pronunciar sobre todas as questões relevantes para a decisão a proferir, sendo que o enquadramento jurídico efectuado pelo tribunal de 1.ª instância tem consequências jurídicas que importa analisar, constituindo, sem margem para dúvidas, um ponto relevante, desde logo por força da necessidade de verificar, face ao disposto no n.º 2, al. a), do art. 368.º do CPP, se estão preenchidos outros elementos típicos de qualquer outro ilícito criminal.
No caso vertente, o tribunal de 1.ª instância refere expressamente que relativamente aos, na sua óptica, eventuais/residuais, crimes de injúria e de ofensas não estão reunidas as condições de procedibilidade.
Isto significa que, não deixou se pronunciar sobre a questão que crimes consubstanciariam aqueles factos provados; só não o fez foi em consonância com o ponto de vista do Ministério Público que considera que, para além daqueles, estaria também em causa o crime de ameaça.
Ora, pese embora o recorrente invoque a omissão de pronúncia e a nulidade da sentença por essa via, verdadeiramente não está a invocar fundamentos que se integrem no denominado vício, mas, apenas, a apontar um putativo erro de subsunção.
Pelo exposto, improcede o recurso nesta parte. b. Do erro de direito:
Vejamos, então, se o tribunal de 1.ª instância enquadrou a conduta do arguido de forma correcta, de acordo com o disposto no art. 412.º, n.º 2, als. b) e c) do CPP.
Pensamos que não, aderindo, assim, aos fundamentos aduzidos pelo recorrente.
Estabelece o art. 152.º, n.ºs 1, al. a), 2, al. a), 4 e 5 do CP que: «1 - Quem, de modo reiterado ou não, infligir maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais: (…) b) A pessoa de outro ou do mesmo sexo com quem o agente mantenha ou tenha mantido uma relação de namoro ou uma relação análoga à dos cônjuges, ainda que sem coabitação; (…); é punido com pena de prisão de um a cinco anos, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal. 2 - No caso previsto no número anterior, se o agente: a) Praticar o facto (…), no domicílio comum ou no domicílio da vítima; ou c) A progenitor de descendente comum em 1.º grau; ou (…); é punido com pena de prisão de dois a cinco anos. 3 - (…). 4 - Nos casos previstos nos números anteriores, incluindo aqueles em que couber pena mais grave por força de outra disposição legal, podem ser aplicadas ao arguido as penas acessórias de proibição de contacto com a vítima e de proibição de uso e porte de armas, pelo período de seis meses a cinco anos, e de obrigação de frequência de programas específicos de prevenção da violência doméstica. 5 - A pena acessória de proibição de contacto com a vítima deve incluir o afastamento da residência ou do local de trabalho desta e o seu cumprimento deve ser fiscalizado por meios técnicos de controlo à distância.».
Assim, para o preenchimento do tipo de crime de violência doméstica, que tem natureza dolosa, exige-se, implicitamente, que se verifique uma reiteração ou não, ao longo do tempo, das agressões, insultos, ameaças ou humilhações (formas mais habituais que os “maus tratos” assumem), assim prejudicando a vivência da vítima.
Por traduzir o nosso pensamento, permitimo-nos transcrever parte do Acórdão do TRG, Rel. Manuela Paupério, proferido a 02.11.2015, referente ao processo n.º 77/14.1TAAVV.G1, publicado em http://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:TRG:2015:77.14.1TAAVV.G1.77 : «(…)este tipo legal previne e pune condutas perpetradas por quem afirme e actue, dos mais diversos modos, um domínio, uma subjugação, sobre a pessoa da vítima, sobre a sua vida ou (e) sobre a sua honra ou (e) sobre a sua liberdade e que a reconduz a uma vivência de medo, de tensão, de subjugação. Este é, segundo cremos, o verdadeiro traço distintivo deste crime relativamente aos demais onde igualmente se protege a integridade física, a honra ou a liberdade sexual. O bem jurídico tutelado pela incriminação, assim caracterizado, é plural e complexo, visando essencialmente a defesa da integridade pessoal (física e psicológica) e a protecção da dignidade humana no âmbito de uma particular relação interpessoal. Desta mesma forma ele se encontra caracterizado por André Lamas Leite, Estudo publicado na Revista Julgar, n.º 12, págs. 25 e segs., quando refere que o mesmo tem como fim o «(…) asseguramento das condições de livre desenvolvimento da personalidade de um indivíduo no âmbito de uma relação interpessoal próxima de tipo familiar ou análogo (…)” sendo este bem jurídico multímodo “(…) uma concretização do direito fundamental (artigo 25º da C.R.P.) mas também do direito ao livre desenvolvimento da personalidade (artigo 26º da C.R.P.), nas dimensões não recobertas pelo artigo 25º da Lei Fundamental, ambos emanações diretas do princípio da dignidade da pessoa humana. (…) A degradação, centrada na pessoa do ofendido, desses valores jurídico constitucionais deve ser a pergunta operatória no distingue entre o crime de violência doméstica e todos os outros que, por via do designado concurso legal, com ele se relacionam”. Entre muitos outros, cremos particularmente feliz a síntese contida no sumário do Acórdão desta Relação do seguinte teor: “No ilícito de violência doméstica é objetivo da lei assegurar uma ‘tutela especial e reforçada’ da vítima perante situações de violência desenvolvida no seio da vida familiar ou doméstica que, pelo seu caráter violento ou pela sua configuração global de desrespeito pela pessoa da vítima ou de desejo de prevalência de dominação sobre a mesma, evidenciem um estado de degradação, enfraquecimento ou aviltamento da dignidade pessoal quanto de perigo ou de ameaça de prejuízo sério para a saúde e para o bem-estar físico e psíquico da vítima. Acórdão de Relação do Porto de 28/09/2011 relatado por Artur Oliveira e pesquisado em http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/. (…) Daqui sobressai o que cremos essencial para a caracterização do crime de violência doméstica, que se evidencia da sua génese e evolução: a existência de uma vítima e de um vitimador, este numa posição de evidente dominação e prevalência sobre a pessoa daquela.»
No caso vertente, durante cerca de 8 anos, o arguido dirigiu à sua mulher atitudes, comportamentos e palavras que considerados em separado podem ser anódinos, mas cuja repetição os torna destruidores.
Através da reiterada de injúrias e ameaças (contra a sua integridade física) e da sua ofensa física, quis o arguido impor a sua vontade de desrespeitar e diminuir a vítima, sem qualquer respeito pela sua pessoa.
Da descrição factual resultou, assim, provado que o arguido infligiu maus tratos consubstanciados numa vivência, durante aqueles 8 anos, de permanente subjugação, medo e tensão.
Ou seja, do cotejo da factualidade, resulta à saciedade um estado de degradação e enfraquecimento da dignidade pessoal quanto de perigo ou de ameaça de prejuízo sério para a saúde e para o bem-estar físico e psíquico da ofendida, o que o arguido quis e concretizou.
Estão, pois, preenchidos os elementos típico do crime por que vinha acusado, devendo assim, ser condenado. c. Da medida concreta da pena e da(s) pena(s) acessória(s):
i. Uma vez feita a qualificação jurídica dos factos, é chegado o momento de determinar a medida concreta da pena aplicável ao arguido.
Ao crime de violência doméstica praticado pelo arguido corresponde a moldura penal abstracta de prisão de 2 a 5 anos (cfr. art. 152º, n.ºs 1, al. a) e 2 al. b) do CP).
Nos termos do art. 40.º do C.P., a aplicação da pena visa a protecção de bens jurídicos (prevenção geral) e a reintegração do agente na sociedade (prevenção especial), não podendo a pena em caso algum ultrapassar a medida da culpa.
A determinação da medida concreta da pena faz-se, nos termos do art. 71.º do C. Penal, em função da culpa do agente, tendo ainda em conta as exigências de prevenção de futuros crimes e atendendo a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime (estas já foram tomadas em consideração ao estabelecer-se a moldura penal do facto), deponham a favor do agente ou contra ele.
Sem violar o princípio da proibição da dupla valoração pode ainda atender-se à intensidade ou aos efeitos do preenchimento de um elemento típico e à sua concretização segundo as especiais circunstâncias do caso, já que o que está aqui em causa são as diferentes modalidades de realização do tipo (neste sentido, Figueiredo Dias, “As consequências jurídicas do crime”, pág. 234).
Como é consabido que, até pela forma como os média divulgam tal situação, a violência conjugal assume proporções alarmantes na nossa sociedade, apesar do novo milénio, com grandes avanços técnico-científicos inigualáveis noutros estádios anteriores da nossa civilização. Mas apesar disso, existem comportamentos do homem que ainda o mantêm num estado primário de desenvolvimento, onde a violência entre os homens era a regra de domínio e sobrevivência.
Efectivamente, perante uma evolução positiva nos ditos campos, o homem mantém em certos casos uma inexplicável regressão em termos afectivos e emocionais, apresentando comportamentos que em nada os distanciam dos nossos mais longínquos antepassados.
Fazendo jus à sua função de direito de primeira protecção dos bens jurídicos essenciais ao viver em sociedade, o Direito Criminal não pode pactuar com esta situação e acabar também ele por sancionar levemente estas actuações, deixando a ideia de que são toleradas pela sociedade.
Com efeito, como caso dos autos não é infelizmente singular, o que coloca exigências acrescidas quer da prevenção geral quer da prevenção especial, devem as decisões dos tribunais, a propósito de tais casos, não deixar que subsista a menor hesitação sobre a proibição de tais comportamentos, sobre a validade da norma violada, isto é, devendo as decisões dos tribunais ser pacificadoras e estabilizadoras.
Dito de outro modo, o crime de violência doméstica causa, pelos seus contornos e pelas suas consequências, enorme sobressalto cívico, tem convocado crescentes medidas e atenção acrescidas por parte das autoridades para a sua prevenção, sendo responsabilidade do Estado proteger as vítimas deste crime, sendo o homicídio um cenário muito provável neste caso – basta atentar, aliás, ao último o relatório da GREVIO sobre sistema de prevenção e combate à violência contra as mulheres em Portugal, a 27.05.2025, elaborado pelo peritos do Conselho Europeu e amplamente divulgado (https://www.cig.gov.pt/2025/05/publicado-relatorio-grevio-sobre-sistema-de-prevencao-e-combate-a-violencia-contra-as-mulheres-em-portugal/ ).
Concretizando, agora, a pena, ter-se-á em atenção, como sempre, a culpa do arguido, as exigências preventivas que o caso coloca, bem como as demais circunstâncias atinentes.
Há, pois, que relevar especialmente o seguinte:
- o dolo intenso (directo, dada a definição do art. 14.º, n.º 1 do CP);
- a ilicitude, que é já acentuada, dados os concretos actos (de violência psicológica com sucessivos rebaixamentos da pessoa da ofendida) em que se consubstanciou a conduta do arguido contra a sua então companheira e mão do seu filho;
- o arguido encontra-se social, familiar e profissionalmente integrado, não lhe sendo conhecidos antecedentes criminais, o que faz diminuir as exigências de prevenção especial, tendo confessado integralmente os factos.
Sopesando todos os factores enunciados, considera-se adequado, crendo que assim se satisfazem as finalidades de tutela dos bens jurídicos, sem desatender ao máximo que nos é fornecido pela culpa do arguido, aplicar-lhe a pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão.
A pena aplicada, porque não superior a 5 anos, pode ser suspensa na sua execução.
Pressuposto formal de aplicação do instituto da suspensão da execução da pena é, como já se disse, que a pena seja de prisão em medida não superior cinco anos.
Pressuposto material de aplicação do instituto da suspensão da execução da pena é que o tribunal conclua que “a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição” – cfr. art. 50.º, n.º 1 do C.P..
A prognose exige uma valoração total de todas as circunstâncias que tornam possível uma conclusão sobre a conduta futura do arguido. Estas circunstâncias são a sua personalidade (por ex., inteligência e carácter), a sua vida anterior (por exemplo, outros delitos anteriormente cometidos da mesma ou de outra natureza), as circunstâncias do delito (por exemplo motivações e fins), o seu comportamento depois de ter cometido o crime (por exemplo reparação do dano, arrependimento), as circunstâncias da sua vida (por exemplo, profissão, casamento e família) e os efeitos que se esperam da suspensão.
Porém, ainda que centrada na pessoa do arguido no momento actual e na avaliação da respectiva capacidade de socialização em liberdade, ou seja, em considerações radicadas na prevenção especial, a decisão que aprecie a propriedade de escolha por esta, ou outra, pena de substituição, deve atender igualmente às exigências de ponderação geral positiva, para que a reacção penal responda adequadamente às expectativas comunitárias na manutenção (e reforço) da validade da norma violada e assegure a protecção do bem jurídico afectado, como imposto pela parte final do n.º 1 do art. 50.º do Código Penal.
Esse necessário balanceamento entre as finalidades de prevenção geral positiva e de prevenção especial de socialização, em que a primeira exerce função limitadora da segunda, encontra relação directa com a gravidade da pena e a proximidade do limite de admissibilidade da pena de substituição.
Neste ponto, as questões que se colocam passam por aquilatar se existem condições para confiar que o arguido será capaz de se ressocializar em liberdade, sem voltar a práticas similares à aqui censurada, e, mesmo que esse risco fundado possa ser afirmado, se a pena de substituição não coloca em causa o limite mínimo de prevenção geral constituído pela defesa irrenunciável do ordenamento jurídico.
Pois bem, no caso concreto, sem prescindir da necessidade de reprovação, que deve ser vincada, em atenção ao crime e às aludidas exigências de prevenção geral, e das cautelas impostas pelas acima abordadas exigências de prevenção especial, afigura-se-nos que, face à ausência de antecedentes criminas e às suas actuais condições de vida, entendemos que uma pena privativa da liberdade poderia colocar em causa, o seu actual processo de reinserção.
Isto significa que a censura do facto e a ameaça da pena, constituindo sério aviso para o mesmo, realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, crendo-se, ainda, que a reprovação pública inerente à pena suspensa e o castigo que ela envolve, satisfazem o sentimento jurídico da comunidade e, consequentemente, as exigências de prevenção geral de defesa da ordem jurídica.
Em conformidade com tudo o acabado de expender, decide-se suspender a execução da pena de prisão imposta ao arguido por igual período de tempo.
A suspensão será, porém, acompanhada de regime de prova, por se considerar o mesmo conveniente e adequado a promover a reintegração deste na sociedade - cfr. art. 53.º, n.º 1, do Código Penal -, regime esse que vigorará durante o período de suspensão e que assentará num plano de reinserção social executado com vigilância e apoio dos serviços de reinserção social, orientado para a problemática da violência contra a pessoa humana, independentemente do respectivo género.
ii. Das penas acessórias previstas no art. 152.º, n.ºs 4 e 5 do Código Penal: Considerando os factores anteriormente enunciados, afigura-se-nos não ser necessária a aplicação (que é facultativa) de alguma pena acessória, em face da factualidade provada quanto às suas condições pessoais.
d. Do direito ao arbitramento de uma indemnização civil à vítima:
Nos termos conjugados das disposições legais previstas nos arts. 16.º, do Estatuto da Vítima, aprovado pela Lei n.º 130/2015, de 04.09, 67º-A e 82º-A, do C.P.P., resulta a imposição (excepto nos casos em que a vítima expressamente se opuser) de arbitrar, em relação a vítimas especialmente vulneráveis, uma reparação pelos danos sofridos, a suportar pelo agente do crime.
No caso vertente, não tendo sido deduzido um pedido de indemnização civil no processo penal pela ofendida, nem, tanto quanto se sabe, em separado e também não se opôs expressamente a que lhe fosse arbitrada quantia reparadora, o tribunal terá obrigatoriamente que fixar uma quantia a título de reparação dos prejuízos sofridos.
No entanto, como se diz no Ac. do TRL de 26.02.2019, referente ao processo n.º 54/16.8PEALM.L1-5, Rel. Artur Vargues, publicado in http://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:TRL:2019:54.16.8PEALM.L1.5.A9«não há que chamar à colação para a respectiva determinação as normas relativas à responsabilidade civil extracontratual, visto que a sua atribuição não é regulada pela lei civil, mas de acordo com o disposto nos artigos 16º, do Estatuto da Vítima, aprovado pela Lei nº 130/2015, de 04/09, 67º-A e 82º-A, do CPP, sendo que estes se não reportam a uma verdadeira indemnização, mas à reparação dos prejuízos – uma vez que a quantia é tida em conta em acção que venha a conhecer o pedido civil de indemnização, de acordo com o nº 3, do mesmo artigo - figuras jurídicas não exactamente coincidentes, pelo que somos levados a concluir que o que o legislador pretendeu foi a fixação de reparação, ainda que tenha utilizado de forma lata o termo “indemnização”, o que conduz a que seja calculada de acordo com a equidade».
Atendendo a estas considerações e à matéria de facto assente, decide-se arbitrar a indemnização no valor de 2.000,00€.
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Atendendo à condenação do arguido por este Tribunal, vai, ainda, condenado nas custas do processo, fixando-se em 2 UC, reduzida a metade, nos termos do art. 344.º, n.º 2, al. c) do CPP (cfr. arts. 513.º e 514.º do C.P.P., e arts. 3.º n.º 1 e 8.º n.º 9 do RCP e Tabela III anexa a tal diploma).
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IV. DECISÃO
Nos termos e pelos fundamentos expostos, acorda-se em julgar parcialmente procedente o recurso do Ministério Público, e em consequência:
a. Condena-se o arguido AA, como autor material, de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.º, n.ºs 1, als. b) e c), 2, al. a) do Código Penal, na pena de 2 (dois) meses e 6 (seis) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo, sujeita a regime de prova, que assentará num plano de reinserção social executado com vigilância e apoio dos serviços de reinserção social, orientado para a problemática da violência contra a pessoa humana, independentemente do respectivo género;
b. Arbitra-se, nos termos das disposições conjugadas dos arts. 67.º-A, n.º 1, al. b) e 82.º-A, ambos do CPP, do art. 16.º, n.º 2 do Estatuto da Vítima e art. 21.º da Lei nº 112/2009, de 16.09, a indemnização no valor de 2.000,00€ (dois mil euros);
c. Condena-se o arguido nas custas do processo, fixando-se em 2 UC, reduzida a metade, nos termos do art. 344.º, n.º 2, al. c) do CPP (cfr. arts. 513.º e 514.º do C.P.P., e arts. 3.º n.º 1 e 8.º n.º 9 do RCP e Tabela III anexa a tal diploma).
Sem custas, por delas estar isento.
Notifique.
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Lisboa, 25 de Setembro de 2025
Marlene Fortuna
Anas Paula Guedes
Ana Marisa Arnêdo