SIMULAÇÃO
ACTO DISSIMULADO
ÓNUS DA PROVA
Sumário

Sumário1:
Em caso de simulação, é sobre o Autor que recai o ónus de provar os factos que permitem concluir sobre a existência de um negócio dissimulado.

Texto Integral

Recurso de Apelação n.º 1374/18.2T8STR.E1

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora,


I. Relatório


1. AA, Advogado, intentou ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra BB e CC, pedindo que se declare válida uma cessão de créditos realizada por este último em seu benefício e que aquele réu seja condenado a pagar-lhe a quantia de € 105.000,00, acrescida de juros moratórios vencidos e vincendos até integral pagamento


2. Para o efeito alegou, em síntese, que prestou vários serviços como Advogado para CC, os quais ainda não se mostram integralmente pagos, que na sequência da revogação de um contrato-promessa de compra e venda de participações sociais de uma sociedade proprietária de uma farmácia, que os réus haviam celebrado entre si, foi acordado que a quantia que CC iria receber do co-Réu a propósito daquela desvinculação se destinaria a liquidar a dívida de honorários, sendo para esse efeito cedida ao autor.


Referiu ainda que, uma vez que CC atravessava problemas financeiros, o nome dele não podia surgir na documentação inerente àquela revogação, pelo que foi decidido elaborar o documento denominado “Confissão de dívida e acordo de pagamento”, que faz referência a um contrato de compra e venda de duas pinturas que as partes nunca quiseram celebrar e que apenas serviu para titular a cedência do crédito. Sendo o contrato dissimulado válido, constituiu-se o réu BB na obrigação de pagar a quantia peticionada, que corresponde ao remanescente do crédito originário, no valor de € 105.000,00, uma vez que já recebeu, através de um cheque a si endossado, a quantia de € 45.000,00.


3. Citados, os Réus apresentaram contestação impugnando os factos alegados pelo autor e sustentando a nulidade da cessão de créditos por falta de forma e a existência de litispendência.


Mais alegaram os réus que o autor litiga de má-fé, pelo que deve ser condenado no pagamento de uma indemnização e de uma multa.


4. Por sentença já transitada em julgado foi homologada a desistência do pedido quanto ao réu CC.


5. Realizou-se a audiência prévia, na qual se procedeu à fixação do objeto do processo, à identificação dos temas da prova e se julgou a exceção de litispendência improcedente.


6. Procedeu-se à realização da audiência final, após o que veio a ser proferida sentença, com o seguinte dispositivo:


“Pelo exposto e de harmonia com a fundamentação que antecede, julgo esta acção totalmente procedente e em consequência:


- Condeno o réu a pagar ao autor a quantia de € 105.000,00 (cento e cinco mil euros), acrescida de juros moratórios vencidos desde 3 de Dezembro de 2013 e vincendos até integral pagamento, calculados à taxa aplicável às obrigações civis;


- Absolvo o autor do pedido de condenação como litigante de má-fé.


Custas pelo réu.


Notifique e registe.”


7. Inconformado interpôs o Réu recurso, o qual motivou, concluindo, após despacho de aperfeiçoamento, do seguinte modo:


1) O presente recurso vem interposto da sentença em crise, proferida em sede de 1ª instância, que fez errada valoração da prova e, em consequência, errada decisão condenatória e com a qual o ora Recorrente não pode, de modo algum, conformar-se;


2) Porque, com interesse para uma boa decisão, interessa analisar, nem que seja em traços gerais, o “perfil” dos ora Recorrido e Recorrente que no corpo desta alegação atrás melhor se descreveu;


3) O tribunal a quo no 2§ da sentença em crise, em síntese, condensou os factos alegados pelo Recorrido e, numa síntese ainda maior, condensou a defesa apresentada pelo ora Recorrente;


4) Porque entendemos ser necessário, para uma boa decisão da causa, fazer o enquadramento de tudo quanto interessa, lembramos o nosso requerimento apresentado em 19-11-2018 --Citius REFª: 30739518- que convidamos a revisitar, onde, com um maior rigor, se enuncia os factos alegados pelo Recorrido e os pedidos subsequentes;


5) Assim, na óptica do tribunal a quo, aparecem numerados de 1 a 28 os factos que, por provados, interessam à boa decisão da causa;


6) Tudo em manifesta oposição aos factos dados como não provados –maioritariamente alegados pelo Recorrente- que, embora não enumerados nem por alíneas (o que agora se fez para facilidade), constam na sentença em crise a fls. 4 a 7;


7) É sobejamente conhecido que cabe a quem invoca um direito fazer prova dos factos, constitutivos, por ele alegados. --artº342 C.C.;


8) Nos presentes autos, em sede de julgamento, por parte do Recorrido só este prestou depoimento quer como “Depoimento de Parte” quer como “Declarações de Parte”. --artºs.452º e seguintes do CPC, já que prescindiu de todas as testemunhas por si arroladas, colegas de escritório e suas empregadas que certamente poderiam, a serem verdadeiros, corroborar os factos por si alegados;


9) Já por parte do Recorrente o seu depoimento quer como “Depoimento de Parte” quer como “Declarações de Parte” foi acompanhado pela única testemunha ouvida em julgamento que foi CC;


10) Mesmo assim, o tribunal a quo, na sentença em crise, acreditou num, num só, depoimento contra dois depoimentos que resultaram idênticos porque correspondem essencialmente à verdade dos factos o que torna imperioso para uma boa decisão a causa o Tribunal de Recurso ouvir integralmente os três depoimentos prestados para que assim possa decidi em matéria de facto com a convicção que certamente exige a si próprio;


11) O tribunal a quo deu erradamente como provados os factos, respectivamente, elencados sob os nºs. 3, 6, 7, 8, 9, 10, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, e 26, todos por manifesta oposição à prova efectivamente produzida em Julgamento e bem assim à prova documental que resulta dos autos;


12) Já quanto aos factos tratados sob os nºs. 1, 2, 4, 5, 11, 21, 22, 23, 24, 25, 27 e 28 (todos porque inócuos) o ora Recorrente aceita a apreciação que quanto a eles foi feita;


13) No que respeita a todos os factos dados como não provados, em oposição frontal aos factos dados como provados, entende o Recorrente que todos os factos elencados na decisão em crise, sem numeração nem sob alíneas mas que atrás se identificaram com alíneas, ou seja os factos constantes supra nas alíneas a) a s) devem ser dados como provados face à prova produzida em Julgamento e bem assim à prova documental que resulta dos autos;


14) Facto numerado como 3 na matéria de facto provada:


Nelas intervieram o réu, CC, o autor, na qualidade de Advogado deste último, o Dr. DD, Advogado e irmão do réu, e a Dra. EE, Advogada do escritório do autor;


15) Para prova deste facto o Tribunal “a quo”, erradamente, socorreu-se unicamente do depoimento do ora Recorrido, sobrevalorizando-o, desvalorizando os depoimentos quer do ora Recorrente quer da testemunha ouvida em julgamento;


16) Ora, sobre a versão do ora Recorrido, só secundada pelo próprio, temos em súmula e concretizando, cumprindo assim o estatuído no nº.2-a) do artº.640 do CPC, o registado no programa H@bilus iniciado às 10h41m e findo às 12h31m, acta julgamento de 23-10-2023, mais precisamente minutos 00:31:54 a 00:32:14 (inclusive), 01:02:26 a 01:02:50 (inclusive), 00:40:07, 00:49:00, 00:49:02 e 00:50:14, 01:22:08, 01:28:51, 01:30:16 e 01:39:07;


17) Já sobre a versão do ora Recorrente temos, em súmula, o seu depoimento registado no programa H@bilus iniciado às 09h34m e findo às 10h40m, acta julgamento de 23-10-2023, mais precisamente minutos 00:07:09, 01:02:35 a 01:02:51 (inclusive);


18) Corroborado pelo testemunho de CC registado no programa H@bilus iniciado às 14h13m e findo às 15h33m, acta julgamento de 23-10-2023, mais precisamente minutos 00:45:43a 0046:01 (inclusive);


19) Assim, e numa análise mais fina da prova dever-se-ia dar como provado em 3 que --artº. 640-1-c) CPC:


“Nelas intervieram o réu, CC, o autor, na qualidade de Advogado deste último, e o Dr. DD, Advogado e irmão do réu.”;


20) Tudo levando a que fosse dado como provado o facto enunciado como a) dos factos não provados;


21) Facto numerado como 6 na matéria de facto provada:


Aquando da realização daquelas reuniões, o autor tinha sobre o réu um crédito por dívidas de honorários já vencidas no montante superior a € 300.000,00.;


22) É verdade que o tribunal a quo deu como provado o facto numerado como 6 dos factos provados. Mas fê-lo cometendo, antes de mais, um erro, no mínimo grosseiro, quando deu como provado que o Autor, o ora Recorrido, tinha um crédito sobre o Réu, o ora Recorrente, por dívidas de honorários de mais de €300.000,00;


23) Bem se sabendo que Recorrente e Recorrido tão pouco se conheciam aquando das reuniões havidas em Novembro de Dezembro de 2011;


24) Nesse sentido o próprio Recorrido deixou expresso no seu depoimento, registado no programa H@bilus iniciado às 10h41m e findo às 12h31m, acta julgamento de 23-10-2023, mais precisamente minutos 00:01:47 a 00:01:57 (inclusive), 00:16:58, 00:25:43, 00:56:14, e 00:57:16 a 00:57:52 (inclusive);


25) Assim, nunca poderia ter sido dado como provado o facto enumerado em 6 dos factos provados;


26) Ora, face à prova produzida em julgamento, que se transcreveu supra cumprindo a alínea a) do nº.2 do artº640 do CPC, e à não prova feita pelo ora Recorrido de que lhe eram devidos mais de €300.000,00, impunha-se que o ponto 6 dos factos provados fosse dado como NÃO PROVADO passando em consequência para a secção dos factos não provados ou mesmo deixando de figurar como enunciado como matéria de interesse para o objecto do processo;


27) Facto numerado como 7 na matéria de facto provada:


Na reunião ocorrida no dia 28 de Novembro de 2011, foi acordado fazer o distrate amigável daquele contrato-promessa, obrigando-se o réu a devolver a CC a quantia de € 150.000,00, o que seria realizado na reunião de 2 de Dezembro de 2011.;


28) Este facto dado como provado vem em frontal oposição como os factos dados como não provados sob as alíneas --enumeradas pelo ora Recorrente nesta alegação-- como, alíneas c), d), e), f), g), h), i), j), k), l), m), n), o), p), q), r), e s);


29) A verdade é que o Tribunal a quo estribou-se, também aqui, unicamente no depoimento do ora Recorrido que, tal como já se disse é parte interessada no processo, tudo ao arrepio do depoimento do Recorrente, que igualmente é parte interessada no processo, mas este com a diferença de ter sido secundado pela testemunha CC;


30) É verdade que o Recorrido afirmou ao longo do seu depoimento que no dia da 1ª reunião (28 de Novembro de 2011) foi acordado fazer o distrate amigável do contrato promessa referido no facto 4 dos factos provados o que aliás é igualmente afirmado quer pelo Recorrente e testemunha CC;


31) Onde as diferenças se acentuam, e de forma inconciliável, é que nessa 1ª reunião de 28 de Novembro de 2011, ou mesmo na 2ª reunião de 2 de Dezembro de 2011, tivesse sido acordado entre o Recorrente e a testemunha CC a devolução de €150.000,00 pela resolução amigável (distrate) do tal contrato referido no facto 4 dos factos provados;


32) Pois o que foi acordado, conforme prova produzida em julgamento e acima transcrita, foi precisamente o que consta dos factos constantes nas alíneas a) a l) --enumeradas pelo ora Recorrente nesta alegação;


33) Ou seja, o ora Recorrido apresenta uma versão dos factos na qual Recorrente e testemunha CC acordaram, a troco de €150.000,00 pagos pelo Recorrente à testemunha, resolver (distratar) o contrato promessa referido no facto 4 dos factos provados --registado no programa H@bilus iniciado às 10h41m e findo às 12h31m, acta julgamento de 23-10-2023, mais precisamente minutos 00:22:10, 00:25:43, 00:28:29 a 00:29:02 (inclusive), 00:29:10 a 00:29:49 (inclusive), 00:32:25 a 00:35:44 (inclusive);


34) Só que, quer o Recorrente quer a testemunha CC negam por completo a versão trazida pelo ora Recorrido, o que fazem com precisão tal como ficou gravado em audiência de julgamento;


35) Ora, sobrea versão do ora Recorrido, só secundada pelo próprio, temos em súmula e concretizando, cumprindo assim o estatuído no nº.2-a) do artº.640 do CPC, o seguinte; --registado no programa H@bilus iniciado às 10h41m e findo às 12h31m, acta julgamento de 23-10-2023, mais precisamente minutos 00:22:10, 00:25:43, 00:28:29 a 00:29:02 (inclusive), 00:29:10 a 00:29:49 (inclusive), 00:32:25 a 00:35:44 (inclusive);


36) Já sobre a versão do ora Recorrente, secundada pela testemunha CC, temos em súmula e concretizando os passos mais relevantes, cumprindo assim o estatuído no nº.2-a) do artº.640 do CPC, o registado no programa H@bilus iniciado às 09h34m e findo às 10h40m, acta julgamento de 23-10-2023, mais precisamente minutos 00:07:09, 00:08:32, 00:11:39;


37) E, sobre a versão da testemunha CC, coincidente com a versão trazida pelo ora Recorrente, temos em súmula e concretizando os passos mais relevantes, cumprindo assim o estatuído no nº.2-a) do artº.640 do CPC, o registado no programa H@bilus iniciado às 14h13m e findo às 15h33m, acta julgamento de 23-10-2023, mais precisamente minutos 00:01:54 a 00:07:30 (inclusive), 00:28:30 a 00:31:23


38) Ora, face à prova produzida em julgamento pelo Recorrente e pela testemunha CC, que se transcreveu no corpo desta alegação cumprindo a alínea a) do nº.2 do artº640 do CPC, arrasadora e que deixou à evidência a falsidade da versão trazida pelo Recorrido, impunha-se que o ponto 7 dos factos provados fosse dado como NÃO PROVADO passando em consequência para a secção dos factos não provados ou mesmo deixando de figurar como enunciado como matéria com interesse para o objecto do processo;


39) Passando, pelo contrário, os factos dados como não provados nas alíneas a) a l) --enumeradas pelo ora Recorrente nesta alegação--como factos provados, pois os mesmos refletem a verdade do que aconteceu nas reuniões de 28 de Novembro e 2 de Dezembro, ambas de 2011, e o posterior a elas;


40) Facto numerado como 8 na matéria de facto provada:


Neste contexto, o autor e CC acordaram que a quantia de € 150.000,00 se destinaria a abater à dívida de honorários, mediante cedência ao autor daquele crédito.;


41) Necessariamente, até pela demonstração já feita do erro em ter sido dado como provado o facto 7 constante da matéria de facto provada, até só por isso, tem de ser dado como não provado;


42) Sobre a versão do ora Recorrido, só secundada pelo próprio, temos em súmula e concretizando, cumprindo assim o estatuído no nº.2-a) do artº.640 do CPC, o registado no programa H@bilus iniciado às 10h41m e findo às 12h31m, acta julgamento de 23-10-2023, mais precisamente minutos 00:36:07, 00:47:48 a 00:50:14 (inclusive);


43) Já sobre a versão do ora Recorrente, corroborada pela testemunha CC, temos o registado no programa H@bilus iniciado às 09h34m e findo às 10h40m, acta julgamento de 23-10-2023, mais precisamente minutos 00:36:20, 00:36:48, 00:36:53, 00:37:17, 00:37:25, depoimento do ora Recorrente, e o registado no programa H@bilus iniciado às 14h13m e findo às 15h33m, acta julgamento de 23-10-2023, mais precisamente minutos 00:08:26 a 00:12:59 (inclusive), 00:17:58 a 00:22:14 (inclusive), depoimento da testemunha CC;


44) Assim, face à prova produzida em julgamento pelo Recorrente e pela testemunha CC, que se transcreveu cumprindo a alínea a) do nº.2 do artº640 do CPC, arrasadora e que deixou à evidência a falsidade da versão trazida pelo Recorrido, impunha-se que o ponto 8 dos factos provados fosse dado como NÃO PROVADO passando em consequência para a secção dos factos não provados ou mesmo deixando de figurar como enunciado como matéria com interesse para o objecto do processo, passando, pelo contrário, o facto dado como não provado na alínea c) --enumerada pelo ora Recorrente nesta alegação-- como facto provado, pois o mesmo reflete a verdade do que aconteceu nas reuniões de 28 de Novembro e 2 de Dezembro, ambas de 2011, e o posterior a elas;


45) Ou seja, de facto a eventual dívida de €105.000,00 que o Recorrente poderia ter para com a testemunha CC estaria sempre dependente que o stock existente e pago a fornecedores na Farmácia 1 em Cidade 1 alcançasse o valor estimado por CC à data dessas duas reuniões de Novembro e Dezembro de 2011, o que de facto não se verificou;


46) Facto numerado como 9 na matéria de facto provada:


O réu compareceu na reunião do dia 2 de Dezembro de 2011 apenas munido do cheque n.º ..., sacado sobre o Banco Santander e já integralmente preenchido quanto ao valor (€ 45.000,00], data (2 de Dezembro de 2011) e beneficiário (CC).;


47) É verdade que o Recorrido afirmou ao longo do seu depoimento que o Recorrente levou o referido cheque previamente assinado, datado, endossado e preenchido quanto ao seu valor para a reunião de dia 2 de Dezembro;


48) Só que esta versão é falsa como à saciedade resulta dos depoimentos quer do Recorrido quer da testemunha CC que foram perentórios ao afirmar que o cheque de €45.000,00, sacado sob o Banco Santander, foi preenchido e assinado precisamente nessa reunião de 2 de Dezembro de 2011;


49) Ora, sobre a versão do ora Recorrido, só secundada pelo próprio, temos em súmula e concretizando, cumprindo assim o estatuído no nº.2-a) do artº.640 do CPC, o registado no programa H@bilus iniciado às 10h41m e findo às 12h31m, acta julgamento de 23-10-2023, mais precisamente minutos 00:22:10, 00:30:36, 00:43:28 a 00:43:49 (inclusive), 00:59:50 a 01:00:05 (inclusive), 01:26:08;


50) Ao invés, e sobre este tema, o depoimento do ora Recorrente que é secundado pelo depoimento da testemunha CC deixa claro que o cheque estivesse previamente assinado, datado, preenchido quanto ao valor e endossado, pelo que, cumprindo assim o estatuído no nº.2-a) do artº.640 do CPC, temos o registado no programa H@bilus iniciado às 09h34m e findo às 10h40m, acta julgamento de 23-10-2023, mais precisamente minutos 00:08:32, 00:15:22, 00:17:00;


51) Depoimento corroborado como já se disse pela testemunha CC e registado no programa H@bilus iniciado às 14h13m e findo às 15h33m, acta julgamento de 23-10-2023, mais precisamente minutos 00:25:22 a 00:26:02 (inclusive), 00:41:10 a 00:41:56 (inclusive), 00:52:34;


52) Assim, face à prova produzida em julgamento pelo Recorrente e pela testemunha CC, que se transcreveu cumprindo a alínea a) do nº.2 do artº640 do CPC, arrasadora e que deixou à evidência a falsidade da versão trazida pelo Recorrido de que o cheque vinha previamente preenchido, assinado e endossado, impunha-se que o ponto 9 dos factos provados fosse dado como NÃO PROVADO passando em consequência para a secção dos factos não provados ou mesmo deixando de figurar como enunciado como matéria com interesse para o objecto do processo;


53) Passando, pelo contrário, o facto dado como não provado na alínea i) --enumerada pelo ora Recorrente nesta alegação-- a facto provado, pois o mesmo reflete a verdade do que aconteceu ou seja, estabeleceu-se, por sugestão do Autor (ora Recorrido) que fosse, então e na hora, paga a quantia de €45.000,00, a qual havia sido indicada pelo Réu (ora Recorrente) como a que estava efectivamente liquidada aos fornecedores, e que fosse diferido para momento posterior o pagamento da quantia que se viesse a verificar também paga aos fornecedores e que excedesse os €45.000,00;


54) Facto numerado como 10 na matéria de facto provada:


Na sequência do acordo referido no n.º 8, CC endossou o cheque ao autor.;


55) Também aqui andou mal o tribunal a quo pois este facto nunca poderia ser dado como provado, bem pelo contrário;


56) Na verdade, é o próprio Recorrido quem afirmou ao longo do seu depoimento que o cheque de €45.000,00 foi depositado numa conta titulada pelo seu colega Dr. FF porque o Recorrido estava num processo de divórcio;


57) O que pode e deve ser dado como provado é o facto que consta na alínea i) nos factos não provados -assim enumerada pelo ora Recorrente nesta alegação;


58) Sobre a versão do ora Recorrido, só secundada pelo próprio, temos em súmula e concretizando, cumprindo assim o estatuído no nº.2-a) do artº.640 do CPC, o registado no programa H@bilus iniciado às 10h41m e findo às 12h31m, acta julgamento de 23-10-2023, mais precisamente minutos 00:40:07 a 00:00:43:30 (inclusive);


59) Sobre este tema, o depoimento do ora Recorrente é naturalmente muito reduzido até porque este foi um tema a ser abordado entre CC e o ora Recorrido, mas, mesmo assim, em súmula e concretizando os passos mais relevantes, cumprindo assim o estatuído no nº.2-a) do artº.640 do CPC, temos o registado no programa H@bilus iniciado às 09h34m e findo às 10h40m, acta julgamento de 23-10-2023, mais precisamente minutos 00:13:16 a 00:13:44 (inclusive), 00:16:51 a 00:17:00;


60) Assim, face à prova junta aos autos - doc.2 junto com a contestação (cheque) -- acompanhada da prova produzida em julgamento, principalmente o depoimento do ora Recorrido, ficamos a saber sem qualquer dúvida que o cheque de €45.000,00 foi endossado em branco pela testemunha CC e que o mesmo foi depositado numa conta de terceiro que não o Recorrido, prova que se transcreveu cumprindo a alínea a) do nº.2 do artº640 do CPC, pelo que se impunha que o ponto 10 dos factos provados fosse dado como NÃO PROVADO (nos termos em que o foi) passando a dar-se no limite como provado que o cheque de €45.000,00 foi endossado em branco pela testemunha CC, entregue ao ora Recorrido e que depois foi depositado numa conta titulada por terceiros;


61) Passando, pelo contrário, o facto dado como não provado na alínea K) --enumerada pelo ora Recorrente nesta alegação-- a facto provado, pois o mesmo reflete a verdade do que aconteceu ou seja, foi no contexto das reuniões havidas, e porque não houve de momento consenso quanto ao real valor dos Stocks existentes e pagos na Farmácia 1 o réu (ora Recorrente) emitiu o cheque de €45.000,00 e o endossou a CC --doc.2 junto com a contestação;


62) Factos numerados como 11, 12, 13, 14, 15, na matéria de facto provada:


11-Ainda na mesma reunião, fruto das dificuldades económicas que à data CC atravessava e por forma a evitar que os seus credores pudessem reagir contra si, foi pelo mesmo pedido que a declaração de dívida não identificasse a verdadeira origem do crédito.


12-O autor e o réu aceitaram este pedido e por todos foi acordado redigir o documento nº1 junto com a petição inicial, denominado “Confissão de dívida e Acordo de Pagamento”, no qual se pode ler o seguinte: “ Eu abaixo assinado, GG (…) confesso-me devedor da quantia de € 105.000,00 (cento e cinco mil euros) a AA (…) resultante da compra que lhe fiz de 2 (duas) pinturas a óleo (marinhas, século XVIII, escola holandês; e ii) obrigo-me a pagar a mesma quantia no prazo de 2 (dois) anos contados da presente data(…)”.


13-Ao aceitarem a elaboração e subscrição daquele documento, a real intenção do autor, do réu e de CC era permitir a cedência, em benefício do autor, do crédito que CC tinha sobre o réu, no montante de € 105.000,00, sem se fazer qualquer referência à verdadeira proveniência do mesmo.


14-Nessa mesma reunião foi acordado que o pagamento, pelo réu ao autor, do montante de € 105.000,00 seria feito no prazo de dois anos a contar dessa data.


15-O crédito cedido destinava-se a liquidar parte da dívida de honorários que CC tinha para com o autor.;


63) Este tema já foi abordado supra quando demonstrado o erro em dar-se como provado o facto nº.7 dos factos provados, mas por ser o “núcleo da questão” exige-se, mesmo tornando-se fastidioso, voltar a abordá-lo;


64) Os dois primeiros factos, numerados de 11 e 12, desacompanhados dos demais dados como provados, ou seja, vistos por si só, correspondem, embora à míngua, à verdade;


65) Acontece que vêm seguidos de outros, os nºs.13, 14 e 15 que foram erradamente dados como provados e por isso, na “estória” que o tribunal a quo acreditou como verdadeira, estão num contexto e têm uma conotação que não podemos deixar passar em branco;


66) Na verdade, há elementos probatórios mais que suficientes nos autos para, contrariamente ao decidido, dar como provados os factos que constam nas alíneas c), d), e), f), g), h), i), j), k), l), m), n), o), p), q), r), e s), nos factos não provados --assim enumerada pelo ora Recorrente nesta alegação-- e que ao fim e ao cabo é tudo o que resulta da prova existente nos autos e produzida em julgamento;


67) Sobre a versão do ora Recorrido, de que não houve qualquer condição para a exigibilidade e cumprimento da “Confissão de Dívida”, só secundada pelo próprio, temos em súmula e concretizando, cumprindo assim o estatuído no nº.2-a) do artº.640 do CPC, o registado no programa H@bilus iniciado às 10h41m e findo às 12h31m, acta julgamento de 23-10-2023, mais precisamente minutos 00:22:10, 00:25:43, 00:29:10 a 00:29:49 (inclusive), 00:33:26 a 00:33:50, 00:34:19, 00:36:07 e 01:20:17;


68) Ou seja, de facto o ora Recorrido apresenta uma versão dos factos na qual a testemunha CC, face à sua situação pessoal e económica, se encontrava diminuído e por isso aceitou reduzir o seu inicial pedido de €500.000,00 para €150.000,00 e que esses €150.000,00 serviriam para amortizar a divida de honorários que CC tinha para com o ora Recorrido;


69) Única razão para ser emitida a tal “Confissão de Dívida” (a redução de €500.000,00 para €150.000,00 sem qualquer racional seguindo a terminologia do ora Recorrido) a não ser o estado calamitoso, pessoal e financeiro, do próprio CC;


70) Só que, quer o Recorrente quer a testemunha CC negam por completo a versão trazida pelo ora Recorrido, o que fazem com precisão tal como ficou gravado em audiência de julgamento;


71) Sobre este tema, o depoimento do ora Recorrente é secundado pelo depoimento da testemunha CC já que negam perentoriamente que a “Confissão de Dívida”, emitida a favor do Recorrido unicamente face à situação pessoal e económica de CC, fosse firme e não sujeita a qualquer condição, pelo que, cumprindo assim o estatuído no nº.2-a) do artº.640 do CPC, temos o registado no programa H@bilus iniciado às 09h34m e findo às 10h40m, acta julgamento de 23-10-2023, mais precisamente minutos 00:08:32, 00:11:39;


72) E, sobre a versão da testemunha CC, coincidente com a versão trazida pelo ora Recorrente, temos em súmula e concretizando os passos mais relevantes, cumprindo assim o estatuído no nº.2-a) do artº.640 do CPC, o registado no programa H@bilus iniciado às 14h13m e findo às 15h33m, acta julgamento de 23-10-2023, mais precisamente minutos 00:01:54 a 00:07:30 (inclusive), 00:28:30 a 00:31:23 (inclusive);


73) Ora, face à prova produzida em julgamento pelo Recorrente e pela testemunha CC, que se transcreveu cumprindo a alínea a) do nº.2 do artº640 do CPC, arrasadora e que deixou à evidência a falsidade da versão trazida pelo Recorrido, impunha-se que os pontos 11 a 15 dos factos provados fossem dados como NÃO PROVADOS passando em consequência para a secção dos factos não provados ou mesmo deixando de figurar como enunciado como matéria com interesse para o objecto do processo;


74) Passando, pelo contrário, os factos dados como não provados nas alíneas a) a l) --enumeradas pelo ora Recorrente nesta alegação-- a factos provados, pois os mesmos refletem a verdade do que aconteceu nas reuniões de 28 de Novembro e 2 de Dezembro, ambas de 2011, e o posterior a elas;


75) 8-Factos numerados como 16 e 17 na matéria de facto provada:


16-O réu e o autor não quiseram celebrar qualquer contrato de compra dos bens mencionado no documento de confissão de dívida.


17-O que era do conhecimento de todos os intervenientes na reunião do dia 2 de Dezembro de 2011.; 76)


Estes dois factos, até porque inócuos quer para a tese do ora Recorrente quer do ora Recorrido, pouco ou nenhum interessem têm e acomodam-se em ambas as teses, pelo que não merecem qualquer reparo;


77) 9-Factos numerados como 18, 19 e 20 na matéria de facto provada:


18- O autor depositou o cheque mencionado em 10. na conta com o NIB ..., pertença de um colega do autor e que por este podia ser movimentada.


19-Após o recebimento do cheque, a sociedade de que o autor é sócio emitiu o recibo n.º RPH-0003/2012, de 13 de Março de 2012.


20-Este recibo integrou ainda a quantia de € 5.000,00, que CC havia entregue em 13 de Fevereiro de 2012, razão pela qual tem o valor total de € 50.000,00 (IVA incluído).;


78) Estes três factos, até porque inócuos quer para a tese do ora Recorrente quer do ora Recorrido, pouco ou nenhum interessem têm mas mesmo assim não podem ser dados como provados nos termos em que o foram;


79) No entanto, e conforme supra alegado há razões mais do que suficientes para os dar como não provados por manifesta insuficiência de prova;


80)10-Factos numerados como 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27 e 28, na matéria de facto provada:


21-O autor enviou ao réu a carta de fls. 36, datada de 9 de Janeiro de 2015, pedindo o pagamento da quantia de € 105.000,00.


22-O réu recebeu esta carta.


23-O réu ainda não procedeu ao pagamento daquele valor.


24-Por sentença proferida nos autos de insolvência de pessoa singular n.º 1155/12.7..., datada de 21 de Junho de 2012 e transitada em julgado no dia 11 de Junho de 2013, foi declarada a insolvência de CC.


25-No âmbito desse processo o administrador de insolvência considerou verificado um crédito comum do autor no valor de € 180.887,39.


26-No dia 27 de Março de 2017, no âmbito do inquérito n.º 257/11.1..., a Polícia Judiciária realizou uma busca ao escritório do autor, tendo procedido à apreensão de uma mica contendo vários documentos numerados de 1 a 4, tendo o primeiro o título “confissão de dívida e acordo de pagamento”, a qual continha ainda um cartão de visita de DD, Advogado.


27-O autor foi constituído arguido no âmbito deste inquérito.


28-Por despacho de 26 de Abril de 2016, foi ordenado o arquivamento do inquérito quanto ao autor e ordenou-se a devolução dos documentos que lhe haviam sido apreendidos.;


81) Todos estes factos, até porque inócuos quer para a tese do ora Recorrente quer do ora Recorrido, pouco ou nenhum interessem têm e acomodam-se em ambas as teses pelo que não merecem reparo de maior;


82) À excepção da formulação do facto numerado como 26 pois falta-lhe um elemento que, por insignificante que possa parecer, resulta sem qualquer dúvida das declarações do próprio Recorrido;


83) É que de facto “No dia 27 de Março de 2017, no âmbito do inquérito n.º 257/11.1..., a Polícia Judiciária realizou uma busca ao escritório do autor, tendo procedido à apreensão de uma mica contendo vários documentos numerados de 1 a 4, tendo o primeiro o título “confissão de dívida e acordo de pagamento”, a qual continha ainda um cartão de visita de DD, Advogado” só que tal mica, que tão pouco seria mica, dizia, ao lado, CC;


84) Tal qual foi afirmado pelo ora Recorrido no seu depoimento onde e concretizando, cumprindo assim o estatuído no nº.2-a) do artº.640 do CPC, temos o registado no programa H@bilus iniciado às 10h41m e findo às 12h31m, acta julgamento de 23-10-2023, mais precisamente minutos 01:19:21, 00:50:14;


85) Ou seja, esta própria afirmação proferida pelo ora Recorrido não foi devidamente valorada pois se fosse, como deveria ter sido, desmontava também a tese do ora Recorrido pois a ser verdade que tal documento “Confissão de Dívida” titulava uma verdadeira dívida, ainda por cima de montante tão elevado, não estaria seguramente guardado numa simples pasta com argolas, mas certamente guardado num cofre, ou noutro qualquer lugar seguro!;


86) Tudo razões para os factos numerados como 21, 22, 23, 24, 25, 27 e 28, na matéria de facto provada, possam continuar provados e com a formulação constante da sentença em crise à excepção do facto numerado como nº.26 onde se deverá acrescentar a final, “numa capa de argolas, daquelas que têm uns elásticos que dizia assim, ao lado, CC”;


87) Tudo visto, e analisada criteriosamente as provas constantes dos autos e sabendo que a decisão sobre a matéria de facto da sentença em crise assentou --6§ da página 7-- não pode o ora Recorrente conformar-se com a decisão em crise já que o julgador, para além de estribar tão só nas declarações de parte do Autor, o que sempre seria manifestamente insuficiente, não soube apreender, assimilar, compreender, entender, captar, absorver, perceber, incorporar, alcançar, atingir correctamente as mesmas!;


88) Deixando-se antes ir atrás duma efabulação que de facto foi desmontada quer pelo ora Recorrente quer pela única testemunha ouvida em sede de julgamento CC, estes sim que depuseram com rigor, isenção, imparcialidade, objetividade e sobretudo COM VERDADE!;


89) Razões para serem dados, nos exatos termos como estão formuladas todos os factos dados como não provados nas alíneas a) a s) --enumeradas pelo ora Recorrente nesta alegação-- como factos provados, pois os mesmos refletem a verdade de tudo quanto aconteceu!;


90) E, em consonância, dar-se como não provados os factos elencados na decisão em crise que conflituam com as alíneas a) a s), nomeadamente, os nºs. 3, 6, 7, 8, 9, 10, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20 e 26, sendo que os demais pouco ou nada importam para uma boa decisão da causa sendo por isso irrelevantes quer sejam dados como provados quer o seu contrário;


91) O ora Recorrente em sede de Contestação e demais requerimentos apresentados já trouxe aos autos o seu entendimento quanto à necessidade de forma escrita para a alegada “cessão de créditos”;


92) Por manifesta “economia processual”, e, sabendo que a presente alegação já vai extensa, o ora Recorrente convida os Senhores Desembargadores a revisitarem quer a contestação apresentada (refª Citius 29534785) quer o requerimento apresentado em 19-11-2018 (rfª Citius 30739518), pois em tais peças o ora Recorrente apresenta a sua visão quanto ao direito subjacente aos pedidos formulados pelo ora Recorrido;


93) O ora Recorrente entende que o julgador excedeu em muito a liberdade de apreciação que a Lei lhe confere no que respeita, mais precisamente, às declarações prestadas em Audiência de Julgamento pelo ora Recorrido,


94) Tudo sabendo que pertencia ao ora Recorrido o ónus da prova da existência duma cessão de créditos de CC a ele, ora Recorrido como impõe o art. 342, CC.;


95) Aqui chegados, entende o ora Recorrente que a sentença em crise sobrevalorizou, inexplicavelmente, a prova resultante das declarações de parte do ora Recorrido e subvalorizou, como nunca seria razoavelmente expectável, as declarações de parte do ora Recorrente e da testemunha CC o qual, qualquer que fosse o sentido do seu depoimento, não seria minimamente prejudicado pela decisão que viesse a ser proferida;


96) Fazendo assim uma errada apreciação da prova produzida até porque ao estribar-se nas declarações prestadas pela testemunha CC como arguido na Policia Judiciária esqueceu que este, na altura tão pouco estava obrigado a falar com verdade como agora esteve em sede de julgamento nos presentes autos;


97) Assim, e em súmula, interessa neste segmento dar nota da inexplicável sobrevalorização em termos de prova do depoimento do ora Recorrido, que sempre teria de ser apreciado com o máximo de cuidado exigido até por ter interesse directo na causa, e a desvalorização do depoimento da testemunha CC que, sem interesse directo no desfecho desta acção, depôs com isenção, rigor e imparcialidade;


98) Pelo que se reitera, que numa análise mais fina de toda prova produzida em julgamento que a presente acção nunca poderia ter sido dada como procedente bem pelo contrário!;


99) A decisão em crise, para além do mais, interpretou e aplicou erradamente o estatuído nos artigos 607-5 do Código do Processo Civil, e os artigos 240º, 241º, 542º, 577º-1, 583º do Código Civil.


*


8. O Recorrido contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso e pela atribuição ao mesmo de efeito meramente devolutivo.


9. O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.


No despacho de admissão do recurso o Tribunal Recorrido procedeu à retificação da sentença, nos seguintes termos:

“Por conseguinte, corrijo a sentença nos seguintes moldes:

- no facto provado n.º 6, onde se lê “(…) o autor tinha sobre o réu um crédito (…)” deve ler-se lê “(…) o autor tinha sobre CC um crédito (…)”;

- o dispositivo passa a ter a seguinte redacção:

“Pelo exposto e de harmonia com a fundamentação que antecede, julgo esta acção totalmente procedente e em consequência:

- Condeno o réu a pagar ao autor a quantia de € 105.000,00 (cento e cinco mil euros), acrescida de juros moratórios vencidos desde 3 de Dezembro de 2013 e vincendos até integral pagamento, calculados à taxa aplicável às obrigações civis, devendo ser abatida à dívida de juros a quantia de € 1.300,50 (mil e trezentos euros e cinquenta cêntimos).

No restante, mantém-se o decidido na sentença objecto de recurso.!

*


10. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

*

II. Questões a decidir.


O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608º, n.º 2, 635º, n.º 4, e 639º, n.º 1, do Código de Processo Civil.


Considerando o teor das conclusões apresentadas, importa decidir as seguintes questões:

i. Da alteração da matéria de facto;

ii. Reapreciação da decisão jurídica da causa, no sentido de se apurar se estão reunidos os requisitos de procedência da ação.

*

III – Fundamentação


III.1. Fundamentação de Facto.


III.1.1. Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos


1. No exercício da sua profissão de Advogado, o autor prestou serviços para CC, a propósito da atividade de exploração de farmácias a que este se dedicava.


2. Nesse âmbito foram realizadas duas reuniões no escritório do autor, uma no dia 28 de novembro de 2011 e outra no dia 2 de dezembro de 2011.


3. Nelas intervieram o réu, CC, o autor, na qualidade de Advogado deste último, o Dr. DD, Advogado e irmão do réu, e a Dra. EE, Advogada do escritório do autor.


4. Em tais reuniões foi discutida a melhor forma de pôr fim a um contrato-promessa de compra e venda de participações sociais da sociedade proprietária de um estabelecimento comercial denominado “Farmácia 1”, sita em Cidade 1.


5. Esse contrato havia sido celebrado em 2008, por escrito, entre o réu, na qualidade de promitente-vendedor, e CC, na qualidade de promitente-comprador.


6. Aquando da realização daquelas reuniões, o autor tinha sobre o CC um crédito por dívidas de honorários já vencidas, de montante superior a € 300.000,002.


7. Na reunião ocorrida no dia 28 de Novembro de 2011, foi acordado fazer o distrate amigável daquele contrato-promessa, obrigando-se o réu a devolver a CC a quantia de € 150.000,00, o que seria realizado na reunião de 2 de Dezembro de 2011.


8. Neste contexto, o autor e CC acordaram que a quantia de € 150.000,00 se destinaria a abater à dívida de honorários, mediante cedência ao autor daquele crédito.


9. O réu compareceu na reunião do dia 2 de Dezembro de 2011 apenas munido do cheque n.º ..., sacado sobre o Banco Santander e já integralmente preenchido quanto ao valor (€ 45.000,00), data (2 de Dezembro de 2011) e beneficiário (CC).


10. Na sequência do acordo referido no n.º 8, CC endossou o cheque ao autor.


11. Ainda na mesma reunião, fruto das dificuldades económicas que à data CC atravessava e por forma a evitar que os seus credores pudessem reagir contra si, foi pelo mesmo pedido que a declaração de dívida não identificasse a verdadeira origem do crédito.


12. O autor e o réu aceitaram este pedido e por todos foi acordado redigir o documento n.º 1 junto com a petição inicial, denominado “Confissão de dívida e Acordo de Pagamento”, no qual se pode ler o seguinte: “Eu, abaixo assinado, GG (…) confesso-me devedor da quantia de € 105.000,00 (cento e cinco mil euros) a AA (…) resultante da compra que lhe fiz de 2 (duas) pinturas a óleo (marinhas, século XXVIII, escola holandesa; e ii) obrigo-me a pagar a mesma quantia no prazo de 2 (dois) anos contados da presente data (…)”.


13. Ao aceitarem a elaboração e subscrição daquele documento, a real intenção do autor, do réu e de CC era permitir a cedência, em benefício do autor, do crédito que CC tinha sobre o réu, no montante de € 105.000,00, sem se fazer qualquer referência à verdadeira proveniência do mesmo.


14. Nessa mesma reunião foi acordado que o pagamento, pelo réu ao autor, do montante de € 105.000,00 seria feito no prazo de dois anos a contar dessa data.


15. O crédito cedido destinava-se a liquidar parte da dívida de honorários que CC tinha para com o autor.


16. O réu e o autor não quiseram celebrar qualquer contrato de compra dos bens mencionado no documento de confissão de dívida.


17. O que era do conhecimento de todos os intervenientes na reunião do dia 2 de Dezembro de 2011.


18. O autor depositou o cheque mencionado em 10. na conta com o NIB ..., pertença de um colega do autor e que por este podia ser movimentada.


19. Após o recebimento do cheque, a sociedade de que o autor é sócio emitiu o recibo n.º RPH-0003/2012, de 13 de Março de 2012.


20. Este recibo integrou ainda a quantia de € 5.000,00, que CC havia entregue em 13 de Fevereiro de 2012, razão pela qual tem o valor total de € 50.000,00 (IVA incluído).


21. O autor enviou ao réu a carta de fls. 36, datada de 9 de Janeiro de 2015, pedindo o pagamento da quantia de € 105.000,00.


22. O réu recebeu esta carta.


23. O réu ainda não procedeu ao pagamento daquele valor.


24. Por sentença proferida nos autos de insolvência de pessoa singular n.º 1155/12.7..., datada de 21 de Junho de 2012 e transitada em julgado no dia 11 de Junho de 2013, foi declarada a insolvência de CC.


25. No âmbito desse processo o administrador de insolvência considerou verificado um crédito comum do autor no valor de € 180.887,39.


26. No dia 27 de Março de 2017, no âmbito do inquérito n.º 257/11.1..., a Polícia Judiciária realizou uma busca ao escritório do autor, tendo procedido à apreensão de uma mica contendo vários documentos numerados de 1 a 4, tendo o primeiro o título “confissão de dívida e acordo de pagamento”, a qual continha ainda um cartão de visita de DD, Advogado.


27. O autor foi constituído arguido no âmbito deste inquérito.


28. Por despacho de 26 de Abril de 2016, foi ordenado o arquivamento do inquérito quanto ao autor e ordenou-se a devolução dos documentos que lhe haviam sido apreendidos.

*

III.1.2. E consideraram-se como não provados os seguintes factos [assinalando-se os factos alterados]:


- Nas reuniões estiveram apenas presentes o autor, o réu, o CC e o Dr. DD;


- O tema nelas abordado foi o repetido incumprimento do contrato-promessa por parte de CC enquanto promitente-comprador, já que os reforços de sinal que se havia proposto pagar ao réu até à celebração do contrato definitivo há muito que estavam em atraso, situação que o ora réu não podia mais tolerar;


- Nesse âmbito, e face à manifestada impossibilidade por parte de CC em cumprir o contrato-promessa, este propôs resolver amigavelmente tal contrato, perdendo como promitente-comprador todas as importâncias que havia entregue a titulo de sinal e seus reforços, mas recebendo do promitente-vendedor, o ora réu, o valor de stock que na data existia na Farmácia 1;


- A formulação desta proposta pareceu aceitável ao réu já que, aquando da celebração do contrato-promessa, ficou estabelecido que, para além do preço de aquisição das participações sociais que era de € 3.537.303,18, o promitente-comprador pagaria o stock na data existente, como efectivamente o fez, num valor que na altura foi estimado em € 225.000,00;


- A todos os intervenientes na reunião do dia 28 de Novembro de 2011 deparou-se o problema de não se saber ao certo o valor do stock que nessa data existia na farmácia e que tinha sido efectivamente pago, havendo mesmo duas perspectivas bem diferentes: na perspectiva do réu, o stock efectivamente pago aos fornecedores não ultrapassaria os 45.000,00€; na perspectiva de CC, seria na ordem dos € 150.000,00;


- Esta discrepância levou a que a reunião do dia 28 de Novembro de 2011 não fosse conclusiva, tendo-se adiado a formulação da resolução do contrato-promessa para o dia 2 de Dezembro de 2011, dilação tida como suficiente para se aferir com rigor o valor de stock existente na farmácia e efectivamente pago aos fornecedores;


- Para tal aferição de stock foi combinado que CC se deslocaria à farmácia para verificar, conjuntamente como o réu, o valor correcto;


- Visto que CC não conseguiu deslocar-se a Cidade 1, na reunião do dia 2 de Dezembro de 2011 a questão dos stocks estava precisamente na mesma, ou seja, o réu mantinha que os stocks pagos não ultrapassavam os € 45.000,00 e CC mantinha que rondariam os € 150.000,00;


- Perante tal impasse, e porque o réu atendeu à pretensão de CC de que lhe fosse pago o stock existente e efectivamente pago aos fornecedores, estabeleceu-se, por sugestão do autor, que fosse, então e na hora, paga a quantia de € 45.000,00, a qual havia sido indicada pelo réu como a que estava efectivamente liquidada aos fornecedores, e que fosse diferido para momento posterior o pagamento da quantia que se viesse a verificar também paga aos fornecedores e que excedesse os € 45.000,00;


- Todos os quatro intervenientes nessa reunião entenderam por bem celebrar esse acordo, passando-se então a redigir o acordo de resolução do contrato-promessa de compra e venda de participações sociais (acções), que se consubstanciou numa carta datada desse dia 2 de Dezembro de 2011, na qual o seu subscritor, o promitente- comprador CC, denunciava o contrato, resolvendo-o, com perda total de todos os montantes entregues a titulo de sinal e seus reforços, tendo o réu, na qualidade de promitente-vendedor e pelo seu punho, declarado aceitar a dita resolução e nada mais ter a receber do promitente-comprador;


- Foi neste contexto que o réu emitiu o cheque e o endossou ao autor;


- Com a emissão deste cheque havia então que se estabelecer o procedimento para se aferir se o stock existente e já pago à data era superior aos € 45.000,00 e como é que esse pagamento, a existir, seria garantido;


- Perante a ruptura financeira que à data CC atravessava, com inúmeros problemas junto de credores, que o ameaçavam inclusive com procedimentos criminais, o autor propôs que se verificasse com rigor o stock que ficaria por liquidar e que o réu emitisse uma declaração de dívida a favor de CC, a qual teria sempre como objecto um qualquer bem cuja transacção não fosse sujeita a IVA;


- CC, sabendo da sua situação perante credores e demais entidades, pediu ao réu que ficasse a constar como beneficiário o então seu Advogado, o ora autor, pois tinha receio que os seus credores viessem, caso se verificasse ter a receber alguma importância, a ser eles os efectivos beneficiários;


- Foi, então, elaborado o documento de confissão de dívida e acordo de pagamento para que a dívida ficasse titulada, caso se verificasse existir na farmácia stock para além dos € 45.000,00 já pagos;


- Passados cerca de quatro meses, o réu comunicou a CC que o stock efectivamente pago à data da resolução do contrato era na ordem dos € 43.000,00 e que, por isso, nada mais lhe devia e que aquele lhe devia a diferença;


- Por tal motivo, o réu pediu a CC que lhe devolvesse o documento de confissão de dívida, ao que este comunicou não o poder fazer já que, anteriormente, no dia 27 de Março de 2012, havia sido despoletada uma operação policial denominada “SOS Farmácias” na qual ele era o principal arguido, na companhia do ora autor e de outros, e no decurso da qual a PJ apreendeu, no escritório do autor, tal documento;


- Nessa altura, CC disse ao réu que, caso o documento viesse a ser devolvido ao seu Advogado, o ora autor, de imediato seria destruído, pois tinha sido elaborado para titular uma eventual dívida que não se verificava;


- A carta enviada pelo autor ao réu não mereceu qualquer resposta pois, tendo aquele falado mais uma vez do assunto com o CC, este reafirmou-lhe que nada lhe era devido a ele, nem tão pouco ao autor, e que ele iria tratar de recuperar o documento para o destruir.

*

III.2. da impugnação da matéria de facto


O Réu/Apelante, declarando que aceita a apreciação realizada pelo Tribunal Recorrido quanto aos factos constantes dos pontos 1, 2, 4, 5, 11, 21, 22, 23, 24, 25, 27 e 28 dos factos provados, que considera “inócuos” discorda da decisão recorrida, impugnando a matéria de facto dada como provada e não provada, por entender que:


- O Tribunal a quo deu erradamente como provados os factos, respetivamente, elencados sob os nºs. 3, 6, 7, 8, 9, 10, 12, 13, 14, 15, 16,17,18,19,20, e 26, todos por manifesta oposição à prova efetivamente produzida em Julgamento e bem assim à prova documental que resulta dos autos;


- No que respeita a todos os factos dados como não provados, em oposição frontal aos factos dados como provados, entende o Recorrente que todos os factos elencados na decisão em crise, sem numeração nem sob alíneas mas que atrás se identificaram com alíneas, ou seja os factos constantes supra nas alíneas a) a s) devem ser dados como provados face à prova produzida em Julgamento e bem assim à prova documental que resulta dos autos.


Por via das pretendidas alterações pede a reapreciação de direito, pugnando pela total improcedência da ação.


Tendo o Autor/Recorrente indicados os factos impugnados, o sentido decisório das alterações pretendidas e, bem assim, as provas (ou a falta delas) em que funda as pretendidas alterações, com indicação, no que à prova gravada se reporta, das passagens das gravações que tem por pertinentes, deram cumprimento aos ónus de impugnação a que estão adstritos os recorrentes na impugnação da matéria de facto, como previsto nas alíneas a) a c) do n.º 1, e na alínea a) do n.º 2 do artigo 640º do Código de Processo Civil, importa, pois, apreciar a impugnação da matéria de facto.


Tarefa que cumpre levar a cabo, tendo em consideração o princípio da livre apreciação da prova, conforme decorre do artigo 607º, n.º 5 do Código de Processo Civil, ao estatuir que “o juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto (…)”.


Para que a decisão da 1ª instância seja alterada haverá que averiguar se algo de “anormal” se passou na formação dessa apontada “prudente convicção”, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção, retratada nas respostas que se deram aos factos, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente aferir da razoabilidade da convicção formulada pelo juiz da 1.ª instância, face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, sem prejuízo do poder conferido à Relação de formular, nesse julgamento, com inteira autonomia, uma nova convicção, com renovação do princípio da livre apreciação da prova (cf. REMÉDIO MARQUES, Acção Declarativa, à Luz do Código Revisto, 3.ª Edição, pág. 638 -641).


Assim, os poderes conferidos por lei à Relação quanto ao princípio fundamental da apreciação das provas previsto no artigo 607.º, n.º 5, do Código de Processo Civil, têm amplitude idêntica à conferida ao tribunal de 1.ª instância, devendo a 2.ª instância expressar a respetiva convicção acerca da matéria de facto impugnada no recurso, e não apenas conferir a lógica e razoabilidade da convicção firmada pelo tribunal a quo, a qual não se funda meramente na prova oral produzida, sendo a mesma conjugada com todos os demais meios de prova que a podem confirmar ou infirmar, e apreciada segundo as regras de experiência e a livre convicção do julgador, de acordo com um exame crítico de todas as provas produzidas, sendo que o rigor e a suficiência do exame crítico têm de ser aferidos por critérios de razoabilidade, sendo fundamental que permita exteriorizar as razões da decisão e o processo lógico, racional e intelectual que lhe serviu de suporte.


Recordemos os factos em causa:


3. Nelas intervieram o réu, CC, o autor, na qualidade de Advogado deste último, o Dr. DD, Advogado e irmão do réu, e a Dra. EE, Advogada do escritório do autor.


6. Aquando da realização daquelas reuniões, o autor tinha sobre CC um crédito por dívidas de honorários já vencidas, de montante superior a € 300.000,00.


7. Na reunião ocorrida no dia 28 de Novembro de 2011, foi acordado fazer o distrate amigável daquele contrato-promessa, obrigando-se o réu a devolver a CC a quantia de € 150.000,00, o que seria realizado na reunião de 2 de Dezembro de 2011.


8. Neste contexto, o autor e CC acordaram que a quantia de € 150.000,00 se destinaria a abater à dívida de honorários, mediante cedência ao autor daquele crédito.


9. O réu compareceu na reunião do dia 2 de Dezembro de 2011 apenas munido do cheque n.º ..., sacado sobre o Banco Santander e já integralmente preenchido quanto ao valor (€ 45.000,00), data (2 de Dezembro de 2011) e beneficiário (CC).


10. Na sequência do acordo referido no n.º 8, CC endossou o cheque ao autor.


12. O autor e o réu aceitaram este pedido e por todos foi acordado redigir o documento n.º 1 junto com a petição inicial, denominado “Confissão de dívida e Acordo de Pagamento”, no qual se pode ler o seguinte: “Eu, abaixo assinado, GG (…) confesso-me devedor da quantia de € 105.000,00 (cento e cinco mil euros) a AA (…) resultante da compra que lhe fiz de 2 (duas) pinturas a óleo (marinhas, século XXVIII, escola holandesa; e ii) obrigo-me a pagar a mesma quantia no prazo de 2 (dois) anos contados da presente data (…)”.


13. Ao aceitarem a elaboração e subscrição daquele documento, a real intenção do autor, do réu e de CC era permitir a cedência, em benefício do autor, do crédito que CC tinha sobre o réu, no montante de € 105.000,00, sem se fazer qualquer referência à verdadeira proveniência do mesmo.


14. Nessa mesma reunião foi acordado que o pagamento, pelo réu ao autor, do montante de € 105.000,00 seria feito no prazo de dois anos a contar dessa data.


15. O crédito cedido destinava-se a liquidar parte da dívida de honorários que CC tinha para com o autor.


16. O réu e o autor não quiseram celebrar qualquer contrato de compra dos bens mencionado no documento de confissão de dívida.


17. O que era do conhecimento de todos os intervenientes na reunião do dia 2 de Dezembro de 2011.


18. O autor depositou o cheque mencionado em 10. na conta com o NIB ..., pertença de um colega do autor e que por este podia ser movimentada.


19. Após o recebimento do cheque, a sociedade de que o autor é sócio emitiu o recibo n.º RPH-0003/2012, de 13 de Março de 2012.


20. Este recibo integrou ainda a quantia de € 5.000,00, que CC havia entregue em 13 de Fevereiro de 2012, razão pela qual tem o valor total de € 50.000,00 (IVA incluído).


26. No dia 27 de Março de 2017, no âmbito do inquérito n.º 257/11.1..., a Polícia Judiciária realizou uma busca ao escritório do autor, tendo procedido à apreensão de uma mica contendo vários documentos numerados de 1 a 4, tendo o primeiro o título “confissão de dívida e acordo de pagamento”, a qual continha ainda um cartão de visita de DD, Advogado.


*


- Nas reuniões estiveram apenas presentes o autor, o réu, o CC e o Dr. DD;


- O tema nelas abordado foi o repetido incumprimento do contrato-promessa por parte de CC enquanto promitente-comprador, já que os reforços de sinal que se havia proposto pagar ao réu até à celebração do contrato definitivo há muito que estavam em atraso, situação que o ora réu não podia mais tolerar;


- Nesse âmbito, e face à manifestada impossibilidade por parte de CC em cumprir o contrato-promessa, este propôs resolver amigavelmente tal contrato, perdendo como promitente-comprador todas as importâncias que havia entregue a titulo de sinal e seus reforços, mas recebendo do promitente-vendedor, o ora réu, o valor de stock que na data existia na Farmácia 1;


- A formulação desta proposta pareceu aceitável ao réu já que, aquando da celebração do contrato-promessa, ficou estabelecido que, para além do preço de aquisição das participações sociais que era de € 3.537.303,18, o promitente-comprador pagaria o stock na data existente, como efectivamente o fez, num valor que na altura foi estimado em € 225.000,00;


- A todos os intervenientes na reunião do dia 28 de Novembro de 2011 deparou-se o problema de não se saber ao certo o valor do stock que nessa data existia na farmácia e que tinha sido efectivamente pago, havendo mesmo duas perspectivas bem diferentes: na perspectiva do réu, o stock efectivamente pago aos fornecedores não ultrapassaria os 45.000,00€; na perspectiva de CC, seria na ordem dos € 150.000,00;


- Esta discrepância levou a que a reunião do dia 28 de Novembro de 2011 não fosse conclusiva, tendo-se adiado a formulação da resolução do contrato-promessa para o dia 2 de Dezembro de 2011, dilação tida como suficiente para se aferir com rigor o valor de stock existente na farmácia e efectivamente pago aos fornecedores;


- Para tal aferição de stock foi combinado que CC se deslocaria à farmácia para verificar, conjuntamente como o réu, o valor correcto;


- Visto que CC não conseguiu deslocar-se a Cidade 1, na reunião do dia 2 de Dezembro de 2011 a questão dos stocks estava precisamente na mesma, ou seja, o réu mantinha que os stocks pagos não ultrapassavam os € 45.000,00 e CC mantinha que rondariam os € 150.000,00;


- Perante tal impasse, e porque o réu atendeu à pretensão de CC de que lhe fosse pago o stock existente e efectivamente pago aos fornecedores, estabeleceu-se, por sugestão do autor, que fosse, então e na hora, paga a quantia de € 45.000,00, a qual havia sido indicada pelo réu como a que estava efectivamente liquidada aos fornecedores, e que fosse diferido para momento posterior o pagamento da quantia que se viesse a verificar também paga aos fornecedores e que excedesse os € 45.000,00;


- Todos os quatro intervenientes nessa reunião entenderam por bem celebrar esse acordo, passando-se então a redigir o acordo de resolução do contrato-promessa de compra e venda de participações sociais (acções), que se consubstanciou numa carta datada desse dia 2 de Dezembro de 2011, na qual o seu subscritor, o promitente- comprador CC, denunciava o contrato, resolvendo-o, com perda total de todos os montantes entregues a titulo de sinal e seus reforços, tendo o réu, na qualidade de promitente-vendedor e pelo seu punho, declarado aceitar a dita resolução e nada mais ter a receber do promitente-comprador;


- Foi neste contexto que o réu emitiu o cheque e o endossou ao autor;


- Com a emissão deste cheque havia então que se estabelecer o procedimento para se aferir se o stock existente e já pago à data era superior aos € 45.000,00 e como é que esse pagamento, a existir, seria garantido;


- Perante a ruptura financeira que à data CC atravessava, com inúmeros problemas junto de credores, que o ameaçavam inclusive com procedimentos criminais, o autor propôs que se verificasse com rigor o stock que ficaria por liquidar e que o réu emitisse uma declaração de dívida a favor de CC, a qual teria sempre como objecto um qualquer bem cuja transacção não fosse sujeita a IVA;


- CC, sabendo da sua situação perante credores e demais entidades, pediu ao réu que ficasse a constar como beneficiário o então seu Advogado, o ora autor, pois tinha receio que os seus credores viessem, caso se verificasse ter a receber alguma importância, a ser eles os efectivos beneficiários;


- Foi, então, elaborado o documento de confissão de dívida e acordo de pagamento para que a dívida ficasse titulada, caso se verificasse existir na farmácia stock para além dos € 45.000,00 já pagos;


- Passados cerca de quatro meses, o réu comunicou a CC que o stock efectivamente pago à data da resolução do contrato era na ordem dos € 43.000,00 e que, por isso, nada mais lhe devia e que aquele lhe devia a diferença;


- Por tal motivo, o réu pediu a CC que lhe devolvesse o documento de confissão de dívida, ao que este comunicou não o poder fazer já que, anteriormente, no dia 27 de Março de 2012, havia sido despoletada uma operação policial denominada “SOS Farmácias” na qual ele era o principal arguido, na companhia do ora autor e de outros, e no decurso da qual a PJ apreendeu, no escritório do autor, tal documento;


- Nessa altura, CC disse ao réu que, caso o documento viesse a ser devolvido ao seu Advogado, o ora autor, de imediato seria destruído, pois tinha sido elaborado para titular uma eventual dívida que não se verificava;


- A carta enviada pelo autor ao réu não mereceu qualquer resposta pois, tendo aquele falado mais uma vez do assunto com o CC, este reafirmou-lhe que nada lhe era devido a ele, nem tão pouco ao autor, e que ele iria tratar de recuperar o documento para o destruir.


Por de interesse para a análise da impugnação, aqui se reproduz a motivação de facto constante da decisão impugnada:


“(…)Quanto aos factos provados descritos nos n.ºs 1 a 23 e aos factos não provados, a convicção do tribunal resultou das declarações de parte do autor: de forma que se reputou idónea, objectiva e revelando isenção, esclareceu toda aquela factualidade, na qual interveio directa e pessoalmente, tendo mencionado o que esteve subjacente à emissão do documento de confissão de dívida e qual a verdadeira e real intenção dos seus subscritores e do seu ex-cliente CC.


As declarações de parte do autor não puderam deixar de ser valoradas positivamente não só pelo modo como foram prestadas, mas também pela reduzida ou mesmo nenhuma plausibilidade ou verosimilhança da versão dos factos dada pelo réu na contestação. Na verdade, não é credível que, tendo estado ele em duas reuniões acompanhado do seu irmão, que é Advogado, tivesse procedido à assinatura de um documento onde se confessava devedor da quantia de € 105.000,00 sem que nele tivesse ficado esclarecido o contexto em que tal confissão foi feita, nomeadamente que se tratava de um montante que não era final e que o seu apuramento definitivo dependia de diligências que seriam feitas pelo réu e por CC, a propósito da determinação do stock existente numa farmácia. Diligências essas que, aliás, nunca foram feitas, o que também não deixa de causar estranheza dados os valores pecuniários envolvidos.


O irmão do réu, Advogado de profissão e conhecedor da responsabilidade associada a certo tipo de declarações, principalmente quando documentadas, não podia, no plano da normalidade das coisas, ignorar a forte vinculação que decorreria daquele documento. Se o irmão do réu permitiu que este assinasse, sem mais e apenas com os dizeres do documento, a confissão de dívida, só poderá ter sido porque a dívida já se encontrava calculada e estabelecida, nada mais havendo a fazer para a sua quantificação.


Também não deixa de causar estranheza a circunstância de o cheque dos € 45.000,00, que, na tese do réu, serviria para pagar pelo menos parte do valor do stock da farmácia (que, para ele, seria o valor correcto, e não o valor de € 150.000,00, que havia sido avançado por CC), tivesse sido endossado ao autor e por este depositado na conta bancária de um colega de escritório, tendo posteriormente sido emitido um recibo, pela sociedade de Advogados de que o demandante é sócio, titulando o pagamento de honorários. Fosse como o réu alegou e certamente o autor teria simplesmente ficado como fiel depositário do cheque. Se o autor recebeu e depositou um cheque numa conta bancária a que tinha acesso e se posteriormente a sociedade de Advogados de que ele é sócio emitiu o respectivo recebido, as regras da experiência dizem-nos, à míngua de outras circunstâncias tão ou mais plausíveis, que, efectivamente, se tratava de um abatimento à dívida de honorários e não de um (primeiro) pagamento de um stock da farmácia, cujo valor efectivo o réu e CC não chegaram a encontrar. E não se procure justificar esta omissão com a circunstância de CC não ter conseguido deslocar-se a Cidade 1 para se fazer a contagem do stock: é que, não havendo notícia de que a situação teria de ficar, por qualquer razão, resolvida até à segunda reunião, a conferência do stock podia ser feita noutra data (com o inerente adiamento da segunda reunião).


Acresce que nada há nos autos que nos leve a concluir que o stock efectivamente pago ascendia a € 45.000,00 ou a € 43.000,00 (valor que, ainda na tese do réu, foi mais tarde comunicado a CC, tendo-lhe pedido a devolução do que pagou a mais). Nada impedia o réu de, a propósito da conferência do stock, apresentar prova documental da qual resultasse um daqueles valores. Ele seria, aliás, a pessoa mais adequada para fazer isso porque era o dono da farmácia (através de uma sociedade). Ora, não existe nos autos um documento, um qualquer elemento contabilístico, que permita alicerçar a bondade da tese do réu quanto ao valor do stock.


Existe ainda um outro elemento ou indício que nos leva a concluir no sentido da verosimilhança da versão dos acontecimentos que o autor trouxe a este tribunal, qual seja: as declarações que CC prestou, na qualidade de arguido, em sede de inquérito penal e constantes do documento n.º 8 junto com a contestação. Em tais declarações sobressai o seguinte: a) ao contrário do que consta da carta junta com a contestação como documento n.º 1 – a qual, note-se, nem sequer foi referenciada nessas declarações –, quem desistiu da venda da farmácia foi o réu; b) seria o declarante que teria de receber do réu a quantia de € 150.000,00 referente ao stock, o que não chegou a acontecer porque endossou ao autor o cheque dos € 45.000,00 e ficou acordado que os restantes € 105.000,00 “passariam” para este último em Novembro de 2013, data que foi combinada entre a sua pessoa, o réu e o autor, tudo isto se tendo passado no escritório deste último. Ora, se o próprio réu participou no agendamento do pagamento dos € 105.000,00 e se já havia efectuado o pagamento de € 45.000,00, é porque não havia qualquer divergência entre ele e o CC quanto ao valor do stock.


Repara-se ainda no seguinte: apesar de o documento de confissão de dívida e de o documento n.º 1 junto com a contestação (carta de 2 de Dezembro de 2011) terem sido elaborados no escritório do autor precisamente no mesmo dia, o lay out é distinto (formatação e tipo de letra, etc.). Ora, não é credível que, tratando-se de dois documentos que foram preparados e redigidos usando os mesmos meios técnicos existentes no escritório do autor e pelas próprias pessoas que intervieram nas reuniões aí ocorridas, possam aparecer com estilos diferentes. Que razão haveria para terem uma diferente configuração externa? Nenhuma é a resposta que decorre da normalidade das coisas.


Por conseguinte, o tribunal ficou plenamente convencido de que o que ocorreu entre as partes e CC foi a cedência do crédito que este tinha sobre o réu e não um acordo quanto ao pagamento de stock existente na farmácia aquando da cessação do contrato-promessa de compra e venda de participações sociais. Tal derivou das declarações de parte do autor e dos elementos ou indícios probatórios supra referidos, apreciados na sua globalidade e escrutinados de harmonia com as regras da experiência comum.


O tribunal ponderou ainda:


- O depoimento da testemunha CC e as declarações prestadas pelo réu em sede de depoimento de parte, unicamente quanto à celebração do contrato-promessa, à intenção de ambos de lhe pôr fim, à realização das duas reuniões no escritório do autor e à não realização de qualquer contrato de compra e venda de duas pinturas;


- O documento n.º 2 junto com a petição inicial (carta e aviso de recepção);


- O auto de busca e apreensão constante do documento n.º 3 junto com a petição inicial;


- O despacho de arquivamento de fls. 199 a 203;


- O recibo de provisão de fls. 205;


- A certidão judicial de fls. 296 e ss;


- O documento n.º 12 junto com a contestação.(…)”


Da análise da motivação do Tribunal Recorrido, duas conclusões se retiram de imediato; o Tribunal Recorrido não fundou a sua convicção estritamente nas declarações do Autor, antes as conjugou com a demais prova produzida em audiência e a prova documental junta aos autos, como resulta da motivação, que, por isso, se reproduziu.


Porém, resulta igualmente claro que, das duas versões apresentadas, o Tribunal Recorrido acolheu a apresentada pelo Autor por entender que a versão dos factos que apresentou era merecedora de maior credibilidade.


Procedeu-se à audição de toda a prova produzida em audiência e à respetiva conjugação com toda a prova documental junta aos autos.


E da concatenação de toda a prova assim produzida, afigura-se que a conclusão do Tribunal Recorrido não é a única que, com razoabilidade, pode retirar-se da mesma.


Vejamos.


Comecemos por recordar que o Autor, que pretende obter a condenação do Réu BB - que é o único Réu perante a homologação da desistência quanto ao Réu CC - no pagamento da quantia de € 105.000,00, alega que o seu crédito provém de um contrato de cessão de créditos outorgado entre aquele e o ex-réu CC, referindo que tal negócio foi o que esteve subjacente à emissão, por escrito, de um documento consubstanciador de uma confissão de dívida e acordo de pagamento, tendo ficado consignado que a dívida provinha de um contrato de compra e venda de duas pinturas, contrato simulado, porque não era intenção das partes realizar qualquer compra e venda daqueles bens, pois que a verdadeira vontade das partes era a cedência ao autor de um crédito no valor de € 105.000,00 que CC tinha sobre o ora Réu e que, por acordo com o demandante, serviria para liquidar uma dívida de honorários.


Note-se que não foi, por qualquer das partes referida qualquer dívida de honorários do ora Réu BB ao ora Autor, como de resto, o Tribunal reconheceu no despacho de admissão do recurso, em que determinou a retificação da sentença quanto ao facto n.º 6, e mesmo relativamente à alegada dívida de CC, não foi junto qualquer documento que refletisse o valor alegado, designadamente da Sociedade de Advogados de que o Autor faz parte.


Por seu turno o Réu, concordando que o teor do documento não foi o pretendido, afastando também a vontade de celebração do contrato de compra e venda que ali se menciona, afirma que o montante a que o documento se refere não era final e que o seu apuramento definitivo dependia de diligências que seriam feitas por si e por CC, a propósito da determinação do stock existente numa farmácia, servindo o documento para garantir tal pagamento, caso viesse a final, a verificar-se que o montante era por si devido ao referido CC.


Ora, como resulta da respetiva análise, a prova documental não confirma, por si, a versão de qualquer uma das partes, sendo que a versão do Autor foi apresentada apenas pelo mesmo, e a do Réu, por si próprio e pela testemunha CC.


E da audição da prova resulta, para este Tribunal, uma evidência - o ora Recorrido apresenta uma versão dos factos na qual Recorrente e testemunha CC acordaram, a troco de €150.000,00 pagos pelo Recorrente à testemunha, resolver (distratar) o contrato promessa referido no facto 4 dos factos provados; quer Recorrente quer testemunha CC negam por completo a versão trazida pelo ora Recorrido, referindo que tal quantia só seria devida, a ele CC, e não em primeira linha ao Autor, se efetivamente os stocks existentes e pagos à data na Farmácia 1 fossem, tal como a testemunha CC julgava, na ordem dos €150.000,00.


Todos têm obvio interesse no desfecho da causa, constatação que nos escusamos de justificar.


Por outro lado, há a salientar os relatos com uma aparente normalidade de diligências realizadas no âmbito das respetivas atividades, inclusivamente designadas por “mecânica jurídica” destinadas a constituir “testas de ferro” para que o mencionado CC pudesse continuar a “tomar” farmácias para além do limite que lhe era legalmente admissível, negócios com intervenção terceiros para evitar que valores que alegadamente seriam devidos ao mesmo CC fossem apreendidos à ordem de um processo de insolvência do mesmo que estava iminente, dessa forma subtraindo tais quantias à massa insolvente - objetivos que, como é sabido, não merecem tutela jurídica - endosso e depósito de cheques em nome de Colega que nada tinha a ver com os negócios em causa, para evitar eventuais complicações no âmbito de processo de divórcio pendente, objetivos de evitar “derrapagens fiscais” e problemas com IVA, titulação de valor devido por “distrate” de contrato promessa através de referência a contratos de compra e venda de antiguidades ou de pinturas, para não “deixar rasto” ou “ponta solta” relativamente à contabilidade de CC, referências a obras de arte guardadas em “boxes” por razões cujos contornos não se apuraram com rigor.


Para além de tudo isto, importa ainda salientar a referência a impossibilidade de junção de documentos como os contratos promessa que teriam sido celebrados entre os Réus por terem sido apreendidos no âmbito de processo de inquérito, tal como sucedeu como a declaração de dívida em causa nos autos que, porém, viria a ser devolvida ao Autor a pedido deste.


Ora, perante o teor das declarações prestadas em audiência, e a falta de elementos objetivos que confirmem com segurança, qualquer das versões, afigura-se a este Tribunal que não é possível resolver as dúvidas criadas pela apresentação de duas versões diferentes dos factos a favor de qualquer delas.


Um coisa temos como certa, até porque não vem controvertida: nenhuma das partes quis, com o documento titular um contrato de compra e venda de pinturas, tal não é sequer controvertido (cf. o facto n.º 11).


Quanto ao mais, isto é, quanto ao que verdadeiramente foi pretendido com a elaboração do documento, não pode validamente excluir-se uma ou outra das versões apresentadas, ou ainda uma qualquer outra diversa.


Pelo que outra solução não resta que a de julgar parcialmente procedente a pretensão recursiva no que aos factos provados respeita, que se consideram não provados, com a ressalva do conteúdo dos mesmos que é estritamente objetivo, sustentado em documentos e não colocado em crise entre as partes.


Assim:


- no que concerne ao facto n.º 3, elimina-se a referência à presença da Exma Sra Dra. EE, Advogada do escritório do Autor;


- no respeitante ao facto n.º 6 elimna-se o valor do crédito ali mencionado;


- quanto ao ponto 7. Elimina-se a referência à obrigação contraída pelo Réu de devolver o montante total de 150.000,00;


- elimina-se o ponto 8 dos factos provados;


- quanto aos pontos 9 e 10 considera-se que apenas se provou que na reunião de 2 de dezembro de 2011, o ora Réu entregou o cheque n.º ... sacado sobre o Banco Santander no valor de 45.000€, datado de 2 de dezembro de 2011 indicando-se no mesmo como beneficiário CC, que o endossou ao ora Autor;


- no respeitante ao facto n.º 12 considera-se apenas provado que foi redigido o documento ali mencionado, com o aí referido teor;


- eliminam-se os artigos 13º, 14º e 15º dos factos provados;


- mantém-se os artigos 15º a 20º;


- relativamente ao facto 26 mantém-se apenas que o documento titulado “confissão de dívida e acordo de pagamento”, foi apreendido no dia 27 de Março de 2017, no âmbito do inquérito n.º 257/11.1...


No mais, designadamente quanto aos factos não provados, julga-se improcedente a impugnação, por se entender, como já explicitado, que nada mais se provou, para além do que já consta dos que se consideram provados.


*


III.4. Reapreciação jurídica da causa:


Com a presente ação pretendia o Autor, no essencial, que fosse declarada a nulidade do negócio de compra e venda a que se reporta o documento junto como documento 1 à petição inicial.


O conceito de negócio simulado foi adequadamente explicitado pelo Tribunal recorrido e encontra-se definido no n.º 1 do art.º 240.° do Código Civil, do qual decorre que há simulação sempre que concorram divergência intencional entre a vontade e a declaração das partes, combinação ou conluio que determine a falsidade dessa declaração (acordo simulatório, pactum simulationis), e a intenção, intuito ou propósito de enganar ou prejudicar terceiros (animus decipiendi ou animus nocendi), consignando-se no n.º 2 do referido preceito que “[o] negócio simulado é nulo”.


O art. 241°, n°1 do mesmo diploma legal, determina que "quando sob o negócio simulado exista um outro que as partes quiseram realizar, é aplicável a este o regime que lhe corresponderia se fosse concluído sem dissimulação, não sendo a sua validade prejudicada pela nulidade do negócio simulado".


Interpretando tais preceitos, tem a doutrina defendido a necessidade da verificação simultânea de três requisitos para que haja um negócio simulado: a intencionalidade da divergência entre a vontade e a declaração, o acordo simulatório (pactum simulationis) e o intuito de enganar terceiros (que se não deve confundir com o intuito de prejudicar).


O ónus da prova de tais requisitos, porque constitutivos do respectivo direito, cabe, segundo as regras gerais nesta matéria, a quem invoca a simulação - cf. art.342° do Código Civil.


Assim, para no caso concreto se poder concluir pela existência de um negócio simulado, terão de provar-se factos integradores dos requisitos enunciados.


Em face da alteração efetuada à matéria de facto temos, pois, que concluir que se mostram verificados os requisitos da simulação, já referidos, a que se reporta o artigo 240º do Código Civil): (i) uma divergência bilateral entre a vontade real e a vontade declarada; (ii) um acordo ou conluio entre o declarante e o declaratário (o acordo simulatório, também denominado pactum simulationis); (iii) intenção de enganar terceiros (animus decipiendi).


De facto, como resultou apurado, Autor e Réu, outorgaram o documento atuando em comunhão de esforços, sem pretenderem realizar qualquer contrato de compra e venda, antes pretendendo retirar do património do referido Nuno quantia que eventualmente pudesse vir integrar o seu património e a servir de garantia dos credores no âmbito de processo de insolvência. Se pretendiam mais do que isto – realizar pagamentos, ceder créditos, garantir pagamento no caso de existência de stock - como se referiu, não se provou.


E era sobre o Autor que recaía, como se referiu, o ónus de demonstrar tais factos.


Assim, em face do disposto nos artigos 240º, n.º 2, do Código Civil, o negócio em causa é nulo, operando a nulidade retroactivamente, nos termos do n.º 1 do artigo 289º do Código Civil.


Não tendo o Autor logrado fazer prova do concreto negócio dissimulado, outra solução não resta que a de julgar improcedente a pretensão de receber do Réu a quantia peticionada.


Deste modo, procede a apelação, com a consequente revogação da sentença, e absolvição do Réu do pedido.

*

IV. Decisão


Nestes termos e com tais fundamentos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar procedente a apelação e, em consequência em revogar a sentença recorrida, absolvendo o Réu do pedido.

Custas pelo Recorrido.

Registe e notifique.

*

Évora,

Ana Pessoa


Maria Adelaide Domingos


Manuel Bargado


____________________________

1. Da responsabilidade da relatora.↩︎

2. Facto retificado por despacho de 31.01.2025, como supra referido.↩︎