COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO TRABALHO
LEGITIMIDADE ACTIVA
INEPTIDÃO DA PETIÇÃO INICIAL
ADVOGADO
PRESCRIÇÃO
Sumário

Sumário elaborado pela relatora:
I- A competência para o julgamento de uma causa afere-se a partir da relação jurídica que se discute na ação, tal como é configurada pelo autor.

II- Se a causa de pedir invocada pela autora assenta na alegada violação, por parte do réu, de obrigações decorrentes da relação laboral anteriormente estabelecida entre as partes, concretamente do contrato de trabalho e do respetivo acordo de revogação, e o direito reclamado emerge dessa relação contratual, o tribunal do trabalho é materialmente competente para conhecer a ação.

III- Tem legitimidade ativa a ex-empregadora que interpõe ação contra o ex-trabalhador, por alegado incumprimento da relação laboral, formulando pedidos que, caso sejam julgados procedentes, terão efeito na sua esfera jurídica.

IV- A causa de ineptidão da petição inicial mencionada na alínea b) do n.º 2 do artigo 186.º do CPC apenas se verifica quando existe uma incompatibilidade lógica entre os factos concretos narrados pelo autor (causa de pedir) e o efeito jurídico por ele requerido (pedido).

V- Quanto à incompatibilidade substancial de pedidos prevista na alínea c) do n.º 2 do artigo 186.º do CPC, esta verifica-se quando se acumulam pedidos que mutuamente se excluem ou que assentam em causas de pedir inconciliáveis.

VI- Uma Advogada que se limite a reconhecer as assinaturas apostas num acordo de revogação de contrato de trabalho, atua unicamente na qualidade de entidade certificadora, nos termos previstos no artigo 38.º do Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de março, pelo que não está impedida de, posteriormente, patrocinar e representar com poderes especiais uma das partes outorgantes do acordo.

VII- O artigo 337.º do Código do Trabalho é aplicável a pedidos de indemnização por danos sofridos em virtude da cessação do contrato de trabalho.

Texto Integral

P. 391/24.8T8FAR-B.E1

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora1


Relatório


1. Na ação declarativa emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum, que VIGIQUINTA – PREVENÇÃO E SEGURANÇA LDA. intentou contra AA, foi proferido despacho saneador, datado de 11-10-2024, no qual foi decidido julgar improcedentes as seguintes exceções, invocadas pelo Réu:


- incompetência do tribunal em razão da matéria;


- ilegitimidade ativa;


- ineptidão da petição inicial;


- irregularidade do mandato da Autora.


Ainda no mesmo despacho, foi julgada procedente a exceção da prescrição do direito peticionado na reconvenção.


2. Recorreu o Réu, formulando, a final, as seguintes conclusões:


«1. Por despacho saneador datado de 11-10-2024 o tribunal “a quo” julgou as exceções invocadas pelo Autor em sede de contestação totalmente improcedentes e absolveu a reconvinda do pedido de reconvenção.


2. O Réu ora Recorrente não se conforma com a decisão de que ora se recorre.


3. No que respeita à Da (in)competência em razão da matéria o tribunal “a quo” violou o disposto no artigo 126.º da Lei 62/2013 de 26 de Agosto.


4. No que respeita à (i)legitimidade a sociedade Autora não é parte legítima para exercer o pedido, uma vez que a Autora não é visada em qualquer artigo jornalístico utilizado na ação.


5. Nem o Réu ora Recorrente violou ou praticou qualquer ato contra a sociedade Autora suscetível de ser indemnizado.


6. O despacho saneador de que ora se recorre viola assim o disposto no artigo 30.º do Código de Processo Civil.


7. Por outro lado, entendemos que estamos perante uma situação insanável de contradição entre a causa de pedir que serve de fundamento à ação e os pedidos formulados pela Autora, os quais entre si também se afiguram incompatíveis.


8. Tal contradição entre o pedido e a causa de pedir determina a ineptidão da petição inicial, vício este que, atenta a sua gravidade, não é suscetível de sanação.


9. Sublinha-se ainda que, no caso concreto, não tem aplicação o n.º 3, do artigo 186.º, do Código de Processo Civil, pois que a ineptidão invocada se baseia no disposto na alínea b) e não, na alínea a), do n.º 2, da mesma disposição, sendo que, apenas neste caso é que caberia ao tribunal averiguar se a ré havia interpretado convenientemente a petição inicial.


10. O despacho saneador de que ora se recorre viola o disposto no artigo 186.º do Código de Processo Civil.


11. Caso assim não se entenda e sem prescindir, quanto à alegada irregularidade do mandato o tribunal “a quo” violou o disposto no artigo 99.º do Estatuto da Ordem dos Advogados e do artigo 75.º do Código das Sociedades Comerciais.


12. Ainda sem prescindir o tribunal “a quo” decidiu que quando a reconvenção foi deduzida já tinha decorrido o prazo de um ano desde aquela cessação, e conclui pela procedência da exceção da prescrição.


13. Consequentemente decide o tribunal “a quo” em decorrência do art.576º nº3 do CPC ex vi art.1º nº 2 al. a) do CPT, absolver a reconvinda do pedido de reconvenção, nesta decisão não se abrangendo a parte do pedido respeitante à litigância de má-fé que, evidentemente, se admite ainda que deduzido na parte da reconvenção.


14. O Réu ora Recorrente não se conforma com a decisão recorrida.


15. Andou mal o tribunal “a quo” ao decidir que o direito que o Réu ora Recorrente pretende fazer valer já se encontra prescrito.


16. O pedido reconvencional deduzido pelo Autor ora Recorrente tem como fundamento a coação física e a falta de consciência da vontade expressa no acordo laboral legalmente prevista no artigo 246.º do Código Civil que consagra que a declaração não produz qualquer efeito se o declarante não tiver consciência de fazer uma declaração negocial ou for coagido por força física a emiti-la, o que ocorreu.


17. No caso concreto também estatui o mesmo artigo que a falta de consciência de emissão dessa declaração ou coação física para a realização da mesma que ocorreu no caso concreto uma vez que o mesmo foi agredido pelo gerente da Autora e pelo CEO da empresa Quinta do Lago.


18. Tem ainda o pedido reconvencional como fundamento a responsabilidade civil extracontratual da Autora.


19. Em bom rigor sempre se dirá que não estamos na presença de créditos laborais.


20. Motivos pelos quais não poderia o tribunal “a quo” aplicar aos autos o prazo de prescrição legal previsto no artigo 337.º, n.º 1 do Código de Trabalho.


21. Sem prescindir e caso assim não se entenda, sempre se dirá que caso se decidida que o disposto no artigo 337.º, n.º 1 do Código de Trabalho é de aplicar ao presente caso concreto deverá ser considerado os vários períodos de suspensão do prazo de prescrição.


22. Termos em que deverá a decisão recorrida ser revogada por erro na aplicação do 337.º, n.º 1 do Código de Trabalho e consequentemente deverá a reconvenção deduzida pelos Réu ora Recorrente ser admitida e seguirem os presentes autos os seus ulteriores termos.


Nestes termos e nos melhores de direito deverá o presente recurso de apelação ser julgado procedente por provado e em consequência deverá o despacho recorrido ser revogado e consequentemente deverá ser proferido outro que julgue procedentes as exceções invocadas e admita a reconvenção apresentada pelo Réu ora Recorrente, com o que se fará Justiça!»


3. Contra-alegou a Autora, propugnando pela improcedência do recurso.


Subsidiariamente, ampliou o objeto do recurso, formulando as seguintes conclusões:


«AMPLIAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO


AAA. Caso o Recurso venha a ser admitido – o que apenas se admite por mera cautela de patrocínio - a Recorrida vem, nos termos do nº 1 do artigo 636º CPC, requerer a ampliação do objeto do Recurso no sentido de ver analisado o segundo fundamento de inadmissibilidade dos pedidos reconvencionais invocados pela Recorrida na sua Réplica, em virtude daqueles pedidos não emergirem de causa de pedir que fundamenta a ação, nem terem com o facto jurídico que fundamenta as relações de conexão de acessoriedade, complementaridade ou dependência.


BBB. O douto Tribunal a quo, na Decisão Recorrida decidiu que “(…) no caso vertente, é de concluir que a A. assenta os seus pedidos na outorga do contrato de trabalho mas também e, fundamentalmente, no acordo de revogação do contrato de trabalho (e sua violação) tanto mais que é com base no valor aí previsto que formula o pedido de condenação em quantia monetária. Ora é também na subscrição de tal acordo de revogação que o R./ Reconvinte alicerça o pedido reconvencional e, por isso, o pedido do réu emerge de um facto jurídico que serve de fundamento à ação, sendo a reconvenção nesta parte (não relacionada com a litigância de má-fé que é sempre admissível e não tem que ser deduzida em sede de reconvenção) admissível”.


CCC. Ora, no caso concreto, resulta que o referido pedido reconvencional do Recorrente se funda na alegada falta de consciência do Recorrente na declaração constante no Acordo de Revogação do Contrato de Trabalho, coação física e danos provocados, bem como, na alegada má-fé no processo da Recorrida e desrespeito aos tribunais e ao sistema judicial.


DDD. Por sua vez, os pedidos da Recorrida na respetiva Petição Inicial fundamentam-se, no essencial, na violação de obrigações (nomeadamente, confidencialidade, sigilo, não depreciação) previstas no Contrato de Trabalho e Acordo de Revogação, por parte do Recorrente.


EEE. Com efeito, o pedido reconvencional do Recorrente funda-se em causas de pedir autónomas, não emergem da causa de pedir (na terminologia legal do "facto jurídico") que fundamenta a ação, nem tem com o facto jurídico que serve de fundamento à ação uma relação de conexão por acessoriedade (isto é, objetivamente conexa a dependente do pedido da causa principal), complementaridade (existência de interligação entre o pedido reconvencional e pedido formulado na ação, em que uma das relações teria sido controvertida por vontade das partes em complemento da outra) ou dependência, tal como legalmente exigido nos termos dos artigos 30.º do CPT e 126.º n.º 1 alíneas n) e o) da Lei n.º 62/2013.


FFF. Termos em que, face ao supra exposto, se requer que o Tribunal ad quem reaprecie a decisão de Direito proferida pelo Tribunal a quo relativamente aos fundamentos de improcedência dos pedidos reconvencionais e profira decisão no sentido de julgar improcedentes os pedidos reconvencionais formulados pelo Recorrente,


GGG. O que se requer que seja apreciado e declarado pelo Tribunal ad quem, caso seja admitido e julgado procedente o recurso apresentado pelo Recorrente, relativamente ao pedido reconvencional, nos termos e para os efeitos do artigo 636º nº 1 do CPC.»


4. A 1.ª instância admitiu o recurso como de apelação, com subida imediata, em separado e com efeito meramente devolutivo.


Tendo o apenso do recurso subido à Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, pugnando pela improcedência do recurso.


Não foi oferecida resposta.


Por despacho prolatado pela Relatora, os autos desceram à 1.ª instância para aí, nos termos previstos pelo artigo 306.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, ser fixado o valor da ação,


Tal valor foi fixado em € 700.000 por despacho que transitou em julgado.


Devolvidos os autos à Relação, o recurso foi mantido, e, depois de elaborado projeto de acórdão, foram colhidos os vistos legais.


Cumpre, agora, em conferência, apreciar e decidir.


*


Objeto do Recurso


É consabido que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, com a ressalva da matéria de conhecimento oficioso (artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi do artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho).


Em função destas premissas, cumpre apreciar:


1. Relativamente ao recurso de apelação, se o tribunal a quo errou ao decidir:


- a improcedência da exceção da incompetência do tribunal em razão da matéria;


- a improcedência da exceção de ilegitimidade ativa;


- a improcedência da alegada ineptidão da petição inicial;


- a improcedência da suscitada irregularidade do mandato da Autora;


- a procedência da exceção da prescrição do direito peticionado na reconvenção.


2. Quanto à (subsidiária) ampliação do recurso, se a decisão recorrida errou ao admitir o pedido reconvencional.


*


Matéria de Facto


A matéria de facto a atender é a que consta do relatório supra, para o qual remetemos, sem necessidade da sua repetição, bem como os demais elementos que constam dos autos que sejam relevantes para a apreciação das questões sub judice.


*


Enquadramento jurídico


Conforme referimos, relativamente ao recurso de apelação, importa apreciar se o tribunal a quo errou ao decidir:


A) A improcedência da exceção da incompetência do tribunal em razão da matéria;


B) A improcedência da exceção de ilegitimidade ativa;


C) A improcedência da alegada ineptidão da petição inicial;


D) A improcedência da suscitada irregularidade do mandato da Autora;


E) A procedência da exceção da prescrição do direito peticionado na reconvenção.


Analisemos, pois, tais questões.


A) Exceção da incompetência material do tribunal


Quanto a esta exceção, o despacho recorrido dita o seguinte:


«Em sede de contestação arguiu o R. a exceção da incompetência absoluta do Tribunal em razão da matéria por entender que os pedidos têm que ver com uma situação civilística e não laboral, razão pela qual que o Juízo do Trabalho não tem competência para deles conhecer.


Exercido o contraditório a A. pugnou pelo indeferimento da mesma alegando que está em causa a violação de cláusulas insertas no contrato de trabalho e no acordo de revogação do mesmo.


Cumpre decidir.


Estatui o art.126ºda Lei 62/2013, 26 de agosto que “compete aos juízos de trabalho, em matéria cível conhecer:


a) Das questões relativas à anulação e interpretação dos instrumentos de regulamentação coletiva do trabalho que não revistam natureza administrativa;


b) Das questões emergentes de relações de trabalho subordinado e de relações estabelecidas com vista à celebração de contratos de trabalho;


c) Das questões emergentes de acidentes de trabalho e doenças profissionais;


d) Das questões de enfermagem ou hospitalares, de fornecimento de medicamentos emergentes da prestação de serviços clínicos, de aparelhos de prótese e ortopedia ou de quaisquer outros serviços ou prestações efetuados ou pagos em benefício de vítimas de acidentes de trabalho ou doenças profissionais;


e) Das ações destinadas a anular os atos e contratos celebrados por quaisquer entidades responsáveis com o fim de se eximirem ao cumprimento de obrigações resultantes da aplicação da legislação sindical ou do trabalho;


f) Das questões emergentes de contratos equiparados por lei aos de trabalho;


g) Das questões emergentes de contratos de aprendizagem e de tirocínio;


h) Das questões entre trabalhadores ao serviço da mesma entidade, a respeito de direitos e obrigações que resultem de atos praticados em comum na execução das suas relações de trabalho ou que resultem de ato ilícito praticado por um deles na execução do serviço e por motivo deste, ressalvada a competência dos tribunais criminais quanto à responsabilidade civil conexa com a criminal;


i) Das questões entre instituições de previdência ou de abono de família e seus beneficiários, quando respeitem a direitos, poderes ou obrigações legais, regulamentares ou estatutárias de umas ou outros, sem prejuízo da competência própria dos tribunais administrativos e fiscais;


j) Das questões entre associações sindicais e sócios ou pessoas por eles representados, ou afetados por decisões suas, quando respeitem a direitos, poderes ou obrigações legais, regulamentares ou estatutárias de uns ou de outros;


k) Dos processos destinados à liquidação e partilha de bens de instituições de previdência ou de associações sindicais, quando não haja disposição legal em contrário;


l) Das questões entre instituições de previdência ou entre associações sindicais, a respeito da existência, extensão ou qualidade de poderes ou deveres legais, regulamentares ou estatutários de um deles que afete o outro;


m) Das execuções fundadas nas suas decisões ou noutros títulos executivos, ressalvada a competência atribuída a outros tribunais;


n) Das questões entre sujeitos de uma relação jurídica de trabalho ou entre um desses sujeitos e terceiros, quando emergentes de relações conexas com a relação de trabalho, por acessoriedade, complementaridade ou dependência, e o pedido se cumule com outro para o qual o juízo seja diretamente competente;


o) Das questões reconvencionais que com a ação tenham as relações de conexão referidas na alínea anterior, salvo no caso de compensação, em que é dispensada a conexão;


p) Das questões cíveis relativas à greve;


q) Das questões entre comissões de trabalhadores e as respetivas comissões coordenadoras, a empresa ou trabalhadores desta;


r) De todas questões relativas ao controlo da legalidade da constituição, dos estatutos e respetivas alterações, do funcionamento e da extinção das associações sindicais, associações de empregadores e comissões de trabalhadores;


s) Das demais questões que por lei lhes sejam atribuídas.”


É sabido que a competência material do Tribunal é aferida em função da estruturação do pedido e fundamentos, não dependendo a verificação de tal pressuposto processual da apreciação do mérito da causa e da eventual procedência desta .


Ora, em sede de petição inicial, alegou a A. que, em 27 de Abril de 2016 celebrou com o R. contrato de trabalho cuja cópia juntou e deu por reproduzida, dele resultando o acordo quanto à realização das funções de diretor de serviços do R. sob a autoridade da A., mediante o pagamento de retribuição mensal, por tempo indeterminado, nas instalações desta, 40 horas por semana, por tempo indeterminado e obrigação de, durante e após, sigilo profissional.


Mais alegou a A. que, em 22 de Outubro de 2022, celebrou com o R. acordo de revogação daquele contrato nos termos do qual este se obrigou a não publicar, veicular, comentar, fazer conhecer ou por qualquer forma transmitir a terceiros, informações que coloquem em causa a reputação dos administradores, gerentes, diretores ou quaisquer funcionários da A. o que o R. fez nos termos que alegou.


Pede, por isso, a condenação do R. a :


a) no pagamento de indemnização em valor não inferior a EUR 100.000,00 (cem mil euros) nos termos:


b) a pagar a indemnização devida pelos danos patrimoniais que, ao abrigo do disposto no artigo 556.º, n.º 1, alínea b) do CPC, se venham a determinar;


c) Caso se venha a demonstrar que os danos referidos no pedido b) supra são impassíveis de determinação concreta antes de proferida decisão final, aplicasse o disposto no artigo 609.º, n.º 2 e 358.º, n.º 2 do CPC;


d) nos juros incidentes sobre tais montantes;


e) na inibição de propagação de quaisquer informações sobre a VIGIQUINTA e todas as empresas que integram o Grupo Quinta do Lago, bem como os membros dos respetivos órgãos de administração, que estejam relacionadas com o dever de confidencialidade e não depreciação que sobre o Réu pende, conforme supra seja por via oral, escrita ou qualquer outro meio ou forma, a quaisquer terceiros, incluindo órgãos de comunicação social e aos próprios membros dos órgãos de administração da VIGIQUINTA e do Grupo Quinta do Lago, e respetivos funcionários e colaboradores;


f) na inibição da prática de quaisquer atos contra a VIGIQUINTA, o Grupo Quinta do Lago, bem como os membros dos respetivos órgãos de administração;


g) na inibição de acesso e proibição de permanência do Réu nas instalações da VIGIQUINTA e em todos as instalações e estabelecimentos da propriedade do Grupo Quinta do Lago e / ou por si geridos;


h) em custas, incluindo custas de parte e procuradoria.


Radicando a causa de pedir na relação laboral, bem assim, no acordo que as partes fizeram tendo em vista a cessação daquela relação e incumprimento de ambos, é evidente que os pedidos emergem de relações de trabalho subordinado e, por isso, sem prejuízo de, a final, o Tribunal se pronunciar acerca da procedência de cada um dos pedidos formulados, a competência material deste juízo para dos pedidos conhecer é inequívoca razão porque, sem necessidade de maiores considerações, julgamos improcedente a exceção arguida.


O Tribunal é, pois, competente em razão da matéria.»


Em sede de recurso, foi alegado, em breve síntese, que os presentes autos não versam questões emergentes de relação de trabalho subordinado, pelo que deve concluir-se que o despacho recorrido violou o disposto no artigo 126.º da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, devendo, por conseguinte, julgar-se totalmente procedente a exceção em causa.


Desde já se adianta que não assiste razão ao Recorrente.


A competência do tribunal constitui um dos mais importantes pressupostos processuais, isto é, uma das condições essenciais de que depende o exercício da função jurisdicional (cf. “Direito Processual Civil Declaratório”, vol II, págs. 7 e ss., Anselmo de Castro, Almedina Coimbra, 1982).


Para que um tribunal possa conhecer e decidir sobre o mérito de uma determinada ação o mesmo tem de ser competente ou idóneo à luz da legislação vigente, designadamente das regras que distribuem o poder de julgar entre os diferentes tribunais – (cf. “Manual de Processo Civil”, Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, 2.ª edição, Coimbra Editora, pág. 195).


Entre estas regras encontram-se as que repartem, na ordem interna, as matérias das causas entre tribunais da mesma categoria e hierarquia. Trata-se, no fundo, de uma organização judiciária horizontal.


De salientar, ainda, que a competência para o julgamento de uma causa afere-se a partir da relação jurídica que se discute na ação, tal como é configurada pelo autor (cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03-05-2000, CJ, STJ, II, pág.39).


Ora, no caso que nos ocupa, a causa de pedir invocada pela Autora assenta na alegada violação, por parte do Réu, de obrigações decorrentes da relação laboral anteriormente estabelecida entre as partes, concretamente do contrato de trabalho e do respetivo acordo de revogação.


Em razão disso, o direito reclamado provém ou emerge de uma relação de trabalho subordinado e das obrigações assumidas nessa relação contratual.


Sendo assim, ao abrigo do artigo 126.º, n.º 1, alínea b) da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto (Lei da Organização do Sistema Judiciário), o tribunal a quo é materialmente competente para conhecer da ação, como bem se decidiu no despacho recorrido.


Consequentemente, o recurso, nesta parte, não pode proceder.


B) Exceção da ilegitimidade ativa


Na decisão recorrida, esta exceção foi assim apreciada:


«Arguiu o R. em sede de contestação exceção da ilegitimidade ativa da A. alegando que a A. está a representar pessoas singulares que identifica e com as quais o R. tem um diferendo judicial em virtude de agressões que os mesmos lhe perpetraram.


Exercido o contraditório cumpre decidir.


Prescreve o art.30.ºdo Código do Processo Civil que “1- O autor é parte legítima quando tem interesse direto em demandar; o réu é parte legítima quando tem interesse direto em contradizer.


2 - O interesse em demandar exprime-se pela utilidade derivada da procedência da ação e o interesse em contradizer pelo prejuízo que dessa procedência advenha.


3 - Na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor.”


Em face de tal redação o apuramento da legitimidade processual impõe apenas a consideração do pedido e da causa de pedir, independentemente da prova dos factos que a integram. Ou seja, a titularidade da relação material controvertida é aferida pela configuração que dela faz o autor.


No seguimento dos Professores Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio de Nora, in Manuel de Processo Civil, 2ª edição revista e atualizada, Coimbra editora, p. 129ss “ ser parte legitima na ação é ter o poder de dirigir a pretensão deduzida em juízo ou a defesa contra ela oponível. A parte terá legitimidade como autor se for ela quem juridicamente pode fazer valer a pretensão em face do demandado, admitindo que a pretensão exista; e terá legitimidade como réu, se for ela a pessoa que juridicamente pode opor-se à procedência da pretensão (…)”.


A legitimidade processual, nos dizeres de Lebre de Freitas, in Código de Processo Civil anotado, Vo.1, p. 51” exprime a relação entre a parte no processo e o objeto deste (a pretensão ou o pedido) e, portanto, a posição que a parte deve ter para que possa ocupar-se do pedido, deduzindo-o ou contradizendo-o”.


A regra supra referida sofre, no entanto, exceções como se retira da 1ª parte do artigo 30º nº 3 do C.P.C. decorrentes da atribuição legal de legitimidade para a ação a quem não é titular da relação material controvertida ou só em parte o é.


No caso vertente, conforme decorre da descrição da causa de pedir e dos pedidos exarada aquando do conhecimento da exceção da incompetência material, a A. alega factos atinentes à relação contratual que a mesma estabeleceu com o R. (e sua violação) – quer aquando da subscrição do contrato de trabalho, quer aquando da outorga do contrato de cessação da mesma - e formula pedidos em nome próprio, ou seja que, a serem deferidos, têm repercussão na sua esfera jurídica.


Em face disso é evidente que a A. tem interesse em demandar e, por isso, julga-se igualmente improcedente a exceção da ilegitimidade deduzida.


As partes são, pois, legitimas.»


Alegou o Recorrente que a Autora não é parte legítima porque veio tentar representar, nesta ação, duas pessoas com quem o Recorrente tem uma lide judicial, e não é visada nos alegados incumprimentos cometidos.


Ora, também neste aspeto, não assiste razão ao Recorrente.


O conceito de legitimidade mostra-se definido no artigo 30.º do Código de Processo Civil, aplicável ao processo laboral, por força da remissão prevista no artigo 1.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho.


Resulta do aludido artigo 30.º que o autor é parte legítima quando tem interesse direto em demandar, exprimindo-se esse interesse pela utilidade derivada da procedência da ação, sendo considerados titulares do interesse relevante, na falta de indicação da lei em contrário, os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor.


No caso sub judice, a relação material controvertida, configurada pela Autora, é, como vimos, a relação laboral e o seu incumprimento por parte do Réu. A Autora apresenta-se, em nome próprio, como outorgante desse contrato – e não em representação de alguém -, e formula pedidos que, caso sejam julgados procedentes, terão efeito na sua esfera jurídica.


É, pois, manifesto o seu interesse direto em demandar.


Por conseguinte, a Autora é parte legítima para a propositura da ação, como, corretamente, foi decidido pelo tribunal a quo.


Em consequência, soçobra, também nesta parte, o recurso.


C) Invocada ineptidão da petição inicial


Sobre a arguida ineptidão da petição inicial, escreveu-se na decisão recorrida:


«Arguiu igualmente o R. ineptidão da petição inicial alegando que existe contradição entre os pedidos e a causa de pedir e incompatibilidade entre os pedidos formulados nas alíneas d), e), f), g) e h) .


Exerceu-se o contraditório.


Estatui o art.186º nº1 do Código de Processo Civil ex vi art.1º nº 2 al. a) do CPT que “é nulo todo o processo quando for inepta a petição inicial.”


Por foça do nº2 da mesma norma “Diz-se inepta a petição inicial:


(…) b) quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir;


c) quando se cumulem causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis.”


O pedido, a sua versão processual, consiste na providência processual adequada para tutela do interesse do autor.


Já do ponto de vista material, consistirá na afirmação duma situação jurídica subjetiva atual ou da vontade dum efeito jurídico baseado numa situação subjetiva atual ou, ainda, na afirmação da existência ou inexistência dum facto jurídico (vide Lebre de Freitas, in Introdução ao processo civil, conceitos e princípios gerais, Coimbra editora, 1996. p. 53).


Por seu turno, a causa de pedir, consistirá na narração dos factos pertinentes à causa e que sejam indispensáveis para a solução que o autor quer obter (neste sentido vide Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil anotado, II, p. 351 e artigo 467º nº 1 al. d) do C.P.C.


Considerando que entre a conclusão (pedido) formulado numa petição e as suas premissas (causa de pedir) deve existir um nexo lógico, a contradição entre a causa de pedir e o(s) pedidos existe quando tal nexo não exista por evidente oposição/negação entre a conclusão e as premissas (neste sentido vide António Abrantes Geraldes, in Temas da Reforma do processo Civil, Almedina, 1997, Vol. I, , p. 115 e AC. RE de 17/06/2021, proc. 112/20.4T8TNV-E1, acessível in www.dgsi.pt).


A incompatibilidade de pedidos, por seu turno, existe quando os vários pedidos formulados têm efeitos jurídicos que mutuamente se excluem ou quando assentam em causas de pedir inconciliáveis (neste sentido vide Abranges Geraldes in op. citada, p. 117 e Ac RL de 04/07/2024, proc. 20137/23.7T8LSB.L1-2, acessível in www.dgsi.pt).


Ora, no caso vertente, a mera leitura dos pedidos formulados permite concluir que nenhum deles exclui os efeitos que com os demais se pretendem. Radicando na mesma causa de pedir, evidentemente, não radicam em causas de pedir inconciliáveis e, por isso, sem necessidade de maiores consideração, a petição inicial não é inepta assim se julgando improcedente a exceção arguida.»


Nas alegações do recurso, insiste o Recorrente que os pedidos formulados nas alíneas d), e), f), g) e h) são substancialmente incompatíveis e que existe uma contradição entre os pedidos e a causa de pedir, pelo que a petição inicial é inepta nos termos previstos pelas alíneas b) e c) do n.º 2 do artigo 186.º do Código de Processo Civil.


Vejamos.


A contradição entre o pedido e causa de pedir, bem como a cumulação de pedidos substancialmente incompatíveis, constituem causas de ineptidão da petição inicial, e, consequentemente, de nulidade de todo o processo – cf. artigo 186.º, n.ºs 1 e 2, alíneas b) e c) do mencionado compêndio legal.


No que se refere à relação entre a causa de pedir e o pedido, ensina-nos Alberto dos Reis, em “Comentário ao Código de processo Civil”, vol. II, pág. 381: «a causa de pedir deve estar para com o pedido na mesma relação lógica em que, na sentença, os fundamentos hão-de estar para com a decisão. O pedido tem, como a decisão, o valor e o significado duma conclusão; a causa de pedir, do mesmo modo que os fundamentos de facto da sentença, é a base, o ponto de apoio, uma das premissas em que assenta a conclusão. Isto basta para mostrar que entre a causa de pedir e o pedido deve existir o mesmo nexo lógico que entre as premissas dum silogismo e a sua conclusão.»


Esclarece, também, Antunes Varela, em RLJ, 121.º, pág. 121 e ss., que «[é] no sentido da incompatibilidade lógica entre o facto real, concreto, individual, invocado pelo autor como base da sua pretensão (causa de pedir) e o efeito jurídico por ele requerido (pedido) através da ação judicial, que a doutrina e a jurisprudência justificadamente interpretam e aplicam a contradição prevista (e regulada) na alínea b) do n.º 2 do art. 193.º do Cód. Proc. Civil.2


Se a crise da pretensão deduzida em juízo reside, não na falta de correspondência lógico-normativa entre o facto concreto alegado pelo autor e a providência jurisdicional por ele requerida, mas na simples falta real de um pressuposto (seja de facto, seja de direito) da concessão desta providência, a situação é de improcedência da ação – e não de contradição (lógica, normativa) entre o petitum e a causa petendi.»


Ora, no vertente caso, a Autora alegou que celebrou com o Réu um contrato de trabalho que cessou através de um acordo de revogação e que, na sequência desta relação laboral, este último assumiu determinadas obrigações, que violou, tendo provocado danos diversos à Autora. Na sequência, através da propositura da presente ação pretende que se reconheça a responsabilidade contratual do Réu pelos (alegados) incumprimentos, tendo concretizado essa responsabilidade através dos pedidos formulados.


Existe, pois, uma coerência lógica entre os factos narrados e os pedidos formulados.


As premissas apresentadas justificam a conclusão. Por isso, como bem decidiu a 1.ª instância, não se verifica contradição entre a causa de pedir e os pedidos formulados.


Quanto à incompatibilidade substancial de pedidos prevista na alínea c) do n.º 2 do artigo 186.º, esta verifica-se quando se acumulam pedidos que mutuamente se excluem ou que assentam em causas de pedir inconciliáveis


Cita-se, a propósito, o Acórdão da Relação de Évora de 11-05-2017 (Proc. n.º 74/14.7T8LAG.E1):3


«Existe incompatibilidade substancial de pedidos quando os efeitos jurídicos que com eles se pretendem obter estão, entre si, numa relação de oposição ou contrariedade, de tal modo que o reconhecimento de um é a negação dos demais.»


Ora, no caso dos autos, os pedidos apresentados nas alíneas d), e), f), g) e h) apoiam-se na mesma causa de pedir e não se excluem mutuamente. O reconhecimento de qualquer um não nega os demais.


Em face do exposto, concluímos que a decisão recorrida não viola as alíneas b) e c) do n.º 2 do artigo 186.º do Código de Processo Civil.


Em decorrência, o recurso também improcede, nesta parte.


D) Suscitada irregularidade do mandato da Autora


Esta questão foi assim decidida:


«Arguiu ainda o R. a exceção dilatória da irregularidade de mandato por entender que, tendo sido gerente da A. entre 8 de junho de 2018 e 31 de outubro de 2022, durante tal período as senhoras advogadas (que agora patrocinam a A.) também a patrocinaram e uma delas reconheceu as assinaturas apostas no acordo de revogação do contrato de trabalho, circunstâncias que consubstanciam conflito de interesses e geram situação de impedimento nos termos do art.83 nº 1 do EOA.


Mais acrescenta que a interposição da presenta ação teria que ter sido deliberada em sede de Assembleia de sócios em virtude do R. ter sido seu gerente o que a A. não provou.


Exercido o contraditório cumpre decidir.


Prescreve o art.99º do Estatuto da Ordem dos advogados que


“1- O advogado deve recusar o patrocínio de uma questão em que já tenha intervindo em qualquer outra qualidade ou seja conexa com outra em que represente, ou tenha representado a parte contrária.


2 - O advogado deve recusar o patrocínio contra quem, noutra causa pendente, seja por si patrocinado.


3 - O advogado não pode aconselhar, representar ou agir por conta de dois ou mais clientes, no mesmo assunto ou em assunto conexo, se existir conflito entre os interesses desses clientes.


4 - Se um conflito de interesses surgir entre dois ou mais clientes, bem como se ocorrer risco de violação do segredo profissional ou de diminuição da sua independência, o advogado deve cessar de agir por conta de todos os clientes, no âmbito desse conflito.”


Ora, considerando que a pessoa coletiva não se confunde com os seus representantes, a circunstância do R. ter sido gerente da A. durante um lapso de tempo, durante o qual as ilustres mandatárias que a patrocinam nesta ação também a representavam, não as coloca no papel de advogadas que já representaram o R. e, por isso, não se verifica o alegado conflito de interesses porquanto, do que decorre dos autos, as mesmas sempre representaram a A. .


Acresce que, de fls. 24 vº e 25 dos autos, decorre que a Srª Drª BB, reconheceu as assinaturas apostas no acordo de revogação do contrato de trabalho.


Nos termos do art. 38º do DL 76-A/2006, 29 de março devidamente atualizado (diploma que atualiza e flexibiliza os modelos de governo das sociedades anónimas, adota medidas de simplificação e eliminação de atos e procedimentos notariais e registrais e aprova o novo regime jurídico da dissolução e da liquidação de entidades comerciais) “ 1- Sem prejuízo da competência atribuída a outras entidades, (…) os advogados (…) podem fazer reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais e por semelhança, autenticar documentos particulares, certificar, ou fazer e certificar, traduções de documentos, nos termos previstos na lei notarial, bem como certificar a conformidade das fotocópias com os documentos originais e tirar fotocópias dos originais que lhes sejam presentes para certificação, nos termos do Decreto-Lei n.º 28/2000, de 13 de Março.”.


A mera certificação de que uma assinatura é da autoria de determinado cidadão não integra, manifestamente, situação que confere ao advogado especiais conhecimentos acerca de questão em litígio e, por isso, sem necessidade de maiores considerações, por despiciendas, não é de concluir pela existência de qualquer conflito de interesses.


Finalmente, prescreve o art.72º do Código das Sociedades comerciais que:


“1 - Os gerentes ou administradores respondem para com a sociedade pelos danos a esta causados por atos ou omissões praticados com preterição dos deveres legais ou contratuais, salvo se provarem que procederam sem culpa.


2 - A responsabilidade é excluída se alguma das pessoas referidas no número anterior provar que atuou em termos informados, livre de qualquer interesse pessoal e segundo critérios de racionalidade empresarial.


3 - Não são igualmente responsáveis pelos danos resultantes de uma deliberação colegial os gerentes ou administradores que nela não tenham participado ou hajam votado vencidos, podendo neste caso fazer lavrar no prazo de cinco dias a sua declaração de voto, quer no respetivo livro de atas, quer em escrito dirigido ao órgão de fiscalização, se o houver, quer perante notário ou conservador.


4 - O gerente ou administrador que não tenha exercido o direito de oposição conferido por lei, quando estava em condições de o exercer, responde solidariamente pelos atos a que poderia ter-se oposto.


5 - A responsabilidade dos gerentes ou administradores para com a sociedade não tem lugar quando o ato ou omissão assente em deliberação dos sócios, ainda que anulável.”


Por força do disposto no art.75º do mesmo diploma:


“1 - A ação de responsabilidade proposta pela sociedade depende de deliberação dos sócios, tomada por simples maioria, e deve ser proposta no prazo de seis meses a contar da referida deliberação; para o exercício do direito de indemnização podem os sócios designar representantes especiais.


2 - Na assembleia que aprecie as contas de exercício e embora tais assuntos não constem da convocatória, podem ser tomadas deliberações sobre a ação de responsabilidade e sobre a destituição dos gerentes ou administradores que a assembleia considere responsáveis, os quais não podem voltar a ser designados durante a pendência daquela ação. (…)”.


A conjugação das normas supra mencionadas impõe a conclusão de que as ações a que as mesmas se referem são as demandas dos gerente ou administradores por atos ou omissões, em violação de deveres legais ou contratuais, durante o exercício de tais funções.


No caso vertente está em causa a violação de uma obrigação decorrente de acordos, atinente a dever de confidencialidade, já depois da relação findar e, por isso, não tinha a A. que juntar cópia da deliberação que determinou a interposição da ação.


Em face de tudo quanto se referiu improcede, in totum, a arguida exceção de irregularidade do mandato.»


Não podemos deixar de concordar e de aderir aos fundamentos transcritos.


Efetivamente, durante o período em que o Recorrente foi gerente da Autora, as senhoras Advogadas que na presente ação patrocinam e representam com poderes especiais a Autora, patrocinavam e representavam era a sociedade VIGIQUINTA – PREVENÇÃO E SEGURANÇA LDA – que é uma pessoa coletiva autónoma - e não o seu gerente.


Ademais, não existem elementos nos autos que permitam concluir que, em algum momento, o Réu, enquanto pessoa jurídica, tenha sido cliente das referidas advogadas ou que estas o tenham representado.


Logo, não há qualquer conflito de interesses associado a esta questão.


No que se refere ao reconhecimento das assinaturas apostas no acordo de revogação do contrato de trabalho, realizado por uma das advogadas da Autora, esta atuou unicamente na qualidade de entidade certificadora, nos termos previstos no artigo 38.º do Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de março. E, nessa qualidade, não estava a defender ou a representar direitos ou interesses de qualquer uma das partes outorgantes do acordo. Como tal, não se verifica qualquer incompatibilidade profissional para o exercício do mandato forense a favor da Autora.


Por fim, cumpre referir que a propositura da presente ação pela Autora não dependia de prévia deliberação em assembleia de sócios, uma vez que não se trata de uma ação de responsabilização pela concreta execução dos poderes de Gerência – cf. artigos 72.º, 75.º e 246.º, n.º 1, alínea g), do Código das Sociedades Comerciais.


Está em causa, repetimos, uma relação laboral, em que se alega que o ex-trabalhador não cumpriu o dever de confidencialidade decorrente do contrato de trabalho e do acordo de revogação. Assim sendo, a decisão sobre a instauração da ação poderia ser assumida, como foi, apenas pela sociedade, através dos legais representantes.


Enfim, atento o exposto, a conclusão que se impõe é que não se verifica a suscitada irregularidade do mandato, pelo que se confirma, nesta parte, a decisão recorrida.


E) Exceção da prescrição do direito peticionado na reconvenção


Esta exceção foi assim decidida pelo tribunal a quo:


«Por força do estatuído no art.337º nº1 do Código de Trabalho, “O crédito de empregador ou de trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.”


Nos termos do disposto no art.323º nº1 do Código Civil “A prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer ato que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o ato pertence e ainda que o tribunal seja incompetente.”


Por força do nº 2 da mesma norma, “Se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias.”


De acordo com o disposto no nº4 da mesma norma “É equiparado à citação ou notificação, para efeitos deste artigo, qualquer outro meio judicial pelo qual se dê conhecimento do ato àquele contra quem o direito pode ser exercido.”


Em decorrência do art.325ºdo mesmo diploma “1. A prescrição é ainda interrompida pelo reconhecimento do direito, efetuado perante o respetivo titular por aquele contra quem o direito pode ser exercido.


2.O reconhecimento tácito só é relevante quando resulte de factos que inequivocamente o exprimam.”.


No caso vertente o contrato de trabalho cessou em 28 de Outubro de 2022 e a reconvenção foi deduzida a 13 de março de 2024, não tendo sido alegada a existência de qualquer causa de suspensão ou interrupção da prescrição.


Sendo evidente que o R/reconvinte pretende fazer valer direito de crédito emergente da cessação da relação laboral (ou da forma como esta ocorreu ), referindo-se o art.337º do Código de trabalho aos direitos de crédito decorrentes da cessação do contrato de trabalho, consistindo a revogação (entre outras) numa das formas de cessação daquele (vide art. 340º do Código de Trabalho), a nosso ver, inexistem razões legais ou decorrentes do espirito que à lei preside que justifiquem eventual distinção entre os direitos de crédito decorrentes desta forma de cessação do contrato ( por acordo de revogação) dos decorrentes das demais formas de cessação previstas na lei e, por isso, é de concluir que o prazo de prescrição previsto no art.337º do Código de Trabalho se aplica à situação sub iudice.


Assim sendo porque, quando a reconvenção foi deduzida já tinha decorrido o prazo de um ano desde aquela cessação, é de concluir pela procedência da exceção da prescrição.


Em face do supra exposto, bem assim em decorrência do art.576º nº3 do CPC ex vi art.1º nº 2 al. a) do CPT, absolvo a reconvinda do pedido de reconvenção, nesta decisão não se abrangendo a parte do pedido respeitante à litigância de má-fé que, evidentemente, se admite ainda que deduzido na parte da reconvenção.»


Não se conforma o Recorrente com esta decisão, tendo alegado que não é aplicável o prazo prescricional previsto no artigo 337.º, n.º 1, do Código do Trabalho, mas o prazo que resulta do artigo 498.º do Código Civil, em virtude de não estarem em causa créditos laborais.


Cautelosamente, referiu que, caso se considere aplicável o mencionado artigo 337.º, deverão ser considerados os períodos de suspensão do prazo de prescrição.


Analisemos.


Em reconvenção foi pedido que a Autora fosse condenada a pagar ao Réu a quantia de € 600.000, acrescida de juros, à taxa legal em vigor, desde a data da notificação da reconvenção até efetivo e integral pagamento.


Este pedido assenta, parcialmente, no acordo de revogação do contrato de trabalho.


Diz o Réu que tal acordo foi por si subscrito mediante coação física e sem a consciência da vontade nele expressa, tendo determinado que ficasse sem trabalho, tivesse sofrido ansiedade, stress, depressão, insónias, tristeza, dificuldades de concentração, com necessidade de tomar medicação, para além de não ter conseguido novo emprego, encontrando-se a sua imagem denegrida. Em consequência, considera-se com direito a receber um valor indemnizatório de € 500.000 pelos danos sofridos.


O remanescente peticionado (€100.000), reporta-se à alegada falta à verdade na petição inicial, o que consubstancia má-fé.


Extrai-se do despacho recorrido que a parte relacionada com a má-fé se manteve, pelo que apenas o pedido de indemnização que emerge do acordo de revogação (pelas alegadas circunstâncias em que o mesmo foi assinado e pelos danos sofridos) foi considerado prescrito por já ter decorrido o prazo prescricional previsto no artigo 337.º do Código do Trabalho.


E, adiantamos, esta decisão não nos merece censura.


O artigo 337.º do Código do Trabalho é aplicável a pedidos de indemnização por danos sofridos em virtude da cessação do contrato de trabalho.


Basta, a título de exemplo mais comum, pensar nas frequentes situações de despedimento ilícito em que o trabalhador peticiona a condenação da empregadora no ressarcimento dos danos não patrimoniais sofridos em consequência do despedimento ilegal, que é um crédito, obviamente, abrangido pelo regime prescricional consagrado no mencionado artigo 337.º.


Ora, de acordo com o referido artigo, o crédito de empregador ou de trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.


A relação laboral sub judice cessou em 28 de outubro de 2022 e o pedido reconvencional foi deduzido em 13 de março de 2024.


Por conseguinte, no momento em que foi deduzido o pedido reconvencional já havia decorrido o prazo prescricional consagrada no artigo 337.º.


Acresce que não foi alegada, nem se verifica, qualquer causa de suspensão ou interrupção do referido prazo.


Em suma, a decisão que julgou procedente a exceção da prescrição invocada não merece reparo.


Em conclusão, o recurso, nesta parte, também improcede.


Em síntese, o recurso de apelação interposto pelo Réu improcede totalmente.


*


Ampliação do recurso


Juntamente com as suas contra-alegações, a Autora veio, a título subsidiário, ampliar o objeto do recurso.


Ora, improcedendo o recurso de apelação, mostra-se prejudicado o conhecimento da ampliação do recurso.


Neste sentido, o acórdão da Relação do Porto de 10-01-2022 (Proc. n.º 2344/20.6T8PNF.P1):4


«III - A ampliação do âmbito do recurso é sempre subsidiária, no sentido de que apenas é conhecida se a apelação proceder. Improcedendo a apelação, a ampliação do âmbito do recurso não é conhecida.».


Consequentemente, não conheceremos da ampliação do recurso.


-


Concluindo, o recurso de apelação terá de improceder e a decisão da 1.ª instância será confirmada.


As custas do recurso serão da responsabilidade do Recorrente, nos termos previstos pelo artigo 527.º do Código de Processo Civil.


*


Decisão


Nestes termos, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso improcedente, e, em consequência, confirma-se a decisão recorrida.


Custas do recurso pelo Recorrente.


Notifique.


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Évora, 18 de setembro de 2025


Paula do Paço


Emília Ramos Costa


Filipe Aveiro Marques

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1. Relatora: Paula do Paço; 1.ª Adjunta: Emília Ramos Costa; 2.º Adjunto: Filipe Aveiro Marques↩︎

2. O artigo indicado corresponde ao artigo 186.º do atual Código de Processo Civil↩︎

3. Consultável em www.dgsi.pt.↩︎

4. Idem.↩︎