I - A sentença não é nula pelo facto de não ter acolhido a classificação da parcela tal como proposto por uma das partes, nem excede o pedido quando o montante da indemnização arbitrado sendo inferior ao fixado na decisão arbitral, se situa entre os valores indicados nos recursos interpostos pelas partes.
II - No domínio do processo de expropriação a prova pericial merece um particular relevo, atento o carácter técnico das matérias em análise, pelo que apenas não deve ser considerada quando se verifique manifesto erro de apreciação ou violação do critério legal. Como se vem entendendo na jurisprudência dos tribunais superiores, verificando-se divergência de análise entre os peritos, cumpre considerar o resultado da prova pericial, no laudo maioritário, sobretudo quando se mostra subscrito pelos peritos nomeados pelo tribunal quer pela competência técnica que lhes é reconhecida, quer pelas melhores garantias de imparcialidade que oferecem, sendo certo que o tribunal pode introduzir-lhe ajustamentos, fazer correções, colmatar falhas, ou seguir o laudo ou critérios diferentes, se os tiver por mais justos, de acordo com os elementos probatórios que possuir.
III - O laudo maioritário dos peritos respeita o critério legal, quando na avaliação do solo da parcela atende ao critério referencial previsto no art.26º/5 do Código das Expropriações, porque a utilização dos valores fixados administrativamente para efeitos de fixação da renda condicionada não foi considerado de forma absoluta, mas temperado por outros fatores (atualização, conversão de área útil em área bruta, tipologia da construção) para apurar o valor real e corrente de mercado, sem considerar critérios especulativos.
IV - A aplicação dos índices corretivos do art.º 26º/9/10 do Código das Expropriações leva em consideração o facto da parcela expropriada dispor de infraestruturas, que no aproveitamento normal do prédio seria necessário reforçar face às exigências do PDM e ainda, as despesas necessárias para concretizar a construção ponderando que face às caraterísticas descritas do prédio seria necessário efetuar despesas com projetos, licenciamentos municipais que os expropriados não suportam com a expropriação.
V - Considerando o aproveitamento normal da parcela, como solo apto para construção de pavilhões industriais ou empresariais, o corte do arvoredo representa um encargo, porque a subsistência das árvores mostra-se incompatível com o aproveitamento da parcela para a construção, não sendo de valorizar como benfeitoria.
VI - Mantendo a parcela sobrante a mesma aptidão construtiva, não se justifica fixar indemnização pela sobrante.
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I. Relatório
Nos presentes autos de expropriação, em que é Expropriante BRISA CONCESSÃO RODOVIÁRIA, S.A., NIPC ..., com sede na Quinta ..., Edifício ..., ..., e Expropriados AA, NIF ..., viúva, residente na Rua ..., ..., ..., ..., Maia, BB, NIF ..., e mulher CC, NIF ..., residente na Rua ..., ..., ..., Gondomar, e DD, NIF ..., solteira, maior, residente na Rua ..., ..., ..., ..., Maia, por despacho do Senhor Secretário de Estado das Infraestruturas de 30 de setembro de 2019, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 199, de 16 de outubro de 2019, sob o Despacho n.º 9351/2019, foi declarada a utilidade pública, com caráter de urgência, da expropriação, a favor do Estado Português, sendo sua concessionária Brisa – Concessão Rodoviária, S.A., de uma parcela (parcela n.º 88) com a área de 2.231m2 a destacar do prédio com a área registada de 3.000m2 inscrito na matriz predial da freguesia ..., Município ..., sob o artigo ..., e descrito na Conservatória do Registo Predial da referida freguesia ..., sob o número ... (Descrição em Livro: N.º ..., Livro N.º ..., da Secção 2).
Mais alegou que o relatório de arbitragem reproduz o auto de vistoria, o qual não foi capaz de traduzir convenientemente o conjunto de infraestruturas que existe na via pública que serve o prédio abrangido pela expropriação, máxime no que se reporta ao concreto local em que este confronta com aquela.
O índice de utilização do solo (quantificado em 0,80 m2/m2) assumido pelos
Senhores Árbitros resulta de uma decisão não devidamente fundamentada, uma vez que os Senhores Árbitros fazem, sem motivo ou causa próxima, coincidir o índice de utilização do solo com aquele que é o índice de impermeabilização máximo que o P.D.M. prevê, devendo antes ser tomado em consideração o índice de utilização do solo máximo, ainda que respeitando o índice de impermeabilização máximo, de 1,20m2/m2, atenta a envolvente e à tipologia da construção aí existente, a que acresce o facto de não ter sido considerada a circunstância de os Expropriados serem proprietários de um conjunto de outros prédios, contíguos ao visado pela expropriação, circunstância essa que, seguindo o critério da normalidade de mercado, possibilitava concretizar uma operação urbanística única, o que representa um aproveitamento económico normal mais rentável porquanto com um índice de construção superior ao atendido pelo relatório arbitral, conforme se constata, aliás, pelo conjunto de unidades industriais, empresariais e/ou de armazenamento implantadas na envolvência.
Na avaliação do solo cumpre ponderar o valor real e corrente de mercado por referência à construção que seria possível efetuar se não tivesse sido sujeito a expropriação e em conformidade com um aproveitamento normal, pelo que o critério utilizado pelos Senhores Árbitros (os preços de construção da habitação, por metro quadrado de área útil, de acordo com a Portaria n.º 353/2013, de 4 de dezembro, afetada do coeficiente de 0,6 por se tratar de construção prevista para indústria) não é um parâmetro atual nem válido para o tipo de construção considerada porquanto distinta da que está na génese do critério de referência (que se destina a habitação).
A decisão arbitral não concretiza no processo de determinação do valor do solo aquele que era o seu aproveitamento económico normal e que passava por considerar o seu destino efetivo ou possível em condições normais de mercado, tendo sempre presente as circunstâncias e condições de facto existentes à data de publicação da DUP, designadamente, não foi ponderada a construção individualizada em pisos distintos, com afetações distintas mas complementares (por exemplo, estacionamento em cave), assim incrementando o índice de construção e a potencialidade do solo.
Os Senhores Árbitros fixam o índice fundiário a atender, nos termos do disposto nos n.º 6 e 7 do artigo 26.º do C.E., em 12%, aludindo à localização, qualidade ambiental e equipamentos existentes na zona (que valoram em 10%) e ao conjunto de infraestruturas que consideraram existir junto do prédio (a que atribuem o valor de 2%), o que não é admissível, porquanto, o conjunto das infraestruturas existente junto do prédio era mais amplo do que o assumido na decisão arbitral, deve ser atribuída a percentagem de 1,5% (em lugar do 1% atribuído) atendendo ao acesso rodoviário que existe junto ao prédio (por se dever atender ao prédio e não à parcela), é parco o índice fundiário de 10%, devendo antes ser fixado em 12%, atendendo à localização, qualidade ambiental e equipamentos existentes, é incoerente considerar um valor de 35% para efeitos de despesas de urbanização para a criação e reforço de infraestruturas, uma vez que o custo de construção já considera despesas com infraestruturas [se o terreno não é valorizado pela existência de infraestruturas (artigo 26.º, n.º 7), então não poderá ser considerada a dedução de qualquer despesa para a sua realização, sob pena de dupla penalização do expropriado], e igual consideração deve ser feita acerca da consideração do fator de risco a que alude o artigo 26.º, n.º 10, uma vez que se apela à execução da construção e não à sua comercialização/transação no mercado, sob pena de dúvidas de constitucionalidade da norma por beneficiar a Expropriante ao fazer reduzir artificialmente a indemnização.
Mais alegou que a expropriação da parcela determina a constituição de uma área sobrante com 769 m2 que ficará sujeita à servidão non edificandi imposta pela via a executar, determinando, assim, a perda da capacidade edificativa que lhe advém do instrumento de gestão territorial vigente que desvaloriza a parcela em 90% do valor unitário do solo, tal como fixado pelos Senhores Árbitros, sendo de atribuir uma indemnização ponderando os fatores indicados para avaliação da parcela como solo apto para construção.
Por fim, refere que o valor da justa indemnização não é passível de ser alcançado por via do critério definido pelo legislador sob os n.º 4 e seguintes do artigo 26.º do Código das Expropriações, o que torna necessário que seja erigido um critério referencial alternativo que, nos termos do n.º 5 do artigo 23.º do mesmo Código, permita aferir o valor real e corrente que se propõe que seja alcançado por recurso ao método do custo.
Em sede de resposta ao recurso, alegou, em síntese, que a parcela expropriada era constituída por um terreno interior que não confinava com arruamento público e também o prédio de onde a parcela é destacada não confrontava com arruamento público, sendo o acesso ao prédio em causa feito por um caminho de perfil irregular, em terra batida que vai ligar, a uma distância não inferior a 30 metros ao arruamento público mais próximo.
Mais alegou que os Senhores Árbitros, embora possam ter ponderado a aplicação do índice de utilização do solo de 0,80m2, não concretizaram tal ponderação, antes mantiveram os cálculos na base de uma potencialidade construtiva máxima de 1,20m2. O envolvimento de outros prédios dos Expropriados, estranhos à expropriação da parcela de terreno em causa nos autos, não atingidos pelo ato expropriativo, não pode deixar de ser considerado inadmissível.
O recurso no acórdão arbitral ao valor referencial do preço unitário de construção a custos controlados revela-se razoável, legítimo e acertado porquanto isento. A arbitragem considerou o índice máximo de construção (que, aliás, contempla a totalidade de construção possível, seja acima, seja abaixo do solo) e a eventual autorização de construção em cave não traduziria uma mais-valia, dado o custo de construção que envolve.
No que concerne à localização, qualidade ambiental e equipamentos, destaca-se a localização da parcela numa zona periférica do concelho, servida à distância de mais de quinhentos metros de alguns estabelecimentos comerciais, e a circunstância de confinar de norte, sul e poente com a autoestrada ....
A adaptação do terreno, que apresenta configuração irregular e um declive acentuado, ao fim da construção importa custos que não podem deixar de ser imputados aos Expropriados.
Formulou as seguintes conclusões:
Conclui no sentido de o valor da justa indemnização ser o de 50.200,00 € (arredondando o valor de 50.199,61 €) que corresponde à soma das seguintes parcelas:
Nomeados os peritos, procedeu-se à realização da avaliação obrigatória.
“Em face do exposto e tudo ponderado, decido julgar parcialmente procedente o recurso apresentado pela Entidade Expropriante e improcedente o recurso apresentado pelos Expropriados e, em consequência,
1. Decreto a expropriação da parcela de terreno com a área de 2.231m2, a destacar do prédio com a área registada de 3.000 m2 inscrito na matriz predial da freguesia ..., Município ..., sob o artigo ..., e descrito na Conservatória do Registo Predial da referida freguesia ..., sob o número ...;
2. Fixo a indemnização a pagar pela Entidade Expropriante BRISA CONCESSÃO RODOVIÁRIA, S.A. aos Expropriados AA, BB e mulher CC e DD, pela expropriação da parcela identificada em 1, no valor de 83.863,29 € (oitenta e três mil oitocentos e sessenta e três euros e vinte e nove cêntimos).
O montante indemnizatório é atualizável de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, publicado pelo Instituto Nacional de Estatística, relativamente ao local da situação dos bens ou da sua maior extensão, desde a data da publicação da declaração de utilidade pública até à disponibilização à Expropriada de parte do depósito da entidade Expropriante e, quanto ao restante, até à data do trânsito desta decisão.
Transitada em julgado a sentença, sobre o montante indemnizatório, devidamente atualizado, vencerão juros de mora, a contar do fim do prazo para depósito da indemnização (cf. artigo 71.º do Código das Expropriações), à taxa legal em vigor, atualmente de 4%.
São ainda devidos juros moratórios nos termos do disposto no artigo 70.º do Código das Expropriações pelo período correspondente aos atrasos imputáveis à Entidade Expropriante relativamente à promoção da arbitragem e à realização do depósito da quantia mencionada no artigo 10.º, n.º 4 do Código das Expropriações.
Custas por ambas as partes, na proporção do respetivo decaimento, que se fixa em 14% para a Expropriante e em 86% para os Expropriados.
Fixo o valor da causa em 238.973,59 € (duzentos e trinta e oito mil novecentos e setenta e três euros e cinquenta e nove cêntimos)”.
1º A entidade expropriante, concessionária do estado Português, no processo de expropriação tem de respeitar, entre outros os princípios da boa fé, de imparcialidade, da administração aberta, da igualdade, legalidade, da justiça, etc.
2º Não pode ter 2 pesos e 2 medidas para aqueles que aceitam os valores que propôs e outra para aqueles que não a aceitam e optem, licitamente pela via da expropriação litigiosa.
3º Não pode uma expropriante defender um valor para o caso de o expropriado não aceitar e outro para o caso contrário.
4º Também não pode esconder peças do processo de expropriação, designadamente o relatório de avaliação que mandou efetuar e aprovou para efeitos de aquisição prévia pela via do direito privado.
5º Principalmente quando há uma diferença tão acentuada, como ocorre nestes autos, entre a oferta e o que defende em sede de recurso subordinado da decisão arbitral.
6º Ter pago um valor aos proprietários (aos que aceitaram o valor que propôs) e vir defender diferente, para muito menos, aos que não aceitaram a sua proposta, viola os princípios da boa fé, da confiança, da igualdade.
7º Não fornecer o relatório de avaliação viola o princípio da legalidade, o princípio da administração aberta, da transparência e da lealdade.
8º A norma do artigo 334º do Código Civil impede o abuso de direito, abuso que bloqueie o direito a exercitar um direito.
9º Viola os princípios básicos que enformam os princípios axiológicos de um direito vir defender em sede de recurso subordinado um valor inferior aquele que antes ofereceu.
10º Ainda por cima, por punição, pelo facto de ter discordado da sua posição inicial.
11º Sem invocar qualquer erro ou lapso em que tivesse incorrido. Apenas e só porque não aceitaste, agora recorro subordinadamente.
12º É ilegítimo o exercício de um direito quando o titular excede manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.
13º Oferecer um montante e depois baixá-lo sem qualquer razão viola o princípio da boa fé, ofende os bons costumes, é desprestigiante, é arvorar-se em castigador sem fundamento para tal.
A violação do poder cognitivo
14º O Tribunal não teve em conta nem a causa de pedir adaptada no recurso subordinado nem a aceitação expressa da expropriante quanto à existência da desvalorização da parcela sobrante.
15º A expropriante aceitou expressamente existir desvalorização da parcela sobrante. A expropriante aderiu em parte à decisão arbitral que é equiparada a uma decisão judicial.
16º O montante indemnizatório a este título está, por isso, apurado para os autos.
17º E o recurso subordinado tem de improceder porquanto se louvou na classificação de parte e permite como solo para outros fins e esta tese improcedem, todo foi classificado como apto para construção.
18º Deste modo, tem de improceder o recurso subordinado e ser fixada uma indemnização, pelo menos, do valor do solo ao preço fixado pelos peritos maioritários acrescida do valor da desvalorização aceite pela expropriante, expressamente (€14.811,00).
19º O julgamento do recurso subordinado, tal qual foi feito, viola o poder cognitivo do Tribunal.
A desvalorização da parcela sobrante
20º À parcela expropriada como resulta da comunicação do Município ... esteve um solo urbano, área verde de enquadramento e em espaços de atividades económicas – Espaços Empresariais Industriais.
21º Os senhores peritos maioritários, com um texto de 6 linhas, afastaram a desvalorização da parcela sobrante por entenderem que essa área (a nova área sujeita a servidão non aedificandi) pode ser contabilizada para a área possível de edificar.
22º Simples de mais para poder ser aceite e, quando está em causa uma área sobrante non aedificandi como o IMT documentou nos autos.
23º Para poder operar a transferência da área construível na parcela sobrante é preciso que seja possível, é possível que haja terreno disponível e condições para implantar.
24º Aqui temos o índice de 1,2 a uma permissão de impermeabilização de 80%.
25º Praticamente não sobra terreno porque estamos a raciocinar com armazéns de 1 piso, e é preciso deixar 20% para impermeabilizar e, deixar áreas envolventes para circulação pública e estacionamento.
26º A configuração da sobrante livre de servidão não ajuda a construção, pelo contrário, impede-a (basta ver-se as plantas juntas pelo IMT).
27º Impunha-se, no mínimo, aplicar a norma nº 1 e 2 do artigo 29º do CE.
28º A construção industrial não é em altura.
29º A compensação entre uma área que já estava sujeita a servidão non aedificandi não faz sentido. Há que ponderar a nova área e raciocinar com base na sua delimitação concreta e as implicações que tem.
30º Por outro lado, a área que integra a servidão non aedificandi criada pela Lei 34/2015 – está classificada no PDM como solo urbano/áreas verde de enquadramento, e desconhecemos como a nova área será classificada em novo PDM.
A dedução de 35% a título do nº 9 do artigo 26º
31º A norma foi mal aplicada pelos peritos e pela decisão recorrida.
32º Os peritos raciocinaram com a parcela concreta, criada pela Brisa e no seu interesse exclusivo. O proprietário não iria construir naquela parcela, mas numa zona mais ampla.
33º O raciocínio com uma parcela mais ampla não levaria a uma dedução tão considerável de 35%.
34º E os senhores peritos e a douta julgadora não consideraram apenas o encargo para reforço de infraestrutura que existia (reforçável) a rede de água. Não, considerou-os todos, os que existiam e os que não existiam.
35º Ora, só o reforço da infraestrutura rede de águas podia ser considerada e, por isso, tinha que ser muito inferior a 35%.
36º A penalização pela não existência de alguma infraestrutura é a não atribuição de índice. E nada mais como resulta do artigo 26º nº 7 do CE.
37º Também os custos com projetos e licenças não cabem na avaliação.
A dedução a título do nº 10 do artigo 26º
38º A aplicação da percentagem máxima a título de inexistência de risco é um perfeito exagero.
39º Na área destinada a este tipo de atividade está tudo preenchido com exceção desta área. Basta ver-se a figura 5 do relatório pericial (página 10 do relatório).
40º A zona está ocupada por empresas com dimensão. Se não houvesse necessidade o PDM não teria previsto para lá esta atividade económica.
41º O valor adotado para 10% atribuído pelos árbitros se bem que alto é mais justo e sensato.
O custo da construção
42º Não faz sentido aplicar um valor de 2014 atualizado com a taxa de desvalorização da moeda.
43º O legislador abandonou a publicação dos custos da construção para efeitos das rendas condicionadas da habitação a custos controlados, exatamente por entender o recurso aos valores de mercado.
44º Por outro lado, este abandono não pode ser suprido pela correção dos valores de 2014 face à desvalorização da moeda porque já antes era assim.
45º Se fosse para aplicar a taxa de desvalorização o Estado, antes de 2014 não publicaria cada ano nova portaria com valores diferentes que nada têm a ver com a depreciação da moeda.
46º Acresce que este valor é mero referencial e foi aplicado como verdade absoluta.
47º Acresce que é notório que o custo da construção é elevadíssimo. Disso nos dá nota um estudo publicado no Confidencial Imobiliário que 2021 (a DUP é de setembro de 2019 é certo) como valor mais baixo é de cerca de € 1 250,00.
A conversão área bruta/área útil
48º Para construção industrial não se justifica esta redução.
A área útil em prédio multifamiliar carece de áreas comuns. A entrada, o vão das escadas, as salas de condomínio, elevadores. Etc. na moradia individual já não se consideram, pois, toda a área é do adquirente.
49º Considerando pavilhões, áreas industriais, já temos área útil. Daí não se poder ter aplicado esta conversão.
50º A decisão que julgou o recurso subordinado é nula por ultrapassar o pedido e a causa de pedir deduzidos.
51º A parcela expropriada esta no PDM em solo urbano, uma parte em área verde de enquadramento e em área para construção de atividades económicas.
52º A parcela sobrante fica sujeita a uma muito maior área de servidão que lhe retira valor e, ninguém garante que continue em solo urbano.
53º E, com uma configuração muito desfavorável que impede muito, senão definitivamente a capacidade construtiva.
54º A douta sentença violou a norma do nº 9 do artigo 26º do CE porquanto considerou a implantação das infraestruturas todas e não apenas as que o preceito manda atender.
55º A norma dos nºs 1 e 2 do artigo 29º do CE não foi cumprida e, por isso, a sentença não aplica, também aqui bem o Direito.
56º A conversão da área bruta em área útil não se justifica em construção industrial pois não há zonas comuns.
57º A aplicação de 15 % a título do nº 10 do artigo 26º não é aceitável num caso como este, quando os proprietários podiam urbanizar de forma gradual e, por fases.
58º Quando as benfeitorias são aproveitáveis antes do aproveitamento do terreno para construção, como é o caso da madeira, podem e devem ser aproveitadas para comercializar.
59º E, por isso, são indemnizáveis.
60º O ponto 7 dos FP deve ser eliminado e substituído pelos dois pontos não provados, a saber, como resulta da prova documental e da prova testemunhal que é inequívoca e, foi prestada por quem conhecia a realidade.
61º Como resulta do levantamento topográfico que tem de ser aceite por não ter sido impugnado, pelas fotografias e plantas do relatório pericial e pelo depoimento das testemunhas, que depuseram com conhecimento, isenção e de forma a não deixar dúvidas.
62º Por serem familiares maior conhecimento das confrontações e dos limites do prédio.
63º Os depoimentos claros, concisos, conhecedores da Dra. EE, cujo depoimento foi gravado entre os momentos 00.00 até 09.27 foi claro no depoimento que entre o minuto 1.20 até ao minuto 9.20, disse que do Sul e do Nascente a parcela e o prédio confrontavam com a linha de água, um ribeiro de dimensão, que fica a uma cota inferior ao do terreno marginando de 4/5 metros.
64ª E foi convicta quando referiu que a Norte e a Poente o prédio confrontava com a Rua ... e, a parcela a Norte com a parcela sobrante, nos mesmos minutos 5.20 ª 9.15.
65ª Depôs também FF, engenheiro, cujo depoimento foi gravado 00.00 a 09.27 que foi claro – a Nascente e Sul confronta com o ribeiro e do Norte e Poente com a Rua ... (1.00 a 5.17).
66ª A Sul, no minuto 2.15 confronta com ribeiro, de outro lado há um terreno e só depois a vedação da AE.
67ª O ribeiro está mais baixo 3 metros, depois há um terreno inclinado a subir e depois fica a AE, (2.58 a 3,59).
68.ª Depôs também FF, engenheiro, cujo depoimento foi gravado 00.00 a 09.27 que foi claro – a Nascente e Sul confronta com o ribeiro e do Norte e Poente com a Rua ... (1.00 a 5.17).
69ª A Sul, no minuto 2.15 confronta com ribeiro, de outro lado há um terreno e só depois a vedação da AE.
70ª O ribeiro está mais baixo 3 metros, depois há um terreno inclinado a subir e depois fica a AE, (2.58 a 3,59).
71ª Devem ser eliminados os pontos 21 e 27 dos FP.
72ª O Ponto 28 dos FP não deve ser considerado por não se enquadrar na solução de direito.
73ª Os pontos 18 e 19 devem ser aditados o seguinte:
Ao 18 constituindo solo urbano.
Ao 19 constituída a área da servidão solo urbano, área verde de enquadramento.
Termina por pedir que se julgue procedente o presente recurso e consequentemente improcedente o recurso subordinado, julgando-se provados os factos que forem dados como não provados e válido o levantamento topográfico junto aos autos e, excluídos dos FP o ponto 7 substituído pelos pontos não provados que passam a provados, completado o ponto 18, completado o ponto 19, eliminado o 21, não considerado o 27 e eliminado o 28.
Peticionam, ainda, que o custo da construção há de ser determinado em função do valor de mercado, da construção, agora que o legislador deixou de publicar as Portarias para fixação dos preços da habitação controlada, ou de renda condicionada, que seja atendido a título do nº 9 apenas o custo do reforço da rede de águas (se necessário) que o risco seja fixado em 10% que o valor das benfeitorias seja aditado ao valor da indemnização, que a desvalorização da parcela sobrante seja calculada nos termos do nº 1 e 2 do artigo 29º, e em tudo o mais que consta das conclusões.
“Em sede de recurso, os Recorrentes invocam a nulidade da sentença prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea d)do Código de Processo Civil por o Tribunal ter conhecido de questão de que não podia tomar conhecimento, em concreto, propugnam que a decisão que julgou o recurso subordinado é nula por ultrapassar o pedido e a causa de pedir deduzidos, uma vez que a desvalorização da parcela sobrante foi expressamente aceite e, como tal, tem de ser considerada por transitada.
Nos termos do disposto no artigo 617.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, se a questão da nulidade da sentença for suscitada no âmbito de recurso dela interposto, compete ao juiz apreciá-la no próprio despacho em que se pronuncia sobre a admissibilidade do recurso.
Ora, analisada a sentença proferida, nela não encontro a apontada nulidade por considerar que, atento o âmbito dos recursos interpostos, incluindo naturalmente o recurso subordinado, e as inerentes questões jurídicas suscitadas e decidida se, bem assim, a fundamentação da decisão do Tribunal de classificação do solo como apto para construção, impunha-se que o Tribunal se pronunciasse e decidisse sobre a desvalorização da parcela sobrante.
Entendo, assim, que a sentença recorrida não padece da apontada nulidade”.
1. Delimitação do objeto do recurso
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso – art.º 639º do CPC.
As questões a decidir:
- nulidade da sentença;
- reapreciação da matéria de facto;
- critério de avaliação da parcela;
- avaliação das benfeitorias;
- avaliação da parcela sobrante;
- abuso do direito.
Com relevância para a apreciação das conclusões de recurso cumpre ter presente os seguintes factos provados no tribunal da primeira instância:
1. Por despacho do Senhor Secretário de Estado das Infraestruturas de 30 de setembro de 2019, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 199, de 16 de outubro de 2019, sob o Despacho n.º 9351/2019, foi declarada a utilidade pública, com caráter de urgência, da expropriação, a favor do Estado Português, sendo sua concessionária Brisa – Concessão Rodoviária, S.A., de parcelas com vista à execução da obra da Concessão Brisa – ... – .../... – .../... – ... e ....
2. De entre as parcelas referidas no ponto 1, consta a parcela n.º 88, com a área de 2.231m2, a destacar do prédio com a área registada de 3.000 m2 inscrito na matriz predial da freguesia ..., Município ..., sob o artigo ... (indicação fornecida pelos Expropriados na VAPRM e que é diferente da que consta da DUP), e descrito na Conservatória do Registo Predial da referida freguesia ..., sob o número ... (Descrição em Livro: N.º ..., Livro N.º ..., da Secção 2).
3. O prédio donde a parcela é a destacar apresenta as seguintes confrontações no registo predial e na matriz: norte – Auto Estrada (...); sul – Auto Estrada (...); nascente – GG; poente – Auto Estrada (...).
4. Em 11.10.2021, os Expropriados requereram ao Serviço de Finanças competente a retificação das confrontações e da área do prédio do qual a parcela expropriada é a destacar com base em levantamento topográfico elaborado a partir do indicado pelo proprietário.
5. O prédio donde a parcela expropriada é a destacar é contíguo a outros prédios do mesmo proprietário.
6. A parcela expropriada surge identificada na planta parcelar como sendo constituída por duas subparcelas (“88.a” e “88.2”), que apenas têm a ver com o seu destino, sendo a primeira com a área de 1.612m2 afeta a “restabelecimentos” e a segunda com a área de 619m2 a “acessos e valas”, conforme DUP.
7. A parcela expropriada apresenta as seguintes confrontações: norte – Auto Estrada (...); sul – Auto Estrada (...); nascente – parcela sobrante; poente – Auto Estrada (...).
8. A parcela expropriada tem uma configuração irregular, declive acentuado, é constituída por solos com boas características agrológicas para as culturas florestais, culturas a que estava afeto.
9. À data da vistoria ad perpetuam rei memoriam, a parcela dispunha de uma Plantação alinhada de eucaliptos com D.A.P. de 10 cm e compasso de 2 x 3 m 1 350,00 m2; 15 unidades de eucaliptos de médio porte disperso pela parcela com D.A.P de 30 cm; 8 unidades de eucaliptos de médio porte disperso pela parcela com D.A.P de 40 cm; 7 unidades de eucaliptos de médio porte disperso pela parcela com D.A.P de 50 cm; 11 unidades de sabugueiros de médio porte e 7 unidades de austrálias com D.A.P médio de 20 cm.
10. A parcela é interior e o acesso à mesma é feito por um caminho de perfil irregular em terra batida que liga a cerca de 30 metros da parcela com a rua de “...”. Este caminho inicia-se junto à rua de “...” no local onde esta rua termina e onde se encontra um portão em estrutura de ferro com a largura de cerca de 4 metros que dá entrada ao prédio, e um outro portão que dá acesso aos terrenos e edifícios das portagens da BRISA.
11. A rua “...”, em frente ao prédio, tem a largura média de 4,00 metros, pavimento revestido a betuminoso, rede pública de telefones e rede pública de abastecimento de água (a cerca de 60 metros da parcela expropriada).
12. Este arruamento margina os restantes prédios do proprietário, em cerca de 225 metros e a partir dos quais a Rua “...” possui pavimento em cubos de granito, passeios pavimentados em ambos os lados e redes públicas de abastecimento de água, rede pública de drenagem de esgotos com ligação à E.T.A.R., rede de drenagem de águas pluviais, rede de eletricidade em baixa tensão e telefone e várias construções do tipo moradias unifamiliares de dois pisos.
13. Na envolvente da parcela são visíveis construções industriais tais como a A..., que se situa a 300 metros, a B..., que se situa a 500 metros, a C..., que se situa a 600 metros, a D..., que se situa a 600 metros e a E..., que se situa a 650 metros.
14. A Rua ... dista da parcela cerca de 700 metros e ao longo dessa rua existem as instalações do ..., da F..., da G..., S.A. e da H..., Lda.
15. O I..., um posto de abastecimento de combustíveis, um ginásio e a J... situam-se a cerca de 700 metros da parcela.
16. No município em que o prédio se insere existem escolas, estabelecimentos de saúde, farmácia, polícia, tribunal e outras repartições públicas como Finanças e Conservatórias, correios, restaurantes e outro tipo de comércio, serviços de autocarros públicos (K...) e privados, comboios e táxis.
17. De acordo com o Plano Diretor Municipal (PDM) de ..., publicado pelo aviso n.º 1634/2015, no Diário da República, 2.ª série, n.º 29, de 11 de fevereiro de 2015, em vigor à data da DUP, a parcela expropriada está inserida em mancha classificada como Solo Urbano – Solo Urbanizado/Fora de Zona Urbana Consolidada – Espaço de Atividades Económicas – Espaços Empresariais Industriais - AE II (2).
18. A parcela expropriada e os prédios contíguos do mesmo proprietário constituem uma mancha florestal (maioritariamente) e agrícola, envolvida a norte, sul e poente pela autoestrada, ramal de saída da mesma e a nascente por uma zona urbanizada caracterizada por unidades industriais e comerciais e manchas habitacionais (moradias unifamiliares).
19. A parcela expropriada estava, à data da DUP, na sua maior parte, mais concretamente em 1386,72 m2, inserida em Zona Non Aedificandi (por força do artigo 32.º da Lei n.º 34/2015, de 27 de abril, que aprovou o Estatuto das Estradas da Rede Rodoviária Nacional, tomando por base a planta junta ao processo pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes – IMT, I.P. em 20.12.2021), não identificada no PDM ....
20. Equivalente zona de servidão non aedificandi já afetava a parcela aquando do registo da sua aquisição pelos Expropriados (AP ... de 1998/01/15).
21. O prédio donde a parcela expropriada é destacada e os prédios contíguos do mesmo proprietário constituem um conjunto predial que permite que a área da parcela afetada pela servidão non aedificandi possa ser contabilizada para determinação da área possível de edificar.
22. A parcela expropriada está inserida em zona com níveis de ruído relativamente elevados, ficando abrangida nas cartas de ruído Lden (período diurno-entardecer-noturno, que representa os níveis sonoros resultantes do somatório da contribuição de todas as fontes de ruído, para todos os períodos do dia) por manchas correspondentes a níveis de ruído entre 65 db e 70 db. Nas cartas de ruído Ln (período noturno, que representa os níveis sonoros resultantes do somatório da contribuição de todas as fontes de ruído, para o período noturno, entre as 23h99 e as 7h00), o terreno da parcela expropriada (e do prédio de onde a mesma foi destacada) fica abrangido por manchas correspondentes a níveis de ruído entre 55 db e 60 db. Tomando por base o conjunto dos prédios do expropriados, esses valores variam, consoante a localização de cada um deles, respetivamente, entre 55 db e 70 db, para o ruído Lden, e entre 45 db e 60 db, para o ruído Ln.
23. A parcela expropriada não é atingida por focos de poluição significativos.
24. A parcela sobrante mantém as mesmas características oro-topográficas e o mesmo acesso que detinha antes da expropriação.
25. O aparcamento necessário à execução de uma operação urbanística pode ser executado em cave, mas, nos termos o PDM ..., a sua área de construção conta para o Índice de Utilização.
26. Nos termos o PDM ..., o índice de utilização do solo máxima é de 1,20 e o índice de impermeabilização do solo máximo é de 80%.
27. Considerando as características e as condições objetivas do terreno da parcela expropriada, a sua utilização para fins de construção obrigaria a trabalhos de adaptação, de terraplanagem, de alargamento de acessos, de construção de apoios de infraestruturas e reforço das infraestruturas existentes, designadamente alargamento, construção e pavimentação da zona de acesso, dotação de abastecimento de água e energia elétrica, instalação de saneamento.
28. A construção nesse terreno obrigaria, como normalmente acontece num aproveitamento construtivo de um terreno, à elaboração de estudos e projetos de arquitetura e de engenharia, a instrução e acompanhamento de um processo administrativo de licenciamento de obra e à execução de trabalhos de construção.
29. A Expropriante apresentou aos Expropriados uma proposta de aquisição amigável da parcela datada de 17.12.2019 no valor de 111.550,00 € (cento e onze mil quinhentos e cinquenta euros).
30. A declaração de utilidade pública da parcela expropriada foi publicada no Diário da República, 2.ª Série, n.º 199, de 16 de outubro de 2019.
31. A posse administrativa da referida parcela foi concretizada em 18 de março de 2020.
32. A Entidade Expropriante solicitou ao Exmo. Senhor Presidente do Tribunal da Relação do Porto a nomeação do grupo de árbitros por ofício datado de 03.06.2020.
33. A entidade Expropriante realizou o depósito a que alude o artigo 20.º, n.º 1 do Código das Expropriações em 15 de junho de 2020.
1. O prédio de onde a parcela é destacada apresenta as seguintes confrontações: norte – Rua ...; sul – Ribeira ..., à qual se segue um trato de terreno; nascente – Ribeira ... e uma zona urbanizada caracterizada por unidades industriais e comerciais e manchas habitacionais; poente – Rua ... e domínio público.
2. A parcela expropriada apresenta as seguintes confrontações: sul – Ribeira ..., à qual se segue um trato de terreno; nascente – Parcela 90.2 de AA; poente – Domínio público (Rua ...).
“A restante matéria alegada não é aqui elencada por assumir natureza meramente conclusiva ou de direito”.
- Nulidade da sentença -
Nas conclusões de recurso os apelantes suscitam a nulidade da sentença no segmento que julgou o recurso subordinado, por ultrapassar o pedido e a causa de pedir deduzidos (ponto 50).
Nos termos do art.º 615º/1 d) CPC “a omissão de pronúncia sobre questões que o juiz devesse apreciar ou o conhecimento de questões de que não podia tomar conhecimento” constitui fundamento de nulidade da sentença.
O conhecimento de questões de que não podia tomar conhecimento, constitui um vício relacionado com a norma que disciplina a “ordem de julgamento” - art.º 608º/2 CPC.
Com efeito, resulta do regime previsto neste preceito, que o juiz na sentença: deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.
Cumpre ao juiz conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (art.º 608º/2 CPC). O não conhecimento de pedido, causa de pedir ou exceção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão constitui nulidade[2].
Resulta desta interpretação que a sentença não padece de nulidade porque não analisou um certo segmento jurídico que a parte apresentou, desde que fundadamente tenha analisado as questões colocadas e aplicado o direito.
Constitui, ainda, fundamento de nulidade da sentença, nos termos do art.º 615º/1/e) CPC a condenação “em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido”.
Esta causa de nulidade da sentença é a resultante da violação da regra estabelecida no art.º 609ºCPC sobre os limites da condenação, onde se determina que a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir.
Esta norma traduz mais uma manifestação do princípio do dispositivo. Os tribunais são órgãos incumbidos de dirimir os conflitos reais formulados pelas partes, mas não constituem, no foro da jurisdição cível contenciosa, instrumentos de tutela ou curatela de nenhum dos litigantes[3].
Consideram os apelantes que a entidade expropriante veio interpor recurso subordinado da decisão arbitral por considerar que mais de metade da superfície total da parcela expropriada se encontra em área de servidão “non aedificandi” construída para resguardo e proteção da autoestrada ..., o que impede a classificação dessa área de solo com 1.594,80 m2 como solo apto para construção, antes devendo ser classificado como solo para outros fins e apenas a área restante como solo apto para construção.
A entidade expropriante defende que dos 2.231 m2 da parcela expropriada, 1.594,80 m2 são solo para outros fins e 636,20 m2 como apto para construção. Aceitou o valor de € 29,63 para o solo apto para construção, atribuiu à parcela em zona “non aedificandi” €10,37, ou seja, o valor global de 10,37 e desvalorizou o sobrante dos 3.000m2 (que foi considerado como todo) ao valor da diferença entre €29,63 - €10,37), ou seja, em €14.811,00.
Os apelantes consideram que a sentença não validou o argumento da entidade expropriante e qualificou todo o solo como apto para construção. A causa de pedir da expropriante improcedeu, razão pela qual o seu recurso não podia ter procedido.
Entende que a decisão foi além do peticionado e, das causas em que se fundamentou, sendo o poder cognitivo do tribunal delimitado pelas partes no seu pedido e na sua causa de pedir.
Alegaram, ainda, que tendo a expropriante pedido que parte do terreno fosse avaliado como solo apto para outros fins e não teve sucesso, nessa parte naufragou o seu pedido. A expropriante aceitou expressamente a desvalorização da parcela sobrante, calculando o valor da indemnização em € 14.811,00. A decisão recorrida ao julgar o recurso subordinado parcialmente procedente foi além do que podia “nec vel ultra petitium partes “, e violou o poder cognitivo e o mesmo fez ao não atribuir, pelo menos, o valor do solo que fixou o valor da desvalorização da parcela sobrante expressamente aceite.
A decisão arbitral é considerada uma verdadeira decisão judicial, razão pela qual tudo o que nele não foi impugnado transita em julgado. A indemnização fixada na decisão arbitral partia da avaliação de todo o solo como apto para construção, decisão que a douta sentença não seguiu. A decisão arbitral fixou desvalorização da parcela sobrante que a expropriante expressamente aceitou.
Alegam, ainda, que uma das causas de pedir era a classificação do solo como para outros fins, pelo que manifestamente improcede o pedido nela suportado. A desvalorização da parcela sobrante foi expressamente aceite e, como tal, tem de ser considerada por transitada.
Contudo, tais argumentos não configuram os alegados vícios.
A decisão arbitral procedeu à avaliação da parcela expropriada como solo apto para construção. Considerou, ainda, que estando em causa uma expropriação parcial, a parcela sobrante com 769 m2 está sujeita a servidão “non aedificandi”, por se situar em zona adjacente à estrada, concluindo que a desvalorização da parcela sobrante ascende a € 20 509,23. Considera-se que a parcela sofreu uma desvalorização de 90%, procedendo à sua avaliação como solo apto para outros fins, ponderando o valor por metro quadrado de € 2,96.
Os expropriados vieram interpor recurso da decisão arbitral, impugnando o valor atribuído à desvalorização da parcela sobrante, com os fundamentos que se transcrevem:
“170. Na faixa de proteção definida pelo instrumento de gestão territorial em vigor, entretanto implementada no solo sobrante do prédio abrangido pela expropriação, em virtude da execução da obra, determina a afetação dos cómodos e utilidade daquele, pois que ao impender sobre si uma proibição legal de construção conduz a que, na área por aquela delimitada, o solo tenha de ser destinado a outros fins, e em função destes quantificado o seu valor de mercado,
171. Que é manifestamente inferior ao que anteriormente mantinha, sendo fixada – e por nós aceite – em € 2,96/m2, enquanto valor do solo por m2 após a expropriação.
172. Nesta senda, e seguindo de perto o posicionamento jurisprudencial dominante entre nós, «A partir do momento em que o solo é classificado como solo apto para a construção, a sua avaliação tem de partir do pressuposto da aptidão construtiva, isto é, tem de partir da ideia de que se pode construir naquele local e de procurar chegar ao valor da indemnização justa através da construção que deixa de se poder edificar no local.
É assim manifesto que as partes sobrantes perdem parte do seu potencial construtivo em função da zona non aedificandi subsequente à implantação de uma via rodoviária a que se destina a expropriação».
173. Estatui o n.º 2 do artigo 29.º do C.E. que «Quando a parte não expropriada ficar depreciada pela divisão do prédio ou desta resultarem outros prejuízos ou encargos, incluindo a diminuição da área total edificável ou a construção de vedações idênticas às demolidas ou às subsistentes, especificam-se também, em separado, os montantes da depreciação e dos prejuízos ou encargos, que acrescem ao valor da parte expropriada».
174. Só assim não será, logo acrescenta o n.º 3, «(…) quando os árbitros ou os peritos, justificadamente, concluírem que, nesta, pela sua extensão, não ocorrem as circunstâncias a que se referem as alíneas a) e b) do n.º 2 e o n.º 3 do artigo 3.º».
175. No caso concreto, vemos que os Senhores Árbitros concluíram pela produção de uma depreciação de 90%, em relação à área sobrante, pelo que deverá a final a mesma ser atendida, corrigindo-se apenas a medida da indemnização correspondente, em função daquele que venha a ser o valor unitário do solo apto para a construção, à luz da crítica aqui produzida, concluídas que sejam as diligências instrutórias necessárias à sua concreta determinação.
De qualquer modo,
176. Flui da crítica exposta que o valor da justa indemnização, como pressuposto da ablação determinada pela expropriação, não é passível de ser alcançado por via do critério definido pelo legislador sob os nºs 4 e seguintes do artigo 26.º do C.E.
177. Este pressuposto torna pois necessário que seja erigido um critério referencial alternativo, que, nos termos do n.º 5 do artigo 23.º do C.E., e ultrapassada a limitação por aquela via introduzida, permita aferir do valor real e corrente,
178. O que se propõe que se faça por recurso ao método do custo, que os Senhores Peritos deverão concretizar, dotando os autos de avaliação em conformidade, tudo à luz do preceito convocado”.
A entidade expropriante, no recurso da decisão arbitral, insurge-se contra a classificação da parcela expropriada, como solo apto para construção, por entender que a área abrangida pela servidão non aedificandi é superior à indicada na decisão arbitral, ónus que já existia à data da DUP, por efeito da anterior expropriação para construção da ..., tendo formulado as seguintes conclusões:
Na sentença procedeu-se à classificação da parcela expropriada e da sobrante como solo apto para construção e não se atribuiu qualquer desvalorização à parcela sobrante, com a área de 769 m2.
Neste contexto, a sentença apreciou apenas os fundamentos do recurso subordinado, sendo que a classificação da parcela constituía uma das questões suscitada no recurso, bem como, a determinação da área da servidão “non aedificandi”.
Apenas a entidade expropriante dispunha de legitimidade para se insurgir contra o segmento da sentença que classificou a parcela expropriada e sobrante como solo apto para construção, pois ficou vencida, mas a entidade expropriante conformou-se com a decisão. Os expropriados não têm legitimidade para se insurgirem contra tal segmento da decisão, porque acolheu aquela que também era a posição que defendiam no recurso da decisão arbitral, na medida em que defendiam que a avaliação da parcela devia atender ao conjunto predial onde a parcela se insere, propriedade dos expropriados e por isso, não ficaram vencidos (art.º 631º/1 CPC).
Por outro lado, insurgindo-se os expropriados contra o valor da avaliação da parcela sobrante, não se poderia considerar assente o valor indicado pela entidade expropriante a título de desvalorização da parcela sobrante, pelo que, também neste segmento se apreciou outra das questões suscitadas no recurso da decisão arbitral. Concluiu-se que não existia desvalorização da parcela sobrante, mas tal circunstância não significa que se conheceu para além do pedido, porque a indemnização arbitrada se fixou entre os €50.200,00 e os € 289.173,20, dentro dos limites dos pedidos formulados.
Convocados os peritos a pronunciarem-se sobre o valor base da avaliação, o “valor da construção” e que constitui um dos fatores a atender no critério de avaliação do solo apto para construção, em conformidade com o art.º 26º da Lei 168/99 de 18 de setembro, justificava-se a reformulação do juízo de avaliação, com vista a obter a justa indemnização.
Os fatores a atender na avaliação funcionam como um todo e a alteração de um dos fatores pode implicar a reavaliação dos demais, como aliás aconteceu no caso concreto.
Por outro lado, a sentença proferida em 1ª instância visa reapreciar a decisão arbitral e como tem sido entendido pelo Supremo Tribunal de Justiça: “ainda que, relativamente a algum ponto parcelar, o expropriado não tenha suscitado objeção relativamente ao que foi considerado na decisão arbitral, o Tribunal pode considerá-lo de modo diverso, não se devendo entender haver aqui caso julgado, pois a indemnização a atribuir, agora no plano do recurso interposto da decisão arbitral, não pode deixar de tomar em linha de conta, para ser uma justa indemnização (art.º 23.º do C. Exp. de 1999), o correto valor a atribuir a cada um dos elementos que se considera concorrerem para a fixação da indemnização por expropriação sem o que estaria posto em causa a reponderação do critério de avaliação e, consequentemente, a possibilidade de fixação de justa indemnização (art.º 62.º, n.º 2, da CRP e art.23.º, n.º 1, do C. Exp. de 1999)”[4].
Pelo exposto conclui-se que a sentença se mostra válida e regular, não se verificando os fundamentos de nulidade indicados no recurso.
Improcedem as conclusões, sob o ponto 50.
Nos pontos 60 a 73 das conclusões de recurso, os apelantes insurgem-se contra a decisão de facto e pretendem a reapreciação da decisão em relação aos pontos 7, 18, 19, 21, 27 e 28 dos factos provados e pontos 1 e 2 dos factos não provados.
Cumpre proceder à verificação dos pressupostos de ordem formal para proceder à reapreciação da decisão de facto.
O art.º 640º CPC estabelece os ónus a cargo do recorrente que impugna a decisão da matéria de facto, nos seguintes termos:
“1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3. […]”
Recai, assim, sobre o recorrente, face ao regime concebido, um ónus, sob pena de rejeição do recurso, de determinar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar – delimitar o objeto do recurso - e motivar o seu recurso – fundamentação - com indicação dos meios de prova que, no seu entendimento, impunham decisão diversa sobre a matéria de facto e ainda, indicar a solução alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação.
Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
No caso concreto, realizou-se o julgamento com gravação dos depoimentos prestados em audiência e os apelantes vieram impugnar a decisão da matéria de facto, com indicação dos pontos de facto impugnados, prova a reapreciar - prova testemunhal e documental, relatório pericial - e decisão que sugerem.
Porém, em relação aos pontos 27 e 28 dos factos provados, pretendem a sua eliminação, mas não indicam a prova que sustenta a pretendida alteração.
Com efeito, na motivação referem que “os pontos 27 e 28 são inócuos para a boa decisão da causa e são conclusivos – o ponto 28 é ostensivamente conclusivo. E inútil já que a lei não manda atender à realidade que lá consta para a avaliação nos termos do CE. O ponto 27 também não tem interesse para a boa decisão da causa pois não é factualidade subsumível ao preceituado no artigo 26º nº 9 como a douta julgadora concluiu”.
Os apelantes insurgem-se contra a solução de direito, mais propriamente contra o relevo jurídico de tais factos para efeito de avaliação da parcela, sem questionarem a prova que sustenta a decisão.
Refira-se, ainda, que tanto o ponto 27, como o ponto 28, contêm em si factos e não meros juízos conclusivos os quais podem ou não relevar para efeitos de avaliação da parcela.
Considera-se, assim, que omitida a indicação da prova a reapreciar não se mostram preenchidos os pressupostos de ordem formal, em relação aos pontos 27 e 28 dos factos provados, para proceder à reapreciação da decisão de facto.
Quanto à prova a reapreciar, para além das referências nas conclusões de recurso, na motivação do recurso os apelantes tecem considerações sobre os depoimentos prestados, motivo pelo qual se considera que fundamentam a impugnação nos depoimentos consignados na gravação, pelo que, se mostra preenchido o pressuposto de ordem formal quanto à indicação da prova gravada.
Por fim, refira-se que os apelantes deixaram expressa a decisão que sugerem.
Nos termos do art.º 640º/1/2 do CPC consideram-se reunidos os pressupostos de ordem formal para proceder à reapreciação da decisão de facto, quanto aos pontos 7, 18, 19, 21 dos factos provados e pontos 1 e 2 dos factos não provados.
A reapreciação da prova tem em vista uma possível alteração da decisão da matéria de facto em pontos relevantes para a boa decisão da causa e à luz das diversas soluções plausíveis das questões de direito e não uma determinação da realidade dos factos, independentemente do relevo que possam ter nas questões de direito a reapreciar, sendo proibida a prática no processo de atos inúteis (artigo 130º do CPC)[5].
Como se observa no Ac. da Relação do Porto de 20 de maio de 2024 (Proc. 4929/21.0T8MTS-G.P1, acessível em www.dgsi.pt): “a reapreciação da matéria de facto não é um exercício dirigido a todo o custo ao apuramento da verdade afirmada pelo recorrente mas antes e apenas um meio de o recorrente poder reverter a seu favor uma decisão jurídica fundada numa certa realidade de facto que lhe é desfavorável e que o recorrente pretende ver reapreciada de modo a que a realidade factual por si sustentada seja acolhida judicialmente, pelo que logo que faleça a possibilidade de uma qualquer alteração da decisão factual poder ter alguma projeção na decisão da matéria de direito em sentido favorável ao recorrente, deixa de ter justificação a reapreciação requerida, constituindo antes a prática de um ato inútil e, por isso, proibido (artigo 130º do Código de Processo Civil)”.
O processo de expropriação visa determinar a justa indemnização de acordo com o critério legal.
Os apelantes no recurso da decisão arbitral não questionam a área da parcela expropriada, nem as respetivas confrontações. Apenas na resposta ao recurso subordinado vêm indicarem novas confrontações.
Contudo, no recurso da sentença, os apelantes não retiram qualquer efeito útil sob o ponto de vista da solução de direito da impugnação da decisão de facto que fixou as confrontações da parcela expropriada.
Os apelantes apenas se insurgem contra certos aspetos que foram considerados no critério de avaliação, os quais não estão relacionados com a determinação das concretas confrontações do prédio do qual foi desanexada a parcela expropriada ou a parcela expropriada.
Desta forma, revela-se inútil proceder à reapreciação do ponto 7 dos factos provados e pontos 1 e 2 dos factos não provados, porque independentemente da decisão face à posição que os apelantes assumem perante a questão essencial em discussão nos autos, não se extrai do mesmo qualquer efeito útil para a decisão e por esse motivo improcede a reapreciação da decisão quanto a tal matéria de facto.
Na fundamentação da decisão, considerou-se:
“O Tribunal fixou os factos supra elencados com base nos documentos juntos aos autos, na vistoria ad perpetuam rei memoriam realizada e o relatório complementar datado de março de 2020, no laudo de peritagem apresentado, nas respostas aos quesitos apresentadas pelos Senhores Peritos e bem assim nos esclarecimentos por si prestados.
Destes esclarecimentos destaca-se, em complemento ao que consta já dos autos, a indicação que nem todos os PDM identificam as zonas non aedificandi na planta dos condicionantes e a informação de que na zona envolvente há muitos lotes devidamente infraestruturados sem construção. […]”.
Conforme resulta da fundamentação da decisão, o juiz do tribunal “a quo” levou em consideração o relatório de peritagem e a resposta aos quesitos, bem como, os esclarecimentos prestados pelos senhores peritos.
No domínio do processo de expropriação litigiosa, na fase judicial, a realização de perícia tem carácter obrigatório, conforme decorre do art.º 61º/2 do Código das Expropriações.
Por outro lado, a perícia é realizada de modo colegial constituída por cinco peritos, sendo que três são nomeados pelo tribunal de entre os da lista oficial e um designado por cada uma das partes – art.º 62º do Código das Expropriações.
De igual forma, determina o art.º 61º/6 do Código das Expropriações que não há lugar a uma segunda avaliação.
A importância deste meio de prova, no âmbito do processo de expropriação litigiosa, resulta ainda de dois aspetos que são nucleares:
“- O processo de expropriação litigiosa tem como fim a determinação da indemnização devida por expropriação pelo que a avaliação tem de fornecer todos os elementos necessários para que o juiz possa decidir.
- Os peritos encontram-se obrigados a elaborar os seus laudos de acordo com as normas legais e regulamentares aplicáveis, devendo fundamentar claramente o cálculo do valor atribuído (art.º 21º do DL 125/2002 de 10/05 )”[6].
Do exposto resulta que a prova pericial visa fornecer elementos para o juiz, em sede de recurso da decisão arbitral, reapreciar a decisão no sentido de proferir decisão que fixe a justa indemnização. A decisão arbitral não constitui mais um meio de prova, mas a decisão em recurso e por esse motivo, não pode ser colocada em posição de igualdade com a diligência pericial a realizar na fase de instrução do processo.
Conclui-se, pois, no caso concreto, o juiz do tribunal “a quo”, procedeu em conformidade com o critério legal, quando optou pelos valores e critérios apontados no laudo pericial em detrimento da decisão arbitral.
Neste domínio a prova pericial merece um particular relevo, atento o carácter técnico das matérias em análise, pelo que apenas não deve ser considerada quando se verifique manifesto erro de apreciação ou violação do critério legal[7].
Como se vem entendendo na jurisprudência dos tribunais superiores, verificando-se divergência de análise entre os peritos, cumpre considerar o resultado da prova pericial, no laudo maioritário, sobretudo quando se mostra subscrito pelos peritos nomeados pelo tribunal quer pela competência técnica que lhes é reconhecida, quer pelas melhores garantias de imparcialidade que oferecem[8].
Tal não significa uma irrestrita vinculação ao laudo maioritário, já que o tribunal pode introduzir-lhe ajustamentos, fazer correções, colmatar falhas, ou seguir o laudo ou critérios diferentes, se os tiver por mais justos, de acordo com os elementos probatórios que possuir[9].
No caso concreto, os apelantes sustentam a alteração da decisão no relatório pericial, mas sem fundamento.
No ponto 18. julgou-se provado:
- A parcela expropriada e os prédios contíguos do mesmo proprietário constituem uma mancha florestal (maioritariamente) e agrícola, envolvida a norte, sul e poente pela autoestrada, ramal de saída da mesma e a nascente por uma zona urbanizada caracterizada por unidades industriais e comerciais e manchas habitacionais (moradias unifamiliares).
Os apelantes sugerem o seguinte aditamento:
- ponto 18: “constituindo solo urbano”.
No relatório de peritagem escreveu-se:
“Em termos de envolvente mais próxima verifica-se que a parcela expropriada e os prédios contíguos do mesmo proprietário constituem uma mancha florestal (maioritariamente) e agrícola, envolvida a norte, sul e poente pela auto estrada, ramal de saída da mesma e a nascente por uma zona urbanizada caracterizada por unidades industriais e comerciais e manchas habitacionais (moradias unifamiliares), tudo como pode ser constatado e nos extratos de ortofotomapas que a seguir se apresentam, um de data anterior à DUP e o outro de data próxima da atual”.
A respeito da descrição da envolvente, que é a matéria de facto a apreciar no ponto 18 dos factos provados, os peritos por unanimidade apresentaram a descrição que se transcreveu.
Desta forma, o aditamento pretendido, não tem sustentação na perícia, porque a classificação da parcela à luz do PDM consta do ponto 17 dos factos provados, sendo que a legenda respeita ao extrato da planta de ordenamento que consta do PDM ..., na qual não se refere que a parcela e a envolvente “constituem solo urbano”. À face do PDM são várias as categorias de solo urbano, relevando apenas aquela em que se encontra inserido o prédio e parcela expropriada.
Não se justifica a pretendida alteração do ponto 18.
No ponto 19. julgou-se provado:
19. A parcela expropriada estava, à data da DUP, na sua maior parte, mais concretamente em 1386,72 m2, inserida em Zona Non Aedificandi (por força do artigo 32.º da Lei n.º 34/2015, de 27 de abril, que aprovou o Estatuto das Estradas da Rede Rodoviária Nacional, tomando por base a planta junta ao processo pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes – IMT, I.P. em 20.12.2021), não identificada no PDM ....
Os apelantes sugerem o seguinte aditamento: “constituída a área da servidão solo urbano, área verde de enquadramento”.
Em relação ao ponto 19, os apelantes pretendem a alteração com base na indicação que consta a fls. 11 do relatório de peritagem.
A legenda que consta a fls. 11 do relatório de peritagem situa a parcela expropriada em zona: “AE II (2) – Solo Urbanizado/Fora de Zona Urbana Consolidada – Espaço de Atividades Económicas – Espaços Empresariais Industriais”.
Sobre a concreta parcela com a área de 1386,72m2 referem os peritos que subscreveram o laudo maioritário:
“Consideram os Peritos que o solo da parcela deverá classificar-se como “Solo Apto para a Construção”, por o prédio donde é a destacar, em sede de planta de ordenamento do Plano Diretor Municipal ... (PDM...), estar inserido como atrás se referiu em Solo Urbano – Solo Urbanizado/Fora de Zona Urbana Consolidada – Espaço de Atividades Económicas – Espaços Empresariais Industriais - AE II(2).
Importa ainda referir e com importância para a avaliação que a parcela expropriada estava, à data da DUP, na sua maior parte, mais concretamente em 1386,72 m2, inserida em Zona Non Aedificandi, tomando por base a Lei n.º 2015, de 27 de abril, mais concretamente o artigo 32.º. A determinação desta área de 1.386,72 m2 foi efetuada pelos Peritos signatários, tomando por base a planta que foi remetida pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes – IMT, I.P. ao Tribunal e por este último remetido aos Peritos.
Assim apenas 844,28 m2 da parcela expropriada estavam fora da zona de servidão non aedificandi de proteção à auto estrada. Esta zona de servidão non aedificandi é semelhante à que existia na legislação anterior de proteção à auto estrada – Decreto-Lei n.º 294/97, de 24 de outubro, e que assim, tendo em atenção a data da aquisição do prédio pelo Expropriados (data de registo na Conservatória de 1998/01/15) e a data da construção da auto estrada (DUP publicada no D.R. n.º 117, II Série, de 22 de maio de 1987) já existia e incidia sobre o prédio à data da sua aquisição pelos atuais proprietários.
Importa referir que o facto de uma parte do terreno da parcela expropriada estar inserido em zona non aedificandi não impede que essa área seja contabilizada para a capacidade construtiva que vier a ser implementada na parte sobrante e noutros prédios contíguos, desde que exista área suficiente para a implantação da construção.
Acontece que como consta da VAPRM, o prédio de onde foi destacada a parcela expropriada é confinante com outros prédios dos mesmos proprietários/expropriados e assim entendem os Peritos que todo o terreno da parcela expropriada pode ser considerado como “contribuinte” líquido para a capacidade construtiva do conjunto predial ou seja para a determinação da área possível de edificar.
De salientar que a informação que consta da VAPRM está de acordo com o que os Peritos concluem dos ortofotomapas do Sistema do Identificação Parcelar do Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas-IFAP, I.P. (obtida na versão pública disponível na internet, ainda que sem identificação do nome do proprietário) e com o que o Expropriado, presente aquando da visita ao local dos Peritos, lhes transmitiu, bem como de planta que posteriormente lhes foi remetida pelo mesmo.
Tendo em atenção o atrás exposto todo o terreno da parcela expropriada será avaliado como solo apto para a construção, apesar de, na sua maior parte, estar abrangido pela servidão non aedificandi”.
Os peritos não referem que a zona de servidão estava integrada em área verde de enquadramento, motivo pelo qual não se justifica a alteração pretendida, quando não foi produzida outra prova que sustente tal alteração.
Por fim, o ponto 21.
No ponto 21., provou-se:
21. O prédio donde a parcela expropriada é destacada e os prédios contíguos do mesmo proprietário constituem um conjunto predial que permite que a área da parcela afetada pela servidão non aedificandi possa ser contabilizada para determinação da área possível de edificar.
Consideram os apelantes que deve ser eliminado porque “[t]rata-se de mera hipótese que os peritos adiantaram com um “pode ser considerado…” o que meramente é insuficiente. E, depois de terem as plantas do IMT, fácil é de concluir que não poderá ser assim”.
O ponto 21 resulta da apreciação e análise realizada pelos peritos, com base nos elementos de facto fornecidos pela vistoria ad perpetuam rei memoriam e elementos fornecidos pelos próprios expropriados, conforme resulta do excerto que se transcreveu na reapreciação do ponto 19.
O perito indicado pelos expropriados apresentou outra interpretação dos factos, por entender que não existe “servidão non aedificandi”, quando observa: “Pediu-se através do Tribunal a opinião do IMT, que a deu. Porém, é diferente da que consta no RPDM de .... E esta tem de prevalecer, porquanto o artigo 11.º n.º 2 da Lei 31/2014 é clara a este respeito: “2 - Quando tenham caráter permanente e expressão territorial suscetíveis de impedir ou condicionar o aproveitamento do solo, as restrições de utilidade pública são obrigatoriamente traduzidas nos planos territoriais de âmbito intermunicipal ou municipal, sem prejuízo do disposto no número seguinte.”
Os Planos Diretores Municipais (PDM) são elaborados com a participação das várias entidades com referência e jurisdição sobre as restrições de ordem pública. Daí que sejam previstas nas plantas de ordenamento e de condicionantes. E o PDM ao configurar uma área construtiva sem as restrições para a parcela que o IMT refere, foi precedido de acordo das Infraestruturas de Portugal que participou na sua feitura.
Assim, a parcela expropriada, à data da DUP, não era abrangida por zona non aedificandi”.
O PDM ... (2015) foi publicado em data anterior à DUP (2019) e talvez por isso, não se faz menção, em tal diploma, à existência da servidão constituída por efeito da concreta obra que está na origem da expropriação. Contudo, a área da servidão decorre da aplicação do critério previsto na lei, como se observa no laudo maioritário e por isso, não pode ser ignorada. Questão diferente e que também se prende com o mérito consiste em apurar se a servidão dá lugar a uma desvalorização da parcela expropriada.
Porém, o perito indicado pelos expropriados não deixa de considerar a unidade predial formada pelos diferentes prédios, propriedade dos expropriados, para efeito de avaliação da parcela, tal como se considerou no laudo maioritário, critério que corresponde ao proposto pelos expropriados para avaliação da parcela.
Conclui-se que não se justifica alterar o ponto 21, por refletir o que resulta do laudo pericial e não se ter produzido outro elemento de prova que justifique a alteração.
Mantém-se o ponto 21 dos factos provados.
Em conclusão não merece censura a decisão de facto que se mantém e improcedem os pontos 60 a 73 das conclusões de recurso.
Nas conclusões de recurso, sob os pontos 31 a 49, 54 a 57, os apelantes insurgem-se contra o critério adotado para avaliação da parcela, por discordarem do montante considerado a título de valor do solo apto para construção.
Na sentença ponderando o critério e valores obtidos no laudo maioritário dos peritos, o qual foi subscrito pelos peritos nomeados pelo tribunal, revogou-se a decisão arbitral e fixou-se o montante da indemnização em €83.863,29 € (oitenta e três mil oitocentos e sessenta e três euros e vinte e nove cêntimos).
Cumpre apreciar se o valor arbitrado respeita o critério legal.
A declaração de utilidade pública e expropriação, com carácter urgente, reporta-se a 30 de setembro de 2019, data em que foi proferido o despacho do Secretário de Estado das Infraestruturas, a qual foi objeto de publicação no Diário da República, n.º199, II série, de 16 de outubro de 2019.
No caso concreto para o cálculo da justa indemnização cumpre seguir o critério estabelecido na Lei 168/99 de 18/09, por ser esse o regime em vigor à data da publicação da declaração de utilidade pública.
A expropriação por utilidade pública, como transmissão coativa típica sempre esteve e continua a estar sujeita a dois grandes princípios constitucionais: o seu condicionamento a fins de utilidade pública legitimamente declarada e a exigência da correspondente indemnização, visando esta compensar o sacrifício pessoal assim imposto e garantindo a observância do princípio de igualdade violado com a privação do respetivo direito[10].
A indemnização será fixada com base no valor real dos bens expropriados e calculada em relação à propriedade perfeita. Por outro lado, a justa indemnização devida não visa compensar o benefício alcançado pelo expropriante, mas ressarcir o prejuízo que ao expropriado advém da expropriação - art.º 23º do Código das Expropriações. Estes prejuízos medem-se pelo valor real e corrente dos bens expropriados e não por virtude de encargos a suportar na aquisição de bens similares aos expropriados[11].
Essencial é que na determinação da “justa indemnização” se tome em consideração todos os elementos valorativos do prédio - capacidade e potencialidade edificativa, localização, envolvimento - que numa análise objetiva da situação e segundo a opinião generalizada do mercado nunca possam nem devam ser desprezados postergando fatores de ordem puramente especulativa.
O montante da indemnização pretende criar uma situação que se aproxime da melhor forma daquela em que o lesado provavelmente estaria, daquela situação que provavelmente seria a existente se não tivesse tido lugar o facto que lhe deu causa. Os valores a adotar na avaliação são os que ocorrerem à data da publicação da declaração de utilidade pública – “as circunstâncias e as condições de facto existentes à data da declaração de utilidade pública” (art.º 23º e 24º/1 da Lei 168/99 de 18/09).
Para sublinhar este princípio, a lei, no art.º 23º/5 estabelece que: “sem prejuízo do disposto no nº 2 e nº 3 do presente artigo, o valor dos bens calculados de acordo com os critérios referenciais constantes dos art.º 26º e seguintes deve corresponder ao valor real e corrente dos mesmos, numa situação normal de mercado, podendo a entidade expropriante e o expropriado, quando tal se não verifique requerer, ou o tribunal decidir oficiosamente, que na avaliação sejam atendidos outros critérios para alcançar aquele valor”.
A atribuição da “justa indemnização” depende, porém, da prévia classificação dos solos, de acordo com o critério do art.º 25º da Lei 168/99 de 18/09.
Com efeito, dispõe o art.º 25º da citada lei, que: “para efeitos do cálculo da indemnização por expropriação, o solo classifica-se em:
- solo apto para a construção;
- solo para outros fins.
Na concreta situação, na sentença, procedeu-se à classificação da parcela, como “solo apto para construção”, nos termos do art.º 25º/1 a) /2 c) da Lei 168/99 de 18/09.
Os apelantes não questionam os pressupostos que conduziram a tal qualificação.
Os apelantes-expropriados não concordam com o valor unitário do solo e fixado na sentença, para obter a justa indemnização, por discordarem do critério seguido para apurar o custo da construção, a conversão da área útil em área bruta e a percentagem utilizada por aplicação do art.º 26º/9 e 10 da Lei 168/99 de 18/09.
Na avaliação da parcela o juiz do tribunal “a quo” seguiu o critério e valores indicados no laudo maioritário dos peritos, formado pelos peritos do tribunal e da entidade expropriante, por considerar que respeitavam o critério legal.
Passando à sua reapreciação.
- Custo construção -
Na decisão arbitral para efeitos de avaliação do solo, como solo apto para construção, ao abrigo do art.º 26º/4/5 CE considerou-se como referencial:
“os preços de construção da habitação, por metro quadrado de área útil, de acordo com a Portaria 353/2013 de 04 de dezembro, sucessivamente atualizada pelos avisos do INE, de 651,42€/m2 afetada do coeficiente de 0.6 por se tratar de construção prevista para indústria, resulta no custo por m2 de 390,85€/m2 à data da DUP.
Tendo em conta que os valores da portaria se referem a área de construção útil e as áreas de construção consideradas no presente laudo são áreas de construção brutas, os peritos atendendo à tipologia das construções (grande parte construção industrial), consideram um fator de conversão de 90% (área útil em área bruta)”.
No recurso da decisão arbitral os expropriados insurgem-se contra tal critério, por considerarem que este critério ficou postergado dado que deixaram de ser aplicados os diplomas legais que fixavam, por zonas, e por referência a cada ano civil, os montantes para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada, em virtude da Lei n.º 80/2014, de 19 de dezembro, ter revogado o D.L. n.º 329-A/2000, de 22 de dezembro.
Consideram que a atualização do valor não se mostra um critério adequado, por não existir uma associação direta entre a evolução do preço da moeda e do custo da construção, que conjuga um conjunto alargado de outros fatores, que aquela não espelha.
Mais referem que o tipo de construção considerada na base da avaliação é em tudo distinta da que está na génese do aludido termo referencial, que se destina a habitação, justificando o recurso a outros elementos, como, por exemplo, as estimativas orçamentais elaboradas pela AICCOPIN ou dados estatísticos publicados em revistas especializadas ou em jornais diários.
Consideram que indagar junto das bases de dados estatísticas disponibilizadas pelo INE que publica, de forma mensal, a taxa de variação do custo da construção, é possível concluir que sofreu uma variação positiva.
Por outro lado, o regime referencial definido pelo legislador reporta-se a um específico tipo construtivo (de custos controlados e/ou de renda condicionada), a construção da envolvente próxima não era pautada por construção desse nível construtivo, seja o conjunto de moradias unifamiliares que se acha descrito nos autos seja o conjunto industrial ali existente.
No relatório de peritagem, os peritos aplicaram o critério seguido na decisão arbitral, com atualização do valor à data da publicação da DUP, com aplicação de uma taxa de 15% na conversão de área útil em área bruta, valor ao qual aplicaram um índice de 60%, porque a capacidade construtiva do terreno é para espaços empresariais e industriais (AEII).
Na sentença considerou-se, como se passa a transcrever:
“Quanto ao custo de construção (artigo 26.º, n.º 5 do CExp.: Na determinação do custo da construção atende-se, como referencial, aos montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada.), foi considerado pelos Senhores Peritos que subscreveram o laudo maioritário o custo de referência definido para o ano de 2014 na Portaria n.º 353/2013, de 4 de dezembro, que para a zona I (...) foi de 801,06 € por m2 de área útil. Mediante atualização da moeda até à data da Declaração de Utilidade Pública, conforme site do INE, atingimos o valor de 822,53€/m2, que corresponde a 699,15 € por m2 de área bruta de construção (822,53€/m2 x 0,85 que corresponde ao fator de conversão da área útil em área bruta de construção). Atendendo a capacidade construtiva do terreno é para espaços empresariais e industriais (AEII), os Senhores Peritos que subscreveram o laudo maioritário consideraram para custo da construção 60% do valor da construção para habitação, assim obtendo o valor final de 419,49 €/m2, que arredondaram para 420€/m2 (699,15 € x 0,60 = 419,49 €/m2), por considerarem corresponder a um custo médio ponderado de construção corrente para edifícios do tipo industrial, incluindo já uma área administrativa de apoio.
O Sr. Perito indicado pelos Expropriados propugnou pela consideração do valor do preço médio da construção na área Metropolitana do Porto de acordo com as Estatísticas da Construção e Habitação publicadas pelo INE em 17 de julho de 2020, relativas ao ano de 2019.
Ora, citando Exmo. Conselheiro Salvador da Costa (Código das Expropriações e Estatuto dos Peritos Avaliadores Anotados e Comentados, Almedina, 2010, p. 181), [t]endo em conta o fim da lei, propendemos a considerar que os árbitros ou os peritos devem utilizar desses valores o que se revelar mais adequado à consecução do princípio da justa indemnização. Ora, o raciocínio explanado pelos Senhores Peritos que subscreveram o laudo maioritário mostra-se devidamente fundamentado e parece-nos adequado ao referido pelo que não descortinamos razões para afastar os valores achados pelos referidos Peritos”.
Os apelantes renovam os argumentos apresentados no recurso da decisão arbitral e consideram que o custo da construção é elevadíssimo e que em estudo publicado no Confidencial Imobiliário em 2021 o valor mais baixo é de cerca de € 1250,00.
Cumpre, pois, apreciar se o critério seguido na sentença para cálculo do custo da construção respeita o critério do art.º 26º/4 e 5 do Código das Expropriações ou se se justifica atender a outro critério no sentido de obter o valor real e corrente de mercado.
No cálculo do valor do solo apto para construção determina o art.º 26º/4 e 5 do Código das Expropriações:
Art.º 26º do Código das Expropriações:
1.[…]
2.[…]
3.[…]
4. Caso não se revele possível aplicar o critério estabelecido no nº2 por falta de elementos, o valor do solo apto para a construção calcula-se em função do custo da construção, em condições normais de mercado, nos termos dos números seguintes.
5. Na determinação do custo da construção atende-se, como referencial, aos montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada.
Decorre das disposições enunciadas que na determinação do custo unitário da construção a lei fornece um critério referencial que consiste em recorrer aos valores fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada.
A respeito da natureza do critério apontado, PEDRO ELIAS DA COSTA refere que: “[e]ste critério tem de ser visto conforme é, ou seja, como uma regra orientadora do cálculo, com carácter meramente referencial, tal como as percentagens do nº 6 e 7 do art.º 26º, que também poderão não ter correspondência com as verificadas em dada situação concreta.
Assim, importante será que o resultado da avaliação seja o valor real e corrente da parcela expropriada. Considerando-se, justificadamente, que os valores fixados administrativamente não permitem alcançar o valor de mercado de determinado solo, pode recorrer-se a outros elementos, como, por exemplo, as estimativas orçamentais elaboradas pela AICCOPIN ou dados estatísticos publicados em revistas especializadas ou em jornais diários”[12].
Na jurisprudência seguindo a orientação exposta e reforçando a natureza de critério referencial, entre outros, pronunciaram-se:
> Ac. Rel. Lisboa 08 de outubro 2010 (Proc. 2313/04.3TBCLD.L1-6 – www.dgsi.pt ):
“O custo da construção respeita à edificação propriamente dita, devendo, por isso, atender-se às despesas de mão – de – obra, materiais, equipamentos, subempreiteiros, às despesas relativas ao estaleiro da obra e às despesas com pessoal administrativo e técnico da obra, isto é, ao custo direto de produção.
Quando uma fração é colocada em venda, além das despesas relativas ao custo de produção, haverá que tomar em atenção outras despesas, com grande repercussão sobre o custo final da obra, como sejam os encargos administrativos e que respeitam às despesas com projetos, licenças, taxas, gestão da obra, sua fiscalização, responsabilidades financeiras, consumíveis, equipamentos, promoções imobiliárias, lucros do promotor, etc., despesas essas relativas ao custo indireto de produção.
Donde se conclui que o valor da construção, ou seja, o preço final de venda ao público de uma fração, reflete o somatório do custo direto da produção (objetivo) com o custo indireto da produção (subjetivo).
Calcular a indemnização com base no valor de mercado da construção seria violar o princípio da igualdade no âmbito da relação interna da expropriação, porquanto a ampla subjetividade, que encerra, permitiria tratamentos diferenciados entre os particulares sujeitos a expropriação que o legislador quis evitar.
Acresce que, visando a justa indemnização ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, não seria aceitável incluir no seu cômputo prejuízos que o expropriado não teve.
Por essa razão, o artigo 26º, n.º 5 do CE estabelece o critério legal para a determinação do valor do solo apto para a construção, nos termos do qual deve atender-se, como referencial, aos montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados.
Tais montantes não são, porém, vinculativos porque, além de versarem apenas a habitação, fixam o custo unitário da construção relativo à área útil que é sempre superior ao da área bruta. No entanto, os mesmos só não deverão ser atendidos se, comprovadamente, não corresponderem ao custo da construção na zona onde se localiza a parcela. “
> Ac. Rel. Lisboa de 09.02.2010 (Proc. 2593/05.7TMSNT.L1-7 – www.dgsi.pt ).
“O valor do solo edificável calcula-se por referência à construção que nele seria possível efetuar se não tivesse sido sujeito a expropriação, num aproveitamento económico normal.
Como primeiro critério referencial do custo da construção, manda a lei que (perante a inaplicabilidade do critério estabelecido no nº 2 do art.º 26º) se ponderem os montantes fixados administrativamente no âmbito do regime de habitação a custos controlados ou de renda condicionada (art.º 26º/5).
Como tem sido entendido pela jurisprudência do Tribunal Constitucional[14] e por alguma doutrina, o n.º5 do art.º 26.º do Cód. Exp.: “não impõe uma correspondência do preço por metro quadrado e construção, para efeitos de expropriação, ao preço por metro quadrado de construção fixado administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada, mas apenas uma obrigação de consideração destes preços como padrão de referência ou como fator indiciário do custo do metro quadrado de construção para o cálculo da indemnização por expropriação[15]. Ou seja, sendo o critério do cálculo do custo de construção meramente referencial, é possível atender a outros critérios, entre os aplicáveis previstos no art.º 26.º do Cód. Exp..
O custo da construção para efeitos do cálculo do valor da indemnização é o da construção possível e não o da construção destinada a ser implantada no terreno.
E o custo da construção obviamente que terá de ponderar não apenas a área de implantação, mas também o número de pisos”.
>Ac. Rel. Porto 10 de julho de 2025, Proc. 829/21.6T8PVZ.P1(acessível em www.dgsi.pt) observa-se:
“No art.º 26º, nº 5 do Cód. das Expropriações estabelece-se que para determinar o valor do solo apto para construção se deverá atender, como referencial, aos montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada.
Porém, embora estes montantes não sejam absolutamente vinculativos para o tribunal só não deverão ser atendidos se, comprovadamente, não corresponderem ao custo de construção na zona onde se localiza a parcela expropriada”.
Na situação concreta, verifica-se que os peritos que subscreveram o laudo maioritário perante a inviabilidade de aplicação do critério previsto no nº 2 e 3 do art.º 26º do Código das Expropriações, atenderam aos valores fixados administrativamente, conforme decorre do disposto no art.º 23º/4 e 5 do Código das Expropriações, seguindo para o efeito os valores fixados administrativamente para efeitos da aplicação do regime de renda condicionada – Portaria 353/2013 de 04 de dezembro.
Na falta de publicações atualizadas do preço da habitação por metro quadrado, porque a Lei n.º 80/2014, de 19 de dezembro revogou o D.L. n.º 329-A/2000, de 22 de dezembro, o valor considerado foi atualizado por referência à data de DUP.
Por outro lado, nos termos do art.º 67º/2 b) Regime Geral das Edificações Urbanas a área útil corresponde à soma das áreas de todos os compartimentos da habitação, incluindo vestíbulos, circulações interiores, instalações sanitárias, arrumos, outros compartimentos e função similar e armários nas paredes, e mede-se pelo perímetro interior das paredes que limitam o fogo, descontando encalços até 30cm, paredes interiores, divisórias e condutas.
A área bruta, de acordo com o art.º 67º/2 a) do mesmo diploma é a superfície total do fogo, medida pelo perímetro exterior das paredes exteriores e eixos das paredes separadoras dos fogos, e inclui varandas privativas, locais acessórios e a quota-parte que lhe corresponda nas circulações comuns do edifício.
Nos termos do art.º 23º/1 CE o valor do solo apto para construção calcula-se por referência à construção que nele seria possível efetuar se não tivesse sido sujeito a expropriação, num aproveitamento económico normal, de acordo com as leis e regulamentos em vigor.
No cálculo, os peritos que subscreveram o laudo maioritário, procederam à conversão do valor correspondente à área útil em área bruta, por aplicação do coeficiente 15%. Consideraram, ainda, adequado o valor apurado para o tipo de construção em causa, traduzindo o custo real e corrente de construção nova, o que se afigura ser o critério que para efeitos de avaliação de um terreno revela a sua capacidade construtiva.
Para além destes aspetos ponderaram a natureza da construção possível na área da parcela expropriada, face ao critério previsto no PDM, por apenas ser possível a construção de edifícios industriais ou afetos a atividades empresariais, distintos das casas para habitação e aplicaram uma percentagem de 60%.
O critério sugerido pelos expropriados não pode ser considerado porque considera o custo metro quadrado para construção em 2021, quando releva os valores à data da DUP (2019), sem indicação da concreta localidade, partindo de um valor especulativo apoiado apenas nas leis do mercado e sem sustentação na perícia realizada, mesmo no laudo minoritário subscrito pelo perito indicado pelos expropriados.
A parcela expropriada à data da declaração de utilidade pública estava integrada numa área de terrenos com produção florestal e agrícola, mas que dispunha nas imediações de construções afetas à indústria e comércio, para além de uma zona habitacional (ponto 18 dos factos provados).
A utilização dos valores fixados administrativamente para efeitos de fixação da renda condicionada não viola o direito do expropriado à justa indemnização, o qual não foi considerado de forma absoluta, mas temperado por outros fatores, sendo certo, que apenas foi utilizado como um critério referencial, no sentido de apurar o valor real e corrente de mercado, sem considerar critérios especulativos.
O critério seguido pelos peritos com a conversão da área útil em área bruta, justifica-se de modo particular pelo facto de se ponderar o valor da parcela para efeitos de construção, pois como determina a lei, o “valor do solo apto para construção calcula-se por referência à construção que nele seria possível efetuar se não tivesse sido sujeito a expropriação, num aproveitamento económico normal”.
Consideram os apelantes que para construção industrial não se justifica a conversão de área útil em área bruta, pois considerando pavilhões, áreas industriais já temos área útil.
Por unanimidade todos os peritos consideraram ser necessário proceder a tal operação de conversão e o perito indicado pelos expropriados justificou a aplicação de tal índice de conversão nos edifícios industriais, pelo facto de ser necessário construir áreas administrativas, de refeitório e balneares, ou seja, áreas comuns.
Não resulta dos factos provados, nem dos autos, que o critério utilizado no laudo maioritário não se mostre adequado para obter o valor real e corrente de mercado, que por esse motivo se deve manter.
Os apelantes insurgem-se contra a aplicação dos fatores corretivos previstos no art.º 26º/9 e 10 da Lei 168/99 de 18/09.
Na decisão arbitral, por aplicação do art.º 26/9 do citado diploma, considerou-se que a transformação do terreno em solo apto para construção acarreta despesas de urbanização para a criação e reforço das infraestruturas, que se estimaram em 35%.
Entendeu-se ser de aplicar um fator de risco de 10%, nos termos do art.º 26º/10 do mesmo diploma, por se considerar que existirá algum risco inerente à atividade construtiva (variações de custos de fatores produtivos) e de comercialização (flutuações de mercado, alterações de taxas de juro, dificuldades de obtenção de crédito), à localização num território com bastante pressão sobre as estruturas rodoviárias existentes.
No recurso da decisão arbitral os expropriados consideram que na concreta situação não se deve proceder à aplicação do fator corretivo previsto no art.º 26º/9 do Código das Expropriações, porque “o solo não é já valorado pela inexistência de tais infraestruturas, procurando-se fixar o valor da justa indemnização por via da expropriação não pode onerar-se o seu património, impondo-lhe que suporte o encargo com a criação de infraestruturas que o mesmo não terá em condições normais de concretizar, e se o fizesse (noutro contexto que não o da expropriação), naturalmente refletiria a despesa que lhe iria associada na definição do valor do solo”.
Em relação ao fator previsto no art.º 26º/10 do Código das Expropriações consideram que não deve ser aplicado, por não estar em causa avaliar os custos com a comercialização do terreno, mas o valor do solo.
Os peritos consideraram, como se passa a transcrever:
“O aproveitamento construtivo do terreno implicaria o reforço e prolongamento de infraestruturas, estimando-se para tal uma percentagem de 35%, que se considera adequada tendo em atenção o tipo de empreendimento, a dimensão e as condições do local.
De referir ainda que as exigências para que pudesse ser viabilizada qualquer construção no terreno dos prédios são significativas (artigo 16.º do regulamento do PMDV).Tendo em atenção que o aproveitamento construtivo do terreno (entendido como toda a sua área ser considerada como contribuindo para a área total possível de edificar) só seria possível considerando o agregamento do terreno a outros prédios contíguos dos mesmos expropriados, o que implicaria um empreendimento com dimensão significativa, os Peritos tendo ainda em atenção o tipo de construção em causa (industrial) consideram adequada a percentagem de 15% para efeitos do n.º 10 do artigo 26.º do C.E..”
Nas respostas aos quesitos formulados pela entidade expropriante, responderam por unanimidade:
“G) Considerando as características e as condições objetivas do terreno da parcela expropriada a sua utilização para fins de construção obrigaria a trabalhos de adaptação, de terraplanagem, de alargamento de acessos, de construção de apoios de infraestruturas e reforço das infraestruturas existentes, designadamente alargamento, construção e pavimentação de zona de acesso, dotação de abastecimento de água e energia elétrica, instalação de saneamento?
R: Sim.
G.1- Em caso afirmativo, qual o custo medio estimado para dotar o terreno das condições necessárias a implantação de construção industrial na parcela expropriada utilizando o índice máximo permitido pelo PDM ...?
R: Ver laudo”.
Na sentença aplicaram-se os fatores indicados na perícia, com os seguintes fundamentos:
“Quando o critério fixado nos n.ºs 4 a 8 constituir, comprovadamente, uma sobrecarga incomportável para as infraestruturas existentes, o n.º 9 do artigo 26.º do mesmo diploma legal determina que se tenham em conta no cálculo do montante indemnizatório as despesas necessárias ao reforço das mesmas. Revela-se adequada a percentagem de 35% indicada no laudo pericial maioritário, atendendo a que o aproveitamento construtivo da parcela implicava a extensão e/ou reforço das infraestruturas existentes nos arruamentos mais próximos, destacando-se aqui o disposto no artigo 16.º do PDM ...:
Não sufragamos o entendimento propugnado pelos Expropriados no sentido de que é incoerente considerar um valor de 35% para efeitos de despesas de urbanização para a criação e reforço de infraestruturas (por o custo de construção já considerar despesas com infraestruturas), uma vez que consideramos que este n.º 9 do artigo 26.º vai além das despesas expectáveis com infraestruturas em qualquer tipo de construção, pois pressupõe uma sobrecarga incomportável para as infraestruturas existentes.
Citando SALVADOR DA COSTA […]
Estamos, portanto, e uma vez mais, perante questão de natureza muito técnica e, atenta a factualidade dada como provada atinente às infraestruturas em causa, já analisadas, não vislumbramos, uma vez mais, fundamento para afastar a posição dos Senhores Peritos que subscreveram o laudo maioritário.
Nos termos do disposto no n.º 10 do mesmo artigo, o valor resultante da aplicação dos critérios fixados nos n.ºs 4 a 9 será objeto da aplicação de um fator corretivo pela inexistência do risco e do esforço inerente à atividade construtiva, no montante máximo de 15% do valor da avaliação. Atendendo à localização e características da parcela expropriada justifica-se esta dedução e ainda a circunstância – determinante para a classificação do solo como apto à construção – de o aproveitamento construtivo do terreno se mostrar condicionado pelo agregamento do terreno a outros prédios contíguos dos mesmos expropriados, julga-se adequado o valor máximo de 15% apontado pelos Senhores Peritos indicados pelo Tribunal e pela Entidade Expropriante. De notar que o valor de 5% indicado pelo Sr. Perito indicado pelos Expropriados não se mostra sequer fundamentado, alegando-se apenas que no contexto existente à data da DUP, o risco de levar a efeito esse empreendimento seria diminuto.
Concluindo, os Senhores Peritos indicados pelo Tribunal e pela Entidade Expropriante, que subscreveram o laudo maioritário, aplicaram com rigor os critérios legais e fizeram-no de forma fundamentada, de modo que, e alertando-se, uma vez mais, para a natureza técnica da avaliação da parcela, o Tribunal pode concluir que os valores apresentados traduzem o valor real e corrente da parcela, conduzindo, assim, a uma justa indemnização, devendo, pois, segui-los”.
Consideram os apelantes, quanto à aplicação do art.º 26º/9 do CE, que a norma foi mal aplicada pelos peritos e pela decisão recorrida. Os peritos raciocinaram com a parcela concreta, criada pela Brisa e no seu interesse exclusivo. O proprietário não iria construir naquela parcela mas numa zona mais ampla. O raciocínio com uma parcela mais ampla não levaria a uma dedução tão considerável de 35%. Por outro lado, na decisão e laudo não se considerou apenas o encargo para reforço de infraestrutura que existia (reforçável) a rede de água, mas antes os que existiam e os que não existiam. Só o reforço da infraestrutura rede de águas podia ser considerada e, por isso, tinha que ser muito inferior a 35%. A penalização pela não existência de alguma infraestrutura é a não atribuição de índice. E nada mais como resulta do artigo 26º nº 7 do CE. Os custos com projetos e licenças não cabem na avaliação.
Cumpre apreciar se no contexto dos factos provados, se justifica aplicar os fatores corretivos indicados.
No cálculo da indemnização, com vista a apurar o valor do solo apto para a construção, cumpre ponderar a aplicação do fator corretivo previsto no nº9 do art.º 26º Código das Expropriações (Lei 168/99 de 18/09), onde se determina que:
“9. Se o aproveitamento urbanístico que serviu de base à aplicação do critério fixado nos nº4 a 8 constituir, comprovadamente, uma sobrecarga incomportável para as infraestruturas existentes, no cálculo do montante indemnizatório deverão ter-se em conta as despesas necessárias ao reforço das mesmas”.
Para a interpretação das normas mostra-se significativo o estudo do Professor FERNANDO ALVES CORREIA onde se refere: “[a] consideração das despesas necessárias ao reforço das infraestruturas existentes, nas situações referidas nesta norma, no cálculo do montante da indemnização é perfeitamente compreensível, pois sem o seu custeamento pelo expropriado não seria possível a realização do aproveitamento urbanístico que serviu de base à determinação do montante da indemnização. É o que resulta do nosso ordenamento jurídico urbanístico, onde se prevê o indeferimento dos pedidos de licenciamento de operações de loteamento e de construção, nos casos de as obras projetadas constituírem, comprovadamente, uma sobrecarga incomportável para as infraestruturas existentes, salvo se o requerente garantir o financiamento dos encargos correspondentes ao seu reforço[…]”[13].
Na jurisprudência têm-se salientado alguns aspetos quanto à aplicação do regime consignado no preceito, com os quais concordamos.
Desde logo apenas se justifica considerar as despesas com reforço das infraestruturas quando se verificar uma sobrecarga incomportável para as infraestruturas existentes.
De igual forma, o recurso a este fator pressupõe que a parcela dispõe de algumas infraestruturas referenciadas no nº7 do preceito, que serviram de valorização da parcela, pois se a parcela expropriada não dispõe de qualquer tipo de infraestruturas, tais despesas são desde logo consideradas no montante da indemnização a atribuir.
Como se salienta no Ac. Rel. Porto de 02.07.2009:
“[…] que o custo de construção já considera despesas com infraestruturas e, como tal, no cálculo do valor de um terreno que não beneficie de quaisquer infraestruturas, não haverá lugar à consideração de quaisquer outras quantias com essa finalidade.
Certo é que, como decorre do disposto no art.º 26º nº 7, o terreno é valorizado em função das infraestruturas de que já beneficia e é nestas situações que se justifica a aplicação do disposto no nº 9, considerando as despesas necessárias ao reforço dessas infraestruturas.
De facto, se o terreno não é valorizado pela existência de infraestruturas (nos termos do nº 7), não poderá ser considerada a dedução de qualquer despesa para a sua realização, na medida em que isso traduziria uma dupla penalização para o expropriado. Com efeito, nessa situação, a inexistência de infraestruturas já é valorizada negativamente pela não aplicação das percentagens referidas no nº 7 (o que determina uma diminuição do valor do terreno) e, como tal, não poderá ser considerada qualquer dedução correspondente às despesas que são necessárias para a realização dessas infraestruturas; um tal procedimento corresponderia a uma dupla penalização pela inexistência de infraestruturas: o terreno seria desvalorizado, por esse motivo, em virtude de o seu valor não ser aumentado pela aplicação das percentagens referidas no nº 7 e seria novamente desvalorizado, pelo mesmo motivo, através da dedução ao valor do terreno das despesas necessárias à realização dessas infraestruturas.
Tal não acontece, porém, quando a parcela expropriada já beneficia de infraestruturas e é valorizada por esse facto, mediante a aplicação das percentagens estabelecidas no nº 7.
É nessa situação que se justifica a dedução das despesas necessárias ao reforço das infraestruturas existentes, porquanto não se justificaria que a parcela expropriada fosse valorizada pela existência de infraestruturas (valorização essa que decorre do facto de a construção não ter que suportar o respetivo custo) quando, afinal, essas infraestruturas, por serem insuficientes, têm que ser reforçadas e, como tal, exigem a realização de despesas com essa finalidade.
Neste caso, além de não existir uma dupla penalização do expropriado – porquanto o valor do terreno sofre apenas, por esse facto, a dedução mencionada no nº 9 – a dedução das despesas necessárias ao reforço das infraestruturas existentes é a única forma de eliminar o benefício injustificado do expropriado que veria o valor do terreno aumentado, por força das infraestruturas existentes, sem que o valor das despesas que teria que efetuar para o reforço dessas infraestruturas se refletisse nesse valor.
E, importa referir, em situação normal de mercado, um comprador prudente e avisado não deixaria de tomar em consideração (positivamente) as infraestruturas já existentes e não deixaria de ponderar (negativamente) as despesas que ainda teria que efetuar para reforçar tais infraestruturas (Nº convencional JTRP00042793 – www.dgsi.pt ).
No mesmo sentido pode ainda consultar-se o Ac. Rel. Porto de 22 de outubro 2009 (nº convencional JTRP ..., acessível em www.dgsi.pt) e o Ac. Rel. Porto de 25 de março de 2010, do qual se transcreve a seguinte passagem:
“Tanto a consideração das valorizações determinadas pelo nº 7 como as deduções impostas pelo nº 9 do artigo 26º direcionam-se à determinação do valor do bem e não a qualquer dupla penalização imposta ao expropriado. É que umas e outras devem ser atendidas porque interferem com a formação do preço do bem numa situação de comércio livre e regular, por agentes da transação.
Se não dispõem das infraestruturas não pode o terreno ser valorizado como se delas beneficiasse; mas deve atender-se às necessárias para o solo adquirir possibilidades concretas de construção, que um loteador construtor teria de implementar e, portanto, a sua falta pesaria negativamente no valor que estaria disposto a pagar pelo terreno para nele edificar.
Como consta do laudo pericial (maioritário), com aceitação na sentença, a “utilização construtiva aconselhava a urbanização do solo do prédio, o que implicaria encargos urbanísticos que se estimam da ordem dos 25%”, valor que se concorda não ser exagerado (pelo que com frequência se verifica em situações análogas), além de, e participando a questão de conhecimentos técnicos, não se dispõe de outros que sirvam para afastar a opção do peritos, que maioritariamente entendem que a urbanização do terreno implicaria dispêndios daquela ordem (ver artigo 26º/9). Esse seria o valor que o expropriado, se quisesse (na hipótese de não haver expropriação) construir, despenderia para dotar o terreno das estruturas para que lhe fosse permitido construir efetivamente, o que corresponde a um encargo não desconsiderável quando se pretende pagar ao expropriado o justo valor do terreno, que deve contemplar esse encargo quando o mesmo é valorizado como terreno para construção.
Não é que se coloquem a cargo do expropriados as despesas de urbanização que, como é óbvio, não serão feitas, atento o destino do terreno, mas de determinar o valor de mercado desse bem, o valor que um comprador prudente e avisado ofereceria, em contrato de compra e venda, estabelecido numa situação normal de mercado, pelo terreno para nele construir, pois que não deixaria de ter em consideração as despesas que teria de efetuar para poder afetar o terreno à construção e, assim, a importar tais despesas diminuição do seu valor. Como escreve Luís Perestrelo Oliveira [3] “uma vez que o valor real e corrente do imóvel é o preço que um comprador prudente pagaria pelo mesmo, numa situação normal de mercado, não podem deixar de relevar, na sua formação, as despesas que para esse efeito teriam de ser efetuadas, designadamente aquelas que o preceito refere”. “Esta norma obriga a que se tenha em conta a realização das infraestruturas necessárias à construção dita possível” e “para se determinar quais as infraestruturas que deverão ser realizadas ou expandidas, deve-se atender ao disposto o respetivo instrumento de gestão territorial. O valor encontrado deve ser deduzido à indemnização devida pela expropriação”.
A parcela expropriada nem sequer margina a via habilitante, é interior, o que, à efetiva construção, pediria a urbanização do solo do prédio, o que, além de outras, implicaria a necessidade do reforço e extensão das infraestruturas existentes” (nº convencional JTRP00043836, acessível em www.dgsi.pt)
No caso concreto, justifica-se aplicar a percentagem de 35%, deduzindo ao valor da construção, porque a parcela expropriada está dotada de infraestruturas e a construção possível – espaços empresariais e industriais – exige um reforço das infraestruturas existentes, como referem os peritos no laudo.
Como se provou:
5. O prédio donde a parcela expropriada é a destacar é contíguo a outros prédios do mesmo proprietário.
8. A parcela expropriada tem uma configuração irregular, declive acentuado, é constituída por solos com boas características agrológicas para as culturas florestais, culturas a que estava afeto.
10. A parcela é interior e o acesso à mesma é feito por um caminho de perfil irregular em terra batida que liga a cerca de 30 metros da parcela com a rua de “...”. Este caminho inicia-se junto à rua de “...” no local onde esta rua termina e onde se encontra um portão em estrutura de ferro com a largura de cerca de 4 metros que dá entrada ao prédio, e um outro portão que dá acesso aos terenos e edifícios das portagens da BRISA.
11. A rua “...”, em frente ao prédio, tem a largura média de 4,00 metros, pavimento revestido a betuminoso, rede pública de telefones e rede pública de abastecimento de água (a cerca de 60 metros da parcela expropriada).
12. Este arruamento margina os restantes prédios do proprietário, em cerca de 225 metros e a partir dos quais a Rua “...” possui pavimento em cubos de granito, passeios pavimentados em ambos os lados e redes públicas de abastecimento de água, rede pública de drenagem de esgotos com ligação à E.T.A.R., rede de drenagem de águas pluviais, rede de eletricidade em baixa tensão e telefone e várias
construções do tipo moradias unifamiliares de dois pisos.
18. A parcela expropriada e os prédios contíguos do mesmo proprietário constituem uma mancha florestal (maioritariamente) e agrícola, envolvida a norte, sul e poente pela autoestrada, ramal de saída da mesma e a nascente por uma zona urbanizada caracterizada por unidades industriais e comerciais e manchas habitacionais (moradias unifamiliares).
19. A parcela expropriada estava, à data da DUP, na sua maior parte, mais concretamente em 1386,72 m2, inserida em Zona Non Aedificandi (por força do artigo 32.º da Lei n.º 34/2015, de 27 de abril, que aprovou o Estatuto das Estradas da Rede Rodoviária Nacional, tomando por base a planta junta ao processo pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes – IMT, I.P. em 20.12.2021), não identificada no PDM ....
20. Equivalente zona de servidão non aedificandi já afetava a parcela aquando do registo da sua aquisição pelos Expropriados (AP ... de 1998/01/15).
21. O prédio donde a parcela expropriada é destacada e os prédios contíguos do mesmo proprietário constituem um conjunto predial que permite que a área da parcela afetada pela servidão non aedificandi possa ser contabilizada para determinação da área possível de edificar.
27. Considerando as características e as condições objetivas do terreno da parcela expropriada, a sua utilização para fins de construção obrigaria a trabalhos de adaptação, de terraplanagem, de alargamento de acessos, de construção de apoios de infraestruturas e reforço das infraestruturas existentes, designadamente alargamento, construção e pavimentação da zona de acesso, dotação de abastecimento de água e energia elétrica, instalação de saneamento.
A parcela expropriada é um terreno interior ao qual se acede através de um caminho que parte da estrada a qual está dotada de certas infraestruturas A construção na parcela impõe o reforço de tais infraestruturas. Para além dessa obra estrutural por determinação do PDM, carece de outras infraestruturas, cujos custos já estão contabilizados no custo da construção. Os peritos, por unanimidade, consideraram ser necessário proceder ao reforço das infraestruturas existentes e justificaram tal decisão, nos termos que constam do ponto 27 dos factos provados.
Acresce que a percentagem que indicaram destina-se apenas a suportar o custo com o reforço das infraestruturas existentes, pois como se refere no relatório de peritagem (laudo maioritário): “o aproveitamento construtivo do terreno implicaria o reforço e prolongamento de infraestruturas, estimando-se para tal uma percentagem de 35%, que se considera adequada tendo em atenção o tipo de empreendimento, a dimensão e as condições do local.
De referir ainda que as exigências para que pudesse ser viabilizada qualquer construção no terreno dos prédios são significativas (artigo 16.º do regulamento do PMDV)”.
Por outro lado, não resulta dos factos provados, nem da prova produzida, que pelo facto de se considerar que a construção englobaria uma zona mais ampla, a despesa com o reforço de infraestruturas ascendesse a um custo inferior. De igual forma, é de referir que não está em causa apenas o reforço da infraestrutura rede de água, porque a utilização para fins de construção obrigaria a trabalhos de adaptação, de terraplanagem, de alargamento de acessos, de construção de apoios de infraestruturas e reforço das infraestruturas existentes, designadamente alargamento, construção e pavimentação da zona de acesso, dotação de abastecimento de água.
Conclui-se que não merece censura a decisão que no cálculo do custo da construção aplicou o índice previsto no art.º 26º/9 do Código das Expropriações e com a percentagem apurada pelos peritos no laudo maioritário.
Na decisão arbitral fixou-se a percentagem de 10%, por se considerar: “[…] que existirá algum risco inerente à atividade construtiva (variações de custos de fatores produtivos…) e de comercialização (flutuações de mercado, alterações de taxas de juro, dificuldades de obtenção de crédito, …), à localização num território com bastante pressão sobre as estruturas rodoviárias existentes[…]”.
No recurso da decisão arbitral defenderam os expropriados a eliminação de tal percentagem.
Na perícia, no laudo maioritário, considerou-se:
“Tendo em atenção que o aproveitamento construtivo do terreno (entendido como toda a sua área ser considerada como contribuindo para a área total possível de edificar) só seria possível considerando o agregamento do terreno a outros prédios contíguos dos mesmos expropriados, o que implicaria um empreendimento com dimensão significativa, os Peritos tendo ainda em atenção o tipo de construção em causa (industrial) consideram adequada a percentagem de 15% para efeitos do n.º 10 do artigo 26.º do C.E.”.
O perito indicado pelos expropriados indicou uma percentagem de 5%, por considerar “a construção possível na propriedade dos Expropriados, nunca poderia apenas reduzir-se a um artigo e o lógico é que toda a propriedade fosse destinada para o aproveitamento possível. Considera-se, no entanto, que no contexto existente à data DUP, o risco de levar a efeito esse empreendimento seria diminuto”.
Nas respostas aos quesitos, referiu-se, ainda:
H) Considerando as características e condições objetivas da parcela expropriada, a construção nesse terreno obrigaria a elaboração de estudos e projetos de arquitetura e de engenharia, a instrução e acompanhamento de um processo administrativo de licenciamento de obra, à execução de trabalhos de construção?
R: Sim, como normalmente acontece num aproveitamento construtivo de um terreno.
H.1 - Em caso afirmativo, esses procedimentos envolveriam custos e despesas, consumiam tempo e importavam risco para o proprietário?
R: Sim. Ver laudo.
H.2 - Em caso afirmativo qual consideram ser um valor médio estimado para esses custos, despesas, risco, determinado em função do custo final da construção ou do seu custo unitário?
R: Ver laudo”.
Na sentença aplicou-se a percentagem indicada no laudo maioritário, com os seguintes fundamentos: “Nos termos do disposto no n.º 10 do mesmo artigo, o valor resultante da aplicação dos critérios fixados nos n.º 4 a 9 será objeto da aplicação de um fator corretivo pela inexistência do risco e do esforço inerente à atividade construtiva, no montante máximo de 15% do valor da avaliação. Atendendo à localização e características da parcela expropriada justifica-se esta dedução e ainda a circunstância – determinante para a classificação do solo como apto à construção – de o aproveitamento construtivo do terreno se mostrar condicionado pelo agregamento do terreno a outros prédios contíguos dos mesmos expropriados, julga-se adequado o valor máximo de 15% apontado pelos Senhores Peritos indicados pelo Tribunal e pela Entidade Expropriante. De notar que o valor de 5% indicado pelo Sr. Perito indicado pelos Expropriados não se mostra sequer fundamentado, alegando-se apenas que no contexto existente à data da DUP, o risco de levar a efeito esse empreendimento seria diminuto”.
Os apelantes consideram excessiva a percentagem aplicada (15%) e pretendem que se aplique a percentagem fixada na decisão arbitral (10%).
A questão consiste em ponderar no cálculo da justa indemnização o fator corretivo previsto no art.º 26º/10 da Lei 168/99 de 18 de setembro.
Determina o art.º 26º/10 do citado diploma, que na avaliação da parcela, como solo apto para construção, deve ponderar-se: “[o] valor resultante da aplicação dos critérios fixados nos nº4 a 9 será objeto da aplicação de um fator corretivo pela inexistência do risco e do esforço inerente à atividade construtiva, no montante máximo de 15% do valor da avaliação”.
O preceito tem como fundamento o princípio da igualdade na sua vertente externa. Ao se avaliar um solo pela construção que nele seria possível efetuar, não se pode ignorar que o expropriado não suportou um risco e uma série de despesas (custos de marketing, organização, impostos), que se iriam traduzir num encargo a pesar sobre a habitação construída.
Estes custos são indispensáveis no cálculo da justa indemnização, como refere PEDRO ELIAS DA COSTA, “[…] influindo diretamente no valor de mercado da parcela expropriada, já que são custos a que estaria sujeito um comprador normal que adquirisse o terreno em causa para fins edificativos”[14].
Na jurisprudência, na interpretação do preceito, para além dos fundamentos invocados, tem-se atribuído particular relevo ao facto de tal fator não operar de forma automática, como manifestação do princípio da justa indemnização.
A ponderação do fator previsto no art.º 26º/10 do Código das Expropriações pressupõe a apreciação concreta de factos e circunstâncias que permitam avaliar do risco ou esforço inerente à atividade construtiva. O preceito está em consonância lógica com a determinação do custo de construção em condições normais de mercado (n.º 4), já que o valor vai ser menor quanto maior for o risco e o esforço envolvidos pela construção possível.
Neste domínio mereceu-nos especial atenção os Ac. Rel. Lisboa 20.01.2015 (Proc. 9783/08.9TBCSC.L1-1) Ac. Rel. Porto 11.02.2010 (nº convencional JTRP 00043609), Ac. Rel. Porto de 31.03.2009 (nº convencional JTRP 00042451), Ac. Rel. Porto 03.06.2008 (Proc. 0821914), todos em www.dgsi.pt, nos quais se sintetiza a posição expressa da seguinte forma:
“Esta norma tem por função diminuir o valor da avaliação com o fim de o ajustar ao valor do mercado.
E é ditada por exigências de igualdade entre o expropriado que, por virtude da expropriação, obtém uma indemnização sem sofrer os riscos e o esforço decorrentes do processo construtivo e o não expropriado que, em idênticas condições, levasse a cabo a edificação possível.
Na verdade, em situações normais, existem esforços, riscos e custos inerentes à construção que devem ser tomados em conta no valor da avaliação. Estão em causa, vg., os riscos inerentes aos custos de organização, marketing, impostos, acidentes na obra, mau tempo, surpresas geológicas, encarecimentos da mão-de-obra e dos materiais e, até, riscos inerentes à comercialização, como, por exemplo, depreciação do imóvel, dificuldades de venda por retração do mercado por virtude de aumento das taxas de juro de empréstimos para habitação que o expropriado suportaria se tivesse podido realizar o empreendimento admitido como possível na avaliação.
A aplicação deste normativo funda-se, pois, no pressuposto de que o expropriado ao receber uma indemnização líquida dos custos que normalmente advêm dos riscos e do esforço inerentes à efetiva edificação, ficaria numa situação de intolerável vantagem ou benefício.
Mas se por via de regra tal risco e esforço existem, em tese é admissível que eles se não verifiquem, pelo menos com a relevância e amplitude suficientes para afetarem o referido princípio da igualdade e, assim, poderem ser considerados.
É que, por um lado, a indemnização já é fixada por valores médios; por outro, no custo da construção, fator a tomar em consideração para cálculo do valor do terreno, já se entra em linha de conta com o esforço construtivo na situação concreta; e, finalmente, pode o expropriado vender o terreno a alguém que depois vai construir.
Logo, e como outrossim constitui jurisprudência uniforme, a aplicação deste fator corretivo não opera de modo automático, ou seja, não decorre do simples facto da concretização do ato expropriativo.
Nesta conformidade para o seu funcionamento exige-se uma comprovada inexistência de risco e esforço inerente à atividade construtiva, relevante na situação concreta, capaz de justificar uma redução do valor da avaliação do solo apto para construção, ajustando os custos à realidade hipotética.
O que passa pela prova da demonstração dos riscos que seriam corridos e os esforços que seriam suportados no caso de uma efetiva edificação no terreno expropriado, se não fosse a expropriação.
Na verdade a aplicação da dedução de forma sistemática, abstrata, “cega” e, quiçá, no seu máximo admissível, acarretaria a violação dos princípios da justa indemnização e da igualdade, na medida em que se prejudicariam indevidamente os expropriados nos casos em que a efetiva construção, se não fora a expropriação, não acarretasse riscos ou esforços que originassem despesas ou encargos relevantes.
Deve, pois, aceitar-se, que o funcionamento do fator corretivo pela inexistência de risco e esforço na atividade construtiva não é de funcionamento automático.
Isto e por um lado, porque a indemnização já é fixada por valores médios e por outro, porque no custo da construção, fator a tomar em consideração para cálculo do valor do terreno, já se entra em linha de conta com o esforço construtivo na situação concreta; e, finalmente, o risco construtivo nem sempre existe, desde logo se o expropriado, como acontece na maior parte das vezes, vender o terreno a alguém que depois vai construir.
Assim, para funcionamento do fator corretivo previsto no aludido nº 10 do art.º 26º, exige-se uma comprovada inexistência de risco e esforço inerente à atividade construtiva relevante na situação concreta capaz de justificar uma redução do valor da avaliação do solo apto para construção, ajustando os custos à realidade hipotética” (nº convencional JTRP00043609 – www.dgsi.pt ).
Acrescenta-se no Ac. Rel. Porto 10 de julho de 2025, Proc. 829/21.6T8PVZ.P1: “Todavia, pese embora a sua não automaticidade, tendo em atenção que, por via de regra, a construção implica sempre custos, ónus, encargos, perdas de tempo, stress, o fator corretivo previsto no art.º 26º, nº 10 do Cód. das Expropriações apenas deverá deixar de ser aplicado se inequivocamente se provar a inexistência de tais condicionantes”.
O Tribunal Constitucional também já se pronunciou sobre a conformidade do fator previsto no art.º 26º/10 da Lei 168/99 de 18 de setembro com o art.º 62º da Constituição, entre outros, nos Ac. nº 11/2012 de 12 de janeiro de 2012 e Ac. nº 381/2012 de 21 de setembro (ambos em www.tribunalconstitucional ), sendo que neste último aresto, refere-se:
“o artigo 26.º, n.º 4, do Código das Expropriações, adotou como critério subsidiário para a determinação do valor da indemnização por expropriação de terreno apto para a construção o do cálculo duma percentagem do “custo da construção”, obtido num juízo de prognose, tendo em atenção o grau de influência que as específicas características do terreno em causa determinam no valor final do prédio edificado. Simula-se que no terreno em causa foram erguidas as construções que nele são permitidas, atribui-se um valor a esse prédio idealizado e finalmente calcula-se qual a percentagem que nesse valor assume o referido terreno, sendo o resultado a quantia a pagar pela expropriação do mesmo. Na determinação dessa percentagem influem os fatores referidos nos n.º 6 e 7, do mesmo artigo 26.º, do Código das Expropriações, como a localização, qualidade ambiental e os equipamentos existentes na zona (n.º 6), o acesso rodoviário, a existência de passeios, rede de abastecimento domiciliário de água, rede de saneamento, rede de distribuição de energia elétrica em baixa tensão, rede de drenagem de águas pluviais, estação depuradora, rede distribuidora de gás e rede telefónica (n.º 7).
Ora, uma vez que estamos perante a fixação de um valor de um terreno como se nele se tivesse erguido a construção possível, a consideração de fatores como o das despesas que seriam necessárias realizar com o reforço das infraestruturas existentes perante o aproveitamento urbanístico idealizado (n.º 9) ou o dos riscos e dos custos organizacionais da atividade construtiva (n.º 10), correspondendo a realidades inerentes à construção, inserem-se coerentemente no pensamento que subjaz ao critério subsidiário adotado no Código das Expropriações para determinar o valor da indemnização pela expropriação de um terreno apto para construção.
Assim, sendo certo que a ponderação do fator previsto no n.º 10, do artigo 26.º, do Código das Expropriações, não está incluída na previsão de qualquer outro número deste artigo, não se revela que tal ponderação possa afastar o julgador de fixar um valor que respeite a ideia de justa indemnização para a expropriação, exigida pelo artigo 62.º, da Constituição”.
Na situação presente resulta dos factos provados que a construção nesse terreno obrigaria, como normalmente acontece num aproveitamento construtivo de um terreno, à elaboração de estudos e projetos de arquitetura e de engenharia, a instrução e acompanhamento de um processo administrativo de licenciamento de obra e à execução de trabalhos de construção (ponto 28 dos factos provados).
Na avaliação do solo, fixou-se um fator corretivo de 15%, ponderando que face às caraterísticas descritas deste prédio seria necessário efetuar despesas com projetos, licenciamentos municipais que os expropriados não suportam com a expropriação.
Encontra-se, assim, justificada a aplicação do fator corretivo, porque se considerou que os expropriados vão receber o valor da indemnização, sem qualquer esforço, ou seja, sem realizar qualquer despesa correspondente aos encargos com a construção, num aproveitamento normal do terreno, quando a construção envolve um risco ou esforço.
Partindo de um critério de normalidade e ponderando, como se provou a natureza das construções existentes na envolvente, a classificação no PDM, seria de esperar que os expropriados viessem a suportar despesas com a construção.
Por outro lado, não resulta dos factos provados que a parcela se encontrava numa das situações de exceção, a que se aludiu, nomeadamente, que viesse a ser comercializada pelos expropriados para construção, sem que os expropriados promovessem a construção ou que no custo da construção estavam contabilizadas todas as despesas necessárias à sua promoção.
O índice apurado - 15% - corresponde ao valor dos encargos que hipoteticamente seriam suportados pelos expropriados, caso promovessem a construção.
Como observa ALÍPIO GUEDES seria de: “[…] fixar sistematicamente uma dedução de 15%, sempre que o expropriado não tenha tomado, antes da data da DUP, qualquer iniciativa tendente a valorizar a parcela a expropriar”[15].
No caso concreto não se provou que os expropriados tenham desenvolvido qualquer diligência no sentido de promover a construção no prédio, do qual foi destacada a parcela expropriada.
Conclui-se, assim, que a fixação de uma percentagem de 15%, como foi fixada no laudo maioritário, respeita o critério legal e está fundamentada, pois corresponde ao máximo legal e reflete a exata medida da inexistência do esforço inerente à atividade construtiva que seria expetável desenvolver em condições normais de mercado.
Conclui-se que não merece censura a sentença quanto ao valor apurado a título de custo de construção, por respeitar o critério legal da justa indemnização.
Improcedem as conclusões de recurso, sob os pontos 31 a 41 e 54 a 57.
Nos pontos 58 e 59 das conclusões de recurso os apelantes insurgem-se contra o segmento da sentença que não arbitrou indemnização a título de benfeitorias.
Na decisão arbitral não se atribuiu qualquer indemnização a título de benfeitorias, por se considerar que não são objeto de indemnização atendendo ao uso previsto para o solo – apto para construção.
Os expropriados no recurso da decisão arbitral não se insurgiram contra tal decisão.
No laudo maioritário dos peritos não se atribuiu qualquer indemnização, por se entender:
“Face à metodologia de cálculo, solo apto para construção, considera-se que as benfeitorias não constituem qualquer mais valia, uma vez que o aproveitamento construtivo do terreno implicaria a remoção de todo o arvoredo, tendo o terreno sido considerado para efeitos de avaliação como limpo de todo o material lenhoso existente. Assim face ao critério de avaliação entendem que as benfeitorias não deverão ser avaliadas”.
Apenas o perito indicado pelos expropriados incluiu a indemnização das benfeitorias, na indemnização a arbitrar, mas sem qualquer fundamento.
Na sentença considerou-se:
“No que concerne a benfeitorias existentes na parcela [à data da vistoria ad perpetuam rei memoriam, a parcela dispunha de uma Plantação alinhada de eucaliptos com D.A.P. de 10 cm e compasso de 2 x 3 m 1 350,00 m2; 15 unidades de eucaliptos de médio porte disperso pela parcela com D.A.P de 30 cm; 8 unidades de eucaliptos de médio porte disperso pela parcela com D.A.P de 40 cm; 7 unidades de eucaliptos de médio porte disperso pela parcela com D.A.P de 50 cm; 11 unidades de sabugueiros de médio porte e 7 unidades de austrálias com D.A.P médio de 20 cm], dado estarmos perante um terreno classificado como apto para construção, coloca-se a questão de saber se as benfeitorias devem ser atendidas no cálculo do montante indemnizatório.
Como se decidiu no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17 de setembro de 2009 (Col. IV/171; cf. também Acórdão do TRP de 08.09.2009, processo 1577/06.2 TBPFR.P1, disponível em www.dgsi.pt) o critério decisivo para se solucionar caso a caso a questão de saber se deve ou não atribuir-se indemnização por uma qualquer benfeitoria existente na parcela expropriada (avaliada como terreno apto para construção) é o da determinação da necessidade ou da inevitabilidade da inutilização/ destruição da mesma benfeitoria, no caso de a parcela ser aproveitada para construção.
No caso em apreço, a execução de uma construção na parcela expropriada implicaria a remoção das mesmas, logo estas não poderão ser tidas em conta para efeitos do cálculo indemnizatório. Nestes termos, o tribunal, seguindo uma vez mais o laudo maioritário, decidiu não atender, para efeitos de cálculo da justa indemnização, ao valor das benfeitorias”.
Os apelantes insurgem-se contra a decisão, por entenderem que as benfeitorias são aproveitáveis antes do aproveitamento do terreno para construção, como é o caso da madeira e podem ser aproveitadas para comercializar, sendo indemnizáveis.
Em bom rigor trata-se de uma questão nova, porque os apelantes no recurso da decisão arbitral não se insurgem contra o segmento da decisão que não arbitrou qualquer indemnização.
Contudo, a sentença recorrida tomou posição sobre a matéria e nesse segmento é também suscetível de recurso, por ser a forma de impugnar a decisão (art.º 627ºCPC).
A questão que se coloca consiste em determinar se as árvores que existiam na parcela devem ser avaliadas como benfeitorias.
Constituem benfeitorias todas as despesas feitas para conservar ou melhorar a coisa – art.º 216º, nº 1, do Código Civil.
As benfeitorias podem ser necessárias, úteis ou voluptuárias, tendo as primeiras (necessárias) por fim evitar a perda, destruição ou deterioração da coisa, constituindo as segundas (úteis) as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação, lhe aumentam, todavia, o valor, e as terceiras (voluptuárias) as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação nem lhe aumentando o valor, servem apenas para recreio do benfeitorizante – art.º 216º, nºs 2 e 3, do Código Civil.
No cálculo da justa indemnização, atento o disposto no art.º 23º do Código das Expropriações (Lei 168/99 de 18/09) visa-se ressarcir o expropriado do prejuízo que lhe advém da expropriação, pelo que a indemnização se apresenta como uma reposição, em termos de equivalente pecuniário, da posição de proprietário de que era titular.
Esta reintegração tem dois vetores: o património deve recuperar a perda que sofreu, mas não deve ficar acrescido em razão disso. E isto implica a ausência de duplas valorações do bem expropriado, designadamente por via da dupla indemnização dos seus elementos.
No cálculo da indemnização, conforme decorre do art.º 23º/2 c) do Código das Expropriações apenas estão excluídas as benfeitorias voluptuárias ou úteis ulteriores à notificação, a que se refere o nº 5 do artigo 10º.
Impõe-se, assim, a consideração das circunstâncias e condições de facto existentes, nas quais se incluem, naturalmente, as benfeitorias úteis realizadas em data anterior à notificação da resolução de declarar a expropriação por utilidade pública.
Tem-se entendido que se o solo for classificado como apto para construção, as benfeitorias nele existentes não podem, em regra, ser consideradas como fator de valorização, pois, ao invés, podem constituir fator de desvalorização da parcela, ponderando os custos de demolição para aí se construir.
Contudo, atenta a natureza da indemnização a atribuir ao expropriado, a jurisprudência tem estabelecido critérios que permitem valorizar as benfeitorias existentes, apesar da classificação da parcela como solo “apto para construção.”
Com efeito, no cálculo da indemnização, não está prevista a exclusão de qualquer benfeitoria ou de outro elemento do património expropriado, antes impondo a lei (art.º 23º, nº 1, parte final) a consideração das circunstâncias e condições de facto existentes, nas quais se incluem, naturalmente, as benfeitorias.
Defende-se, assim, que as benfeitorias “deverão ser ponderadas sob o prisma da desvalorização da parte sobrante do prédio e, assim, a indemnização poderá integrar o seu valor, de modo a compensar aquela depreciação” (Ac. Rel. Coimbra de 9/2/99, CJ, Tomo I, pág. 33).
Neste sentido pronunciou-se também o Ac. Rel. Porto 08 de setembro de 2009, quando refere:
“Tendo sido a parcela expropriada classificada como solo apto para construção, classificação essa que não foi objeto de impugnação por parte da entidade expropriante, é entendimento pacífico da nossa jurisprudência que as benfeitorias não devem ser consideradas no cálculo da indemnização, isto porque a execução da construção implicará necessariamente a sua demolição e destruição, sendo de ressalvar, porém, os casos em que elas mantenham utilidade para a parte sobrante do prédio, uma vez que aí a sua destruição provocará a desvalorização desta.
Acontece que no caso “sub judice” as benfeitorias (um muro de betão, com 10,50 metros de comprimento, 1,95 metros de altura, 0,45 metros de espessura, em bom estado de conservação; um muro de suporte de pedra rebocada, com 4 metros de comprimento, 2,20 metros de desenvolvimento, 0,40 metros de espessura, em bom estado de conservação) encontravam-se inseridas em logradouro de construção existente e, por isso, mantinham utilidade para a parte sobrante do prédio.
Como tal, o seu valor deverá ser atendido para fixação do montante indemnizatório” (nº convencional JTRP 00042902).
Num outro segmento, considera-se um: “[c]ritério decisivo para solucionar, caso a caso, a questão de saber se deve ou não atribuir-se indemnização por qualquer benfeitoria existente na parcela expropriada (avaliada como terreno apto para construção) a determinação da necessidade ou inevitabilidade da inutilização/destruição da mesma benfeitoria, no caso de a parcela ser aproveitada para construção.
Assim, sendo tal destruição ou inutilização inelutável numa situação de aproveitamento construtivo do prédio, sempre a indemnização pela benfeitoria em caso de expropriação viria a corresponder a uma sobrevalorização do prédio expropriando. Na situação inversa, mantendo-se ou podendo manter-se a benfeitoria no caso de construção sobre a parcela expropriada, impõe-se a indemnização pelo valor da mesma em caso de expropriação, por ser manifesta a perda para o expropriado da sua utilidade ou valor.” (Ac. Rel. Porto 03 de março 2010 – nº convencional JTRP00047700 – www.dgsi.pt ).
Neste sentido também se pronunciaram:
> Ac. Rel. Lisboa de 11 de fevereiro de 2010, quando refere:
“A questão consiste em saber se o murete, o pilar de betão, o portão e o armazém a que os peritos aludem, em conformidade com o acórdão arbitral, aumentam o valor do bem expropriado, traduzindo-se, portanto, numa benfeitoria.
Torna-se, assim, necessário apurar se podem ou não ser aproveitáveis, conforme o fim que vier a ser dado ao terreno expropriado, dado que o facto da avaliação do solo o haver considerado apto para construção não exclui automaticamente as benfeitorias nele existentes, mediante a justificação de que seriam, em caso de construção de um prédio, destruídas.
Ficou provado que, no prédio a expropriar foi colocada uma rede metálica com portão, tendo sido edificado um armazém com 120 m2 e construídos muretes de alvenaria com 330 metros de extensão.
Atentos os esclarecimentos prestados pelos peritos, resulta ser entendimento unânime dos mesmos que, na eventualidade de um aproveitamento diverso do atual, o mesmo é compatível com as benfeitorias existentes no mesmo.
Salientam que tais benfeitorias são aproveitáveis e enquadráveis com as construções a prever como possíveis para o local, as quais também têm natureza industrial, ou seja, as benfeitorias são aproveitáveis na construção de novos edifícios cuja utilização será da mesma natureza da atividade desenvolvida pela expropriada” (Proc. 114/1998.L1-6 – www.dgsi.pt).
> Ac. Rel. Porto de 25 de março de 2010
“Conforme artigo 216º/2 do CC, consideram-se benfeitorias as despesas feitas para conservar ou melhorar a coisa. Essa conservação ou melhoramento depende precisamente da natureza da coisa. Só pode considerar-se benfeitorias algo que traga um valor acrescido à coisa. Num aproveitamento agrícola ou florestal pode determinada despesa considerar-se um melhoramento, aumente o valor, ou seja, necessário à conservação e frutificação da coisa. Porém, num aproveitamento urbanístico, pode essa despesa não constituir melhoramento algum ou equivaler a uma menos valia, por importar despesas necessárias para colocar o bem em condições adequadas ao fim construtivo a que se destina.
E só em concreto (abstratamente, quase tudo pode ter uma qualquer utilidade – no caso do muro, até para atulhar a mina ou fazer um qualquer aterro, mas para um construtor que quisesse simplesmente edificar no local, preferiria, seguramente, ter um terreno limpo, pronto a receber a construção), perante a afetação do (ou a dar ao) terreno é seguro concluir que se está perante uma benfeitoria valorizante, que acrescenta algum valor a ter em conta na compensação ao proprietário expropriado” (nº convencional JTRP 00043836).
No caso concreto, o corte do arvoredo é inevitável para obter o aproveitamento do prédio para construção e foi na ponderação de tal aspeto que se fixou o valor do solo para construção. Considerando o aproveitamento normal da parcela, como solo apto para construção de pavilhões industriais ou empresariais, a subsistência das árvores mostra-se incompatível com o aproveitamento da parcela para a construção. Para o aproveitamento construtivo proposto revela-se imprescindível o abate das árvores, o que importa em si um encargo e por isso, não pode ser considerado uma benfeitoria.
Desta forma, não merece censura a decisão pelo facto de não ter considerado o valor das árvores a título de benfeitorias.
Improcedem as conclusões de recurso sob os pontos 58 e 59.
Nos pontos 20 a 28 e 51 a 53 os apelantes insurgem-se contra o segmento da sentença que não atribuiu qualquer indemnização pela depreciação da parcela sobrante, em virtude de ficar integrada em área de servidão “non aedificandi”.
Na decisão arbitral considerou-se que a parcela sobrante sofreu uma depreciação que calcularam em € 20 509,23.
Os expropriados não aceitaram o montante da indemnização, por considerarem que o valor do terreno para construção era superior ao considerado nos cálculos.
Na perícia, no laudo maioritário, considerando o critério utilizado para a avaliação da parcela, não se atribuiu qualquer desvalorização à sobrante por se entender que: “face ao critério de avaliação adotado e aos pressupostos assumidos para a avaliação do terreno da parcela expropriada, entenderem os peritos que a parte sobrante abrangida pela servidão non aedificandi não introduz qualquer desvalorização, uma vez que essa área poderia também ser contabilizada para a área possível de edificar no conjunto predial dos expropriados, tal como foi considerado para a parcela expropriada”.
A sentença acolheu tal interpretação.
Os apelantes consideram que a parcela expropriada como resulta da comunicação do Município ... esteve um solo urbano, área verde de enquadramento e em espaços de atividades económicas – Espaços Empresariais Industriais. Os senhores peritos maioritários afastaram a desvalorização da parcela sobrante por entenderem que essa área (a nova área sujeita a servidão non aedificandi) pode ser contabilizada para a área possível de edificar.
Consideram que para poder operar a transferência da área construível na parcela sobrante é preciso que seja possível, é possível que haja terreno disponível e condições para implantar. Com o índice de 1,2 a uma permissão de impermeabilização de 80% praticamente não sobra terreno porque estamos a raciocinar com armazéns de 1 piso, e é preciso deixar 20% para impermeabilizar e, deixar áreas envolventes para circulação pública e estacionamento. A configuração da sobrante livre de servidão não ajuda a construção, pelo contrário, impede-a (basta ver-se as plantas juntas pelo IMT).
Concluem que seria de aplicar a norma nº 1 e 2 do artigo 29º do CE. A construção industrial não é em altura. A compensação entre uma área que já estava sujeita a servidão “non aedificandi” não faz sentido. Há que ponderar a nova área e raciocinar com base na sua delimitação concreta e as implicações que tem. A área que integra a servidão “non aedificandi” criada pela Lei 34/2015 – está classificada no PDM como solo urbano/áreas verde de enquadramento, desconhecendo-se como a nova área será classificada em novo PDM.
Cumpre apreciar se deve ser atribuída uma indemnização pela depreciação da parcela sobrante.
Determina o art.º 29º do CE:
1. Nas expropriações parciais, os árbitros ou os peritos calculam sempre, separadamente, o valor e o rendimento totais do prédio e das partes abrangidas e não abrangidas pela declaração de utilidade pública.
2. Quando a parte não expropriada ficar depreciada pela divisão do prédio ou desta resultarem outros prejuízos ou encargos, incluindo a diminuição da área total edificável ou a construção de vedações idênticas às demolidas ou às subsistentes, especificam-se também, em separado, os montantes da depreciação e dos prejuízos ou encargos, que acrescem ao valor da parte expropriada.
3.Não haverá lugar à avaliação da parte não expropriada, nos termos do nº1, quando os árbitros ou os peritos, justificadamente, concluírem que, nesta, pela sua extensão, não ocorrem as circunstâncias a que se referem as alíneas a) e b) do nº2 e o nº3 do art.º 3º.
Resulta deste regime que a expropriação parcial pode dar origem à depreciação da parcela sobrante e causar prejuízos e encargos, contando-se entre esses encargos, a diminuição da área total edificável e a construção de vedações, circunstâncias que justificam a atribuição de uma indemnização.
No Código das Expropriações de 1991 (art.º 28º) OSVALDO GOMES considerava que a indemnização, por depreciação da parcela sobrante, englobava:
- as depreciações e os prejuízos diretamente resultantes da divisão do prédio ou da expropriação parcial;
- outros prejuízos ou encargos resultantes da expropriação, incluindo o custo das novas vedações; e
- as depreciações e prejuízos indiretamente resultantes da expropriação ou da afetação da parcela expropriada ao fim determinante da expropriação[16].
Em comentário ao nº 2 do art.º 29º do Código das Expropriações refere FERNANDO ALVES CORREIA, que se prevê: “[…] a indemnização de um conjunto de danos patrimoniais subsequentes, derivados[…]ou laterais, isto é, prejuízos que são uma consequência direta e necessária da expropriação parcial de um prédio, a qual acresce à indemnização correspondente à perda do direito ou à perda da substância do bem expropriado (a parte expropriada do prédio )”[17].
No comentário ao Ac. Rel. Évora de 30.03.2000 e Ac. STJ de 01.03.2001– publicado na Revista de Legislação e Jurisprudência nº 134 (pág. 77 e 87) o mesmo AUTOR desenvolve a análise da natureza dos prejuízos a considerar neste domínio e refere:
“Todavia, exige-se que tais prejuízos patrimoniais subsequentes, derivados ou laterais sejam uma consequência direta e necessária da expropriação parcial de um prédio. Só eles é que podem ser incluídos na indemnização e não já também aqueles que têm com a expropriação parcial do prédio apenas uma relação indireta, porque encontram a sua causa em factos posteriores ou estranhos à expropriação”[18].
Considera o mesmo autor que o prejuízo direto: “é um dano que apresenta um laço de causalidade estreita com a medida expropriativa, um dano cuja origem resulta do ato de desapossamento forçado imposto ao expropriado”[19].
Em tese geral as servidões “non aedificandi” constituem uma modalidade específica das servidões administrativas, fixadas diretamente na lei ou resultantes de ato administrativo, que oneram certos prédios e se traduzem numa proibição de edificar, por motivos de interesse público.
Entre elas, destacam-se as que incidem sobre faixas de terrenos adjacentes a uma estrada ou autoestrada a construir, a reconstruir ou já existentes e que visam proteger tais vias de comunicação, em conformidade com o regime previsto na Lei 34/2015.
O art.º 8 do Cód. das Expropriações, que se reporta à constituição de servidões administrativas, estatui o seguinte:
1. Podem constituir-se sobre imóveis as servidões necessárias à realização de fins de interesse público.
2. As servidões, resultantes ou não de expropriações, dão lugar a indemnização quando:
a) inviabilizem a utilização que vinha sendo dada ao bem, considerado globalmente;
b) inviabilizem qualquer utilização do bem, nos casos em que não estejam a ser utilizados; ou
c) anulem completamente o seu valor económico.
3. À constituição das servidões e á determinação da indemnização aplica-se o disposto no presente código com as necessárias adaptações, salvo o disposto em legislação especial.
Na interpretação do preceito refere FERNANDO ALVES CORREIA que “é demasiado restritivo no que respeita ao âmbito das servidões administrativas que devem ser acompanhadas de indemnização”. Prosseguindo, afirma que “para além das servidões administrativas que produzem os tipos de danos referidos nas três alíneas do nº 2 do art.º 8, outras há que devem dar direito a indemnização: são aquelas que produzem danos “especiais” e “anormais” (ou “graves”) na esfera jurídica dos proprietários dos prédios (normalmente terrenos)”.
Mais adiante escreve ainda o seguinte: “...devem dar direito a indemnização todas as servidões administrativas que se apresentem como verdadeiras “expropriações de sacrifício” ou “substanciais”, isto é, como actos que produzem modificações “especiais” e “graves” (ou “anormais”) na utilitas do direito de propriedade, em termos tais que ocorreria uma violação do “princípio da justa indemnização” por expropriação ... condensado no art.º 62, nº 2 da Constituição, do “princípio do Estado de Direito democrático”, consagrado nos arts. 2 e 9, al. b) da Lei Fundamental, nos termos do qual os actos do poder público lesivos de direitos ou causadores de danos devem desencadear uma indemnização, e do “princípio da igualdade dos cidadãos perante os encargos públicos”, ínsito no art.º 13º, nº 1 da Constituição, se o proprietário onerado com essa servidão administrativa não obtivesse uma indemnização. E as servidões administrativas que produzem danos daquela “natureza” não se restringem, seguramente, às elencadas no nº 2 do art.º 8º do vigente Cód. das Expropriações”[20].
Refira-se, aliás, que o acórdão do Tribunal Constitucional nº 331/99, publicado no D.R., 1ª Série-A, de 14/07/99, já havia declarado a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, do art.º 8º nº 2 do Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto Lei nº 438/91 de 09/11, na medida em que não permitia a indemnização pelas servidões fixadas diretamente pela lei que incidissem sobre parte sobrante do prédio expropriado, no âmbito de expropriação parcial, desde que a mesma parcela já tivesse, anteriormente ao processo expropriativo, capacidade edificativa, por violação do disposto nos arts. 13º nº 1 e 62º nº 2 da Constituição.
Conclui-se, assim, que mesmo não se verificando nenhuma das situações previstas no art.º 8º, nº 2 do Cód. das Expropriações, a constituição de uma servidão administrativa dará sempre lugar a indemnização quando a mesma produza, na esfera jurídica do proprietário, um prejuízo concreto, grave e anormal, designadamente, quando o proprietário vê reduzido o valor económico e de mercado do bem por força da eliminação ou redução da capacidade edificativa que o prédio possuía antes de estar onerado com a servidão “non aedificandi”.
A entender-se de forma diversa, estaríamos seguramente a violar os princípios constitucionais do Estado de Direito democrático, da igualdade dos cidadãos perante os encargos públicos e da justa indemnização por expropriação.
A desvalorização dos imóveis assume particular importância no caso das servidões “non aedificandi”, uma vez que estas limitam o direito de transformação que integra o conteúdo da propriedade, traduzindo-se numa efetiva e, em muitos casos, importante redução do valor dos prédios servientes.
Contudo, não se verificando nenhuma das situações previstas no citado art.º 8º, nº 2 e não estando demonstrada a existência de qualquer prejuízo efetivo decorrente da servidão, designadamente a eliminação ou redução da sua potencialidade construtiva, não existe qualquer fundamento legal para atribuir uma indemnização pela constituição da servidão.
Neste sentido pronunciaram-se, entre outros, o Ac. Rel. Porto 02.07.2009 (nº convencional JTRP 00042793 – www.dgsi.pt ) e o Ac. Rel. Porto 22.09.2009 (nº convencional 000 42 980 – www.dgsi.pt ).
No caso presente, não se verifica nenhuma das situações previstas no citado art.º 8º nº 2, pois não está demonstrado que a constituição da servidão “non aedificandi” tenha determinado uma redução da capacidade construtiva da parcela sobrante e não está provado que a servidão tenha originado para os expropriados um qualquer outro prejuízo concreto e relevante que seja suscetível de indemnização.
Com efeito, não estando aqui demonstrado que a constituição da servidão tenha determinado uma redução da capacidade edificativa que a parcela sobrante possuía anteriormente, fica também por demonstrar que, por força desse facto, a referida parcela tenha sofrido uma redução do respetivo valor económico e de mercado e, como tal, inexiste fundamento para atribuir aos expropriados uma indemnização a esse título.
Conforme resulta do laudo maioritário na avaliação da parcela considerou-se o prédio integrado no todo formado pelos prédios que pertencem aos expropriados e por outro lado, o tipo de construção possível face ao PDM – pavilhões industriais e empresariais. A parcela sobrante após a expropriação manteve os cómodos. A área da parcela sobrante pode num aproveitamento normal ficar afeta a logradouro ajardinado ou aparcamento, ou área de circulação exterior e por esse facto não perde a natureza de apto para construção, porque o juízo de avaliação leva em consideração a construção possível, como um todo, nos diversos prédios que pertencem aos expropriados.
Os apelantes, para sustentar a sua posição, nas conclusões de recurso, alegam um conjunto de factos que não se provaram e não resultam da prova pericial e por isso, não relevam para a avaliação da parcela sobrante.
Para efeito de apurar a justa indemnização releva apenas a classificação da parcela sobrante à data da DUP e nessa data nem a parcela expropriada, nem a sobrante, estavam classificadas como um solo urbano, área verde de enquadramento e em espaços de atividades económicas – Espaços Empresariais Industriais.
Por outro lado, a área ajardinada ou logradouro de um prédio não deixa de ter a qualidade de solo apto para construção quando faz parte de um conjunto de prédios com aptidão para construção. Não resulta dos factos provados que a tipologia da construção impedia a afetação da parcela sobrante para logradouro ou área ajardinada.
O laudo maioritário dos peritos mostra-se devidamente fundamentado, respeitando o critério legal, conforme resulta do art.º 29º/2 do Código das Expropriações e por isso, merece inteiro relevo para apreciar a questão em análise.
Conclui-se, assim, que por efeito da expropriação a parcela sobrante não sofreu qualquer depreciação.
Improcedem as conclusões de recurso, sob os pontos 20 a 30 e 51 a 53.
A última questão prende-se com o segmento da decisão que julgou improcedente a exceção abuso do direito, suscitada pelos expropriados na resposta ao recurso subordinado.
Os apelantes mantêm a posição que existe abuso do direito, quando a entidade expropriante na fase administrativa apresenta uma proposta de indemnização no montante de €115 000,00 e vem interpor recurso da decisão arbitral, pretendendo que a indemnização a arbitrar se fixe em € 50.200,00.
O abuso do direito, nos termos do art.º 334º CC, consiste no exercício ilegítimo de um direito.
Considera-se ilegítimo o exercício de um direito “quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.
PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA referem que: “[a] nota típica do abuso do direito reside, por conseguinte, na utilização do poder contido na estrutura do direito para a prossecução de um interesse que exorbita do fim próprio do direito ou do contexto em que ele deve ser exercido”[21].
ALMEIDA COSTA refere a este respeito que: “exige-se, um abuso nítido: o titular do direito deve ter excedido manifestamente esses limites impostos ao seu exercício”[22].
Para apurar se as partes envolvidas no negócio agiram segundo os ditames da boa-fé cumpre ao juiz considerar: “as exigências fundamentais da ética jurídica, que se exprimem na virtude de manter a palavra e a confiança, de cada uma das partes proceder honesta e lealmente, segundo uma consciência razoável, para com a outra parte, interessando as valorações do círculo social considerado, que determinam expectativas dos sujeitos jurídicos”. De igual modo, “não se pode esquecer o conteúdo do princípio da boa fé objetivado pela vivência social, a finalidade intentada com a sua consagração e utilização, assim como a estrutura da hipótese em apreço”[23].
Com base no abuso do direito, o lesado pode “requerer o exercício moderado, equilibrado, lógico, racional do direito que a lei confere a outrem; o que não pode é, com base no instituto, requerer que o direito não seja reconhecido ao titular, que este seja inteiramente despojado dele”[24].
Tal como o apelante configura a exceção, a mesma é suscetível de se enquadrar na modalidade do venire contra factum proprium.
A conduta suscetível de integrar o venire contra factum proprium pressupõe, estruturalmente, duas condutas da mesma pessoa, lícitas em si e diferidas no tempo. A primeira – o factum proprium – é contrariada pela segunda. O óbice reside na relação de oposição entre ambas[25].
O venire é suscetível de configurar um comportamento abusivo e por isso merecedor de censura legal, à luz do abuso do direito, tal como se mostra configurado no art.º 334º CC, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé.
Em termos dogmáticos o venire contra factum proprium constitui uma manifestação de tutela da confiança, que decorre do princípio da boa fé. Um comportamento não pode ser contraditado quando ele seja de molde a suscitar a confiança das pessoas[26].
A questão que se coloca consiste em saber como se pode considerar que um comportamento é suscetível de criar a confiança das pessoas, vinculando-as às obrigações assumidas.
MENEZES CORDEIRO propõe, como auxiliar ao intérprete, na concretização do conceito de “confiança”, “um modelo de quatro proposições” sem estabelecer qualquer hierarquia entre eles e sem carácter cumulativo:
“- uma situação de confiança conforme com o sistema e traduzida na boa fé subjetiva e ética, própria da pessoa que, sem violar os deveres de cuidado que ao caso caibam, ignore estar a lesar posições alheias;
- uma justificação para essa confiança, expressa na presença de elementos objetivos capazes de, em abstrato, provocarem uma crença plausível;
- um investimento de confiança consistente em, da parte do sujeito, ter havido um assentar efetivo de atividades jurídicas sobre a crença consubstanciada;
- a imputação da situação de confiança criada à pessoa que vai ser atingida pela proteção dada ao confiante: tal pessoa, por ação ou omissão, terá dado lugar à entrega do confiante em causa ou ao fator objetivo que a tanto conduziu”[27].
No caso concreto, cumpre apurar, perante os factos provados, se a apelada adotou uma conduta suscetível de gerar uma confiança legítima nos apelantes, no sentido de não impugnar a decisão arbitral e fazendo-o, não apresentar um valor inferior ao proposto na fase administrativa e negocial.
Entendemos que não.
A proposta apresentada na fase de negociações, no sentido de se obter um acordo, leva em consideração aspetos que não relevam na fase judicial do processo de expropriação, como já se salientou no acórdão proferido no Apenso A) e foi reafirmado na sentença. Fora disso, instaurado o processo judicial a entidade expropriante assume a posição de parte e nessa qualidade assiste-lhe o direito a recorrer da decisão arbitral. Por outro lado, foram os expropriados que não aceitaram a proposta. Instaurado o processo de expropriação a atribuição da justa indemnização está sujeita a regras próprias que podem não ser observadas numa fase negocial e por isso, não se pode estabelecer qualquer paralelismo entre os valores oferecidos numa perspetiva de acordo e aqueles que resultam de uma decisão judicial.
Aliás, ainda, que a entidade expropriante não viesse interpor recurso, não existia qualquer garantia de ser reconhecida uma indemnização equivalente ao valor proposto, como bem evidenciam os autos, porque a justa indemnização é fixada em decisão arbitral, a qual pode ou não ser objeto de recurso. A determinação do montante da indemnização fica sujeito às regras previstas no Código das Expropriações.
Desta forma, inexiste fundamento para invocar o abuso do direito, porque não se provou qualquer facto que revele que a apelada não agiu de acordo com os ditames da boa-fé ao interpor recurso subordinado, pretendendo que o valor da indemnização se situe abaixo do valor apresentado em fase de negociações, pelo que não merece censura a decisão.
Improcedem os pontos 1 a 13 das conclusões de recurso.
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Nos termos do art.º 527º CPC as custas são suportadas pela apelante.
Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação e confirmar a decisão.