CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO MÉDICO
INTERVENÇÃO MÉDICO-DENTÁRIA COM FINS ESTÉTICOS
OBRIGAÇÃO DE RESULTADO
MORA
INCUMPRIMENTO DEFINITIVO
Sumário

I - A legitimidade processual, pressuposto de cuja verificação depende o conhecimento do mérito da causa, não se confunde com a legitimidade substantiva, requisito da eventual procedência do pedido e afere-se à luz das regras substantivas. Ao apuramento de ambas interessa, contudo, a consideração do pedido e da causa de pedir.
II - Os serviços médicos prestados pela Médica, ao autor(paciente), ocorreram no âmbito de uma relação contratual estabelecida entre este e a ré. A Médica, dentro da sua esfera de autonomia, interveio enquanto “auxiliar” da ré, no quadro das funções que lhe estavam atribuídas por esta. Estamos, assim, perante um contrato de prestação de serviço que consistia num tratamento médico dentário, a efectuar pela ré ao autor, mediante retribuição.
III - Neste quadro, a clínica/ré, prestadora de serviço de saúde, assume as obrigações correspondentes ao contrato de prestação de serviço médico e é quem responde integralmente perante o paciente credor (ora autor), nos termos do artigo 800.º, n.º 1, do CC, pelos actos praticados pela Médica, na execução das prestações médicas convencionadas, como se tais actos fossem praticados por aquela devedora.
IV - As intervenções médico-dentárias com fins predominantemente estéticos, tais como colocação de próteses, restauração de dentes e realização de implantes, reconduzem a obrigação do médico a uma obrigação de resultado. Trata-se de uma área especializada que impõe ao médico um específico dever do emprego da técnica adequada e estão em causa, no caso concreto, actos médicos que comportam uma ínfima margem de risco (restauração dos dentes 13, 24, 37 e 47; extracção do dente 11; colocação de implantes nos dentes 12 e 22, com coroas pilares aparafusadas sobre os mesmos; e colocação de coroas pôntico cerâmicas nos dentes 11 e 21).
V - No quadro de uma obrigação de resultado, incumbe ao credor lesado provar a ocorrência desse resultado enquanto facto constitutivo do direito que invoca (art.º 342.º, n.º 1, e 798.º do CPC), presumindo-se a culpa do devedor lesante, sobre quem recai o ónus de ilidir tal presunção legal, nos termos do artigo 799.º do CC.
VI - O devedor só fica constituído em mora depois de interpelado para cumprir, havendo, porém, mora da sua parte, independentemente de interpelação, quando, designadamente, a obrigação tiver prazo certo.
VII - Pode o credor, em consequência da mora, perder o interesse que tinha na prestação ou esta não ser realizada dentro do prazo que razoavelmente seja fixado pelo credor, caso em que se considera não cumprida, em definitivo, a obrigação.
VIII - A mora transforma-se em incumprimento definitivo se o devedor não cumpre no prazo suplementar e peremptório que o credor razoavelmente lhe concede. Trata-se da chamada interpelação admonitória ou interpelação cominatória que visa conceder ao devedor uma derradeira possibilidade de manter o contrato e tem de conferir uma dilação razoável, em vista dessa finalidade, e comunicada em termos de deixar transparecer a intenção do credor.
IX - A perda de interesse deve ser “apreciada objectivamente”. Este critério significa que a importância de tal interesse, embora aferida em função da utilidade concreta que a prestação teria para o credor, não se determina de acordo com o seu juízo arbitrário, mas considerando elementos susceptíveis de valoração pelo comum das pessoas.
X - Não se tratando de uma obrigação sujeita a prazo e não tendo a ré sido interpelada, nos termos referidos, não se constituiu em mora e, consequentemente, não se verifica o incumprimento definitivo do contrato com fundamento na perda de interesse do credor.

Texto Integral

Processo nº3488/19.2T8AVR.P1

Acordam os Juízes da 5.ª Secção (3ª Secção Cível) do Tribunal da Relação do Porto, sendo

Relatora: Anabela Mendes Morais

Primeira Adjunta: Teresa Maria Sena Fonseca

Segunda Adjunta: Carla Jesus Costa Fraga Torres

I_ Relatório

O autor AA propôs a presente acção declarativa contra “A... Lda.”, peticionando:

(i) a resolução do contrato celebrado entre ambos, com vista à colocação de dois implantes dentários, no maxilar superior do autor;

(ii) a condenação da ré a restituir-lhe a quantia de €3.138,00 (três mil cento e trinta e oito euros), que recebeu como retribuição da colocação de implantes dentários que não conseguiu realizar com sucesso;

(iii) a condenação da ré no pagamento, ao autor, da quantia global de €31.488,00 € (trinta e um mil quatrocentos e oitenta e oito euros), a título de indemnização por todos os danos patrimoniais e morais que lhe causou e continua a causar, com as suas intervenções;

(iv) a condenação da ré a pagar, ao autor, juros de mora, à taxa legal, sobre os montantes referidos nas duas alíneas anteriores, desde a citação para contestar a presente acção até integral pagamento.

Para tanto alegou, em síntese, que:

_ Tendo perdido os dois dentes incisivos centrais, no seu maxilar superior, o autor, no dia 30-09-2014 dirigiu-se à clínica da ré, com o objectivo de averiguar a possibilidade de colocação de prótese fixa e definitiva que substituísse os referidos dentes.

_ Na clínica da ré, foi observado pela Dr.ª BB que ali exercia actividade profissional por ordem, no interesse e sob direcção da ré, tendo esta, por intermédio daquela, proposto a realização dos tratamentos que constam dos documentos nºs 1, 2 e 3 juntos com a petição.

_ O autor aceitou a proposta da ré, tendo sido submetido aos tratamentos descritos nos documentos 4 a 12 juntos, nos dias 30/09/2014, 18/10/2014, 11/11/2014, 15/12/2014, 20/01/2015, 17/02/2015, 30/03/2015 e 11/10/2016, entre os quais uma cirurgia para colocação de dois implantes dentários e a colocação de coroas pôntico-cerâmicas, tendo pago a quantia total de €3.138,00.

_ Decorridos nove meses, os implantes caíram sem que o autor os tivesse sujeitado a qualquer esforço ou pressão, tendo a ré, por intermédio dos seus colaboradores, nomeadamente a Dra. BB, durante os dezoito meses subsequentes, tentado remover os parafusos que implantou no maxilar daquele, sem sucesso.

_ Estas intervenções causaram-lhe dor e incómodos.

_ Durante os mencionados dezoito meses, o autor permaneceu sem os quatro dentes da frente o que lhe causou incómodos pois, sem esses dentes tinha dificuldades em se alimentar e em falar; e sentiu-se vexado com a sua aparência física, resultante da falta de tais dentes.

_ A ré optou, então, por submeter o autor a nova cirurgia para colocação de novos parafusos para suporte de novos implantes, sem remoção dos parafusos iniciais.

_ Após esta cirurgia seguiram-se mais três meses durante os quais o autor permaneceu desdentado, enquanto aguardava a cicatrização da intervenção, sofrendo todos os inconvenientes da falta dos dentes da frente, já enunciados.

_ Decorridos os mencionados três meses, a R. colocou no A. duas novas coroas pilar aparafusadas sobre implantes e duas novas coroas pôntico-cerâmicas.

_ Decorridos mais seis meses, também as novas próteses acabaram por cair, ficando o A., uma vez mais, sem os quatro dentes da frente, do seu maxilar superior e com o aspecto que o documento que juntou sob o nº 13 demonstra.

_ Entretanto a Dra. BB deixou de prestar serviços na Clínica da R., passando o A. a ser atendido pelo Dr. CC que ali exercia a sua actividade de médico dentista, de igual modo por ordem, por conta e sob a direcção da R.

_ O Dr. CC, após examinar o A., informou-o de que os tratamentos que antes lhe haviam sido realizados se apresentavam defeituosos e que tais defeitos não eram susceptíveis de correcção e que, em sua opinião, a única maneira de efectuar, de forma persistente, os implantes correspondentes aos quatro dentes em falta exige a extracção de todos os dentes do maxilar superior do A., ainda que perfeitamente saudáveis, e posterior colocação de seis implantes em substituição de todos esses dentes.

_ O A. não pretende que a R. lhe extraia mais dentes saudáveis, nem pretende que a R. lhe coloque mais implantes.

Em boa verdade está até muito arrependido de ter permitido que a Clínica R. lhe extraísse dois dentes perfeitamente sãos e só o permitiu por lhe ter sido garantido pela R. que apenas dessa forma seria possível instalar implantes para substituição dos dois dentes que perdera.

_ Decorridos quase cinco anos sobre a data em que a R. se obrigou a colocar os implantes em questão na boca do A., este continua sem dentes da frente – sem os dois que lhe faltavam e queria substituir e sem os outros dois que tinha saudáveis e que a R. lhe subtraiu com a garantia de que desse modo lhe conseguiria colocar próteses fixas definitivas.

_ O actual colaborador da Ré assumiu a incapacidade desta para realizar os dois implantes acordados.

_ Pretende a resolução do contrato que celebrou com a R. e que esta, através do seu colaborador, já reconheceu não conseguir cumprir, nos termos acordados.

Pretende a restituição do dinheiro que pagou à R. por tratamentos que esta, afinal, não conseguiu realizar nos termos convencionados.

_ Pretende ser indemnizado por todos os demais prejuízos físicos, emocionais e patrimoniais que vem sofrendo, desde Setembro de 2014, com as sucessivas intervenções que a R. lhe fez e que resultaram inúteis e bem assim, pelo grave dano moral resultante de andar há quase cinco anos sem dentes da frente, situação que lhe causa dificuldades na alimentação e, sobretudo, de dicção e que o faz sentir ridículo, vexado e humilhado, causando-lhe um grave prejuízo de afirmação pessoal e social.

_ O A. nasceu em 27.07.1983, pelo que em Setembro de 2014 tinha trinta e um anos de idade.

_ Até a R. o deixar sem os quatro dentes da frente, o A. era um jovem alegre e sociável, que gostava de conviver com outras pessoas e de frequentar espaços públicos.

_ Desde as intervenções da R., passou a evitar sair, conviver com outras pessoas e estabelecer novos relacionamentos, o que lhe causa grande desgosto.

_ Quantifica os danos morais em quantia não inferior a € 30.000,00.

_ Tem ainda direito a ser compensado pela perda de rendimentos do trabalho em consequência das mais de 120 horas gastas com as intervenções da ré: o autor exercia a actividade de operador de linha, auferindo em média um salário líquido mensal de €1.000,00, ou seja, cerca de €6 por hora de trabalho; as 120 horas gastas com as intervenções da ré, incluindo tempos de espera no consultório e com deslocações à Clínica traduzem-se num prejuízo de cerca de €720,00, que a R. deverá ser condenada a indemnizar.

_ As referidas intervenções obrigaram ainda o A. a fazer cerca de 1920 Km de deslocações, entre a sua residência, em ..., Vagos, e a clínica da R., em Aveiro e de regresso, no que despendeu cerca de €768,00, valor pelo qual a R. deverá ser condenada a compensar o A.

_ Estes prejuízos são devidos à imperícia dos colaboradores da R., que se mostraram incapazes de realizar, com sucesso, os tratamentos que esta se obrigou a realizar, ao A.

I.1_ Citada, a ré “A..., Lda” contestou.

Apresentou defesa por excepção, invocando a sua ilegitimidade processual para a presente acção, porquanto:

_ o acto médico praticado pela Dr.ª BB, foi prestado no âmbito da relação médico-paciente e sob a égide dos princípios da independência técnica e deontológica do médico; da independência, da isenção e liberdade profissionais e da liberdade de escolha dos meios de diagnóstico e tratamento que lhes assiste. Trata-se de um contrato pessoal (intuitu personae), de execução continuada, oneroso e com natureza civil .

_ O serviço médico foi prestado no âmbito dum contrato dividido, assumindo a ré obrigações organizacionais, enquanto titular dum estabelecimento de prestação de cuidados de saúde, nomeadamente os relativos aos recursos humanos com enfermagem, assistentes de consultório, empregadas de limpeza; etc, bem como os deveres respeitantes aos equipamentos e meios de cura e diagnóstico disponibilizados.

_O acto médico foi prestado directa e autonomamente pela médica em causa.

_ Neste cenário, a clínica responde pelas prestações de assistência clínica tais como preparação das instalações e equipamentos, contratação e disponibilização de assistentes e ajudantes da equipa médica, ou seja, o titular da clínica responde pelos comportamentos dos seus órgãos, representantes e auxiliares (artigo 800º CC); o médico responde pelas prestações próprias da natureza do acto médico prestado, no caso do seu eventual incumprimento.

_ A médica que atendeu o autor não tem qualquer vínculo de subordinação à ré, pelo que é aquela, e não esta, que responde pelo acto médico prestado.

Concluiu, invocando a ilegitimidade processual e a ilegitimidade substantiva, nos termos do artigo 30º do CPC e com tais fundamentos, pediu a sua absolvição da instância.

Subsidiariamente, invoca a excepção de preterição de litisconsórcio necessário porquanto:

_ Não foi demandada a médica dentista prestadora do acto médico, considerando que o autor invoca um putativo incumprimento ou cumprimento defeituoso da obrigação contratual emergente da prestação do serviço médico-dentário.

_ O autor circunscreve a alegada responsabilidade ao acto médico tout court, não colocando em causa qualquer juízo de censurabilidade sob a vertente organizacional, essa na dependência directa e dominal da ré.

_ a responsabilidade obrigacional emergente do acto lesivo é obrigatoriamente de conjunção. Do confronto do artigo 512º do Código Civil com o disposto nos artigos 497º e 507º do Código Civil, resulta que nas obrigações civis resultantes de responsabilidade contratual em que haja pluralidade de devedores, a regra geral é a de conjunção: cada um dos obrigados responde para com o credor por uma parte proporcional da prestação, se o contrário não estiver estipulado entre as parte, nem resultar da lei. Diversamente, na responsabilidade que tem por fonte um acto mercantil, a regra, havendo pluralidade de sujeitos passivos, é a da solidariedade, também salvo estipulação contrária – artigo 100º Código Comercial.

_ Estando em causa uma obrigação de natureza civil no âmbito da responsabilidade contratual, impõe-se a conjunção dos putativos devedores para apurar e aferir a quota de responsabilidade que caberá a cada um.

Apresentou, ainda, defesa por impugnação, alegando que no primeiro dia em que entrou na Clínica da ré, o autor apresentava um cenário bucal de visível agenesia e hipodontia, resvalando quase para uma situação clínica de oligodontia, desconhecendo a causa de tal deficiência e há quanto tempo permanecia neste cenário clínico. Apresentou a sua versão dos factos, descrevendo quais os tratamentos realizados e a razão pela qual os parafusos dos implantes partiram, os trabalhos feitos nessa sequência e as faltas que aquele deu, às consultas agendadas.

Concluiu que existindo um insucesso para o caso, o mesmo ficou a dever-se ao comportamento do A., quer ostentando uma má higiene oral, quer por não se ter munido dos cuidados na alimentação, quer pelo traumatismo que infligiu a si próprio num acidente doméstico com a sua filha, quer pela flagrante falta de assiduidade às consultas, comprometendo a boa execução do tratamento. E mesmo, quando a R., no fôlego de boa-fé, aceitou reabilitar o tratamento ao A., este desapareceu da Clínica, faltando injustificadamente à realização da TAC, por 3 vezes, não mais dando notícias. Quer na génese do tratamento, quer durante a sua execução, o

paciente foi sempre cabal, expressa e plenamente informado de todo o processo clínico, nomeadamente, tempo de duração, fase de adaptação, cuidados especiais, higiene, assiduidade, remoção temporária, contenção e estabilidade, como aliás, está de forma competentíssima vazado a escrito na ficha clínica pessoal do paciente, onde se relata, passu a passu, a súmula de cada consulta prestada e evolução do tratamento.

As leges artis, in casu, foram, escrupulosamente, cumpridas e respeitadas, não se desviando um milímetro que fosse do plano de tratamento traçado, obedecendo-se, ainda, na sua execução, às instruções do próprio paciente, nomeadamente, quanto à invocada necessidade de extracção de dentes para facilitar o êxito final do tratamento, e que este anuiu.

Concluiu que inexiste qualquer dano cuja responsabilidade, ou nexo causal, seja imputável à conduta da R., pelo que está votada ao decesso qualquer pretensão ressarcitória do A.

Deduziu o incidente de intervenção principal provocada, nos termos do artigo 316º, nº1, do Código de Processo Civil, da seguradora denominada “B..., S.A.”, para a qual transferiu os riscos emergentes da sua actividade; e da médica-dentista que ministrou os tratamentos ao autor, nos termos do artigo 317º, nº1, do CPC, invocando o direito de regresso sobre esta, caso seja condenada.

Deduziu reconvenção contra o autor, peticionando a condenação deste no pagamento da quantia de 4.570,00 €, a título de serviços que lhe prestou na sequência do acidente doméstico sofrido pelo mesmo e no âmbito do qual foram fracturados os implantes, quantia que ainda não se mostra paga.

Alicerça a sua pretensão, alegando, em síntese, que:

_ Foram prestados ao A. os seguintes serviços: estudo de reabilitação sobre implantes com programa informático, no valor de €70,00 €; cirurgia para colocação de um implante, no valor de €800,00; cirurgia para colocação de outro implante, no valor de €800,00; regeneração óssea simultânea com colocação de implante, no valor de €450,00; regeneração óssea simultânea com colocação de outro implante, no valor de €450,00; colocação de coroa aparafusada sobre implante, no valor de €1.000,00; colocação de coroa pôntica em cerâmica, no valor de €1.000,00; perfazendo o total de €4.570,00.

_ O A. não logrou, até à presente data, liquidar esta quantia que se mantém em dívida.

Terminou, pedindo que seja julgada improcedente a presente acção, por não provada, e a sua absolvição da instância, considerando-a parte ilegítima na presente lide.

Subsidiariamente:

_requereu o chamamento, a título de intervenção principal provocada da Seguradora, para o polo passivo da demanda, como sua associada, ao abrigo do artigo 316º, n.º1, do CPC; o chamamento a título de intervenção provocada da médica-dentista, para o polo passivo da demanda, ao abrigo do artigo 317º, n.º1, do CPC, para efeitos de efectivação do direito de regresso;

_ a sua absolvição do pedido;

_ a condenação do A. a pagar-lhe a quantia de €4.570,00, a título de serviços médicos prestados.

Requereu, ainda, para efeitos de eventual impugnação da decisão que concedeu apoio judiciário, a notificação do A. para juntar aos autos o procedimento administrativo completo, composto por requerimento inicial, com cópia dos documentos eventualmente juntos, e respectiva decisão administrativa.

I.2_ O autor apresentou réplica, em 06-02-2020, pugnando pela improcedência das excepções invocadas, argumentando que procurou a ré e foi esta que apresentou os orçamentos, facturou e recebeu o preço dos tratamentos que foram por si pagos, e não a Dr.ª BB, tanto que aquela deduz reconvenção a peticionar o pagamento de parte dos maus serviços que alega ter prestado ao reconvindo. Alegou ignorar quais os acordos estabelecidos entre a Ré e a médica, sendo aquela, em qualquer caso, responsável nos termos do artigo 500º do Código Civil.

Deduziu defesa por impugnação, admitindo ter sido alertado pela Dra. BB para os cuidados de higiene que devia ter e para o facto de que não podia usar os dentes em causa para o corte de alimentos, cuidados que o A. sempre observou, lavando os dentes sempre que comia e só introduzindo na boca alimentos previamente cortados em pequenas porções; e, ainda, da necessidade de usar uma goteira oclusal, cuidado que sempre observou; nada lhe tendo sido referido quanto ao risco, maior o menor, de fractura dos parafusos.

Negou ter faltado a consultas, sem avisar previamente, o que justificou por se encontrar ansioso por remediar o aspecto ridículo e inestético que apresentava. Por motivos profissionais, apenas foi forçado a reagendar duas ou, no máximo, três consultas, uma das quais em 18.01.2019, que lhe foi antecipada para 17.01.2019, não sabendo precisar em que datas ocorreram o outro ou outros dois reagendamentos.

Rejeitou que a R., em 06.09.2016 tenha conseguido “remover a ponte”, tendo o A. permanecido com a ponte desde 02.03.2016; e os parafusos, pois permanecem colocados no Autor e quanto ao alegado no artigo 35º da contestação, admite, apenas, BB lhe comunicou que, concluídos os implantes dos dentes incisivos, iniciaria os trabalhos de reabilitação da parte posterior do maxilar superior e do maxilar inferior, como, aliás, a R. havia programado antecipadamente, razão pela qual, em 29.08.2017, apresentou-lhe o Plano/Orçamento cuja junção requereu com a réplica - documento o nº1 -, no valor de €233,00 que já se mostra pago.

Nesse articulado, referiu ignorar se foram, ou não, realizados os diversos tratamentos descritos nos artigos 36º a 42º da contestação, o que justificou por ter “pouca instrução” e por “não lhe terem sido prestadas explicações sobre o que lhe iam fazendo na boca”, tratamentos que, dada a sua localização, não podia ver; e não se recordar de ter assinado qualquer documento, nomeadamente o referido nos artigos 44º e 55º da contestação, documento que, a ter existido, só pode encontrar a sua explicação no facto da R. já prever, então, que o trabalho que realizara ia resultar mal, como resultou.

Impugnou a generalidade da factualidade alegada, contrapondo que a Dra. BB atribuiu a quebra dos parafusos à deficiência do material utilizado e, posteriormente o Dr. CC esclareceu que o material fora deficientemente aplicado, “em ângulo incorrecto” e que a reabilitação da boca do Reconvindo deveria ter começado pela parte posterior e não pelos dentes da frente, como aconteceu; a Dr.ª BB não tinha formação adequada na área da implantologia, sendo que a ré propôs ao autor fazer gratuitamente os trabalhos mencionados no artigo 67º da reconvenção.

Peticionou a condenação da ré como litigante de má-fé, nos termos das alíneas a), b) e d) do nº 2 do artigo 542º do Código de Processo Civil, dada a contradição entre os artigos 1º a 24º da contestação e os artigos 66º a 68º da reconvenção, em multa e em indemnização ao A., esta última a liquidar em execução de sentença, de valor correspondente ao do tempo de trabalho vier a perder com a presente lide, acrescido do valor das despesas que tiver de realizar, incluindo com honorários à sua mandatária.

I.3_ Por despacho proferido em 18-06-2020 foi admitida a intervenção principal nos autos da “B..., S.A.” e a intervenção acessória de BB.

I.4_ A interveniente principal “B..., S.A.”, actualmente “C..., S.A.”, apresentou contestação, invocando que o contrato de seguro que celebrou com a ré teve o seu início, apenas, no dia 31-07-2018, data muito posterior aos tratamentos invocados pelo autor. Como tal, não pode ser condenada no pedido deduzido pelo autor. Acrescenta que a ré só transferiu a responsabilidade extracontratual (artigo 2º das Condições Gerais da Apólice) e não, também, a contratual, que é a invocada pelo autor, na petição inicial.

Impugnou a generalidade dos factos alegados na petição inicial, alegando, entre o mais, que inexistia qualquer relação de dependência laboral entre a ré e a interveniente acessória, BB, não estando esta sujeita a qualquer espécie de subordinação laboral relativamente à primeira, às ordens ou ao poder de direcção desta. À data dos factos, a interveniente acessória apenas efectuava consultas e tratamentos e cirurgias, na clínica, em regime de prestação de serviços.

I.5_ Por despacho proferido em 29-10-2020 foi ordenada a alteração da denominação da interveniente B..., para C..., S.A.

I.6_ Em 12-11-2020, a interveniente acessória BB apresentou contestação.

Nesse articulado, alegou, em síntese, que:

_ O autor não a procurou para resolver o seu problema dentário, mas sim a Clínica ré. Nessa clínica, a interveniente acessória colaborava, a par de outros médicos da mesma especialidade, e prestava, em horários pré-definidos, os procedimentos clínicos que lhe eram marcados por essa mesma clínica. Tanto assim é que encontrando-se a interveniente acessória ausente da Clínica Ré, no dia 28.01.2016, não deixou o autor de ser atendido, nessa mesma clínica, pelo Dr. CC. O mesmo sucedeu quando deixou de colaborar com a clínica Ré, passando o Autor a ser seguido pelo Dr. CC. Não celebrou qualquer contrato com o autor, pelo que, em relação a si, o pedido deduzido só pode ter por fonte a responsabilidade civil extracontratual, estando prescrito o direito do mesmo, nos termos do artigo 498º do CC por terem decorrido mais de três anos desde o final (11/10/2016) dos tratamentos que lhe ministrou.

_ Foi realizado um exame radiográfico (ortopantomografia) e feito um estudo para averiguar as condições para a colocação dos implantes dentários, tendo sido por si apresentado e explicado, ao Autor, um plano terapêutico que contemplava: a colocação de implantes dentários a nível antero-superior (dois implantes nas posições dos dentes 12 e 22, mais uma ponte fixa implanto suportada de quatro dentes, mais a exodontia do dente 11, incisivo central superior direito, para uma melhor reabilitação protética da área em causa; a colocação de implantes nas zonas posteriores.

_ O autor foi devidamente informado da necessidade de reabilitação protética das zonas posteriores e advertido que, caso não tivesse condições para colocar implantes dentários, a solução seria a colocação de prótese parcial removível, a fim de dar suporte à reabilitação efectuada no sector anterior. Pese embora tenha sido elucidado e aconselhado a fazer um tratamento global, quer da zona antero-superior, quer nas zonas posteriores, o Autor optou por dar prioridade ao tratamento da zona antero-superior, por razões de ordem estética, preterindo as zonas posteriores por razões económicas, o que diminuiu a eficácia dos implantes.

Concluiu que observou todos os procedimentos técnico-científicos aplicáveis ao caso e respeitadas as legis artis e requereu a intervenção principal provocada da seguradora “D...

, Companhia de Seguros, S.A.”, para a qual transferiu a responsabilidade pelos danos emergentes do exercício da sua actividade.

I.7_ Por requerimento apresentado em 25/11/2020, o autor pronunciou-se sobre as excepções aduzidas pela interveniente acessória BB.

I.8_ Notificado do Relatório da Perícia Médico-Legal – Medicina Dentária, elaborado pelo INML, o autor, por requerimento de 30/7/2021, requereu que fosse solicitado ao Conselho Médico-Legal do Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses, IP, que se pronunciasse sobre a alegada violação das legis artis nos tratamentos que lhe prestados, objecto desta acção, nomeadamente respondendo aos quesitos que apresentou.

Por requerimento de 8/9/2021, C..., SA também assim procedeu.

I.9_ Por despacho proferido em 10-01-2022, foi admitida a intervenção principal provocada da seguradora “D..., Companhia de Seguros, S.A.”.

I.10_ A chamada “D..., Companhia de Seguros, S.A.” apresentou contestação, argumentando que a sua intervenção nos autos só pode ocorrer a título acessório, visto que foi chamada para se associar à interveniente acessória BB, com a qual celebrou um contrato de seguro de responsabilidade civil.

Invocou que a Dra. BB seguiu durante algum tempo o Autor apenas e só na qualidade de colaboradora da Ré, pelo que é parte ilegítima, sendo-o também na mesma medida, a ora contestante.

Invocou, também, a prescrição do direito do autor contra a interveniente acessória, nos termos do art. 498º, nº 1 do Código Civil, e impugnou os factos alegados na petição inicial.

I.11_ Em 02-03-2022, o autor pronunciou-se sobre excepção de prescrição aduzida pela interveniente “D..., Companhia de Seguros, S.A.”. Alegou, em síntese, que a responsabilidade da Dra. BB é contratual, uma vez que se baseia no acordo celebrado entre ela e a Clínica R., razão pela qual o prazo de prescrição é o previsto no artigo 309º do Código Civil, improcedendo, assim, a excepção de prescrição.

I.12_Por despacho proferido na audiência de partes, realizada em 13-10-2022, foi determinado que “a seguradora “D..., Companhia de Seguros, S.A.” assume nos autos a qualidade de parte acessória, com o estatuto de assistente da chamada BB”.

I.13_ Notificada para, querendo, se pronunciar sobre a excepção invocada pela “B..., S.A.”, actualmente “C..., S.A.”, a ré (cf. requerimento de 24-10-2022 aceitou que o contrato de seguro junto aos autos teve o seu termo inicial de vigência a partir das 00:00 horas do dia 31.07.2018. Relativamente à circunstância de os tratamentos ministrados ao autor possuírem data anterior à celebração do contrato de seguro celebrado entre ambas, sustenta que não se logra fixar num determinado momento histórico-temporal o facto gerador do sinistro visto que o acto médico sindicado foi continuado no tempo, não se tendo esgotado nos anos anteriores ao do início da vigência temporal do contrato de seguro, antes, havendo plúrimos actos praticados em data posterior a 31.07.2018, estendendo-se até 2019, numa lógica de tratamento médico uno e contínuo. Tanto assim é que o próprio A. vem impetrar a resolução contratual somente em 18.10.2019, pelo que o contrato de prestação de serviços se encontrava em vigor, à data do contrato de seguro em causa, convocando, ainda, a ocorrência dos danos na pendência da vigência do contrato de seguro. Perspectivando a delimitação temporal da cobertura da apólice de seguro pelo momento da reclamação, também, apodicticamente, se aporta à conclusão que foi na vigência do contrato de seguro, pois, a reclamação data de 18.10.2019.

Termina, pedindo que seja julgada improcedente a excepção.

I.14_ Em 12/12/2022, foi admitida a reconvenção, deduzida pela ré A...,LDA..

Foi fixada à presente acção o valor de 39.196,00€ (trinta e nove mil cento e noventa e seis euros).

Foi proferido despacho saneador, no qual foi julgada improcedente a ilegitimidade processual da ré “A..., Lda.” e prejudicada a excepção de ilegitimidade da interveniente “D..., Companhia de Seguros, S.A.”, face ao despacho proferido em 13-10-2022, que considerou esta é interveniente acessória e não principal, nestes autos.

Sobre a excepção de prescrição, invocada pelas intervenientes acessórias BB e “D..., Companhia de Seguros, S.A.”, foi decidido que extravasava o âmbito de intervenção das intervenientes por não respeitar à eventual acção de regresso entre a ré e aquela.

Foi fixado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.

I.20_ Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, constando do dispositivo:

Por tudo o exposto decide-se:

A) julgar a acção parcialmente procedente e, em conformidade:

A1) declarar resolvido o contrato (de prestação de serviços médicos dentários) celebrado entre o autor AA e a ré “A..., Lda.”;

A2) CONDENAR a ré “A..., Lda.” a restituir ao autor a quantia de 3.138,00 € (três mil cento e trinta e oito euros), acrescida de juros de mora vencidos desde 22-10-2019 e de juros vincendos, até integral pagamento, calculados à taxa supletiva civil para os juros civis;

A3) CONDENAR a ré “A..., Lda.” a pagar ao autor as quantias de:

_ 155,04 € (cento e cinquenta e cinco euros e quatro cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos desde 22-10-2019 e de juros vincendos, até integral pagamento, calculados à taxa supletiva civil para os juros civis;

_ e de 7.500,00 € (sete mil e quinhentos euros), acrescida de juros de mora vincendos, desde a presente data e até integral pagamento, calculados à taxa supletiva civil para os juros civis, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e morais sofridos em consequência das intervenções/tratamentos realizados;

A4) ABSOLVER a ré do demais peticionado;

A5) ABSOLVER a chamada “C..., S.A.” de todos os pedidos deduzidos;

B) julgar a reconvenção totalmente improcedente e, em conformidade, ABSOLVER o autor/reconvindo do pedido deduzido pela ré/reconvinte “A..., Lda.”;

C) julgar o incidente de litigância de má-fé deduzido pelo autor/reconvindo totalmente improcedente e, em conformidade, ABSOLVER a ré/reconvinte do pedido de condenação em multa e em indemnização.


*

Custas pelo autor e pela ré, na proporção dos respectivos decaimentos, que se fixa em 60% para aquele e 40% para esta, sem prejuízo da protecção jurídica de que beneficia o primeiro - artigo 527º do Código de Processo Civil.

*

Registe e notifique.”.

I.21_ Inconformada, a ré “A..., Lda.” interpôs recurso da sentença, formulando as seguintes conclusões:

(…)

I.22_ Inconformada a interveniente acessória BB interpôs recurso da sentença, formulando as seguintes conclusões:

(…)

I.23_ Notificado, o Autor apresentou resposta, pugnando pela improcedência de ambos os recursos.

I.24_ A recorrida/interveniente principal C..., S.A. apresentou resposta relativamente ao recurso interposto pela Ré A..., LDA, quanto ao segmento da sentença recorrida que a absolveu do pedido, pugnando pela improcedência desse recurso.

I.25_ Por despacho de 12/6/2024, foi admitido o recurso e determinada a “correcção do lapso de escrita” localizado na motivação da matéria de facto, passando a ler-se “o dia 06-01-2015”, onde consta a data de “05-01-2015” (na página 43 da sentença).

I.26_ Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – Objecto do recurso

Nos termos do disposto nos artigos 635º, nº. 4, e 639º, nºs1 e 2, do Código de Processo Civil são as conclusões das alegações de recurso que estabelecem o thema decidendum do mesmo, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso que resultem dos autos.

Assim, são as seguintes as questões a decidir:

1_ Legitimidade processual da ré A..., Lda.

2_ Preterição de litisconsórcio necessário passivo.

3_ Legitimidade substantiva da ré A..., Lda.

4_ Impugnação da decisão da matéria de facto:

4.1_ A recorrente/ré impugnou a decisão da matéria de facto por referência aos seguintes factos:
i) Facto ínsito no ponto 1) dos factos provados [1) Em consequência de um acidente de trabalho, o autor perdeu os dois dentes incisivos centrais do seu maxilar superior.”]: deve ser densificado com a indicação que o A. perdeu os dentes incisivos há pelos menos 3 ou 4 anos antes de deslocar-se à Clínica da R. [conclusões 3 e 4, apresentadas pela Ré].
ii) Facto ínsito no ponto 8) dos factos provados [“8) Decorridos doze meses sobre a colocação das coroas sobre os implantes referidos em 4.1), estas caíram.”]: mostra-se incorrectamente julgado como provado.
iii) Facto ínsito no ponto 12) dos factos provados [12) Em consequência do referido em 8), o autor permaneceu sem os quatro dentes da frente durante dezoito meses, tendo dificuldades em se alimentar e em falar, e sentindo-se vexado com a sua aparência física.”]: foi erroneamente elevado ao patamar dos factos provados.
iv) Facto ínsito no ponto 14) dos factos provados [“14) Decorridos cerca de nove meses, também as novas próteses acabaram por cair, quando o autor se encontrava a dormir”]: foi erroneamente elevado ao patamar dos factos provados.
v) Facto ínsito no ponto 15) dos factos provados [“15) ficando o autor novamente sem os quatro dentes da frente, do seu maxilar superior e com o aspecto retratado no documento 13, junto com a petição inicial.”]: foi erroneamente elevado ao patamar dos factos provados.
vi) Facto ínsito no ponto 22) dos factos provados [“22) Antes da realização dos tratamentos referidos, o autor era alegre e sociável, gostava de conviver com outras pessoas e de frequentar espaços públicos.”]: foi incorrectamente considerado provado.
vii) Facto ínsito no ponto 57) dos factos provados [“57) O autor ostentava uma má higiene oral.”]: mostra-se incompleto, devendo constar também deste ponto que “o Autor era fumador”.
viii) Facto ínsito no ponto 80) dos factos provados [“80) A fractura referida em 27) está relacionada com a ausência de dentes posteriores na maxila e mandíbula do autor, com a consequente sobrecarga dos dentes anteriores.”]: dever ser transferido para os factos não provados.
ix) Facto ínsito no ponto n) dos factos não provados [1) Em consequência de um acidente de trabalho, o autor perdeu os dois dentes incisivos centrais do seu maxilar superior.”]: dever ser transferido para os factos provados.
x) Facto ínsito no ponto r) dos factos não provados [“r) o agendamento da realização da TAC referida em 56), para os dias 29-01-2019 e 26-03-2019, tivesse sido concertado ou comunicado ao autor e que este tivesse faltado sem prestar justificação;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xi) Facto ínsito no ponto t) dos factos não provados [“t) as faltas do autor às consultas, referidas nos factos provados, tivessem comprometido a execução do tratamento;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xii) Facto ínsito no ponto u) dos factos não provados [“u) Quer no início do tratamento, quer durante a sua execução, o autor tivesse sido informado do tempo de duração do mesmo, da fase de adaptação, da importância da assiduidade, da remoção temporária, contenção e estabilidade]: deve ser transferido para os factos provados.
xiii) Facto ínsito no ponto bb) dos factos provados [bb)“quando do referido em 2) o autor tivesse sido devidamente informado e elucidado sobre a necessidade da reabilitação protética das zonas posteriores, a fim de dar suporte à reabilitação efectuada no sector anterior;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xiv) Facto ínsito no ponto cc) dos factos não provados [“cc) o autor tivesse compreendido o referido em bb) e manifestado que a sua prioridade seria a reabilitação da zona antero-superior, por razões estéticas;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xv) Facto ínsito no ponto dd) dos factos não provados [“dd) o autor tivesse comunicado à assistente, nomeadamente no dia 03-11-2014, que, por factores económicos, não pretendia a reabilitação das zonas posteriores;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xvi) Facto ínsito no ponto ee) dos factos provados [“ee) antes de 09-05-2017, a assistente tivesse informado e alertado o autor, reiteradamente, para a necessidade de um tratamento global, com reabilitação quer da zona anterior, quer da zona posterior, para que o resultado final do tratamento fosse plenamente alcançado;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xvii) Facto ínsito no ponto ff) dos factos não provados) [“ff) quando do referido em 65) (11-11-2014), a assistente tivesse instruído e motivado o autor para a necessidade de melhoria de higiene oral, que era bastante deficitária e poderia comprometer o sucesso do tratamento;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xviii) Facto ínsito no ponto gg) dos factos não provados [“gg) o autor tivesse faltado à consulta no dia 05-01-2015;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xix) Facto ínsito no ponto ii) dos factos não provados [“ii) antes do referido em 27) e em 41), a assistente tivesse comunicado ao autor e este soubesse que a não realização da reabilitação das zonas posteriores diminuía a eficácia dos implantes colocados;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xx) Facto ínsito no ponto jj) dos factos não provados [jj)“quando do referido em 2), o autor tivesse sido alertado para a importância da necessidade de reabilitar tanto a zona posterior, como a zona anterior das suas maxila e mandíbula, por forma a não comprometer o sucesso do tratamento proposto e tivesse optado por colocar, apenas, os implantes e as coroas/ponte referidas em 4.1) e 4.2);”]: deve ser transferido para os factos provados.
xxi) Facto ínsito no ponto kk) dos factos não provados [“kk) quando do referido em 75), a Dr.ª BB tivesse dito ao autor que tal era necessário para não comprometer o sucesso do tratamento na zona anterior;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xxii) Facto ínsito no ponto ll) dos factos não provados [“ll) quando do referido em 75), tivesse sido transmitido ao autor que a reabilitação da zona posterior da maxila e mandíbula, quer através da colocação de implantes, quer através da colocação de uma prótese parcial removível, solução mais económica – se mostrava essencial no conjunto do tratamento de reabilitação oral que lhe foi proposto, para salvaguarda da função mastigatória, que estava comprometida, face à ausência das indicadas peças dentárias 16, 35, 36 e 46, evitando-se a sobrecarga na zona anterior; “]: deve ser transferido para os factos provados.
xxiii) Facto ínsito no ponto mm) dos factos não provados [“mm) antes de 09-05-2017 o autor tivesse sido devidamente alertado para a necessidade de reabilitar a zona posterior da maxila e mandíbula e tivesse optado por não a concretizar;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xxiv) Facto ínsito no ponto nn) dos factos não provados [“nn) os implantes e as coroas referidos em 4.1) e 11) tivessem sido colocados de forma e na posição correctas;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xxv) Facto ínsito no ponto oo) dos factos não provados [“oo) o referido em 57) tivesse condicionado o sucesso clínico dos actos médicos praticados pela interveniente BB.;”]: deve ser transferido para os factos provados.

4.2_A recorrente/interveniente acessória BB impugnou a decisão da matéria de facto por referência aos seguintes factos:
i) Factos ínsitos no ponto 22 dos factos provados [22) “Antes da realização dos tratamentos referidos, o autor era alegre e sociável, gostava de conviver com outras pessoas e de frequentar espaços públicos”.]: devem ser transferidos para os factos não provados [conclusões 4,5 e 6, apresentadas pela interveniente acessória BB].
ii) Factos ínsitos no ponto 80 dos factos provados [“80) A fractura referida em 27) está relacionada com a ausência de dentes posteriores na maxila e mandíbula do autor, com a consequente sobrecarga dos dentes anteriores.”.]: devem ser transferidos para os factos não provados [conclusões 8 a 24, apresentadas pela interveniente acessória BB].
iii) Factos ínsitos no ponto n) dos factos não provados [“n) a fractura referida em 27) tivesse sido provocada por uma pancada com um tablet, desferida ao autor, na zona da ponte, pela filha do mesmo, quando estava na cama dos pais.”.]: devem ser transferidos para os factos provados [conclusões 26 a 28, apresentadas pela interveniente acessória BB].
iv) Factos ínsitos no ponto t) dos factos não provados [“t) as faltas do autor às consultas, referidas nos factos provados, tivessem comprometido a execução do tratamento.”.]:devem ser transferidos para os factos provados [conclusões 29 a 33, apresentadas pela interveniente acessória BB].
v) Factos ínsitos no ponto bb) dos factos não provados [“bb) quando do referido em 2) o autor tivesse sido devidamente informado e elucidado sobre a necessidade da reabilitação protética das zonas posteriores, a fim de dar suporte à reabilitação efectuada no sector anterior.”]: devem ser transferidos para os factos provados [conclusões 35 a 42, apresentadas pela interveniente acessória BB].
vi) Factos ínsitos nos pontos ii) [“ii) Antes do referido em 27) e em 41), a assistente tivesse comunicado ao autor e este soubesse que a não realização da reabilitação das zonas posteriores diminuía a eficácia dos implantes colocados.”], jj) [“jj) quando do referido em 2), o autor tivesse sido alertado para a importância da necessidade de reabilitar tanto a zona posterior, como a zona anterior das suas maxila e mandíbula, por forma a não comprometer o sucesso do tratamento proposto e tivesse optado por colocar, apenas, os implantes e as coroas/ponte referidas em 4.1) e 4.2).”], kk) [“kk) quando do referido em 75), a Dr.ª BB tivesse dito ao autor que tal era necessário para não comprometer o sucesso do tratamento na zona anterior.”] e mm) [“mm) antes de 09-05-2017 o autor tivesse sido devidamente alertado para a necessidade de reabilitar a zona posterior da maxila e mandíbula e tivesse optado por não a concretizar.”], dos factos não provados: devem ser transferidos para os factos provados [conclusões 43 a 42, apresentadas pela interveniente acessória BB].

5_ Direito do autor a resolver o contrato celebrado entre si e a ré e, em caso afirmativo, quais as consequências.

6_ Direito do autor à indemnização pelos danos morais e patrimoniais, sofridos em consequência das intervenções/tratamentos realizados pela ré.

7_ Direito de crédito da ré A..., Lda sobre o autor, no valor de €4.750,00.

8_ Âmbito do contrato de seguro celebrado entre a ré A..., Lda e a interveniente principal “C..., S.A.”: a responsabilidade civil contratual da ré encontra-se abrangida nesse contrato de seguro e, em caso afirmativo, quais as consequências.

9_ Litigância de má-fé da ré.

III _ Fundamentação de facto

Pelo Tribunal a quo foram considerados os seguintes factos:

“A. Factos Provados

Com relevo para a decisão da causa[1], provou-se que:

(da petição inicial)

1) Em consequência de um acidente de trabalho, o autor perdeu os dois dentes incisivos centrais do seu maxilar superior.

2) No dia 30 de Setembro de 2014, o autor dirigiu-se à clínica da ré “A..., Lda.”, sita na Avenida ..., em Aveiro, para averiguar a possibilidade de colocação de prótese fixa e definitiva que substituísse os referidos dentes perdidos.

3) Na referida clínica, o autor foi observado pela médica dentista Dra. BB.

4) Após a realização de raio-x aos maxilares superior e inferior do autor, a ré, por intermédio da Dra. BB, propôs ao autor a realização dos seguintes tratamentos:

4.1) colocação de implantes nos dentes 12 e 22, com coroas pilares aparafusadas sobre os mesmos;

4.2) colocação de coroas pôntico cerâmicas nos dentes 11 e 21;

4.3) colocação de implantes nos dentes 16 e 17, com coroas aparafusadas sobre os mesmos;

4.4) restauração dos dentes 13, 24, 37 e 47;

4.5) extracção do dente 11;

4.6) extracção do dente 17;

4.7) destartarização bimaxilar, raspagem e alisamento radicular;

4.8) colocação de implantes nos dentes 35, 36 e 46, com coroas aparafusadas sobre os mesmos,

5) (…) referindo que a colocação de implantes que substituíssem os dois dentes incisivos centrais, em falta no seu maxilar superior, exigia a prévia extracção do dente 11, que ladeava um daqueles.

6) O autor aceitou realizar os tratamentos referidos em 4.1), 4.2), 4.4) e 4.5).

7) No âmbito do acordo assim celebrado, o autor foi submetido, nomeadamente, aos seguintes tratamentos, cujo preço pagou à ré:

7.1) estudo de reabilitação sobre implantes com programa informático, objecto da factura-recibo datada de 30-09-2014, no valor 33,00 €;

7.2) restauração directa definitiva em resina composta de três faces do dente 37, objecto da factura- recibo datada de 18-10-2014, no valor de 34,00 €;

7.3) cirurgia para colocação de dois implantes, regeneração óssea simultânea e estudo de reabilitação sobre implantes com programa informático, objecto das facturas-recibos datadas de 11-11-2014, nos valores de 1.450,00€ e de 33,00 €;

7.4) restauração directa definitiva em resina composta de três faces do dente 13, objecto da factura-recibo datada de 15-12-2014, no valor de 34,00 €;

7.5) restauração directa definitiva em resina composta de três faces do dente 47, objecto da factura-recibo datada de 20-01-2015, no valor de 34,00 €;

7.6) colocação de coroa aparafusada sobre implante e de coroa pôntico cerâmica, nos dentes 11, 21 e 22, objecto das facturas-recibos datadas de 17-02-2015 e de 30-03-2025, no valor de 743,00 cada uma;

7.7) colocação de coroa pilar aparafusada sobre implante nos dentes 11 e 22 e de coroa pôntico cerâmica nos dentes 11 e 21, objecto da factura-recibo datada de 30-03-2015, no valor de 743,00 €;

7.8) restauração directa em resina composta de três faces do dente 47, objecto da factura-recibo datada de 11-10-2016, no valor de 34,00 €;

8) Decorridos doze meses sobre a colocação das coroas sobre os implantes referidos em 4.1), estas caíram.

9) A ré, por intermédio da Dra. BB, tentou remover os parafusos que implantara no maxilar do autor, sem o conseguir,

10) (…) intervenções que causaram dor e incómodos ao autor.

11) A Dr.ª BB optou por submeter o autor a nova cirurgia para colocação de novos implantes, nos dentes 11 e 21, com colocação de novos parafusos para suporte de coroas, sem remoção dos parafusos colocados nos implantes 12 e 22.

12) Em consequência do referido em 8), o autor permaneceu sem os quatro dentes da frente durante dezoito meses, tendo dificuldades em se alimentar e em falar, e sentindo-se vexado com a sua aparência física.

13) No dia 11-12-2017 a ré colocou no autor duas novas coroas pilar aparafusadas sobre os implantes em 11 e 21, e duas novas coroas pôntico cerâmicas.

14) Decorridos cerca de nove meses, também as novas próteses acabaram por cair, quando o autor se encontrava a dormir;

15) Ficando o autor novamente sem os quatro dentes da frente, do seu maxilar superior e com o aspecto retratado no documento 13 junto com a petição inicial.

16) Após a Dr.ª BB ter deixado de exercer funções na ré, o autor foi atendido, no dia 17-01-2019, pelo Dr. CC, que aí exercia a actividade de médico dentista.

17) O autor não pretende que a ré lhe extraia mais dentes, nem que lhe coloque mais implantes.

18) O autor permitiu que a Dr.ª BB extraísse o dente 11, em virtude de esta ter garantido que tal era necessário para colocar implantes para substituição dos dois dentes da frente.

19) O autor continua sem os quatro dentes da frente, os três que tinha em falta e o que a Dr.ª BB lhe extraiu, para colocar próteses fixas definitivas nos mesmos;

20) O que lhe causa dificuldades na alimentação e de dicção e o faz sentir envergonhado e humilhado.

21) O autor nasceu em 27-07-1983.

22) Antes da realização dos tratamentos referidos, o autor era alegre e sociável, gostava de conviver com outras pessoas e de frequentar espaços públicos.

23) Desde o referido em 8) o autor passou a evitar sair, conviver com outras pessoas e estabelecer novos relacionamentos, o que lhe causa grande desgosto.

24) Quando do referido em 2), o autor auferia um salário mensal de cerca 1.000,00 €.

25) Os tratamentos realizados na clínica da ré obrigaram o autor a fazer cerca de 760 quilómetros de deslocações, entre a sua residência, em ..., Vagos e a clínica da ré, em Aveiro.


*

(Da contestação da ré e depoimento de parte do autor)

26) Quando do referido em 2), o autor tinha em falta três dentes incisivos do maxilar superior: o 12, o 21 e o 22.

27) O referido em 8) ocorreu por fractura dos parafusos da ponte colocada, que sustentavam/fixavam a mesma aos implantes dentários.

28) A ponte com os quatro dentes, sendo dois implantes, foi colocada no dia 30-03-2015.

29) Em 28-01-2016 foi efectuado um aperto das coroas da ponte e o autor foi alertado para a necessidade de ter maior cuidado de higiene oral.

30) Após o referido em 8), a Dr.ª BB procurou proceder à remoção da parte dos parafusos que se encontrava dentro dos implantes, o que não conseguiu.

31) Foi requerido um kit de remoção de parafuso da Biotech para efectuar nova tentativa.

32) Em 03-05-2016 procedeu-se ao desgaste dos parafusos fracturados nos implantes dos dentes 12 e 22, sem se ter conseguido desgastar na totalidade.

33) Em 24-05-2016 procedeu-se ao desgaste do parafuso 12, sem se conseguir remover os parafusos fracturados.

34) O autor faltou sem avisar às consultas marcadas para os dias 27-06-2016 e 19-07-2016.

35) Em 06-09-2016 foi removida a ponte superior por os parafusos já não apertarem.

36) Em 12-12-2016 foram feitas impressões para a colocação de parafusos mais curtos nos implantes 12 e 22.

37) Em 03-01-2017 o autor faltou à consulta sem avisar.

38) Em 07-02-2017 foi colocada a ponte antero-superior aparafusada com dois parafusos protéticos mais curtos, sendo o autor avisado de que a retenção da ponte estava diminuída.

39) Em 28-03-2017, com a concordância do autor, decidiu-se colocar dois implantes na posição dos dentes 11 e 21, manter infra ósseos os implantes 12 e 22 e fazer nova ponte fixa de quatro elementos.

40) Em 18-04-2017 efectuou-se cirurgia para colocação dos implantes 11 e 21.

41) Em 09-05-2017 a Dr.ª BB avisou o paciente para a necessidade de reabilitação protética do maxilar inferior e do superior, a nível posterior.

42) Em 01-08-2017 foram feitas impressões para ponte de quatro elementos pônticos dos dentes 12 e 22 e foi dito ao autor, várias vezes, que tinha que ter cuidado com a alimentação, por existir grande risco de fractura dos parafusos.

43) Em 29-08-2017 efectuou-se a restauração dos dentes 33, 34 e 37 em resina, para subida da mordida.

44) Em 04-09-2017 efectuou-se a restauração dos dentes 43, 44, e 45, em resina, para subida da mordida e foram efectuados moldes para prótese esquelética inferior de três dentes.

45) Em 03-10-2017 colocou-se a prótese esquelética inferior de três dentes.

46) Em 13-11-2017 foi realizada a prova de metal da ponte superior.

47) Em 11-12-2017 foi efectuada a colocação da ponte aparafusada aos implantes 11 e 21, suspensa aos dentes 22 e 12. Dada a oclusão do paciente, projecção vestibular do maxilar superior com mordida funda, o autor foi aconselhado a ter cuidado com a alimentação, a não fazer uso destes dentes para corte dos alimentos (têm só efeito estético), pois existia grande risco de fractura dos parafusos protéticos, nem fazer movimentos de tracção. Foi aconselhado, ainda, a usar goteira oclusal para prevenir acidentes de bruxismo e da reabilitação protética superior.

48) Mais para o fim do tratamento, a Dr.ª BB aconselhou o autor a utilizar goteira, mas ficou complicado porque andava sempre a cair a ponte; o autor não chegou a usar a goteira.

49) As recomendações referidas em 47) foram lidas ao autor, pela Dr.ª BB, tendo ambos assinado o respectivo texto.

50) Em 04-09-2018, os pilares da ponte descimentaram; a prótese foi para o laboratório para conserto.

51) Em 24-09-2018 foram efectuadas impressões à cabeça dos implantes com silicone, para conserto da ponte superior.

52) Em 02-10-2018 colocou-se a ponte fixa.

53) O autor faltou à consulta agendada para o dia 03-01-2017, sem avisar.

54) O autor reagendou a consulta do dia 18-01-2019, para o dia 17-01-2019.

55) Em 17-01-2019 o autor foi consultado pelo Dr. CC; foi realizada uma ortopantomografia e prescrita uma TAC dental superior e inferior, para posterior diagnóstico de provável reabilitação com implantes.

56) A realização da TAC foi agendada para o dia 22-01-2019, tendo o autor faltado.

57) O autor ostentava uma má higiene oral.

58) Após a fractura referida em 27), a ré prestou ao autor os seguintes serviços:

58.1) estudo de reabilitação sobre implantes com programa informático, no valor de 70,00 €;

58.2) cirurgia para colocação de um implante, no valor de 800,00 €;

58.3) cirurgia para colocação de outro implante, no valor de 800,00 €;

58.4) regeneração óssea simultânea com colocação de implante, no valor de 450,00 €;

58.5) regeneração óssea simultânea com colocação de outro implante, no valor de 450,00 €;

58.6) colocação de coroa aparafusada sobre implante, no valor de 1.000,00 €;

58.7) colocação de coroa pôntica em cerâmica, no valor de 1.000,00 €.


*

(Da réplica)

59) Os orçamentos referentes aos tratamentos referidos em 4), que foram apresentados ao autor, foram emitidos em nome da ré.

60) Foi a ré quem emitiu as facturas/recibos referentes aos tratamentos realizados pelo autor e quem recebeu os respectivos pagamentos, efectuados por este.

61) O autor não pagou à ré as quantias referidas em 58), em virtude de a ré, através da Dr.ª BB, se ter proposto executar esses tratamentos gratuitamente, por força do referido em 8) e 27).

62) A ponte referida em 28) caiu no dia 02-03-2016 e a nova ponte foi colocada em 11-12-2017.


*

(Da contestação da assistente Dr.ª BB)

63) A assistente BB executava, em horários pré-definidos, os actos médicos/clínicos que lhe eram marcados pela ré, aos pacientes que procuravam esta última.

64) No dia 28-01-2016 o autor foi atendido por outro médico, em virtude de a assistente se encontrar ausente da clínica da ré.

65) No dia 11-11-2014 foi feita a colocação dos dois implantes antero-superiores na posição dos dentes 12 e 22.

66) No dia 02-12-2014 o autor desmarcou a consulta que tinha agendada para aquele dia.

67) No dia 17-02-2015, foi efectuado o molde em silicone para a ponte fixa antero-superior de 4 elementos.

68) No dia 30-03-2015, a ponte fixa antero-superior de quatro elementos foi colocada na boca do autor.

69) Em 11-12-2017 a assistente alertou o autor para os cuidados a ter com os implantes, fez recomendações sobre o modo de cortar os alimentos, sobre os cuidados de higiene a adoptar, sobre o modo de usar os implantes, uma vez que estes teriam apenas um efeito estético e não a função de uns dentes incisivos naturais.


*

(Da contestação da chamada “C...” e depoimentos de parte da assistente e do autor)

70) Quando do referido em 2), a Dr.ª BB prestava serviços nas instalações da ré “A..., Lda.” ao abrigo de um contrato de prestação de serviços celebrado entre si e a sociedade “BB Unipessoal, Lda.” e posteriormente, com a sociedade "E...".

71) As sociedades através das quais a assistente prestava serviços à ré, emitiam recibos a esta última, relativamente aos serviços por esta prestados.

72) Havia critérios de uniformização na clínica da ré, por exemplo, quanto às tabelas usadas, sendo a Dr.ª BB que definia os tratamentos a ministrar aos pacientes, com total autonomia.

73) A Dr.ª BB decidiu o aconselhamento e o plano do aqui autor, sem ter de prestar contas ou submeter o mesmo à apreciação/aprovação da ré.

74) Quando do referido em 2), o autor tinha em falta sete dentes.

75) Quando do referido em 2), a Dr.ª BB aconselhou o autor a colocar uma prótese parcial removível na zona posterior, caso o mesmo decidisse não colocar implantes nessa zona.

76) Nos dias 09-05-2017 e 11-12-2017 a ré alertou o autor para a necessidade de reabilitação protética do maxilar inferior e do superior a nível posterior.

77) Os dentes posteriores são fundamentais no equilíbrio do sistema mastigatório.

78) A ausência de vários dentes posteriores, por parte do autor, leva a graves deficiências na mastigação de alimentos e implica uma sobrecarga sobre os dentes da frente, onde se passa a gerar uma força e um esforço acrescidos, que os mesmos não deveriam suportar.

79) E gera uma tendência de diminuição da dimensão vertical de oclusão, levando a um fechamento anterior da mandíbula e uma carga oclusão excessiva que igualmente afecta os dentes anteriores, fragilizando-os.

80) A fractura referida em 27) está relacionada com a ausência de dentes posteriores na maxila e mandíbula do autor, com a consequente sobrecarga dos dentes anteriores.

81) Por acordo celebrado entre a ré “A..., Lda.” e a chamada “B..., S.A.”, actualmente “C..., S.A.”, documentado na apólice n.º ... (junta aos autos em 16-09-2020, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido), aquela transferiu para esta a responsabilidade pelos riscos e danos emergentes do exercício da sua actividade profissional, com as seguintes coberturas:

81.1) Responsabilidade Civil Exploração, com o capital máximo de 50.000,00€ por sinistro e anuidade, independentemente do número de lesados e sem prejuízo dos sub-limites de capital expressamente previstos nas Condições Particulares da Apólice;

81.2) Responsabilidade Civil Profissional, com o capital máximo de 125.000,00€.

82) O acordo referido em 81) iniciou-se às 00h00m do dia 31-07-2018.

83) O acordo referido em 81) foi celebrado com base na proposta datada de 23-07-2018, apresentada pela ré à chamada no dia 30-07-2018.

84) Das condições gerais do acordo referido em 81), intituladas de “Apólice de Seguro de Responsabilidade Civil Empresas de Saúde”, consta, além do mais:

Artigo 1º

«c) SEGURADO: A pessoa singular ou colectiva cuja responsabilidade civil se garante, nos termos do presente contrato de seguro.

d) TERCEIRO LESADOS: A pessoa singular ou colectiva que, em consequência de um sinistro coberto pelo presente Contrato de seguro, sofra lesões que originem danos susceptíveis de, nos termos da lei civil e deste contrato, serem reparados ou indemnizados;

(…)

k) RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL: Entende-se por responsabilidade civil contratual, a responsabilidade proveniente da falta de cumprimento das obrigações emergentes de contratos, de negócios jurídicos unilaterais ou da lei;

l) RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL: Entende-se por responsabilidade civil extracontratual, a responsabilidade resultante da violação de direitos absolutos ou da prática de certos atos que, embora lícitos, causam prejuízos a outrem;

m) SINISTRO: O evento danoso, pelo qual possa ser imputada responsabilidade ao Segurado nos termos da lei civil, e que seja suscetível de reparação ou indemnização no âmbito do presente Contrato de seguro;

(…)

q) LESÃO CORPORAL: Ofensa que afete a saúde ou integridade física ou mental de um terceiro, provocando um dano;

(…)

s) DANO PATRIMONIAL: Prejuízo que, sendo suscetível de avaliação pecuniária, deve ser reparado ou indemnizado;

t) DANO NÃO PATRIMONIAL: Prejuízo que, não sendo suscetível de avaliação pecuniária, deve, no entanto, ser compensado através de uma obrigação pecuniária;»

Artigo 2.º:

«O presente Contrato tem por objeto a garantia de responsabilidade civil extracontratual que, nos termos da lei civil, seja imputável ao Segurado, através do pagamento das indemnizações que legalmente lhe sejam exigíveis pelos danos patrimoniais e/ou não patrimoniais exclusivamente resultantes de lesões corporais e/ou materiais por este causadas involuntariamente a terceiros, directamente resultantes de qualidade, ou situação jurídica, ou exercício de atividade ou profissão, expressamente constante das Condições Particulares da Apólice.»

Artigo 4.º

«1. Nos termos das demais disposições contratuais, fica coberta pela Apólice a responsabilidade civil imputável ao Segurado por factos geradores de responsabilidade civil ocorridos e reclamados durante a vigência do contrato.

2. As reclamações pelos factos indicados no número anterior, desde que desconhecidas das partes à data da cessação do contrato, podem ainda ser apresentadas até 1 ano após a data de cessação da sua vigência. Para este efeito considera-se reclamação a comunicação dos factos ao Segurador pelo lesado, por correio registado ou outro meio de que fique registo escrito, ou a notificação ao Segurador por entidade administrativa ou judicial.

3. Ficam, porém, excluídas as reclamações apresentadas após a data da cessação do contrato se o risco estiver coberto por contrato de seguro posterior.

4. Em qualquer caso, ficam excluídas quaisquer reclamações por factos ocorridos anteriormente ou posteriormente ao período de vigência do contrato, estejam ou não abrangidos por outra Apólice.

artigo 5.º:

“1.1 O presente Contrato não garante a responsabilidade pelos danos:

a) resultantes de atos ou omissões dolosos do Segurado e/ou do Tomador do Seguro, seus representantes, trabalhadores, mandatários e outros prestadores de serviços, auxiliares ou comissários e bem assim de pessoas por quem o Segurado e/ou o Tomador sejam civilmente responsáveis;

(…)

o) que não resultem diretamente de lesão causada pelo Segurado, seja lesão material, seja lesão corporal, nomeadamente lucros cessantes, paralisações ou outras perdas indiretas de qualquer natureza;

1.2 Ficam também excluídas as reclamações que se fundamentem em obrigações contratuais do Segurado.»

85) Consta da condição especial intitulada de “Responsabilidade Civil Profissional – Empresas de Saúde”, do acordo referido em 81), que:

Artigo 1º

«1. Pela presente Condição Especial fica garantida, até aos limites estipulados nesta Condição Especial e/ou nas Condições Particulares, a Responsabilidade Civil Extracontratual que, ao abrigo da lei civil, seja imputável ao Segurado, através do pagamento das indemnizações que legalmente lhe sejam exigíveis pelos danos patrimoniais e/ou não patrimoniais resultantes de lesões corporais e/ou materiais por este causadas a Terceiros, em consequência do exercício e exploração da actividade indicada no número seguinte.

2. Atividade segura: Conforme descrição nas Condições Particulares.

3. Mantém-se, na parte em que não se oponha às disposições desta Condição Especial, que prevalecerão, o estabelecido nas Condições Gerais do Seguro de Responsabilidade Civil Empresas de Saúde.

4. Ficam, assim, garantidos no objeto do presente Contrato de seguro:

a) Os danos resultantes da atuação dos profissionais de saúde (trabalhadores e/ou prestadores de serviços) do Segurado, no desempenho das suas funções e enquanto ao serviço daquele, desde que identificados na proposta que serviu de base à emissão do presente Contrato;

b) Responsabilidade Civil Exploração: da posse ou utilização dos edifícios e equipamentos destinados às atividades e/ou especialidades clínicas seguras, quer o Segurado seja proprietário, arrendatário ou usufrutuário dos mesmos; da atuação dos demais trabalhadores e/ou prestadores de serviços do Segurado, não profissionais de saúde, no exercício das respetivas funções, e enquanto ao serviço daquele, desde que identificados na proposta que serviu de base à emissão do presente Contrato…”

Artigo 2º

“1. Para além das exclusões indicadas nas Condições Gerais da Apólice de Responsabilidade Civil, ficam expressamente excluídas das coberturas contratuais as reclamações pelos danos decorrentes de:

(…)

b) Obrigações contratuais que ultrapassem a Responsabilidade Civil legal;

c) Obrigação de resultados a que o Segurado se comprometa perante terceiros, nomeadamente por não ter sido conseguida a finalidade proposta na operação, intervenção ou tratamento;

(…)

f) Desempenho de atividade profissional por trabalhadores e/ou prestadores de serviços do Segurado que não possuam a habilitação ou autorização legal necessária para o efeito;

g) Atos e/ou omissões dos trabalhadores e/ou prestadores de serviços do Segurado que exorbitem as competências/funções para as quais foram contratados e que constam na proposta de seguro que serviu de base à emissão do presente Contrato;

h) Aplicação de técnicas que sejam consideradas, pela Autoridade ou Entidade competente para o efeito, inovadoras ou experimentais, ou violadoras das legis artis;

i) Utilização de substâncias ou equipamentos que devam ser objeto de qualquer seguro obrigatório de Responsabilidade Civil;

(…)

k) Serviços ou produtos prestados ou fornecidos por terceiros ainda que contratados pelo Segurado.

2. Ficam, ainda, excluídos de qualquer indemnização os danos sofridos por bens de terceiros que, por qualquer motivo (depósito, uso, transporte, manipulação ou outro), se encontrem em poder do Segurado ou de pessoas por quem este seja responsável, salvo os bens pessoais usados pelos utentes do Segurado durante a consulta ou ato terapêutico.”

artigo 4.º:

«1. Nos termos das demais disposições contratuais, fica coberta pela Apólice a responsabilidade civil imputável ao Segurado por factos geradores de responsabilidade civil ocorridos e reclamados durante a vigência do contrato.

2. As reclamações pelos factos indicados no número anterior, desde que desconhecidas das partes à data da cessação do contrato, podem ainda ser apresentadas até 1 ano após a data de cessação da sua vigência. Para este efeito considera-se reclamação a comunicação dos factos ao Segurador pelo Segurado ou pelo lesado, por correio registado ou outro meio de que fique registo escrito, ou a notificação judicial ao Segurador.

3. Ficam, porém, excluídas as reclamações apresentadas após a data da cessação do contrato se o risco estiver coberto por contrato de seguro posterior.

4. Em qualquer caso, ficam excluídas quaisquer reclamações por factos ocorridos anteriormente ou posteriormente ao período de vigência do contrato, estejam ou não abrangidos por outro contrato de seguro.»

Artigo 7º

«O quadro de trabalhadores e/ou prestadores de serviços do Segurado é composto pelas pessoas indicadas pelo Tomador e/ou Segurado e identificadas na proposta que serviu de base à emissão do presente Contrato de seguro fazendo parte integrante da apólice.».


*

(Da contestação da assistente “D... – Companhia de Seguros, S.A.”)

86) Por acordo celebrado entre as assistentes BB e “D... – Companhia de Seguros, S.A.”, documentado na apólice n.º ... (junta aos autos em 17-02-2022, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido), aquela transferiu para esta a responsabilidade pelos riscos e danos emergentes do exercício da sua actividade profissional.


*

B. Factos Não Provados

Não se provou que:

a) a Dr.ª BB exercesse a sua actividade por ordem e sob a direcção da ré;

b) quando do referido em 2), o autor possuísse o dente 22 e que este tivesse sido extraído pela Dr.ª BB;

c) o autor tivesse aceitado executar os trabalhos referidos em 4.3), 4.6), 4.7) e 4.8);

d) o referido em 8) tivesse ocorrido, concretamente, nove meses após a colocação das coroas;

e) o referido em 14) tivesse ocorrido, concretamente, seis meses após a colocação das novas coroas;

f) o Dr. CC exercesse a sua actividade por ordem e sob a direcção da ré;

g) o Dr. CC tivesse informado o autor de que os tratamentos que antes lhe haviam sido realizados se apresentavam defeituosos e que não eram susceptíveis de correcção;

h) o Dr. CC tivesse dito ao autor que a única maneira de efectuar de forma persistente os implantes correspondentes aos quatro dentes em falta, exigia a extracção de todos os dentes do maxilar superior do autor, ainda que perfeitamente saudáveis, e a posterior colocação de seis implantes em substituição de todos esses dentes;

i) o dente 11 do autor estivesse são, quando da respectiva extracção;

j) o Dr. CC tivesse assumido a incapacidade da ré para realizar os dois implantes referidos em 4.1) e 4.2);

k) na realização dos tratamentos referidos nos factos provados, o autor tivesse despendido mais de 120 horas e que tal tivesse implicado, para o mesmo, perda de rendimentos do seu trabalho, no montante de 720,00 €;

l) o referido em 24) tivesse ocorrido durante todo o período em que perduraram os tratamentos descritos nos factos provados;

m) o número de para quilómetros percorridos pelo autor, referido em 25), tivesse sido de 1920 e que tivessem implicado um custo de 768,00 €;


*

n) a fractura referida em 27) tivesse sido provocada por uma pancada com um tablet, desferida ao autor, na zona da ponte, pela filha do mesmo, quando estava na cama dos pais;

o) o alerta referido em 29) tivesse sido feito pela Dr.ª BB;

p) quando do referido em 35), tivessem sido retirados os parafusos colocados nos implantes dos dentes 12 e 22;

q) o autor tivesse faltado às consultas dos dias 10-01-2019 e 18-01-2019;

r) o agendamento da realização da TAC referida em 56), para os dias 29-01-2019 e 26-03-2019, tivesse sido concertado ou comunicado ao autor e que este tivesse faltado sem prestar justificação;

s) o autor não se tivesse munido dos cuidados na alimentação recomendados pela Dr.ª BB referidos em 47);

t) as faltas do autor às consultas, referidas nos factos provados, tivessem comprometido a execução do tratamento;

u) quer no início do tratamento, quer durante a sua execução, o autor tivesse sido informado do tempo de duração do mesmo, da fase de adaptação, da importância da assiduidade, da remoção temporária, contenção e estabilidade;


*

v) o referido em 14) tivesse sucedido no dia 23-09-2018, quando o autor se encontrava num café a conversar com os amigos;

w) quando do referido em 16), o Dr. CC tivesse dito ao autor que se aceitasse fazer implantes na parte posterior do maxilar, só teria que pagar quatro dos seus implantes a realizar, ficando o custo dos dois restantes à

conta da ré, como compensação pelo trabalhão executado pela Dr.ª BB;

x) quando do referido em 30), a Dr.ª BB tivesse atribuído a quebra dos parafusos à deficiência do material utilizado;

y) quando do referido em 16), o Dr. CC tivesse dito ao autor que o material foi aplicado em ângulo incorrecto e que a reabilitação da boca do autor deveria ter começado pela parte posterior e não pelos dentes da frente;

z) a Dr.ª BB não possuísse formação na área da implantologia;


*

aa) quando do referido em 64) o autor tivesse sido atendido, concretamente, pelo Dr. CC;

bb) quando do referido em 2) o autor tivesse sido devidamente informado e elucidado sobre a necessidade da reabilitação protética das zonas posteriores, a fim de dar suporte à reabilitação efectuada no sector anterior;

cc) o autor tivesse compreendido o referido em bb) e manifestado que a sua prioridade seria a reabilitação da zona antero-superior, por razões estéticas;

dd) o autor tivesse comunicado à assistente, nomeadamente no dia 03-11-2014, que, por factores económicos, não pretendia a reabilitação das zonas posteriores;

ee) antes de 09-05-2017, a assistente tivesse informado e alertado o autor, reiteradamente, para a necessidade de um tratamento global, com reabilitação quer da zona anterior, quer da zona posterior, para que o resultado final do tratamento fosse plenamente alcançado;

ff) quando do referido em 65) (11-11-2014), a assistente tivesse instruído e motivado o autor para a necessidade de melhoria de higiene oral, que era bastante deficitária e poderia comprometer o sucesso do tratamento;

gg) o autor tivesse faltado à consulta no dia 05-01-2015;

hh) quando do referido em 68) tivesse ficado concluído o trabalho que a assistente se propôs realizar ao autor;

ii) antes do referido em 27) e em 41), a assistente tivesse comunicado ao autor e este soubesse que a não realização da reabilitação das zonas posteriores diminuía a eficácia dos implantes colocados;


*

jj) quando do referido em 2), o autor tivesse sido alertado para a importância da necessidade de reabilitar tanto a zona posterior, como a zona anterior das suas maxila e mandíbula, por forma a não comprometer o sucesso do tratamento proposto e tivesse optado por colocar, apenas, os implantes e as coroas/ponte referidas em 4.1) e 4.2);

kk) quando do referido em 75), a Dr.ª BB tivesse dito ao autor que tal era necessário para não comprometer o sucesso do tratamento na zona anterior;

ll) quando do referido em 75), tivesse sido transmitido ao autor que a reabilitação da zona posterior da maxila e mandíbula, quer através da colocação de implantes, quer através da colocação de uma prótese parcial removível, solução mais económica – se mostrava essencial no conjunto do tratamento de reabilitação oral que lhe foi proposto, para salvaguarda da função mastigatória, que estava comprometida, face à ausência das indicadas peças dentárias 16, 35, 36 e 46, evitando-se a sobrecarga na zona anterior:

mm) antes de 09-05-2017 o autor tivesse sido devidamente alertado para a necessidade de reabilitar a zona posterior da maxila e mandíbula e tivesse optado por não a concretizar;

nn) os implantes e as coroas referidos em 4.1) e 11) tivessem sido colocados de forma e na posição correctas;

oo) o referido em 57) tivesse condicionado o sucesso clínico dos actos médicos praticados pela interveniente BB.


*

C. Demais matéria dos articulados

A demais alegação vertida nos articulados configura matéria conclusiva ou de direito, alusão a meios de prova ou mera impugnação da alegação da contra-parte. “.


*

IV_ Fundamentação de direito

1ª Questão

A ré “A..., Lda.” invocou a sua ilegitimidade processual e substantiva para a presente acção, com fundamento no disposto no artigo 30º do CPC.

O autor pugnou pela improcedência da excepção, invocando, entre o mais, que a dedução, pela ré, de reconvenção, peticionando o pagamento de parte dos maus serviços que alega ter prestado, é demonstrativo da sua legitimidade passiva nesta acção, invocando, em apoio da posição por si defendida o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 18.09.2007, no Proc. 296/07.7TBMCN.P1.S1.

No despacho saneador, foi apreciada a legitimidade processual, invocada na contestação apresentada pela ré, tendo o tribunal a quo julgado improcedente tal excepção dilatória[2].

A legitimidade processual, pressuposto de cuja verificação depende o conhecimento do mérito da causa, não se confunde com a legitimidade substantiva, requisito da eventual procedência do pedido. Ao apuramento de ambas interessa, contudo, a consideração do pedido e da causa de pedir. Na verdade, "a relação controvertida, tal como a apresenta o autor e forma o conteúdo jurídico da pretensão deste é que é - em orientação jurídica - o objecto do processo, em face do qual (e, por isso, quase sempre determinável por simples exame da petição inicial) se aferem a legitimidade e os outros pressupostos que desse objecto dependam"[3].

A legitimidade processual, pressuposto processual relativo às partes, afere-se, na falta de indicação da lei em contrário, face à relação material controvertida tal como configurada pelo A., e cuja falta, determina a verificação da correspondente excepção dilatória, dando lugar à absolvição do réu da instância - cfr. artigos 30º, 576º, n.º 2 e 577º, alínea e), ambos do Código de Processo Civil”.

A "parte é legítima quando, admitindo-se que existe a relação material controvertida, ela for efectivamente seu titular"[4].
A legitimidade substancial ou substantiva tem que ver com a efectividade da relação material, com a titularidade de um direito e deve ser aferida à luz das regras substantivas.

Sobre a questão, decidiu o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 29/10/2015 [5]:

I - A legitimidade processual, constituindo uma posição do autor e do réu em relação ao objecto do processo, é de averiguar em face da relação jurídica controvertida, tal como o autor a desenhou; já a legitimidade material consiste num complexo de qualidades que representam pressupostos da titularidade, por um sujeito, de certo direito que o mesmo invoque ou que lhe seja atribuído, respeitando, portanto, ao mérito da causa».

A legitimidade processual, pressuposto de cuja verificação depende o conhecimento do mérito da causa, não se confunde com a legitimidade substantiva, requisito da eventual procedência do pedido. Ao apuramento de ambas interessa, contudo, a consideração do pedido e da causa de pedir.

O autor fundamenta as suas pretensões deduzidas na petição, no contrato celebrado com a ré, ao abrigo do qual esta, por intermédio de uma Médica que prestava serviço na sua clínica, lhe prestou serviços médico-dentários, os quais foram pagos directamente à ré. Significa que os titulares da relação material controvertida, tal como se encontra gizada, na petição inicial, são o próprio autor e a ré A..., LDA..

Pelo exposto e sem necessidade de mais considerandos, improcede a excepção de ilegitimidade processual passiva, invocada pela ré.

2ª Questão

A recorrente/ré invocou a excepção dilatória de preterição de litisconsórcio necessário passivo que esteou na celebração de um contrato entre o autor e a médica que prestou os cuidados médicos.

Advoga que é sobre o médico, enquanto profissional liberal, que impende o ónus de respeitar as leges artis no acto clínico prestado, gozando de independência técnica e deontológica e liberdade na escolha dos meios de diagnóstico e de tratamento. O autor circunscreveu a alegada responsabilidade ao acto médico, não tendo colocado em causa qualquer juízo de censurabilidade sobre a vertente organizacional, essa sim, na dependência directa e dominial da R. Por aplicação do disposto no artigo 512º do Cód. Civil, a obrigação é solidária quando cada um dos devedores responde pela prestação integral e esta a todos libera (n.º 1), não deixando de ser solidária pelo facto de os devedores estarem obrigados em termos diversos ou com diversas garantias, ou de ser diferente o conteúdo das prestações de cada um deles (n.º 2). Por seu lado, dispõe o artigo 513º do mesmo diploma, que a solidariedade de devedores ou credores só existe quando resulte da lei ou da vontade das partes. Deste preceito, confrontado com o disposto nos artigos 497º e 507º do mesmo Código, resulta que, nas obrigações civis integrantes de responsabilidade contratual, em que haja pluralidade de devedores, a regra geral é a da conjunção: cada um dos obrigados responde para com o credor por uma parte proporcional da prestação, se o contrário não estiver estipulado entre as partes. Sendo de natureza civil a obrigação alegada pelo autor e não tendo sido demandada a médica-dentista, prestadora do acto médico, verifica-se a excepção de preterição de litisconsórcio necessário passivo que deveria ter sido sanada pelo Tribunal a quo, o que não sucedeu.

O facto de a relação jurídica material controvertida afectar directamente os interesses de várias pessoas não determina, só por si, a necessidade de intervenção de todos os interessados. A regra é a do litisconsórcio voluntário em que os sujeitos da relação podem intervir ou não em conjunto, tendo carácter excepcional o litisconsórcio necessário, dados os graves embaraços que para a parte representa a sua imposição. E, assim, apenas se exigirá a presença de todos os interessados nos casos em que a lei colocou acima dos interesses das partes e dos respectivos custos, a unidade da decisão[6].

O litisconsórcio é necessário, segundo dispõe os nºs 1 e 2 do artigo 33º do C.P.C., quando a lei ou o contrato o impuserem ou quando resultar da própria natureza da relação jurídica, ela seja necessária para que a decisão a obter produza o seu efeito útil normal.

Para uma concepção mais ampla, o efeito útil normal afere-se pela insusceptibilidade de contradição lógica, teórica ou técnica de julgados. Ao invés, para uma concepção mais restrita, o efeito útil afere-se pela insusceptibilidade de contradição apenas prática entre julgados, em termos de obstar a decisões que não possam definir estavelmente a situação jurídica sem atingir os diversos interessados na decisão.

O nº 2 do artigo 33º do CPC adopta a noção mais restrita de efeito útil normal, já que o instituto do litisconsórcio necessário natural visa evitar decisões inconciliáveis sob o ponto de vista prático e, consequentemente, obter segurança e certeza na definição das situações jurídicas.

Como refere o Tribunal a quo, «do modo como o autor caracteriza a presente acção, invocando a celebração de um contrato com a ré e a falta de cumprimento pela mesma, através da prática de actos de uma médica que prestava funções na sua clínica, da obrigação a que se encontrava adstrita por força de tal contrato, resulta que, juridicamente, tal factualidade se integra no âmbito da previsão legal do art. 800º do Código Civil, o qual estatui que:

“1. O devedor é responsável perante o credor pelos actos dos seus representantes legais ou das pessoas que utilize para o cumprimento da obrigação, como se tais actos fossem praticados pelo próprio devedor.

2. A responsabilidade pode ser convencionalmente excluída ou limitada, mediante acordo prévio dos interessados, desde que a exclusão ou limitação não compreenda actos que representem a violação de deveres impostos por normas de ordem pública.”

Com efeito, nos termos do n.º 1, do dispositivo legal supracitado, a médica dentista em causa trata-se de uma auxiliar da devedora, a ré.

Ora, da letra e espírito do referido normativo legal não resulta a obrigatoriedade de qualquer litisconsórcio entre o devedor e o seu auxiliar. Pelo contrário, o dispositivo legal refere expressamente que o devedor é responsável pelos actos dos seus auxiliares.».

Como ensina o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 23/3/2017, proferido no processo nº296/07.7TBMCN.P1.S1[7] - e que permitimo-nos respeitosamente transcrever um excerto -, «a prestação de serviços de saúde, no sector privado, se pode reconduzir a uma diversificada tipologia de fontes jurídicas, consoante o perfil de cada caso concreto.

Assim, há casos em que as prestações dos cuidados de saúde são realizadas sem a prévia ou concomitante negociação entre o prestador do serviço e o paciente, não se gerando, por isso, qualquer vínculo negocial. Daí que a ocorrência de lesão do paciente, no quadro da realização dessa prestação, deva ser equacionada em sede de responsabilidade civil extracontratual ou delitual, nos termos dos artigos 483.º e seguintes do CC.

Já quando a prestação do serviço de saúde tiver sido objeto, de algum modo, de negociação entre o prestador de serviço (médico ou instituição prestadora de cuidados de saúde) e o paciente, impõe-se reconduzir o não cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação assumida pelo prestador ao instituto da responsabilidade contratual, nos termos dos artigos 798.º e seguintes do CC, sem prejuízo de eventual concurso deste título de responsabilidade com a responsabilidade delitual.

Com efeito, é hoje pacificamente aceite, na doutrina e na jurisprudência, que a prestação de cuidados de saúde, mormente de serviços médicos, pode ser objeto de regulação por via contratual, entre o paciente e o profissional de saúde (v.g. médico) ou uma instituição prestadora de serviços de saúde, na esfera do princípio da autonomia privada proclamado no artigo 405.º do CC, ainda que com as limitações e imposições à liberdade de celebração e de estipulação decorrentes das normas legais imperativas, das normas deontológicas e de certos costumes e usos respeitantes ao exercício das profissões de saúde, ou inerentes à natureza indisponível do bem jurídico envolvido, como é o complexo psico-somático do paciente, tutelado pelos direitos de personalidade.

Nessa base, a relação jurídica de matriz convencional entre o médico e o paciente tem vindo a ser configurada, à luz do nosso ordenamento legal, como um contrato social e nominalmente típico, de natureza civil, consensual, subsumível ao tipo de contrato de prestação de serviço previsto no artigo 1154.º do CC, em regra oneroso, podendo ainda ser perspetivado como contrato de consumo.

E no âmbito mais complexo das variadas prestações de serviços de saúde, no domínio do sector privado, como se destaca no acórdão do STJ, de 28/01/2016, proferido no processo n.º 136/12.5TVLSB.L1.S1, a doutrina mais recente tem vindo a avançar com a seguinte tipologia:

i) – a modalidade de contrato total, traduzido num misto (combinado) que engloba um contrato de prestação de serviços médicos, a que se junta um contrato de internamento (prestação de serviço médico e paramédico), bem como um contrato de locação e eventualmente de compra e venda (fornecimento de medicamentos) e ainda de empreitada (confecção de alimentos);

ii) – a variante de contrato total com escolha de médico (contrato médico adicional), consistente num contrato total mas com a especificidade de haver um contrato médico adicional (relativo a determinadas prestações);

iii) – a modalidade de contrato dividido, nos termos do qual a clínica apenas assume as obrigações decorrentes do internamento (hospedagem, cuidados paramédicos, etc.), enquanto que o serviço médico é direta e autonomamente celebrado por um médico (actos médicos).

Pode ainda, noutra variante, a instituição prestadora dos serviços de saúde só assumir as obrigações correspondentes ao contrato de prestação de serviços médicos, portanto sem internamento.

Nesse quadro, enquanto que, tanto no dito contrato total como nesta última variante, é a instituição prestadora do serviço quem responde integralmente perante o paciente credor, na variante com escolha de médico, este poderá também responder em sede do contrato médico adicional e, na modalidade de contrato dividido, responderão, em princípio, a instituição prestadora e o médico, na órbita das respetivas obrigações assim assumidas.».

Pelo exposto e sem necessidade de mais considerandos, atenta a relação jurídica de natureza controvertida, definida pelo autor, no seu articulado, improcede a excepção dilatória de preterição de litisconsórcio necessário passivo.

3ª Questão

A recorrente/ré invocou a sua ilegitimidade substantiva.

Concorda-se com os considerandos sobre o contrato de prestação de serviços médicos constantes da decisão recorrida, pelo que se mostra desnecessária a sua repetição.

Consta da matéria de facto provada que no dia 30 de Setembro de 2014, o autor dirigiu-se à clínica da ré “A..., Lda.”, sita em Aveiro, para averiguar a possibilidade de colocação de prótese fixa e definitiva que substituísse os dois dentes perdidos em consequência de acidente de trabalho. Nessa data, a Dr.ª BB prestava serviços nas instalações da ré “A..., Lda.” e executava, em horários pré-definidos, os actos médicos/clínicos que lhe eram marcados pela ré, aos pacientes que procuravam esta. A Dr.ª BB prestava tais serviços ao abrigo de um contrato de prestação de serviços celebrado entre si e a sociedade “BB Unipessoal, Lda.” e posteriormente, com a sociedade "E...", sociedades através das quais aquela prestava serviços à ré e emitiam recibos a esta, relativamente a esses serviços.

Nessa clínica, o autor foi observado pela médica dentista Dra. BB, tendo a ré, por intermédio daquela, proposto ao autor a realização dos tratamento indicados no ponto 4 dos factos provados. Desses tratamentos, pelo autor foi aceite a realização do tratamentos referidos em 4.1), 4.2), 4.4) e 4.5). Foi a ré que determinou a realização dos tratamentos ao autor, pela Dr.ª BB Os orçamentos apresentados pela Dr.ª BB, referentes aos tratamentos propostos, foram emitidos em nome da ré que emitiu, ainda, as facturas/recibos referentes aos tratamentos que foram realizados ao autor. O pagamento desses serviços foi feito à ré, pelo autor. Após a Dr.ª BB ter deixado de exercer funções na ré, o autor foi atendido, no dia 17-01-2019, pelo Dr. CC, que aí exercia a actividade de médico dentista.

Havia critérios de uniformização na clínica da ré, por exemplo, quanto às tabelas usadas, sendo a Dr.ª BB que definia os tratamentos a ministrar aos pacientes, com total autonomia, tendo decidido o aconselhamento e o plano de reabilitação da cavidade oral do autor, sem ter de prestar contas ou submeter o mesmo à apreciação/aprovação da ré.

Sendo este o enquadramento fáctico da realização dos tratamentos ao autor, não se vislumbra qualquer acordo entre si e a Dr.ª BB. Como é referido pelo Tribunal a quo, a Dr.ª BB «executou os actos e tratamentos médicos [com] autonomia técnica, sem seguir instruções da ré. Todavia, tal deve-se ao concreto vínculo negocial que existe entre a ré e a [Dr.ª BB], ao qual o autor é totalmente alheio, bem como à especifica actividade exercida por esta última, que, em regra, pressupõe aquela autonomia – cf. artigos 6.º e 9.º, n.º 2, do Regulamento Interno nº 2/99, publicado em Diário da República – II Serie, nº 143, de 22 de Junho, alterado pelo Regulamento interno nº 4/2006, publicado em DR-II Serie nº 103, de 29 de Maio, e artigo 6.º do Código Deontológico da Ordem dos Médicos Dentistas, aprovado pelo Regulamento n.º 515/2019, publicado na 2.ª série do Diário da República, n.º 115, de 18 de Junho. [S]ubsumindo a factualidade provada aos normativos legais [impõe-se] concluir que o autor celebrou um contrato de prestação de serviços médicos com a ré, e apenas com a ré, respondendo esta, perante aquele, pelos actos dos médicos dentistas a quem recorreu, para executar a prestação que lhe incumbia.».

Pelo exposto e contrariamente ao alegado pela recorrente/ré [conclusão 21ª e pontos 131 a 139 do corpo de alegações], não existe qualquer contrato entre o autor e a Médica BB, sendo titulares efectivos da relação jurídica o autor e a ré.

Improcede, assim, o recurso, nesta parte.

4ª Questão

A recorrente/ré impugnou a decisão da matéria de facto por referência aos seguintes factos:
xxvi) Facto ínsito no ponto 1) dos factos provados [1) Em consequência de um acidente de trabalho, o autor perdeu os dois dentes incisivos centrais do seu maxilar superior.”]: deve ser densificado com a indicação que o A. tinha perdido os dentes incisivos há pelos menos 3 ou 4 anos antes de deslocar-se à Clínica da R. [conclusões 3 e 4, apresentadas pela Ré].
xxvii) Facto ínsito no ponto 8) dos factos provados [“8) Decorridos doze meses sobre a colocação das coroas sobre os implantes referidos em 4.1), estas caíram.”]: mostra-se incorrectamente julgado como provado.
xxviii) Facto ínsito no ponto 12) dos factos provados [12) Em consequência do referido em 8), o autor permaneceu sem os quatro dentes da frente durante dezoito meses, tendo dificuldades em se alimentar e em falar, e sentindo-se vexado com a sua aparência física.”]: foi erroneamente elevado ao patamar dos factos provados.
xxix) Facto ínsito no ponto 14) dos factos provados [“14) Decorridos cerca de nove meses, também as novas próteses acabaram por cair, quando o autor se encontrava a dormir”]: foi erroneamente elevado ao patamar dos factos provados.
xxx) 4ªFacto ínsito no ponto 15) dos factos provados [“15) ficando o autor novamente sem os quatro dentes da frente, do seu maxilar superior e com o aspecto retratado no documento 13, junto com a petição inicial.”]: foi erroneamente elevado ao patamar dos factos provados.
xxxi) Facto ínsito no ponto 22) dos factos provados [“22) Antes da realização dos tratamentos referidos, o autor era alegre e sociável, gostava de conviver com outras pessoas e de frequentar espaços públicos.”]: foi incorrectamente considerado provado.
xxxii) Facto ínsito no ponto 57) dos factos provados [“57) O autor ostentava uma má higiene oral.”]: mostra-se incompleto, devendo constar também deste ponto que “o Autor era fumador”.
xxxiii) Facto ínsito no ponto 80) dos factos provados [“80) A fractura referida em 27) está relacionada com a ausência de dentes posteriores na maxila e mandíbula do autor, com a consequente sobrecarga dos dentes anteriores.”]: dever ser transferido para os factos não provados.
xxxiv) Facto ínsito no ponto n) dos factos não provados [1) Em consequência de um acidente de trabalho, o autor perdeu os dois dentes incisivos centrais do seu maxilar superior.”]: dever ser transferido para os factos provados.
xxxv) Facto ínsito no ponto r) dos factos não provados [“r) o agendamento da realização da TAC referida em 56), para os dias 29-01-2019 e 26-03-2019, tivesse sido concertado ou comunicado ao autor e que este tivesse faltado sem prestar justificação;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xxxvi) Facto ínsito no ponto t) dos factos não provados [“t) as faltas do autor às consultas, referidas nos factos provados, tivessem comprometido a execução do tratamento;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xxxvii) Facto ínsito no ponto u) dos factos não provados [“u) Quer no início do tratamento, quer durante a sua execução, o autor tivesse sido informado do tempo de duração do mesmo, da fase de adaptação, da importância da assiduidade, da remoção temporária, contenção e estabilidade]: deve ser transferido para os factos provados.
xxxviii) Facto ínsito no ponto bb) dos factos não provados [bb)“quando do referido em 2) o autor tivesse sido devidamente informado e elucidado sobre a necessidade da reabilitação protética das zonas posteriores, a fim de dar suporte à reabilitação efectuada no sector anterior;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xxxix) Facto ínsito no ponto cc) dos factos não provados [“cc) o autor tivesse compreendido o referido em bb) e manifestado que a sua prioridade seria a reabilitação da zona antero-superior, por razões estéticas;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xl) Facto ínsito no ponto dd) dos factos não provados [“dd) o autor tivesse comunicado à assistente, nomeadamente no dia 03-11-2014, que, por factores económicos, não pretendia a reabilitação das zonas posteriores;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xli) Facto ínsito no ponto ee) dos factos não provados [“ee) antes de 09-05-2017, a assistente tivesse informado e alertado o autor, reiteradamente, para a necessidade de um tratamento global, com reabilitação quer da zona anterior, quer da zona posterior, para que o resultado final do tratamento fosse plenamente alcançado;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xlii) Facto ínsito no ponto ff) dos factos não provados [“ff) quando do referido em 65) (11-11-2014), a assistente tivesse instruído e motivado o autor para a necessidade de melhoria de higiene oral, que era bastante deficitária e poderia comprometer o sucesso do tratamento;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xliii) Facto ínsito no ponto gg) dos factos não provados [“gg) o autor tivesse faltado à consulta no dia 05-01-2015;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xliv) Facto ínsito no ponto ii) dos factos não provados [“ii) antes do referido em 27) e em 41), a assistente tivesse comunicado ao autor e este soubesse que a não realização da reabilitação das zonas posteriores diminuía a eficácia dos implantes colocados;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xlv) Facto ínsito no ponto jj) dos factos não provados [jj)“quando do referido em 2), o autor tivesse sido alertado para a importância da necessidade de reabilitar tanto a zona posterior, como a zona anterior das suas maxila e mandíbula, por forma a não comprometer o sucesso do tratamento proposto e tivesse optado por colocar, apenas, os implantes e as coroas/ponte referidas em 4.1) e 4.2);”]: deve ser transferido para os factos provados.
xlvi) Facto ínsito no ponto kk) dos factos não provados [“kk) quando do referido em 75), a Dr.ª BB tivesse dito ao autor que tal era necessário para não comprometer o sucesso do tratamento na zona anterior;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xlvii) Facto ínsito no ponto ll) dos factos não provados [“ll) quando do referido em 75), tivesse sido transmitido ao autor que a reabilitação da zona posterior da maxila e mandíbula, quer através da colocação de implantes, quer através da colocação de uma prótese parcial removível, solução mais económica – se mostrava essencial no conjunto do tratamento de reabilitação oral que lhe foi proposto, para salvaguarda da função mastigatória, que estava comprometida, face à ausência das indicadas peças dentárias 16, 35, 36 e 46, evitando-se a sobrecarga na zona anterior; “]: deve ser transferido para os factos provados.
xlviii) Facto ínsito no ponto mm) dos factos não provados [“mm) antes de 09-05-2017 o autor tivesse sido devidamente alertado para a necessidade de reabilitar a zona posterior da maxila e mandíbula e tivesse optado por não a concretizar;”]: deve ser transferido para os factos provados.
xlix) Facto ínsito no ponto nn) dos factos não provados [“nn) os implantes e as coroas referidos em 4.1) e 11) tivessem sido colocados de forma e na posição correctas;”]: deve ser transferido para os factos provados.
l) Facto ínsito no ponto oo) dos factos não provados [“oo) o referido em 57) tivesse condicionado o sucesso clínico dos actos médicos praticados pela interveniente BB.;”]: deve ser transferido para os factos provados.

A recorrente/interveniente acessória BB impugnou a decisão da matéria de facto por referência aos seguintes factos:
vii) Factos ínsitos no ponto 22 dos factos provados [22) “Antes da realização dos tratamentos referidos, o autor era alegre e sociável, gostava de conviver com outras pessoas e de frequentar espaços públicos”.]: devem ser transferidos para os factos não provados [conclusões 4,5 e 6, apresentadas pela interveniente acessória BB].
viii) Factos ínsitos no ponto 80 dos factos provados [“80) A fractura referida em 27) está relacionada com a ausência de dentes posteriores na maxila e mandíbula do autor, com a consequente sobrecarga dos dentes anteriores.”.]: devem ser transferidos para os factos não provados [conclusões 8 a 24, apresentadas pela interveniente acessória BB].
ix) Factos ínsitos no ponto n) dos factos não provados [“n) a fractura referida em 27) tivesse sido provocada por uma pancada com um tablet, desferida ao autor, na zona da ponte, pela filha do mesmo, quando estava na cama dos pais.”.]: devem ser transferidos para os factos provados [conclusões 26 a 28, apresentadas pela interveniente acessória BB].
x) Factos ínsitos no ponto t) dos factos não provados [“t) as faltas do autor às consultas, referidas nos factos provados, tivessem comprometido a execução do tratamento.”.]: devem ser transferidos para os factos provados [conclusões 29 a 33, apresentadas pela interveniente acessória BB].
xi) Factos ínsitos no ponto bb) dos factos não provados [“bb) quando do referido em 2) o autor tivesse sido devidamente informado e elucidado sobre a necessidade da reabilitação protética das zonas posteriores, a fim de dar suporte à reabilitação efectuada no sector anterior.”]: devem ser transferidos para os factos provados [conclusões 35 a 42, apresentadas pela interveniente acessória BB].
xii) Factos ínsitos nos pontos ii) [“ii) Antes do referido em 27) e em 41), a assistente tivesse comunicado ao autor e este soubesse que a não realização da reabilitação das zonas posteriores diminuía a eficácia dos implantes colocados.”], jj) [“jj) quando do referido em 2), o autor tivesse sido alertado para a importância da necessidade de reabilitar tanto a zona posterior, como a zona anterior das suas maxila e mandíbula, por forma a não comprometer o sucesso do tratamento proposto e tivesse optado por colocar, apenas, os implantes e as coroas/ponte referidas em 4.1) e 4.2).”], kk) [“kk) quando do referido em 75), a Dr.ª BB tivesse dito ao autor que tal era necessário para não comprometer o sucesso do tratamento na zona anterior.”] e mm) [“mm) antes de 09-05-2017 o autor tivesse sido devidamente alertado para a necessidade de reabilitar a zona posterior da maxila e mandíbula e tivesse optado por não a concretizar.”], dos factos não provados: devem ser transferidos para os factos provados [conclusões 43 a 42, apresentadas pela interveniente acessória BB].

Importa, assim, reapreciar a prova produzida com vista a decidir as impugnações aduzidas pelas recorrentes.

Previamente, importa explicitar os vectores quanto à apreciação e valoração da prova por referência, mormente por referência aos factos de natureza técnica.

Nos termos do artigo 466º, nº3, do Código de Processo Civil, o tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se as mesmas constituírem confissão.

Como decidiu esta Relação, no Acórdão proferido no Processo nº 1028/21.2T8VFR-B.P1[8], «a valoração das declarações de parte há de ser feita com parcimónia, já que são declarações interessadas, parciais e não isentas, em que quem as produz tem um manifesto interesse na ação.

Com efeito, seria de todo insensato que sem mais, nomeadamente sem o auxílio de outros meios probatórios, sejam eles documentais ou testemunhais, o tribunal desse como provados os factos pela própria parte alegados e, tão só, por ela admitidos.

Não obstante, o certo é que são um meio de prova legalmente admissível e pertinentemente adequado à prova dos factos que sejam da natureza que ele mesmo pressupõe (ou seja, nos termos do art. 466º, nº 1 in fine, factos em que as partes tenham intervindo pessoalmente ou de que tenham conhecimento direto).

Todavia, tais declarações são apreciadas livremente pelo tribunal (art. 466º, nº 3, 1ª parte) e, nessa apreciação, engloba-se a sua suficiência à demonstração do facto a provar.

A afirmação, perentória e inequívoca, de as declarações das partes não poderem fundar, de per si e só por si, um facto constitutivo do direito do depoente, não é correta, porquanto, apresentada sem qualquer outra explicação, não deixaria de violar, ela mesma, a liberdade valorativa que decorre do citado nº 3 do art. 466º.

Mas compreende-se que, tendencialmente, as declarações de parte, sem qualquer corroboração de outra prova, qualquer que ela seja, não apresentem, ainda assim, e sempre num juízo de liberdade de apreciação pelo tribunal, a suficiência bastante à demonstração positiva do facto pretendido provar. Portanto, será num contexto de suficiência probatória e não propriamente de valoração negativa e condicionada da prova que as declarações de parte devem ser analisadas.

Evidentemente que, perspetivando de modo inverso o problema, também a admissão da prova por declarações de parte num sentido interpretativo de onde decorresse, em qualquer circunstância, a prova dos factos favoráveis ao deferimento da sua pretensão (sejam eles factos constitutivos, modificativos, impedimentos ou extintivos, consoante a posição do declarante na lide) por mero efeito de declarações favoráveis nesse sentido, também não pode ser sufragada, na medida em que, num processo de partes como é o processo civil, deixaria sem possibilidade de defesa a parte contrária.

Como assim, a prova por declarações de parte, nos termos enunciados no art. 466º, é apreciada livremente pelo tribunal, na parte que não constitua confissão, na certeza de que a livre apreciação é sempre condicionada pela razão, pela experiência e pelas circunstâncias e que, neste enquadramento, a declaração de parte que é favorável e que surge desacompanhada de qualquer outra prova que a sustente ou sequer indicie, será normalmente insuficiente à prova de um facto essencial que constitua a causa de pedir ou em que se baseie a exceção invocada.».

Sufragado, na íntegra, este entendimento, a versão dos factos narrada pelo autor, bem como a versão dos factos narrada pela legal representante da ré DD, na parte em que sejam favoráveis aos mesmos, desacompanhadas de qualquer outro elemento de prova no mesmo sentido, será considerada, em princípio, insuficiente para demonstrar factos que integrem a causa de pedir ou nos quais esteja sustentada uma excepção que tenha sido invocada pelo declarante.

A interveniente BB tem, nos presentes autos, o estatuto de assistente (cfr. artigos 323º, nº1, e 328º do CPC). Como é manifesto, não é indiferente para a interveniente acessória o desfecho da presente acção, o que não pode deixar de ser valorado na análise e valoração da prova. Esse interesse está plasmado ao longo das declarações e depoimento por si prestado, atenta a sua persistência e empenho em sublinhar que cumpriu todos os procedimentos que lhe eram impostos e prestou informação completa ao autor sobre todos os trabalhos executados e que as opções deste quanto aos tratamentos realizados foram precedidas da prestação de todos os esclarecimentos, recomendações e advertências que se mostraram pertinentes. Percorrendo o registo clínicos dos actos médicos, facilmente se constata que a realidade narrada pela interveniente acessória BB nem sempre se encontra plasmada nesses registos, pese embora, na audiência, tenha sido salientado que a Senhora Médica tinha o cuidado e o hábito de registar tudo. A título de exemplo, como é salientado pelo Tribunal a quo – com o que se concorda -, «dos registos clínicos dos actos médicos prestados ao autor não se extrai um plano cabalmente definido, com tempos de execução de cada fase, opções claras comunicadas ao paciente e vantagens e desvantagens de cada uma, nem que este tenha sido devidamente informado e advertido, ab initio, que caso optasse por começar com a colocação de implantes na parte anterior do maxilar superior, como sucedeu, era necessário que, em simultâneo ou a breve trecho reabilitasse a parte posterior dos maxilares, de forma a garantir a retenção dos implantes e da ponte colocada nos dentes 12, 22 e 11 e 21. Com efeito, o registo de tal informação surge, apenas, em 09-05-2017 e em 11-12-2017, volvidos dois anos e oito meses desde o início do tratamento e já após a fractura dos parafusos dos implantes colocados em 12 e 22. O mesmo se diga quanto à necessidade de não utilizar os “dentes” da frente para mastigar e triturar alimentos.».

Assim, o relato dos factos apresentado pela interveniente acessória obedecerá aos mesmos critérios que os relatos apresentados pelo autor e pela legal representante da ré. Assume particular relevância, além dos detalhes, da descrição de cadeias de interacções, da segurança/assertividade, da fundamentação, da contextualização pormenorizada e plausível do relato em contraposição a um relato estereotipado/cristalizado ou com recurso a generalizações; a existência de corroborações periféricas que confirmem o teor das declarações da partes.

A testemunha EE é sócio da ré. Ouvida a gravação do depoimento prestado por esta testemunha, é notório o seu interesse no desfecho da presente acção e a sua falta de isenção, o que não pode deixar de ser valorado na apreciação crítica e conjugada de toda aprova.

Em segundo lugar, atenta a natureza técnica de alguma factualidade vertida nos factos provados e não provados, assume especial relevância a perícia realizada pelo INML, bem como os esclarecimentos prestados, em audiência, pela Senhora Perita FF e pelo Senhor Perito GG.

Nos termos do art.º 388.º do Código Civil, “A prova pericial tem por fim a perceção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, ou quando os factos, relativos a pessoas, não devam ser objeto de inspeção judicial”.

O perito auxilia o juiz quando chamado a dilucidar uma determinada questão com base na sua especial aptidão técnica e científica para essa apreciação.
A prova pericial é de livre apreciação pelo Tribunal.
Como ensina o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 29/11/2022[9], citando o Acórdão proferido a 08/06/2021, no processo n.º 3004/16.8T8FAR.E1.S1, «a prova pericial está sujeita à livre apreciação pelas instâncias, sendo fixada livremente pelo Tribunal, nos termos dos artigos 389.º do Código Civil e 489.º do Código de Processo Civil, não existindo impedimento legal a que o Tribunal atribua maior força probatória a outros meios de prova e a que, perante motivos de ordem técnica ou probatória que apontem para a rejeição ou modificação do resultado da perícia média realizada nos autos, fixe um entendimento divergente daquela.”. No mesmo sentido, entre outros, cfr. os Acórdãos de 04/07/2018, proferido no processo n.º 1165/13.7TTBRG.G2.S1 (Chambel Mourisco), de 26/09/2018, proferido no processo n.º 25.552/16.0T8LSB.L1.S1 (Gonçalves Rocha), de 06/02/2019, proferido no processo n.º 639/13.4TTVFR.P1.S1 (Júlio Gomes), de 06/05/2020, proferido no processo n.º 1085/10.7TTPNF.5.P1.S1 (Leones Dantas).»

Nos presentes, foi realizada prova pericial médico-legal, pelo INML. Pela imparcialidade e especial qualidade dos exames periciais elaborados no Instituto Nacional de Medicina Legal, por quem não tem qualquer interesse e submetendo-se às regras próprias de um meio de prova mais exigente como é a prova pericial, conferimos total prevalência à apreciação e às conclusões alcançadas pelos Senhores Peritos, Drª FF e Professor Doutor GG, e esclarecimentos prestados pelos mesmos em audiência.

No relatório pericial do INML, a Senhora Perita procedeu à transcrição de actos médicos que constam “Do registo de actos médicos de F..., A..., Lda.».

Consta desse relatório que o “examinado não apresenta higiene oral satisfatória e refere ser fumador”.

Das respostas aos quesitos, resulta que pela Senhora Perita FF foi considerado, com base na ortopantomografia, que na primeira consulta, realizada em 30/9/2014, o autor apresentava ausência das seguintes peças dentárias anteriores: “18, 17, 15, 12, 21, 22, 27, 28, 38, 36, 35, 46 e 48”.

Quanto aos “tratamentos propostos ao autor com a vista a reabilitação oral da sua boca”, a Senhora Perita limitou-se a transcrever o que consta do “Registo de actos médicos” da ré:

30/09/2014 foi apresentada proposta de plano de tratamento com implantes para a colocação de 2 implantes dentários,12 e 22, e uma ponte, … o dente 11 só se extrai cerca de 1 mês antes das impressões, …fazer Prótese Parcial Removível (PPR), superior e inferior, se não fizer implantes posteriores”.

Como é manifesto, a Senhora Perita não esteve presente quando o plano do tratamento foi proposto ao autor. Explicou, no entanto, que o clínico para formular um plano de tratamento deve realizar previamente: “exame objectivo, exames complementares de diagnóstico, tais como fotografias e radiológicos/imagiológicos que nos permite ver a largura e altura do implante e uma simulação do que será o tratamento ideal dentro das várias escolhas. O clínico pode obter esses elementos na consulta se tiver o equipamento no seu consultório”. O consentimento livre e esclarecido do doente pressupõe que a este sejam apresentados vários modelos de tratamento, salientando, no entanto, ao doente deve ser conferida a possibilidade de escolha mas, a “decisão é sempre do Clínico, o que se compreende pois, é o profissional que tem conhecimentos técnicos para adaptar o plano de reabilitação da cavidade bucal ao condicionalismo concreto que se verifica.

Quanto ao quesito “Quais os dentes que os referidos tratamentos abrangiam?”, respondeu a Senhora Perita “De acordo com a ortopantomografia apresentada na figura 1, corresponde à substituição de: 17, 15, 12, 21, 22, 27, 36, 35 e 46; ao que acresce o 11 após a sua extração”.

Quanto ao quesito “quantos implantes se pretendiam realizar?”, a Senhora Perita respondeu “Dois implantes foram considerados no tratamento inicial”, tendo esclarecido, em audiência, que a sua resposta teve por base os dados médicos disponibilizados. Feita a pergunta se não foram propostos sete implantes, considerando que o orçamento menciona o implante dos dentes 12,22,16,17,35,36 e 46, a Senhora Perita respondeu que “esse plano de tratamento não foi executado”.

Dos esclarecimentos prestados em audiência, pela Senhora Perita, resulta que quando faz a reabilitação de um doente com implantes anteriores, também faz a reabilitação posterior, faz uma reabilitação mista. Como exemplo, a Senhora Perita referiu que, na reabilitação mista, pode começar pela reabilitação anterior mas, “temporariamente, fazemos o apoio posterior enquanto fazemos uma reabilitação anterior que tende a ser definitiva”.

Transpondo para a situação objecto destes autos, explicou a Senhora Perita que:
i. No “registo clínico do dia 28 de Março de 2017, o autor tinha os dois implantes (incisivos lateral direito e esquerdo); e tinha apoio posterior do segundo quadrante (lado esquerdo) e não tinha apoio posterior do lado direito”.
ii. Da análise da optomografia de 30/9/2014, verifica-se que o autor “tinha dois molares, no lado esquerdo, que poderiam ser para apoios temporários para uma reabilitação anterior. No lado direito, tinha uma raiz superior e um molar inferior que poderia tornar-se, também, um apoio temporário posterior”.

Colocada a questão é por quanto tempo “esse apoio temporário”, a Senhora Perita esclareceu que a colocação de implantes tem as seguintes etapas: a primeira consiste na colocação de implantes, aguardando-se, de seguida, três meses para a osteointegração do implante; estando osteointegrado, faz-se a impressão para a superestrutura, demorando um mês a vir do laboratório .essas impressões demoram um mês a vir do laboratório. O período de “seis meses, é exequível, já contabilizando alguma falha de material; seis meses seria o adequado para tornar funcional a reabilitação anterior”, acrescentando “poderia ser reforçado o apoio posterior enquanto é feita a reabilitação dos dentes anteriores”.

Confrontada com a situação dos autos - decorreram três anos até serem retiradas as impressões para a reabilitação posterior -, a Senhora Perita esclareceu que três anos é “um tempo demasiado longo” para a reabilitação anterior; “é uma excepção; não é um intervalo de tempo que seja considerado dentro dos parâmetros mais usuais”; “quando há situações inesperadas, pode alargar um pouco, entre seis meses e um ano, sendo o doente visto e monitorizado”, durante esse hiato.

Nos Registos dos actos clínicos, existe o registo, datado de 29 de Agosto de 2017, que foram tirados moldes para construir uma prótese parcial removível esquelética. A primeira opção da Médica BB foi a colocação de implantes nos dentes 12 e 22 e extracção de um dente; a primeira cirurgia para os primeiros implantes ocorreu em Novembro de 2014, ou seja, os moldes para a reabilitação posterior datam de três anos depois da primeira cirurgia para os primeiros implantes. Acrescentou a Senhora Perita não dispor de dados objectivos para responder qual a razão para ter sido tomada a opção de extrair um dente ao invés de começar pelos implantes em 11 e 21 e não em 12 e 22.

Ao quesito “Se tais implantes foram realizados com sucesso?”, a Senhora Perita respondeu “Os dois implantes, nas posições dos dentes 12 e 22 não cumprem a função de suporte de estrutura protética, desde 18 de abril de 2017”. Em audiência, esclareceu que observou o autor e verificou que dois dos implantes (incisivo lateral esquerdo e direito) permanecem na sua cavidade bucal, mas não tem estrutura, não viu a estrutura, acrescentando que a colocação de um implante tem um objectivo: a sua adequação para suportar uma estrutura. Não viu a estrutura colocada no autor, pelo que considera que não está feita a reabilitação, na sua totalidade; não está terminada.

Ao quesito “A que deve atribuir-se o insucesso da colocação dos pretendidos implantes, ou como se explica o referido insucesso”, a Senhora Perita respondeu “deve atribuir-se, segundo os dados documentais, à diminuída retenção da ponte sobre os mesmos”. Significa que esteve pouco tempo na boca. A retenção é atribuída à sedimentação. Colocada a 30 de Março, a superestrutura não teve capacidade para ficar no local, sendo, portanto, diminuída a retenção, acrescentado a Senhora Perita que não tem qualquer dado concreto que lhe permita dizer a razão da diminuída retenção.

No quesito referente à informação e esclarecimentos prestados ao autor, a resposta da Senhora Perita, como é óbvio, foi dada com base na leitura dos “Registos dos Actos Médicos”, referindo que “No dia 11 de dezembro de 2017, o paciente assinou a Nota: dada a oclusão do paciente, projeção vestibular do maxilar superior com mordida profunda, o paciente foi aconselhado a ter cuidado com a alimentação; não fazer uso destes dentes para corte dos alimentos (têm só efeito estático) pois existe grande risco de fratura dos parafusos protéticos do trabalho. Aconselhando a fazer goteira oclusal para prevenir acidentes do bruxismo e a reabilitar proteticamente maxilar superior”. Dessa resposta consta, ainda, que dos elementos disponibilizados “não existe prova de consentimento livre e esclarecido” prestado pelo autor.

Analisado o Registo de actos médicos, constata-se que em data anterior a Dezembro de 2017, está registada a prestação das seguintes informações/conselhos/avisos, pela Médica BB: prestadas são as seguintes:

- 30/9/2014: “… aconselhei a fazer PPR, superior e inferior, se não fizer implantes posteriores…”.

- 28/1/2016: “ … aviso sobre a necessidade de mais higiene”.

7/2/2017: “… colocação de ponte antero superior aparafusada com dois parafusos protéticos mais curtos,.. paciente avisado de que a retenção da ponte está diminuída”.

9/5/2017: “avisei paciente da necessidade de reabilitação protética do maxilar inferior e do superior a nível posterior”.

Em audiência, esclareceu a Senhora Perita que da documentação disponibilizada, não contém elementos dos quais possa extrair que o paciente tenha sido esclarecido quanto ao plano de tratamento. Explicou que o consentimento livre e esclarecido” pressupõe o conhecimento do plano de tratamento e do plano alternativo e, nos autos, não constam elementos que lhe permitam aferir que foi prestado esse esclarecimento.

Sobre a higiene oral, apresentada pelo autor, e se a “má higiene [pode] ter condicionado o sucesso clínico dos actos médicos praticados pela interveniente BB”, a Senhora Perita respondeu que “A higiene oral influência, positivamente, o sucesso da reabilitação protética”, destacando “que outros factores contribuem, igualmente, para o referido sucesso, nomeadamente a relação oclusal, o desenho da estrutura de suporte e hábitos individuais”. Em audiência, explicou que “o fumo ou o acto de fumar vai aumentar o grau dos efeitos secundários da falta de higienização oral, nos tecidos moles”. Esclareceu, no entanto, que “quando estamos perante um doente que não apresenta higiene oral satisfatória e é fumador, o nosso tipo de reabilitação é condicionado ao facto de que não pudemos imputar uma reabilitação que exija uma boa higiene oral e que exija não ser fumador …. A reabilitação deve ser adequada a essas duas circunstâncias: deficiente higiene oral e fumador; existem vários tipos de reabilitação que permitem ao doente higienizar a sua estrutura fora do cuidado oral, é o caso da prótese parcial removível”.

No que tange ao que se exige ao profissional, a Senhora Perita referiu, ainda, que deve ser tomado em consideração a motivação do cliente explicando que “quando temos um doente que está muito motivado para uma estrutura (não removível) mas, não cumpre uma higiene oral satisfatória, nós vamos motivá-lo a cumprir uma higiene oral satisfatória e a deixar de ser fumador…Essa motivação passa muita vez pelo apoio psicológico. Há áreas de psicologia próprias que nos ajudam a nós, profissionais de saúde, a averiguar se o doente está ou não motivado, quando nós temos essa dúvida. Esta dúvida passa um bocadinho por nós acompanharmos o doente. Uma reabilitação …não é conhecer o doente hoje e amanhã dar-lhe alta; é acompanhar o doente, no estadio inicial, e conhecer a cavidade oral integralmente para nos dar tempo de nos certificarmos se o doente está motivado. Quando temos dúvida devemos fazer uma consolidação de prova e então sugerimos uma avaliação psicológica do estado de motivação e o psicólogo adequado para o efeito fará o relatório”. Pela Senhora Perita foi explicado que a higiene oral insatisfatória é uma atitude, “hábitos que podem ser ultrapassados. Passa tudo por um trabalho de informação do profissional de saúde para com o doente que tem hábitos contraprudecentes para o sucesso.”. No caso concreto, referiu não dispor de dados documentais que lhe permitam concluir que essa motivação foi efectuada. Percorrendo o “Registo de actos médicos”, nenhuma referência existe a essa actuação de BB perante o autor ou que tenha sido tomado em consideração, na apresentação do plano de tratamento inicial, que o autor era fumador e não apresentava uma higiene oral satisfatória.

Resulta dos esclarecimentos prestados em audiência, pela Senhora Perita, no caso concreto, a quebra dos parafusos não está relacionada a circunstância de o autor ser fumador ou da sua higiene oral não ser satisfatória. Explicou que são condicionantes do sucesso do plano de tratamento sugerido pelo profissional de saúde, BB, a circunstância de o doente ser fumador e as condições de higiene deste, mas “não são determinantes” do insucesso. No caso do autor, se os implantes estão colocados, “em que medida é que a higiene e o tabagismo contribuíram para as pontes terem caído?”. Resulta dos esclarecimentos prestados pela Senhora Perita que o tabagismo é um factor de afectação de regeneração do tecido; o tabagismo e a falta de higiene vão promover as feridas e existindo estas, a sua dificuldade de cicatrização, processo que vai culminar na perda de ancoragem que o implante necessita. Perguntou a Senhora Perita: no caso do autor, “houve perda de ancoragem óssea?” Não existindo, qual a relação entre a quebra dos parafusos e o tabagismo? Estas perguntas tiveram resposta muito clara e objectiva dada pela Senhora Perita: quando temos uma estrutura partida, essa ocorrência é motivada por trauma ou por carga excessiva; não estão em causa estruturas biológicas, pelo que, à situação de estruturas partidas, não se aplica a explicação do tabagismo, nem da ausência de higiene oral.

Emitiu parecer no sentido da viabilidade da reabilitação da cavidade oral do autor, referindo, no entanto, que não pode dizer como pode ser feita sem fazer um exame clínico e diagnósticos. Não analisou se os implantes podem retirados da cavidade oral do autor por essa questão não lhe ter sido colocada.

Do Parecer do Conselho Médico-Legal do “Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses em Coimbra”, datado de 04-05-2022 e aprovado em reunião plenário, sendo o seu Relator o Senhor Professor Doutor em Medicina Dentária, GG - junto aos autos em 19-05-2022 -, consta a transcrição dos registos clínicos constantes do “Registo dos Actos Médicos” (únicos registos clínicos disponibilizados pela ré). Com base nesse elemento documental e nas radiografias panorâmicas, o Senhor Professor Doutor GG respondeu que, com base na radiografia panorâmica, datada de 30 de Setembro de 2014, o autor apresentava “ausência dos dentes 18, 16, 15, 12, 21, 22, 26, 28, 38, 36, 35, 46 e 48”.

Sobre os tratamentos propostos, a sua resposta consistiu na transcrição do registo datado de 30/9/2014 constante do “Registo de Actos Médicos”, à semelhança da Senhora Perita.

Ao terceiro quesito, o Senhor Professor Doutor GG respondeu:

 

Ao quarto quesito, o Senhor Professor Doutor GG respondeu:

Esclareceu o Senhor Professor Doutor GG, em audiência, que a reabilitação deve ser precedida do “diagnóstico, na íntegra, de toda a cavidade oral e deveriam ter sido descartadas todas as hipóteses que aparecem aqui como eventuais possibilidades de insucesso, desde logo a higiene oral. Uma falta de higiene oral é uma das condicionantes das reabilitações com implantes. O segundo elemento é o equilíbrio de mastigação: se o doente conseguia ou conseguiria mastigar, após a reabilitação, não só com os dentes anteriores mas também com os dentes posteriores”. O plano de tratamentos deve ser feito em função dos dados obtidos com o estudo da situação; “após a obtenção de dados do estudo é que iria orientar qual o caminho, por assim dizer, que essa reabilitação seguiria. Poderia, por exemplo, face à ausência de tecido ósseo em condições adequadas ou outros factores, na parte posterior não pudesse ser feita a reabilitação por implantes. Mas não temos elementos para dizer que essa possibilidade não existia e que a única possibilidade, porque a própria profissional refere, na ausência do doente optar pela restauração ou pela realização de implantes, poderia recorrer a próteses. O que significa que eu não tenho a certeza que a reabilitação da parte posterior não pudesse ser feita também por implantes. Essa reabilitação devia ter sido feita no sentido de permitir o equilíbrio da força mastigatória; os dentes posteriores são importantes para suportar a força mastigatória e, no caso, essa força mastigatória estava a ser feita pelos dentes anteriores.

Em suma, para o Senhor Professor Doutor GG, deveria ter sido resolvido “o problema dos dentes posteriores, em termos da mastigação ser feita pelos dentes molares e não pelos dentes da frente”, como sucedeu, esclarecendo, ainda, que a decisão de iniciar o tratamento pelos dentes anteriores ou posteriores, cabe ao médico e não ao doente: “a definição do plano de tratamento cumpre ao profissional que a expõe perante o doente e, no caso de haver qualquer problema relativamente ao cumprimento desse plano, tem de ser esclarecido.”

Pelo Senhor Professor Doutor GG foi explicado que “numa situação de reabilitação de ausência de dentes, como se verifica neste caso, faz-se… uma tomografia computorizada aos dois maxilares que é para determinar o espaço ósseo, a relação entre o posicionamento dos implantes e todas as estruturas (imperceptível) que eventualmente estejam nas proximidades, a realização de moldes, ou seja, do modelo exactamente reprodutivo da cavidade oral, dos dentes que existem e da própria articulação entre os maxilares; e eventualmente fotografias. É aquilo que normalmente se faz, previamente à definição do plano de tratamento. Na posse desses elementos, o profissional delineia um plano de tratamentos de reabilitação da cavidade oral”.

Ao quesito quinto, o Senhor Professor Doutor GG respondeu:

Ao oitavo quesito, o Senhor Professor Doutor GG respondeu:


Ao nono quesito, o Senhor Professor Doutor GG respondeu:

À semelhança da Senhora Perita, o Senhor Professor Doutor esclareceu que:

Sobre a questão, à semelhança da Senhora Perita, o Senhor Professor Doutor GG esclareceu que a falta de higiene caracteriza-se por inflamações entre o espaço do implante, o tecido ósseo e a gengiva e, no “caso concreto, não ocorreu dificuldade de integração do implante no tecido ósseo. Aliás, os dois implantes mantêm-se na cavidade”. Explicou que os implantes estão íntegros, mantiveram-se na cavidade oral, por isso exclui a componente da falta de higiene oral. “Significa que os implantes não tiveram qualquer problema. O problema foi entre a ligação do implante e a coroa”. Sobre a causa para o problema localizado aí, o Senhor Professor Doutor GG explicou que “sob o ponto de vista da física, da mecânica, as forças são transmitidas à coroa e sobrecarregam exactamente este tipo de parafusos. Numa situação normal, os parafusos estão feitos de forma a suportarem exactamente esse tipo de esforços. No caso de haver uma sobrecarga, que é isso que eu refiro, excesso de mastigação, eventualmente, esses parafusos podem partir. Até porque não podemos esquecer que havia apenas dois implantes a suportar quatro coroas de dentes. É o denominado uma ponte. Significa uma força bastante intensa, particularmente quando o doente ou a pessoa tem dificuldades em trincar alimentos com os dentes posteriores. Normalmente há uma

tendência de sobrecarga dos dentes anteriores” e isso “pode levar à fractura”, admitindo também que o traumatismo, o embate com qualquer objecto, pode provocar a fractura dos “parafusos”.

Conforme se explicou, a Senhora Perita emitiu parecer no sentido de o período de “seis meses, ser o adequado para tornar funcional a reabilitação anterior. Sobre o tempo, em termos médios, que demoram os tratamentos de reabilitação da cavidade oral, o Senhor Professor Doutor GG esclareceu que depende de várias circunstâncias, devendo o plano de tratamento contemplar os tempos em que é realizado, “deve quantificar exactamente os tempos”. No caso do autor, a reabilitação foi orientada, “a fazer fé no que consta do processo clínico, só para os dentes anteriores. E foi remetida para uma hipótese ... a complementar esse tratamento a nível posterior, com implantes ou prótese removível. Mas não foi definida temporalmente essa reabilitação (...) Devia ter sido feita desde o início”.

Sobre o hiato decorrido entre a data da colocação da prótese e a data da ocorrência da fractura ser suficiente para a realização da reabilitação posterior, o Senhor Professor referiu que não pode pronunciar-se com objectividade porque “não sei qual era o plano de reabilitação posterior”. Na primeira consulta, é feita a referência à necessidade de reabilitação posterior. Depois desta consulta, só volta a ser mencionada a necessidade de reabilitação posterior após a ocorrência da factura. Na proposta terapêutica inicial há uma recomendação de reabilitação integral, mas não há um plano de reabilitação posterior.

Segundo o Parecer emitido pelo Senhor Professor, em audiência, a nível técnico, a solução inicial adoptada, se acompanhada da complementaridade de reabilitação posterior, poderia ser satisfatória, do ponto de vista estético. Do ponto de vista funcional, já é questionável. Explicou que “ficaria mais confortável, sob o ponto de vista técnico -profissional, se o plano de tratamento estivesse bem apresentado, bem detalhado, temporalmente estabelecido e fosse apresentado ao doente. De facto uma reabilitação deste tipo, com este tipo de recursos, pressupõe uma reabilitação da cavidade oral, de todos os dentes da cavidade oral e dificilmente se resolve com uma solução sectorial, principalmente nos dentes anteriores, nos quatro dentes anteriores. São soluções muito difíceis de ter sucesso em termos de reabilitação”.

Questionado se o plano de tratamento inicial, proposto por BB, “passa por uma reabilitação integrada, anterior e posterior, o Senhor Professor Doutor GG respondeu “não me parece; aquilo que nós temos, na primeira consulta, é, exactamente, a avaliação da colocação de implantes, focada na parte anterior, focada exactamente nessa área, os quatro incisivos. E depois, deixa-se para o paciente ponderar e agendar a possibilidade de fazer uma prótese parcial removível posterior, se não fizer implantes posteriores”. Segundo o seu Parecer, a avaliação inicial, feita por BB, está “centrada na componente anterior” e não na reabilitação integrada.

O Senhor Professor identifica como problemas apresentados pelo autor que podiam condicionar o sucesso da reabilitação: a ausência de dentes na parte inferior e também na parte posterior era uma componente que podia comprometer o sucesso; o bruxismo; e a higiene oral que, neste caso, não existem evidências de o insucesso estar relacionado com a ausência de higiene oral. E refere “O primeiro ponto é que na primeira consulta a deliberação do tratamento, a realização, foi baseada numa radiografia”, que para si, trata-se de “um tipo de exame que não é recomendado para fazer um tratamento deste tipo”, devendo ter sido efectuado um TAC, exame considerado adequado, sendo também “muito importante”, fazer “moldes da cavidade oral para ficarmos com o modelo dos dentes”.

Sobre a importância deste estudo e dos exames enunciados, prévios ao plano de tratamento, esclareceu o Senhor Perito “se eu faço uma reabilitação parcial, não valorizando toda a componente e complexidade da cavidade oral, poderão surgir situações inesperadas, que foi aquilo que se verificou, de insucesso e que foi condicionando, obrigando a tentar adaptar tratamentos posteriores para resolver aquilo que, sob o ponto de vista do planeamento de tratamento, não estava completamente clarificado. Aquilo que eu considero é que, de facto, carecia, para ter sido iniciada a reabilitação com colocação dos implantes, de mais elementos em termos de definição para o tratamento”.

Em momento posterior foi feito um TAC, não constando do Registo dos Actos clínicos, a justificação para o pedido desse exame, nessa fase. Da análise desse exame concluiu o Senhor Professor que havia a possibilidade de colocar quatro implantes na parte anterior, no espaço dos incisivos. Se esta determinação de condições para colocação dos quatro implantes tivesse sido inicialmente efectuada, a solução de colocação de dois implantes com a ponte podia eventualmente ser a alternativa de quatro implantes com quatro coroas. Mas não existe elemento indicador relativamente à opção terapêutica que, inicialmente, foi feita. No dia 17/1/2019, foi realizada uma ortopografia e foi prescrito o TAC da maxila e da mandíbula para realização de implantes, sendo este o último registo na clinica. Este é um elemento de estudo para avaliar a situação.

Sobre o risco de quebra dos parafusos, explicou que “é diminuto”, podendo “acontecer em duas circunstâncias: excesso de carga mastigatória ou um defeito do próprio parafuso. Há situações descritas em que o próprio material e a colocação desse parafuso carece de qualidade das forças a que é sujeito”. Admitiu o Senhor Professor que o traumatismo também pode causar a quebra dos parafusos, mas essa hipótese não foi equacionada nos quesitos formulados, nem dispõe de elementos para dizer que neste caso era previsível suceder.

Segundo o Parecer emitido pelo Senhor Professor, em audiência, a nível técnico, a solução inicial adoptada, se acompanhada da complementaridade de reabilitação posterior, poderia ser satisfatória, do ponto de vista estético. Do ponto de vista funcional, já é questionável.

Sobre a influência do “absentismo” às consultas no sucesso do tratamento, o Senhor Professor Doutor GG esclareceu que “neste caso, não vislumbro elementos que me permitam concluir por esse facto”.

Ao décimo segundo quesito, o Senhor Professor Doutor GG respondeu:


Sobre o consentimento do doente, à semelhança da Senhora Perita, o Senhor Professor Doutor GG esclareceu que “quando se faz o plano de tratamento, tem de ser submetido à aprovação do próprio doente”. O doente “ dá o consentimento informado, mediante o plano de tratamento que lhe é proposto, têm que estar elencadas todas essas hipóteses.”. As informações constantes da nota assinada em 2017, deviam ter sido prestadas logo no início.

Além da qualidade técnica e imparcialidade dos Senhores Peritos, na prestação de esclarecimentos, em audiência, ambos procuraram sempre fundamentar todas as respostas dadas, o que fizeram de forma clara, permitindo, assim, a percepção do que é realmente importante na reabilitação da cavidade oral e o que deve ser feito pelo profissional clínico, previamente à apresentação de qualquer plano de tratamento, bem como da importância de ser prestada ao doente toda a informação sobre o plano de tratamento sugerido mas, também, sobre as soluções alternativas.

Expostos estes vectores na apreciação da prova, proceder-se-á à análise da matéria de facto impugnada.

Factos ínsitos no ponto 1) dos factos provados [1) Em consequência de um acidente de trabalho, o autor perdeu os dois dentes incisivos centrais do seu maxilar superior.”]

Insurge-se a ré contra a decisão da matéria de facto por referência ao facto vertido no ponto 1 dos factos provados, advoga que deve ser densificado com a indicação que o A. tinha perdido os dentes incisivos há pelos menos 3 ou 4 anos antes de deslocar-se à Clínica da R. [conclusões 3 e 4, apresentadas pela Ré].

De acordo com o previsto no nº 1 do artigo 5º do Código de Processo Civil, às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções invocadas.

O Tribunal ad quem deve proceder à ampliação da matéria de facto sempre que conclua que existe matéria de facto alegada pelas partes, essencial à luz das diversas soluções plausíveis das questões decidendas e que não foi conhecida pelo tribunal recorrido. Além de tais factos, articulados pelas partes, são ainda considerados pelo Tribunal os factos instrumentais que resultem da instrução da causa, os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes tenham alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar, os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por força do exercício das suas funções (artigo 5º, nº 2, do Código de Processo Civil).

Pretende a Recorrente/Ré que do ponto 1 dos factos provados passe a constar que o autor “tinha perdido os dentes incisivos há pelos menos 3 ou 4 anos antes de deslocar-se à Clínica da R.”. Não foi alegado por qualquer das partes, nos articulados, a localização temporal desse acontecimento. Resultando da instrução da causa, ainda que se considerasse tratar-se de facto concretizador dos alegados pelas partes, não pode o mesmo ser tomado em consideração pelo Tribunal ad quem por não se mostrar cumprido o exercício do contraditório (artigo 2º, alínea b) do artigo 5º).

Pelo exposto, improcede, nesta parte, a impugnação da decisão da matéria de facto.

Factos ínsitos no ponto 8) [“8) Decorridos doze meses sobre a colocação das coroas sobre os implantes referidos em 4.1), estas caíram.”], no ponto 12) [12) Em consequência do referido em 8), o autor permaneceu sem os quatro dentes da frente durante dezoito meses, tendo dificuldades em se alimentar e em falar, e sentindo-se vexado com a sua aparência física.”], no ponto 14) [“14) Decorridos cerca de nove meses, também as novas próteses acabaram por cair, quando o autor se encontrava a dormir”] e no ponto 15) [“15) ficando o autor novamente sem os quatro dentes da frente, do seu maxilar superior e com o aspecto retratado no documento 13, junto com a petição inicial.”] dos factos provados.

Insurge-se a ré contra a decisão da matéria de facto por referência aos factos vertidos nos pontos 8, 12, 14 e 15 dos factos provados, advogado que não têm qualquer correspondência factual, nem amparo probatório.

No que tange ao ponto 8 dos factos provados, advoga que pelo Tribunal “a quo” foi considerado provado que “as coroas caíram, sem legendar o facto”, resultando dos autos, mormente dos dois relatórios periciais e do Registo dos Actos Médicos, que o tratamento médico ministrado ao A. não estava terminado, quando este abandonou, sem qualquer justificação, o tratamento e a Clínica, a partir de 17.01.2019. Neste contexto fáctico, as coroas e as pontes aplicadas ao paciente A., no decurso do tratamento, eram, meramente, provisórias.

Sustenta que o A. nunca permaneceu 18 meses sem os quatro dentes da frente, como, erroneamente, consta dos pontos 12 e 15. Tal factualidade não se mostra conforme aos factos considerados demonstrados nos pontos 28 a 56 os quais definem o percurso do autor, no tratamento da sua cavidade oral, na ré. Invoca, como meio de prova para sustentar a impugnação de tais factos o registo de actos médicos que se mostra “reiterado pelo Relatório Pericial, datado de 19/5/2022”.

Salvo o devido respeito, não assiste razão à ré.

A queda das coroas mencionadas no ponto 4.1 dos factos provados foi narrado pela própria interveniente acessória, BB, que narrou o acontecimento por si presenciado, da seguinte forma: Tomou conhecimento, em Março de 2016, que se partiram os dois parafusos. O Autor foi à clínica e “queixou-se que tinha a estrutura a abanar mais ainda tinha os dentes”. Na consulta realizada, nesse dia, “verificou-se que havia a fractura dos parafusos proteicos”. Declarou a Médica BB que, nessa consulta “fez raio x e bastou tocar naquilo que se soltou”.

Em nenhum momento da prova, é aludido à natureza provisória das coroas mencionadas no ponto 4.1, nem do registo dos actos médicos consta a menção da provisoriedade de tais coroas.

Consta da matéria de facto provada, não impugnada:

«7.6) colocação de coroa aparafusada sobre implante e de coroa pôntico cerâmica, nos dentes 11, 21 e 22, objecto das facturas-recibos datadas de 17-02-2015 e de 30-03-2025, no valor de 743,00 cada uma;

7.7) colocação de coroa pilar aparafusada sobre implante nos dentes 11 e 22 e de coroa pôntico cerâmica nos dentes 11 e 21, objecto da factura-recibo datada de 30-03-2015, no valor de 743,00 €;».

Das facturas mencionadas nos pontos 7.6 e 7.7 não consta a menção da natureza provisória das coroas.

Declarou a Médica BB que “os dois parafusos ficaram inutilizados. A única solução para ajudar o paciente com uma reabilitação fixa era aqueles dois parafusos ficarem lá e colocaram-se dois novos parafusos, ao lado, para sustentar uma nova reabilitação para sustentar os quatro dentes. Correu tudo bem. Em 2018, descolou uma cerâmica da estrutura metálica; é a coroa. Ele compareceu com o descolamento de uma cerâmica (descola um e vem todos) . Isso aconteceu só uma vez. Foi ao laboratório e colocou novamente: essa reparação demorou no máximo 15 dias e esse descolamento não tem nada a ver com a quebra do parafuso.”.

Referiu, ainda, a Médica BB, em audiência, que “accionaram a garantia dos implantes e houve uma redução do preço do segundo trabalho, dos materiais; foram oferecidos dois implantes”, acrescentando que a “colocação dos segundos implantes foi suportada pela clínica” e por si, com o esclarecimento que “não accionam a garantia quando há mau uso, falta de colaboração do cliente”.

Da narração do sucedido feito pela própria Médica que efectuou os primeiros e segundos implantes, não decorre a provisoriedade das coroas. Se fossem provisórias, qual a razão para accionar o seguro?

É certo que do registo dos actos clínicos não consta o registo da queda das coroas referidas no ponto 4.1, embora a Médica BB tenha admitido a ocorrência desse facto, na sua presença, o que demonstra que, afinal, nem tudo era registado nesse “Registo dos Actos Médicos”.

Da leitura dos pontos 28 a 56 dos factos provados resulta que (28) a ponte com os quatro dentes, sendo dois implantes, foi colocada no dia 30-03-2015 e (29) em 28-01-2016 foi efectuado um aperto das coroas da ponte. Nada se refere quanto à provisoriedade das coroas, caso em que seria mencionado o prazo/data para colocação das coroas definitivas. Pelo contrário. O que ocorre é o “aperto das coroas da ponte”, ou seja, a ultimação do trabalho.

Chama-se à colação os esclarecimentos prestados pelo Senhor Perito Professor Doutor GG: “se eu faço uma reabilitação parcial, não valorizando toda a componente e complexidade da cavidade oral, poderão surgir situações inesperadas, que foi aquilo que se verificou, de insucesso e que foi condicionando, obrigando a tentar adaptar tratamentos posteriores para resolver aquilo que, sob o ponto de vista do planeamento de tratamento, não estava completamente clarificado. Aquilo que eu considero é que, de facto, carecia, para ter sido iniciada a reabilitação com colocação dos implantes, de mais elementos em termos de definição para o tratamento”.

Destes esclarecimentos resulta, com toda a clareza, que a colocação de implantes nos dentes 12 e 22, com coroas pilares aparafusadas sobre os mesmos, mencionada no ponto 4.1 dos factos provados não tem natureza provisória.

Improcede, assim, a impugnação referente ao factos vertido no ponto 8 dos factos provados.

O primeiro segmento do ponto 12 é uma decorrência lógica dos factos vertidos nos pontos 9, 10 e 11 pois, à luz do crivo das regras da experiência comum e da lógica, fracturados os parafusos e encetadas diligências, sem sucesso, para os remover, não se vislumbra como seria possível a colocação de coroas nesse espaço, tendo efectuado “nova cirurgia para a colocação de novos implantes, agora nos dentes 11 e 21, sem remoção dos parafusos colocados para os implantes no espaço dos dentes 11 e 22 (facto 11), e só em 11 de Dezembro de 2017, a Médica BB colocou, na cavidade oral do autor, duas novas coroas pilar aparafusadas sobre os implantes em 11 e 21, e duas novas coroas pôntico cerâmicas (ponto 13, não impugnado).

O seu ânimo, após o facto vertido no ponto 8 dos factos provados, decorre das declarações prestadas pelo Autor, corroboradas pelas depoimentos prestados pelas testemunhas HH, seu tio, II. A testemunha HH declarou que convivia mensalmente com o sobrinho, ora autor, no jantar de família que era realizado um vez por mês, razão pela qual pode observar mudanças no comportamento deste que descreveu do seguinte modo: ficou irritado; começou a deixar de conversar; e, a partir de certa altura, “começou a recatar-se e deixou de comparecer nos jantares de família, o que não era o seu costume”.

A testemunha II, amigo de infância do autor, mencionou episódios por si presenciados, no local de trabalho, de situações constrangedoras, provocadas por terceiros de motivadas pela circunstância enunciada no ponto 12 dos factos provados.

Convocando o relato feito pela Médica BB e analisando o mesmo, à luz do crivo das regras da experiência, a conclusão não será diversa. Declarou a Médica BB que o autor compareceu no consultório, em Setembro de 2014, na tentativa de “reabilitar a parte da frente dos dentes que lhe causava bastante dano na autoestima e essa era a sua principal preocupação”, ou seja, a sua aparência, já nessa altura, não era questão de menor relevância. Inicia o tratamento imbuído do sucesso do tratamento planeado pela Médica BB e, em Março de 2016, constata que, afinal, o seu problema não foi resolvido. Neste quadro e face à prova acima indicada, considera-se demonstrado o facto vertido no ponto 12 dos factos provados.

No que tange aos pontos 14 e 15, do registo de actos médicos, transcrito pelos Senhores Peritos, consta o registo, no dia 4 de Setembro de 2018, «pilares da ponte antero-superior implanto suportada “descolaram” da ponte”.». Esse facto foi admitido pela Médica BB, em audiência. Pela legal representante da ré foi igualmente admitido que as “coroas caíram algumas vezes”. De 11 de Dezembro de 2017 a 4 de Setembro de 2018, decorreram cerca de nove meses.

Pelo exposto, improcede, nesta parte, a impugnação da decisão da matéria de facto.

Facto ínsito no ponto 22) dos factos provados [“22) Antes da realização dos tratamentos referidos, o autor era alegre e sociável, gostava de conviver com outras pessoas e de frequentar espaços públicos.”]

Insurgem-se as recorrentes contra a decisão da matéria de facto por referência à factualidade vertida no ponto 22 dos factos provados. Advoga a ré que nos quatro anos que antecedem a ida do autor, à ré, aquele tinha “falta, entre outros, de 3 dentes incisivos (ou seja, os da frente), além de cáries diversas”. Pela Médica BB foi transmitido que o autor, quando se deslocou à clínica, “tinha dano de auto estima, aliás, uma fase emocionalmente mais frágil dele, que não saía de casa, que não conseguia andar assim, fechava-se em casa e, portanto, a procura principal era a reabilitação dos dentes da frente”. Sustenta, ainda, que a testemunha JJ, psicóloga, conheceu o autor em Setembro de 2021, pelo que não pode saber quais as características do autor em 2014, o seu percurso de vida, a sua história.

Por sua vez, sustenta a interveniente acessória BB que é absolutamente inverosímil que o autor fosse “alegre e sociável, gostasse de conviver com outras pessoas e de frequentar espaços públicos” porquanto, foi por este reconhecido que o facto de não ter dentes o inibia de simplesmente sorrir. Declarou a interveniente acessória BB, em audiência, que a procura da clínica, pelo autor, tinha como propósito a reabilitação da sua cavidade oral e que, nessa data, “tinha dano de autoestima” e encontrava-se numa “fase mais frágil” na qual “não saía de casa, não conseguia andar assim, fechava-se em casa”.

Concorda-se com a Ré quanto à dificuldade de fundamentar a convicção quanto aos factos vertidos no ponto 22 dos factos provados com recurso ao depoimento prestado pela testemunha JJ, psicóloga que acompanha o autor desde Setembro de 2021. Na valoração do depoimento desta testemunha, não pode deixar de se considerar o contexto temporal em que o autor passou a ser acompanhado pela Senhora Psicóloga e como a mesma tomou conhecimento do percurso de vida daquele e do seu histórico. Em rigor, o conhecimento da testemunha JJ sobre a vivência do autor, em data anterior a 30 de Setembro de 2014, decorre dos relatos que lhe foram efectuados pelo próprio autor, nas consultas de psicoterapia individual. O acompanhamento em psicoterapia individual ocorre em data posterior à propositura da presente acção. O autor pode fazer o seu retrato, perante a Senhora Psicóloga, à luz do seu próprio olhar ou pode ser objectivo. Tudo isto para dizer que o conhecimento da testemunha sobre a situação do autor no ano de 2014, decorre do que lhe foi transmitido pelo próprio.

Em segundo lugar, não pode deixar de causar estranheza que a testemunha não se recorde se o autor partilhou consigo o estado da cavidade oral, antes de começar o tratamento médico na ré. Desde logo, pela justificação avançada pela testemunha para não se recordar se foi ou não feita essa revelação. Referiu a testemunha que se trata de “uma informação que é de todo irrelevante para a [sua] avaliação…O que é relevante é o impacto que tem para um ser humano desta idade ficar sem dentição”, o que concretizou, referindo “eu não tenho dúvidas que qualquer um de nós presente nesta sala, se não tiver a dentição da frente e se olhar no espelho e nas relações sociais, isto vai ter impacto. Não tenho dúvida”. Mas, assim sendo, não teria significância o estado da cavidade oral do autor antes do início do tratamento? Decorre do depoimento desta testemunha que o abalo psicológico suportado pelo autor, na sequência do insucesso do tratamento da sua cavidade oral, está relacionado com uma dismorfia corporal, com o facto do autor “ter uma alteração da sua imagem corporal”, acrescentando “a questão aqui é o facto da ausência desta dentição ser uma dentição na zona da frente e, portanto, ter um impacto imediato em qualquer interação com outras pessoas”. Sendo assim, não pode deixar de causar estranheza não atribuir relevância à circunstância de o autor, desde sensivelmente, 2010, ter ausência de peças dentárias na parte da frente da sua cavidade oral.

Importa, então, analisar a demais prova produzida.

Declarou o autor que foi vítima de um acidente de trabalho e, em consequência, “foram apodrecendo os [seus] dois dentes da frente”. Tais peças dentárias foram extraídas, tendo colocado “próteses esqueléticas e andou anos assim, três ou quatro anos”, antes de se dirigir à clínica. Significa que, contrariamente ao sustentado pela ré, não se verificava qualquer problema no plano da comunicação e convívio social.

A sua versão é corroborada, nesta parte, pelo depoimento da testemunha II, seu amigo de infância. Decorre do seu depoimento que costumava conviver com o autor, “na cafetaria” e que após os tratamentos, este “evitava sair”; por essa razão, a testemunha passou a frequentar, mais vezes, a residência do autor. Do depoimento da testemunha HH resulta, também, que nas reuniões familiares, o autor conversava, tendo deixado de fazê-lo, a partir de determinada, após ter iniciados os tratamentos. Considerando a descrição do autor, efectuada pela testemunha KK - assistente dentária a exercer funções na ré -, aquando da presença daquele na clínica; e da Médica BB, a prova não se mostra suficiente para se concluir que o autor era uma pessoa alegre. A este propósito, veja-se o depoimento da testemunha JJ, psicóloga que acompanha o autor desde Setembro de 2021. Por esta testemunha foi transmitido que o autor desenvolveu “uma ansiedade generalizada na sequência desta intervenção danosa, do ponto de vista físico e emocional”, salientado a importância das peças dentárias, na parte da frente, na cavidade oral e que a ausência dessas peças provoca no autor um desequilíbrio na sua imagem corporal; afecta a sua capacidade de sorrir . Em suma, tais sequelas orgânicas acarretam para o autor dificuldades na sua participação na vida em sociedade e na comunicação e interacção com terceiros. Considerando os efeitos que a falta de peças dentárias provoca na vida pessoal e social do autor, a ausência de peças dentárias anteriores que já se registava em momento anterior ao início dos tratamentos, na ré, não se compatibiliza com o estado alegre do mesmo.

Sendo esta a prova produzida, encontra-se demonstrado que “Antes da realização dos tratamentos referidos, o autor era sociável, gostava de conviver com outras pessoas e de frequentar espaços públicos”.

Procede, assim, parcialmente a impugnação da decisão da matéria de facto, nesta parte, e, em consequência:
i. Altera-se o ponto 22 dos factos provados, passando a constar do mesmo a seguinte redacção: Antes da realização dos tratamentos referidos, o autor era sociável, gostava de conviver com outras pessoas e de frequentar espaços públicos.”.
ii. Adita-se ao factos não provados o ponto pp) com a seguinte redacção: Antes da realização dos tratamentos referidos, o autor era uma pessoa alegre.


Facto ínsito no ponto 57) dos factos provados [“57) O autor ostentava uma má higiene oral.”]

Pretende a Recorrente/Ré que do ponto 57 dos factos provados passe a constar que o autor “era fumador”, facto não alegado nos articulados. Conforme já foi referido, ainda que resultasse da instrução da causa, não pode o mesmo ser tomado em consideração pelo Tribunal ad quem por não se mostrar cumprido o exercício do contraditório (nº 2º, alínea b) do artigo 5º do CPC).

Pelo exposto, improcede, nesta parte, a impugnação da decisão da matéria de facto.

Facto ínsito no ponto 80) dos factos provados [“80) A fractura referida em 27) está relacionada com a ausência de dentes posteriores na maxila e mandíbula do autor, com a consequente sobrecarga dos dentes anteriores.”]

Insurgem-se as recorrentes contra a decisão da matéria de facto por referência à factualidade vertida no ponto 80 dos factos provados.

Advoga a ré que inexiste qualquer resquício de prova nos autos que sustente tal factualidade e sendo um juízo de jaez, eminentemente, técnico, estará fora da alçada das competências do Tribunal a quo. nas duas perícias médicas lavradas nos autos, em nenhuma, repete-se, em nenhuma é sustentado que a quebra dos parafusos se deveu àquela causa.

Sustenta a interveniente acessória que os Senhores Peritos transmitiram “algo completamente diferente”.

Por este Tribunal já foi exposta a posição quanto à prova dos factos que pressupõem conhecimentos técnicos e as razões pelas quais se confere prevalência ao relatório pericial e ao Parecer do Conselho Médico-Legal do “Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses em Coimbra”, completados pelos esclarecimentos prestados em audiência pelo relator este Parecer, o Senhor Professor Doutor GG, e pela Senhora Perita. Nas questões que se prendem com a violação, ou não, das legis artis, a Senhora Perita não se pronunciou, assumindo, nessa parte, particular relevância os esclarecimentos prestados pelo Senhor Professor Doutor GG e o Parecer do Conselho Médico-Legal do “Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses em Coimbra”, considerando as explicações, pormenorizadas e claras, que foram apresentadas relativamente aos esclarecimentos solicitados em audiência.

Conforme resulta do já exposto, pelo Senhor Professor Doutor GG foi respondido - quesito nono - que “face à informação constante dos registos clínicos, a causa mais provável para a fractura dos parafusos resulta de uma sobrecarga oclusal nos dentes anteriores”, tendo respondido, ao quesito subsequente, “não dispomos de elementos que permitam elaborar qualquer conclusão” no sentido dessa fractura ter ocorrido devido a actuação negligente da Médica BB.

No entanto, com toda a clareza, explicou que os implantes estão íntegros, mantiveram-se na cavidade oral, por isso exclui a componente da falta de higiene oral. “Significa que os implantes não tiveram qualquer problema. O problema foi entre a ligação do implante e a coroa”. Sobre a causa para o problema aí localizado, o Senhor Professor Doutor GG explicou que “sob o ponto de vista da física, da mecânica, as forças são transmitidas à coroa e sobrecarregam exactamente este tipo de parafusos. Numa situação normal, os parafusos estão feitos de forma a suportarem exactamente esse tipo de esforços. No caso de haver uma sobrecarga, que é isso que eu refiro, excesso de mastigação, eventualmente, esses parafusos podem partir. Até porque não podemos esquecer que havia apenas dois implantes a suportar quatro coroas de dentes. É o denominado uma ponte. Significa uma força bastante intensa, particularmente quando o doente ou a pessoa tem dificuldades em trincar alimentos com os dentes posteriores. Normalmente há uma

tendência de sobrecarga dos dentes anteriores” e isso “pode levar à fractura”.

Dos seus esclarecimentos resulta, ainda, que numa reabilitação oral com ausência de dentes, como se verifica no caso do autor, é essencial que o recurso a implantes dentários seja precedido de um estudo detalhado, com elevado grau de rigor, com recurso a uma tomografia computorizada aos dois maxilares; moldes, ou seja, modelo exactamente reprodutivo da cavidade oral, dos dentes que existem e da própria articulação entre os maxilares; e eventualmente fotografias. O primeiro ponto assinalado pelo Senhor Professor é que na primeira consulta, a decisão do tratamento foi baseada numa radiografia, que para si, trata-se de “um tipo de exame que não é recomendado para fazer um tratamento deste tipo”, devendo ter sido efectuado um TAC, exame considerado adequado, sendo também “muito importante”, fazer “moldes da cavidade oral para ficarmos com o modelo dos dentes”. Nos Registos dos actos clínicos, consta o registo, datado de 29 de Agosto de 2017, a moldes tirados nessa data para construir uma prótese parcial removível esquelética .

Sobre o trabalho efectuado por BB, o Senhor Professor referiu que “ficaria mais confortável, sob o ponto de vista técnico -profissional, se o plano de tratamento estivesse bem apresentado, bem detalhado, temporalmente estabelecido e fosse apresentado ao doente”, acrescentando “uma reabilitação deste tipo, com este tipo de recursos, pressupõe uma reabilitação da cavidade oral, de todos os dentes da cavidade oral e dificilmente se resolve com uma solução sectorial, principalmente nos dentes anteriores, nos quatro dentes anteriores. São soluções muito difíceis de ter sucesso em termos de reabilitação”. Da análise do Registo dos Actos Médicos, o Senhor Professor conclui que a reabilitação da cavidade oral do autor “foi orientada só para os dentes anteriores, tendo sido a reabilitação a nível posterior, remetida para uma hipótese, a complementar esse tratamento a nível posterior, com implantes ou prótese removível. Mas não foi definida temporalmente essa reabilitação (...) Devia ter sido feita desde o início”.

Percorrendo o Relatório Pericial e o Parecer e ouvida a gravação dos esclarecimentos prestados pela Senhora Perita e pelo Senhor Professor, assiste razão aos recorrentes. Em audiência, admitiu o Senhor Professor que o traumatismo também pode causar a quebra dos parafusos, mas essa hipótese não foi equacionada nos quesitos formulados, nem dispõe de elementos para dizer que, neste caso, foi o que sucedeu. Considerou a sobrecarga oclusal dos dentes anteriores como a causa “mais provável” da fractura dos parafusos, não tendo excluído o traumatismo.

No entanto, dos esclarecimentos prestados pelo Senhor Professor decorre que na reabilitação oral, as considerações protéticas devem merecer uma avaliação aprofundada, na fase de planeamento pois, «se não for salvaguardado um bom equilíbrio oclusal e se a reabilitação levar a uma sobrecarga mecânica nos dentes reabilitados podem surgir fracturas das coroas, dos parafusos de fixação e, em casos mais severos, do próprio implante.». Foram colocados, ao autor, dois implantes a suportar quatro coroas de dentes (mencionados nos pontos 4.1, 4.2 e 28 dos factos provados), o que significa uma força bastante intensa. No caso da mastigação não ser feita pelos dentes posteriores, como é o caso do autor, há uma tendência de sobrecarga oclusal dos dentes anteriores que pode provocar a fractura dos parafusos. Na situação concreta do autor, a reabilitação posterior devia ter sido feita para permitir um equilíbrio na força mastigatória pois, a concentração da força localizava-se nos seus dentes anteriores.

Assim, procede parcialmente a impugnação da decisão quanto ao ponto 80 dos factos provados, passando a constar do mesmo a seguinte redacção:

Foram colocados, ao autor, dois implantes a suportar quatro coroas de dentes (mencionados nos pontos 4.1, 4.2 e 28 dos factos provados), situação que, no caso do autor, gera uma tendência de sobrecarga oclusal dos dentes anteriores que pode provocar a fractura dos parafusos.

Factos ínsitos no ponto n) dos factos não provados [“n) a fractura referida em 27) tivesse sido provocada por uma pancada com um tablet, desferida ao autor, na zona da ponte, pela filha do mesmo, quando estava na cama dos pais.”.]

Dissentem ambos os recorrentes da decisão proferida quanto à matéria de facto por referência ao ponto n) dos factos não provados, pretendendo que seja transferido para a matéria de facto provada.

A recorrente sustenta a sua pretensão no depoimento prestado pela testemunha KK e o recorrente advoga que foi, vastamente, relatado, e por diversas pessoas, que o Autor “terá sofrido uma pancada com um tablet na zona dos implantes em referência, provocada pela sua filha menor, quando o manuseava na cama que partilhava com os pais, causando, assim, a fractura dos parafusos da ponte”. Além das declarações prestadas pelo autor e pela Médica BB, invoca o depoimento prestado pelas testemunhas LL – mãe do autor -, e KK - assistente, na clínica.

A versão do autor quanto ao referido episódio do tablet, analisada à luz das regras da experiência comum, não se mostra plausível. Caso o incidente tivesse ocorrido como relatou, não se descortina qual a razão para o ter narrado, à Médica BB, no âmbito de uma consulta. Acresce que negou a existência de tablet, tendo a sua mãe, a testemunha LL, declarado que a neta “manuseava um tablet”.

Declarou a interveniente BB que quando o autor chegou ao consultório, em Março de 2016 e queixou-se que tinha a estrutura a abanar – mais, ainda tinha os dentes colocados -, verificou que os parafusos proteicos encontravam-se fracturados. “Fez um raio x e bastou tocar naquilo que se soltou”. Narrou o sucedido da seguinte forma: A sua primeira pergunta foi “o que aconteceu aqui?” e disse-lhe “só um trauma podia ter provocado a fractura do parafuso”. O autor respondeu-lhe que “de traumas o que se lembrava era o embater de um tablet” e que “ele tinha uma criança pequenina que usava esse tablet e quando [ela] estava entre os pais”, levou “com o embate do tablet”. Não lhe foi transmitido quando esse acontecimento sucedeu, se tinha ocorrido no dia anterior ou quatro ou cinco dias antes ou outra data.

Das declarações da Médica BB não resulta, como pretendem os recorrentes, que o autor tenha assumido que os parafusos foram fracturados com o embate do tablet. Da análise crítica e conjugada da prova resulta, apenas, que o autor transmitiu recordar-se somente de uma situação de embate nos parafusos, sem localização temporal desse acontecimento e sem estabelecer qualquer nexo entre esse acontecimento e a fractura dos parafusos.

A testemunha KK, assistente da ré, curiosamente, relata o sucedido de forma diversa. Referiu que o “Sr. AA apareceu lá na consulta, com a ponte a abanar e tinha os parafusos partidos. A Doutora perguntou o que é que se tinha passado e o Sr. AA disse o motivo porque é que aquilo tinha acontecido. Foi que, na altura, a filha dormia com o casal, no meio do casal, e adormecia-se…A filha dormia sempre com um tablet…E que a filha, sem querer, lhe mandou com o tablet, pronto, na boca, sim. E pronto, e depois aquilo começou a abanar, e foi por isso que depois foi lá à clínica. Para ver essa situação”.

O depoimento da testemunha DD, sobre esta matéria, resulta do que foi transmitido pela testemunha KK.

Do Registo dos Actos Médicos não existe qualquer referência ao traumatismo como causa da fractura dos parafusos mas, apenas, “2 de março de 2016, fratura dos parafusos da ponte, … tentativa de remoção de parte do parafuso dentro do implante, com vibração (ultrasons) e com broca mas não se conseguiu! Vai-se pedir emprestado o kit de remoção de parafuso da BioNTech para nova tentativa”.

Confrontada com tal circunstância, BB justificou a ausência de registo porque a fractura com o tablet não constitui acto médico para ser sujeito a registo. Dúvidas não subsistem que não se trata de acto médico. No entanto, a causa da fractura dos parafusos respeita a um acto médico. Acresce que no Registo de Actos Médicos consta o registo das faltas às consultas e também não se vislumbra que esteja em causa um acto médico.

A Médica BB, confrontada com a pergunta “a clínica teve alguma atenção?”, respondeu “tudo relacionado com a tentativa de nova reabilitação, nunca houve cobrança extra ao paciente: os desgastes, os novos implantes”; não pagou porque “tinha sido um trabalho recente e como tal tivemos essa atenção na ajuda ao paciente”. Referiu que “um trabalho caro e recente, por norma, há uma garantia que se dá” e “corresponde ao custo inicial do que o autor tinha pago”. Essa decisão foi tomada em conjunto, por si e com a Dr.ª DD.

DD, legal representante da ré, negou que não tivesse sido cobrada qualquer quantia ao autor por referência aos segundos implantes. Confrontada com a versão apresentada pela Médica BB, referiu “o que não foi cobrado foi a parte do acidente, aquele Kit que a Drª BB teve de usar para tentar tirar os parafusos, as tentativas de se retirar o parafuso” e justificou essa atitude “porque ficamos sensíveis à situação do Sr. AA e quisemos ajudar”.

Em sentido diverso, depôs a testemunha EE, sócio da ré. Declarou que qualquer médico tinha capacidade para fazer descontos. A situação do autor foi “falada consigo. A BB veio ao meu gabinete”. A clínica estava aberta há 5/6 anos e era novidade na cidade o implante, estando este trabalho a dar bom nome à clínica. Explicou que “BB veio perguntar-me o que podia fazer no caso do cliente AA. Na altura, nós facilitávamos. Sugerimos que a Clínica suportava uma parte dos custos de repetição do trabalho”, mas já não se recorda qual o valor. Feita a pergunta “O que disseram ao cliente?”, a testemunha respondeu “eu no meu espírito não sabia quanto a Doutora ia ter de gastos para refazer o trabalho, do ponto de vista dos laboratório; se não fosse demasiado, a clínica assumiria. Basicamente terá sido dito ao cliente “vamos procurar resolver isto sem o senhor ter problemas”. Feita a pergunta “o que BB lhe propôs em concreto?”, respondeu “o que podia fazer pelo paciente” e nessa altura, disse à Médica BB “vamos procurar o melhor possível para o cliente” e isso consistia em “ele não ter custos”.

Sendo esta a prova produzida, não se encontra demostrado o facto constante do ponto n). Dúvidas se suscitam quanto ao depoimento da testemunha KK pois, não é plausível, à luz das regras da experiência comum, que a ré assumisse o pagamento do segundo tratamento, tendo conhecimento que o autor havia assumido que o insucesso do primeiro tratamento lhe era imputável. Segundo a testemunha EE, a Médica BB elaborou um relatório sobre o sucedido com o primeiro tratamento ao autor, o que causa ainda maior perplexidade a ausência de registo da causa da fractura dos parafusos.

Improcede, assim, nesta parte, a impugnação da decisão da matéria de facto.

Facto ínsito no ponto r) dos factos não provados [“r) o agendamento da realização da TAC referida em 56), para os dias 29-01-2019 e 26-03-2019, tivesse sido concertado ou comunicado ao autor e que este tivesse faltado sem prestar justificação;”]

Dissente a recorrente/ré da decisão proferida quanto à matéria de facto por referência ao ponto r) dos factos não provados, pretendendo que seja transferido para a matéria de facto provada.

Sustenta que no ponto 56, o Tribunal a quo considerou provado que o A. faltou no dia 22.01.2019. Todavia, não considerou demonstrada a factualidade vertida no ponto r), pese embora os elementos de prova sejam exactamente os mesmos: ambos resplandecem do Registo de Actos Médicos. Se foi considerado para o agendamento da TAC para o dia 22.01.2019, também deveria ser para as outras datas e respectivas faltas do A., factualidade que se mostra confirmada pela assistente clínica KK que procedeu a tais reagendamentos.

Ouvida a gravação do depoimento prestado pela testemunha KK, assistente da ré que procedeu ao reagendamento da TAC e contactou o autor a propósito de cada reagendamento, em conjugação com o teor do Registo de Actos Médicos, assiste razão à recorrente. O telefonema mencionado pela legal representante foi pela mesma localizado após as três marcações e não em data anterior às duas marcações, motivo pelo qual falece o raciocínio exposto pelo Tribunal a quo.

Procede, assim, a impugnação da matéria de facto por referência ao ponto r) dos factos provados e, em consequência:
i. Elimina-se o ponto r) dos factos não provados.
ii. Altera-se o ponto 56) dos factos provados, passando a constar do mesmo a seguinte redacção: “A realização da TAC foi agendada para os dias 22-01-2019, 29-01-2019 e 26-03-2019, datas concertadas com o autor, não tendo este comparecido, nem apresentado justificação”.

Facto ínsito no ponto t) dos factos não provados [“t) as faltas do autor às consultas, referidas nos factos provados, tivessem comprometido a execução do tratamento;”] e Facto ínsito no ponto oo) dos factos provados [“oo) o referido em 57) tivesse condicionado o sucesso clínico dos actos médicos praticados pela interveniente BB.;”]

Dissentem as recorrentes da decisão proferida quanto à matéria de facto por referência ao ponto t) dos factos não provados, pretendendo que seja transferido para a matéria de facto provada. Insurge-se a ré, ainda, contra a decisão proferida quanto à matéria de facto por referência ao ponto oo) dos factos não provados, pretendendo que seja transferido para a matéria de facto provada.

O ponto t) dos factos provados contém um juízo conclusivo[10] e não qualquer facto, o mesmo sucede com o ponto oo) dos factos não provados[11].

A matéria de facto à qual há que aplicar o direito tem de cingir-se a verdadeiros factos e não a meros juízos conclusivos, razão pela qual improcede a impugnação da decisão da matéria de facto, nesta parte.

Facto ínsito no ponto u) dos factos não provados [“u) Quer no início do tratamento, quer durante a sua execução, o autor tivesse sido informado do tempo de duração do mesmo, da fase de adaptação, da importância da assiduidade, da remoção temporária, contenção e estabilidade]

Dissente a recorrente/ré da decisão proferida quanto à matéria de facto por referência ao ponto u) dos factos provados, pretendendo que seja transferido para a matéria de facto provada.

O Autor negou esta factualidade sendo em sentido contrário a versão apresentada pela Médica BB. Convoca-se o supra exposto quanto à valoração das declarações prestadas por autor e interveniente acessória.

Pela legal representante foi dito que a Médica BB registava todos os seus actos. Considerando o teor dos actos que se mostram registados e os esclarecimentos prestados pela Senhora Perita e pelo Senhor Professor, a propósito dos esclarecimentos quanto aos registos efectuados pela Médica BB, à informação veiculada ao autor e à circunstância de não existir um plano de tratamento [que] estivesse bem apresentado, bem detalhado, temporalmente estabelecido], não se encontra demonstrada o quadro factual constante do ponto u) dos factos não provados.

Improcede, nesta parte, a impugnação da decisão da matéria de facto.


Facto ínsito no ponto bb) [bb)“quando do referido em 2) o autor tivesse sido devidamente informado e elucidado sobre a necessidade da reabilitação protética das zonas posteriores, a fim de dar suporte à reabilitação efectuada no sector anterior;”], Facto ínsito no ponto cc) [“cc) o autor tivesse compreendido o referido em bb) e manifestado que a sua prioridade seria a reabilitação da zona antero-superior, por razões estéticas;”], Facto ínsito no ponto dd) [“dd) o autor tivesse comunicado à assistente, nomeadamente no dia 03-11-2014, que, por factores económicos, não pretendia a reabilitação das zonas posteriores;”], Facto ínsito no ponto ee) [“ee) antes de 09-05-2017, a assistente tivesse informado e alertado o autor, reiteradamente, para a necessidade de um tratamento global, com reabilitação quer da zona anterior, quer da zona posterior, para que o resultado final do tratamento fosse plenamente alcançado;”], Facto ínsito no ponto ff) [“ff) quando do referido em 65) (11-11-2014), a assistente tivesse instruído e motivado o autor para a necessidade de melhoria de higiene oral, que era bastante deficitária e poderia comprometer o sucesso do tratamento;”], Facto ínsito no ponto ii) [“ii) antes do referido em 27) e em 41), a assistente tivesse comunicado ao autor e este soubesse que a não realização da reabilitação das zonas posteriores diminuía a eficácia dos implantes colocados;”], Facto ínsito no ponto jj) [jj)“quando do referido em 2), o autor tivesse sido alertado para a importância da necessidade de reabilitar tanto a zona posterior, como a zona anterior das suas maxila e mandíbula, por forma a não comprometer o sucesso do tratamento proposto e tivesse optado por colocar, apenas, os implantes e as coroas/ponte referidas em 4.1) e 4.2);”], Facto ínsito no ponto kk) [“kk) quando do referido em 75), a Dr.ª BB tivesse dito ao autor que tal era necessário para não comprometer o sucesso do tratamento na zona anterior;”], Facto ínsito no ponto ll) [“ll) quando do referido em 75), tivesse sido transmitido ao autor que a reabilitação da zona posterior da maxila e mandíbula, quer através da colocação de implantes, quer através da colocação de uma prótese parcial removível, solução mais económica – se mostrava essencial no conjunto do tratamento de reabilitação oral que lhe foi proposto, para salvaguarda da função mastigatória, que estava comprometida, face à ausência das indicadas peças dentárias 16, 35, 36 e 46, evitando-se a sobrecarga na zona anterior; “] e Facto ínsito no ponto mm) [“mm) antes de 09-05-2017 o autor tivesse sido devidamente alertado para a necessidade de reabilitar a zona posterior da maxila e mandíbula e tivesse optado por não a concretizar;”], todos dos factos não provados

Dissentem as recorrentes da decisão proferida quanto à matéria de facto por referência aos pontos bb), ii), jj), kk), e mm) dos factos não provados, pretendendo que seja transferido para a matéria de facto provada. Dissente, ainda, a recorrente/ré da decisão proferida quanto à matéria de facto por referência aos pontos cc), dd), ee), ff) e ll) dos factos não provados, pretendendo que seja transferido para a matéria de facto provada.

Sustentam tais pretensões nos esclarecimentos prestados pelo Senhor Professor GG e pela Senhora Perita.

São contraditórias as versões narradas em audiência, pelo Autor e pela Médica BB, convocando-se o supra exposto quanto à valoração das declarações prestadas por ambos.

Ouvida a gravação dos esclarecimentos prestados pelo Senhor Professor GG, salvo o devido respeito, não assiste razão às recorrentes.

Inquirido sobre “qual era o hiato temporal da duração deste tratamento de reabilitação?”, o Senhor Professor GG respondeu “A reabilitação foi orientada apenas para... ou pelo menos, a fazer fé no que consta do processo clínico, só para os dentes anteriores. E foi remetida para uma hipótese complemento... a complementar esse tratamento a nível posterior, com implantes ou prótese removível. Mas não foi definida temporalmente essa reabilitação (...) Devia ter sido feita desde o início”.

Sobre o hiato decorrido entre a data da colocação da prótese e a data da ocorrência da fractura ser suficiente para a realização da reabilitação posterior, o Senhor Professor referiu que não pode pronunciar-se com objectividade porque “não sei qual era o plano de reabilitação posterior”. Na primeira consulta, é feita a referência à necessidade de reabilitação posterior. Depois desta consulta, só volta a ser mencionada a necessidade de reabilitação posterior após a ocorrência da factura. Na proposta terapêutica inicial há uma recomendação de reabilitação integral, mas não há um plano de reabilitação posterior, convocando-se, ainda, a resposta ao quesito quarto.

Inquirido sobre “o que contribuiu para o insucesso?”, o Senhor Professor respondeu “É difícil dizer com os elementos disponíveis. Ficaria mais confortável, sob o ponto de vista técnico profissional, se o plano de tratamento estivesse bem apresentado, bem detalhado, temporalmente estabelecido e fosse apresentado ao doente. De facto uma reabilitação deste tipo, com este tipo de recursos, pressupõe uma reabilitação da cavidade oral, de todos os dentes da cavidade oral e dificilmente se resolve com uma solução sectorial, principalmente no dente anterior, nos dentes anteriores, nos quatro dentes anteriores. São soluções muito difíceis de ter sucesso em termos de reabilitação”.

Feita a pergunta “esta implantação/tratamento sectorial não foi a proposta inicial? A proposta inicial passa por uma reabilitação integrada, anterior e posterior?”, o Senhor Professor GG respondeu “Não me parece. Aquilo que nós temos na primeira consulta, é exactamente a avaliação da colocação de implantes, focada na parte anterior, focada exactamente nessa área, os quatro incisivos. E depois deixa-se para o paciente ponderar e agendar a possibilidade de fazer uma prótese parcial removível posterior, se não fizer implantes posteriores.” Na sua opinião, esta avaliação inicial está “centrada na componente anterior” e não na reabilitação integrada.

Segundo o Parecer emitido pelo Senhor Professor, em audiência, a nível técnico, a solução inicial adoptada, se acompanhada da complementaridade de reabilitação posterior, poderia ser satisfatória, do ponto de vista estético. Do ponto de vista funcional, já é questionável. Explicou que “ficaria mais confortável, sob o ponto de vista técnico -profissional, se o plano de tratamento estivesse bem apresentado, bem detalhado, temporalmente estabelecido e fosse apresentado ao doente. De facto uma reabilitação deste tipo, com este tipo de recursos, pressupõe uma reabilitação da cavidade oral, de todos os dentes da cavidade oral e dificilmente se resolve com uma solução sectorial, principalmente nos dentes anteriores, nos quatro dentes anteriores. São soluções muito difíceis de ter sucesso em termos de reabilitação”.

Pedido o esclarecimento à Senhora Perita, se nos registos, existe menção de reabilitação posterior, quer com implantes, quer com PPR?”, respondeu “A 29 de Agosto de 2017, foram tirados moldes para construir uma prótese parcial removível esquelética”. Salienta-se que os primeiros implantes – a primeira cirurgia – ocorreu em Novembro de 2014, ou seja, os moldes para a reabilitação posterior datam de três anos depois da primeira cirurgia para colocação dos primeiros implantes.

Sendo esta a prova, não se encontra demonstrado o esclarecimento do autor. Importa salientar que pelo Senhor Professor foi transmitido que a decisão sobre o tratamento adequado cabe ao profissional de saúde e não ao doente, convocando-se, ainda, os esclarecimento prestados pela Senhora Perita sobre a motivação do doente e o que se impõe ao profissional de saúde, antes de avançar para a execução da reabilitação.

Pelo exposto e sem necessidade de mais considerandos, não se encontra demonstrada a factualidade vertida nos ponto bb), cc), dd), ee), ff), ii), jj), kk, ll), e mm) dos factos não provados.

Invoca a ré, a propósito do ponto bb) dos factos não provados, a contradição insanável entre os factos vertidos nos pontos 41 [41) “Em 09-05-2017 a Dr.ª BB avisou o paciente para a necessidade de reabilitação protética do maxilar inferior e do superior, a nível posterior.”] e 69 [“Em 11-12-2017 a assistente alertou o autor para os cuidados a ter com os implantes, fez recomendações sobre o modo de cortar os alimentos, sobre os cuidados de higiene a adoptar, sobre o modo de usar os implantes, uma vez que estes teriam apenas um efeito estético e não a função de uns dentes incisivos naturais”] dos factos provados e o facto ínsito no ponto bb) dos factos não provados.

Da simples leitura dos factos, facilmente se constata que se reportam a momentos diverso. O facto vertido no ponto 41 reporta-se ao sucedido no dia 9 de Maio de 2017. O facto vertido no ponto 69 reporta-se ao sucedido no dia 11 de Dezembro de 2017. O facto vertido no ponto bb) respeita ao momento que se encontra indicado no ponto 2 dos factos provados. Não se verifica, assim, a alegada contradição.

Como refere o Tribunal a quo, o despacho de 12/6/2024, “dos registos clínicos dos actos médicos prestados ao autor não se extrai um plano cabalmente definido, com tempos de execução de cada fase, opções claras comunicadas ao paciente e vantagens e desvantagens de cada uma, nem que este tenha sido devidamente informado e advertido, ab initio, que caso optasse por começar com a colocação de implantes na parte anterior do maxilar superior, como sucedeu, era necessário que, em simultâneo ou a breve trecho reabilitasse a parte posterior dos maxilares, de forma a garantir a retenção dos implantes e da ponte colocada nos dentes 12, 22 e 11 e 21.

Com efeito, o registo de tal informação surge, apenas, em 09-05-2017 e em 11-12-2017, volvidos dois anos e oito meses desde o início do tratamento e já após a fractura dos parafusos dos implantes colocados em 12 e 22. O mesmo se diga quanto à necessidade de não utilizar os “dentes” da frente para mastigar e triturar alimentos.».

Improcede, nesta parte, a impugnação da decisão da matéria de facto.

Facto ínsito no ponto gg) dos factos não provados [“gg) o autor tivesse faltado à consulta no dia 05-01-2015;”]

Dissente a recorrente/ré da decisão proferida quanto à matéria de facto por referência ao ponto gg) dos factos não provados, pretendendo que seja transferido para a matéria de facto provada.

Sustenta esta pretensão, invocando que o ponto gg) dos factos não provados encontra-se em contradição com o facto considerado provado e que até serviu para o iter cognitvo e decisório do Tribunal a quo, como se alcança por simples cotejo com a pp. 43, 1º parágrafo da sentença, pelo que também, este ponto deveria ter merecido resposta positiva.

No despacho proferido em 12/6/2024, o Tribunal a quo procedeu à rectificação do lapso que consta a fls. 43 da sentença, passando a constar da motivação “faltou a sete consultas (06-01-2015, 27-04-2015, 27-06-2016, 19-07-2016, 03-01-2017, 23-01-2018 e 23-10-2018), num período de quatro anos e quatro meses.”.

Pelo exposto, improcede a impugnação.

Facto ínsito no ponto nn) dos factos não provados [“nn) os implantes e as coroas referidos em 4.1) e 11) tivessem sido colocados de forma e na posição correctas;”]

Dissente a recorrente da decisão proferida quanto à matéria de facto por referência ao ponto nn) dos factos provados, pretendendo que seja transferido para a matéria de facto provada.

Sustenta que “a Sr.ª Juiz decidiu para lá da prova e mesmo contra a prova”. Está em causa matéria que pressupõe conhecimentos técnicos. Da peritagem, efectuada pela Senhora Prof.ª Dr.ª FF, e da avaliação feita pelo Conselho Técnico, à luz do cumprimento das legis artis dos actos médicos prestados, relatada pelo Senhor Prof. Dr. GG, não existe sequer o resquício de os implantes ou as coroas terem sido mal colocados. Mais, em nenhum deles, os Srs. Peritos se atreveram a afirmar que tenha havido por parte da médica BB qualquer violação das legis artis. E se não houve violação das legis artis, significa que os actos médicos prestados cumpriram as normas técnicas convocáveis e aplicáveis ao caso concreto.

Salvo o devido respeito, dos esclarecimentos prestados pelo Senhor Professor Doutor GG, não se pode concluir que a Médica BB tenha cumprido todas as normas. A título de exemplo, veja-se o que o Senhor Professor referiu sobre o estudo prévio que se mostra necessário fazer antes de efectuar qualquer plano de reabilitação oral e quais os exames e elementos de que o profissional de saúde se deve socorrer previamente ao planeamento da reabilitação por contraposição ao estudo, ou falta dele, efectuado pela Médica BB.

A título de exemplo, veja-se também o esclarecimento prestado pelo Senhor Professor quanto aos parafusos: “numa situação normal, os parafusos estão feitos de forma a suportarem exactamente esse tipo de esforços. No caso de haver uma sobrecarga, que é isso que eu refiro, excesso de mastigação, eventualmente, esses parafusos podem partir. Até porque não podemos esquecer que havia apenas dois implantes a suportar quatro coroas de dentes”.

Como já foi explicado, pelo Senhor Professor GG foi prestado o esclarecimento que “A reabilitação foi orientada apenas para... ou pelo menos, a fazer fé no que consta do processo clínico, só para os dentes anteriores. E foi remetida para uma hipótese complemento... a complementar esse tratamento a nível posterior, com implantes ou prótese removível. Mas não foi definida temporalmente essa reabilitação (...) Devia ter sido feita desde o início”.

Referiu, ainda, que na primeira consulta, é feita a referência à necessidade de reabilitação posterior. Depois desta consulta, só volta a ser mencionada a necessidade de reabilitação posterior após a ocorrência da factura. Na proposta terapêutica inicial há uma recomendação de reabilitação integral, mas não há um plano de reabilitação posterior.

A titulo de exemplo, veja-se o esclarecimento prestado pela Senhora Perita a propósito do tempo de duração do tratamento: a colocação de implantes tem as seguintes etapas: a primeira consiste na colocação de implantes, aguardando-se, de seguida, três meses para a osteointegração do implante; estando osteointegrado, faz-se a impressão para a superestrutura, demorando um mês a vir do laboratório .essas impressões demoram um mês a vir do laboratório. O período de “seis meses, é exequível, já contabilizando alguma falha de material; seis meses seria o adequado para tornar funcional a reabilitação anterior”, acrescentando “poderia ser reforçado o apoio posterior enquanto é feita a reabilitação dos dentes anteriores”.

Confrontada com a situação dos autos - decorreram três anos até serem retiradas as impressões para a reabilitação posterior -, a Senhora Perita esclareceu que três anos é “um tempo demasiado longo” para a reabilitação anterior; “é uma excepção; não é um intervalo de tempo que seja considerado dentro dos parâmetros mais usuais”; “quando há situações inesperadas, pode alargar um pouco, entre seis meses e um ano, sendo o doente visto e monitorizado”, durante esse hiato.

Sobre o consentimento livre e esclarecido do doente, referiu que pressupõe que a este sejam apresentados vários modelos de tratamento, salientando, no entanto, ao doente deve ser conferida a possibilidade de escolha mas, a “decisão é sempre do Clínico, pois, é o profissional que tem conhecimentos técnicos para adaptar o plano de reabilitação da cavidade bucal ao condicionalismo concreto que se verifica.

Ao quesito “A que deve atribuir-se o insucesso da colocação dos pretendidos implantes, ou como se explica o referido insucesso”, a Senhora Perita respondeu “deve atribuir-se, segundo os dados documentais, à diminuída retenção da ponte sobre os mesmos”. Explicou que a retenção é atribuída à sedimentação. Colocada a 30 de Março, a superestrutura não teve capacidade para ficar no local, sendo, portanto, diminuída a retenção, acrescentado a Senhora Perita que não tem qualquer dado concreto que lhe permita dizer a razão da diminuída retenção.

Estes são apenas alguns dos esclarecimentos prestados pela Senhora Perita e pelo Senhor Professor que nos impedem de considerar demonstrado que os implantes e as coroas referidos em 4.1) e 11) foram colocados de forma e na posição correctas.

. Os parafusos colocados nos primeiros implantes foram fracturados e a Médica BB não os conseguiu extrair. As coroas colocadas caíram. Perante este quadro fáctico e não tendo sido apurada a causa, não se mostra possível concluir no sentido vertido no ponto nn) dos factos provados.

Importa salientar que a não prova de um facto equivale à não articulação desse facto, tudo se passando como se tal facto não existisse, não se podendo retirar da não prova de certo facto a prova do facto contrário.

Improcede, nesta parte, a impugnação da decisão da matéria de facto.


*

Em conclusão, procede parcialmente a impugnação da decisão da matéria de facto, deduzida pelo Autor e a impugnação da decisão da matéria de facto, deduzida pela Ré, e, em consequência:
I.Altera-se o ponto 22 dos factos provados, passando a constar do mesmo a seguinte redacção: Antes da realização dos tratamentos referidos, o autor era sociável, gostava de conviver com outras pessoas e de frequentar espaços públicos.”.
II.Altera-se o ponto 56) dos factos provados, passando a constar do mesmo a seguinte redacção: “A realização da TAC foi agendada para os dias 22-01-2019, 29-01-2019 e 26-03-2019, datas concertadas com o autor, não tendo este comparecido, nem apresentado justificação”.
III.Altera-se o ponto 80 dos factos provados, passando a constar do mesmo a seguinte redacção: Foram colocados, ao autor, dois implantes a suportar quatro coroas de dentes (mencionados nos pontos 4.1, 4.2 e 28 dos factos provados), situação que, no caso do autor, gera uma tendência de sobrecarga oclusal dos dentes anteriores que pode provocar a fractura dos parafusos.
IV.Adita-se ao factos provados o ponto pp) com a seguinte redacção: Antes da realização dos tratamentos referidos, o autor era uma pessoa alegre”.
V.Elimina-se o ponto r) dos factos não provados.

5ª Questão

Dissentem as recorrentes da decisão proferida pelo Tribunal a quo que declarou resolvido o contrato celebrado entre o autor e ré, sustentando que “foram cumpridas, pela médica-dentista, todas as diligências”, verificando-se “um tratamento incompleto, por responsabilidade do paciente, e não um tratamento defeituoso, por responsabilidade da R.”.

Advogam que a obrigação de prestar cuidados médicos constitui uma obrigação de meios e não de resultado pelo que, não há lugar à inversão do ónus da prova.

A quantia peticionada de 3.138,00€ aglomera actos médicos que nem sequer estiveram em discussão nos autos, como é o caso das reabilitações dos dentes 37 e 13.

Conforme já se explicitou, do acervo factual provado resulta que os serviços médicos prestados pela Médica BB ao autor ocorreram no âmbito de uma relação contratual estabelecida entre este e a ré. A Médica BB, dentro da sua esfera de autonomia, interveio enquanto “auxiliar” da ré, no quadro das funções que lhe estavam atribuídas por esta. Estamos, assim, perante um contrato de prestação de serviço que consistia num tratamento médico dentário, a efectuar pela ré ao autor, mediante retribuição (art. 1154º do C. Civil). Esse contrato de prestação de serviço, embora socialmente típico, não está especialmente regulado. Assim, na disciplina do mesmo há que, como previsto no artigo 1156º do C. Civil, aplicar, com as necessárias adaptações, as disposições sobre o mandato constantes dos artigos 1157º e seguintes do C. Civil.

Nos termos desse contrato, a clínica/ré, a prestadora de serviço de saúde assume as obrigações correspondentes ao contrato de prestação de serviço médico e é quem responde integralmente perante o paciente credor (ora autor).
Assim, a ré é responsável perante o autor, nos termos do artigo 800.º, n.º 1, do CC, pelos actos da Médica BB, na execução das prestações médicas convencionadas, como se tais actos fossem praticados por aquela devedora.
À relação jurídica estabelecida entre autor e ré é aplicável o instituto da responsabilidade contratual. A responsabilidade da ré (clínica), pelos actos médicos praticados por Médica BB deve ser aferida em função dos ditames que à Médica cumpria observar na realização da prestação médica ao autor, ao serviço da ré[12].

Sobre a natureza das obrigações inerentes à prática de actos médicos, ensina o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 23/3/2017, já por nós citado e que permitimo-nos respeitosamente transcrever uma parte da sua fundamentação:

«De um modo geral, tem-se entendido que o resultado correspondente ao fim visado pelo contrato de prestação de serviço de ato médico não deve ser considerado como a cura da patologia que estiver em causa, mas sim como o tratamento adequado dessa patologia mediante a observância diligente e cuidadosa das regras da ciência e da arte médicas (leges artis), posto que a prática da medicina encerra, em regra, uma natureza complexa e aleatória derivada da própria complexidade dos sistemas psico-somáticos humanos, a par do estado e desenvolvimento dos conhecimentos científicos e técnicos disponíveis. Nessa medida, a obrigação de prestação do ato médico configura-se como uma obrigação de meios, por parte do médico, na obtenção do tratamento adequado.

Ora, no campo da responsabilidade contratual emergente de uma obrigação de meios, coloca-se a questão da distinção entre a vertente da ilicitude e a vertente da culpa, mormente para efeitos de repartição do ónus de prova, à luz das regras constantes dos artigos 342.º, n.º 1, 798.º e 799.º do CC.
Assim, é comumente entendido pela doutrina e jurisprudência que, no quadro de uma típica obrigação de resultado, incumbe ao credor lesado provar a ocorrência desse resultado como facto constitutivo que é da obrigação de indemnizar (art.º 342.º, n.º 1, e 798.º do CPC), face ao que se presume a culpa do devedor lesante, sobre quem recai o ónus de ilidir tal presunção legal, nos termos do artigo 799.º do CC.
Já no domínio das obrigações de meios, tem-se entendido que impende sobre o credor lesado (o paciente) provar não só a falta de verificação do resultado pretendido, mas também a falta de cumprimento do dever objetivo de diligência ou de cuidado, nomeadamente requerido pelas leges artis, como pressuposto de ilicitude, incumbindo, por seu turno, ao devedor o ónus de provar a inexigibilidade desse comportamento, a fim de ilidir a presunção da culpa.
Segundo o ensinamento de Almeida Costa, as obrigações de meios, que ocorrem com mais frequência no domínio das obrigações de prestação de facto positivo, em particular nas que se prendem com atividades profissionais liberais: “(…) são aquelas em que o devedor apenas se compromete a desenvolver, prudente e diligentemente, certa atividade para a obtenção de um determinado efeito, mas sem assegurar que o mesmo se produza” …. “Daí que o devedor fique exonerado na hipótese de o cumprimento requerer uma diligência maior do que a prometida, e que tanto a impossibilidade objectiva como a subjectiva não imputáveis ao devedor o liberem (artigos 790.º e 791.º)”.
E, conforme observa Carneiro da Frada, nas obrigações de meios, há que fazer a distinção entre a finalidade da obrigação, dirigida ao resultado pretendido, e o conteúdo estruturante do próprio dever objetivo de diligência ou de cuidado, sendo que a falta de cumprimento da obrigação ou o seu cumprimento defeituoso se aferem não pelo respetivo escopo, mas sim em função do teor daquele dever. Tal distinção torna-se, pois, essencial para equacionar a distribuição do ónus probatório sobre os pressupostos da responsabilidade civil emergente da falta de cumprimento ou do cumprimento defeituoso no quadro de uma obrigação de meios, nomeadamente em sede do disposto no artigo 799.º, n.º 1, do CC.
Quando a obrigação é de meios ou de diligência, segundo Carneiro da Frada:
“… é então ao devedor que compete identificar e fazer provar a exigibilidade de tais meios ou da diligência (objectivamente) devida. A presunção de culpa tende portanto a confinar-se à mera censurabilidade pessoal do devedor. Por outras palavras, se a falta de cumprimento carece de ser positivamente demonstrada pelo credor lesado, esta exigência traduz-se aqui, em termos práticos, na demonstração da ilicitude da conduta do devedor.
Tudo isso comporta a formulação do art.º 799.º, n.º 1, do CC. Nas obrigações de meios, (…) dada a ausência de um resultado devido, não é suficiente que o credor demonstre a falta de verificação do resultado. Ele tem sempre de individualizar uma concreta falta de cumprimento (ilícita). Dada a índole da obrigação, carece de demonstrar que os meios não foram empregues pelo devedor ou que a diligência prometida com vista a um resultado não foi observada.”
Por sua vez, Antunes Varela, embora critique a tese que de que a violação do dever objectivo de cuidado exigível se coloque no plano da ilicitude, considerando que “não é essa, manifestamente, a concepção de ilicitude no direito civil português”, o certo é que, ao tratar do tema da “presunção de culpa”, na órbita da responsabilidade contratual, acaba por considerar que “nas obrigações de meios não bastará (…) a prova da não obtenção do resultado previsto com a prestação, para se considerar provado o não cumprimento.” E, tomando como exemplos as profissões de médico e de advogado, acrescenta que “é necessário provar que o médico ou o advogado não realizaram os actos em que normalmente se traduziria uma assistência ou um patrocínio diligente, de acordo com as normas deontológicas aplicáveis ao exercício da profissão].
De acordo com esta orientação doutrinária, por exemplo, o acórdão do STJ, de 11/07/2006, proferido no processo n.º 06A1503, considerou que:
“É de meios, não de resultado, a obrigação a que o cirurgião se vincula perante a doente com quem contrata a realização duma cirurgia à glande tiróide (tiroidectomia) em determinado hospital”.
Todavia, ante a frequente onerosidade da prova para o paciente sobre a inobservância das leges artis, por parte do médico, têm vindo a ser consideradas outras soluções, entre as quais a que tem procurado distinguir a actividade médica de carácter mais geral, aleatório ou complexo, e as atividades médicas especializadas em que a margem de risco seja ínfima. Nessa base, tem sido considerado que, nestes tipos de atividade, a obrigação do médico se poderá traduzir numa obrigação de resultado, fazendo recair sobre ele o ónus de provar, no plano da culpa, que a ocorrência desse resultado não decorre de falta de cuidado ou imperícia, nomeadamente por inobservância das leges artis.
Nesta linha, podemos citar os seguintes acórdãos do STJ:
- o acórdão de 15/12/2011, proferido no processo n.º 209/06. 3TVPRT.P1.S1, no qual se observa que “(…) casos há em que o médico está vinculado a obter um resultado concreto, constituindo exemplo de escola a cirurgia estética de embelezamento (mas já não a cirurgia estética reconstrutiva geralmente considerada como exemplo cirúrgico de obrigação de meios), a par da execução das manobras próprias de parto, no campo da odontologia, por exemplo, a simples extracção de um dente ou colocação de um implante, a ainda nas áreas de vasectomia e exames laboratoriais”;
- o acórdão de 07/10/2010, proferido no processo n.º 1364/05. 5TBBCL.G1, em que se considerou que:
“Em regra, a obrigação do médico é uma obrigação de meios (ou de pura diligência), cabendo, assim, ao lesado fazer a demonstração em juízo de que a conduta (acto ou omissão) do prestador obrigado não foi conforme com as regras de actuação susceptíveis de, em abstracto, virem propiciar a produção do almejado resultado.
Já se se tratar de médico especialista (v.g. um médico obstetra) sobre o qual recai um específico dever do emprego da técnica adequada, se torna compreensível a inversão do ónus da prova, por se tratar de uma obrigação de resultado – devendo o mesmo ser civilmente responsabilizado pela simples constatação de que a finalidade proposta não foi alcançada (prova do incumprimento), o que tem por base uma presunção da censurabilidade ético-jurídica da sua conduta.”
- mais recentemente, o acórdão de 26/04/2016, proferido no processo n.º 6844/03.4TBCSC.L1.S1, em que se considerou que “(…) no contrato de prestação de serviços médico-cirúrgicos com colocação de prótese, o médico assume uma obrigação de resultado quanto à elaboração da prótese adequada à anatomia do paciente, e uma obrigação de meios quanto à aplicação da mesma no organismo do paciente segundo as leges artis.”
Seja como for, afigura-se que uma tal ponderação – obrigação de meios / obrigação de resultado - não deve ser feita de forma apriorística em função da mera categorização do tipo de atividade médica, mas sim de forma casuística centrada no exato contexto e contornos de cada situação, sem prejuízo do apelo a alguns factores indiciários, sabido como é que o carácter aleatório e complexo dos atos médicos dependem de diversas condicionantes que nem sempre se revelam na tipologia de determinada especialidade.».
Decidiu o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 14 de Março de 2024[13], (relator Fernando Baptista), proferido no processo nº 2076/9.18.5TBPRT.P1.S1, onde pode ler-se:
“A obrigação a que o médico se vincula perante o paciente – ressalvados, naturalmente, os casos em que garante a obtenção de determinado resultado –, é uma obrigação de meios, pois consiste em lhe proporcionar os melhores e mais adequados cuidados ao seu alcance, de acordo com a sua aptidão profissional e em conformidade com as leges artis e os conhecimentos científicos actualizados e comprovados ao tempo da prestação.

O erro médico não pode ser confundido com a imprevisibilidade – que pode resultar da acção médica, da deficiência ou incorrecta extensão da doença, da impossibilidade de terem sido detectadas elementos desconhecidos e não abrangidos, por exemplo pelos exames de diagnóstico, etc. – ou com factores estranhos e/ou desconhecidos da ciência da medicina.».
Decidiu o Supremo Tribunal Administrativo, no Acórdão de 13 de Janeiro de 2023[14]:
i) As leges artis, enquanto “normas técnicas” da prática médica, não podem ser analisadas, interpretadas e mobilizadas pelo julgador, como se de normas jurídicas se tratasse, para “determinar” a existência ou não de um ilícito.
ii) As leges artis são, como o nome indica, as “regras da arte” de um determinado domínio extrajurídico e a sua violação é uma questão de facto, apreciada e valorada no âmbito da produção de prova, através dos meios probatórios adequados para o efeito, em regra, a prova testemunhal e pericial.
Casos há em que, tratando-se de ato médico com margem de risco ínfima, a obrigação pode assumir, mesmo tratando-se de cirurgia curativa ou necessária, a natureza de obrigação de resultado”
Refere Rute Teixeira Pedro[15], “[em] regra, o incumprimento imputável ao médico apresenta uma configuração que não se reconduz nem a um atraso na implementação dos actos devidos, nem à sua omissão do irremediável. Trata-se com frequência de situações em que o médico realiza a prestação assumida, mas fá-lo de forma deficiente, já que, em virtude de empregar um menor grau de cuidado ou de não implementar todo o quadro de conhecimentos disponíveis, provoca danos à pessoa, e indirectamente ao património do doente.».
Transpondo tais princípios para os presentes autos, assumiu a ré a obrigação de prestar cuidados médicos de saúde odontológica – reabilitação da cavidade oral do autor -, mediante o pagamento de um montante pecuniário. Como refere o citado Acórdão do STJ, de 11/07/2006, proferido no processo n.º 06A1503, e no Acórdão de 5/3/2013, proferido por esta Relação – citado na sentença recorrida -, «as intervenções médico-dentárias com fins predominantemente estéticos, tais como colocação de próteses, restauração de dentes e até a realização de implantes, reconduzem a obrigação do médico a uma obrigação de resultado». No caso concreto, estão em causa actos médicos que não comportam senão uma ínfima margem de risco: restauração dos dentes 13, 24, 37 e 47; extracção do dente 11; colocação de implantes nos dentes 12 e 22, com coroas pilares aparafusadas sobre os mesmos; e colocação de coroas pôntico cerâmicas nos dentes 11 e 21. Trata-se de uma área especializada que impõe ao médico um específico dever do emprego da técnica adequada. Pelo exposto, tais intervenções médico-dentárias reconduzem a obrigação do médico a uma obrigação de resultado.
No quadro de uma obrigação de resultado, incumbe ao credor lesado provar a ocorrência desse resultado como facto constitutivo que é da obrigação de indemnizar (art.º 342.º, n.º 1, e 798.º do CPC), presumindo-se a culpa do devedor lesante, recaindo sobre este o ónus de ilidir tal presunção legal, nos termos do artigo 799.º do CC.
Ao contrato de prestação de serviço médico, estabelecido entre autor e ré são aplicáveis as regras do contrato de mandato. Nos termos do artigo 1154.º do Código Civil, constituem obrigações do mandatário as que se mostram previstas no artigo 1161.º do mesmo diploma, com as adaptações impostas pelas especificidades técnicas e deontológicas da profissão de médico dentista.
Estabelece o artigo 20º, nº 1, alínea b), do Estatuto da Ordem dos Médicos Dentistas, aprovado pela Lei nº 124/2015, de 2 de Setembro, que “São deveres do médico dentista, cumprir as normas deontológicas que regem o exercício da medicina dentária, integradas no presente Estatuto e na demais legislação aplicável”.
De harmonia com o disposto no artigo 124.º, n.ºs 2 a 6, do Estatuto da Ordem dos Médicos Dentista:
“2 - No exercício da sua profissão, o médico dentista é técnica e deontologicamente independente, e, como tal, responsável pelos seus atos.
3 - Na atuação da profissão devem ser atendidos prioritariamente os interesses e direitos do doente no respetivo tratamento, assegurando-lhe sempre a prestação dos melhores cuidados de saúde oral ao alcance do prestador, agindo com correção e delicadeza, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos resultantes das relações profissionais com colegas, organizações ou empresas.
4 - A multiplicidade de direitos e deveres do médico dentista e dos prestadores da medicina dentária inscritos na OMD, impõem-lhes uma independência absoluta, isenta de qualquer pressão, quer resultante de interesses próprios, quer resultante de influências exteriores.
5 - O médico dentista deve assegurar as melhores condições possíveis para a prestação dos atos médico-dentários, de molde a melhor satisfazer todas as necessidades clínicas do doente.
6. - O médico dentista tem o direito à liberdade de fazer juízos clínicos e éticos, e à liberdade de diagnóstico e terapêutica, agindo, sempre, de forma independente”.
Nos termos do artigo 8º (Princípios fundamentais de conduta) Código Deontológico da Ordem dos Médicos Dentistas:
1- O médico dentista deve exercer a sua profissão de acordo com as leges artis, com respeito pelo direito à saúde das pessoas e da comunidade.
2- O médico dentista deve exercer as suas funções agindo com correção e delicadeza, professando o superior interesse do doente, assegurando a prestação dos melhores cuidados de saúde oral possíveis.
3- Sempre que existam opções de tratamento, o médico dentista garante, através do processo de consentimento, a liberdade de escolha do tratamento pelo doente.
…”.
Dispõe o artigo 16º do mesmo diploma, sob a epígrafe “Assistência”:
“1- O médico dentista ao tratar o doente tem obrigação de administrar os cuidados para os quais tenha formação e experiência, assumindo a responsabilidade pelos mesmos.
2- O reconhecimento da competência do médico dentista assenta essencialmente no saber e na experiência profissional, devendo acompanhar os mais recentes progressos e a evidência científica no plano da medicina dentária.
3- O médico dentista, quando lhe pareça indicado, deve pedir a colaboração de outro profissional ou indicar ao doente outro profissional que julgue mais qualificado.”.
Estabelece o artigo 23º desse diploma que:
“1_ O consentimento do doente só é válido se este, no momento em que o presta, tiver capacidade de decidir livremente e estiver na posse da informação relevante para o efeito.
2 _ Entre os esclarecimentos e o consentimento deverá existir, sempre que possível, um intervalo de tempo que permita ao doente refletir e aconselhar-se.
3_ ...”.
Os citados diplomas definem e enquadram a prática da medicina dentária como uma actividade vocacionada para o atendimento dos primordiais interesses do paciente, no plano do exercício técnico inerente ao tratamento médico dentário.
Do quadro fáctico provado resulta que no dia 30 de Setembro de 2014, o autor dirigiu-se à clínica da ré “A..., Lda.”, para averiguar a possibilidade de colocação de prótese fixa e definitiva que substituísse os dois dentes perdidos num acidente de trabalho. Nessa data, o autor tinha em falta três dentes incisivos do maxilar superior: 12, 21 e 22. A ré, por intermédio da Dra. BB, propôs ao autor a realização dos tratamentos elencados no ponto 2 dos factos provados, tendo este aceite os seguintes: colocação de implantes nos dentes 12 e 22, com coroas pilares aparafusadas sobre os mesmos; colocação de coroas pôntico cerâmicas nos dentes 11 e 21; restauração dos dentes 13, 24, 37 e 47; e extracção do dente 11.
Foram realizados os seguintes trabalhos: restauração directa definitiva em resina composta de três faces do dente 37; cirurgia para colocação de dois implantes, regeneração óssea simultânea e estudo de reabilitação sobre implantes com programa informático; restauração directa definitiva em resina composta de três faces do dente 13; restauração directa definitiva em resina composta de três faces do dente 47; colocação de coroa aparafusada sobre implante e de coroa pôntico cerâmica, nos dentes 11, 21 e 22; colocação de coroa pilar aparafusada sobre implante nos dentes 11 e 22 e de coroa pôntico cerâmica nos dentes 11 e 21; e restauração directa em resina composta de três faces do dente 47. A ponte com os quatro dentes, sendo dois implantes, foi colocada no dia 30-03-2015. Decorridos doze meses sobre a colocação das coroas sobre os implantes referidos em 4.1), estas caíram (em 2/3/2016) por ter ocorrido a fractura dos parafusos da ponte colocada, que sustentavam/fixavam a mesma aos implantes dentários, tendo a ré, por intermédio da Dra. BB, tentado remover os parafusos que implantara no maxilar do autor, sem o conseguir. O autor demonstrou aquela ocorrência. À ré incumbia demonstrar que essa ocorrência não decorre de falta de cuidado ou imperícia, nomeadamente por inobservância das leges artis.
Na sequência daquela ocorrência, a Dr.ª BB optou por submeter o autor a nova cirurgia para colocação de novos implantes, nos dentes 11 e 21, com colocação de novos parafusos para suporte de coroas, sem remoção dos parafusos colocados nos implantes 12 e 22. Em 06-09-2016, foi removida a ponte superior por os parafusos já não apertarem e em 12-12-2016, foram feitas impressões para a colocação de parafusos mais curtos nos implantes 12 e 22. Em 28-03-2017, com a concordância do autor, decidiu colocar dois implantes na posição dos dentes 11 e 21, manter infra ósseos os implantes12 e 22 e fazer nova ponte fixa de quatro elementos. No dia 11-12-2017, a ré colocou no autor duas novas coroas pilar aparafusadas sobre os implantes em 11 e 21, e duas novas coroas pôntico cerâmicas. Decorridos cerca de nove meses, também as novas próteses – projecto alternativo ao plano negocial - acabaram por cair, ficando o autor novamente sem os quatro dentes da frente, do seu maxilar superior e com o aspecto retratado no documento 13, junto com a petição inicial.
Em 29-08-2017, foi efectuada a restauração dos dentes 33, 34 e 37 em resina, para subida da mordida. Em 04-09-2017, foi efectuada a restauração dos dentes 43, 44, e 45, em resina, para subida da mordida e foram efectuados moldes para prótese esquelética inferior de três dentes. Em 03-10-2017, foi colocada a prótese esquelética inferior de três dentes. Em 11-12-2017, foi efectuada a colocação da ponte aparafusada aos implantes 11 e 21, suspensa aos dentes 22 e 12. Dada a oclusão do paciente, projecção vestibular do maxilar superior com mordida funda, o autor foi aconselhado a ter cuidado com a alimentação, a não fazer uso destes dentes para corte dos alimentos (têm só efeito estético), pois existia grande risco de fractura dos parafusos protéticos, nem fazer movimentos de tracção. Foi aconselhado, ainda, a usar goteira oclusal para prevenir acidentes de bruxismo e da reabilitação protética superior. Mais para o fim do tratamento, a Dr.ª BB aconselhou o autor a utilizar goteira, mas ficou complicado porque a ponte andava sempre a cair. Em 09-05-2017, a Dr.ª BB avisou o paciente para a necessidade de reabilitação protética do maxilar inferior e do superior, a nível posterior.Em 04-09-2018, os pilares da ponte descimentaram e a prótese foi para o laboratório para conserto. Em 24-09-2018, foram efectuadas impressões à cabeça dos implantes com silicone, para conserto da ponte superior. Em 02-10-2018, foi colocada a ponte fixa. Apesar das várias intervenções realizadas para solucionar o problema desta ponte, ainda não se mostra ultrapassado o problema.
Resulta ainda da factualidade provada que os dentes posteriores são fundamentais no equilíbrio do sistema mastigatório. A ausência de vários dentes posteriores, como é o caso do autor, leva a graves deficiências na mastigação de alimentos e implica uma sobrecarga sobre os dentes da frente, onde se passa a gerar uma força e um esforço acrescidos, que os mesmos não deveriam suportar, e gera uma tendência de diminuição da dimensão vertical de oclusão, levando a um fechamento anterior da mandíbula e uma carga de oclusão excessiva que igualmente afecta os dentes anteriores, fragilizando-os. Todavia, não resulta da matéria de facto provada que a ré, antes de 2 de Março de 2016, tenha informado o autor da necessidade de reabilitar a parte posterior para o sucesso da reabilitação efectuada na parte anterior.
A ré não logrou demonstrar que a quebra dos parafusos, referente ao tratamento que faz parte do plano negocial, não decorreu de falta de cuidado ou imperícia da Médica, nomeadamente por inobservância das leges artis. O mesmo sucede com a ponte colocada em 2017: o autor demonstrou que essa ponte encontra-se sempre a cair e a ré não logrou demonstrar que não tem culpa na produção desse resultado [factos constantes dos pontos n), s), t), u), bb), cc), dd), ee), ff), ii), jj), kk), ll), mm) e oo) dos factos não provados] (artigos 344º, nº1, e 799º do CC).
Atenta a desconformidade entre a prestação devida e a que foi realizada, de acordo com o conteúdo do programa obrigacional, verifica-se o cumprimento defeituoso do contrato por parte da ré.
Aqui chegados, a questão que importa decidir consiste em saber se se verificam os pressupostos para o autor resolver o contrato.

De acordo com o disposto no artigo 432.º, n.º 1, do CC é admitida a resolução do contrato fundada na lei ou em convenção.

Fundada na lei, a resolução contratual, nos termos do respectivo quadro normativo geral definido pelos artigos 801.º, n.º 2, e 808.º, n.ºs 1 e 2 do CC, em regra, depende, para o que aqui releva, de uma situação de incumprimento definitivo que tanto se verifica nos casos de recusa categórica de cumprimento, como nos casos, ali previstos, de conversão da mora em incumprimento definitivo, seja por via da imediata perda de interesse do credor, apreciada objectivamente, seja por via da chamada notificação admonitória ou interpelação cominatória.

Dispõe o artigo 808º do Código Civil que:

“1_ Se o credor, em consequência da mora, perder o interesse que tinha na prestação, ou esta não for realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo credor, considera-se para todos os efeitos não cumprida a obrigação.

2_ A perda do interesse na prestação é apreciada objectivamente.”.

Como é sabido, o devedor só fica constituído em mora depois de interpelado para cumprir, havendo, porém, mora da sua parte, independentemente de interpelação, quando, designadamente, a obrigação tiver prazo certo (art.º 805.º, n.ºs 1 e 2, do C.Civ.), situação que não se verifica. Pode o credor, em consequência da mora, perder o interesse que tinha na prestação ou esta não ser realizada dentro do prazo que razoavelmente seja fixado pelo credor, caso em que se considera não cumprida, em definitivo, a obrigação (art.º 808.º, n.º 1, do C.Civ.).

A perda de interesse para o credor deve ser apreciada objetivamente (art.º 808.º, n.º 2, do C.Civ.), pois o que se pretende é evitar que o devedor fique sujeito aos caprichos daquele (credor) ou à perda infundada do interesse na prestação. Atende-se, por conseguinte, não ao valor da prestação determinado pelo credor, mas à valia da prestação medida (objectivamente) em função do sujeito.

O credor, para converter a mora em incumprimento definitivo, tem de interpelar o devedor, intimando-o a cumprir a prestação, dentro de prazo razoável, fixado de acordo com as circunstâncias concretas do contrato a celebrar, com a advertência, muito clara, de que a falta da prestação, no prazo estabelecido, o fará incorrer em incumprimento definitivo da obrigação. Por isso, a mora transforma-se em incumprimento definitivo se o devedor não cumpre no prazo suplementar e peremptório que o credor razoavelmente lhe concede. Trata-se da chamada interpelação admonitória ou interpelação cominatória que visa conceder ao devedor uma derradeira possibilidade de manter o contrato e tem de conferir uma dilação razoável, em vista dessa finalidade, e comunicada em termos de deixar transparecer a intenção do credor.

A interpelação admonitória exige o preenchimento de três pressupostos: a existência de uma intimação para cumprimento, a consagração de um prazo peremptório, suplementar, razoável e exacto para cumprir, e a declaração cominatória de que findo o prazo fixado, sem que ocorra a execução do contrato se considera este definitivamente incumprido.[16]

Como se referiu, a perda de interesse deve ser “apreciada objectivamente” - art. 808.º, nº2, do Código Civil. Este critério significa que a importância de tal interesse, embora aferida em função da utilidade concreta que a prestação teria para o credor, não se determina de acordo com o seu juízo arbitrário, mas considerando elementos susceptíveis de valoração pelo comum das pessoas. A lei impõe, em síntese, uma perda subjectiva do interesse com justificação objectiva. Nas palavras de João Baptista Machado, a perda de interesse em consequência da mora respeita aos casos em que o interesse do credor que despareceu durante a mora se liga a uma finalidade que não fez parte do conteúdo do negócio, “em que o fim-motivo negocialmente irrelevante pode vir a relevar por efeito de uma inexecução (de uma perturbação na fase executiva) do negócio”. [17]

Volvendo aos presentes autos, salvo o devido respeito, não assiste o direito ao autor de resolver o contrato. Não tendo a ré sido interpelada, nos termos referidos, não se constituiu em mora. Como ensina Antunes Varela[18], “A mora do devedor pode eliminar todo o interesse do credor na prestação”. Não estando o devedor constituído em mora, não se mostra possível a conversão da mora em incumprimento definitivo por perda de interesse. Como ensina o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 10/9/2009, citado pelo Tribunal a quo, na sentença recorrida, «Havendo mora do devedor no cumprimento da obrigação, a perda do interesse do credor tem de ser justificada à luz de circunstâncias objectivas]».

Da matéria de facto assente não resulta demonstrado um comportamento da ré reveladora, de forma concludente, que é sua intenção firme não cumprir a prestação à qual se vinculou. Pelo contrário. A ré procedeu ao agendamento da TAC e o autor não compareceu.

Assim sendo, não se mostram preenchidos os pressupostos para a resolução do contrato de empreitada, pelo que procede, nesta parte, a pretensão recursória da ré.

6ª Questão

Considerando a decisão proferida sobre a 5ª questão, mostra-se prejudicado o conhecimento da pretensão recursória de absolvição do pedido de condenação no pagamento de indemnização ao autor, pelos danos, morais e patrimoniais.

7ª Questão

Dissente a recorrente/ré da decisão de improcedência do pedido reconvencional.

Sustenta que da factualidade provada resulta que os actos médicos - descritos no ponto 58[19] - prestados ao A. que os recebeu, perfazem a quantia de €4.570,00.

Consta do ponto 61 dos factos provados que o autor não pagou à R. as quantias referidas em 58.

Argumenta a recorrente/ré que “não pode colher o argumento esgrimido na sentença que a Dr.ª BB terá dito ao A. que esses tratamentos seriam gratuitos, não havendo qualquer obrigação de os pagar, pois, (…) a Assistente BB não se confunde com a R., não a vincula, de nenhuma maneira, e não estava mandatada para representá-la.”.

Conclui que o preço é devido pois, o autor beneficiou dos actos médicos, fazendo ingressá-los na sua esfera jurídico-patrimonial, pelo que, em sinalagma, deve pagar o preço à R..

Consta da matéria de facto provada e não impugnada que “o autor não pagou à ré as quantias referidas em 58), em virtude de a ré, através da Dr.ª BB, se ter proposto executar esses tratamentos gratuitamente, por força do referido em 8) e 27).”.

Deste facto, não consta que a decisão seja da Médica BB mas da ré.

Pelo exposto, improcede a pretensão recursória.

8ª Questão

Considerando a decisão proferida sobre a questão nº4, mostra-se prejudicado o conhecimento da pretensão recursória de condenação da interveniente “C..., S.A.”.

9ª Questão

Na resposta ao recurso apresentada pelo autor, este invoca a litigância de má-fé da ré sustentando que a dedução de reconvenção e a reiteração da sua ilegitimidade passiva “constitui intolerável venire contra factum proprium, consubstanciando grosseira litigância de má fé”.

Os conceitos de abuso de direito e de litigância de má fé não são coincidentes, sendo a proibição desta uma consequência ao nível processual do princípio geral da proibição do exercício abusivo de um direito. Para que haja abuso de direito é necessário que o ilegítimo exercício do direito exceda de forma manifesta a boa fá, os bons costumes ou o fim económico ou social do direito. O que não se verifica.

Na sentença recorrida, o Tribunal a quo pronunciou-se sobre o pedido deduzido pelo autor como litigante de má-fé, advogando que “existe grosseira e chocante contradição entre a matéria alegada pela ré nos artigos 1.º a 24.º da contestação e nos artigos 66.º a 68.º da reconvenção”, tendo julgado improcedente o incidente e absolvido a ré do pedido de condenação em multa e indemnização.

Este segmento da decisão não foi impugnado, pelo que transitou em julgado. Assim, este tribunal só pode conhecer do pedido de condenação da ré como litigante de má-fé na parte atinente à conduta da recorrente em fase de recurso[20].

As partes estão vinculadas aos deveres de probidade e cooperação, agir de boa-fé e cooperar para se obter, com brevidade e eficácia a justa composição do litígio. Algum exagero na pretensão que foi deduzida não é, por si só, litigância de má fé, nem consubstancia litigância de má fé a dedução de pretensão que vem a decair por mera fragilidade da prova e de não se convencer o tribunal da realidade trazida a julgamento ou resultar da discordância na interpretação e aplicação da lei aos factos, ou mesmo, convencida que lhe assiste razão, vê os seus argumentos afastados por razões mais ponderosas ou legalmente fundadas.

A má fé pressupõe uma intenção maliciosa ou uma negligência de tal modo grave ou grosseira que, aproximando-a da actuação dolosa, justifica um elevado grau de reprovação e idêntica reação punitiva. O que não se verifica no caso. A ré alicerçou a sua pretensão recursória em entendimento diverso das normas que regulam legitimidade processual, exercendo o direito que lhe assiste de impugnar as decisões judiciais.

Face ao exposto, entende este tribunal que não se mostram ultrapassados, no caso sub judice os limites da “litigiosidade séria" que "dimana da incerteza” [21], não se verificando os pressupostos da condenação da ré, como litigante de má fé.

Improcede, assim, a pretensão recursória do autor de condenação da recorrente/ré como litigante de má-fé.


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Custas

Sendo procedente o recurso interposto pela interveniente BB, as custas do recurso por esta interposta, são da responsabilidade do autor, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia.

O recurso interposto pela ré foi procedente relativamente ao pedido deduzido pelo autor e improcedente relativamente à reconvenção. Assim, as custas da acção e do recurso são da responsabilidade do autor e da ré, na exacta proporção do respectivo decaimento, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia (artigo 527º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).


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V_ Decisão

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar procedente o recurso interposto pela interveniente acessória BB e parcialmente procedente o recurso interposto pela ré e, em consequência, decidem:
a. alterar a decisão da matéria de facto quanto aos pontos 22, 56 e 80 dos factos provados, eliminar o ponto r) dos factos não provados e aditar, aos factos não provados, o ponto pp), nos termos supra enunciados;
b. revogar a sentença na parte em que decidiu: declarar resolvido o contrato celebrado entre o autor AA e a ré “A..., Lda.” [A1 do dispositivo]; condenar a ré “A..., Lda.” a restituir ao autor a quantia de 3.138,00 € (três mil cento e trinta e oito euros), acrescida de juros de mora vencidos desde 22-10-2019 e de juros vincendos, até integral pagamento, calculados à taxa supletiva civil para os juros civis [A2 do dispositivo]; condenar a ré “A..., Lda.” a pagar ao autor a quantia de 155,04 € (cento e cinquenta e cinco euros e quatro cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos desde 22-10-2019 e de juros vincendos, até integral pagamento, calculados à taxa supletiva civil para os juros civis; e a quantia de 7.500,00 € (sete mil e quinhentos euros), acrescida de juros de mora vincendos, desde a presente data e até integral pagamento, calculados à taxa supletiva civil para os juros civis [A3 do dispositivo];
c. absolver a ré dos pedidos deduzidos pelo autor;
d. no mais, confirmar a sentença recorrida.


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As custas do recurso interposto pela interveniente BB são da responsabilidade exclusiva do autor, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia e as custas da acção e do recurso interposto pela ré são da responsabilidade desta e do autor, na exacta proporção do respectivo decaimento, tudo sem prejuízo do apoio judiciário de que este beneficia (artigo 527º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).

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Sumário:

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Porto, 15/9/2025
Anabela Morais
Teresa Fonseca
Carla Fraga Torres
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[1] Consta da nota 1, “Seguiremos os articulados apresentados, com exclusão dos que consistem na mera repetição da factualidade alegada pelas outras partes, sem nada acrescentar à mesma (bem como da matéria conclusiva/meramente argumentativa ou impugnativa do alegado pela parte contrária)”.
[2] A decisão sobre tal excepção dilatória, proferida no despacho saneador, não se enquadra em nenhuma das situações previstas nos n.ºs 1 e 2 do art.º 644.º do CPC, onde se preveem os casos de recurso autónomo, sendo assim passível de ser impugnada no recurso a interpor da decisão que ponha termo à causa, no caso, a sentença final.
[3] José Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, vol. 1º, Coimbra, 1999, pág. 52.
[4] Castro Mendes, Manual de Processo Civil, Coimbra, 1963, págs. 260, 261, 262.
[5] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29/10/2015, Proc. 915/09.0TVPRT.P1.S1, acessível em www.dgsi.pt.
[6] Artur Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, vol. II, Almedina - Coimbra, 1982, pág.199.
[7] Acessível em https://juris.stj.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2017:296.07.7TBMCN.P1.S1.67?search=EXkLj2vfE206Xdr9blw.
[8] Acessível em https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/d2e4ddea9e115cd980258b330045c3e7?OpenDocument.
[9]Acórdão proferido no processo n.º23119/16.1T8LSB.C2.S2, acessível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/d1bbd76eff05fdd98025890a0036facb?OpenDocument.
[10] Sobre a influência do “absentismo”, às consultas, no sucesso do tratamento, o Senhor Professor Doutor GG esclareceu que “neste caso, não vislumbro elementos que me permitam concluir por esse facto”.
[11] O Senhor Professor Doutor GG esclareceu que a falta de higiene caracteriza-se por inflamações entre o espaço do implante, o tecido ósseo e a gengiva e, no “caso concreto, não ocorreu dificuldade de integração do implante no tecido ósseo”. Explicou que os implantes estão íntegros, mantiveram-se na cavidade oral, por isso exclui a componente da falta de higiene oral. “Significa que os implantes não tiveram qualquer problema. O problema foi entre a ligação do implante e a coroa”.
Pela Senhora Perita foi explicado que quando temos uma estrutura partida, essa ocorrência é motivada por trauma ou por carga excessiva; não estão em causa estruturas biológicas, pelo que, à situação de estruturas partidas, não se aplica a explicação do tabagismo, nem da ausência de higiene oral.
[12] Acórdão de 23/3/2017, do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no Proc. nº 296/07.7TBMCN.P1.S1, acessível em https://juris.stj.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2017:296.07.7TBMCN.P1.S1.67?search=EXkLj2vfE206Xdr9blw.
[13] Acórdão de 14 de Março de 2024, proferido no processo nº 2076/9.18.5TBPRT.P1.S1, acessível em www.dgsi.pt.
[14] Acórdão de 13 de Janeiro de 2023, proferido no processo nº 1248/12.0OBELSB, acessível em www.dgsi.pt.
[15] Rute Teixeira Pedro, A Responsabilidade Civil do Médico, Centro de Direito Biomédico, Coimbra Editora, 2008, página 110.
[16] João Baptista Machado, Pressupostos da resolução por incumprimento em Obra Dispersa, Scientia Iuridica, 1991, vol. I, pág. 164.
[17] João Baptista Machado, Pressupostos da resolução por incumprimento em Obra Dispersa, Scientia Iuridica, 1991, vol. I, págs. 160 e 161.
[18] Antunes Varela, Das Obrigações em geral, vol. II, 5.ª edição, Almedina, Coimbra, págs. 122 e 123.
[19] Teor do ponto 58 dos factos provados: Após a fractura referida em 27), a ré prestou ao autor os seguintes serviços:
58.1) estudo de reabilitação sobre implantes com programa informático, no valor de 70,00 €;
58.2) cirurgia para colocação de um implante, no valor de 800,00 €;
58.3) cirurgia para colocação de outro implante, no valor de 800,00 €;
58.4) regeneração óssea simultânea com colocação de implante, no valor de 450,00 €;
58.5) regeneração óssea simultânea com colocação de outro implante, no valor de 450,00 €;58.6) colocação de coroa aparafusada sobre implante, no valor de 1.000,00€;
58.7) colocação de coroa pôntica em cerâmica, no valor de 1.000,00 €.
[20] Neste sentido, José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, 4ª edição, Almedina, 2019, pág. 459.
[21] Fernando Luso Soares, A Responsabilidade Processual Civil, Almedina, 1987, página 26.