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INTERRUPÇÃO DO PRAZO DE RECURSO
APOIO JUDICIÁRIO
Sumário
1 – No que respeita à matéria dos recursos temos no CIRE uma norma geral, o art.º 14º do referido código, e algumas normas específicas. 2 - Nem umas nem outras regulam, de forma completa, as regras relativas à admissibilidade e regime dos recursos no processo de insolvência e seus apensos, impondo-se o recurso ao CPC, com as limitações referidas no art.º 17º, n.º 1, do CIRE. 3 - É irrelevante no caso, face ao disposto no art.º 24º, n.º 5, al. a), da Lei 34/2004, de 29.07, em que data ou se a requerente foi ou não notificada do deferimento do pedido de apoio judiciário formulado, na modalidade de nomeação de patrono e da efetiva indicação do patrono nomeado pela Ordem dos Advogados, o que releva, para o início da contagem do prazo processual em curso, por inteiro, em ação judicial pendente, é a notificação ao patrono da sua designação, tendo o pedido de apoio judiciário sido deferido, designadamente, na modalidade de nomeação de patrono.
Texto Integral
1. Relatório
Comitiva de Mordomias, Lda., apresentou-se a processo especial de revitalização em 14.08.2024.
O referido processo, iniciado e tramitado nos termos dos art.ºs 17º-A e ss do CIRE (Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas) veio a ser encerrado, nos termos do art.º 17.º-G, n.º 1, do CIRE, pelo decurso do prazo de negociações sem aprovação de plano de recuperação.
O Administrador Judicial Provisório nomeado apresentou parecer no sentido da declaração de Insolvência em 08.04.2025.
Notificada nos termos e para os efeitos do art.º 17.º-G, n.º 5, do CIRE, a devedora nada opôs.
Foi proferida nos autos, em 12.05.2025, decisão declarando a insolvência da sociedade Comitiva de Mordomias, Lda.
Em 12.05.2025, foi remetida notificação da referida decisão para o nomeado patrono da insolvente D…
Na mesma data foi remetida notificação da referida decisão para a devedora insolvente.
Em 20.05.2025, foi junto email aos autos, com comprovativo de requerimento pela insolvente de apoio judiciário, nomeadamente na modalidade de nomeação de patrono.
Em 26.05.2025, foi junto email aos autos, remetido por aj..., informando da nomeação à devedora de patrono – Drª. S…
No referido email é feita a seguinte menção: “Informamos que, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do nº 5 do artigo 24º e artigos 30º e 31º da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, na redacção dada pela Lei nº 47/2007, de 28 de Agosto, e nos termos do nº 1 do artº 3 da Portaria nº 10/2008, de 3 de Janeiro, com as alterações introduzidas pela Portaria nº 210/2008, de 29 de Fevereiro, o(a) Senhor(a) Advogado(a) foi notificado(a), na presente data, da nomeação efectuada.”
Em 26.05.2025, foi remetida notificação da junção do referido email aos autos, ao Dr. D…
Em 26.05.2025, foi remetida à patrona nomeada comunicação via email de notificacoes.aj... com o seguinte teor:
“Exmo(a) Senhor(a),
Nos termos dos artigos 30º e 31º da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, na redacção dada pela Lei nº 47/2007, de 28 de Agosto, e nos termos do nº 1 do artº 3 da Portaria nº 10/2008, de 3 de Janeiro, com as alterações introduzidas pela Portaria nº 210/2008 de 29 de Fevereiro, informamos V.Exª que foi nomeado(a) para patrocinar o(a) requerente:
Senhor(a) COMITIVA DE MORDOMIAS – LDA …- 008 AMADORA.
Contacto telefónico:
Permitimo-nos, ainda, chamar a atenção para as regras da contagem de prazos constantes dos nºs 4 e 5 do artigo 24º da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de acção judicial.”
Em 13.06.2025, foi junto aos autos ofício remetido pelo Instituto de Segurança Social I.P. com o seguinte teor:
“Assunto: REQUERIMENTO DE PROTECÇÃO JURÍDICA
Na sequência do requerimento de proteção jurídica formulado, em 15-05-2025, por COMITIVA DE MORDOMIAS - LDA, E…, Alfragide, 2610-008 AMADORA, cuja referência se indica em epígrafe, e nos termos do disposto no artigo 26º da Lei 34/2004, de 29 de Julho com as alterações introduzidas pela lei 47/2OO7, de28 de Agosto, vem notificar-se V.Ex.a que o pedido foi DEFERIDO por decisão proferida em 26-05-2025 na (s) modalidade (s) de Dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo,
Nomeação e pagamento da compensação de patrono, prevista (s) no artigo 16ª da citada Lei.
Esta decisão foi notificada ao requerente e à Ordem dos Advogados na mesma data.”
Em 26.06.2025, foi interposto recurso pela devedora da sentença que declarou a insolvência da mesma, subscrito pela patrona nomeada S….
No âmbito do referido recurso invoca a recorrente nas conclusões apresentadas que:
“R – Ora, a Insolvente/Recorrente só em 16-06-2025 é que recebeu o despacho da Segurança Social, concedendo-lhe apoio judiciário, conforme o carimbo de receção que nele consta, porém, até a presente data, não recebeu o respetivo ofício de nomeação da patrona da Ordem dos Advogados.
S - Em 17-06-2025 a patrona foi contactada pela Recorrente, tendo-se reunido com a mesma em 18-06-2025.”
Juntou com as alegações de recurso, documento nos seguintes termos:
Em 04.08.2025, foi proferida decisão nos autos nos termos de seguida enunciados:
“Da admissão do recurso
A decisão recorrida é a sentença de declaração de insolvência proferida em 12.05.2025, notificada à Insolvente na sua morada e na pessoa do Ilustre Patrono então em funções no Processo Especial de Revitalização que deu origem aos presentes autos.
Nos termos das disposições conjugadas dos artigos 138.º, n.º 1 e 638.º, n.º 1 do CPC e 9.º, n.º 1, do CIRE, o prazo de interposição de recurso da sentença de insolvência é de 15 dias contados desde a data da notificação ou publicidade da sentença, não se interrompendo nem suspendendo nas férias judiciais.
O prazo de recurso foi interrompido em 20.05.2025, nos termos do art.º 24.º, n.º 4 da Lei n.º 34/2004 de 19.09, por efeito da apresentação na referida data, de comunicação eletrónica da Insolvente comunicando a apresentação de requerimento de proteção jurídica datado de 15.05.2025, nas modalidades de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e de nomeação e pagamento de Patrono.
O art.º 24.º, n.º 5, al. a), da Lei n.º 34/2004 de 19.09 dispõe que o prazo interrompido se inicia a partir da data da notificação ao patrono nomeado da sua designação.
Nos termos das disposições legais citadas o prazo de recurso interrompido em 20.05.2025 iniciou-se novamente em 27.05.2025, tendo atingido o seu termo em 11.06.2025.
Mediante pagamento de multa fixada nos termos do art.º 139.º, n.º 5, do CPC, o ato poderia ainda ser praticado até 16.06.2025.
O requerimento de recurso apresentado em 26.06.2025 é, assim, claramente intempestivo.
Decide-se assim, nos termos e pelos fundamentos expostos, não admitir o recurso interposto em 26.06.2025 pela Insolvente.
Notifique.”
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Inconformada com este despacho, que não admitiu o recurso interposto, veio a reclamante apresentar reclamação ao abrigo do disposto no art.º 643º, do CPC (Código de Processo Civil), pedindo, a final, que a reclamação seja recebida e que o recurso seja conhecido pelo tribunal superior.
A reclamação tem, no que ora nos interessa, o seguinte teor, omitindo-se o referido no requerimento quanto aos termos da discordância da requerente no que respeita à sentença proferida:
“14 – O ora Reclamante em 20-05-2025 juntou o comprovativo do requerimento do
apoio judiciário para interposição do respetivo recurso, conforme o documento que se junta sob o Doc. n.º 3 e que se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos.
15 – Na sequência do pedido do apoio judiciário, em 26-05-2025, foi nomeada oficiosamente patrona de aqui Reclamante, a ora subscritora da presente peça processual.
16 – Acontece, que a ora Reclamante alega que só em 16-06-2025 é que recebeu o despacho da Segurança Social que lhe concedeu apoio judiciário, conforme o documento que já se encontra junto aos autos, porém, alega que até a presente data, não recebeu o respetivo ofício de nomeação da patrona.
17 – Ou seja, segundo a ora Reclamante, até a data supra (16-06-2025) desconhecia a existência da patrona que lhe fora nomeada.
18 – Pelo que só em 17-06-2025 que a ora Reclamante contactou a signatária, tendo esta agendado de imediato o dia seguinte, isto é, dia 18-06-2025 para conferenciar com a mesma com vista a interpor o respetivo recurso que por não ter sido admitido ora se reclama.
19 – Ainda, para a instrução da presente reclamação, requer-se a junção do requerimento de interposição de recurso e as alegações com os respetivos documentos anexos, a decisão recorrida e o despacho objeto de reclamação, conforme os docs. 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14 e 15 que aqui se dá por integralmente reproduzidos para todos os devidos e legais efeitos.”
*
Não foi apresentada qualquer resposta à reclamação.
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Cumpre decidir.
2. Objeto da reclamação
Nos termos do art.º 643º, n.º 1, do CPC, do despacho que não admita o recurso pode o recorrente reclamar para o tribunal que seria o competente para dele conhecer, no prazo de 10 dias contados da notificação da decisão.
A reclamação, nos termos do n.º 4 do mesmo normativo legal, logo que distribuída, é apresentada ao relator que tem um prazo de 10 dias para proferir decisão que admita o recurso ou o mande subir ou mantenha o despacho reclamado.
O objeto da reclamação prevista no art.º 643º é assim apenas o de saber se o recurso deve ser admitido.
Face a este enquadramento, a questão que importa decidir, no caso, é a de saber se o despacho reclamado deve ser mantido ou o recurso deverá ser admitido, não cabendo a este tribunal, nesta fase, pronunciar-se sobre o objeto do recurso.
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3. Fundamentação
Fundamentos de facto
Os factos a considerar são os que se encontram descritos no relatório.
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Fundamentos de Direito
Dispõe o art.º 17º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), que os processos regulados neste código regem-se pelo Código de Processo Civil, “… em tudo em que não contrarie as disposições do presente Código”, ou seja, ao processo de insolvência aplicam-se as regras próprias do CIRE e subsidiariamente o CPC.
No que respeita à matéria dos recursos temos no CIRE uma norma geral, o art.º 14º do referido código, e algumas normas específicas. No entanto, nem umas nem outras, regulam, de forma completa, as regras relativas à admissibilidade e regime dos recursos no processo de insolvência e seus apensos, impondo-se, pois, o recurso ao CPC com as limitações já referidas no citado art.º 17º do CIRE.
Na espécie está em causa uma não admissão de recurso de uma sentença que declarou a insolvência da ora reclamante.
Está em apreciação um processo com caráter urgente nos termos do art.º 9º, n.º 1, do CIRE.
Assim sendo, importa ter em consideração o prazo reduzido de 15 dias, previsto no art.º 638º, n.º 1, do CPC, contado a partir da notificação da decisão que declarou a insolvência da devedora.
Ora tendo a sentença sido proferida em 12.05.2025, foi enviada notificação da decisão proferida para o anterior patrono da reclamante e para a própria ora reclamante e insolvente no próprio dia 12.05.2025.
No dia 20.05.2025, a ora reclamante veio informar nos autos que requereu apoio judiciário na modalidade, nomeadamente, de nomeação de patrono.
Foi nomeado novo patrono à requerente em 26.05.2025, tendo a mesma (a patrona) sido notificada dessa nomeação nessa mesma data, como surge comprovado nos autos e aliás a recorrente não põe em causa, pelo contrário juntando o documento respeitante a essa notificação por parte da Ordem dos Advogados.
Dispõe o art.º 24º, da Lei 34/2004, de 29.07, no que ora nos interessa que:
“4 - Quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de acção judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo.
5 - O prazo interrompido por aplicação do disposto no número anterior inicia-se,
conforme os casos:
a) A partir da notificação ao patrono nomeado da sua designação.
b) A partir da notificação ao requerente da decisão de indeferimento do pedido de
nomeação de patrono.”
Face ao disposto neste normativo legal importa assentar que o prazo de interposição
de recurso que se iniciou com a notificação da sentença de declaração de insolvência se interrompeu em 20.05.2025, data em que a ora reclamante fez saber nos autos que requereu apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono.
Esse prazo reiniciou-se em 27.05.2025, no dia seguinte ao da notificação ao patrono nomeado da sua designação.
O referido prazo de interposição de recurso em processo urgente, como já vimos ser o caso, é de 15 dias, contando-se de forma contínua e não se suspendendo durante as férias judiciais (art.º 138º, n.º 1, do CPC).
Quando o prazo para a prática do ato processual terminar em dia em que os tribunais estiveram encerrados (o caso do 10 de junho, feriado nacional), transfere-se o seu termo para o primeiro dia útil seguinte (art.º 138º, n.º 2, do CPC).
É irrelevante, face ao disposto no normativo citado em que data ou se a requerente foi ou não notificada do deferimento do pedido formulado e da nomeação do patrono, o que releva, é a notificação ao patrono da sua designação, tendo o pedido de apoio judiciário sido deferido, de acordo com a leitura clara e sem possibilidade de outra interpretação do citado art.º 24º, n.º 5, al. a), do diploma citado, tendo aliás a patrona nomeada sido advertida do disposto no citado normativo legal, aquando da comunicação da sua nomeação, em cumprimento do disposto no art.º 31º, n.º 1, da Lei já supra citada.
Ora tendo o recurso sido interposto em 26.06.2025, há muito que o mencionado prazo de 15 dias já tinha decorrido (termo em 11.06.2025), ainda que considerando os três dias úteis subsequentes ao termo do prazo previstos no art.º 139º, n.º 5, do CPC (16.06.2025).
Verifica-se assim que o recurso interposto é manifestamente intempestivo.
Não deveria, pois, o tribunal, ao contrário do que defende a reclamante, ter admitido o recurso.
Concluímos, assim, que não assiste razão à reclamante, não sendo o recurso interposto admissível, porque intempestivo.
No que respeita às considerações feitas pela reclamante nos pontos 1 a 13 da reclamação apresentada nada se impõe dizer ou decidir tratando-se de considerações sobre questões alheias ao que cumpre conhecer no âmbito desta reclamação que é apenas, como supra referimos, saber se o recurso interposto deve ou não ser admitido.
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As custas do incidente devem ser suportadas pela reclamante, dado o respetivo decaimento, devendo ter-se em consideração o apoio judiciário concedido – arts. 663.º, n.º 2, 607.º, n.º 6, 527.º, n.º 1 e 2, 529.º e 533.º, todos do Código de Processo Civil – fixando-se a taxa de justiça em 1 UC, nos termos do art. 7º nº 4 e tabela II-A do Regulamento das Custas Processuais.[1]
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5. Decisão
Considerando o exposto, julga-se a reclamação improcedente, mantendo-se o despacho que não admitiu o recurso interposto.
Fixa-se em 1 UC a taxa de justiça devida pelo incidente.
Custas pela reclamante, devendo ter-se em consideração o apoio judiciário concedido.
Notifique.
Lisboa, 05-09-2025,
Elisabete Assunção
_______________________________________________________ [1] Neste sentido Ac. Tribunal da Relação de Évora de 19/11/2015, Processo n.º 1167/12.0TBSLV.A.E1, relator Francisco Matos, disponível em www.dgsi.pt: “A reclamação contra o despacho que não admita o recurso está sujeita ao pagamento da taxa de justiça entre 1 a 3 Ucs, a liquidar previamente pelo seu valor mínimo, sem prejuízo do pagamento do excedente, se o houver, a final.”