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LEI TUTELAR EDUCATIVA
OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA
INJÚRIA
MEDIDA TUTELAR
ACOMPANHAMENTO EDUCATIVO
Sumário
Sumário: A Lei tutelar educativa configura-se como instrumento de intervenção desenvolvido pelo Estado com o intuito de resolver a questão de delinquência juvenil e garantir o bem-estar e proteção dos cidadãos, assumindo uma função educativa. Do ponto de vista da Política Social, a avaliação das políticas e programas sociais constituem-se sempre como momentos importantes para atender às novas especificidades do problema e necessidades evidenciadas ao longo da implementação da política (Howard & Sherwood, 1981). Neste caso, a menor, ainda com 13 anos de idade, bateu nas suas colegas de escola e nas suas vizinhas (em 4 pessoas no espaço de poucos meses), tem um percurso escolar pouco satisfatório, tem dificuldades em lidar com a frustração, e de controlo dos impulsos quando confortada de forma mais ríspida, ou perante situações de tensão. Acresce que a progenitora tem uma atitude desculpabilizante da menor. Em face dos factos dados como provados reveladores da prática de quatro crimes de ofensa à integridade física e um crime de injúria, por uma menor de 13 anos, julga-se que a medida é bastante adequada e proporcional, posto que os pais não revelaram até agora capacidade de conter os comportamentos agressivos da menor, com o qual têm um relacionamento afectivo e pautado pela presença física, até porque são ambos desempregados de longa duração. No que concerne à duração da medida, cremos que se pecar é apenas por defeito e não por excesso, sendo difícil de antever que bastem 12 meses para lograr uma satisfatória educação para o direito. Não obstante a medida aplicada ter a duração de 12 meses, a mesma pode ser revista se a mesma se revelar desnecessária devido aos progressos educativos alcançados pelo menor (artigo 136º, nº 1, al. d) da LTE. Nesse caso pode ser reduzida ou mesmo declarada extinta artigos 138, nº 1 als d) e e) da citada Lei.
Texto Integral
Acordam em Conferência os Juízes da 3ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa
1. Relatório
Nos autos de processo tutelar educativo n.º 3575/23.2 Y6LSB.L1 foi decidido aplicar a menor AA, melhor identificada nos autos, a medida tutelar educativa de acompanhamento educativo, pelo período de 12 meses, prevista nos artsº. 4º nº. 1 h), 16º nº. 2 e 3 da Lei Tutelar Educativa nº. 166/99 de 14-9. Não conformada, veio a recorrente interpor recurso para este Tribunal, juntando, para tanto, as motivações que constam destes autos, e que aqui se dão por integralmente reproduzidas para todos os efeitos legais, concluindo nos seguintes termos, que se transcrevem:
A.O Ministério Público apresentou requerimento inicial de abertura de fase jurisdicional imputando a AA que:
- No dia ... de ... de 2023, a jovem AA dirigiu-se à colega BB no decurso de uma aula de educação física, e, puxando-lhe o cabelo e deitando-a ao chão, desferindo-lhe depois vários pontapés na barriga perna e face, enquanto a mantinha manietada, agarrando-a pelos cabelos; pouco depois, no intervalo a AA dirigiu-se a CC e, e puxa-lhe os cabelos com bastante força, arrancou-lhe um tufo grande de cabelo.
- No dia ... de ... de 2024, a jovem AA dirigiu-se à vizinha DD e disse-lhe que a mesma era "mentirosa e que era uma puta ordinária” desferindo-lhe de seguida vários murros na cabeça e puxões de cabelo; pouco depois a Jovem foi ao encontro da vizinha EE, desferiu-lhe vários murros na cabeça e na face e ainda a mordeu no braço direito.
B. Realizado o julgamento com observância das formalidades legais, resultaram provados os factos numerados de 1 a 28, no relatório da (douta) sentença.
C. Resultaram ainda provados, a partir dos alegados na defesa, embora o (douto) Tribunal a quo, com o devido respeito, não os tenha numerado e colocados na ordem correta no relatório da sentença, que:
29. DD e EE envolveram-se em confronto físico com a jovem AA, sendo aquelas mulheres adultas;
30. Do confronto físico com DD e EE, a AA ficou ferida
com escoriações e hematomas;
31. Tendo havido lesões recíprocas não apurou em nenhuma das situações ocorridas em ... de ... de 2024, quem iniciou as agressões.
32. O facto referido em 8 ocorreu no contexto referido em 29.
D. O que se retira dos seguintes segmentos da (douta) decisão recorrida: “Importa sublinhar que o Tribunal ao concluir pela veracidade dos factos constantes do requerimento de abertura de fase jurisdicional não olvida o contexto em que os mesmos ocorreram. Desde logo, existe a já indicada animosidade que DD e EE tinham para com a jovem AA, imputando-lhe o comportamento que levou a que o prédio onde todas moram ficasse sujo. Não pode igualmente deixar de pôr-se em relevo que se trata de duas mulheres adultas que se envolveram em confrontos físicos com uma criança, apesar de fisicamente robusta. Por último, as mesmas têm a correr contra si processo crime devido aos acontecimentos em discussão nestes autos… (…)
(…) Na verdade, depois de [a AA] ter participado no confronto físico com DD, tendo mesmo ficado ferida conforme fotografias juntas aos autos…” (…) “Contudo, verifica-se que houve lesões recíprocas. Por outro lado, da conjugação das declarações de AA e das testemunhas não é possível retirar com segurança quem agrediu primeiro quem. Na verdade, tem o Tribunal em atenção não só a rivalidade entre vizinhos e a animosidade para com a AA por parte das vizinhas DD e EE, mas também o facto de estas pessoas terem sido objecto de queixa criminal pelos factos em discussão nestes autos. Assim sendo, não pode dizer-se que sejam desinteressadas no seu desfecho.”
E. Da imputação, e em síntese, provou-se apenas, que. no dia ...-...-2023, no contexto de um desentendimento na escola, a jovem AA puxou o cabelo a BB e a CC; por relação ao ocorrido no dia ...-...-2024, provou-se que a jovem foi também agredida pelas maiores DD e EE, a jovem sofreu lesões pelos atos destas, sem que em qualquer dos casos, se conseguisse apurar quem agrediu primeiro, o que exprime uma menor culpa, e que foi nesse contexto que a jovem chamou “puta” a DD.
F. A matéria de facto provada apresenta contornos substancialmente diferentes dos descritos na acusação. Os factos inicialmente imputados configuravam um grau de agressividade e um desrespeito pelos valores fundamentais da vida em comunidade claramente mais grave, exprimindo uma deformação da personalidade que, segundo o Ministério Público, demandava a aplicação uma medida educativa de acompanhamento por 12 meses.
G. De modo diverso, os factos que se lograram provar exigem uma resposta ajustada a exigências de educação para o direito distintas, pois assentam num comportamento de natureza substancialmente diferente. Na acusação, perfilava-se uma atuação de violência gratuita, desmedida e unilateral, reveladora de um impulso agressivo descontrolado e de uma preocupante insensibilidade às consequências dos próprios atos. Já nos factos provados, para além de não se ter demonstrado parte significativa da imputação, apurou-se que a jovem foi igualmente alvo de agressões por parte de adultos, emergindo daí uma realidade conflituosa mais complexa e uma culpa claramente mitigada face àquela que a acusação inicialmente sustentava.
I. A medida de acompanhamento educativo por 12 meses não pode ser aplicada como uma solução padronizada para todas as situações. A sua aplicação deve ser proporcional, adequada às circunstâncias concretas e às necessidades educativas efetivas da jovem.
J. Não se promove a educação para o direito se, independentemente dos factos que venham a ser provados, se aplicar sempre a mesma medida, indiferenciada e automática. A jovem dificilmente interiorizará qualquer noção de justiça ou responsabilidade se compreender que, quaisquer que sejam os seus comportamentos, a consequência será invariavelmente a mesma.
K. Considerando a natureza dos factos e a conduta da jovem, a medida de acompanhamento educativo por 12 meses, mostra-se desproporcionada e desadequada, sendo suficiente para assegurar as necessidades educativas, uma medida de admoestação, nos termos do art. 4.º al a) LTE, ou, no limite, a frequência de programas formativos que permitam à jovem trabalhar competências no domínio do autocontrolo e resolução de conflitos, nos termos do art. 4º al. g) LTE da pelo tempo equivalente a um período letivo de 4 meses.
* O recurso foi admitido e respondeu o Ministério Público, concluindo pela improcedência do recurso nos seguintes termos:
A douta sentença ora posto em crise, considerou provado que a menor AA praticou factos suscetíveis de serem qualificados como quatro (4) crimes de ofensa à integridade física e 1 (um) crime de injúria, ilícitos previstos e punidos pelos artigos 143º e 181º do Código Penal.
Em consequência, e perante as necessidades de “educação para o direito”, foi-lhe aplicada a medida tutelar de acompanhamento educativo pelo período de 12 meses.
O tribunal “a quo” aplicou à jovem AA a medida tutelar educativa proposta pelo Ministério Público, por a considerar adequada, sendo certo que poderia ter aplicado outra mais gravosa, ou a mesma, mas com duração superior, pois não está vinculado à proposta efetuada pelo Ministério Público (artigo 104, nº 5, da LTE).
Não estando vinculado à medida proposta pelo Ministério Público, e caso os factos tivessem ocorrido do modo como descreve a Recorrente, e que extraiu do requerimento de abertura da fase jurisdicional, a saber “Na acusação, perfilava-se uma atuação de violência gratuita, desmedida e unilateral, reveladora de um impulso agressivo descontrolado e de uma preocupante insensibilidade às consequências dos próprios atos” poderia o tribunal a quo, eventualmente, aplicar outra medida ou a mesma, mas por um período de tempo mais longo.
Não o fez, certamente por ter considerado já o contexto em que os factos ocorreram, considerando, assim adequada a medida proposta. Por isso, falar em caráter automático da medida não nos parece correto, por não corresponder à verdade.
Por outro lado, quando se fala em proporcionalidade da medida, mais que ter em conta os factos, há que aferir da necessidade da medida tutelar e se esta é adequada aos fins da mesma.
As medidas tutelares têm por objetivo (principal), a necessidade de educar o menor para o direito bem como restabelecer a paz jurídica comunitária. (cfr. Anabela Miranda Rodrigues, Comentário à LTE, pág. 159). 8- Ainda quando á duração da medida, considerada elevada pela Recorrente, importa referir que, não obstante a medida aplicada ter a duração de 12 meses, a mesma pode ser revista se a mesma se revelar desnecessária devido aos progressos educativos alcançados pelo menor (artigo 136º, nº 1, al. d) da LTE. Nesse caso pode ser reduzida ou mesmo declarada extinta artigos 138, nº 1 als d) e e) da citada Lei.
A medida tutelar aplicada - acompanhamento educativo - revela-se não só proporcional, como adequada às necessidades de educação para o direito que a jovem apresenta, pois que a AA necessita de aprender a controlar os seus impulsos, pensando antes de agir.
Contribuiu para essa crença, não só meio em que se encontra inserida, como o próprio ambiente familiar, uma vez que a progenitora minimiza alguns comportamentos menos adequados, atribuídos à sua filha, alegando que tem que se defender quando é ofendida.
A medida aplicada – acompanhamento educativo por 12 meses – é adequada às necessidades de educar a menor para o direito e a sua inserção, de forma digna e responsável, na vida em comunidade – cfr. artigo 2 n. 1, da LTE, pelo que deverá ser mantida. Nesta instância, foi cumprido o disposto no art. 416º nº 1 do Código de Processo Penal. O Digno Procurador-Geral Adjunto proferiu parecer, pugnando pelo não provimento do recurso.
***
O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas (art.s 403º e 412º do Código de Processo Penal), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso. Deu-se cumprimento ao disposto no artigo 417º nº 2 do CPP, foram os autos aos vistos e procedeu-se à Conferência.
2. Fundamentação:
Cumpre assim apreciar e decidir. A decisão recorrida tem o seguinte teor:
O Ministério Público apresentou requerimento inicial de abertura de fase jurisdicional relativamente a factos imputados a:
- AA, solteira, estudante, nascida em ... de ... de 2010, filha de FF e de GG, residente na ..., imputando-lhe factos que se práticados em idade penalmente imputável, integrariam quatro crimes de ofensa à integridade física, p. e p. pelo artigo 143°, n° 1, do Código Penal e um crime de injúria, com assento legal no art. 181°, n°1 do mesmo diploma legal.
Em audiência prévia a jovem não aceitou a medida proposta pelo Ministério Público.
A jovem juntou requerimento probatório, com rol e documentos.
Realizou-se audiência de julgamento.
Mantém-se a regularidade da instância.
II - Fundamentação de facto
A) Factos provados
Com interesse para a causa provou-se que:
No ano letivo de ...2.../2024 as jovens AA, BB e CC foram colegas da mesma Escola, a ..., sita em ....
No dia ... de ... de 2023, na sequência de uma troca de palavras entre a AA e a sua condiscípula BB no decurso de uma aula de educação física, devido a uma atitude que BB achou que AA tinha tido com outra colega quando a chamou a atenção por estar a correr muito devagar, a jovem AA num momento em que ambas se encontravam fora da referida aula, dirigiu-se à colega BB, puxando-lhe o cabelo.
Pouco depois, já no intervalo a seguir à referida aula, no recreio da escola, cerca das 11h40, e depois de nova troca de palavras sobre o sucedido com a colega AA, a jovem AA dirige-se a esta última colega e puxa-lhe os cabelos com bastante força, conseguindo arrancar-lhe um tufo grande de cabelo.
Em consequência das descritas condutas, BB e CC sofreram dores, algumas escoriações e queda de cabelo.
Ao proceder da forma descrita, a jovem AA agiu livre e conscientemente com o propósito concretizado de atingir corporalmente as ofendidas BB e CC na respetiva integridade física, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
A jovem AA é vizinha de DD e de EE, residindo todas no prédio supra identificado, sito em ....
No dia ... de ... de 2024, pelas 19h00, na sequência de desentendimentos relacionados com o facto do prédio se encontrar sujo por causa de balões de água que tinham sido arremessados para as partes comuns do prédio e de uma discussão que se seguiu a esse desentendimento, a jovem AA e seus familiares, por um lado, e as duas supra identificadas vizinhas e respetivos familiares, por outro, envolveram-se em discussão verbal e física entre todos.
A jovem dirigiu-se a DD e disse-lhe que a mesma era uma puta, desferindo-lhe de seguida vários murros na cabeça e puxões de cabelo.
Pouco depois deste primeiro incidente, a jovem AA foi ao encontro de EE e, na sequência de nova troca de palavras com a mesma sobre a dita desavença, desferiu-lhe vários murros na cabeça e na face e ainda a mordeu no braço direito.
Em consequência das descritas condutas, DD e EE sofreram dores e algumas escoriações.
Ao proceder da forma descrita, a jovem AA agiu livre e conscientemente com o propósito concretizado de atingir corporalmente as ofendidas DD e EE na respetiva integridade física, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
A jovem encontra-se inserida no agregado familiar, composto pelos progenitores de quarenta e três; e trinta e nove anos de idade; e dois irmãos germanos do sexo masculino, um com quinze, e outro de seis anos de idade.
O agregado reside numa habitação social, num contexto descrito como tranquilo, sendo neste envolvente que a jovem possui as suas referências pessoais e familiares.
Apesar de nas imediações se localizem bairros conotados com várias problemáticas de ordem social, a jovem não exposta a elas, nem tem tais ligações.
A situação económica da família é assegurada pelo rendimento social de inserção, e das prestações familiares, sendo que, ambos os progenitores são desempregados de longa duração.
A relação da jovem com os elementos do seu agregado familiar foi descrita de forma positiva, tendo sido referido que respeita as regras familiares.
As práticas educativas são assumidas por ambos os progenitores, embora a mãe pareça exercer um papel preponderante, privilegiando o desenvolvimento de competências, por parte da jovem, ao nível das responsabilidades domésticas.
Já relativamente às regras em contexto escolar, a progenitora minimiza alguns comportamentos menos adequados, atribuídos à sua filha, alegando que tem que se defender quando é ofendida. Esta crença poderá ser potenciadora de estratégias mal adaptativas de resolução de conflitos, nomeadamente passagens ao ato com agressividade verbal e físico, em detrimento de outras estratégias alternativas de resolução de problemas, com recurso ao diálogo ou mediação.
A jovem apresenta um percurso escolar com uma retenção no segundo ano de escolaridade. No último ano letivo frequentou o sétimo ano na ..., e apresentou durante o primeiro período um rendimento escolar muito baixo, associado a falta de assiduidade e de empenho nas atividades letivas.
No segundo período revelou maior investimento e motivação, assim como assiduidade mais regular, acabando transitar para o oitavo ano de escolaridade, embora com três níveis negativos.
Ao longo do ano teve acompanhamento por parte do ensino especial, e de acordo com informações recolhidas através do relatório elaborado pelo diretor de turma, e pela professora de ensino especial, AA apresenta dificuldades de aprendizagem, tendo tudo apoio direcionado às suas necessidades, incluindo medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão, tutoria e acompanhamento psicológico. Contudo, revelou elevado absentismo.
Em termos comportamentais é uma jovem tendencialmente ajustada.
Todavia no contexto escolar foi referido tende a reagir e forma disruptiva quando advertida de forma mais ríspida ou autoritária, aspeto que a própria refere ter dificuldade em controlar.
A encarregada de educação revelou-se sempre cooperante e compareceu na escola sempre que solicitado.
De acordo com referências da jovem e sua mãe, aquela mantém ligações a pares com comportamentos normativos, mantendo um círculo a de amigos restrito, com os quais partilha interesses, e cuja relação é avaliada pela progenitora de forma favorável, alegando tratar-se de conhecimentos de longa data e que reconhece como normativos.
A jovem não desenvolve atividades de tempos livres organizadas, tendo referido que ajuda a mãe em casa, e que mantém algumas atividades lúdicas de caracter individual e outras com jovens do mesmo bairro de residência.
AA apresenta uma postura tendencialmente ajustada, nos diferentes contextos em que se insere.
Identificam-se algumas dificuldades em lidar com a frustração, e de controlo dos impulsos quando confortada de forma mais ríspida, ou perante situações de tensão. Por outro lado, subsistem indicadores de que estará sujeita a crenças suscetíveis de potenciar o recurso a estratégias mal adaptativas de resolução de conflitos, podendo recorrer à agressividade verbal ou física.
B. Factos não provados
Nada mais se provou. Designadamente não se provou que:
A AA desferiu depois vários pontapés na barriga, pernas e face, enquanto a mantinha manietada BB, deitando-a ao chão.
C. Motivação da decisão de facto
A convicção do Tribunal alicerçou-se na ponderação crítica e conjugada da prova produzida em audiência de julgamento, analisada à luz de regras de experiência comum e critérios de normalidade. Ponderaram-se as declarações da jovem AA, os depoimentos das testemunhas e a prova documental, incluindo as fotografias juntas pela jovem aos autos.
AA prestou declarações, dando conta da sua versão dos acontecimentos. Disse que tinha dito a uma colega chamada HH para ela se despachar a correr, tendo esta começado a chorar. A HH foi fazer queixa à II, que a insultou. O professor mandou a AA para a rua, por causa disso. Quando estava fora da sala indo ao encontro da auxiliar de acção educativa D. JJ foi atrás dela. A AA disse que a BB e a II não se iam embora, apesar de estar a chorar e da auxiliar lhes dizer que fossem embora dali. Quando foram, estavam a rir-se tocaram-lhe no cabelo. A AA admitiu que foi a correr atrás delas e que puxou o cabelo à BB. No que tange à AA disse que também esta foi atrás de si, confrontando-a e que lhe deu um empurrão. Disse ainda que deu o empurrão em resposta e que começaram à bulha. A versão dos acontecimentos trazida aos autos foi desmentida pelos demais depoimentos. Cabe dizer que quer as duas colegas de escola, quer a auxiliar de acção educativa, depuseram de forma isenta, sendo mesmo evidente das suas declarações que tentaram minimizar o sucedido.
BB relatou ao Tribunal o modo como foi ao encontro de AA por ela ter falado de forma desagradável com uma colega. Disse ainda que acabou por se afastar da jovem, mas que esta veio atrás de si e lhe puxou os cabelos, apanhando-a de costas. A jovem tentou desvalorizar os factos, tentando passar a ideia de que os mesmos não tiveram importância e que são coisas correntes entre adolescentes. Ainda assim, confirmou que nunca se tinha envolvido em situação como a dos autos, nem antes, nem depois dos acontecimentos. No que diz respeito aos pontapés e demais formas de agressão, não os confirmou.
KK, exerce funções como assistente operacional da escola secundária ..., conhecendo de vista a AA e a BB. Disse que quando chegou ao local, a AA estava agarrada aos cabelos da BB. Tentaram separar, mas foi difícil. Quando conseguiram, a AA fugiu, tendo ido para o recreio tendo-se envolvido noutra briga.
Refira-se que a jovem BB se apercebeu igualmente da agressão de AA à jovem AA, colega de ambos no Liceu. Ouvida AA, a mesma relatou que a colega AA se aproximou dela e quando lhe estava a chamar à atenção para o seu comportamento, lhe puxou os cabelos, arrancando-lhe um tufo deles. A existência desse tufo de cabelo arrancado pela AA à colega AA foi confirmada por BB.
Cabe salientar que tal como sucedido com BB, também CC depôs de forma isenta, minimizando a situação em que se viu envolvida com AA.
O Tribunal teve ainda em conta o teor do relatório elaborado. Assume particular relevo a descrição da jovem como alguém com dificuldade em lidar com a frustração e em controlar os seus impulsos, bem como em situações de tensão. Importa referir que se demonstrou que a jovem vive com os pais e irmãos, formando um núcleo afectivamente sólido. Contudo, para além do desinvestimento escolar que se desprende dos autos e das dificuldades em controlar os seus impulsos, verifica-se ainda outra limitação grava na vida da jovem: a exposição da mesma a conflitos familiares com os vizinhos, sem que encontre a devida protecção junto da sua família.
Isso mesmo é visível no segundo núcleo de factos que foram trazidos a juízo, ocorridos a ... de ... de 2024.
Quanto a estes foram ouvidas as seguintes testemunhas: DD, EE, LL, FF e GG. A jovem AA admitiu ter estado envolvida em altercação física com as vizinhas DD e EE. Disse que a primeira chamou nomes à sua mãe (puta) e que pela sua parte apenas lhe retribuiu o epíteto, dizendo "puta é você".
Afirmou que agiu fisicamente para se defender e para ajudar, no primeiro incidente a mãe (a quem teriam chamado nomes e tentado bater) e no segundo o irmão LL. A sua versão dos factos foi confirmada pela mãe e pelo irmão. Quanto à contenda com EE, a jovem AA disse que decidiu descer à rua por ter tido receio que esta e o namorado batessem no irmão. Todavia, não conseguiu concretizar porque motivo da janela de casa onde se encontrava a olhar para a rua concluiu que o irmão ia ser agredido.
Esta versão dos factos foi mais uma vez confirmada pelos familiares da jovem. Contudo, quer DD, quer EE afirmaram com credibilidade terem sido agredidas pela jovem, tendo a última exibido a cicatriz de uma mordida que disse ter-lhe sido feita por AA. Cabe referir que também a jovem ficou ferida, como decorre das fotografias que juntou aos autos e que foram exibidas em audiência de julgamento. DD explicou que abordou a mãe da jovem no patamar do prédio, depois de ter estado a limpá-lo com outros vizinhos. A testemunha referiu que tinham sido a AA e o irmão quem tinha estado a rebentar balões de água no dia anterior, assim sujando a entrada do prédio. Este facto foi negado, quer pela AA, quer por sua mãe, que foi ouvida como testemunha. Das declarações dos envolvidos resulta uma evidente animosidade entre todos na vivência quotidiana.
Também importa salientar que não se demonstrou em momento algum que as agressões que a jovem perpetrou tenham resultado de legitima defesa sua ou de terceiro (mãe ou algum dos irmãos).
Quanto à primeira situação (com DD) não vê o Tribunal porque motivo seria necessário a AA defender a sua mãe, que é uma mulher adulta, fisicamente capaz, e para mais acompanhada de pelo menos um filho adolescente (o LL). Aliás, quanto ao incidente com a vizinha EE (que a jovem AA disse ter sucedido por ter querido defender o irmão LL) também não se compreende a necessidade da sua actuação. O irmão LL é mais velho do que AA e não sofre de qualquer limitação física. Mais importante ainda, não se provou que tenha sido ou estivesse na iminência de ser batido. Por outro lado, nessa ocasião foi o próprio pai da jovem que desceu à rua, não sabendo explicar o motivo pelo qual a AA estava com ele. Foi nesta situação que a jovem AA se envolveu fisicamente com a EE, tendo-lhe batido nos termos acima descritos.
Importa sublinhar que o Tribunal ao concluir pela veracidade dos factos constantes do requerimento de abertura de fase jurisdicional não olvida o contexto em que os mesmos ocorreram.
Desde logo, existe a já indicada animosidade que DD e EE tinham para com a jovem AA, imputando-lhe o comportamento que levou a que o prédio onde todas moram ficasse sujo. Não pode igualmente deixar de pôr-se em relevo que se trata de duas mulheres adultas que se envolveram em confrontos físicos com uma criança, apesar de fisicamente robusta. Por último, as mesmas têm a correr contra si processo crime devido aos acontecimentos em discussão nestes autos. Ainda assim, os seus depoimentos revelaram-se verosímeis e coerentes com a demais prova produzida.
Por fim, o que estes incidentes demonstram é a desproteção em que se encontra a jovem AA por parte dos pais, que deveriam ter sido os primeiros a protege-la. Na verdade, não foi o pai capaz de explicar porque motivo deixou a filha AA sair para ir ao encontro do irmão na situação em que a mesma se confrontou com EE.
O pai acabou por dizer que a filha saiu atrás deles, sem que ele disso desse conta. Em última análise, se tal corresponde à realidade, apenas se pode concluir que aquele não sabe impor a sua autoridade parental à filha. Na verdade, depois de ter participado no confronto físico com DD, tendo mesmo ficado ferida conforme fotografias juntas aos autos, é incompreensível que os pais não tivessem dito à filha que ficaria em casa durante o resto da tarde, antes lhe permitindo ir ao encontro de nova vizinha (que já tinha estado envolvida no primeiro confronto). Tanto mais que o primeiro desacato determinou ainda a chamada da policia, expondo a jovem a uma situação que em nada contribuiu para o seu sadio desenvolvimento.
III - Do Direito
O crime de ofensa à integridade física tem a sua base legal no art. 143° do Código Penal.
A incriminação visa a tutela da integridade física, bem jurídico que abrange o corpo e a saúde, sendo o ilícito em causa um crime material ou de dano. Trata-se de um bem jurídico com dignidade constitucional. A partir da Lei Fundamental a tutela legal estende-se contra agressões ilícitas de terceiros e do Estado ou entidades que representam este, com assento, quer na lei civil, quer na lei penal. Em causa está a tutela contra um determinado resultado que é a lesão do corpo ou saúde de outrem, fazendo-se a imputação objectiva deste resultado à conduta ou à omissão do agente. São elementos do tipo de ilícito: (a) a verificação de uma qualquer ofensa no corpo, enquanto bem-estar físico, ou na saúde, enquanto normal funcionamento das funções corporais, de uma forma não insignificante; (b) causada a terceiro, por acção ou omissão; (c) acção ou omissão essas que tem de ser dolosas, enquanto conhecimento e vontade de realização do tipo de ilícito, revelando uma atitude pessoal contrária ou indiferente ao bem jurídico protegido, traduzindo-se, deste modo, o elemento subjectivo do tipo no dolo em qualquer das modalidades previstas no artigo 14.° do Código Penal.
No caso dos autos resultou demonstrado que a jovem ofendeu as suas colegas de escola no corpo nos termos acima descritos. O que consubstancia a ofensa à integridade física é a existência de um contacto corporal doloso, com intenção de magoar. A intensidade do toque (com mais ou menos força), o grau de dor que foi infligido e as suas consequências são elementos revelantes, para melhor enquadrar o ilícito nas normais penais e daí extrair consequências (ofensas simples ou qualificadas, por exemplo).
No caso dos autos provou-se que a jovem puxou os cabelos, primeiro a BB e depois a AA. Tem, pois de concluir-se pelo preenchimento do tipo de ilícito imputado. O mesmo se diga quanto ao crime de ofensa à integridade física que teve como ofendida DD e os factos perpetrados pela jovem sobre EE. Não se apurou a existência de factos que traduzam qualquer causa de exclusão da ilicitude.
Já acima se deu nota de que o Tribunal tem presente o contexto de rivalidade entre vizinhos em que as mesmas ocorreram.
Contudo, não se fez prova de prova da existência de situação subsumível a legítima defesa. Desde logo, por não se demonstrar que os familiares da jovem tivessem sido agredidos ou que precisam do seu auxílio. O que os autos demonstram nesta parte é um sentimento de protecção exacerbado da parte da jovem, agravado pela impulsividade e incapacidade de encontrar formas de r/ solução dos conflitos que não passem pelo recurso à força física.
Tem-se ainda em conta o disposto no n°4 do art. 143° do Código Penal. Pode ler-se nesse preceito:
"O tribunal pode dispensar de pena quando:
a. Tiver havido lesões recíprocas e se não tiver provado qual dos contendores agrediu primeiro; ou
b. O agente tiver unicamente exercido retorsão sobre o agressor."
Não se prova que exista retorsão, pelo que a al.b) não é de aplicar. Contudo, verifica-se que houve lesões recíprocas. Por outro lado, da conjugação das declarações de AA e das testemunhas não é possível retirar com segurança quem agrediu primeiro quem. Na verdade, tem o Tribunal em atenção não só a rivalidade entre vizinhos e a animosidade para com a AA por parte das vizinhas DD e EE, mas também o facto de estas pessoas terem sido objecto de queixa criminal pelos factos em discussão nestes autos. Assim sendo, não pode dizer-se que sejam desinteressadas no seu desfecho.
Todavia, há dois aspectos ainda a ter em atenção. Em primeiro lugar, a lei penal estabelece que o Tribunal pode dispensar a pena e não que o Tribunal tem de dispensar a pena. Ou seja, cabe ao julgador perante a factualidade apurada determinar se no caso concreto se justifica dispensar a pena que seria aplicada, quando entenda que existem circunstâncias que o justificam. No caso concreto, as mesmas não se vislumbram, tanto mais que o ocorrido a .../.../2024 não é algo isolado na vida da jovem, tendo presente o que se provou quanto ao seu comportamento escolar nestes autos.
Em segundo lugar, e este e o ponto mais importante, os presentes autos não assumem natureza penal, visando antes a educação da jovem para o Direito.
Assim, a questão a decidir não se subsume a um juízo de culpa e responsabilidade penal, mas antes averiguar se dos autos se desprendem ou não factos que permitam concluir pela necessidade de educação para o Direito d jovem AA.
A jovem admitiu ainda ter chamado "puta" à vizinha DD, apenas dizendo que aquela tinha chamado tal nome a sua mãe primeiro. Ainda que assim tenha sido (o que não se provou) não pode deixar de considerar-se que está preenchido o art. 181° do Código Penal.
Em causa está a honra e consideração pessoais que a todos são devidos. Tais bens jurídicos são alicerçados na dignidade da pessoa humana e com assento na Lei Constitucional. Em ambos os casos tutela-se a honra e a consideração pessoais. "Honra será a dignidade subjectiva da pessoa, ou seja, o elenco de valores éticos que cada pessoa possui, dizendo respeito ao património pessoal e interno de cada um - o próprio eu. A consideração será o merecimento que o indivíduo tem no meio social, isto é, a reputação, a boa fé, a estima, a dignidade objetiva, ou seja, a forma como a sociedade vê cada cidadão - a opinião pública" (cf. Código Penal Anotado, Simas Santos e Leal-Henriques, vol. II, pág. 317 e Ac. da Relação de Lisboa de 6-2-96, CJ, tomo I, pág. 156).
O crime de injúria encontra-se previsto no art. 181° do CP.
O ilícito pode ser preenchido através das seguintes acções típicas: - A imputação de um facto ofensivo (ainda que meramente suspeito). - A formulação de um juízo de desvalor. - A reprodução de uma imputação ou de um juízo.
No caso dos autos, a expressão utilizada pela jovem, ainda que reflexamente como a própria indicou, consubstancia um inequívoco juízo de desvalor da pessoa de DD. E é mais uma vez elucidativa da incapacidade que a jovem tem de conter impulsos.
II) Da necessidade de aplicação de medida tutelar educativa
A verificação dos factos acima indicada sendo um elemento essencial para a determinação de aplicação ou não de medida tutelar educativa, não é, ainda assim, o elemento único da sua aplicação.
Com efeito, cabe avaliar se perante a factualidade apurada se verifica ou não uma necessidade de educação para o Direito. No caso da jovem AA cremos que a resposta é afirmativa.
Importa ter presente a sua actuação junto das colegas de escola AA e BB, traduzindo-se em agressões físicas a ambas, apenas por não ter gostado de ser confrontada pelas mesmas com o seu comportamento na aula de educação física. Por outro lado, dos elementos trazidos aos autos resulta ainda que a jovem se viu envolvida em outras duas contendas físicas num mesmo, ambas com vizinhos do seu bairro. Quanto a este aspecto, é de realçar que mesmo inserida num meio familiar afectivo, o mesmo não só não é contendor, como não é protector para a jovem. O envolvimento da jovem em confrontos com vizinhos adultos, para mais na presença dos pais, é disso sinal evidente.
Verifica-se que os pais, em particular a mãe, impõem regras à filha e exercem sobre ela alguma supervisão. Contudo, a mesma não se tem revelado suficiente. Aliás, é indicado que a mãe privilegia o envolvimento da filha em tarefas domésticas. Embora tal contribua também para o seu desenvolvimento e autonomização não é suficiente. Á medida que AA cresce e o seu mundo se amplia é necessário que ganhe competências em outras áreas da sua vida, incluindo de relacionamento social.
A jovem tem tido um percurso académico marcado por algum absentismo e tem igualmente necessidade de apoios educativos. Mostra-se pouco motivada para o seu percurso escolar. Por outro lado, a AA demonstra acentuada impulsividade, dificuldade em gerir a frustração e um fácil recurso à agressão física para resolver conflitos. Ora, este tipo de incompetência social tem reflexos imediatos na sua educação para o Direito, expondo a jovem a comportamentos antissociais que devem ser debelados. Só aprendendo a controlar o seu temperamento, a gerir as diferenças de opinião e as críticas que lhe são dirigidas e a responder de forma socialmente ajustada às mesmas, poderá a AA inserir-se de forma responsável em sociedade.
A medida de acompanhamento educativo pelo prazo de doze meses é adequada e proporcional, motivo pela qual se decide pela sua aplicação à jovem AA.
IV - Decisão
Face ao que precede e com os fundamentos acima expostos aplica-se à jovem AA medida tutelar educativa de acompanhamento educativo, pelo período de 12 meses, prevista no artigo nos artigos 4° n° 1 al. h), 16° no 2 e 3, do referido diploma legal da Lei Tutelar Educativa (Lei n. 166/99, de 14 de Setembro).
*** Em suma, a única questão a decidir é a seguinte:
- saber se medida tutelar educativa de acompanhamento educativo, pelo período de 12 meses, é adequada e proporcional aos factos praticados.
Lidas as conclusões do recurso, percebe-se mal o porquê da interposição do mesmo, porquanto o que a recorrente alega é que os factos dados como provados divergem daqueles dos quais vinha acusada e com base nisso pretende que a sua conduta foi afinal menos gravosa e, portanto, justificar-se-ia uma medida como a admoestação ou a frequência de programas formativos que permitam à jovem trabalhar competências no domínio do autocontrolo e resolução de conflitos, nos termos do art. 4º al. g) LTE da pelo tempo equivalente a um período letivo de 4 meses.
A sentença considerou provado que a menor AA praticou factos susceptíveis de serem qualificados como quatro (4) crimes de ofensa à integridade física e 1 (um) crime de injúria, ilícitos previstos e punidos pelos artigos 143º e 181º do Código Penal.
Em consequência, e perante as necessidades de “educação para o direito”, foi-lhe aplicada a medida tutelar de acompanhamento educativo pelo período de 12 meses.
De acordo com o artigo 6º da LTE, a lei 166/99 de 14.09, 1- Na escolha da medida tutelar aplicável o tribunal dá preferência, de entre as que se mostrem adequadas e suficientes, à medida que represente menor intervenção na autonomia de decisão e de condução de vida do menor e que seja suscetível de obter a sua maior adesão e a adesão de seus pais, representante legal ou pessoa que tenha a sua guarda de facto.
2 - O disposto no número anterior é correspondentemente aplicável à fixação da modalidade ou do regime de execução de medida tutelar.
3 - A escolha da medida tutelar aplicável é orientada pelo interesse do menor.
4 - Quando o menor for considerado autor da prática de uma pluralidade de factos qualificados como crime o tribunal aplica uma ou várias medidas tutelares, de acordo com a concreta necessidade de educação do menor para o direito.
Conforme frisa o MP, as medidas tutelares têm por objetivo (principal), a necessidade de educar o menor para o direito bem como restabelecer a paz jurídica comunitária. (cfr. Anabela Miranda Rodrigues, Comentário à LTE, pág. 159).
A medida tutelar aplicada - acompanhamento educativo - revela-se não só proporcional, como adequada às necessidades de educação para o direito que a jovem apresenta.
A este respeito, pode ler-se no Acórdão da Relação do Porto de 22-05-2013 I - A intervenção tutelar educativa do Estado relativamente aos jovens justifica-se quando se tenha manifestado uma situação desviante que tome clara a ruptura com elementos nucleares da ordem jurídica, legitimando-se o Estado para educar o jovem para o direito, mesmo contra a vontade de quem está investido das responsabilidades parentais. II - São pressupostos da intervenção tutelar educativa: A existência de uma ofensa a bens jurídicos fundamentais traduzido na prática de um facto considerado por lei como crime; A exigência ao jovem do dever de respeito pelas disposições jurídico- penais essenciais normalidade da vida em comunidade, conformando a sua personalidade de forma socialmente responsável - necessidade de ser educado para o direito; A idade mínima de 12 anos, fazendo coincidir o início da puberdade com o limiar da maturidade requerida para a compreensão do sentido da intervenção tutelar educativa. III - E é ainda necessário que a necessidade de correcção subsista no momento da decisão. IV - Tal como acontece com as penas, exclui-se qualquer finalidade retributiva: as medidas tutelares não são um castigo, uma expiação ou compensação do mal do crime (punitur quia peccatum est), mas visam garantir que o desenvolvimento do menor ocorra de forma harmoniosa e socialmente integrada e responsável, tendo como referência o dever-ser jurídico consubstanciado nos valores juridicamente tutelados pela lei penal, enquanto valores mínimos e essenciais da convivência social V À semelhança do que sucede no processo penal, em que a tarefa primeira do juiz é a escolha da pena a aplicar, também no processo tutelar deve o julgador começar por ponderar e decidir qual a medida tutelar mais adequada, a que melhor serve o interesse do menor, dando-se preferência aquela que realize de forma adequada e suficiente a finalidade subjacente da sua aplicação, isto é, a socialização do menor. VI - Na determinação da dosimetria concreta da medida a aplicar importa observar os critérios de proporcionalidade e necessidade de correcção da personalidade do menor manifestada na prática do facto e que subsista no momento da decisão. VII - Na fixação da duração da medida concretamente aplicada, o tribunal deve ter em conta a gravidade do facto cometido, a necessidade de correcção da personalidade do menor, manifestada na prática do facto, e a actualidade dessa necessidade de correcção. VIII - O Tribunal deve dar preferência, de entre as medidas que se mostrem adequadas e suficientes, a medida que represente menor intervenção na autonomia de decisão e de condução de vida do jovem e que seja susceptível de obter a sua maior adesão e a adesão dos pais, representante legal ou pessoa que tenha a sua guarda de facto. IX - A escolha da medida tutelar aplicável é orientada pelo interesse do jovem (balizado pela protecção dos seus direitos fundamentais, assim se exigindo a observância no âmbito do processo tutelar educativo dos princípios da legalidade, tipicidade, oficialidade, obtenção da verdade material, contraditório, livre apreciação da prova e celeridade processual). X - A medida, sempre de duração determinada, deve ser proporcionada gravidade do facto e a necessidade de educação do jovem para o direito, manifestada na prática do facto e subsistente no momento da decisão.
Acresce o artigo 16 da LTE, do qual resulta que:
1.A medida de acompanhamento educativo consiste na execução de um projecto educativo pessoal que abranja as áreas de intervenção fixadas pelo tribunal.
2.O tribunal pode impor ao menor sujeito a acompanhamento educativo regras de conduta ou obrigações, bem como a frequência de programas formativos.
(…)
5.A medida de acompanhamento educativo tem a duração mínima de três meses e a máxima de dois anos, contados desde a data do trânsito em juglado da decisão de homologação judicial prevista no n.º3.
A LTE configura-se como instrumento de intervenção desenvolvido pelo Estado com o intuito de resolver a questão de delinquência juvenil e garantir o bem-estar e proteção dos cidadãos, assumindo uma função educativa. Do ponto de vista da Política Social, a avaliação das políticas e programas sociais constituem-se sempre como momentos importantes para atender às novas especificidades do problema e necessidades evidenciadas ao longo da implementação da política (Howard & Sherwood, 1981).
Neste caso, a menor, ainda com 13 anos de idade, bateu nas suas colegas de escola e nas suas vizinhas (em 4 pessoas no espaço de poucos meses), tem um percurso escolar pouco satisfatório, tem dificuldades em lidar com a frustração, e de controlo dos impulsos quando confortada de forma mais ríspida, ou perante situações de tensão.
Acresce que a progenitora tem uma atitude desculpabilizante da menor.
Em face dos factos dados como provados reveladores da prática de quatro crimes de ofensa à integridade física e um crime de injúria, por uma menor de 13 anos, julga-se que a medida é bastante adequada e porporcional, posto que os pais não revelaram até agora capacidade de conter os comportamentos agressivos da menor, com o qual têm um relacionamento afectivo e pautado pela presença física, até porque são ambos desempregados de longa duração.
No que concerne à duração da medida, cremos que se pecar é apenas por defeito e não por excesso, sendo difícil de antever que bastem 12 meses para lograr uma satisfatória educação para o direito.
Não obstante a medida aplicada ter a duração de 12 meses, a mesma pode ser revista se a mesma se revelar desnecessária devido aos progressos educativos alcançados pelo menor (artigo 136º, nº 1, al. d) da LTE. Nesse caso pode ser reduzida ou mesmo declarada extinta artigos 138, nº 1 als d) e e) da citada Lei.
Nenhuma censura se nos afigura possível relativamente à sentença proferida, bem fundamentada e equilibrada na aplicação da medida tutelar educativa. 3. Decisão:
Assim, acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa em negar provimento ao recurso interposto confirmando-se na íntegra a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 uc’s.
Notifique.
Lisboa, 24 de Setembro de 2025
Cristina Isabel Henriques
Alfredo Costa
Maria da Graça dos Santos Silva