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INTERVENÇÃO PRINCIPAL PROVOCADA PASSIVA
RELAÇÃO MATERIAL CONTROVERTIDA
Sumário
– A intervenção principal provocada pressupõe que o chamado e a parte à qual se deve associar têm interesse igual na causa, desenhando-se uma situação de litisconsórcio sucessivo, seja necessário, seja voluntário. 2 – O chamamento deduzido pelo A. de outros sujeitos passivos da relação material controvertida depende da análise dessa relação, tal como é configurada pelo autor na petição inicial. 3 – Se a relação material controvertida, tal como é configurada pelo autor, respeita apenas ao autor e aos réus já presentes na ação, essa constatação determina o indeferimento da requerida intervenção principal provocada.
Texto Integral
Acordam os Juízes que compõem este Colectivo da 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:
I – RELATÓRIO
AA, intentou ação de simples apreciação, sob a forma de processo comum, contra BB, CC e DD peticionando 1) a declaração de que o poço/tanque e a área de terreno circundante, com aproximadamente 300m2 estão inseridos no prédio rústico sito em São João - Piquinho, da freguesia de Fajã da Ovelha, inscrito na matriz sob o artigo ...6...50, 2) o reconhecimento dessa propriedade pelos três réus, 3) a declaração de ineficácia da escritura de justificação datada de 29-04-2022 quanto ao teor do prédio assinalado com o número um, relativamente à área do prédio rústico sito em São João - Piquinho, da freguesia de Fajã da Ovelha, inscrito na matriz sob o artigo ...6...50, 4) a rectificação da área, junto da Conservatória do Registo Predial de Ponta do Sol, e o registo da acção no prédio rústico sito em São João - Piquinho, da freguesia de Fajã da Ovelha, inscrito na matriz sob o artigo ...6...50.
Para tanto, alegou, em suma, que celebrou um contrato de compra e venda de um poço e terreno circundante com área aproximada de 300m2 inserido num prédio rústico que, pelo menos, fez parte do prédio rústico sito em São João - Piquinho, da freguesia de Fajã da Ovelha, inscrito na matriz sob o artigo ...6...50, que indica ter pertencido à primeira ré. Mais alegando que a R. BB no dia da escritura de justificação e compra e venda declarou perante testemunhas que lhe estava a vender o poço/tanque e a área circundante a este, aproximadamente 300 metros quadrados, pelo que o A. não imaginou que estava a comprar um outro prédio, existindo pois erro entre o prédio contratado e o negocio realizado, pelo que demanda os RR. para que reconheçam a sua propriedade , peticionando ainda que seja declarada ineficaz a justificação de 29 de Abril de 2022 requerida pela segunda Ré CC.
Citados os RR. apresentaram contestação.
E após foi peticionada a intervenção principal provocada de Luiztro Property, Ld.ª, como associada dos réus, alegando que a área de terreno que o autor reclama na acção abrange 3 prédios rústicos e que corresponde ao rústico com a Matriz ...7...55 e titulado por BB, ao rústico com a Matriz ...6...69 e titulada pela sociedade Luiztro Property, Ld.ª e ainda pelo rústico Matriz ...7...53 na posse de CC.
A ré BB pronunciou-se, sustentando que não existe qualquer fundamento legal, uma vez que não há qualquer relação litisconsorcial que tenha sido preterida.
Mais invocou que, depois de citado o réu a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei, nomeadamente, quanto às modificações subjectivas da instância, em virtude dos incidentes de intervenção de terceiros cf. artigos 260.º e 262.º, al. b) do Código de Processo Civil.
In casu, o autor requer a intervenção provocada de terceiro, afirmando que a relação material controvertida importa situações jurídicas relativas também à sociedade Luiztro Property, Ld.ª. Fundamentação: Foi proferida a seguinte decisão objecto de recurso
«No requerimento de 05-09-2024 foi peticionada a intervenção principal provocada de Luiztro Property, Ld.ª, como associados dos réus, alegando que a área de terreno que o autor reclama na acção abrange 3 prédios rústicos e que corresponde ao rústico com a Matriz ...7...55 e titulado por BB, ao rústico com a Matriz ...6...69 e titulada pela sociedade Luiztro Property, Ld.ª e ainda pelo rústico Matriz ...7...53 na posse de CC.
A ré BB pronunciou-se, sustentando que não existe qualquer fundamento legal, uma vez que não há qualquer relação litisconsorcial que tenha sido preterida.
Depois de citado o réu, a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei, nomeadamente, quanto às modificações subjectivas da instância, em virtude dos incidentes de intervenção de terceiros cf. artigos 260.º e 262.º, al. b) do Código de Processo Civil.
No caso em apreço, o autor requer a intervenção provocada de terceiro, afirmando que a relação material controvertida importa situações jurídicas relativas também à sociedade Luiztro Property, Ld.ª.
A apreciação do pressuposto da legitimidade processual deve ser referida à relação jurídica objecto do pleito trazida pelo autor na sua petição inicial e determina-se delineando os fundamentos da acção e a posição das partes relativamente a esses fundamentos artigo 30.º, n.os 1 e 3, do Código de Processo Civil.
A intervenção principal provocada está prevista para as seguintes situações:
1. Ilegitimidade por preterição de litisconsórcio necessário activo ou passivo artigos 33.º e 34.º, do Código de Processo Civil;
2. Chamamento de um terceiro litisconsorte do réu inicialmente demandado, alguém que é titular passivo da mesma relação jurídica que está na base da demanda do primitivo réu e que, por isso mesmo, poderia ter sido, desde logo, demandado juntamente com ele em regime de litisconsórcio voluntário artigo 32.º, do Código de Processo Civil;
3. Chamamento de terceiro visando constituir pluralidade subjectiva subsidiária passiva artigo 39.º, do Código de Processo Civil.
O que se pretende é alargar o âmbito da eficácia subjectiva da decisão aos chamados, sempre que o autor dirija o seu pedido já formulado contra um réu que não tenha sido primitivamente demandado.
Só que este mecanismo de salvação do efeito útil da acção depende da verificação de uma situação de fundada dúvida sobre o elemento subjetivo, justificando que a pretensão possa ser deduzida em via principal por um autor e, em via subsidiária, por outro, para a eventualidade de aquele ser considerado parte ilegítima, ou que o Autor demande um determinado réu e, precavendo-se quanto à sua ilegitimidade, demande
subsidiariamente outro réu .
Porém, a superveniência desencadeada pelo autor, através do incidente de intervenção principal provocada limita-se aos casos de dúvida fundamentada relativamente à identificação do sujeito passivo da relação controvertida, diferente de uma dúvida emergente da violação dos deveres de diligência investigatória precedente à instauração de uma acção. No caso em apreço, considerando o pedido deduzido na petição inicial, bem como a causa de pedir que o sustenta, não se reconhece à chamada um interesse idêntico ao dos réus relativamente ao objecto da acção, nem uma situação de dúvida fundada acerca da titularidade do direito invocado pelo autor.
É que o autor pretende, a avaliar pelo pedido que vem formulado na petição inicial e a causa de pedir que o acompanha até ao momento e considerando as possibilidades limitadas de alteração objectiva da instância : 1) a declaração de que o poço/tanque e a área de terreno circundante, com aproximadamente 300m2 estão inseridos no prédio rústico sito em São João - Piquinho, da freguesia de Fajã da Ovelha, inscrito na matriz sob o artigo ...6...50, 2) o reconhecimento dessa propriedade pelos três réus, 3) a declaração de ineficácia da escritura de justificação datada de 29-04-2022 quanto ao teor do prédio assinalado com o número um, relativamente à área do prédio rústico sito em São João - Piquinho, da freguesia de Fajã da Ovelha, inscrito na matriz sob o artigo ...6...50, 4) a rectificação da área, junto da Conservatória do Registo Predial de Ponta do Sol, e o registo da acção no prédio rústico sito em São João - Piquinho, da freguesia de Fajã da Ovelha, inscrito na matriz sob o artigo ...6...50.
E sabendo que é este o pedido, que fixa os limites objectivos da acção ressalvados os casos em que a lei admite a modificação objectiva da instância , nos sujeitos da relação material controvertida não se inclui a sociedade que o autor pretende chamar, uma vez que na sua causa de pedir o autor invoca unicamente que celebrou um contrato de compra e venda de um poço e terreno circundante com área aproximada de 300m2 inserido num
prédio rústico que, pelo menos, fez parte do prédio rústico sito em São João - Piquinho, da freguesia de Fajã da Ovelha, inscrito na matriz sob o artigo ...6...50, que refere ter pertencido à primeira ré.
E a isto não obsta a circunstância de o autor ter afirmado que Tendo em conta o supra descrito, o pedido principal será objecto de ampliação que o Autor requererá na acção principal depois de admitida o pedido deste incidente , já que a intervenção principal provocada depende de uma relação jurídica que já esteja prefigurada no processo.
Face ao exposto, indefere-se o pedido de intervenção principal deduzido.
Custas processuais pelo autor artigos 527.º, n.º 1, 539.º, n.º 1 do Código de Processo Civil e 7.º, n.º 4 do Regulamento das Custas Processuais.».
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Não se conformando com a decisão proferida, o A apresentou recurso deapelação invocando, em suma, que o requerimento de intervenção principal provocada deveria ser procedente tendo Tribunal a quo, errado na aplicação do Direito
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O Recorrente apresentou as seguintes conclusões:
1 - Vem a interposição do presente recurso da decisão de indeferimento do Pedido de intervenção principal.
2 - No entanto por muito respeito que mereça o vertido na decisão a quo, com a mesma não se pode de modo algum concordar, pois que, considerando o Tribunal Recorrido o indeferimento do pedido de intervenção principal, não julgou corretamente com tal decisão, a Mma Juiz a quo violou e fez errada aplicação e interpretação nos artigos 30.º; 32.º; 33.º: 34.º e 39.º , todos do Código Processo Civil.
3 - O que o Autor pretende (e que consta no pedido) é que a primeira Ré - BB, bem como a segunda Ré - CC e o terceiro Réu - DD reconheçam o direito à propriedade plena ao Autor - AA, sobre o poço/tanque e a área circundante de aproximadamente 300 metros quadrados, inserido no prédio rústico sito em São João - Piquinho, da freguesia de Fajã da Ovelha, inscrito na matriz sob o artigo ...6...50..
4 - A Causa de pedir assenta na circunstância do negócio juridico realizado entre o Autor e a primeira ré tinha em vista a transmissão da propriedade de um terreno determinado com uma característica, mais concretamente um elemento concreto e objectivo, como sendo o poço/tanque e a área circundante de 300 m2-
5 - Ou seja, foi escriturado um imóvel, quando foi convictamente pré-negociado e negociado um outro, o poço/tanque e uma área de 300 m2 circundante, incluído no imóvel inserido no prédio rústico sito em São João - Piquinho, da freguesia de Fajã da Ovelha, inscrito na matriz sob o artigo ...6...50.
6 - Esta relação jurídica, que o Autor quer discutir em audiência de julgamento, pode desencadear, caso o Autor tenha ganho de causa, uma outra relação jurídica que abrange os segundo, terceiro e o chamado, pois o efeito útil da sentença pode abranger área de terreno circundante ao poço/tanque pertencente a estes.
7 - O que o Autor pede em relação à primeira ré, é que esta reconheça que lhe vendeu o poço/tanque e uma área de 300 m2 circundante, incluído no imóvel inserido no prédio rústico sito em São João - Piquinho, da freguesia de Fajã da Ovelha, inscrito na matriz sob o artigo ...6...50.
8 - E como consequência desta constatação, que todos os réus, e o chamado, reconheçam a titularidade do Autor sobre o poço/tanque e uma área de 300 m2 circundante, incluído no imóvel inserido no prédio rústico sito em São João - Piquinho, da freguesia de Fajã da Ovelha, inscrito na matriz sob o artigo ...6...50.
9 - É este o efeito útil da acção e da razão de chamar a sociedade Luiztro Property, Ldª, pois encontra-se na mesma situação dos segundos e terceiros réus, já que são titulares de imóveis que confrontam com o prédio rústico originário inscrito na matriz número ...6...50.
10 - Pois o que o Autor pretende é alargar o âmbito da eficácia subjectiva da decisão ao chamado, tendo em conta que dirige o seu pedido já formulado contra um réu que não tinha sido primitivamente chamado,
11 - O Autor tomou conhecimento do facto gerador da existência do chamado, a Luiztro Porperty, Ldª pela publicação da justificação que a segunda ré realizou e da alienação de uma parte do terreno afecto ao artigo matricial ...6...50 a esta sociedade.
12 - O terceiro réu DD é o legal representante da sociedade chamada.
13 - Tendo em conta que a acção deu entrada no dia 27/06/2024; - Os réus foram citados a 28/06/2024; - A primeira ré - BB em 22/07/2024 por escritura pública, reclama a aquisição do imóvel, por usucapião, como sendo composto por terreno de cultivo e um poço, sito em São João - Piquinho, da freguesia de Fajã da Ovelha, e tendo como confrontantes a Norte com Caminho de São João a Sul e a Poente com CC e a Nascente com Luiztro Property, Ldª.; - Em 05/09/2024 o Autor requer a Intervenção principal da sociedade Luiztro Property, Ldª, por ser o confrontante Nascente do prédio: - A ré BB contesta a 30/09/2024: e os réus CC e DD contestam a 01/10/2024.
14 - Foram estes factos supervenientes que desencadearam no Autor a dúvida fundamentada relativamente à identificação do sujeito passivo da relação controvertida.
15 - Pelo que é de interesse fundamental, dado a existência de conflito entre a área circundante ao poço/tanque, e que abrange todos os titulares dos terrenos confinantes, aqui se incluindo o chamado Luiztro Proprty, Ldª.
16 - É que estando o poço/tanque encravado entre os vários terrenos confinantes, a área de 300 m2 que o Autor reclama, tando pode abranger parte do artigo matricial ...6...50, e/ou o artigo matricial ...7...53 e/ou o artigo matricial ...7...55 e/ou do artigo matricial ...6...69, este último propriedade da sociedade chamada - Luiztro Property, Ldª..
17 - Do supra mencionado verifica-se a dúvida fundamentada quanto à demanda do chamado - Luiztro Property, Ld:, precavendo-se o Autor, quanto à ilegitimidade do outro réu.
18 - Por tudo o que foi alegado, somos de concluir que a decisão de indeferir o pedido de intervenção principal do chamado Luiztro Property, Lda foi julgada incorretamente e que houve violação e errada aplicação e interpretação do disposto nos artigos 30.º; 32.º; 33.º: 34.º e 39.º , todos do Código Processo Civil.
TERMOS EM QUE;
Nos melhores de direito e com o muito douto e avisado saber de Vossa Excelências, deve o recurso ser julgado procedente, com o consequente deferimento do chamado Luiztro Property, Ldª como ré na acção principal, assim se fazendo inteira e merecida Justiça!
A Recorrida BB contra-alegou apresentando as seguintes
CONCLUSÕES
A) A decisão proferida pelo Tribunal a quo, ao indeferir o incidente de intervenção principal provocada, encontra-se devidamente fundamentada e em estrita conformidade com o regime jurídico previsto nos artigos 30.º, 33.º, 39.º e 316.º do Código de Processo Civil.
B) O recurso interposto pelo Autor não visa a sindicância da legalidade da decisão, mas antes constitui tentativa de reformulação indevida da ação e de alargamento artificial do litígio, em manifesta violação dos princípios da estabilidade da instância e da lealdade processual.
C) A intervenção principal provocada configura um incidente de natureza excecional, admissível apenas nas hipóteses legalmente previstas, não sendo um expediente ao serviço de estratégias processuais oportunistas ou de superação de vícios da petição inicial.
D) No caso concreto, não se verifica qualquer litisconsórcio necessário nem voluntário que justifique a intervenção da sociedade Luiztro Property, Lda., sendo esta completamente alheia à relação jurídica material controvertida, tal como delineada pelo próprio Autor.
E) A sociedade visada não participou do negócio subjacente nem integra a cadeia dominial ou factual que sustentaria qualquer interesse jurídico direto na causa, sendo, portanto, manifesta a sua ilegitimidade para figurar na lide.
F) O Autor, ao invocar a existência de dúvida fundada quanto à titularidade do prédio, omite que essa alegação surge apenas após a contestação das Rés, numa tentativa clara de reconstruir a ação para suprir omissões e falhas processuais originárias.
G) Tal conduta configura abuso da instância recursiva e violação dos princípios estruturantes do processo civil, em especial o contraditório, a preclusão e a concentração da matéria controvertida na fase própria.
H) A escritura pública celebrada entre o Autor e a ora Recorrida é clara e inequívoca quanto à área transmitida de 30m2 e não 300m2 e à inexistência de outros prédios rústicos adjacentes pertencentes à vendedora, afastando qualquer presunção de erro ou desconhecimento de limites.
I) O preço simbólico de €2.000,00, aceite pelo Autor, é compatível com a reduzida área adquirida, a qual corresponde à realidade física e matricial do prédio vendido, afastando qualquer expectativa legítima de aquisição de parcela de maior dimensão ou valor.
J) A invocação de factos completamente falsos e controvertidos apresentados em sede de recurso, sem qualquer produção de prova admissível ou prévia contradita em primeira instância, demonstra a instrumentalização da via recursiva como palco de alegações infundadas.
K) Não compete à ora Recorrida reconhecer direitos sobre prédios alheios que nunca foram de sua titularidade, sendo absolutamente infundada qualquer pretensão nesse sentido, designadamente quanto ao artigo ...6...50.
L) A isto acresce que o Autor carece de legitimidade para impugnar a escritura de justificação do prédio rustico com artigo ...6...50, a qual não lhe é oponível nem lhe causa prejuízo direto, além de não apresentar fundamento jurídico atendível para tal impugnação.
M) Não se verifica qualquer inutilidade da decisão recorrida nem qualquer omissão ou erro de julgamento, antes se mostra patente a correção jurídica da mesma perante os pressupostos legais aplicáveis ao incidente deduzido.
N) A inclusão da Luiztro Property, Lda. seria apenas uma forma de gerar entropia processual e onerar as partes com intervenções infundadas, visando obter efeitos extrajudiciais de pressão sobre os réus.
O) O mecanismo processual utilizado pelo Autor – a provocação de intervenção principal –não pode ser pervertido para servir fins especulativos ou táticos, sob pena de subversão das garantias fundamentais do processo equitativo.
P) Como bem nota a doutrina, só se admite a intervenção principal provocada quando o terceiro, desde o início, possua interesse jurídico atual e relevante na definição da lide, o que não se verifica, nem se demonstrou nos autos.
Q) Por tudo quanto vem sendo exposto, deve o recurso interposto pelo Autor ser julgado totalmente improcedente, mantendo-se integralmente o despacho recorrido, com a consequente condenação em custas.»
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Foi proferido despacho de admissão do recurso, que de seguida foi remetido a este Tribunal da Relação.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir. *
II- Quaestio Iudicio:
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da apelante, tal como decorre das disposições legais dos artºs 635º nº4 e 639º do CPC, não podendo o tribunal conhecer de quaisquer outras questões, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o seu conhecimento oficioso (art.º 608º nº2 do CPC).
As questões a resolver são as que constam das conclusões da apelação, acima reproduzidas e que se resume a apreciar:
I - Da verificação dos pressupostos de deferimento da requerida intervenção principal provocada.
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III - Fundamentação
Os elementos fácticos relevantes para a decisão são os supra elencados .
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Nos presentes autos, entende o Recorrente que o disposto no art. 316º do Código de Processo Civil, deve conduzir ao deferimento do seu pedido de intervenção principal provocada (ao lado dos RR) da sociedade comercial que indica para chamamento.
Constitui um princípio vigente no nosso direito processual a estabilidade da instância, pelo que a intervenção de terceiros no andamento do processo, após definidos os respectivos sujeitos, reveste carácter excepcional e só pode ocorrer nos casos previstos na lei.
Conforme resulta do disposto no art. 260º do Código de Processo Civil:
“Citado o réu, a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei.”
Assente que é esta a regra, cumpre reconhecer que a própria lei previu algumas situações em que excepcionalmente permite a modificação subjectiva da lide, como acontece com o mencionado art. 316º CPC. O artigo referido, com a epígrafe “intervenção provocada”, reza o seguinte: “1 - Ocorrendo preterição de litisconsórcio necessário, qualquer das partes pode chamar a juízo o interessado com legitimidade para intervir na causa, seja como seu associado, seja como associado da parte contrária.2 - Nos casos de litisconsórcio voluntário, pode o autor provocar a intervenção de algum litisconsorte do réu que não haja demandado inicialmente ou de terceiro contra quem pretenda dirigir o pedido nos termos do artigo 39.º.(…)».
Percorrendo a norma, constata-se que na realidade a pretensão exposta pelo requerente não encontra manifestamente apoio em nenhuma das restantes previsões legais sobre intervenção principal provocada.
No número 1 a norma previu as situações de preterição de litisconsórcio necessário, caso em que qualquer das partes pode deduzir o pedido de intervenção, mas que é hipótese que não está colocada na situação presente.
No número 2 a norma previu casos de litisconsórcio voluntário em que a parte autora poderá suscitar o incidente de intervenção (não a parte demandada).
E no número 3 estão previstas, realmente, as possibilidades que assistem ao réu de também ele requerer a intervenção principal na causa de terceiros que inicialmente não figurem como sujeitos processuais.
O Recorrente pretende chamar à acção um terceiro que não teve intervenção em nenhum das situações delineadas na petição inicial nem no contrato de compra e venda relativamente ao qual o Recorrente invoca erro sobre o objecto, nem na escritura de justificação celebrada pela 2ª R.
A nosso ver, na análise da questão há que considerar sempre o que seja a “relação material controvertida”.
Ora a relação material controvertida é aquela que vem delineada, subjetiva e objetivamente, pelo autor, na petição inicial. Considerando o pedido e a causa de pedir apresentados na petição inicial define-se o objecto do processo, e definem-se os sujeitos do litígio processual que o tribunal é chamado a dirimir.
A relação material controvertida nos autos é aquela que o autor desenhou na petição inicial, e não outra.
Assim, logrando o A. demonstrar os pressupostos de facto e de Direito de que depende o seu pedido, poderá alcançar sucesso na lide; e, ao contrário, logrando a ré comprovar os fundamentos da sua defesa poderá conseguir a absolvição almejada.
A intervenção principal provocada pressupõe que o chamado e a parte à qual se deve associar têm interesse igual na causa, desenhando-se uma situação de litisconsórcio sucessivo, seja necessário, seja voluntário – mas, no caso dos autos, e considerando os pedidos e a causa de pedir apresentados pelo A., não se pode considerar que a sociedade chamada tenha qualquer interesse na causa. Com efeito, o próprio A. deduz pedidos contra os RR. com base no pressuposto de ter existido erro no objecto contratado e pretendendo o reconhecimento da sua propriedade pelos RR. e ainda a ineficácia de uma escritura de justificação, sendo que a terceira ora chamada não foi interveniente em nenhum desses negócios ou escrituras de justificação, aliás o próprio A. indica que em função da intervenção principal provocada da sociedade irá ampliar o pedido principal. Todavia, como bem referiu o Tribunal a quo “a intervenção principal provocada depende de uma relação jurídica que já esteja prefigurada no processo”, o que não sucede in casu como vimos.
Ou seja, analisada a relação material controvertida, tal como é configurada pelo autor, verifica-se que a mesma não respeita à ora chamada à acção, mas, apenas e tão só, ao autor e aos réus contra quem foi deduzido o pedido, não podendo ser admitida a intervenção. Tal constatação implica, necessariamente, o indeferimento da requerida intervenção principal provocada.
Resta, portanto, confirmar a decisão recorrida, não merecendo a mesma qualquer censura.
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V- Decisão
Por tudo o exposto, julgam os Juízes que compõem este Colectivo da 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, declarar o presente recurso improcedente, mantendo-se a decisão recorrida.
Custas do presente recurso a cargo do Recorrente nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 527.º do Código de Processo Civil.
Notifique
Lisboa, 25.09.2025
Elsa Melo
Gabriela de Fátima Marques
António Santos