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INDEMNIZAÇÃO
CAPACIDADE DE GANHO
CAPITAL DE REMIÇÃO
BEM COMUM DO CASAL
Sumário
Sumário: Apesar de o direito à indemnização por redução de capacidade de ganho ser um direito pessoal do sinistrado e incomunicável (artigos 1722/1c e 1733/1d do Código Civil), as prestações em que ele se concretizar, designadamente sob a forma de capital de remição, por acidente ocorrido durante o casamento e recebidas durante o casamento (ou reportadas a ele), são um bem comum do casal (art. 1724/a do CC).
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo identificados:
A 09/01/2024, H intentou uma acção comum contra M pedindo que se (a) declare que a quantia de 25.379€ é um bem próprio do autor decorrente de remissão de pensões indemnizatórias por acidente de trabalho e que, por isso, não integra o acervo de bens da comunhão conjugal indivisa decorrente da dissolução do casamento celebrado entre autor e ré e declarado dissolvido por divórcio já transitado em julgado; (b) e, por consequência, condene a ré a devolver ao autor tal quantia; e (c) e a pagar-lhe juros de mora à taxa legal supletiva de 4% ao ano, ou outra que vier a ser estalecida, e na respectiva e legal sanção pecuniária compulsória.
Em suma, o autor alega que ele e a ré estavam casados no regime de comunhão de bens adquiridos; a indemnização por acidente de trabalho recebida por ele no decurso do matrimónio não é uma retribuição do trabalho, pelo que não é bem comum: art. 1724/a do Código Civil; trata-se de uma compensação indemnizatória de natureza pessoal, por incapacidade: é por isso um bem próprio do cônjuge: artigo 1722/c do CC: são bens próprios os bens adquiridos na constância do matrimónio, mas emergentes de direito próprio anterior, de cada cônjuge.
A ré foi citada pessoalmente a 25/06/2024 na rua … [ref.ª 8129428], não tendo apresentado contestação, não constituído mandatário judicial, nem por qualquer outra forma interveio nos autos.
A 13/01/2025, depois de um incidente de incompetência territorial porque o autor tinha intentado a acção noutro juízo, foram julgados confessados os factos alegados pelo autor, nos termos das disposições conjugadas nos artigos 566 e 567/1 do CPC, uma vez que a ré não apresentou contestação, e foi ordenado o cumprimento do disposto no artigo 567/2 do CPC.
Não foram apresentadas alegações por escrito.
A 14/03/2025 foi proferida sentença, julgando a acção improcedente e, em consequência absolveu a ré do pedido formulado pelo autor. O autor recorre desta sentença – para que seja declarada nula e para que seja revogada e substituída por outra que condene a ré como pedido –, arguindo nulidades da sentença e o erro da sentença quanto ao direito aplicado.
* Questões que importa conhecer: das nulidades; se a quantia referida pelo autor é bem próprio dele e se, por isso, os pedidos deviam ter sido julgados procedentes.
* Nulidades da sentença
O autor argui a nulidade da sentença porque ela teria deixado de apreciar que o art. 1722 do CC não abrange, de modo expresso, a natureza de uma indemnização recebida por qualquer dos cônjuges, por direito próprio (art. 615/1d do CPC) e porque ela não teria discriminado os factos provados (art. 615/1b do CPC). Apreciação:
Uma sentença não tem de apreciar normas específicas relacionadas com o caso para não ser nula (art. 615/1d, 1.ª parte, do CC): tem apenas que decidir todas a questões – pedidos, causas de pedir e excepções – que se coloquem. Quanto à falta de discriminação dos factos provados: os factos ficam provados pela revelia da ré (art. 567/1 do CPC). Não há qualquer norma que obrigue o juiz a reproduzir os factos provados na sentença proferida nos termos do art. 567/2-3 do CPC. Pelo que não se verifica nenhuma nulidade (como também o defendeu o tribunal recorrido no despacho com que admitiu o recurso).
* Os factos (não o direito ou as conclusões) alegados pelo autor na PI e com relevo para o caso dos autos foram os seguintes(este TRL elimina o absolutamente irrelevante e numera os factos autonomamente):
1\ Autor e réu contraíram matrimónio em 14/08/1993, sem convenção antenupcial (assento de casamento n.º 0/2013, da Conservatória do Registo Civil de S).
2\ O casamento entre autor e ré foi dissolvido por sentença de divórcio proferida [a 30/03/2022] no processo 6524/21 que correu termos no Juízo de Família e Menores de S, transitada em julgado em 20/04/2022 (consta de um averbamento no assento de casamento referido em 1, excepto quanto ao n.º do processo).
3\ O casamento findou por a ré ter abandonado o lar conjugal no dia 06/09/2021.
4\ Do mesmo passo, a ré levou consigo, transferindo para uma conta DO da sua exclusiva titularidade, do Banco M, 25.379€.
5\ A conta sacada é uma conta D.O. do Banco M com o número 00000000000, do Balcão de F e a ré só logrou retirar a dita quantia em dinheiro porque era, outrossim titular nesse contrato de depósito bancário e era a ré quem movimentava exclusivamente a conta.
6\ O autor é trabalhador por conta de outrem há 42 anos.
7\ Na constância do matrimónio o autor sofreu acidentes de trabalho que deram origem a outros tantos processos judiciais decorrentes desses sinistros.
8\ Em 13/03/2006, no processo 1018/05 junto do Tribunal de Trabalho de A a entidade responsável (Companhia de Seguros, entregou ao autor 28.401,80€, acrescida de 8€ de transportes (doc. 3 [trata-se, aqui como, em 10 e 11, de um termo de entrega de capital de remição sem qualquer outra referência – TRL]).
9\ Em 18/12/2009, no proc. 132/09 junto do Tribunal de Trabalho de A a entidade responsável (Companhia de Seguros), entregou ao autor 8.163,14€ acrescida de 10€ de transportes (doc. 4).
10\ Em 31/01/2013, no proc. 406/12, a entidade responsável (Companhia de Seguros) entregou ao autor 3.960,91€, acrescidos de 12€ de transportes (doc. 5).
11\ Os valores indicados e recebidos pelo autor – que ascendem a 40.552,85€ - correspondem a capitais de remição nos processos de acidentes de trabalho.
12\ Este indicado montante encontrava-se depositado na conta DO de onde a ré retirou os 25.379€
13\ O autor, confiando na ré, pediu a esta que depositasse as quantias recebidas como remissão de pensão, na conta referenciada em 5.
14\ Quando a ré abandonou o lar conjugal e levou consigo aquela quantia o saldo em conta era de cerca de 50.758€ [o saldo a 09/06/2021 era o indicado pela sentença, mais abaixo, de 51.939,47€, e não o indicado pelo autor - TRL].
* A fundamentação de Direito da sentença foi a seguinte:
No âmbito do casamento celebrado no regime de comunhão de adquiridos, determina o artigo 1722 do CC que:
1. São considerados próprios dos cônjuges:
a) Os bens que cada um deles tiver ao tempo da celebração do casamento;
b) Os bens que lhes advierem depois do casamento por sucessão ou doação;
c) Os bens adquiridos na constância do matrimónio por virtude de direito próprio anterior.
2. Consideram-se, entre outros, adquiridos por virtude de direito próprio anterior, sem prejuízo da compensação eventualmente devida ao património comum:
a) Os bens adquiridos em consequência de direitos anteriores ao casamento sobre patrimónios ilíquidos partilhados depois dele;
b) Os bens adquiridos por usucapião fundada em posse que tenha o seu início antes do casamento;
c) Os bens comprados antes do casamento com reserva de propriedade;
d) Os bens adquiridos no exercício de direito de preferência fundado em situação já existente à data do casamento.
Nos termos do artigo 1724 do CC:
Fazem parte da comunhão:
a) O produto do trabalho dos cônjuges;
b) Os bens adquiridos pelos cônjuges na constância do matrimónio, que não sejam exceptuados por lei.”
No caso vertente, o autor alega que recebeu 40.552,85€ a título de capital de remição no âmbito de três processos de acidente de trabalho, e que tal quantia constitui um bem próprio.
Entendemos que não lhe assiste razão.
Sobre esta matéria, pronunciou-se o Supremo Tribunal de Justiça através de acórdão de 11/05/2023, proc. 656/20.8T8VCD-A.P1.S1, tendo concluído que: “Em virtude de as indemnizações devidas a título de incapacidade para o trabalho se destinarem a compensar a perda das remunerações recebidas como contrapartida do trabalho (art. 48.º, n.ºs 1 e 2, da LAT), os montantes recebidos pelo sinistrado a título indemnizatório revestem a natureza de bens comuns do casal.”
De acordo com Francisco Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira (Curso de Direito da Família (e-book), vol. I - Introdução ao Direito Matrimonial, 5.ª ed., Imprensa da Universidade de Coimbra, 2016, págs. 631-632 [e 639]): “Não é pacífico que mereça este regime [o do art. 1733/1-d do CC - TRL] as indemnizações que pretendam reparar uma incapacidade de ganho ou se meçam por uma perda de salários. Será o caso das indemnizações recebidas por acidentes de trabalho, doenças profissionais, reforma antecipada, despedimento, etc. Nestes casos, as somas recebidas vêm substituir os salários “cessantes”, que teriam a qualidade de bens comuns; as indemnizações deviam entrar para o património comum.”
Também Maria João Vaz Tomé (Código Civil Anotado, Livro IV - Direito da Família, coordenadora: Clara Sottomayor, Almedina, Coimbra, 2020, págs. 425-426), em anotação ao art. 1724 do CC, entende que: “De acordo com a al. a), o “produto do trabalho dos cônjuges” faz parte da comunhão. Assim, todos os proventos – prestações patrimoniais, periódicas ou não, em dinheiro ou em espécie – recebidos por um dos cônjuges, por força de um contrato de trabalho, de prestação de serviço ou de qualquer outro contrato que enquadre a prestação efectuada ao cônjuge, são bens comuns do casal. / De acordo com a doutrina, todas as prestações patrimoniais que representem a contrapartida da realização de uma prestação por um dos cônjuges, em que este aplique as suas aptidões físicas ou intelectuais, assim como aquelas que sejam auferidas como indemnização pela redução da capacidade de aquisitiva (art. 1733/1d do CC), integram o património comum do casal”.
No mesmo sentido, acompanhando a posição de Francisco Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, pronuncia-se Hélder Roque («Da partilha parcial em divórcio por mútuo consentimento convolado, da parcela respeitante à indemnização por cessação do contrato de trabalho de um dos ex-cônjuges vencida na constância do matrimónio», in Revista Julgar, n.º 40, 2020, pág. 45), concluindo que fazem parte da comunhão conjugal «as indemnizações, por qualquer causa, que tenham na sua base uma intenção de compensar a diminuição da capacidade de ganho».
Sufragando-se inteiramente o entendimento supra explanado, tendo em consideração que a indemnização devida a título de incapacidade para o trabalho se destina a compensar a perda das remunerações recebidas como contrapartida do trabalho, os montantes recebidos pelo aqui autor, na qualidade de sinistrado e a título indemnizatório, revestem a natureza de bens comuns do casal, nos termos do disposto no artigo 1724/-a, do CC.
Não obstante o supra exposto, sempre se diga que não se vislumbra o fundamento da pretensão do autor, na medida em que, mesmo que os 40.552,85€ fossem considerados bem próprio e sendo o saldo bancário de 51.939,47€ (cf. extracto bancário), nunca a ré teria de restituir a totalidade da quantia que transferiu, pois sempre existiria um valor remanescente a dividir pelos ex-cônjuges.
Consequentemente, declara-se a acção improcedente e absolve-se a ré do pedido.
* Nesta parte as conclusões do recurso do autor constam do seguinte(que se transcrevem na parte minimamente útil):
6\ O artigo 1724 do CC refere que são bens comuns dos cônjuges o produto do seu trabalho (de ambos) e os bens adquiridos pelos cônjuges na constância do matrimónio, que não sejam exceptuados por lei.
[…]
9\ Quando se conclui que o legislador disse menos do que pretendia dizer poder fazer-se uma “interpretação extensiva”, isto é, quando seja possível inferir uma conclusão que não está abrangida na letra da lei.
10\ No caso dos presentes autos o que se pode concluir é que se prevê apenas os proveitos que advêm como resultado do trabalho do cônjuge.
[…]
12\ Os ganhos (não todos) do sinistrado não tiverem como fonte genética o trabalho de um dos cônjuges, mas o desastre de um deles, ou seja, sem acidente não haveria indemnizações.
13\ Ora, na letra da lei nada, sem uma só palavra, permite concluir que um valor indemnizatório pago na sequência de um acidente de trabalho, para compensar a incapacidade para desempenhar uma determinada função de ganho, está contemplado como um proveito do trabalho.
14\ Na verdade não se vê na letra da lei a possibilidade de uma interpretação extensiva no sentido dos montantes indemnizatórios serem integrados na comunhão.
15\ A lei fala tão-somente em “produto do trabalho” como contrapartida, do exercício da actividade manual ou intelectual do prestador de trabalho, obviamente lato sensu.
16\ A indemnização atribuída ao sinistrado e remida, obrigatoriamente por força da lei, visa compensar a perda da capacidade de ganho por lesão corporal, sendo que o facto gerador dessa responsabilidade é, tout court, a lesão corporal.
17\ Existe um regime de incomunicabilidade do direito à indemnização previsto para o regime de comunhão de bens, no artigo 1733/1d do CC: São exceptuados da comunhão: […] as indemnizações devidas por factos verificados contra a pessoa de cada um dos cônjuges ou contra os seus bens próprios; […].
18\ Poder-se-ia defender uma posição exclusivista argumentando que o preceito se aplica apenas ao regime de comunhão geral de bens no casamento, mas a argumentação não é válida, porque geraria uma incongruência absoluta no sistema normativo, e arrasaria o elemento lógico e sistemático da interpretação.
19\ Não se pode [deixar de] concluir que a regra igualmente se aplica ao regime de comunhão de bens adquiridos porque uma posição contrária geraria uma “ruptura” na coerência material e substantiva entre os dois regimes patrimoniais de bens no casamento [colocou-se o parenteses recto de modo a dar sentido à argumentação do autor - TRL]
20\ A indemnização em causa emerge de factos que atingem a pessoa do autor na articulação dos artigos 1772/1-c e 1733/1[d], ambos do CC.
21\ O art. 1772/1-c na conjugação com um direito indemnizatório permite concluir que a vantagem patrimonial pecuniária não é, e é impossível dizer-se que é, produto do trabalho do sinistrado e, por isso, não entra na comunhão conjugal.
22\ A indemnização em causa está abrangida no art. 1733/1[d] que consagra um regime geral de incomunicabilidade e que por essa razão é também aplicável ao regime de bens adquiridos
23\ As indemnizações são bem próprio do recorrente.
24\ […] porque resultam de direito próprio anterior que é o direito à integridade física e o direito à capacidade de ganho que vinha de contrato de trabalho anterior [ao matrimónio – o acrescento é deste TRL].
25\ As indemnizações por acidente de trabalho são bem próprio do autor, nos termos do previsto nos artigos 9, 1699/1c e 1722/1c e 1733/1 todos do CC, pelo que o tribunal de 1ª instância fez, daqueles preceitos errada aplicação do Direito, dado que o seu conteúdo visa compensar o sinistrado pela ofensa do direito à integridade física, que é um bem pessoal, sendo um bem próprio do sinistrado. Apreciação:
O ac. do STJ citado acima, para além de toda a doutrina citada pela sentença recorrida, lembra, “no mesmo sentido, ainda que acerca da questão, não inteiramente coincidente, da qualificação da indemnização por cessação do contrato de trabalho”, o acórdão do STJ de 02/11/2010, proc. 726/08.0TBESP-D.P1.S1 [relatado por Hélder Roque, citado acima como autor de um estudo publicado na Julgar], qualificando tal indemnização como bem comum:
V - Encontrando-se os cônjuges ainda casados, por ocasião em que a compensação pecuniária, de natureza global, referente a indemnização em substituição de créditos laborais, foi recebida por um deles, o mesmo bem, ao entrar na esfera patrimonial deste, assumiu, imediatamente, a qualidade de bem comum do casal, passando a estar sujeito, desde a propositura da acção, ao regime da partilha dos bens comuns, em consequência de divórcio.
Guilherme de Oliveira, Manual de direito da família, Almedina, 2020, páginas 237-238 (n.ºs 475, 476 e 477) e 241 (n.ºs 486 e 487), mantém a mesma posição da obra anterior com Pereira Coelho.
No mesmo sentido, pode ainda lembrar-se o ac. do STJ de 23/10/2014, proc. 800/12.9TBCBR.C1.S1, embora também esta questão não seja exactamente a mesma:
1\ A pensão de invalidez, como um apoio em dinheiro sucedâneo do rendimento do trabalho perdido por causa de doença ou de lesão corporal destina-se a proteger o beneficiário em situação de incapacidade permanente para o trabalho.
2. Não se deve confundir o direito à pensão de invalidez adquirido antes do casamento e, após este, o direito à respectiva prestação mensal, como compensação pela perda de remunerações de trabalho.
3. Sendo uma coisa a aquisição de tal pensão através de um direito pessoal, umbilicalmente ligado à pessoa do beneficiário, e outra, as prestações recebidas, com a comunicação daquele direito através da entrada da prestação no património comum (no caso de vigorar entre os cônjuges o regime da comunhão de adquiridos).
4. A pensão de invalidez, seja, o montante que através dela é recebido, é, pois, um bem comum do casal. O autor invoca, em sentido contrário, as posições, que já eram referidas pelo ac. do STJ citado acima, de Jorge Duarte Pinheiro, O Direito de Família Contemporâneo, 6.ª ed., AAFDL Editora, Lisboa, 2019, pág. 420, nota 917, que diz [na 7.ª edição, Gestlegal, 2020, págs. 506-507 e 514/nota 876]:
“[…D]o artigo 1699/1-d, decorre a incomunicabilidade dos bens mencionados: […] as indemnizações que visam compensar a perda de capacidade para o trabalho são bens próprios, nos termos do art. 1733/1d-e do CC. Quando muito e dentro da lógica que preside aos arts. 1722/2, 1726/2, 1727 e 1728/1, o cônjuge estará obrigado a compensar o património comum, se, para obter as referidas prestações, tiver contribuído com bens comum, p.e., com parte do seu salário.”
[…]
O elenco de bens incomunicáveis estabelecido pelo art. 1733/1 abarca: […] as indemnizações devidas por factos verificados contra a pessoa de cada um dos cônjuges […]876: Enquadram-se nos bens incomunicáveis as indemnizações por acidentes de trabalho.
e de J.P. Remédio Marques (anotação ao artigo 1733, in Código Civil Anotado, Livro IV - Direito da Família, ob. cit., páginas 454-458):
A ideia subjacente a esta incomunicabilidade alicerça-se na ligação intituis personae ou a afectação empírica estritamente individual dos direitos e das situações jurídicas de vantagem à pessoa de cada um dos cônjuges. São os seguintes:
[…]
(e) As indemnizações devidas por factos verificados contra a pessoa de cada um dos cônjuges ou contra os seus bens próprios também são bens incomunicáveis. Isto tanto no caso de reparações de danos não patrimoniais como de danos patrimoniais. Mas já não merecem esta qualidade de bens próprios as pensões de reforma, as indemnizações que tenham na sua génese a intenção de compensar a perda ou a diminuição da capacidade de ganho, bem como os complementos de reforma decorrentes de aforro de salários (p. ex., por meio de planos poupança-reforma ou instrumentos financeiros semelhantes), incluindo as rendas vitalícias e os direitos de natureza semelhante - neste sentido, COELHO, Pereira/OLIVEIRA (2016: 632); LIMA, Pires de/VARELA, Antunes (1997: 442-443); TOMÉ, Maria João (1997: 224 ss.); contra, PINHEIRO, Jorge Duarte (2008: 510-511), com base na alínea d) do n.º 1 do art. 1699 CC, enquanto direitos estritamente pessoais, que são exceptuados da comunhão por força do art. 1733/1c do CC. […].
Todavia, parece que as indemnizações que se alicerçam na supressão ou na diminuição da capacidade de ganho de qualquer um dos cônjuges desfrutam de natureza de direitos estritamente pessoais, pelo que, neste sentido, devem ser exceptuadas da massa dos comuns, ao abrigo do disposto nas alíneas d) e e) do art. 1733 CC, aplicável a fortiori ao regime de comunhão de adquiridos. Isto dito sem prejuízo de o cônjuge cuja massa dos bens próprios integra tais indemnizações dever compensar o património comum, por ocasião da partilha dos bens comuns se e quando à obtenção de tais indemnizações tiverem concorrido, total ou parcialmente, bens comuns, designadamente, o produto do trabalho - em sentido semelhante, […] cf. PINHEIRO, Jorge Duarte (2008: 510). […].”
e o ac. do TRC de 10/11/2015, proc. 2281/11.5TBFIG-B.C1:
1\ É a afectação estritamente individual dos bens que justifica a incomunicabilidade prevista no art. 1733 do CC.
2\ Perante situações de perda do emprego por facto não imputável ao trabalhador (v. g., em caso de encerramento da empresa), o valor correspondente à compensação por antiguidade destina-se a ressarcir as consequências inerentes à perca do direito ao trabalho, que é de índole pessoal (intuitu personae).
3\ Trata-se, pois, de um bem pessoal (próprio) do cônjuge, que, em princípio/regra - sem prejuízo do posicionamento dos cônjuges ou ex-cônjuges e porventura de outros aspectos relacionados com a relação conjugal - deverá ser excluído da comunhão conjugal.
4\ Decisivo para as relações patrimoniais entre os cônjuges é o momento do facto que dá causa/origem a determinado fluxo patrimonial (a repercutir no património comum do casal), e não propriamente a data da concretização ou execução desse mesmo fluxo, ainda que verificado após a propositura da acção de divórcio (art. 1789/1 do CC).
Este acórdão do TRC, invoca no mesmo sentido o ac. do TRL de 02/10/2007, proc. 5871/2007-7:
I- Deve ser incluída na relação de bens a apresentar em inventário para partilha dos bens do casal a verba designada indemnização que integra a reposição das prestações pecuniárias devidas ao trabalhador por ter sido considerado nulo o despedimento. II- Estamos face a produto do respectivo trabalho (artigo 1724/-a do CC), ou seja, de bem integrado na comunhão e não diante de uma indemnização por antiguidade em opção da reintegração no posto de trabalho cuja natureza é de índole pessoal.
Mas o sumário deste ac. do TRL (que não foi feito pela relatora) tem os não raros problemas de tradução do conteúdo do acórdão; veja-se, com efeito, o que, a dada altura consta do texto do acórdão (os sublinhados são da relatora, à excepção do primeiro):
“Poderá, porventura, afirmar-se que já o valor correspondente à indemnização por antiguidade em opção pela reintegração no posto de trabalho apresenta natureza distinta, dirigida a ressarcir a perca do direito ao trabalho que é de índole pessoal.
Note-se que dos autos, nem o agravante, nem a recorrida, distinguiram os valores em referência, o que por si, desconsidera em termos factuais o tratamento diferenciado da questão.
Contudo, ainda que assim se disserte e por hipótese académica, é preciso salientar que, uma coisa é considerar-se o direito à indemnização por antiguidade de índole intuitu personae, e por consequência, um bem pessoal do cônjuge, outra diversa, é a natureza das prestações ou valores que ao abrigo desse direito ele recebeu, que pelas razões sobreditas, reconduzem-se a um bem móvel comum.”
O ac. do TRC invoca ainda o ac. do TRC de 02/07/2013, proc. 988/12.9TMCBR-A.C1. Mas, como se vê do respectivo sumário, também este acórdão não lhe dá apoio, como se vê da parte final:
Tendo A trabalhado numa empresa entre 1991 e 2011 e casado em 2004, sob o regime de comunhão de adquiridos, a quantia recebida por A, durante a vigência do casamento, a título de compensação por revogação consensual do seu contrato de trabalho, assume a qualidade de bem próprio, nos termos do artigo 1722/1-c do CC, relativamente à fracção da compensação que é proporcional ao tempo correspondente ao período em que a relação laboral decorreu antes de A ter casadoe comum na parte restante”.
Não lhe dava também apoio o ac. do TRL de 25/01/2011, proc. 2119/10.0TMLSB-A.L1-7:
II - A indemnização por despedimento, porque destinada a substituir os “salários cessantes”, ingressará no património comum, desde que efectivamente adquirida na constância do matrimónio.
III -Não será bem comum, se adquirida já após a separação de facto dos cônjuges e se o divórcio vier a ser decretado com fundamento na separação de facto, fazendo retroagir os respectivos efeitos patrimoniais à data da separação.
Nem o ac. do TRL de 22/01/2008, proc. 9010/2007-1
1. O valor indemnizatório percebido pelo trabalhador da entidade patronal resultante da cessação do contrato de trabalho é integrável no art. 1724/a do CC, sendo bem comum a partilhar em caso de dissolução do matrimónio.
2. Já assim não será se a respectiva integração no património tiver ocorrido em momento ulterior à separação do casal.
Ou seja, nenhum daqueles acórdãos defende que, em relação aos valores recebidos durante o casamento, se trata de bens próprios.
E aquele ac. do TRC não foi seguido por outros, pelo contrário, como se vê dos seguintes:
Ac. do TRE de 14/01/2021, proc. 980/20.0T8FAR-A.E1:
A indemnização por cessação da relação laboral deve considerar-se bem que integra o património comum dos cônjuges, nos termos do disposto no artigo 1724/a do CC, na medida em que tem em vista compensar o trabalhador da ruptura da relação laboral e da perda de salários subsequente àquela ruptura com os quais o primeiro contribuía para os encargos da vida familiar.
Ac. do TRP de 12/07/2021, proc. 2579/20.1T8GDM.P1:
II - Sendo certo que o pagamento da indemnização de antiguidade é desencadeado pela rotura contratual, é a constituição do vínculo laboral e o seu desenvolvimento que justificam e moldam essa compensação indemnizatória; III – No regime de bens de comunhão de adquiridos, será comum aquilo que exprime a colaboração de ambos os cônjuges no esforço patrimonial do casamento e têm de ser excluídos da massa comum os bens que resultam do esforço, trabalho ou diligência de, apenas, um deles, ou seja, aqueles para cuja obtenção o outro cônjuge não deu qualquer contributo relevante; IV - Nesse enquadramento, será de considerar bem próprio a indemnização de antiguidade recebida por um dos cônjuges na parte proporcional ao tempo em que a relação laboral decorreu fora do período da comunhão conjugal; será comum na parte restante.
Ac. do TRE de 28/01/2021, proc. 1200/19.5T8STR.E1:
Tendo o autor trabalhado numa empresa entre 1970 e 2004 e casado em 1997, sob o regime de comunhão de adquiridos, a quantia recebida pelo autor durante a vigência do casamento e acordada como “indemnização por antiguidade” por revogação do seu contrato de trabalho, assume a sua qualidade de bem próprio, nos termos do art. 1722/1c do CC, relativamente à fracção da “indemnização” que é proporcional ao tempo correspondente ao período em que a relação laboral decorreu antes de o autor ter casado e comum na parte restante.
Ac. do TRG de 03/03/2022, proc. 2248/20.2T8BRG.G1
2. As compensações por cessação de contrato de trabalho, por extinção do posto de trabalho ou por cessação de contrato no âmbito da insolvência da entidade empregadora, achadas com referência à remuneração do trabalhador antes da cessação e ao tempo de antiguidade na empresa, e que apoiam necessariamente a sua subsistência e a economia do casal, nos termos do art.1724/a do CC, ex vi do art.1734 do CC, não integram a previsão do art.1733/1d, 1ª parte, do CC.
Ac. do TRC de 06/02/2024, proc. 3278/19.2T8VIS.C1, com um voto vencido
I – Nos termos das disposições conjugadas dos artigos 1721 e 1724/a, por remissão do disposto no artigo 1734, todos do CC, fazem parte da comunhão, o produto do trabalho dos cônjuges.
II – O espírito do sistema da comunhão geral é o de que ingressam no património comum todos os ganhos “alcançados” pelos cônjuges, todos os bens que “advierem” aos cônjuges durante o casamento que não sejam exceptuados por lei.
III – Encontrando-se os cônjuges ainda casados, por ocasião em que a compensação pecuniária, de natureza global, referente a indemnização em substituição de créditos laborais, foi recebida por um deles, o mesmo bem, ao entrar na esfera patrimonial deste, assumiu, imediatamente, a qualidade de bem comum do casal, passando a estar sujeito, desde a propositura da acção, ao regime da partilha dos bens comuns, em consequência de divórcio.
O voto de vencido diz o seguinte: Em meu entender, o direito à indemnização – ainda que previamente tenha havido acordo quanto ao respectivo montante – só nasce e se constituiu na data acordada para a cessação do contrato de trabalho e com a sua efectiva cessação, a 31/01/2014, sendo esta a data relevante quer para a base de cálculo do respectivo montante (nomeadamente, para a contagem da antiguidade do trabalhador), quer para a impugnação do despedimento. / Por outro lado, tratando-se de uma situação de perda de emprego por despedimento colectivo, tal indemnização destina-se a compensar o réu pela perda do trabalho, compensando-o das perdas salariais, perdas que só ocorrem a partir da data da cessação de tal contrato, num momento em que já se encontram divorciados – até 31/01/2014, foi-lhe sendo pago o respectivo salário. / Concluindo, consideraria que tal montante indemnizatório não se integrou na comunhão, pelo que revogaria a decisão recorrida, julgando a acção totalmente improcedente e absolvendo o réu do pedido.
Ac. do TRP de 30/01/2024, proc. 1132/15.6T8MTS-D.P1
[…]
III – […A] indemnização recebida pelo ex-cônjuge, com origem no Fundo constituído na pendência do casamento, a título de pré-reforma, apenas constituirá bem comum do casal casado segundo o regime da comunhão, se for atribuída/recebida na pendência do casamento, por se destinar a compensar a perda das remunerações recebidas como contrapartida do trabalho, uma vez que o produto do trabalho dos cônjuges integra a comunhão de bens, nos termos do art. 1724/a do C.C.
IV - Uma vez que o divórcio faz cessar a comunhão, não se pode entender constituir tal indemnização bem comum, se a indemnização foi atribuída e recebida pelo ex-cônjuge 6 anos depois da data da propositura da acção de divórcio, data em que aqueles efeitos retroagem, nos termos do disposto no art.1789/1 do CC. Daí que tal bem não deva ser incluído em partilha adicional.
Ac. do TRG de 15/05/2025, proc. 5774/20.0T8GMR-F.G1
I - Nos termos das disposições conjugadas dos arts. 1721 e 1724/a do CC, faz parte da comunhão o produto do trabalho dos cônjuges. II – A compensação pecuniária de natureza global, referente a indemnização por cessação da relação laboral, deve considerar-se bem que integra o património comum dos cônjuges, nos termos do disposto no artigo 1724/a do CC, na medida em que tem em vista compensar o trabalhador da ruptura da relação laboral e da perda de salários subsequente àquela ruptura com os quais o primeiro contribuía para os encargos da vida familiar.
Ou seja, também nenhum destes acórdãos defendeu que, em relação aos valores recebidos durante o casamento, se trata de bens próprios. Mesmo o voto de vencido só defende a natureza de bens próprios para os valores recebidos relativamente a um período posterior ao casamento.
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Também não serve de apoio ao autor, o por ele invocado (veja-se nota 23 do corpo das alegações, embora sem a indicação completa do acórdão, mas incluindo, por exemplo, a referência à obra de Pereira Coelho nos mesmos termos que o acórdão) ac. do TRC de 19/02/2004, proc. 4260/03:
“A indemnização devida por factos verificados contra a pessoa de cada um dos cônjuges, é bem próprio de cada cônjuge, não por efeito da aplicação analógica do disposto no art. 1733/1d, mas sim de acordo com o disposto no art. 1722/1c. É que existindo uma violação de um direito pessoal, evidentemente que a indemnização correspondente é resultante de direito próprio anterior (v.g., o direito à integridade física). De resto, os correspondentes bens (resultantes de indemnizações por factos verificados contra a pessoa de cada um dos cônjuges) são até incomunicáveis, de acordo com o disposto nos artigos 1699/1d e 1733/1d [todos do CC]. Ou seja, tais bens são incomunicáveis por força da lei (neste sentido P. Coelho, Curso de Direito de Família, 1977, pág. 410).”
É que este acórdão está a referir-se, em abstracto, à previsão do art. 1733/1d do CC, não em concreto, pois que a pretensão de considerar a indemnização em causa bem próprio da requerida foi julgada improcedente, não tendo o acórdão matéria sobre a qual se pronunciar em concreto, porque “não está alegado (e muito menos provado) que a indemnização emergiu de qualquer facto verificado contra a pessoa da requerida, pelo que não se pode concluir que a indemnização tendesse a ressarcir um bem de carácter estritamente pessoal da mesma” (os sublinhados são do próprio acórdão).
Ou seja, o acórdão diz, e não se discute que é assim, que as indemnizações devidas por factos verificados contra a pessoa de cada um dos cônjuges são incomunicáveis (art. 1733/1d do CC). Mas não tratou da questão de saber, porque a questão nem sequer se colocou, se, estando em causa uma indemnização por redução da capacidade de ganho, ela e/ou as prestações com origem nela, também seriam um bem próprio.
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Em suma, a posição do autor tem apoio apenas numas poucas linhas de uma obra que diz simplesmente que estas indemnizações não são bens comuns (não se baseando esta obra, como se vê da parte final da citação, na distinção entre o direito à indemnização e às prestações que dele derivem); numa outra obra em que se parece defender simultaneamente as duas posições contrárias e que o faz apenas com adesão à posição da outra obra; e num acórdão que se está a referir a indemnizações por cessação do contrato de trabalho e que não tem suporte jurisprudencial anterior, nem foi seguido por outros acórdãos.
Contra a posição do autor, existe vária doutrina, principalmente sintetizada por Maria João Vaz Tomé que, em 4 páginas (425-428, em anotação ao art. 1724 do CC, para além de outras passagens de anotação ao art. 1717 do CC), defende (e invoca vária jurisprudência no mesmo sentido – apenas o ac. do TRG de 18/10/2018 está indicado por engano) que estas indemnizações por redução da capacidade aquisitiva devem ser consideradas bens comuns do casal – mesmo no regime de comunhão de adquiridos em que é também aplicável, por maioria de razão, o art. 1733/1c-e do CC, mas que não constitui obstáculo a tal – não por interpretação extensiva, mas por não se justificar a interpretação restritiva do art. 1724/a do CC. Isto tendo em conta (a) valorações axiológicas, (b) a consideração (i) de outros preceitos que regulam problemas normativos paralelos (art. 1725 e 1671/1 do CC, e 13, 36/3 e 67 da CRP), (ii) do lugar sistemático que compete à norma da alínea (a) e (iii) da sua consonância com a unidade intrínseca de todo o ordenamento jurídico, e (c) a história evolutiva do art. 1724/a do CC.
Note-se que é também este o entendimento corrente em dois outros países com um regime jurídico familiar muito próximo ao nosso.
Veja-se
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Em França existe o regime da comunhão reduzida aos adquiridos, que é o regime supletivo (art. 1400 do CC), com dois artigos do Code Civil que são utilizadas para o assunto [aqui como a seguir utilizou-se, para tradução, o deepseek, o chatgpt e o tradutor do google, com algumas adaptações]:
Article 1401
La communauté se compose activement des acquêts faits par les époux ensemble ou séparément durant le mariage, et provenant tant de leur industrie personnelle que des économies faites sur les fruits et revenus de leurs biens propres. => A comunhão é composta pelas aquisições feitas pelos cônjuges em conjunto ou separadamente durante o casamento, e provenientes tanto da sua indústria pessoal como das poupanças feitas com os frutos e rendimentos dos seus próprios bens.]
Article 1404
Forment des propres par leur nature, quand même ils auraient été acquis pendant le mariage, les vêtements et linges à l'usage personnel de l'un des époux, les actions en réparation d'un dommage corporel ou moral, les créances et pensions incessibles, et, plus généralement, tous les biens qui ont un caractère personnel et tous les droits exclusivement attachés à la personne. => Constituem bens próprios pela sua natureza, mesmo que adquiridos na constância do casamento: as roupas e o vestuário de uso pessoal de um dos cônjuges, as acções de indemnização por danos corporais ou morais, os créditos e pensões insusceptíveis de cessão e, de um modo mais geral, todos os bens que tenham carácter pessoal e todos os direitos exclusivamente ligados à pessoa.
[…]
Como base nisto no Mémento Pratique, Droit de la famille, 20-21, Editions Francis Lefebv, 2020, diz-se (tiraram-se as inúmeras referências jurisprudenciais e doutrinais), páginas 72-73 (muita outra jurisprudência e doutrina no mesmo sentido, sobre os tipos que se seguem, podem ver-se nos n.ºs 34 a 44 de anotação ao art. 1401, págs. 389-390 do Code du divorce, annoté et commenté, Dalloz, 2019, 2e édition):
3057 - Alimentent également la communauté les indemnités perçues à l'occasion de la rupture du contrat de travail en réparation du préjudice tant moral que matériel, seules celles exclusivenment attachées à la personne du créancier étant exclues. Sont donc communs: => Alimentam igualmente a comunhão, as indemnizações recebidas por ocasião da cessação do contrato de trabalho, a título de indemnização por danos morais e materiais, sendo apenas excluídas as indemnizações exclusivamente relacionadas com a pessoa do credor. Por isso, são comuns:
- l'indemnité de licenciement => a indemnização por despedimento;
- l'indemnité de départ à la retraite => indemnização por reforma;
- les dommages et intérêts transactionnels versés en sus des indemnités légales, quel que soit leur libellé => as indemnizações compensatórias acordadas para além das indemnizações legais, independentemente da sua designação;
- les sommes versées au titre de l'assurance perte d'emploi => valores pagos a título de subsídio de desemprego;
ll en va de même des revenus de remplacement tels que: O mesmo se aplica ao rendimento de substituição, como:
- les arrérages d'une pension de retraite => pensões de reforma em atraso;
- le capital versé par un régime de prévoyance professionnelle obligatoire => capital pago por um plano de pensões profissional obrigatório.
- les indemnités journalières de maladie => subsídio de doença diário;
- les sommes qui compensent une baisse du commissionnement d'un agent d'assurances commun en biens exploitant un portefeuille propre => os montantes que compensam uma redução na comissão de um agente de seguros comum de ramos patrimoniais que gere uma carteira própria.
3060 - En présence d'une indemnité versée en raison d'une invalidité, il faut distinguer les sommes qui réparent exclusivement le préjudice personnel de la victime, qui sont des biens propres (voir n° 3105), de celles qui constituent un revenu de substitution, qui sont des biens communs. Ont ainsi été considérees comme des biens comuns => No caso de indemnização por incapacidade, deve distinguir-se entre os montantes que indemnizam exclusivamente os danos corporais sofridos pelo sinistrado, que constituem bens próprios (ver n.º 3105), e os que constituem rendimentos de substituição, que constituem bens comuns. Assim, foram considerados bens comuns:
- l'indemnité versée par une assurance invalidité garantissant le paiement des échéances d’un prêt dès lors que cette indemnité a pour cause non la réparation du préiudice résultant des séquelles mais la perte de revenus consécutive => a indemnização paga pelo seguro de invalidez, garantindo o pagamento das prestações do empréstimo, quando a indemnização não se destina a compensar os danos decorrentes das sequelas, mas sim a perda de rendimentos daí decorrentes;
- l'indemnité destinée à compenser la perte de revenus résultant de I'incapacité à reprendre un emploi => a indemnização destinada a compensar a perda de rendimentos decorrente da incapacidade de regresso ao trabalho.
3065 - Pour entrer en communauté, les gains et salaires doivent rémunérer un travail effectué pendant le fonctionnement du régime matrimonial. Plus précisément, il faut que la créance de salaire naisse durant le mariage. C'est le cas de: Para entrar na comunhão, os rendimentos e os salários devem compensar o trabalho prestado durante a vigência do regime de bens do casamento. Mais concretamente, o direito ao salário deve surgir durante o casamento. É o caso de:
- l'indemnité de licenciement si la rupture du contrat est notifiée durant le mariage, peu important qu’elle soit calculée en fonction d'une ancienneté acquise antérieurement => a indemnização por despedimento, se a cessação do contrato for comunicada durante o casamento, independentemente de ser calculada com base na antiguidade anteriormente adquirida;
- du pécule d'incitation au départ alloué avant le divorce, qui trouve sa cause non dans la compensation de la perte de revenus à venir mais dans l'activité professionnelle exercée au cours du mariage => do montante de incentivo à saída atribuído antes do divórcio, que se baseia não na indemnização por perda futura de rendimentos, mas na actividade profissional exercida durante o casamento.
Peu importe si les revenus ne sont perçus qu'après sa dissolution => Não importa se o rendimento só é recebido após a sua dissolução.
Pág.74 (muita outra jurisprudência e doutrina no mesmo sentido sobre os tipos que se seguem, podem ver-se nos n.ºs 5 a 8 de anotação ao art. 1404, págs. 394-395 do citado Code du divorce, que terminam assim: 5 […] les dommages-intérêts alloués à un époux tombent en communauté, saulf lorsqu’ils son accordés en réparation d’un dommage corporel ou moral; 6 e 7 […] lorsque la pension ou l’indemnité [ou l’indemnité d’assurance] est destinée à reparer le préjudice resultant de la perte de revenus, comparer jurisprudence citée ss art. 1401 => as indemnizações concedidas ao cônjuge são da comunhão, excepto quando sejam concedidos como reparação por danos corporais ou morais; quando a pensão ou a indemnização [ou a indemnização de seguro] se destine a reparar o prejuízo resultante da perda de rendimentos, comparar jurisprudência citada no art. 1401):
3105 - les actions en réparation d'un dommage corporel ou moral. Par extension, I'indemnité versée au titre d'un contrat d'assurance-invalidité ayant pour objet de réparer un dommage corporel est propre par nature. Que ce capital soit calculé en fonction des salaires et de la situation de famille de l'assuré n'y change rien. Dans le même sens pour une indemnité versée au titre d'une incapacité permanente partielle ou pour une pension de guerre. L'indemnité tombe en revanche en communauté si ele a pour finalité de réparer un dommage économique ou professionnel (nº 3060). Il en va de même d'une indemnité mixte, c'est-à-dire qui a aussi pour objet de réparer un dommage affectant la personne du créancier. Seules sont propres par nature les indemnités qui ont pour seul object de réparer un dommage affectant uniquement la personne d'un époux => acções de indemnização por danos corporais ou morais. Por extensão, a indemnização paga ao abrigo de um contrato de seguro de invalidez destinado a compensar danos corporais é própria por natureza. O facto de este capital ser calculado de acordo com os salários e a situação familiar do segurado não altera nada. O mesmo se aplica à indemnização paga por incapacidade permanente parcial ou para uma pensão de guerra. A indemnização, no entanto, recai no seio da comunhão se o seu propósito for compensar o dano económico ou profissional (n° 3060). O mesmo se aplica à indemnização mista, ou seja, aquela que também tem como objectivo compensar o dano que afecta a pessoa do credor. Apenas são próprias por natureza as indemnizações que têm como único propósito reparar o dano que afecta apenas a pessoa de um dos cônjuges;
Portanto, também a doutrina e a jurisprudência francesas consideram bem comum a indemnização por lesão que se destina a reparar o dano económico ou profissional / perda de rendimentos, ou melhor, aquela que não se destina a indemnizá-lo apenas pelo dano que afecta a pessoa do credor. E relativamente à indemnização por cessação do contrato de trabalho não coloca nenhuma dúvida de que se trata de um bem comum (mas não na parte que se reporte à perda de rendimentos futuros, depois do casamento).
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Em Espanha, o regime supletivo é o de sociedad de ganaciales (art. 1316 do Código Civil)/ comunhão de adquiridos. Respeitam ao problema em causa os artigos 1346 e 1347 do CC, que se transcrevem na parte que importa:
Art. 1346:
Son privativos de cada uno de los cónyuges:
[…]
5.° Los bienes y derechos patrimoniales inherentes a la persona y los no transmisibles ínter vivos.
6.° El resarcimiento por daños inferidos a la persona de uno de los cónyuges o a sus bienes privativos.
[…]
São próprios de cada um dos cônjuges: […] 5.º Os bens e direitos patrimoniais inerentes à pessoa e os intransmissíveis entre vivos. 6.º A indemnização por danos causados à pessoa de um dos cônjuges ou aos seus bens próprios.
Art. 1347
Son bienes gananciales:
1.° Los obtenidos por el trabajo o la industria de cualquiera de los cónyuges.
2.° Los frutos, rentas o intereses que produzcan tanto los bienes privativos como los gananciales.
[…]
São considerados bens comuns: 1.º Bens obtidos através do trabalho ou da indústria de qualquer dos cônjuges. 2.º Os lucros, rendimentos ou juros gerados tanto pelos bens próprios como pelos bens comuns.
María Linacero de la Fuente, no Tratado de derecho de família, 2.ª edición, Tirant lo blanch, 2020, páginas 285-291, lembra que o:
El Tribunal Supremo invocando entre otros, el art 1346. 5 CC […] [STS 14/12/2017, 668/2017 (Tol 64544498) […] Pleno de la Sala Primera) […] sobre el carácter ganancial o privativo de una indemnización percibida por el esposo antes del divorcio, con base en una póliza colectiva suscrita por la empresa donde este trabajaba, diz:
[…]
En consecuencia, por su propia naturaleza y función, la titularidad de esta pensión guarda una estrecha conexión con la personalidad (es inherente a la persona, art. 1346.5.º CC) y con el concepto de resarcimiento de daños personales (art. 1346.6.º CC, con independencia de que hayan sido «inferidos» por otra persona, sean consecuencia de un accidente o procedan de una enfermedad común).
Atendiendo, por tanto, a los criterios presentes en los apartados 5.º y 6.º del art. 1346 CC, la titularidad de la pensión derivada de una incapacidad permanente debe ser calificada como privativa.
En efecto, la pensión derivada de una incapacidad permanente dispensa protección a quien ve mermada su capacidad laboral como consecuencia de una enfermedad o de un accidente: se dirige a compensar un daño que afecta a la persona del trabajador, la ausencia de unas facultades que tenía y que ha perdido, lo que en el futuro le mermará las posibilidades de seguir obteniendo recursos económicos por la aplicación de esas facultades.
El reconocimiento del carácter privativo de la pensión tiene como consecuencia que, después de la disolución de la sociedad, el beneficiario no debe compartir la pensión con su cónyuge (ni, en su caso, con los herederos del cónyuge premuerto).
O Supremo Tribunal, invocando, entre outros, o artigo 1346.5 do Código Civil [STS 14/12/2017, 668/2017 (Tol 64544498 - Sessão Plenária da Primeira Câmara] sobre a natureza conjunta ou separada da indemnização recebida pelo marido antes do divórcio, com base numa apólice de seguro coletivo subscrita pela empresa onde trabalhava, declara: / Consequentemente, pela sua própria natureza e função, a titularidade desta pensão está intimamente ligada à personalidade (é inerente à pessoa, artigo 1346.5 do CC) e ao conceito de indemnização por danos pessoais (artigo 1346.6 do CC, independentemente de terem sido "causados" por outra pessoa, terem resultado de acidente ou doença comum). / Assim sendo, tendo em conta os critérios estabelecidos nos pontos 5 e 6 do artigo 1346 do CC, a titularidade da pensão derivada de uma incapacidade permanente deve ser qualificada como própria. / De facto, uma pensão derivada de uma invalidez permanente oferece protecção àqueles cuja capacidade de trabalho é diminuída em consequência de doença ou acidente: destina-se a compensar os danos que afectam a pessoa do trabalhador, a ausência de faculdades que tinha e perdeu, o que no futuro lhe diminuirá as suas hipóteses de continuar a obter recursos económicos pela aplicação de tais faculdades. / O reconhecimento da natureza própria da pensão significa que, após a dissolução da sociedade, o beneficiário não tem de partilhar a pensão com o seu cônjuge (nem, quando aplicável, com os herdeiros do cônjuge falecido).
Mas logo a seguir o acórdão esclarece:
Cuestión distinta es que, en ausencia de norma específica que diga otra cosa, las cantidades percibidas periódicamente durante la vigencia de la sociedad tienen carácter ganancial, dado que el art. 1349 CC [: El derecho de usufructo o de pensión, perteneciente a uno de los cónyuges, formará parte de sus bienes propios; pero los frutos, pensiones o intereses devengados durante el matrimonio serán gananciales] no distingue en función del origen de las pensiones y atribuye carácter común a todas las cantidades devengadas en virtud de una pensión privativa durante la vigencia de la sociedad, a diferencia de lo que hacen otros derechos, […] => Diversamente, na ausência de norma específica que disponha em contrário, os montantes recebidos periodicamente ao longo da comunhão têm caracter comum, dado que o artigo 1349 do CC [O direito de usufruto ou pensão pertencente a um dos cônjuges fará parte dos seus bens próprios; no entanto, quaisquer lucros, pensões ou juros acumulados durante o casamento serão bens comuns.] não distingue as pensões em função da sua origem e atribui um carácter comum a todos os montantes auferidos a título de pensão própria ao longo da comunhão, ao contrário de outros direitos, […]
Depois, quanto ao n.º 6º do art. 1346, a autora diz que:
La norma es consecuente con el principio de que la indemnización no es una ganancia. El resarcimiento de daños inferidos a la persona incluye el relativo a su esfera física y moral (v.gr., honor, intimidad, integridad) => A regra é consistente com o princípio de que a indemnização não é um ganho. A reparação por danos causados a uma pessoa inclui os relativos à sua esfera física e moral (por exemplo, honra, privacidade, integridade).
Mais à frente a autora esclarece:
La STS 588/2008, de 18 de junio (Tol 1336004), resume la doctrina jurisprudencial sobre la calificación de pensiones de jubilación, indemnización por baja anticipada, planes de pensiones, indemnizaciones obtenida por una póliza de seguros e indemnización por despido improcedente.
FJ 5 Esta Sala ya se ha pronunciado en diversas ocasiones sobre la pertenencia de determinadas indemnizaciones a la sociedad de gananciales. Así, la Sentencia de 26 de junio de 2007 que recoge en su resolución un supuesto análogo al aquí estudiado, realiza un análisis de las posibles soluciones de la siguiente manera:… “El resumen de la doctrina de esta Sala lleva a la conclusión de que existen dos elementos cuya concurrencia permite declarar que una determinada prestación relacionada con los ingresos salariales, directos o indirectos, deba tener la naturaleza de bien ganancial o, por el contrario, queda excluida de la sociedad y formará parte de los bienes privativos de quien la percibió. Estos dos elementos son: a) la fecha de percepción de estos emolumentos: si se adquirieron durante la sociedad de gananciales, tendrán esta consideración, mientras que si se adquieren con posterioridad a la fecha de la disolución, deben tener la consideración de bienes privativos de quien los percibe; b) debe distinguirse entre el derecho a cobrar estas prestaciones que debe ser considerado como un componente de los derechos de la personalidad y que, por esto mismo, no son bienes gananciales porque son intransmisibles, mientras que los rendimientos de estos bienes devengados durante la vigencia de la sociedad de gananciales, tendrán este carácter.”
A STS n.º 588/2008, de 18 de Junho, resume a jurisprudência sobre a classificação das pensões de reforma, das prestações de reforma antecipada, dos planos de pensões, das indemnizações obtidas através de apólice de seguro e das indemnizações por despedimento sem justa causa. / FJ 5 Este Tribunal já se pronunciou por diversas vezes sobre a pertença de determinadas indemnizações à comunhão de bens. Assim, o acórdão de 26/06/2007, que inclui na sua resolução um caso análogo ao aqui estudado, procede à análise das possíveis soluções da seguinte forma:… “O resumo da doutrina deste Tribunal leva à conclusão de que existem dois elementos cuja ocorrência conjunta permite declarar que um determinado benefício relacionado com o rendimento salarial, directo ou indirecto, deve ter a natureza de bem comum ou, pelo contrário, está excluído da comunhão e faz parte dos bens próprios de quem o recebeu. Estes dois elementos são: a) a data de recebimento destes emolumentos: se foram adquiridos durante a comunhão de adquiridos, serão considerados como tal, enquanto que se forem adquiridos após a data da dissolução, devem ser considerados bens próprios de quem os recebe; b) deve distinguir-se entre o direito à cobrança destes benefícios, que deve ser considerado como uma componente dos direitos de personalidade e que, por essa razão, não são bens comuns por serem intransmissíveis, enquanto que os auferidos durante a vigência do regime da comunhão de adquiridos terão este carácter.”
E mais à frente, lembra que:
“la STS 216/2008, califica como ganancial la indemnización por despido improcedente porque tiene su causa en un contrato de trabajo, como el actual, que se ha venido desarrollando a lo largo de la vida del matrimonio.
FJ 3 “(….) la indemnización por despido constituye una compensación por el incumplimiento del contrato y por ello mismo va a tener la misma consideración que todas las demás ganancias derivadas del contrato, siempre que se hayan producido vigente la sociedad de gananciales. El derecho que permite el ejercicio de la fuerza de trabajo no se ha lesionado en absoluto; lo único que ha quedado vulnerado de alguna manera es la efectiva obtención de las ganancias originadas por la inversión de este capital humano, que es lo que según el Art. 1347.1 CC resulta ganancial”. […]
=> “O STS 216/2008 classifica a indemnização por despedimento improcedente como um bem comum, por se basear num contrato de trabalho, como o actual, em vigor durante todo o casamento. / FJ 3 “(…) a indemnização por despedimento constitui uma compensação por incumprimento contratual e, por isso, será equiparada a todos os outros rendimentos decorrentes do contrato, desde que tenham sido gerados durante a vigência da comunhão de adquiridos. O direito que permite o exercício da força de trabalho não foi violado de forma alguma; a única coisa que foi violada de alguma forma é a efectiva aquisição de rendimentos provenientes do investimento desse capital humano, que é o que, segundo o art. 1347.1 do CC, é considerado bem comum.” […]
E depois, quanto ao art. 1347.1 CC sintetiza assim:
En cuanto a las pensiones por jubilación y prejubilación, planes de pensiones e indemnizaciones vinculadas al trabajo, se consideran gananciales si se adquieren durante la vigencia de la sociedad de gananciales, mientras que si se adquieren con posterioridad a la fecha de la disolución, deben tener la consideración de bienes privativos de quien los percibe. => As pensões de reforma e de reforma antecipada, os planos de pensões e as indemnizações ligadas ao trabalho são considerados bens comuns se adquiridos durante o período de vigência do regime de comunhão de adquiridos. Se adquiridos após a data da dissolução, devem ser considerados bens próprios de quem os recebe.
No Memento prático, Família, 2020-2021, Francis Lefebvre, 2020, págs. 125 a 129, dá-se nota, entre o muito mais, do seguinte (de novo sem transcrição das inúmeras referências jurisprudenciais e com transcrição das passagens relativamente apenas a 3 dos temas já discutidos):
Resarcimiento de daños inferidos a la persona de uno de los cónyuges (cc art. 1346.6) Se corresponde con cualquier indemnización que tenga por objeto la reparación de un daño causado en la esfera privativa, por lo que también esta debe tener tal carácter.
Entre tales indemnizaciones cabe destacar las siquientes: - por lesiones o daños: -por despido.
Indemnización por lesiones o daños Cuando son producidos por accidentes o cualquier otra lesión física o psiquica a la persona de uno de los cónyuges, dicha indemnización es privativa, aunque la doctrina distingue entre los dos conceptos que la integran: el precio del dolor o las secuelas causadas al cónyuge, que tendrían carácter privativo y el lucro cesante o dejado de percibir como consecuencia del tiempo impedido, que sería ganancial, al tratarse del resarcimiento de rentas de trabajo que no se han producido como consecuencia del daño causado.
[…]
El dinero percibido por el cónyuge como indemnización por un accidente de tráfico tiene carácter privativo, aunque el accidente se produjera durante su actividad laboral, pues se considera un acidente común, según doctrina del Tribunal Supremo. Es posible individualizar las cantidades que corresponden a las secuelas fisicas del accidente y distinguirlas de las percebidas en relación al resarcimiento por incapacidad para el trabajo y gastos sanitarios y de otra índole ligada al accidente.
[…]
Reparação de danos causados à pessoa de um dos cônjuges (art. 1346.6 do Código Penal). Corresponde a qualquer indemnização que vise reparar danos causados na esfera privada, devendo, por isso, também possuir tal carácter. / Entre tais indemnizações, destacam-se: por lesões ou danos; por despedimento. / Indemnização por lesões ou danos: Quando causados por acidentes ou qualquer outra lesão física ou psicológica à pessoa de um dos cônjuges, tal indemnização é privada, embora a doutrina distinga os dois conceitos que a compõem: o preço da dor ou das sequelas causadas ao cônjuge, que terão natureza própria, e os lucros cessantes ou deixados de receber como consequência do tempo de impedimento, que será bem comum, por se tratar de indemnização por rendimentos do trabalho que não foram gerados em consequência do dano causado. / […] / O valor recebido pelo cônjuge a título de indemnização por acidente de viação é próprio, mesmo que o acidente tenha ocorrido durante o trabalho, por ser considerado um acidente comum, segundo a doutrina do Supremo Tribunal. É possível separar os valores correspondentes às consequências físicas do acidente e distingui-los dos valores recebidos referentes a indemnizações por incapacidade para o trabalho e despesas médicas e outras relacionadas com o acidente.
[…]
Indemnizaciones por accidente laboral.
El mismo tratamiento que las indemnizaciones por lesiones o daños tienen las indemnizaciones percibidas por un cónyuge como consecuencia de haber sufrido un accidente laboral, pues se trata igualmente del resarcimiento de daños inferidos a la persona. Sin embargo, al tratarse de una indemnización percibida como consecuencia de una relación laboral, existían sentencias que distinguían si la misma se había percibido constante la sociedad de gananciales o cuando ya se había producido su disolución.
Precisiones 1) Aunque la jurisprudencia del Tribunal Supremo ha interpretado el contenido del CC art.1346.6, considerando que toda indemnización que se fundamente en un resarcimiento de daños tiene acogida en dicho precepto, siempre que se trate de reparar los perjuícios que se causaron, a su perceptor fundamentalmente en su cuerpo, y ello hace que la reparación tenga naturaleza de bien propio y exclusivo de quien la recibe, sin embargo, cuando la indemnización es de carácter económico o patrimonial basada en el derecho al trabajo no tiene ese fundamento, y por ser una consecuência económica y permanente de este alcanza carácter ganancial, siempre que ingrese en el patrimonio conyugal durante la vigencia de la sociedad. Señala la doctrina del Tribunal Supremo que existen dos elementos cuya concurrencia permite declarar que una determinada prestación relacionada con los ingresos salariales, directos o indirectos, deba tener la naturaleza de bien ganancial o, por el contrario, queda excluida de la sociedad y formará parte de los bienes privativos de quien la percibió. Estos dos elementos son: a) la fecha de percepción de estos emolumentos: si se adquirieron durante la sociedad de gananciales, tendrán esta consideración, mientras que si se adquieren con posterioridad a la fecha de la disolución, deben tener la consideración de bienes privativos de quien los percibe. b) Debe distinguirse entre el derecho a cobrar estas prestaciones que debe ser considerado como un componente de los derechos de la personalidad y que, por esto mismo, no son bienes gananciales porque son intransmisibles, mientras que los rendimientos de estos bienes devengados durante la vigencia de la sociedad de gananciales, tendrán este carácter.
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Indemnização por acidente de trabalho. / A indemnização recebida pelo cônjuge em consequência de acidente de trabalho é equiparada à indemnização por lesões ou danos, dado que constitui também uma reparação por danos causados à pessoa. No entanto, como esta indemnização é recebida em consequência de uma relação laboral, houve decisões que distinguiram conforme a indemnização foi recebida durante a comunhão de adquiridos ou após a sua dissolução. Esclarecimentos 1) Embora a jurisprudência do Supremo Tribunal tenha interpretado o teor do art. 1346.6, considerando que qualquer indemnização fundada em ressarcimento de danos está abrangida por tal disposição, desde que se destine a reparar os danos causados ao beneficiário, principalmente ao seu corpo, e isso faz com que a reparação tenha a natureza de um bem próprio e exclusivo de quem a recebe, porém, quando a indemnização é de natureza económica ou patrimonial fundada no direito ao trabalho, não tem esse fundamento, e por ser consequência económica e permanente deste, recebe o carácter de bem comum, desde que ingresse no património conjugal durante a vigência da sociedade. A doutrina do Supremo Tribunal assinala que existem dois elementos cuja concordância permite declarar que um determinado benefício relativo ao rendimento salarial, directo ou indirecto, deve ter a natureza de bem comum ou, pelo contrário, é excluído da comunhão e integrará os bens próprios de quem o recebeu. Estes dois elementos são: a) a data do recebimento destes emolumentos: se adquiridos durante o período de comunhão de bens, serão considerados como tal, enquanto que se adquiridos após a data da dissolução, deverão ser considerados bens próprios de quem os recebe. b) Deve distinguir-se entre o direito à cobrança destes benefícios, que deve ser considerado uma componente dos direitos de personalidade e, por isso, não é bem comum por ser intransmissível, enquanto os rendimentos destes bens auferidos durante o período de comunhão de bens serão considerados como bens comuns. […]
Indemnizaciones por despido
Es criterio unánime que las indemnizaciones percibidas una vez disuelta la sociedad de gananciales siempre tienen carácter privativo. Existe, no obstante, diversidad de criterios en la calificación de las indemnizaciones percibidas constante la sociedad de gananciales.
Asi pues, lo que viene a determinar la naturaleza privativa o ganancial de dicha indemnización es la fecha de percepción de la misma, resultando que si se percibe durante la vigencia de la sociedad de gananciales, la indemnización tiene esta consideración, mientras que si percibe con posterioridad a la fecha de la disolución, debe tener la consideración de bien privativo de quien lo ha percibido. Se distingue entre el derecho a cobrar la indemnización, que debe ser considerado como un componente de los derechos de la personalidad y que, por tanto, no es un bien ganancial al tratarse de un derecho intransmisible, mientras que el rendimento de estes derechos, devengados durante la vigencia de la sociedad de gananciales, tiene carácter ganancial.
En una sentencia posterior, el Tribunal Supremo ha matizado aún más esta doctrina, confirmando el criterio sentado en la TS 26-6-07, EDJ 70141, aunque precisando que:
- por una parte, que lo determinante es que la indemnización se cause constante la sociedad de gananciales, aunque se perciba con posterioridad (p.e. el despido se produce constante la sociedad de gananciales, pero el cónyuge percibe la indemnización meses después de estar disuelta la misma por sentencia de divorcio); y
- por otra, que ha de descontarse de la indemnización la parte proporcional que se corresponda con el trabajo prestado por el cónyuge antes del inicio de la sociedad de gananciales, es decir, ha de tenerse en cuenta en el cálculo de la concreta cantidad que tiene la naturaleza el porcentaje de la indemnización que corresponde a los años trabajados durante el matrimonio, cantidad que se determinará en ejecución de sentencia.
Indemnização por despedimento / É unânime que a indemnização por despedimento recebida após a dissolução da comunhão de bens é sempre considerada bem próprio. No entanto, existem diferentes critérios para classificar as indemnizações por despedimento recebidas durante a comunhão de bens. / Assim, o que determina a natureza própria ou comum da referida indemnização por despedimento é a data do seu recebimento. Se for recebida durante o período da comunhão de adquiridos, a indemnização por despedimento é considerada comum, enquanto que se for recebida após a data da dissolução, deve ser considerada propriedade própria da pessoa que a recebeu. Distingue-se entre o direito a receber a indemnização por despedimento, que deve ser considerado uma componente dos direitos pessoais e, por isso, não é um bem da comunhão, pois é um direito intransmissível, enquanto os rendimentos desses direitos, auferidos durante o período da comunhão de bens, são considerados propriedade comum. / Numa decisão posterior, o Supremo Tribunal refinou ainda mais esta doutrina, confirmando o critério estabelecido no acórdão do Supremo Tribunal de 26-6-07, EDJ 70141, embora especificando que: - por um lado, o factor determinante é que a indemnização tenha a sua causa durante o período de comunhão de bens, mesmo que seja recebida posteriormente (por exemplo, o despedimento ocorre durante o período de comunhão de bens, mas o cônjuge recebe a indemnização meses após a dissolução da mesma por sentença de divórcio); e - por outro lado, a parte proporcional correspondente ao trabalho prestado pelo cônjuge antes do início da comunhão de bens deve ser deduzida à indemnização; ou seja, a percentagem da indemnização correspondente aos anos trabalhados durante o casamento deve ser tida em conta no cálculo do montante específico. Este montante será determinado no momento da execução da sentença.
Assim, também a jurisprudência espanhola entende, grosso modo, que a titularidade do direito à indemnização pelos danos causados no corpo de alguém é do lesado e não se comunica ao outro cônjuge; mas, por um lado, faz a distinção entre os valores para as dores ou para as sequelas físicas e os valores de reparação do prejuízo económico decorrente da incapacidade para o trabalho durante a comunhão e recebidos durante ela, sendo estes últimos bens comuns; e, por outro lado, esclarece quanto às indemnizações por cessação do contrato, que o direito a elas é um direito pessoal e por isso bem próprio, mas os valores recebidos durante a comunhão ou reportados a esse período são bens comuns.
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Posto isto,
A entrega de um capital de remição de uma pensão nos casos de acidente de trabalho tem sempre por pressuposto, por força dos artigos 23/b, 47/1c e 48/2-3c e 75 da Lei 98/2009, de 04/09 (Regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais), a existência de uma incapacidade permanente para o trabalho e destina-se a compensar o sinistrado pela perda ou redução permanente da sua capacidade de trabalho ou de ganho.
Ou seja, a pensão, que o capital remite, pretende compensar o trabalhador de uma presumida perda de remuneração; com menos capacidade de trabalho ou de ganho vai passar a ganhar menos ou, se continuar a ganhar o mesmo, presume-se que o faz com mais esforço.
Assim, o capital de remição é o capital de uma indemnização por redução da capacidade de trabalho ou de ganho que é um produto, embora indirecto, ou por sub-rogação, do trabalho do autor, cabendo assim na previsão do art. 1724/a do CC, e por isso um bem comum.
É certo que o direito à indemnização é um bem pessoal do sinistrado e por isso incomunicável (artigos 1722/1-c e 1733/1d do CC), o que quer dizer, entre o mais, que não é o outro cônjuge que pode estar a discutir o seu conteúdo com o lesante, nem esse direito é relacionável como bem comum num inventário para separação de meações; mas as quantias com fonte nele e recebidas durante o casamento, enquanto pensões ou enquanto capital, são bens comuns do casal (art. 1724/1a do CC). Entradas na comunhão, não pode, depois da dissolução do casamento, separar-se parte delas para se atribuir só ao lesado. Também serão comuns as partes das pensões ou dos capitais que venham a ser recebidas depois do termo do casamento mas reportadas até ao termo do mesmo, mas neste caso já se poderá impedir a entrada na comunhão da parte restante que não se reporte à mesma.
Como no caso só se está a discutir capitais de remição de indemnizações por incapacidade permanente parcial por acidentes de trabalho recebidos durante o casamento num regime de comunhão de bens (art. 1717 do CC), todos eles são bens comuns do casal e, por isso, nenhum dos pedidos deduzidos pelo autor podia proceder.
Isto não se aplica aos 30€ entregues ao autor a título de despesas de transporte, mas o autor não disse nada que pudesse levar a qualificá-los como bem próprio, ou seja, não se sabe com que dinheiro foi paga a despesa de transporte que os 30€ se destinam a compensar.
Pelo que a sentença está certa.
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Pelo exposto, julga-se o recurso improcedente.
O autor perde as suas custas de parte (não há outras).
Lisboa, 11/09/2025
Pedro Martins
Fernando Alberto Caetano Besteiro
Paulo Fernandes da Silva