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ATRIBUIÇÃO PROVISÓRIA DA CASA DE MORADA DE FAMÍLIA
FIXAÇÃO DE COMPENSAÇÃO A FAVOR DO OUTRO CÔNJUGE
Sumário
I - Na atribuição provisória da casa de morada de família ao abrigo do nº 9 do art. 931º do CPC, incidente que se rege por critérios de conveniência e oportunidade, o julgador deve ter em conta os princípios estabelecidos no nº 1 do art. 1793º do CCiv., ou seja, as necessidades de cada um dos cônjuges e o interesse dos filhos do casal, bem como os rendimentos de cada cônjuge, o estado de saúde de cada um deles, a idade, a possibilidade de arranjarem trabalho, a possibilidade de um deles dispor de outra casa em que possa residir sem beneficiar da mera tolerância de terceiros e o comportamento pretérito dos mesmos no que diz respeito ao cumprimento dos seus deveres conjugais. II - A atribuição provisória da casa de morada de família a um dos cônjuges não determina a fixação automática de uma compensação a favor do outro cônjuge [a suportar por aquele]; a fixação de tal compensação depende das circunstâncias do caso concreto, em particular, das exigências de equidade e de justiça que este impuser com base nas circunstâncias da vida dos cônjuges e no equilíbrio dos interesses em confronto.
Texto Integral
Proc.6369/24.4T8VNG-A.P1–2ªSecção(apelação) Relator: Des. Pinto dos Santos Adjuntos: Des. Rodrigues Pires
Des. Artur Dionísio Oliveira
AA requereu, no âmbito da ação de divórcio sem consentimento que instaurou contra o seu então cônjuge, BB, que lhe fosse atribuídoousodacasademoradadefamília, sita em ..., Vila Nova de Gaia, alegando, em síntese, que a relação entre o casal se encontra em rutura irremediável, que não é possível a manutenção da sua convivência no mesmo espaço, que não tem qualquer suporte familiar que lhe permita residir noutra habitação, já que toda a sua família reside no Algarve, que não tem, pelos seus rendimentos, condições financeiras para pagar renda ou adquirir outro prédio no qual possa residir com os seus dois filhos e que, diversamente, o requerido tem parentes que o podem acolher, designadamente a mãe, que reside perto da casa de morada de família, que ele aufere um salário muito superior ao seu e que é ele que gere todos os bens comuns do casal a seu exclusivo intento, não permitindo à autora usar os recursos materiais comuns.
Realizada, sem êxito, a tentativadeconciliação, foi o requeridonotificadopara, querendo, deduziroposição, mas nãoofez.
Inquiridasastestemunhas arroladas, foi proferida decisãofinalnoincidente, com o seguinte dispositivo [parte decisória]: «DECISÃO Peloexposto,atribuoàrequerenteAAousodacasademoradadefamília,sitanaRua ..., n.º ...,4.º,hab. ...,em...,VilaNovadeGaia,atéàsuavendaoupartilha,cabendoacadaumadaspartespagarmetadedaprestaçãomensalrelativaàaquisiçãodahabitaçãoeficandoarequerenteexclusivamenteresponsávelpelopagamentodosencargosrelativosaofornecimentodeágua,eletricidade,gás,telecomunicaçõesetelevisãoacabo,absolvendoorequeridoBBdomaisrequerido. Custaspelarequerente,semprejuízodoapoiojudiciáriodequebeneficie.Fixoàcausaovalorde€30.000,01.».
Inconformado com o decidido, interpôs o requerido o presente recursodeapelação [admitido com subida imediata, nos próprios autos (apenso) e efeito suspensivo], cujas alegações culminou com as seguintes conclusões: «A.OpresenteRecursoconsubstanciaomaisprofundoinconformismodoRecorrentefaceàSentençaproferidapelaMm.ªJuizaquo,entendendo,semquebradorespeitosempredevidopordoutaopiniãoemcontrário,serdesajustadaquerdaprópriamatériaassente,querdosnormativoslegaispositivosaplicáveisincasu,querdejustiça,padecendodegraveserros,tantonoquetangeaojulgamentodefactocomodeDireito. B.ComobemsedefinenaSentençaemsindicância,eparaoqueesteefeitoreleva,aquestãoadecidirnospresentesautossãoessencialmenteasseguintes:“decide-sesobreaatribuiçãodousodacasademoradadefamília.(…)Háquedecidirseaautoracarecemaisdahabitaçãoidentificadanosautosdoqueoréuesedeveficarausá-laemexclusivoatéàdefiniçãodoseudestinoemsededepartilha.”,discordandooRéu,emabsoluto,dasconclusõesdefactoededireitodasentençaemcrise,tantoporanálisedaprovatestemunhalproduzidacomodaprovadocumental(oufaltadela)oportunamentejuntaaosautos. C.Daprovaproduzidanãoficoudemonstrado,queaMãedoaquiRéu,temdisponibilidadeparaoacolher,asieaoseufilho,inexistindoqualquerelementoprobatórioqueindiquequeahabitaçãodesuaMãe,únicoelementoqueresidepróximodeste,temsequermaisdoqueumquarto(eefetivamentenãotem),sendoquenemporsombrasficoudemonstradonosautosqualquerconcretaimpossibilidadedemanutençãodevivênciaemconjunto,estandoapenascomofactodemonstradoprovadoqueaspartesnospresentesautos“nãosedirigemmutuamenteapalavra”,eistotalcomonãoficoudemonstradoqueoRéutivessequalquervínculolaboralmenosperenequeodaAutora,maisimportandoreterqueaRegulaçãodasResponsabilidadesParentaisatualmenteexistenteestatuiumadivisãoparitáriadotempoperpassadocomcadaumdosprogenitores,oqueintuinosentidodequearesidênciaalternadaseráocaminhoaseguiremfuturaRegulaçãodefinitiva,peloqueoaquiRéuteráqueterasseguradascondiçõesparagarantiraomenorcondiçõesanálogasàsqueesteterácomaaquiAutora,maissendoÉpublicoenotórioqueomontanteadespenderpelopagamentodeprestaçãomensalatítuloderendaporimóvelanálogoaopropriedadedeRéueAutora,oumesmodetipologiaT1,émanifestamentesuperioraopagoatitulodeprestaçãodecréditohipotecário,nãosendoassimsuportávelpeloRéu,tendoemcontaomontanteporeleauferidoenquantoúnicorendimento. D.VemooraApelanterecorrerdadoutaSentençaproferidanosautos,peticionandoque,emrespeitopelospreceitoslegaisaplicáveis,sejarevogadaadecisãorecorridaesubstituídaporumaqueatribuaousodacasademoradadefamíliatambémaorequerido,esemprescindir,que,sendoestaatribuídaexclusivamenteàRequerente,quesejaestatuídomontanteapagaratituloderenda,deacordocomopagohabitualmenteporimóveldetaltipologianazonaemcausae,outrossim,semprescindir,queamesmafiquetotalmenteresponsávelpelopagamentodocréditohipotecário,nãopodendoapartedaresponsabilidadequecabeaoRequeridoserdeduzidadomontanteareceberemsededepartilhaouvendadoimóvel. E.OTribunalaquodeucomoprovadosofactoconstantenon.º6damatériadefactodadacomoassente,nomeadamentequantoaofactodeaspartesnãosedirigirem“mutuamenteapalavra,anãoser pararesolverassuntosrelacionadoscomofilhoCC,relativamenteaoqualtêmfrequentesdivergênciaseducativas”,sendoqueinexistenafundamentaçãofácticadadecisãonadaqueapontenessesentido. F.Namesma,apenaséreferidoqueatestemunhaDD(filho(apenas)daRequerente),que“nãoexistediálogonormalentreambos”,“apenasfalandodoseuirmãoquandoestritamenteentreambos”,nadareferindoquantoàexistênciadedivergênciaseducativasquantoaofilhoCC,asrestantestestemunhasapenasrevelam,segundoaquela,umconhecimentoindiretodarelaçãodocasal,tendopoucavaliaprobatória,sendoassimevidenteafaltadefundamentaçãofácticaparaqueoponto6,mormentequantoàquestãodasfrequentesdivergênciaseducativas,sejaumfactoconsideradoprovadosendoincompreensívelcomoéqueoTribunaldácomoprovadotalfactoquandoinexistequalqueracervoprobatórioqueorefira. G.Quantoaofactodadocomoprovadocomon.º13,diga-sequeasentençaaquiemcriseconsideroutambémcomonãoprovadoque“Oréutemcomoretaguardafamiliarasuamãe,residentenasproximidadesdacasademoradadefamília,em...,VilaNovadeGaia.”,sendoqueamesmaapenasrefereque“otribunalponderou,parasuademonstração,asdeclaraçõesconjugadasdeEE,sobrinhadaautora,edeDD(…)”,nadareferindoemconcretoquantoanenhumaformaou“modalidade”deapoiofamiliar. H.Maisseinferequeinexistequalqueroutromeioprobatórioproduzidonospresentesautosqueocomprove,portantonãopodeomesmoserdadocomoprovado,sendoquejamaisficoudemonstrado,sendomesmoumfactonãoprovado,queoRéu“dispõedetrêsoutrashabitaçõesnasquaissepodefixar”,peloquetalapoiojamaispodeseranalisadocomopodendosergarantidaatravésdomesmohabitaçãocondigna,querparasi,querparaoseufilho,nãosubsistindoassimquaisquerdúvidasnoqueconcerneàexistênciadeumverdadeiroerrodejulgamento,quantoaesteparticular. I.Noquerespeitaaodestinodacasademoradadefamília,preceituaon.º7docitadoartigo931.ºdoCódigodeProcessoCivil:“Emqualqueralturadoprocesso,ojuiz,poriniciativaprópriaouarequerimentodealgumadaspartes,eseoconsiderarconveniente,podefixarumregimeprovisórioquantoaalimentos,quantoàregulaçãodoexercíciodasresponsabilidadesparentaisdosfilhosequantoàutilizaçãodacasademoradadafamília;paratanto,ojuizpode,previamente,ordenararealizaçãodasdiligênciasqueconsiderarnecessárias.”,sendoque,oregimeprocessualreferidocontidonon.º2enon.º7doartigo931.ºdoCPCconstituiincidentenatramitaçãodaaçãodedivórcio“semconsentimentodooutrocônjuge”,tendonaturezaprovisória,comoexpressamenteresultadascitadasdisposiçõeslegais:éprovisóriooacordoobtidoquantoaodestinodacasademoradadefamília([vigorandoemregra“duranteoperíododependênciadoprocesso”–cfr.artigo931.ºn.º2doCódigoCivil,sendoprovisória,também,adecisãodaMma.Juizproferidaperantea inviabilidadedoacordodaspartes(“regimeprovisório”comoexpressamenteodefineon.º7doart.931.ºdoCC),comosucedeincasu. J.ConformenostrazoinsigneProfessorPereiraCoelho:“(…)aleiquereráqueacasademoradadafamília,decretadoodivórcioouaseparaçãojudicialdepessoasebens,possaserutilizadapelocônjugeouex-cônjugeaquemformaisjustoatribuí-la,tendoemconta,designadamente,asnecessidadesdeumedeoutro[…].Ora,estecritériogeral,segundonosquerparecer,nãopodeseroutrosenãoodequeodireitoaoarrendamentodacasademoradadafamíliadeveseratribuídoaocônjugeouex-cônjugequemaisprecisedela.[…]Anecessidadedacasa(oua«premência»,comovemadizerajurisprudência;melhorsediriaapremênciadanecessidade)parece-nosser,assim,ofatorprincipalaatender.[…]Naavaliaçãodapremênciadanecessidadedacasadeveotribunalteremconta,emprimeirolugar,justamenteestesdoiselementos,quemaisexpressivamentearevelam[…].Trata-se,quantoà«situaçãopatrimonial»doscônjugesouex-cônjuges,desaberquaisosrendimentoseproventosdeumedeoutro[…].Noqueserefereao«interessedosfilhos»,háquesaberaqualdoscônjugesouex-cônjugesficouapertenceraguardadosfilhosmenores[…].Masojuízosobreanecessidadeouapremênciadanecessidadedacasanãodependeapenasdestesdoiselementos.Haveráqueconsideraraindaasdemais«razõesatendíveis»:aidadeeoestadodesaúdedoscônjugesouex-cônjuges,alocalizaçãodacasarelativamenteaolocaldetrabalhodeumeoutro,ofactodealgumdelesdisporeventualmentedeoutracasaemquepossaestabelecerasuaresidência,etc.”. K.Ora,nasituaçãodosautos,importadesdejáreferirque,conformedadocomoprovado,existeumaprestaçãodecréditohipotecárioapagarmensalmente.,maisexistindoregulaçãodasresponsabilidadesparentaisprovisóriadofilhodeAutoraeRéu,prevendoestadivisãoparitáriadotempoperpassadocomcadaum,sendoqueresultademonstrado,mesmoatendendoàsregrasdaexperiênciacomumenormaldecursodascoisas,queoRéunãoconseguesuportaropagamentoderendamensalnoutrahabitação,nemtampoucocondiçõesparaefetuaropagamentodemetadedocréditohipotecárioemtalcaso,bemcomonãotemsitioparaondehabitarcondignamentecomoseufilho,eistosendocertoqueaprestaçãomensal,nãosendopagaeocorrendoincumprimento,talpoderásignificarqueambospercamtodoquantopagoduranteomatrimónio,oquenãosereveladoseuinteressenemtampoucodofilhomenordeambos. L.Assim,emsuma,esendoacasaumbemdacompropriedadedeAutoraeRéu,mesmoatendendoàsregrasdaexperiênciacomumenormaldecursodascoisas,estádemonstradoquenenhumadaspartestemcapacidadeparaarrendaroutrahabitação,resultandoóbvioque,seacasaficarexclusivamenteatribuídaaum,essedeveráficarresponsávelpelopagamento,pelomenosdatotalidadedaprestaçãomensaldocréditohipotecárioetodasasdespesasdacasa,incluindocondomínioeIMI. M.Quantoaointeressedasmenores,estedeveservistotambémnaóticadoperíododetempoparitárioqueestepassarácomoaquiRéu,enoqualdevetercondiçõesigualmentecondignas,maissendodointeressedestequeosPaismantenhamacasademoradadefamíliaenãodeemcomoperdidooinvestidomonetariamenteparaasuaaquisiçãoemanutençãodesta. N.Deverá,assim,porviolaçãododisposto,nomeadamente,nosartigos931.ºn.ºs2e7doCPCe1793.ºdoCC,emconsequênciaalterar-seadecisãonaparteemqueatribuiàRéodireitodeutilizaracasa demoradadefamíliaatévendadamesma,atribuindo-seesteaoAutor. O.Semprescindir,oquenãoseconcede,sempresedigaqueserevelainaceitávelque,atribuindo-seodireitodeutilizaçãodacasademoradadefamíliaàRé,portodoquantosobredito,aoAutornãosejaatribuíaumacontrapartida. P.Assim,emantendocomopresenteque,oobjetivoessencialdesteincidenteéadefiniçãoprovisóriadasituaçãodoscônjugesrelativamenteàcasademoradadefamília,combasenafactualidadequefoipossívelapurar,que,seguindocritériosdeequidade,econsiderandosobretudoointeressedosmenores,filhosdocasal,quenenhumaculpatêmdasdivergênciasentreosprogenitores,afigura-se-nosqueaimposiçãoàrecorrida,atéàvendaouadjudicaçãodacasa,demontanteestatuídoatituloderendaou,adminimum,dopagamentointegraldovalorrelativoàamortizaçãomensaldoempréstimoparaaquisiçãodessahabitação,bemcomotodososencargosdecorrentesdamesma(seguros,IMI,condomínioeoutros),éomínimoexigívelparaocumprimentodocritérioenunciado,traduzindo-se,desdelogo,numacontrapartidaafavordorecorrente:adispensadopagamentodasuapartedaprestaçãobancáriaerestantesencargosreferentesaumbemcomum,nãopodendotaisprestaçõesserdeduzidasaovalorqueoRéutenhaquerecebernaspartilha/vendadobem.-Postoisto,amanter-seosentidoindicado,deve,adminimum,esobpenadeviolaçãodoprincípioedasmaiselementaresregrasdaequidade,serestatuídacontrapartidaafavordoRéunostermosoraexpostos. Nestestermosenosmelhoresdedireitoaplicáveis,requer-seav.exas.que,dandoprovimentoaorecurso,sejarevogadaadecisãorecorridaesubstituídaporoutraque,julgandoopresenterecursoprocedenteealterenostermosexpostosadecisãotomada,assimsefazendoasãecostumeiraJustiça!».
A requerentecontra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso e consequente confirmação da decisão recorrida.
* * *
II.Questõesaapreciaredecidir:
Em atenção às conclusões das alegações das partes, que, de acordo com o estabelecido nos arts. 635º nº 4 e 639º nºs 1 e 2 do CPC, fixam o themadecidendum deste recurso [sem prejuízo do eventual conhecimento de questões de conhecimento oficioso], as questões a apreciar e decidir consistem em saber: 1.Seadecisãorecorridapadecedefaltadefundamentaçãodosfactosprovadosnºs6e13; 2.Seháquealterarasoluçãojurídicadecretadadadecisãorecorrida–atribuiçãodoseuusoe fixaçãoderenda.
* * *
III.Factosprovadosenãoprovados:
i) A decisão recorrida considerou provados os seguintes factos:
1. No dia 27 de dezembro de 2022, autora e réu, à data com domicílio fixado na Bélgica, casaram civilmente, com convenção antenupcial, pela qual estabeleceram o regime de bens de comunhão de bens adquiridos tendo por lei reguladora a lei portuguesa.
2. Em ../../2017, nasceu de relacionamento das partes prévio ao seu casamento, a criança CC, filho de ambas, e então residente com seus pais na Bélgica.
3. Com as partes e o seu referido filho menor comum, residia ainda um outro filho da autora, DD, menor de idade.
4. Em data não concretamente apurada do ano de 2023, as partes, com ambas as crianças acima identificadas, regressaram a Portugal, tendo-se instalado em habitação sita na Rua ..., hab. ..., em ..., Vila Nova de Gaia, onde hoje residem todos.
5. Esse prédio encontra-se inscrito a favor das partes na respetiva matriz predial urbana com o artigo n.º ..., em partes iguais, desde o ano de 2023, estando aí descrita como habitação própria e permanente, e inscrita na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o n.º ....
6. Autora e réu, apesar de residirem na mesma casa, não se dirigem mutuamente a palavra, a não ser para resolver assuntos relacionados com o filho CC, relativamente ao qual têm frequentes divergências educativas.
7. Em 5 de novembro de 2024, foi definido regime provisório do exercício das responsabilidades parentais relativas ao filho de ambas as partes, segundo o qual as responsabilidades parentais quanto aos atos da vida corrente e quanto aos atos de particular importância são exercidas conjuntamente, por ambos os pais, jantando o ora réu com o seu filho CC às segundas e quartas-feiras, entre as 19 e as 21 horas, e jantando a mãe com a criança às terças e quintas-feiras, no mesmo horário; às sextas-feiras, a criança jantará com um ou com outro progenitor, alternadamente, mais passando a criança o sábado com um dos pais e o domingo com o outro, alternadamente, cabendo a ambos os pais o pagamento de todas as despesas relativas ao sustento do filho, em partes iguais, como decorre da respetiva ata, do apenso B, cujo teor se dá aqui por reproduzido.
8. A requerente está atualmente desempregada, tendo exercido atividade profissional como técnica dos A..., S.A., que cessou por ter chegado ao seu termo o contrato de trabalho com a duração de seis meses celebrado, aguardando a celebração de novo contrato, dentro em breve, regressando à mesma atividade profissional.
9. A requerente recebeu subsídio de desemprego, até 05/03/2025, tendo obtido entre 01/01/2025 e 04/02/2025, o valor diário de € 17,41€ por dia, num total de € 592,17, e entre 20/11/2024 e 31/12/2024, o valor diário de € 16,97, no total de € 695,99, acrescido de € 104,40 que corresponde à majoração do limite mínimo.
10. Quando ao serviço dos A.... S.A., a autora aufere a quantia mensal líquida média de € 1.017,27.
11. O requerido exerce atividade profissional ao serviço de B..., S.A., sendo a sua última remuneração mensal declarada ao Instituto da Segurança Social, I.P., em janeiro de 2025, de € 1.750,00.
12. Todos os parentes próximos da requerente habitam no Algarve, não tendo neste momento qualquer pessoa da sua família ou amiga próxima que resida em Vila Nova de Gaia ou em áreas limítrofes que a possa acolher na sua habitação com os seus filhos.
13. O réu tem como retaguarda familiar a sua mãe, residente nas proximidades da casa de morada de família, em ..., Vila Nova de Gaia.
14. A requerente prepara geralmente as refeições, adquirindo a alimentação para todos os habitantes da casa, apesar de o requerido não as consumir conjuntamente com os demais.
ii) Oficiosamente, ao abrigo do que dispõem os arts. 607º nº 4, 663º nº 2 e 986º nº 2, todos do
CPC, considera-seaindaprovadooseguinte [resultante de consulta do histórico do apenso B (mais concretamente da ata com data de 28.05.2025), relativo à regulação das responsabilidades parentais do menor CC, filho de requerente e requerido]: 15.Oregimeprovisóriodescritoem7foisubstituído,em28.05.2025,poroutroregimeprovisóriocomoseguinteteor: «Cláusula1.ª(Fixaçãodaresidênciaeregimedoexercíciodasresponsabilidadesparentaisquantoàsquestõesdeparticularimportânciaparaavidadacriança) 1.1Fixa-searesidênciadeCCcomamãe,aquemcompetiráadecisãorelativaaosatosdasuavidacorrente,semprejuízodaintervençãodoprogenitornãoresidentenosmomentosemqueotiverconsigo; 1.2Asresponsabilidadesparentaisrelativasaquestõesdeparticularimportânciaparaavidadacriança,serãoexercidasporambosospais,conjuntamente. 1.3Todasascomunicaçõeseinformaçõesnecessáriasparaesteefeitoserãorealizadaspelairmãdoprogenitor,FF,epelaavópaterna,naindisponibilidadedaprimeira,devendoocorrerporcontactotelefónico,mensagemescritaeporcorreioeletrónico. 1.4.Àirmãdoprogenitor,tiapaternadacriança,competeaindaaassegurarasrecolhaseasentregasdacriança,naexecuçãodoregimedeconvívioscomoprogenitornãoresidente,podendocaberàavópaterna,emcasodeimpedimentodaprimeira. Cláusula2.ª(Regimedeconvívios/visitasentreoprogenitoreofilho) 2.1Duranteoperíodoescolar,opaiirábuscarofilhoàescola,sendoasuaentregaemcasadamãe19:00horas àssegundasequartasfeiras;jantandocomesteàsterçasequintasfeiras,sendoaentregaemcasadamãeàs21.30 horas. 2.2Ofilhoconviveráaindacomopaiaosfinsdesemanade15em15dias,indoaintermediáriabuscarofilhoà casadamãeàs09:00horasdesábadoeentregando-onodomingoàs19:00horasnomesmolocal. 2.3Nassextasfeirasqueantecedemofimdesemanaemqueofilhoficarácomamãe,opaiirábuscarofilhoàescolaejantarácomeste,sendoacriançaentregueemcasadamãeàs21:30horas. 2.4Nasfériasdeverão,ofilhopassará15diascomcadaumdospais,emdatasaacordaraté30/06/2025;casohajasobreposiçãodedataspretendidas,ospaispoderãoalternarentresiesseperíodode15diasemdoisdeduassemanas. 2.5Nasfériasescolaresdeverão,noperíodoemqueofilhonãoestejaemgozodefériascomqualquerdospaisnostermosdescritosem2.4,ofilhopassaráoperíododeummês,seguidoouintercalado,ematividadesdocentrodeATLemquefoiinscritopelamãe,passandooutroperíododeummês,seguidoouintercalado,acargodopaiduranteodia,seguindooshoráriosderecolhaeentregaosacimadescritos(respetivamente,9horase19horasnosdiasemquenãodevajantarcomopai;e9horase21h30nosdiasemquedevajantarcomopai). 2.6Acriançapoderácontactarcomoprogenitorcomquemnãoestejaapassarodiaporvideochamada,umavezpordia,arealizaràs19:00horas,comaduraçãomáximade15minutos,eaefetuardiretamenteparaaplicaçãoinstaladanotabletdacriança. Cláusula3ª(Alimentoseformadeosprestar)(…)».
*
iii) Na decisão recorrida foram dados como nãoprovados os seguintes factos:
- O requerido retirou de contas bancárias comuns do casal valores não apurados, usando-os em seu único proveito.
- O requerido dispõe de três outras habitações nas quais se pode fixar.
* * *
IV.ApreciaçãodasquestõesindicadasemII:
1.Seadecisãorecorridapadecedefaltadefundamentaçãodosfactosprovadosnºs6e13.
O recorrente alega nas conclusões E a H que os factos provados nºs 6 e 13 não se mostram fundamentados na decisão recorrida e, por isso, não podiam ter sido dados como provados (sic).
O tribunal aquo fundamentou a materialidade que deu como provada do seguinte modo: «Paradarosfactosreferidoscomoassentes,otribunalfundou-se,emprimeirolugar,naapreciaçãodosdocumentosjuntospelaspartesnaaçãodedivórcio,bemcomonatramitaçãodesseprocesso,conjugadocomaanálisecríticadosdepoimentosdastestemunhasouvidas. Maisteveemconsideraçãoodocumentojuntopelaautoracomapetiçãoinicial,relativoaoseu salário,eàspesquisasefetuadasjuntodoISS,I.P.sobreosrendimentosdotrabalhodeambasaspartes,emespecialsobreasprestaçõesdedesempregoentretantorecebidaspelarequerente. Paraprovadatitularidadedacasaaquiemapreço,otribunalatendeuaodocumentojuntopelarequerenteem03/03/2025. Quantoàscircunstânciasdevidadaspartes,desdeoseuregressodaBélgica,eespecificamentenasuavidadiárianahabitaçãocomum,otribunalbaseou-se,parasuaprova,naapreciaçãocríticadasdeclaraçõesdatestemunhaDD. Apesardasuaidadeedarelaçãodeparentescocomaautora,deformasingelaexplicouqueaspartesnãofazemrefeiçõesjuntas(jáqueorequeridotomaasrefeiçõesconfecionadaspelarequerente,masnãoemconjunto)equenãoexistediálogonormalentreambas,dormindooréunasala,nosofá,enãoexistindovidafamiliaresocialconjunta.Peloquereferiuatestemunha,arelaçãoentreaspartesédistanteetensaenãohádiálogoentreambos,contrariamenteaoqueaconteciaquandoaindaresidiamnaBélgica,apenasfalandodoseuirmãoquandoestritamentenecessário. AstestemunhasGGeHHdemonstrarampraticamenteapenasumconhecimentoindiretodarelaçãodocasal,tendopoucavaliaprobatória,masafirmaramdoestadodeânimodaautoraquantoàsuavidaconjugalefamiliaredarelaçãodifícilentreambosnoquetangeaofilhocomum. Noquerespeitaaoapoiofamiliardequebeneficiacadaumadaspartes,otribunalponderou,parasuademonstração,asdeclaraçõesconjugadasdeEE,sobrinhadaautora,edeDD,jácitado. AprimeiraexplicouquetodaasuafamíliavivenoAlgarve,oquefoisecundadopelasegundatestemunhareferida,equenãoháninguémquepossaacolhê-los,nãoexistindonenhumparentearesidirnassuasproximidades. Relativamenteàexistênciadahabitaçãodamãedoréu,situadabempróximadacasademoradadefamília,eàretaguardaqueestapessoaconfigura,otribunalmaisumavezatendeuaessastestemunhas,especialmenteaDDque,nãosabendodescrevercomrigoroespaçodarespetivaresidência,informoucomclarezaqueficalocalizadamuitopróximadahabitaçãodafamília,equesetratadepessoacomquemhárelacionamentoeconvíviofrequentedorequerido.».
Começando pelo facto provado nº 6, diremos que desta transcrição decorre que quanto às circunstâncias de vida das partes, desde o seu regresso da Bélgica, incluindo a sua vivência e relacionamento diário na habitação comum, a decisão recorrida é taxativa no sentido de que a convicção da Julgadora se fundou no depoimento prestado pela testemunha DD, filho da requerente [que declarou não ter, atualmente, bom relacionamento com o réu]. Não obstante esta relação de parentesco com a requente [e menos bom relacionamento com o requerido], a Mma. Julgadora a acreditou na isenção e veracidade do seu depoimento. E o requerido, ora recorrente, nada refere agora em desabono de tais isenção e veracidade do depoimento da testemunha.
Não há dúvida que aquele facto se reporta ao atual relacionamento diário entre a requerente e o requerido. Por isso, o que dele consta radica no que disse a referida testemunha no decurso do depoimento que prestou na sessão de prova realizada no dia 04.02.2025, no âmbito do incidente em apreço. Disto não há dúvida, nem para o recorrente.
Este parece entender que na fundamentação da matéria de facto considerada provada e não provada a Mma. Julgadora aquo estava obrigada a reproduzir ponto por ponto, facto por facto, o que foi relatado pela dita testemunha na indicada diligência. Mas não é isso que a lei processual exige. O que os nºs 4 e 5 do art. 607º do CPC impõem é que o juiz aprecie livremente as provas [exceto nos casos em que estiver em causa prova vinculada, nos termos indicados na 2ª parte do nº 5] e proceda à análise crítica das mesmas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção. E a análise crítica das provas não se confunde com uma indicação descritiva, nem muito menos com uma reprodução ponto por ponto, ipsisverbis, do que disseram as partes [em declarações de parte], as testemunhas ou outras pessoas ouvidas em produção de prova [segundo AbrantesGeraldes, in RecursosemProcessoCivil, 7ª ed., atual., Almedina, pgs. 359-360, “[a] exigêncialegalimpõequeseestabeleçaofiocondutorentreadecisãosobreosfactosprovadosenãoprovadoseosmeiosdeprovausadosnaaquisiçãodaconvicção,fazendoarespetivaapreciaçãocríticanosseusaspetosmaisrelevantes”, o que significa que, querrelativamenteaosfactosprovados,querquantoaosfactosnãoprovados,ojuizdevejustificarosmotivosdasuadecisão,declarandoporquerazão,semperdadaliberdadedejulgamentogarantidapelamanutençãodoprincípiodalivreapreciaçãodasprovas(…),deumaiscredibilidadeaunsdepoimentosenãoaoutros,julgourelevantesouirrelevantescertasconclusõesdosperitosouachousatisfatóriaounãoaprovaresultantededocumentos”. Em igual sentido, TeixeiradeSousa, in EstudosSobreoNovoProcessoCivil, 2ª ed., Lex, pg. 348, que ensina que “otribunaldeveindicarosfundamentossuficientesparaque,atravésdasregrasdaciência,dalógicaedaexperiência,sepossacontrolararazoabilidadedaquelaconvicçãosobreojulgamentodofactoprovadoounãoprovado”, acrescentando a que a exigência da motivação da decisão “nãosedestinaaobteraexteriorizaçãodasrazõespsicológicasdaconvicçãodojuiz,masapermitirqueojuizconvençaosterceirosdacorreçãodasuadecisão”].
Ora, da transcrição feita resulta que, embora sucinta, a decisão recorrida contém a exigida análise crítica das provas. O que não contém é a reprodução do depoimento integral que a referida testemunha prestou. Mas faz menção do essencial e daí se conclui que o facto provado nº 6 assentou no que essa testemunha relatou.
Não estamos, por isso, perante falta ou insuficiência de fundamentação/motivação atinente ao facto provado nº 6.
Como tal, não ocorre vício enquadrável na previsão da al. b) do nº 1 do art. 615º do CPC [não especificação dos fundamentos de facto que justifiquem a decisão sobre a prova do referido facto provado nº 6, sendo certo que esta falta de fundamentação teria de ser absoluta/total, como defende a jurisprudência maioritária], gerador de nulidade da decisão recorrida, nem se coloca sequer a necessidade de se lançar mão da possibilidade prevista na al. d) do nº 2 do art. 662º do CPC, soluções que, diga-se, o recorrente não invocou.
Caso não tivesse ficado convencido de que a dita testemunha depôs de modo a permitir que o tribunal aquo considerasse como provado o facto em análise, restava-lhe a respetiva impugnação em conformidade com o estabelecido no art. 640º do CPC, ou seja, além de indicar o facto que reputa mal decidido [al. a) do nº 1], devia especificar os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa [al. b) do nº 1] e a decisão que, no seu entender, deveria ser proferida sobre tal ponto [al. c) do nº 1], devendo, ainda, por estar em questão prova oral gravada, indicar com exatidão as passagens da gravação do depoimento da referida testemunha [ou de outras que tivesse por adequadas] em que se funda [al. a) do nº 2].
O recorrente, porém, não alega que a referida testemunha tenha deposto de modo divergente do que foi considerado na decisão recorrida, não indica nem transcreve nenhum segmento do seu depoimento e não especifica – muito menos com exatidão – qualquer passagem da respetiva gravação que possa indiciar que a factualidade do facto provado nº 6 tenha sido erradamente apreciada/decidida. Ou seja, não cumpriu, minimamente, quer o ónus primário da al. b) do nº 1, quer o ónus secundário da al. a) do nº 2, ambos do citado art. 640º.
Limitou-se, pura e simplesmente, a alegar a falta de fundamentação da decisão recorrida relativamente ao aludido facto provado e a sustentar que, por via disso, deveria ser dado como não provado.
Quanto à falta de fundamentação, já concluímos atrás não assistir razão ao recorrente.
Se quis impugnar o facto em questão, a impugnação tem de ser rejeitada por inobservância do ónus primário da al. b) do nº 1 daquele art. 640º, além de também não se mostrar cumprido o ónus secundário da al. a) do nº 2 do mesmo normativo [a Jurisprudência vem sustentando uniformemente que a não observância dos ónus primários das als. a) a c) do nº 1 deste artigo determina a rejeição imediata do recurso na parte relativa à impugnação da matéria de facto, ao passo que o não cumprimento do ónus secundário da al. a) do nº 2 só implicará tal rejeição quando a falta ou inexatidão dificulte gravemente o exercício do contraditório pela parte contrária e/ou o exame da prova pelo tribunal de recurso – neste sentido, i. a., AcórdãosdoSTJde14.03.2024, proc. 8176/21.7TSLSB.L1.S1, de27.02.2024, proc. 2351/21.1T8PDL.L1.S1, de25.01.2024, proc. 1007/17.4T8VCT.G1.S1, de21.03.2023, proc. 296/19.4T8ESP.P1.S1, de13.10.2022, proc. 1700/20.4T8LRS.L1.S1 e de03.10.2019, proc. 77/06.5TBGVA.C2.S2, todos disponíveis in www.dgsi.pt/jstj].
Tudo para concluir que o facto provado nº 6 é de manter nos seus precisos termos.
O recorrente insurge-se também contra o facto provado nº 13, entendendo que deve ser dado como não provado. Como causa para este resultado, invoca, igualmente, falta de fundamentação na decisão recorrida.
Desta resulta que tal facto radicou nos depoimentos das testemunhas EE e, especialmente, DD. E especificou-se ali que esta, embora «nãosabendodescrevercomrigoroespaçodarespetivaresidência,informoucomclarezaqueficalocalizadamuitopróximadahabitação dafamília,equesetrata [a mãe do requerido] depessoacomquemhárelacionamentoeconvíviofrequentedorequerido”.
O que consta daquele facto provado não extravasa esta indicação sucinta do conteúdo do depoimento da testemunha DD.
Não há, por isso, também aqui falta ou insuficiência de fundamentação de tal facto. Pelo que, quanto a ela, não ocorre a nulidade de decisão atrás referenciada, nem há, igualmente, que lançar mão da possibilidade prevista na al. d) do nº 2 do art. 662º do CPC.
Se o recorrente quis impugnar o facto ao abrigo do art. 640º do mesmo Código, devia ter observado o que atrás se deixou indicado, o que não aconteceu. Valem, por isso, aqui as considerações e conclusões atrás expostas a propósito do facto provado nº 6.
Consequentemente, também o facto provado nº 13 se mantém intocado. *
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2.Seháquealterarasoluçãojurídicadecretadadadecisãorecorrida–atribuiçãodoseuusoefixaçãoderenda.
Estamos perante incidente com processo especialíssimo com características idênticas aos processos de jurisdição voluntária, por se nortear, como estes, por critérios de conveniência [e de oportunidade] e não de legalidade, como indica o nº 9 do art. 931º do CPC, o que o aproxima do disposto no art. 987º do mesmo Código [M.TeixeiradeSousa, no Blog do Instituto Português de Processo Civil, a propósito da qualificação da tutela provisória permitida pelo atual nº 9 do art. 931º do CPC, discorda do entendimento (sustentado em vários acórdãos) que aproxima o incidente da figura dos procedimentos cautelares por não se destinar “aacautelaroefeitoútildeumatuteladefinitiva”, designadamente a da atribuição do destino da casa depois do divórcio, além de o critério de conveniência nada ter em comum “comocritériodedecretamentodasprovidênciascautelares”, destinando o regime provisório a vigorar apenas na pendência do processo de divórcio, estando “excluídaqualquernecessidadedeconfirmaçãodatutelaprovisóriaatravésdeumaaçãorespeitanteàtuteladefinitiva” (cf. “https://blogippc.blogspot.com/2017/01/jurisprudencia-541.html?m=1”)].
É certo que o incidente em apreço não se confunde com o processo que está previsto no art. 990º do CPC, pois enquanto incasu está em questão a fixação de um regime provisório de utilização da casa de morada de família para vigorar durante a pendência do processo de divórcio entre o recorrente e a recorrida e até que a partilha dos bens do casal seja efetuada, ali prevê-se a atribuição definitiva (ou da transferência do direito ao arrendamento) da casa de morada de família em consequência ou como efeito do decretamento do divórcio, por remeter para o preceituado no art. 1793º do CCiv..
Mas, apesar disso, o referido regime provisório, além de ser fixado de acordo com o(s) apontado(s) critério(s) de conveniência (e de oportunidade), deverá também ter em conta os princípios estabelecidos no nº 1 do art. 1793º, o que, sem dúvida, aproxima, como começámos por dizer, o regime deste incidente do processo que está previsto no dito art. 990º [com interesse sobre esta problemática, vejam-se os acórdãosdoSTJde26.11.2024, proc. 4188/22.1T8VIS-B.C1.S1, de17.12.2019, proc. 4630/17.3T8FNC-A.L1.S1 e de13/10/2016, proc. 135/12.7TBPBL-C.C1.S1, disponíveis in www.dgsi.pt/jstj, destaRelaçãodoPortode29.09.2022, proc. 17360/21.2T8PRT.P1 e de 05.02.2013, proc. 1164/10.0TMPRT-B.P1 (este relatado pelo aqui relator), disponíveis in www.dgsi.pt/jtrpe da RelaçãodeCoimbrade21.01.2020, proc. 1558/19.6T8CBR.C1, disponível in www.dgsi.pt/jtrc].
Feito este brevíssimo introito, avancemos então.
O recorrente, nas conclusões I a N, alega que não estão provados os pressupostos para atribuição provisória da casa de morada de família à requerente/recorrida e que, pelo contrário, tal direito lhe deve ser conferido a ele.
De acordo com o disposto no nº 9 do art. 931º do CPC, «[e]m qualquer altura do processo, o juiz, por iniciativa própria ou a requerimento de alguma das partes, e se o considerar conveniente, pode fixar um regime provisório (…) quanto à utilização da casa de morada da família (…)».
Por sua vez, o art. 990º nº 1 do mesmo corpo de normas – aplicável por via analógica ao incidente aqui em causa – refere que «[a]quele que pretenda a atribuição da casa de morada de família, nos termos do artigo 1793.º do Código Civil, ou a transmissão do direito ao arrendamento, nos termos do artigo 1105.º do mesmo Código, deduz o seu pedido, indicando os factos com base nos quais entende dever ser-lhe atribuído o direito».
E o art. 1973º do CCiv. [que tem como epígrafe «Casa de morada da família»], estabelece no nº 1 que «[p]ode o tribunal dar de arrendamento a qualquer dos cônjuges, a seu pedido, a casa de morada da família, quer esta seja comum quer própria do outro, considerando, nomeadamente, as necessidades de cada um dos cônjuges e o interesse dos filhos do casal».
Da conjugação destes preceitos resulta que a atribuição provisória da casa de morada de família e um dos cônjuges depende, desde logo, de dois fatores/pressupostos: a atribuição deverá ser feita ao cônjuge que tiver mais necessidade da mesma e em função do interesse dos filhos do casal, havendo-os.
Mas estes não são os únicos fatores a considerar, já que o nº 1 do citado art. 1793º não é taxativo [utiliza a expressão «nomeadamente», antes de referir aqueles dois pressupostos].
A jurisprudência tem apontado outros, também relevantes, embora mantendo a primazia daqueles, tais como os rendimentos de cada cônjuge, o estado de saúde de cada um deles, a idade, a possibilidade de arranjarem trabalho, a (im)possibilidade de um dos cônjuges dispor de outra casa em que possa residir sem beneficiar da mera tolerância de terceiros e o comportamento pretérito dos mesmos no que diz respeito ao cumprimento dos seus deveres conjugais [assim, acórdãosdoSTJde26.11.2024 e de17.12.2019, atrás citados]. E admite que, excecionalmente, a casa possa ser atribuída a ambos os cônjuges quando seja premente a necessidade de ambos e a casa tenha caraterísticas que permitam que funcione como se de duas residências se tratasse, cada uma delas com autonomia física e funcional, de tal modo que permita que cada cônjuge desenvolva uma residência autónoma e independente enquanto perdurar a medida [acórdãodaRelaçãodoPortode29.09.2022, também já atrás indicado].
Na doutrina, PereiraCoelho [in RevistadeLegislaçãoeJurisprudência, ano 122º, 1989-1990, pgs. 137, 138, 207 e 208, citado no acórdão desta Relação acabado de citar] não anda longe deste entendimento ao ensinar que “(…)alei quereráqueacasademoradadafamília,decretadoodivórcioouaseparaçãojudicialdepessoasebens, possaserutilizadapelocônjugeouex-cônjugeaquemformaisjustoatribuí-la,tendoemconta,designadamente,asnecessidadesdeumedeoutro(…).Ora,estecritériogeral,segundonosquerparecer,nãopodeseroutrosenãoodequeodireitoaoarrendamentodacasademoradadafamíliadeveseratribuídoaocônjugeouex-cônjugequemaisprecisedela.(…)Anecessidadedacasa(oua«premência»,comovemadizerajurisprudência;melhorsediriaapremênciadanecessidade)parece-nosser,assim,ofatorprincipalaatender.(…)Naavaliaçãodapremênciadanecessidadedacasadeveotribunalteremconta,emprimeirolugar,justamenteestesdoiselementos,quemaisexpressivamentearevelam(…).Trata-se,quantoà«situaçãopatrimonial»doscônjugesouex-cônjuges,desaberquaisosrendimentoseproventosdeumedeoutro(…).Noqueserefereao«interessedosfilhos»,háquesaberaqualdoscônjugesouex-cônjugesficouapertenceraguardadosfilhosmenores(…).Masojuízosobreanecessidadeouapremênciadanecessidadedacasanãodependeapenasdestesdoiselementos.Haveráqueconsideraraindaasdemais«razõesatendíveis»:aidadeeoestadodesaúdedoscônjugesouex-cônjuges,alocalizaçãodacasarelativamenteaolocaldetrabalhodeumeoutro,ofactodealgumdelesdisporeventualmentedeoutracasaemquepossaestabelecerasuaresidência,etc.” [veja-se, ainda, NunoSalterCid, in Sobreaatribuiçãojudicialprovisóriadodireitodeutilizaracasademoradadafamília, Julgar, nº 40, 2020, pgs. 56-57, que, de modo mais abreviado refere que “[a] fixaçãoderegimeprovisóriorelativoàutilizaçãodacasademoradadafamíliapressupõenaturalmente,emprimeirolugar,aconclusãodequeacasaexiste,sobopontodevistajurídico” e, “[e]msegundolugar,cumpreaveriguarsea‘atribuiçãoprovisóriadacasa’aumdoscônjugeséimperiosaouvivamenteaconselhável,considerandoanecessidademaisprementedessecônjugee/ouointeresseatendíveldosfilhos,sim,massemdesprezaroutrosfactosecircunstânciasquenocasomereçamponderação.”].
É em função destes critérios que há que aferir se a decisão recorrida decidiu bem ou mal ao atribuir a utilização provisória da casa de morada de família à ora recorrida ou se, pelo contrário, a prova recolhida impõe solução diversa, no sentido defendido pelo recorrente.
Começando pelo que se mostra provado com vista ao preenchimento dos dois principais fatores a considerar – quem tem mais necessidade na utilização da casa de morada de família [identificada nos factos provados nºs 4 e 5] e interesse dos filhos –, diremos que as necessidades são inequivocamente mais prementes para a requerente/recorrida do que para o requerido/recorrente. Desde logo porque aquela, além do CC [criança atualmente com oito anos de idade], que é filho dela e deste último, tem ainda a cargo [à sua guarda e cuidado] um outro filho menor, DD [fruto de outro relacionamento], que também reside na casa de morada de família, ao passo que o requerido, de acordo com o regime provisório mais recente fixado no apenso de regulação das responsabilidades parentais, de 28.05.2025, já nem sequer tem a cargo a guarda e cuidados diários daquele seu filho CC, diversamente do que havia inicialmente sido estabelecido no regime provisório de 05.11.2024 [o requerido, atualmente, pode ter consigo o menor em fins de semana alternados e nas férias de Verão durante quinze dias]. Visto do lado das crianças, também o facto de a requerente ter dois filhos menores de quem tem de cuidar, enquanto o requerido só tem um nos períodos de visitas fixados [acabados de referir], faz pender a maior necessidade da casa para o lado daquela, já que a procura de outra habitação com condições mínimas para albergar permanentemente três pessoas [a requerente e os dois filhos menores] é necessariamente mais dispendiosa do que a de uma habitação para uma pessoa a título permanente [o requerido] ou duas pessoas ocasionalmente [o requerido e o filho, quando este estiver consigo nos períodos de visitas].
Depois, quanto aos outros fatores atrás apontados, temos ainda que os proventos do trabalho do requerido são um mais elevados que os da requerente, com a agravante de esta estar atualmente desempregada, por ter chegado ao fim o contrato de trabalho a termo a que esteve vinculada.
E há ainda o facto de a requerente não ter parentes próximos a residir na localidade em que se situa a casa de morada de família ou em zonas limítrofes [todos os seus parentes próximos residem no Algarve], ao passo que o requerido tem um familiar direto [a mãe] que vive nas proximidades e com quem se relaciona, além de, ao que parece, ter também o apoio de uma irmã que se prestou a auxiliá-lo em várias tarefas indicadas do regime provisório fixado em 28.05.2025 no apenso B.
Ora, face a estes fatores [assentes na factualidade provada] apresenta-se evidente que a decisão recorrida, ao atribuir a utilização provisória da casa de família à requerente, ora recorrida, não é merecedora de censura, pois atribuiu-a à parte que dela mais necessita e em benefício também dos interesses dos ditos menores.
Como tal e não tendo o recorrente feito, em devido tempo [já que não deduziu sequer oposição ao incidente em apreço], prova de que «nãoconseguesuportaropagamentoderendamensalnoutrahabitação,nemtampoucocondiçõesparaefetuaropagamentodemetadedocréditohipotecário(…),bemcomonãotemsítioparaonde (possa ir) habitarcondignamentecomoseufilho» [cfr. conclusão K das alegações], a sua pretensão recursória [de lhe ser atribuído a ele o direito de utilizar provisoriamente a casa de morada de família] tem que improceder.
O recorrente insurge-se ainda contra o facto de a decisão recorrida não ter fixado uma contrapartida, a seu favor, pela utilização da casa de morada de família provisoriamente atribuída à recorrida.
Já defendemos [o aqui relator] que a atribuição provisória da casa de morada de família a um dos cônjuges em processo de divórcio implica necessariamente a condenação desse cônjuge a pagar ao outro uma compensação, ainda que não coincidente com a que seria devida a título de renda no âmbito de um contrato de arrendamento [cfr. acórdãodestaRelaçãodoPortode05.02.2013, atrás citado, no qual dissemos que “apesardaatribuiçãoprovisóriadacasademoradadefamílianãoestardiretamentereguladanosarts.1793ºdoCCiv.e1413º (atual art. 990º) doCPC,oSTJ(…)concluique,aindaassim,oregimeprescritonestesnormativoséindiretamenteaplicável(…)àquelescasosdeatribuiçãoprovisória.Nãotanto,(…),napartequealudeaoarrendamento,massimnosegmentoemqueprevêa«compensação»dooutrocônjugecomumarenda”, tendo-se então justificado tal entendimento, afirmando que “afixaçãodestacompensação(…)éfacilmenteentendível,pelomenosemcasos(…),emqueestáemquestãoumbemqueécomumdeambososcônjuges(…),nãofazendosentido beneficiarumdeles(oqueficacomodireitodeutilizarprovisoriamenteacasademoradadefamília)semcompensarooutro(oqueficasemodireitodeautilizar)porseverprivadodousoefruiçãodeumbemquetambéméseu,sendocertoqueentreomomentodaatribuiçãoprovisóriadaquelaeodapartilhadosbenscomunspodedecorrerumperíodomaisoumenoslongo”].
Acontece, porém, que, entretanto, alterámos a nossa posição após a publicação do acórdãodoSTJde13.10.2016 [também já atrás citado] e em função dos ensinamentos que nele se consignaram.
Com efeito, consta do respetivo sumário que: “I.Amedidaprovisóriaecautelardeatribuiçãodacasademoradadefamíliapodeounãocomportar,emfunçãodeumavaloraçãojudicialconcretadascircunstânciasdoscônjugeseatentasasexigênciasdeequidadeedejustiça,afixaçãodeumacompensaçãopecuniáriaaocônjugeprivadodousodaquelebem,pressupondoestaatribuiçãoatítulooneroso,quandodecretada,umaaplicaçãoanalógicadoregimequeestáprevistoparaaatribuiçãodefinitivadacasademoradadefamília.II.Naverdade,aolimitar-seaprescreverapossibilidadedeojuizproferirdecisãoprovisóriaacercadautilizaçãodacasademoradadefamílianapendênciadoprocesso,anormadoart.donº7doart.931ºdoCPCésuficientementeampla,indeterminadaeflexívelparaconsentir,emfunçãodeumavaloraçãoprudencialdascircunstânciaspessoaisepatrimoniaisdoscônjuges,quernumaatribuiçãodobemimóvelatítulogratuito,quernumaatribuiçãoatítulooneroso,fundadaemrazõesdeequidadeejustiça,estabelecidaporanalogiacomoregimequeestálegalmenteprevistoparaaatribuiçãodefinitivadacasademoradadefamília.III.Destemodo,dependendoconstitutivamenteessedireitoaumacompensaçãopelousoexclusivodacasademoradapelooutrocônjugedeumaponderaçãojudicial,casuísticaeequitativa,elesóexisteseojuizotiverefetivamenteatribuídonadecisãooportunamenteproferidasobretalmatéria,nãopodendoserinovatoriamentereconhecidoatravésdaproposituradeaçãoulterior.”.
E na fundamentação de tal douto aresto diz-se, mais desenvolvidamente, o seguinte: “Comoatrássereferiu,ajurisprudênciadasRelaçõestemoscilado,quantoaestaquestão,entreduasvisões,rígidaseextremadas,entendendoumadasorientações,plasmada,porexemplo,noacórdãorecorrido,que(independentementedequalquervaloraçãoouponderaçãoconcretadasituaçãodoscônjugesdissidentes)afixaçãodetalcompensaçãoélegalmenteinadmissível,aopassoqueaoutracorrentejurisprudencialconsideraquetalatribuiçãocompensatóriadeveráternecessariamentelugar,comoformadeobviarauminadmissívelenriquecimentodocônjugeaquemoimóvelfoiprovisoriamenteatribuídoàcustadooutrointeressado. Considera-sequenenhumadestasposiçõesextremadas,assentesfundamentalmentenumaanáliseconceitualdoregimejurídicoemcausa,éadequadaàsexigênciasdeponderaçãoequitativadascircunstânciasdocasoconcreto,especialmenteprementesnocampodadefiniçãoprovisóriadasrelaçõesentreoscônjuges,napendênciadoprocessodedivórcio:naverdade,aformulaçãolegal–aolimitar-seaprescreverapossibilidadedeojuizproferirdecisãoprovisóriaacercadautilizaçãodacasademoradadefamílianapendênciadoprocesso-ésuficientementeampla,indeterminadaeflexívelparaconsentir,emfunçãodeumavaloraçãoprudencialecasuísticadascircunstânciaspessoaisepatrimoniaisdoscônjuges, quernumaatribuiçãodobemimóvelatítulogratuito,quernumaatribuiçãoatítulooneroso;noprimeiro caso,ojulgadorentenderáque,peranteoresultadodetalponderaçãocasuística,avantagemauferidapelocônjugebeneficiáriocomousoexclusivodoimóvelnãojustificaaatribuiçãodeumacontrapartidapatrimonialaooutrocônjuge,privadotemporariamentedousodobem;nasegundasituação,podeojuiztemperartalatribuiçãoexclusivacomaimposiçãodaobrigaçãodopagamentoaooutrocônjugedeumacontrapartidaeconómica,fundadaemrazõesdeequidadeejustiça,aproximando-se,nestecaso,aomenosporanalogia,doregimedearrendamentoqueestálegalmenteprevistoparaaatribuiçãodefinitivadacasademoradadefamília. (…) Talsignifica,comoéevidente,queouso,individualeexclusivo,dobempelocônjugeaquemomesmofoijudicialmenteatribuídoélícito,encontrandoaindacausaousuporteprecisamentenaditadecisão,ouseja,nahéterocomposiçãodeinteressesqueamesma-injuntivamente–contém.Masacircunstânciadenãoexistirefetivamenteumasituaçãoderesponsabilidadecivildobeneficiáriodaatribuiçãooudeenriquecimentosemcausadestenãosignificaquesedevaafastaremabsolutoapossibilidadede,porexigênciasdejustiçaeequidade,faceàscircunstânciasconcretasdavidadoscônjuges,talatribuiçãoexclusivapodersertemperadacomacompensação,noplanopatrimonial,dooutrocônjuge,privadodousoreferidoimóvele,porisso,eventualmenteobrigadoasuportaroutrasdespesasouincómodosgravescomoestabelecimentodasuaresidência,atéàpartilhadosbens… Saliente-sequenosmovemosnocampodasdecisõesprovisóriasecautelares,emquesempreseentendeuqueojulgadordispõedeamplaspossibilidadesdevaloraçãoconcretaeflexíveldosinteressescontrapostos,bemexpressas,porexemplo,nanormaconstantedoart.376º,nº3,doCPC,aoprescreverque–emsededeprocedimentoscautelares–ojuiznãoestásujeitoàprovidênciaconcretamenterequerida,podendodecretaraqueserevelemaiseficazeadequadaàtuteladodireitoeàprevençãodopericuluminmora. Interpreta-se,pois,anormaconstantedonº7 (agora nº 9, após a alteração introduzida pela Lei nº 3/2023, de 16.01) doart.931ºdoCPCnosentidodeamedidaprovisóriaecautelardeatribuiçãodacasademoradadefamíliapoderounãocomportar,emfunçãodeumavaloraçãojudicialconcretadascircunstânciasdoscônjugeseatentasasexigênciasdeequidadeedejustiça,afixaçãodeumacompensaçãopecuniáriaaocônjugeprivadodousodaquelebem,pressupondoestaeventualatribuiçãoatítuloonerosoumaaplicaçãoanalógicadoregimequeestáprevistoparaaatribuiçãodefinitivadacasademoradadefamília. Destaconfiguraçãonormativa(…)decorreque (o) (…)direitoaumacompensaçãopatrimonialpressupõenecessariamente,emtermosconstitutivos,aformulaçãodeumjuízoequitativo,emqueojulgador,ponderadasascircunstânciasconcretasdavidadoscônjugeseporimperiosasrazõesdejustiçamaterial, consideraqueoequilíbriodosinteressesemconfrontosósesatisfazcomaimposiçãoaobeneficiáriodautilizaçãodoimóveldeumacontrapartidaportalusoexclusivo(…)”.
Lendo as referências feitas aos procedimentos cautelares como sendo antes reportadas aos processos de jurisdição voluntária [atentas as críticas apontadas por TeixeiradeSousa a que atrás fizemos menção], também entendemos agora que a fixação de uma compensação a cargo do cônjuge que beneficia da atribuição provisória da casa de morada de família, e a favor do outro cônjuge, depende das circunstâncias do caso concreto, em particular, das exigências de equidade e de justiça que este impuser com base nas circunstâncias da vida dos cônjuges e no equilíbrio dos interesses em confronto [é, aliás, esta a orientação que atualmente predomina na Jurisprudência, como se afere do decidido, entre outros, nos acórdãosdestaRelaçãodoPortode 29.09.2022 e daRelaçãodeCoimbrade21.01.2020, atrás citados].
Ora, no caso dos autos são várias as circunstâncias que impedem a fixação da compensação pretendida pelo recorrente.
À cabeça surge o facto deste não ter deduzido oposição ao incidente, nada tendo, por isso, alegado [para depois provar no momento processual próprio] com vista a demonstrar a necessidade de fixação de tal compensação [necessidade esta reportada a ele próprio] e a possibilidade de a requerente, ora recorrida, a suportar. Aliás, não sendo agora defensável que o juiz tenha obrigatoriamente que fixar uma compensação pela referida atribuição provisória [ainda que não requerida pelas partes] e não tendo esta questão [da fixação de compensação] sido suscitada pelo requerido na fase da tramitação do incidente na 1ª instância, até à prolação da decisão recorrida, sempre haveria de considerar-se que estamos perante questão nova, só agora invocada em sede recursória e que, como tal, por não ser de conhecimento oficioso, estaria fora do conhecimento deste tribunal de recurso, não podendo ser aqui atendida.
Depois – ainda que não se tratasse de questão nova e dela pudéssemos conhecer –, porque se mostra provado que a requerente está desempregada, a receber subsídio de desemprego inferior ao salário mínimo nacional, tem a cargo dois filhos menores [desconhecendo-se se um deles, o DD, está a beneficiar de alimentos do respetivo progenitor] e está obrigada [conforme se decidiu na decisão recorrida] a pagar metade da prestação mensal relativa ao empréstimo concedido para aquisição da casa de morada de família e a totalidade dos encargos relativos ao fornecimento de água, eletricidade, gás, telecomunicações e televisão a cabo.
Por isso, a decisão recorrida também não é merecedora de censura nesta parte. Há, assim, que julgar o recurso totalmente improcedente.
As custas deste recurso ficam a cargo do recorrente, face ao total decaimento nesta 2ª instância -arts. 527º nºs 1 e 2, 607º nº 6 e 663º nº 2 do CPC..
Nestes termos, os Juízes desta secção cível do tribunal da Relação do Porto acordam em: 1º) Julgar o recursoimprocedente e, em consequência, confirmaradecisãorecorrida. 2º) Condenar o recorrente nas custas do recurso, pelo decaimento.
Porto, 2025.07.10
Pinto dos Santos
Rodrigues Pires
Artur Dionísio Oliveira