INJUNÇÃO
RECONVENÇÃO
ADMISSIBILIDADE
Sumário

Sumário ([1]):
I – O processo de injunção, face à simplificação exigida, não comportará reconvenção, se atendermos apenas ao texto do D.L. 269/98, de 01.09, nomeadamente ao disposto nos seus artºs. 1, nº 3, 3, 4, 16, nº 1 e 17, nº 1. Mas, face ao disposto no artº 549, nº 1 do CPC, a nossa ordem jurídica não só não proíbe, como admite, que um processo especial que começou por ser de injunção simplificado, siga como processo declarativo comum, admitindo esta nova forma, a reconvenção deduzida.
II - Havendo fundamentos para em sede de defesa, se perfilar a existência de uma acção cruzada do primitivo réu contra o primitivo autor, faz todo o sentido que, se aproveitem os recursos existentes, ainda que se tenha que alterar o valor do processo e a competência do juízo, para dirimir um litigio único. O contrário, poderia levar até à prolação de decisões contraditórias, em dois tribunais distintos, quando, o que está em causa, são duas faces do mesmo conflito.
III - Com as alterações introduzidas ao novo CPC privilegiou-se a obtenção de uma justiça material e não formal, o que decorre dos princípios de gestão e adequação a que aludem os artºs 547 e 6 do CPC.
IV - De igual modo, este entendimento é o que se adequada mais aos princípios da economia processual e igualdade das partes (artºs 130 e 4º do CPC).
V - A ser assim, aceita-se a admissibilidade plena da reconvenção, desde que se respeitem os requisitos gerais do art. 266 do CPC, pois esta é a posição que melhor concretiza os princípios de gestão processual e adequação formal e, assegura igualdade entre as partes e uma solução de mérito que evite o fracionamento da discussão em duas ações distintas.

[1] Por mim elaborado, enquanto relatora, cfr. art.º 663º nº 7 do Código de Processo Civil

Texto Integral

Acordam as Juízes na 8ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

I – RELATÓRIO
Shinefix, Ld.ª, apresentou requerimento de injunção contra ………….. peticionando a condenação no pagamento de € 9.587,61 de capital, acrescido de juros vencidos e vincendos, alegando para tanto um contrato de empreitada celebrado entre as partes, tendo a autora prestado serviços no valor total de € 33.114,61 e a ré pago a quantia de € 23.527,00.
Citada, a ré apresentou oposição, excecionando a ineptidão do requerimento de injunção por falta de causa de pedir, mais tendo excepcionado o não cumprimento.
Na oposição, deduziu ainda, separadamente, pedido reconvencional, peticionando a condenação da autora no pagamento à ré da quantia de € 14.190,99, referente a obras para reparação de defeitos e obras não realizadas pela autora, mais tendo peticionado “em alternativa (…) o acerto de contas entre o valor peticionado (…) e este valor ou ainda em substituição ser reduzido o valor peticionado no RI e realizadas as obras de correcção e as que não foram efectuadas”.
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Em 24.0.2025, foi proferido despacho que não admitiu a reconvenção, julgou improcedente a excepção de ineptidão da PI e agendou audiência de julgamento.
Consta do referido despacho o seguinte:
“Veio a ré (…) oferecer o requerimento de ref.ª 41515483 em que, no que respeita à reconvenção, peticiona a condenação da autora no pagamento de determinada quantia, que quantifica, referente ao custo que alega ter de suportar adicionalmente para reparação dos defeitos na obra que executada pela autora. Peticiona, subsidiariamente, e caso venha a ser condenada, a condenação da autora no pagamento integral do valor que corresponde ao custo com a reparação dos defeitos na obra.
(…) Os presentes autos, com início em procedimento de injunção a que a ré se opôs, seguem a forma de processo especial prevista no regime anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de setembro, que não prevê a possibilidade de o réu deduzir reconvenção.
Nos termos do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 266.º do Código de Processo Civil, a reconvenção é admitida quando o réu pretende o reconhecimento de um crédito, seja para obter a compensação seja para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado excede o do autor, significando que a compensação de créditos exige a dedução de reconvenção.
Coloca-se então a questão de saber se, na ação declarativa especial em que se transmuta o procedimento de injunção pode o réu invocar a compensação de créditos, ou seja, se pode deduzir
reconvenção com esse fim.
Não sendo unânime a resposta que tem sido dada pela jurisprudência superior, e estando em presença, essencialmente, de um lado os princípios da economia, simplificação e celeridade
processual que norteiam o regime das ações declarativas especiais para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato e, de outro lado, o princípio de igualdade das partes e da paridade de armas, é entendimento do tribunal que a resposta à questão da admissibilidade da reconvenção na presente forma especial dependerá dos exatos contornos do caso.
Com efeito, tratando-se de invocação de contracrédito com os mesmos contornos do crédito primitivo, isto é, que admitisse ser exigido com recurso à ação declarativa especial, o princípio da
economia processual e da prevalência da substância sobre a forma permitem que, numa mesma ação, as partes possam discutir as suas pretensões recíprocas, vendo dirimida, numa única ação judicial, as suas diferentes relações.
Já porém, se o alegado contracrédito não for relativo a obrigação pecuniária emergente de contrato, não será de admitir a sua invocação. Com efeito, se nada obsta a que, no mesmo processo sejam discutidas diferentes obrigações pecuniárias com fonte contratual já não será de admitir que na ação declarativa especial sejam discutidas outras fontes obrigacionais, ainda que de obrigações pecuniárias se tratem.
Com efeito, a especial simplicidade da ação declarativa especial não se compadece com a apreciação de questões diferentes do cumprimento ou incumprimento de obrigação pecuniária de fonte contratual – tendo vindo a ser reconhecido pela jurisprudência superior que as ações especiais para cumprimento de obrigação pecuniária emergente de contrato se destinam ao conhecimento das obrigações pecuniárias emergentes de contrato em sentido estrito, por oposição às obrigações de valor, que não têm originariamente por objecto quantias pecuniárias, mas prestações de outra natureza, intervindo o valor pecuniário apenas como meio de liquidação (Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 15 de outubro de 2015, rel. Teresa Albuquerque).
No caso vertente, atendendo ao teor da reconvenção deduzida, conclui-se que a ré pretende ver reconhecido um crédito por incumprimento contratual, não sendo o incumprimento referente a obrigação pecuniária em sentido estrito, antes surgindo a obrigação pecuniária reclamada como meio de liquidação do alegado dano resultado do alegado incumprimento.
Assim, trata-se de crédito que não pode ser discutido em ação especial. Pelo exposto, não admito reconvenção apresentada.”
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Recorreu a Ré desta decisão, apresentando os argumentos sintetizados nas respectivas conclusões, que seguem:

“1. A ação teve origem em injunção apresentada pela Apelada (Shinefix, Lda.) que peticiona o pagamento de € 9.587,61 relativos a trabalhos prestados ao abrigo de contrato de empreitada celebrado entre as partes.
2. A Recorrente deduziu oposição, invocando o incumprimento contratual pela Autora, nomeadamente: abandono da obra, vícios de execução, defeitos técnicos, omissão de trabalhos contratados e danos decorrentes da impossibilidade de explorar o imóvel para alojamento local.
3. Deduziu igualmente pedido reconvencional, com fundamento no incumprimento definitivo do contrato, peticionando: a condenação da Autora no pagamento de € 14.190,99 (ou, em alternativa, € 4.602,39); a realização de avaliação técnica (art. 1222.º, n.º 2 CC); a compensação entre créditos.
4. O presente recurso tem por objeto o despacho de 24.04.2025, que não admitiu a reconvenção deduzida pela recorrente em sede de oposição à injunção, com fundamento em alegada inadmissibilidade da reconvenção na ação especial para cumprimento de obrigação pecuniária emergente de contrato.
5. A reconvenção deduzida pela Recorrente fundamenta-se no mesmo contrato de empreitada que serve de base ao pedido da Autora, visando a condenação desta no pagamento de € 14.190,99, a título de custos com a correção de defeitos e conclusão da obra contratada, ou, subsidiariamente, o acerto de contas.
6. A decisão recorrida entendeu, no entanto, que o crédito reconvencional não configuraria obrigação pecuniária em sentido estrito, mas antes uma obrigação de valor, e, por isso, inadmissível no âmbito da ação especial.
7. Tal entendimento assenta numa interpretação formalista e excessivamente restritiva do conceito de obrigação pecuniária emergente de contrato, contrariando a letra e o espírito do artigo 10.º do DL 269/98 e do artigo 266.º do CPC.
8. A jurisprudência maioritária e consolidada admite a reconvenção em ações especiais desde que o crédito invocado tenha natureza pecuniária e resulte do mesmo contrato da ação principal.
9. O crédito invocado pela Recorrente é pecuniário, certo, exigível, contratual e diretamente emergente do incumprimento da prestação da autora, devendo por isso ser admitido no presente processo.
10. A reconvenção deduzida visa, em substância, a compensação entre créditos reciprocamente exigíveis, ao abrigo do artigo 847.º do Código Civil.
11. O próprio tribunal a quo havia admitido, em despacho anterior, a possibilidade de admissibilidade da reconvenção, tendo inclusive convidado a Ré ao aperfeiçoamento do pedido, o que foi feito nos termos solicitados.
12. A decisão recorrida viola ainda os princípios da economia processual, da celeridade, da efetividade da tutela jurisdicional e da igualdade das partes.
13. Impor à Ré a instauração de ação autónoma para discutir matéria que deriva do mesmo contrato de empreitada fraciona desnecessariamente o litígio, onera as partes e contradiz a matriz simplificada da ação especial.
14. A inadmissibilidade da reconvenção nestes termos não encontra suporte legal nem jurisprudencial e prejudica gravemente o direito de defesa da Recorrente.
15. Por tudo o exposto, deve ser revogada a decisão recorrida e substituída por outra que admita a reconvenção deduzida, permitindo o conhecimento e apreciação do crédito da Ré no presente processo. 16. Ainda, decisão recorrida violou o artigo 266.º, n.º 1, al. c) do CPC (admissibilidade da reconvenção); O artigo 10.º do DL 269/98 (interpretação extensiva da natureza contratual do crédito); violou ainda os princípios da economia processual, da efetividade, celeridade e da igualdade das partes.”
Termina, solicitando que seja dado provimento ao seu recurso e que, a decisão recorrida seja revogada, sendo substituída por outra que contemple as conclusões atrás aduzidas.
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A recorrida contra-alegou, concluindo do seguinte modo:
“A. Os presentes autos iniciaram-se com a apresentação de requerimento de injunção, ao abrigo do disposto no Decreto-Lei 269/98, de 01.09.
B. A ora Recorrente deduziu oposição, o que determinou que os autos fossem apresentados a distribuição, passando a aplicar-se, com as necessárias adaptações, o regime instituído nos artigos 1º n.º 4, 3º e 4º do Decreto-Lei 269/98, de 01.09, conforme decorre dos artigos 16º n.º 1 e 17º n.º 1 do mesmo diploma.
C. Conjuntamente com a sua oposição, a Recorrente deduziu o seguinte pedido reconvencional:
«Nestes termos e nos melhores de direito, sempre com o douto suprimento de V.Exa, deve a presente Reconvenção ser julgada procedente por provada e em consequência ser o A. condenado no pedido reconvencional, devendo este ser condenado no pagamento de €14.190,00 referente a obras de correcção de defeitos e obras por realizar, ou em alternativa ser efectado o acerto de contas entre o valor peticionado o RI e este valor ou ainda em substituição ser reduzido o valor peticionado no RI e realizadas as obras de correcção e as que não foram efectuadas.»
D. Antes de se pronunciar quanto à concreta admissibilidade da reconvenção deduzida, o Tribunal a quo convidou a Recorrente a proceder ao seu aperfeiçoamento, clarificando e detalhando os pedidos reconvencionais formulados, mais esclarecendo se eram alternativos ou subsidiários, e clarificando o valor que atribuía à reconvenção.
E. Na sequência de tal convite, a Ré apresentou nova reconvenção, que concluiu como segue: «Nestes termos e nos melhores de direito, sempre com o douto suprimento de V. Exa., deve a presente Reconvenção ser julgada procedente por provada e em consequência ser a Autora condenada no pedido reconvencional, devendo o tribunal reconhecer e declarar a resolução do contrato por incumprimento definitivo da Autora, nos termos do artigo 428.º e ss do CC, e em consequência ser a Autora condenada no pagamento da diferença\acerto de contas entre o valor peticionado de €9.857,61 (valor que a Ré já contava gastar com a conclusão e pagamento final das obras) e o valor de €14.190,00 (referente a obras de correcção de defeitos e obras por realizar), conforme resulta do Relatório apresentado sob o doc. 1, o que se cifra no valor de €4.602,39 (prejuízo da Ré), devendo a Autora ser condenada no pagamento desta quantia;
Pedido Alternativo: Caso este tribunal, o entenda necessário, seja realizada uma avaliação técnica à obra, para apurar com precisão o custo das reparações e obras não realizadas, bem como correção dos defeitos, com posterior decisão sobre o ajuste de valores, nos precisos termos do artigo 1222º, n.º 2 do CC.
Pedido Subsidiário: Ou caso V. Exa. assim não entenda, e venha a Ré a ser condenada no pagamento do RI, como pedido subsidiário, Requer-se a V. Exa., de acordo com o artigo 1219.º e 1225.º, n.º 1 ambos do Código Civil a responsabilidade pelos defeitos e obras não concluídas são da responsabilidade da Autora, devendo esta ser condenada ao pagamento de €14.190,99.»
F. De acordo com a jurisprudência mais recente dos tribunais superiores, nomeadamente do Tribunal da Relação de Lisboa, no procedimento de injunção e no âmbito do processo especial para cumprimento de obrigações pecuniárias em que o pedido é inferior a 15.000,00€, a dedução de reconvenção não é, em circunstância alguma, admissível.
G. Mesmo quem, em abstrato, admite a possibilidade de haver pedido reconvencional no âmbito da ação especial para o cumprimento de obrigações pecuniárias, entende também que o juiz terá, em cada caso, de avaliar o preenchimento dos requisitos vertidos no n.º 2 do art. 266º do CPC e, mais do que isso, ponderar se deve autorizar a sua dedução, nos termos do art. 266º, n.º 3 do CPC.
H. Quando o legislador do Decreto-Lei 269/98, de 01.09, usa a expressão “obrigações pecuniárias emergentes de contratos” está a referir-se aos tipos contratuais cuja prestação principal, a cargo do devedor, consiste numa obrigação pecuniária de quantidade (ou de soma), isto é, dívidas em dinheiro, afastando as obrigações pecuniárias de valor.
I. Nas dívidas de dinheiro a prestação pecuniária é a prestação devida, sendo que, nas dívidas de valor, a prestação pecuniária é uma prestação substitutiva da prestação devida.
J. O pedido reconvencional apresentado pela Recorrente tem a natureza de pretensão indemnizatória decorrente de alegado incumprimento contratual e não a exigência de cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes daquele mesmo contrato.
K. Tal pretensão nunca poderia ser deduzida em processo injuntivo ou em procedimento especial destinado a exigir cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a 15 000,00 €.
L. Ou seja, caso a Recorrente pretendesse acionar a Recorrida, de forma a exercer o seu alegado direito indemnizatório, nunca o poderia fazer no quadro dos processos especiais aprovados pelo Decreto-Lei n.º 269/98.
M. Atendendo a que a Recorrente pretendia ver reconhecido um crédito que não pode ser discutido no âmbito do regime da ação especial para o cumprimento de obrigações pecuniárias, ainda que, em abstrato, se admitisse a possibilidade de dedução de reconvenção no âmbito deste procedimento, jamais poderia o Tribunal a quo admitir a reconvenção apresentada neste caso concreto.”
Terminou, pugnando pela improcedência do recurso.
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O recurso foi admitido como sendo de apelação, com subida imediata, em separado e com efeito meramente devolutivo.
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Nada obsta ao conhecimento do mérito do recurso.
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Foram colhidos os vistos legais.
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São as conclusões formuladas pela recorrente que delimitam o objeto do recurso, no tocante ao desiderato almejado por aquele, bem como no que concerne às questões de facto e de direito suscitadas, conforme resulta das disposições conjugadas dos arts. 635º, n.º 4 e 639º, n.º 1 do CPC.
Esta limitação dos poderes de cognição do Tribunal da Relação não se verifica em sede de qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cfr. art. 5º n.º 3 do CPC)[1].
Por outro lado, não pode o Tribunal de recurso, conhecer de questões que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas[2].
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2. Do objecto do recurso
Questão a decidir: da admissibilidade de reconvenção em processo de injunção.
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II – FUNDAMENTOS
2.1. Fundamentos de facto
A factualidade que interessa na apreciação do presente recurso mostra-se vertida no relatório que antecede.
2.2. Fundamentos de direito
O ponto em discussão que cumpre decidir, é o da admissibilidade da reconvenção em processo de injunção.
Várias decisões evidenciam posições jurisprudenciais divergentes quanto à admissibilidade da reconvenção em processos de injunção de valor não superior a € 15.000,00.
De um lado, entende-se que a ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato (regulada no anexo ao DL n.º 269/98, de 1 de Setembro) e a sua tramitação simplificada não comportam a dedução de um pedido reconvencional, sobretudo porque tal implicaria a apresentação de réplica e a convocação de formalismos processuais que a lei pretende evitar.
Num outro sentido, há entendimentos intermédios que defendem a possibilidade de invocar a compensação meramente enquanto excepção peremptória, desde que não se pretenda o reconhecimento de crédito excedente ao do autor e sem que daí decorra um alargamento do objeto do litígio incompatível com as fases processuais reduzidas.
Por fim, surgem acórdãos sublinhando que, não obstante a exigência do art. 266.º, n.º 2, al. c), do Código de Processo Civil — segundo a qual a compensação exige reconvenção —, nessas ações seria preferível admitir a reconvenção sempre que os poderes de adequação formal permitissem acomodar a discussão dos pedidos sem prejuízo da celeridade pretendida.    
São assim, três, as posições que têm sido defendidas pela jurisprudência portuguesa, sobre o tema em análise.
De seguida, elencam-se, exemplificativamente, alguns dos acórdãos consultados[3] que expressam os mencionados entendimentos:
1) No sentido da Inadmissibilidade da reconvenção:
Nesta linha, entende-se que a forma de processo especial não comporta a dedução de reconvenção, por implicar um terceiro articulado (réplica) e outras formalidades que frustrariam a simplificação pretendida pelo legislador:
- Acórdão do TRE de 08.02.2018 (Processo nº 96889/16.5YIPRT.E1), relatado pelo Sr. Desembargador Silva Rato, no qual se decidiu que:
“I - O legislador do NCPC, ao introduzir a redacção plasmada na alínea c), do n.º2 do art.º 266º, teve por fito pôr termo à controvérsia jurisprudencial e doutrinária sobre a questão da admissibilidade da compensação por via de excepção, nos casos em que o valor da mesma fosse inferior ao do pedido do autor, optando por estabelecer que a compensação só pode operar por via reconvencional, independentemente do seu valor ser inferior ou não ao pedido formulado pelo autor.
II - Não sendo admissível a compensação, por via de excepção, nos casos em que a vontade de compensar só é manifestada na contestação, também não é admissível a dedução da compensação por via de excepção, nos casos em que a manifestação de vontade de compensar operou por via extrajudicial, nos termos do art.º 848º do Cód. Civ., uma vez que, “limitando-se a sentença (de mera apreciação) a verificar a ocorrência dos respectivos requisitos materiais, não há diferença substantiva que justifique um regime processual distinto num e noutro caso.”(autor e obra citados).
III - No âmbito Acção Declarativa Especial para Cumprimento de Obrigações Pecuniárias Emergentes de Contratos, destinada a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a € 15.000,00, regulada pelo Decreto-Lei 269/98, de 01 de Setembro e respectivo Anexo, não sendo admissível a dedução de reconvenção, não pode o réu fazer operar, por via de excepção, a compensação de crédito de valor inferior ao peticionado pelo autor, por legalmente inadmissível
IV - Estando na disponibilidade do réu a possibilidade de intentar acção judicial para ver reconhecido o seu crédito sobre o autor, a interpretação acima plasmada não viola o disposto no art.º 20º da Constituição.”
- Acórdão do TRE de 30.05.2019 (Processo nº 81643/18.8YIPRT-A.E1), relatado pela Srª. Desembargadora Isabel Imaginário, no qual se decidiu que:
“I - A forma de processo aplicável na sequência da dedução de oposição no procedimento de injunção para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de transações comerciais determina-se pelo valor da dívida ou do pedido;
II - Aplica-se a forma de processo comum, se está em causa injunção destinada à cobrança de dívida fundada em transação comercial com valor superior a € 15.000,00, e a forma de processo especial prevista no DL nº 269/98, se está em causa injunção destinada à cobrança de dívida de valor não superior a € 15.000,00;
III - Não é admissível a reconvenção em sede de oposição no procedimento de injunção destinado à cobrança de dívida de valor não superior a € 15.000,00.”
- Acórdão do TRP de 21.06.2021 (Processo nº 83857/20.1YIPRT-A.P1), relatado pelo Sr. Desembargador Pedro Damião e Cunha, no qual se decidiu que:
“I - Nas acções especiais para cumprimento de obrigações pecuniárias reguladas no anexo do DL nº269/98, de 01.09., não é admissível a dedução de pedido reconvencional, nos termos do art. 266º, nº 2 do CPC, em face: do escopo dos procedimentos especiais para cumprimento de obrigações pecuniárias ser o de conferir força executiva aos requerimentos iniciais (art. 7º e 2º do anexo do diploma); da acção especial apenas dispor de dois articulados, seguidos da audiência de julgamento (arts. 3º e 4º do anexo do diploma), que exclui a possibilidade de apresentação de réplica, nos termos do art. 584º do CPC da acção comum.
II - Nestas acções especiais não pode vir a ser admitida a reconvenção, também: nem pela via da norma remissiva do art. 549º, nº 1 do CPC, uma vez que não existe lacuna da lei na tipificação do regime processual da acção especial; nem por força da adequação formal, nos termos dos arts. 6º e 547º do CPC, uma vez que a referida adequação não serve para resolver de forma estrutural a possibilidade de dedução de pedidos reconvencionais nas acções especiais limitadas a dois articulados, sempre que os réus nas mesmas tivessem vontade e fundamento para formular um pedido reconvencional, nos termos do art. 266º, nº 2 do CPC.”
2) No sentido da admissibilidade restrita (compensação apenas como excepção peremptória, sem pedido reconvencional):
Entende-se que a compensação, para o réu, é um importante meio de defesa e pode ser alegada como excepção peremptória, sem deduzir reconvenção (não se ampliaria o objeto do litígio para além do crédito que o autor reclama).
- Acórdão do TRG de 13.06.2019 (Processo nº 107776/18.0YIPRT-C.G1), relatado pelo Sr. Desembargador Alcides Rodrigues, no qual se decidiu que:
“I – A injunção inicial, de valor inferior a metade da alçada da Relação, após a distribuição e por virtude da oposição deduzida, segue os termos da ação declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos (arts. 3.º a 5.º do Dec. Lei n.º 269/98 e art. 10.º, n.º 4 do Dec. Lei n.º 62/2013).
II - A simplificada tramitação processual legalmente estabelecida para a ação em causa não se compatibiliza com a admissibilidade de formulação de qualquer pedido reconvencional, nomeadamente para fazer atuar a compensação-reconvenção.
III - Não sendo admissível reconvenção, é de admitir a defesa por invocação da exceção perentória de compensação, a fim de não coartar ao réu um meio de defesa importante e eficaz.”
- Acórdão do TRG de 05.11.2020 (Processo nº 9426/20.2YIPRT-A.G1), relatado pela Srª. Desembargadora Lígia Venade, no qual se decidiu que:
“I –No procedimento de injunção distribuído como ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias ao abrigo do Decreto-Lei nº. 269/98 de 1/9, o valor a atender para se aferir da admissibilidade da reconvenção é o do pedido, sendo esse o que norteia a distribuição do procedimento em que é apresentada oposição.
II –Nessas ações deve compatibilizar-se a vertente adjetiva com a realização do direito substantivo, de modo a que prevaleça ou se alcance a realização da justiça material.
III- As razões de celeridade e simplicidade que orientaram aquele diploma não ficam prejudicadas com a admissibilidade de ser invocada a compensação como exceção perentória.”
- Voto de vencido no Acórdão do TRG de 06.02.2025 (Processo nº 123527/23.5YIPRT-A.G1), apresentado pela Srª. Desembargadora Maria Amália Santos, que perfilhou o seguinte entendimento:
“(…) Vem o recurso interposto da decisão recorrida que considerou que as ações declarativas especiais para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato - como é o caso da presente ação -, comportam unicamente dois articulados: o requerimento inicial e a oposição, não sendo admissíveis quaisquer outros articulados para além destes.
E que neste conspecto, resulta desde logo inadmissível a dedução de pedido reconvencional, por inexistir um terceiro articulado (a Réplica) onde a requerente possa pronunciar-se sobre tal pedido.
Compreende-se, na versão do julgador, a opção do legislador, atenta a natureza especialmente célere e a tramitação simplificada dos presentes autos, pelo que se conclui pela não admissão da reconvenção deduzida pela requerida.
Insurge-se a recorrente contra tal decisão, argumentando, no essencial, que o entendimento perfilhado pelo tribunal recorrido afronta os princípios da economia processual e da celeridade, na medida em que obsta a que, numa só ação, se decidam duas pretensões, que assentam em factualidade comunicante e intimamente relacionada, e que poderia a julgadora ter lançado mão dos seus soberanos poderes de gestão processual e adequação formal, para adaptar a tramitação processual do tipo de ação em presença, às especificidades da causa.
Mas não podemos concordar com a recorrente.
Fazendo um enquadramento legal da questão, constatamos que a presente ação é uma Ação Especial para Cumprimento de Obrigações pecuniárias (AECOP), tramitada nos termos previstos no DLei n.º 269/98, de 1.9., na sequência da apresentação pela requerente de um procedimento de Injunção no Balcão Nacional de Injunções.
Efetivamente, o DL n.º 269/98, de 1 de setembro aprovou o regime dos procedimentos para cumprimento de obrigações pecuniárias, prevendo-se no seu artigo 7.º que «Considera-se injunção a providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações a que se refere o artigo 1.º do diploma preambular, ou das obrigações emergentes de transações comerciais abrangidas pelo Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17 de fevereiro».
Este procedimento traduz-se num mecanismo processual conferido ao credor de obrigação pecuniária emergente de contrato, de montante não superior a quinze mil euros (ou de transação comercial para os efeitos do decreto-lei n.º 32/2003, de 17 de fevereiro, sem qualquer limite quanto ao montante do crédito), a fim de lhe permitir, de modo mais célere, a obtenção de um título executivo que lhe faculte o acesso direto à ação executiva.
Efetivamente, o artigo 1.º do diploma preambular (DL n.º 269/98, de 1.09) reporta-se ao “regime dos procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a (euro) 15.000”.

O n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 62/2013, de 10 de maio (para o qual se considera atualmente feita a remissão prevista no art.º 7.º do DL 269/98, de 1/09, face ao disposto no artigo 13.º do DL 62/2013, de 10/05), define, por sua vez, o âmbito de aplicação daquele diploma, a “pagamentos efetuados como remuneração de transações comerciais”, excluindo o n.º 2 desse âmbito normativo: “a) Os contratos celebrados com consumidores; b) Os juros relativos a outros pagamentos que não os efetuados para remunerar transações comerciais; c) Os pagamentos de indemnizações por responsabilidade civil, incluindo os efetuados por companhias de seguros”.
A alínea b) do artigo 3.º do citado DL 62/2013, de 10/05, define “transação comercial”, como «uma transação entre empresas ou entre empresas e entidades públicas destinada ao fornecimento de bens ou à prestação de serviços contra remuneração».
Finalmente, o artigo 10.º do mesmo diploma legal (DL 62/2013, de 10/05), estabelece o seguinte regime de “Procedimentos especiais”: “1- O atraso de pagamento em transações comerciais, nos termos previstos no presente diploma, confere ao credor o direito a recorrer à injunção, independentemente do valor da dívida. 2 - Para valores superiores a metade da alçada da Relação, a dedução de oposição e a frustração da notificação no procedimento de injunção determinam a remessa dos autos para o tribunal competente, aplicando-se a forma de processo comum. 3 - Recebidos os autos, o juiz pode convidar as partes a aperfeiçoar as peças processuais. 4 - As ações para cumprimento das obrigações pecuniárias emergentes de transações comerciais, nos termos previstos no presente diploma, seguem os termos da ação declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos quando o valor do pedido não seja superior a metade da alçada da Relação» (realce nosso).
Decorre assim dos dispositivos legais citados, que o procedimento de injunção apenas é utilizável quando se destina a exigir o cumprimento: a) de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a €15.000 (artigo 1.º do diploma preambular citado); b) ou, independentemente desse valor (art.º 10.º do DL 62/2013 de 10/05), de obrigações emergentes de transações comerciais que não integrem as exceções previstas nas alíneas a), b) e c) do n.º 2 do art.º 2.º do DL 62/2013 de 10/05.
Isto posto,
Nos presentes autos, vem reclamado pela requerente um crédito no montante de € 14.338,45, sendo tal valor crucial para a definição do tipo de ação a seguir após a Oposição deduzida pela requerida, e a respetiva tramitação dos autos.
Com efeito, o procedimento de injunção, após ser deduzida oposição, transmuta-se em processo declarativo, que poderá revestir a forma de processo especial, ou a forma de processo comum, em função do valor da Injunção: nas injunções destinadas à cobrança de dívida fundada em transação comercial com valor superior a € 15.000,00, após a dedução da Oposição, a ação segue os termos do processo comum (art.º 10.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 62/2013, de 10 de maio); nas injunções destinadas à cobrança de dívida de valor não superior a €15.000,00, a forma de processo a seguir é o processo especial (AECOP) (art.º 3.º a 5.º do DL n.º 269/98, de 1 de setembro).
Assim, face ao seu valor, o presente procedimento corre termos na forma de Ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias, tramitando-se de acordo com o regime processual aprovado pelo DL 269/98, 1.09.
É aqui que se coloca então a questão fulcral suscitada pela recorrente: a da viabilidade, na ação especial em causa, da dedução de pedido reconvencional, nomeadamente visando a realização da compensação de créditos.
Adiantando já soluções, afirmamos que aderimos integralmente à decisão recorrida, assim como aos ensinamentos de Salvador da Costa (“A Injunção e as Conexas Acção e Execução”, Almedina, 6.ª edição, 2008, pág. 88) quando refere, que «Não obstante a compensação só poder ser suscitada por via de reconvenção, pensamos que, se neste tipo de ação ela for deduzida, deve ser liminarmente indeferida, caso em que o respetivo valor processual é insuscetível de adição ao valor processual da ação, designadamente para efeito da alteração da regra da competência ou da interposição de recurso».
Efetivamente, face ao disposto na alínea c) do n.º 2 do art.º 266.º do atual CPC - que impõe a reconvenção como meio processual para o exercício do direito de compensação, caso o seu valor exceda o do pedido principal -, o problema da admissão da Reconvenção é acrescido, decorrente do facto de tal articulado implicar automaticamente a adição do valor da ação (art.º 299.º CPC), o que se pode traduzir numa alteração da forma da ação declarativa.
In casu, considerando o valor da ação - € 14.338,45 -, e o valor da reconvenção - € 22.445,60 -, teríamos um valor muito superior ao permitido para a tramitação da ação em que se transmutou o procedimento de Injunção previsto no artigo 1.º do diploma preambular - DL n.º 269/98, de 1.09.
Diferente seria já a situação, caso a Injunção fosse de valor superior a €15.000,00, pois como adianta Salvador da Costa (ob. e local citados), «Nessa hipótese (…) é admissível a formulação de reconvenção na oposição ao procedimento de injunção, essencialmente sob o argumento de a tramitação processual imprimida ter passado a ser, após a oposição, a do processo comum».
De facto, a jurisprudência tem entendido, de forma generalizada e pacífica, que em função da natureza da forma processual que se segue à oposição à injunção (e consequente distribuição como ação declarativa), se definirá a viabilidade da reconvenção, concluindo que tal articulado será sempre viável nas ações de natureza comum (decorrentes de injunção referente a transação comercial de valor superior a €15.000,00).
Como se concluiu no Ac. RP de 14.05.2012 (disponível em www.dgsi.pt), «O problema não é original nas decisões das Relações, e todas elas se encaminham, tanto quanto constatamos, para o entendimento que distingue as injunções em dois tipos, concluindo que aquelas que correspondem a transações comerciais com pedidos superiores à alçada da Relação (anteriormente, à alçada do tribunal) implicam o prosseguimento do processo como ação comum ordinária e, por isso, permitem a dedução de reconvenção pelo requerido que, entretanto, com a oposição, passou a réu» (cfr. no mesmo sentido os Acs. da RP de 15.5.2012 e de 26.1.2015; e da RE de 21.1.2016, todos disponíveis em www.dgsi.pt.).
No que respeita às ações com processo especial (de valor não superior a €15.000,00, como ocorre com aquela que apreciamos) a jurisprudência em geral, assim como a doutrina, tem entendido que não é viável a reconvenção (Acs. RP de 10.2.2011, de 2.05.2015 e de 24.1.2018; da RC de 7.06.2016; da RL de 6.5.2010, 12.11.2015, 12/12/2020, e 26-09-2024; da RE de 3.12.2015 e 9.2.2017; e da RG de 22.06.2017, - todos disponíveis em www.dgsi.pt).
São em geral expendidos os seguintes argumentos, para obstar à admissibilidade da reconvenção neste tipo de ações: há apenas dois articulados, não comportando este processo especial um terceiro articulado/resposta; e o legislador pretendeu instituir um processo particularmente célere.
E assim é, de facto: o processo especial em análise apenas comporta dois articulados – o requerimento de Injunção e a Oposição -, inexistindo na tramitação legal a previsão de um terceiro articulado onde possa ser debatido o pedido reconvencional deduzido, restando ao requerente a possibilidade de debater oralmente, na audiência de Julgamento, as exceções deduzidas pelo requerido (art.º 3º nº 4 do CPC).
Como se anotou no Ac. do STJ de 24/09/2015 (www.dgsi.pt), face ao disposto nos artigos 3º e 4º do Anexo ao Diploma Preambular do DL nº. 269/98, de 01/09, “e ao modelo que presidiu ao regime nele estabelecido – o da antiga ação sumaríssima – não podemos deixar de concluir que tal ação especial não comporta a possibilidade de ser deduzida reconvenção, ao contrário do que acontece nas ações de processo comum”.
Como resulta ademais do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 269/98, este tipo de procedimentos especiais veio corresponder à observação de que “a par de um aumento explosivo da litigiosidade, esta se torna repetitiva, rotineira, indutora da "funcionalização" dos magistrados, que gastam o seu tempo e as suas aptidões técnicas na prolação mecânica de despachos e sentenças”.
Assim, uma das forças motrizes da criação destes processos especiais foi a desjudicialização de certo tipo de litígios, e a simplificação do processo civil.
Como se acentuou no Ac. RL de 12/12/2020 (disponível em www.dgsi.pt), “A ideia era afastar a rigidez da legalidade da forma de processo, limitar o objeto da controvérsia a determinados pontos de direito substantivo, e afastar diretamente alguns atos do formalismo legalmente previsto - Américo de Campos Costa, in O Processo Simplificado do Art. 464-A - Tribuna de Justiça, n.º 2, Fevereiro/Março, 1990, p. 58.
É nesta tendência legislativa que se inscreve o regime dos procedimentos aprovados pelo Decreto-Lei n.º 269/98 de 1.9.
Este diploma legal, na sua versão original, apenas se aplicava aos pedidos de cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior à alçada da 1.ª instância.
Ora, no Código de Processo Civil de 1961, o processo declarativo comum poderia seguir a forma ordinária, sumária ou sumaríssima (artigo 461.º), sendo esta última a forma de processo comum adequada ao cumprimento de obrigações pecuniárias de valor inferior a metade da alçada do tribunal de comarca (artigo 461.º, n.º 1, in fine).
O processo sumaríssimo era uma forma de processo mais simplificada, que compreendia apenas dois articulados - a petição e a contestação -, estabelecia prazos mais curtos, os meios de prova eram mais limitados, e não havia fase de saneamento dos autos, passando o processo logo para a fase de julgamento, com prolação imediata da sentença (artigos 793.º a 800.º do CPC de 1961). 
Já então a questão da admissibilidade da reconvenção em processo sumaríssimo era discutida, havendo uma corrente, porventura maioritária, que entendia que a resposta a essa questão deveria ser negativa (vide, neste sentido, Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. VI, 1953, p. 493; Antunes Varela, in Manual de Processo Civil, 1985, pp. 745 e 746; Lopes do Rego, in Comentários ao Código de Processo Civil, 1999, p. 315).
Neste diapasão alinhava também a jurisprudência (como por exemplo, o acórdão do TRL de 30.3.1982, BMJ n.º 321, p. 433, o acórdão do TRP de 8.2.1983, BMJ n.º 326, p. 536, e o acórdão do TRE de 7.5.1998, BMJ n.º 477, p. 586), argumentando-se que na referida forma de processo não havia resposta à contestação, devendo logo designar‑se data para julgamento. Considerava-se que a celeridade e a simplicidade do processo não se compaginavam com o exercício da defesa por reconvenção.

Esta argumentação não está desfasada da realidade do regime dos procedimentos especiais aprovados pelo Decreto-Lei n.º 269/98, os quais, de igual modo, só contemplam dois articulados - a petição ou formulário de injunção e a contestação ou oposição - artigos 1.º a 4.º e artigos 15.º a 17.º do regime de processos anexo a esse diploma.
Daí que seja legítimo continuar a sustentar que a lei, intencionalmente, veda a dedução de pedido reconvencional na espécie de processos aqui em causa, sustentando-se que esta solução legal não afeta os direitos de defesa do réu, porquanto o mesmo poderá, se tiver fundamento legal para o efeito, fazer valer os mesmos em ação própria…”.
E aderimos integralmente aos argumentos expendidos no acórdão citado, que segue a posição jurisprudencial maioritária.
E tal posição não pode ser derrogada pela afirmação da recorrente, de que a tal ação se aplicam, nos termos do n.º 1 do art.º 549.º do CPC, não só as disposições que lhe são próprias, mas também as regras gerais e comuns do processo civil, sendo que a norma que expressamente regula a admissibilidade do pedido reconvencional se integra nas disposições gerais do Cód. Proc.
Efetivamente, o artigo 266.º, n.º 2, al. c) do CPC, com a redação que lhe foi introduzida pela Lei n.º 41/2013, de 26/6, refere a possibilidade do exercício da compensação através de dedução de reconvenção. E daí a afirmação da recorrente (alegadamente com acompanhamento na doutrina), de que não existem razões que obstem à aplicação das regras gerais do Código de Processo Civil às Ações especiais em causa, sobretudo tendo em consideração que o regime anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de setembro, é manifestamente insuficiente para regular aquele tipo de ação.
Rebatemos tal afirmação com o seguinte argumento: a aplicabilidade daquela norma geral ao caso concreto, deve aferir-se por via da sua compatibilidade com o modelo da ação especial em apreço, nomeadamente na fase dos articulados, não podendo olvidar-se as adaptações que a norma subsidiária teria de sofrer na sua aplicação, em virtude das diferenças estruturais fundamentais que existem entre o processo comum e o processo especial em causa.
Como escreve Salvador da Costa a este propósito (ob. e local citados) “…no que concerne à ação declarativa em análise, a lei confina essa forma de processo especial unicamente a dois articulados, a petição inicial e a contestação, e estabelece que este último instrumento só é notificado ao autor aquando da notificação do despacho designativo da data de julgamento. Isso significa que a resposta pelo autor a eventuais exceções que o réu deduza na contestação só pode ocorrer, oralmente, sob registo na ata, no início da audiência de discussão e julgamento (artigo 3.º, n.º 4 do Código de Processo Civil). Daí resulta a intencionalidade da lei no sentido de proibir a dedução de pedido reconvencional na espécie em causa, o que, aliás, está de acordo com a simplificação que a caracteriza, em função da reduzida importância dos interesses suscetíveis de a envolver ou da estrutura do litígio em causa…”.
E em corroboração do aduzido, acrescenta que “…nestes casos, os princípios da simplicidade e celeridade processual, reportados à natureza dos litígios para que estes procedimentos foram criados, prevalece sobre o princípio da economia processual que justificaria a admissibilidade em geral dos pedidos reconvencionais, nos termos do artigo 266.º do CPC…” (realce nosso).
São também de realçar nesta matéria as considerações de Rui Pinto (no seu estudo sobre “A Problemática da Dedução da Compensação no Código de Processo Civil de 2013”, disponível em www.academia.edu.pt, pp. 17 e 18), onde muito claramente afirma: “Na realidade, os processos especiais não são processos incompletos ou lacunares, a que o artigo 549º acrescentaria articulados, mas processos que veriam diminuída a sua eficácia específica se fossem engordados por normas do processo comum.
Na verdade, a relação de subsidiariedade entre processo especial e processo comum guia-se por um princípio paradoxal: o legislador especial regulou o que considerou mais importante e deixou para a lei processual comum o que era secundário. Assim, quando o legislador especial determina que um processo especial apenas tem dois articulados, quis mesmo limitar esse número. Não há lacunas. Mas se o legislador não regula questões como as do procedimento instrutório, i.e., o direito probatório formal, é porque as quis deixar para o disposto no processo civil comum.
Aliás, é este tipo de raciocínio que permitia, no passado, a diferenciação entre processo comum ordinário, sumário e sumaríssimo. Se assim não fosse, todos os processos teriam, em maior ou menor grau, o procedimento do processo ordinário ou, atualmente, do processo comum.
Em consequência, deve concluir-se que a previsão de reconvenção e de réplica no processo declarativo comum não é transponível ex lege para os processos declarativos especiais. Tal não é de estranhar porquanto estes perseguem desideratos próprios associados a um “timing” processual breve e a um específico objeto processual - os processos declarativos especiais são moldados sobre uma certa espécie de pretensão do autor ou requerente, pelo que a defesa do réu ou requerido é correlata dessa pretensão”.
Também não sufragamos o entendimento da recorrente, de que a seguir-se o entendimento exposto, ser-lhe-á vedado o direito a ver ressarcido o contra-crédito que detém sobre a recorrida e, consequentemente, o direito a exercer a sua defesa por esta via.
Começamos por dizer que não vemos compatibilidade substancial entre o pedido reconvencional deduzido e este tipo de ação especial. Efetivamente, o pedido reconvencional apresentado pela Requerida, nos termos em que foi suscitado na oposição, tem a natureza de pretensão indemnizatória decorrente do alegado incumprimento do contrato de empreitada (incumprimento qua tale ou na sua vertente de cumprimento defeituoso), pelo que, enquanto tal, não tem por génese ou facto emergente, a exigência de cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes daquele mesmo contrato, e nem sequer uma “transacção comercial”, requisito de aplicabilidade do mencionado DL nº. 269/98, mesmo com as consequentes alterações no mesmo introduzidas.
Logo, como bem se decidiu no Ac. RL de 26.9.2024 (disponível em www.dgsi.pt), tal pretensão nunca poderia ser deduzida em processo injuntivo ou em procedimento especial destinado a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a € 15 000,00.
Ou seja, caso a requerida pretendesse acionar a requerente, de forma a exercer o reclamado direito indemnizatório por incumprimento do contrato, instaurando a competente ação judicial, nunca o poderia fazer no quadro dos processos especiais aprovados pelo Decreto-Lei n.º 269/98, de 1.9.
Acrescenta-se ainda o seguinte:
Os limites impostos ao réu neste tipo de ação especial não prejudicam o seu direito de defesa, pois o mesmo não fica inibido do exercício do direito de ação, reclamando em processo próprio o crédito a que julga ter direito, não havendo por isso qualquer violação ao disposto no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa (cfr. neste sentido o Ac. RP de 12.5.2015; o Ac. RC de 7.6.2016; e o Ac. desta RG de 22.6.2017, todos disponíveis em www.dgsi.pt).
Muito pelo contrário: a admissão da Reconvenção neste tipo de ação especial poderia vir a constituir uma limitação inaceitável ao exercício do seu direito de ação, e ao correspondente direito de defesa da contraparte, tendo em atenção os limites que o Regime Jurídico dos Procedimentos aprovados pelo Decreto-Lei n.º 269/98 impõe às partes, por força da celeridade e simplicidade da causa, traduzidos, por exemplo: na existência de apenas dois articulados, o que constitui uma limitação, quer à reconvenção, quer à defesa por exceção à reconvenção, quer à resposta à exceção à reconvenção; no facto de os meios de prova serem apresentados apenas na audiência final; e na limitação do número de testemunhas que cada parte pode apresentar (artigo 3.º, n.º 1, ex vi do artigo 17.º do regime dos procedimentos aprovados em anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98).
Ou seja, a verificação desta limitação não se traduz em qualquer prejuízo para a Recorrente, que não fica inibida de exercer o seu direito no momento oportuno, e com as garantias de um processo justo e equitativo.
Afirma-se, finalmente, que também não é caso para lançar mão do princípio da gestão processual, na sua vertente de adequação formal (cf. artigo 547.º do CPC) como pretende a recorrente, transplantando as regras do processo declarativo comum para os processos especiais, permitindo ao juiz autorizar a reconvenção e o inerente articulado de resposta.
Como se deixou dito acima, a dedução da reconvenção conduz a um articulado de resposta (a Réplica), o que o regime especial afasta.
Por outro lado, a reconvenção postula um pedido de condenação do autor ou, pelo menos, de reconhecimento do direito do devedor, o que está fora do escopo da ação especial: formar título executivo contra o devedor, nos termos do artigo 2.º do Anexo ao Decreto-Lei nº 269/98.
Ora, como se defendeu no Ac. RC de 14.10.2014 (www.dgsi.pt), o princípio da gestão processual/adequação formal tem como terreno fértil situações específicas, não devendo ser utilizado para subverter o quadro legal da tramitação de um processo, transformando o juiz em legislador.
Trata-se de um poder a usar apenas “quando o modelo legal se mostre de todo inadequado às especificidades da causa, e em decorrência, colida frontalmente com o atingir do processo equitativo”; ele constitui “uma válvula de escape” e não um instrumento de utilização corrente, “sob pena de subverter os princípios essenciais da certeza e da segurança jurídica”.
Também Manuel Eduardo Bianchi Sampaio defende (em «A compensação nas formas de processo em que não é admissível reconvenção», Julgar Online, maio de 2019, p. 9), que julga inadequada a utilização do princípio da adequação formal para admitir a reconvenção nas formas de processo em que não é admissível.

E o mesmo sucede com Salvador da Costa (“A Injunção e as Conexas Ação e Execução”, 7.ª edição, Coimbra: Almedina (2020), p. 132), ao afirmar o seguinte: “Considerando a estrutura do referido procedimento de injunção e da ação declarativa de condenação com processo especial em que se transmuta, e o seu fim, os princípios da gestão processual e da adequação formal não podem justificar a admissão da reconvenção que o requerido tenha deduzido na oposição.”
Em conclusão:
Temos para nós como regra, que para o procedimento de injunção e a ação especial para o cumprimento de obrigações pecuniárias em que o pedido é inferior a € 15 000,00 (art.º 44.º, n.º 1, da Lei 62/2013 de 26.8 - que aprovou a Lei de Organização do Sistema Judiciário), como é o caso dos autos, em circunstância alguma a reconvenção é processualmente admissível.”
3) No sentido da admissibilidade plena da reconvenção
Esta interpretação defende a aplicação do princípio da adequação formal (art. 547.º do CPC) e da gestão processual (artº 6 do CPC), permitindo juntar a pretensão reconvencional à oposição, para evitar fracionamento de litígios e reforçar a economia processual.
- Acórdão do TRG de 06.02.2025 (Processo nº 123527/23.5YIPRT-A.G1), relatado pela Srª. Desembargadora Anizabel Sousa Pereira, no qual se decidiu que:
“Sendo a AECOP (ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias) um procedimento especial, são-lhe aplicáveis as regras gerais do CPC (artº 549, nº 1), entre as quais se conta as da reconvenção (artº 266), cabendo ao juiz, utilizando os seus poderes de gestão processual e de adequação formal (artigos 6º e 547º), adaptar o processo à tramitação da reconvenção, pelo que relegar a invocação da compensação para a oposição a subsequente execução (artº 729, al. h)) implicaria um desnecessário desperdício de recursos e violaria o princípio constitucional da igualdade, cumprindo-se, assim, a função instrumental do processo civil em face do direito material.”
- Acórdão do TRG de 28.11.2024 (Processo nº 64253/23.5YIPRT-C.G1), relatado pela Srª. Desembargadora Rosália Cunha, no qual se decidiu que:
”I – O direito a um processo equitativo, previsto no artº 20, nº 4 da CRP, e a justiça material exigem e impõem que se possibilite que o réu demandado se socorra de todos os meios de defesa ao seu dispor, designadamente invocando a compensação de créditos a qual lhe permite que não se exponha ao risco de insolvência do seu devedor. Por isso, pode invocar a compensação de créditos no âmbito de uma ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias.
II – À luz do atual direito processual civil, a compensação tem necessariamente de ser invocada e declarada por via reconvencional, independentemente do seu valor exceder ou não o crédito reclamado   pelo autor.
III – Na ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias a compensação também tem que ser deduzida por via reconvencional, devendo o juiz, se necessário, fazer uso dos seus poderes de gestão processual e de adequação formal para ajustar a respectiva tramitação à dedução desse pedido reconvencional.
IV – A reconvenção implica uma modificação do objecto da ação a qual, em vez de se circunscrever ao pedido formulado pelo autor, passa a ter também por objeto um pedido formulado pelo réu. A sua admissibilidade depende de requisitos de ordem processual e de ordem substantiva, sendo que estes últimos se prendem com a necessária conexão que tem de existir entre os dois pedidos e que se encontram elencados nas als. a) a d) do nº 2 do artº 266 do CPC.
V – Invocando o requerido que detém um crédito sobre a requerente decorrente de danos ocorridos na sequência de inundações causadas por instalação deficiente de uma torneira efetuada pela requerente no âmbito de um outro contrato de empreitada, e pretendendo compensar este seu crédito com o invocado na ação e obter a condenação da requerente no pagamento do valor remanescente, a reconvenção é processualmente admissível nos termos do disposto no artº 266, nº 2, al. c) do CPC. (…).”
- Acórdão do TRL de 07.07.2022 (Processo nº 86718/21.3YIPRT-A.L1), relatado pela Srª. Desembargadora Ana Rodrigues da Silva, no qual se decidiu que:
“1 – O espírito do actual processo civil dá prevalência às decisões de mérito sobre as decisões formais, recorrendo para tal designadamente aos princípios de gestão processual e da adequação formal;
2 – De acordo com estes princípios, a reconvenção deduzida no âmbito de procedimento de injunção na parte em que se peticiona o reconhecimento judicial da compensação de créditos deve ser admitida, nos termos do artº 266, nº 2, al. c) do CPC;
3 – As mesmas razões de justiça material levam a que se chegue a igual conclusão, admitindo-se a reconvenção com base em qualquer das situações previstas no artº 266, nº 2 do CPC.”
- Acórdão do TRP de 11.11.2024 (Processo nº 7269/23.7YIPRT-A.P1), relatado pelo Sr. Desembargador José Eusébio Almeida, no qual se decidiu que:
“I – Atento o disposto na al. c) do nº 2 do artº 266 do CPC, a compensação deve ser deduzida, sempre, por via reconvencional, inclusivamente em sede de AECOP.
II – Mas a compensação tem de ser efetivamente deduzida/invocada.
III – Não o sendo, não será também de admitir, em sede de AECOP, a dedução de reconvenção com fundamento nas restantes alíneas – que não a alínea c) – do nº 2 do artº 266 do CPC.
IV – Salvo se – ocasião em que passa a ser genericamente admissível a reconvenção – a alteração do valor da causa, por força do disposto no artigo 299, nº 1 do CPC, implicar que os termos posteriores dos autos sigam a forma processual comum.”
- Acórdão do TRG de 15.12.2022 (Processo nº 117544/21.7YIPRT-B.G1), relatado pela Srª. Desembargadora Maria Cristina Cerdeira, no qual se decidiu que:
I) - Em face da redacção do artº. 266º, nº. 2, al. c) do NCPC, a compensação de créditos deve ser sempre deduzida em sede de reconvenção, independentemente do valor dos créditos compensáveis, até porque se trata de uma pretensão autónoma que ultrapassa a mera defesa.
II) - No âmbito de uma acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias (AECOP) deve ser dada a possibilidade ao réu de invocar a compensação de créditos por via de reconvenção, bem como, através desta, tentar obter o pagamento do valor em que o seu crédito excede o do autor.
III) - Para tal, deve o juiz fazer uso dos seus poderes de adequação formal e também de gestão processual de forma a ajustar a tramitação da AECOP à dedução do pedido reconvencional.
IV) - Em processo onde não seja admissível reconvenção, é de admitir a defesa por invocação da excepção peremptória de compensação, a fim de não coartar ao réu um meio de defesa importante e eficaz.”
- Acórdão do TRL de 23.02.2021 (Processo nº 72269/19.07YIPRT.L1-7), relatado pelo Sr. Desembargador Luís Filipe Pires de Sousa, no qual se decidiu que:
“I – No que tange à admissibilidade da invocação da compensação de créditos invocada pelo requerido no âmbito do regime do D.L. nº 269/98, de 1.9, perfilam-se três teses:
a) A da inadmissibilidade da reconvenção uma vez que tal não se coaduna com a simplicidade de tramitação e celeridade que o legislador pretendeu imprimir a esta forma processual;
b) A da admissibilidade da dedução da compensação, mas como exceção perentória sob pena de ser coartado um meio de defesa ao requerido;            
c) A da invocação da compensação de créditos por via da dedução de reconvenção, devendo o juiz, se necessário, fazer uso dos seus poderes de gestão processual e de adequação formal para ajustar a respectiva tramitação à dedução do pedido reconvencional.
II – Adere-se à terceira posição porquanto: é a solução que resulta da conjugação do artº 549, nº 1 com o artº 266, nº 2, al. c); permite a apreciação  numa única ação das questões que, doutra forma, teriam de ser apreciadas em duas ações (artº 729, al. h)); a imediata apreciação da compensação evita que o compensante suporte o risco de insolvência da contraparte; conforma-se melhor com o princípio da igualdade das partes; o legislador quis facilitar a compensação; é a posição que se conforma com o espírito do atual processo civil, o qual dá prevalência às decisões de mérito sobre as decisões formais, recorrendo para tal, designadamente aos princípios da gestão processual e da adequação formal.”
Cumpre tomar posição:
Ponderadas as vantagens e desvantagens de cada tese “supra” descrita, entendemos ser esta última, a que melhor contribui para a realização da justiça.
Efectivamente, não há dúvidas que o processo injunção, em si, face à simplificação exigida, não comportará reconvenção, se atendermos apenas ao texto do D.L. 269/98, de 01.09, nomeadamente ao disposto nos seus artºs. 1, nº 3, 3, 4, 16, nº 1 e 17, nº 1.
No entanto, por força do disposto no artº 549, nº 1 do CPC, em tudo o que não estiver prevenido nas disposições próprias dos processos especiais, há que observar o que se mostra estabelecido para a tramitação do processo comum.
Pelo que, a nossa ordem jurídica não proíbe que um processo especial que começou por ser de injunção simplificado, siga como processo declarativo comum, admitindo esta nova forma, a reconvenção deduzida.
Havendo efectivamente fundamentos para em sede de defesa, se perfilar a existência de uma acção cruzada do primitivo réu contra o primitivo autor, faz todo o sentido que, se aproveitem os recursos existentes, ainda que se tenha que alterar o valor do processo e a competência do juízo, para dirimir um litigio único.
O contrário, poderia levar até à prolação de decisões contraditórias, em dois tribunais distintos, quando, o que está em causa, são duas faces do mesmo conflito.
No caso em apreço, se a acção seguisse sem pedido reconvencional a ré poderia vir a ser condenada a pagar à autora o preço do serviço por esta efectuado. Posteriormente teria que intentar nova acção para fazer valer o alegado direito a uma indemnização pelo não cumprimento ou cumprimento defeituoso da prestação da primitiva autora.
Não vemos como cindir estes dois momentos, possa trazer alguma vantagem para as partes.
É certo que a primeira acção teria andamento mais célere, mas não sendo resolvidos todos os aspectos da relação jurídica, só com a realização de novo julgamento, em diferente processo, se obteria a solução global.
A isto acresce, o risco de a parte que foi condenada primeiramente, caso cumpra a sua prestação, poder ser confrontada com a insolvência da outra parte, no decurso da segunda acção, ou mesmo antes desta ser proposta.
Com as alterações introduzidas ao novo CPC privilegiou-se, sem dúvida, a obtenção de uma justiça material e não formal, o que decorre dos princípios de gestão e adequação a que aludem os artºs 547 e 6 do CPC.
De igual modo, este entendimento é o que se adequada mais aos princípios da economia processual e igualdade das partes (artºs 130 e 4º do CPC).
A ser assim, aceita-se a admissibilidade plena da reconvenção, desde que se respeitem os requisitos gerais do art. 266 do CPC, pois esta é a posição que melhor concretiza os princípios de gestão processual e adequação formal e, assegura igualdade entre as partes e uma solução de mérito que evite o fracionamento da discussão em duas ações distintas.
Adere-se, deste modo, à linha jurisprudencial que privilegia a decisão de mérito em detrimento de formalismos que restringem indevidamente o exercício do contraditório e tem como linhas mestras os seguintes pontos:
- Aplicação plena do art. 266.º CPC;
- Uso dos princípios da adequação formal e da gestão processual (artºs. 547 e 6 do CPC), devendo o Tribunal gerir e ajustar o processo para permitir a apreciação dos pedidos reconvencionais;
- Aplicação dos princípios da economia processual e igualdade das partes (artºs 130 e 4º do CPC), uma vez que se preza a resolução integral da controvérsia num só processo, evitando litígios paralelos ou futuros.
Julgando-se assim procedente a apelação, revoga-se a decisão de 1.ª instância e, determina-se a admissão da reconvenção, desde que se verifique os demais requisitos legais necessários à sua admissibilidade previstos no artº 266 do CPC.
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III – DECISÃO
Pelo exposto, atentas as disposições legais citadas e as considerações expendidas, as Juízes da oitava secção deste tribunal de recurso, julgam procedente o mesmo e, em consequência, revogam a decisão de 1.ª instância recorrida e determinam a admissão da reconvenção, desde que se verifique os demais requisitos legais necessários à sua admissibilidade previstos no artº 266 do CPC.
Custas pela apelada (art. 527 nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil).
Notifique.
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Lisboa, 10-07-2025,
Marília Leal Fontes
Cristina da Conceição Pires Lourenço
Carla Figueiredo
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[1] Neste sentido cfr. GERALDES, Abrantes António, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5ª Edição, Almedina, 2018, págs. 114 a 116.
[2] Neste sentido cfr. GERALDES, Abrantes António, in “Opus Cit.”, 5ª Edição, Almedina, 2018, pág. 116.
[3] In www.dgsi.pt.