I - Quando existam construções que não cubram um prédio na totalidade, para determinar se o mesmo tem natureza rústica ou urbana deve ser utilizado o critério da destinação ou afetação económica.
II - Assim, um prédio será rústico ou urbano conforme as construções nele existentes sejam um meio de aproveitamento do terreno ou este último constitua apenas um complemento daquelas.
III - Não havendo afetações desse tipo, estamos perante prédios distintos e autónomos.
IV - No processo de inventário, compete ao reclamante que acusa a falta de bens o ónus da prova dessa falta.
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
I- Relatório
1- No processo de inventário, iniciado em 17/03/2023, para partilha dos bens deixados por óbito de AA e BB, a Requerente, CC, que veio a ser nomeada Cabeça de Casal, apresentou, no requerimento inicial, a relação de bens.
Nessa relação, constavam, entre outras, as seguintes verbas:
“VERBA Nº 1
Prédio urbano com quintal, sito na Rua ... da União de Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim
Matriz: artigo ... urbano da União de Freguesias ..., ... e ..., do concelho de Póvoa de Varzim.
Valor Patrimonial Tributário: € 40.742,10
Conservatória do Registo Predial: Omisso”.
(…)
VERBA Nº 5
Prédio rústico denominado Quinta ... sito na União de Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim, a confrontar de Norte com proprietário, do Sul com DD, Nascente com EE e de Poente com FF.
Matriz: Artigo ... rústico da União de Freguesias ..., ... e ..., do concelho de Póvoa de Varzim.
Valor Patrimonial Tributário: € 36,20 Conservatória do Registo Predial: Omisso”.
2- Esta relação de bens, depois de corrigida pela Cabeça de Casal no dia 02/06/2023, foi objeto de reclamação, quanto aos bens móveis, pelos interessados, GG, HH e II, reclamação essa a que a Cabeça de Casal respondeu.
3- Posteriormente, foi realizada uma audiência prévia, na qual a instância foi suspensa, a pedido dos interessados, para os mesmos “se munirem de um levantamento topográfico e avaliação de todos os bens imóveis (diligências a serem realizadas extrajudicialmente), bem como, irem todos os interessados, acompanhados pelos Ilustres Mandatários, ao interior do imóvel descrito na verba n.º 1 da relação de bens e, com isso, lograrem um consenso entre as partes”.
4- Depois de designado dia para a continuação da referida audiência, a Cabeça de Casal juntou aos aos autos, no dia 23/05/2024, uma nova relação de bens, na qual consta como verba n.º 15, o seguinte:
“Prédio urbano com quintal, sito na Rua ... da União de Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim, com a área total de 2808 m2.
Matriz: artigo ... urbano da União de Freguesias ..., ... e ..., do concelho de Póvoa de Varzim.
Valor Patrimonial Tributário: € 40.742,10
Conservatória do Registo Predial: Omisso”.
5- Os interessados GG, HH e II, vieram, então, no dia 14/06/2024, reclamar, alegando, no essencial, o seguinte:
Quanto ao imóvel relacionado sob a verba n.º 15, o mesmo deverá manter-se como se encontrava relacionado na primeira relação de bens apresentada pela Cabeça de Casal.
Deve ainda ser relacionado o prédio constante da verba n.º 5 da primeira relação de bens, uma vez que inexiste qualquer duplicação destes imóveis e, apenas, um lapso das áreas.
Assim, devem ser relacionadas as seguintes verbas:
Verba n.º 15- Prédio urbano com quintal, sito na Rua ..., da União de Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim, com área total de 317 m2, inscrito na matriz sob o artigo ... urbano (que proveio do artigo ....º de ...), da União de Freguesias ..., ... e ... do concelho da Póvoa de Varzim, omisso na Conservatória do Registo Predial, com o valor patrimonial de 40.742,10€.
Verba n.º 16 – Prédio rústico, denominado Quinta ..., sito na União de Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim, a confrontar do norte com proprietário, do sul com DD, nascente com EE e do Poente com FF, com a área total de 2.492 m2, que inclui a casa ... e a passagem de acesso à Rua ..., inscrito na matriz sob o artigo ... rústico, da União de Freguesias ..., ... e ..., do concelho da Póvoa de Varzim, omisso na Conservatória do Registo Predial, com o valor patrimonial de 36,20€.
De acordo com os Reclamantes, o prédio da verba n.º 16, prédio rústico, denominado Quinta ..., onde se inclui a casa ..., foi a residência dos inventariados, durante muitos anos, tendo a mesma sido construído há mais de 30 anos, pelo que já deveria ter sido legalizada pela Cabeça de casal, inexistindo qualquer duplicação entre a verba 1 e 5 da primitiva relação de bens, até porque sempre constou este imóvel (o da verba 16) da relação de IMI, que ao longo destes anos foi sendo pago, sem qualquer objeção ou correção por qualquer um dos interessados.
6- Contra a pretensão dos aludidos interessados manifestou-se a Cabeça de Casal, uma vez que a verba n.º 15 da nova Relação de Bens é um prédio único, constituído por uma casa, com casa ... e quintal anexo, que tem a configuração bem definida no local por paredes em toda a volta, com a área total de 2.808,00 m2, como foi apurado pelo topógrafo que fez o levantamento.
A seu ver, tal como se pode verificar da certidão da matriz junta aos autos, o prédio tem na matriz a área total 2596 m2 e é constituído por uma casa e uma casa de eira, como os próprios reclamantes reconhecem, e todo um terreno anexo, vedado à volta por paredes, com uma entrada, não se compreendendo como pretendem os reclamantes que se legalize uma casa ... para fins habitacionais.
Assim, conclui que se verifica que o Artigo ...-R é uma duplicação do quintal da casa que estava integrado na área do artigo matricial ......, que é o todo, sendo que o prédio que agora foi descrito como a verba 15 tem uma só entrada, um só quintal e um só poço, e não tem nada que separe a habitação do resto, sendo que a área que vem indicada para a suposta verba 15, de 317 m2, não tem qualquer suporte factual, legal ou documental.
7- Realizada a audiência prévia antes designada e avaliadas as verbas relacionadas sob as verbas n.ºs 15 a 19, foram os interessados notificados para alegar o que tivessem por conveniente, quanto à última reclamação à relação de bens, o que a Cabeça de Casal e os Reclamantes fizeram.
8- Seguidamente, foi proferida sentença que julgou a última reclamação apresentada pelos interessados, GG, HH e II, improcedente, por não provada.
9- Inconformados com esta sentença, dela recorrem os mesmos interessados, finalizando a sua motivação de recurso com as seguintes conclusões:
“A)- O presente recurso de interpelação vem interposto da douta sentença de Iª instância que julgou improcedente, por não provada, a reclamação apresentada pelos ora reclamantes.
B)- A questão em apreço nestes autos, trata-se em saber se a verba n° 15 relacionada enquanto “Prédio urbano com quintal, sito na Rua ..., da União de Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim, com a área de 2.808 m2, inscrito na matriz sob o artigo ... urbano, da União de Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim”, corresponde a um prédio único, ou se antes corresponde a dois prédios, um correspondente a um “Prédio urbano com quintal, sito na Rua ..., da União de Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim, com área de 317 m2, inscrito na matriz sob o artigo ... urbano (que proveio do artigo ... de ...) e omisso na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim”, e outro correspondente a um “Prédio rústico denominado Quinta ..., sito na União de Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim, a confrontar do norte com proprietário, do sul com DD, do nascente com EE e do poente com FF, com a área de 2.492 m2”, que inclui a casa ... e a passagem de acesso à Rua ..., inscrito na matriz sob o artigo ... rústico, da União de Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim, e omisso na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim”.
C)- Manda a verdade dizer, com todo o respeito e consideração que nos merece o Tribunal de Iª Instância, que quanto ao imóvel relacionado na Nova Relação de Bens, sob a Verba n° 15, o mesmo deverá manter-se como se encontrava relacionado na primeira Relação de Bens, apresentada pela Cabeça-de-Casal, como Verba n° 1.
D)- Deverá ser relacionado a Verba n° 5, da primeira Relação de Bens, pois não existe qualquer duplicação destes imóveis, apenas lapso das áreas, conforme levantamento topográfico, elaborado para o efeito.
E)- Mister se mostra antes de mais rememorar que o Prédio da Verba 16, prédio rústico, denominado Quinta ..., onde se inclui a casa ..., foi, em tempos, a residência dos inventariados, durante muitos anos, tendo sido construída há mais de 30 anos, pelo que a mesma já deveria ter sido legalizada pela Cabeça-de-Casal.
F)- Importa relevar, no tocante à matéria de facto, que sempre constou este bem na prestação do IMI, que, ao longo destes anos, sempre foram pagos, sem qualquer objecção ou correcção destes cinco bens imóveis, por qualquer um dos interessados.
G)- Tanto assim é, que é a própria Cabeça-de-Casal quem relaciona os dois prédios: um correspondente ao (…) “Prédio urbano com quintal, sito na Rua ..., da União de Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim, inscrito na matriz sob o artigo ... urbano da União de Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim, com o valor patrimonial tributário de € 40.742,10, omisso na Conservatória do Registo Predial”, e outro correspondente ao (sublinhado nosso) “Prédio rústico denominado Quinta ... e ..., sito na União de Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim, a confrontar do norte com proprietário, do sul com DD, do nascente com EE e do poente com FF, inscrito na matriz sob o artigo ... (artigo anterior 190) rústico, da União de Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim, com o valor patrimonial tributário de € 36,20, omisso na Conservatória do Registo Predial”.
H)- A fortiori sempre se dirá que não houve qualquer falta de relacionação de bens, já que foi a Cabeça-de-Casal quem os relacionou, e que os aqui interessados e reclamantes, GG, HH e II, entendem que os prédios fazem parte da herança, como dois imóveis, prova essa feita pela Cabeça-de-Casal, com a Relação de Bens inicialmente apresentada.
I)- A reclamação que os interessados e reclamantes efectuaram foi à alteração que a Cabeça-de-Casal veio a realizar posteriormente, dando como certo a relação inicial cujos imóveis à data da abertura da herança, isto é à data da morte do seu autor, eram os que foram relacionados e cujos documentos juntos comprovam essa titularidade.
J)- Á guisa de remate, e sem necessidade de mais delongas, antolha-se inelutável a revogação da sentença da Iª instância, atenta designadamente o não reconhecimento da existência de dois prédios que foram relacionados correctamente pela Cabeça-de-Casal como sendo à data do óbito do autor, bens da herança, não existindo qualquer duplicação entre a Verba 1 e a Verba 5, como pretendeu, a Cabeça-de Casal, fazer valer”.
Terminam pedindo que se revogue a sentença recorrida.
10- Em resposta, a Cabeça de Casal defendeu a posição oposta.
11- Recebido o recurso e preparada a deliberação, importa tomá-la.
A- Definição do seu objeto.
Este objeto, como é sabido, é, em regra e ressalvadas, designadamente, as questões de conhecimento oficioso, delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente [artigos 608.º n.º 2, “in fine”, 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC)].
Assim, levando em consideração este critério, cinge-se o objeto deste recurso a saber se, em vez do prédio relacionado (na relação de bens apresentada no dia 23/05/2024) sob a verba n.º 15, devem ser relacionados os dois prédios indicados pelos Apelantes.
B.1- Na decisão recorrida julgaram-se provados os seguintes factos:
1. O inventariado AA faleceu a 20 de maio de 2001.
2. A inventariada BB faleceu a 16 de novembro de 2022.
3. Existia, à data da morte da segunda inventariada, BB, a 16/11/2022:
- Verba n.º 15
Prédio urbano com quintal, sito na Rua ... da União de Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim, com a área total de 2.808 m2, inscrito na matriz sob o artigo ... urbano da União de Freguesias ..., ... e ..., do concelho de Póvoa de Varzim.
A verba n.º 15 da relação de bens corresponde a dois imóveis, um correspondente a um “Prédio urbano com quintal, sito na Rua ..., da União de Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim, com área total de 317 m2”, inscrito na matriz sob o artigo ... urbano (que proveio do artigo ....º de ...), da União de Freguesias ..., ... e ... do concelho da Póvoa de Varzim, omisso na Conservatória do Registo Predial, e outro correspondente a um “Prédio rústico, denominado Quinta ..., sito na União de Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim, a confrontar do norte com proprietário, do sul com DD, nascente com EE e do Poente com FF, com a área total de 2.492 m2, que inclui a casa ... e a passagem de acesso à Rua ...”, inscrito na matriz sob o artigo ... rústico, da União de Freguesias ..., ... e ..., do concelho da Póvoa de Varzim, omisso na Conservatória do Registo Predial, com o valor patrimonial de 36,20€.
Como vimos, nada mais se discute neste recurso que não seja a questão de saber, em vez do prédio que, na relação de bens apresentada no dia 23/05/2024, está relacionado sob a verba n.º 15, devem ser relacionados os dois prédios distintos, indicados pelos Apelantes. Ou seja, se em vez do “prédio urbano com quintal, sito na Rua ... da União de Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim, com a área total de 2.808 m2, inscrito na matriz sob o artigo ... urbano da União de Freguesias ..., ... e ..., do concelho de Póvoa de Varzim”, devem ser relacionados dois prédios diferentes: um “prédio urbano com quintal, sito na Rua ..., da União de Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim, com área total de 317 m2”, inscrito na matriz sob o artigo ... urbano (que proveio do artigo ....º de ...), da União de Freguesias ..., ... e ... do concelho da Póvoa de Varzim, omisso na Conservatória do Registo Predial, e outro correspondente a um “prédio rústico, denominado Quinta ..., sito na União de Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim, a confrontar do norte com proprietário, do sul com DD, nascente com EE e do Poente com FF, com a área total de 2.492 m2, que inclui a casa ... e a passagem de acesso à Rua ...”, inscrito na matriz sob o artigo ... rústico, da União de Freguesias ..., ... e ..., do concelho da Póvoa de Varzim, omisso na Conservatória do Registo Predial, com o valor patrimonial de € 36,20”.
No fundo, para os Apelantes, na mesma área e local onde está situado o prédio que consta da já aludida verba n.º 15, existem dois prédios distintos: um rústico e outro urbano.
Mas, como veremos, não há dados nos autos que apontem, seguramente, nesse sentido.
Antes de justificar esta resposta, porém, importa deixar claro que, não tendo sido arguida nenhuma nulidade ou irregularidade sobre a apresentação das diferentes relações de bens (e processado subsequente), ater-nos-emos, tão só, à que foi apresentada em último lugar; ou seja, a que foi apresentada no dia 23/05/2024. É a partir dela que nasce a já aludida divergência, com a Cabeça de Casal a considerar que no local onde está situado o prédio aí relacionado sob a verba n.º 15, existe só esse prédio e os Apelantes, por seu turno, a defenderem, diversamente, que aí existem os dois prédios (rústico e urbano), já referenciados.
Ora, como é fácil de intuir, esta divergência há-se ser solucionada com base no critério legal para a autonomização de um prédio como rústico ou urbano e no confronto desse critério com os factos alegados e provados.
Quanto ao primeiro aspeto, a lei exprime-se nestes termos: os prédios, para efeitos de direito civil[1], podem ser de dois tipos: rústicos ou urbanos. “Entende-se por prédio rústico uma parte delimitada do solo e as construções nele existentes que não tenham autonomia económica, e por prédio urbano qualquer edifício incorporado no solo, com os terrenos que lhe sirvam de logradouro” – artigo 204.º, n.ºs 1 al.a) e 2, do Código Civil.
O critério de distinção, pois, quando existam construções que não cubram o prédio na totalidade, tem subjacente a destinação ou afetação económica[2]. Assim, um prédio será rústico ou urbano conforme as construções nele existentes sejam um meio de aproveitamento do terreno ou este último constitua apenas um complemento daquelas. Dito por outras palavras, “quando um prédio possui edificações e terrenos, se a afetação predominante é a utilização do terreno, à qual se subordinam as construções (estas não têm autonomia económica, destinando-se somente ao apoio da atividade aí desenvolvida), o prédio será rústico (…); se, pelo contrário, o terreno é um mero logradouro (mesmo que seja de grande extensão), destinado a potenciar o uso do edifício, então o prédio é urbano”[3].
Não havendo nenhuma das referidas afetações, estamos perante prédios distintos e autónomos. Isto é, haverá, nesse caso, não uma unidade predial, mas uma pluralidade.
Ora, é tendo presente este enquadramento que, analisando os factos provados, facilmente se conclui que, na situação em apreço, não há qualquer evidência de que, como afirmado pelos Apelantes, na mesma área e local onde está situado o prédio que consta da já aludida verba n.º 15, existam dois prédios distintos: um rústico e outro urbano. Isto, no essencial, porque não foram alegados, nem, menos ainda, demonstrados factos de onde resulte essa realidade.
Na verdade, aquilo que os Apelantes alegaram foi, tão só, que para além do prédio relacionado sob a verba n.º 1, na primitiva relação de bens, existe ainda um outro prédio rustico (que querem ver incluído na última relação de bens sob a verba n.º 16), denominado Quinta ..., onde se inclui a casa ..., que foi a residência dos inventariados, durante muitos anos e construída há mais de 30 anos, tendo a respetiva inscrição matricial dado origem a tributação em sede de IMI que sempre foi pago.
Acontece que nenhuma prova foi aportada para a demonstração da primeira realidade invocada, ou seja, a de que nesse alegado prédio se situava a residência dos inventariados, sendo que, em qualquer caso, dessa circunstância também não resultaria, só por si e necessariamente, a autonomia desse prédio em relação ao outro, o urbano, relacionado como a já referida verba n.º 15.
Por outro lado, também não se retira essa autonomia da referida relevância fiscal, para efeitos de IMI. Como é jurisprudência pacífica, “a nossa lei civil não só não reconhece a categoria de prédio misto como um tertium genus, como também não atende ao tipo de inscrição matricial nem ao tipo de descrição predial, pelo que, para qualificar um prédio como sendo rústico ou urbano, há que recorrer à definição dada pelo artigo 204.º do C. Civil”[4].
A todas as luzes, portanto, só se pode concluir que os Apelantes não provaram a existência dos dois ditos prédios, em lugar daquele que foi relacionado pela Cabeça de Casal sob a verba n.º 15.
Mas, competia-lhes fazer essa prova. Com efeito, como é entendimento largamente dominante, de resto, citado também na decisão recorrida, o interessado que alega a falta de relacionação de bens tem o ónus de provar essa falta[5]. E, por regra, através dos meios de prova que indicou na reclamação (artigos 1104.º, n.º 1, al. d) e 1105.º, n.º 5, do CPC).
Ora, no caso, os Apelantes não produziram essa prova.
Como tal, a sua pretensão de ver modificada a relação de bens aqui controvertida, é de indeferir. Ou seja, este recurso soçobra, sendo de confirmar, por isso, a decisão recorrida.
Pelas razões expostas, acorda-se em julgar improcedente este recurso e em confirmar o decidido no despacho recorrido.