I. A contagem do prazo máximo de prisão preventiva não se inicia com a detenção do arguido.
II. Apenas se inicia com a prolação do despacho que decreta a prisão preventiva.
III. Para se aferir se o prazo máximo da prisão preventiva, no caso de 6 meses, se mostra excedido há qua atentar na data da prolação da acusação.
IV. E, não na data da sua notificação.
I. Relatório
Em requerimento, que deu entrada em Juízo a 29.5.2025, dirigido ao Presidente do Tribunal de Justiça, subscrito por advogado, AA, preso preventivamente, apresentou petição de Habeas Corpus, ao abrigo do artigo 222.º alínea c) CPPenal, pugnando pela sua libertação imediata, alegando, em resumo, o seguinte:
- o arguido encontra-se privado da sua liberdade desde o dia 26 de Novembro de 2024, quando foi formalmente detido;
- tendo-lhe sido, a 28 de Novembro de 2024, em sede de primeiro interrogatório de arguido detido, aplicada a medida de coacção de prisão preventiva;
- que se saiba não foi levantada qualquer questão que indique que o processo será de especial complexidade, não tendo o mesmo assim sido tramitado;
- sendo que até à data, 29.5.2025, 6 meses e 1 dia decorridos desde que lhe foi aplicada tal medida, inexiste prolação da acusação;
- sendo que, in casu, obedecendo àquilo que estatui o artigo 215.º/2 CPPenal, por referência ao n.º 1 do mesmo artigo, o prazo máximo de prisão preventiva admitido até acusação é de 6 meses;
- sendo o direito à liberdade um direito fundamental – artigo 27.º/1 da CRP - e podendo ocorrer a privação da mesma, “pelo tempo e nas condições que a lei determinar”, apenas nos casos elencados no n.º 3 do mesmo preceito, a providência em causa constitui um instrumento reactivo dirigido ao abuso de poder por virtude de prisão ou detenção ilegal;
- a providência de habeas corpus tem a natureza de remédio excepcional para proteger a liberdade individual, revestindo carácter extraordinário e urgente “medida expedita” com a finalidade de rapidamente pôr termo a situações de ilegal privação de liberdade, decorrentes de ilegalidade de detenção ou de prisão, taxativamente enunciadas na lei:
- em caso de detenção ilegal, nos casos previstos nas quatro alíneas do n.º 1 do artigo 220.º CPPenal e,
- quanto ao habeas corpus em virtude de prisão ilegal, nas situações extremas de abuso de poder ou erro grosseiro, patente, grave, na aplicação do direito, descritas nas três alíneas do n.º 2 do artigo 222.º CPPenal;
- estabelece o artigo 215.º CPPenal, na redacção introduzida pela Lei 48/2007, de 29 de Agosto que “a prisão preventiva extingue-se quando, desde o seu início, tiverem decorrido quatro meses sem que tenha sido deduzida acusação…”;
- sendo que, o referido prazo, nos termos do n.º 2 do mesmo preceito, é elevado para 6 meses, no caso de – e para o que interessa in casu – se proceder por crimes de máximo superior a 8 anos;
- o arguido encontra-se preso preventivamente desde o dia 28.11.2024;
- encontrando-se, em virtude disso, ilegalmente preso.
2. A 2.6.2025 foi prestada a seguinte informação:
“nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 223.º/ CPPenal, remeta-se imediatamente ao Excelentíssimo Senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça os autos de Habeas Corpus - a serem constituídos por certidão da presente informação, da antecedente promoção do Ministério Público, da petição de Habeas Corpus, de despacho(s) de aplicação e reexame de prisão preventiva, da acusação formulada nos autos, além de outro processado eventualmente indicado para esse efeito – com a seguinte informação:
o arguido AA interpôs providência excepcional de Habeas Corpus, nos termos do artigo 222.º/2 alínea c) CPPenal alegando, em síntese, que se encontra-se em situação de prisão preventiva à ordem dos autos desde o dia 26 de Novembro de 2024; até ao dia 29 de Maio de 2025 – seis meses e um dia decorridos de inquérito desde que lhe foi decretada tal medida, inexistia prolação de acusação, pelo que se encontra ilegalmente preso e deve ser libertado.
A Digna Magistrada do Ministério Público promoveu a improcedência dessa providência, porquanto, em síntese, o prazo máximo da prisão preventiva não foi excedido em razão de ter sido deduzida acusação nos autos a 27 de Maio de 2025, ainda dentro do aludido prazo legal máximo.
Nos termos do disposto artigo 222.º/2 CPPenal a petição de habeas corpus, deve fundar-se em ilegalidade da prisão proveniente de:
a) Ter sido efectuada ou ordenada por entidade incompetente;
b) Ser motivada por facto pelo qual a lei não a permite; ou
c) Manter-se para além dos prazos fixados por lei ou por decisão judicial.
O arguido encontra-se em prisão preventiva desde o dia 28 de Novembro de 2024, medida de coação essa que foi revista e mantida periodicamente e, por último, na sequência de ter sido a 27 de Maio de 2025 deduzida acusação nos autos contra o arguido pela prática dos seguintes crimes:
- 1 (um) crime de abuso sexual de crianças agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 94 (noventa e quatro) crimes de abuso sexual de crianças agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 2, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 1 (um) crime de abuso sexual de crianças agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 2, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 16 (dezasseis) crimes de abuso sexual de crianças agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 267 (duzentos e sessenta e sete) crimes de abuso sexual de crianças agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 2, e 177.º, n.º 2, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 78 (setenta e oito) crimes de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 2, e 177.º, n.º 2, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 42 (quarenta e dois) crimes de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 2, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal;
- 186 (cento e oitenta e seis) crimes de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 1, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal;
- 1 (um) crime de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 1, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal e,
- 1 (um) crime de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 2, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal.
A acusação foi deduzida a 27 de maio de 2025, logo a menos dos seis meses decorridos desde a sujeição a 28 de novembro de 2024 de o arguido a prisão preventiva, pelo que esta medida de coação não caducou no prazo legal de 6 meses que está previsto no artigo 215.º/1 alínea a) e 2 CPPenal,
Prologando-se o prazo máximo de duração da prisão preventiva para além de 28.05.2025, por efeito da acusação deduzida a 27.05.2025, tal medida de coação foi reexaminada e mantida por despacho de 29.05.2025, pelo que se mantém legalmente em vigor.
Destarte, e em suma, a prisão preventiva é, salvo melhor entendimento, legal, por ter sido aplicada pela competente autoridade judiciária, por crimes que fundamentam a sua aplicação, sem ter caducado desde a sua aplicação.
Termos em que, salvo melhor entendimento, a providência de habeas corpus deve ser indeferida e deve o arguido aguardar os ulteriores termos do processo em prisão preventiva”.
3. Da certidão junta consta,
1. o arguido foi detido a 26.11.2024 e submetido a 1.º interrogatório de arguido detido, no final, por despacho de 28.11.2024 foi-lhe aplicada a medida de coacção de prisão preventiva, fortemente indiciado pela prática de,
- 1 (um) crime de abuso sexual de crianças agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 60 (sessenta) crimes de abuso sexual de crianças agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 2, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 1 (um) crime de abuso sexual de crianças agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 2, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- pelo menos 4 (quatro) crimes de abuso sexual de crianças agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- pelo menos 2 (dois) crimes de abuso sexual de crianças agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 2, e 177.º, n.º 2, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 1 (um) crime de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 2, e 177.º, n.º 2, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 1 (um) crime de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 2, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal;
- 91 (noventa e um) crimes de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas a) e b)), por referência ao artigo 171.º, n.º 2, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal;
- 1 (um) crime de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 1, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal e,
- 2 (dois) crimes de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 2, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal;
- 2 (dois) crimes de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 2, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal;
2. a 27.5.2025 foi deduzida acusação pública contra o arguido, constando do seu intróito que “pese embora ainda não se encontre junto ao inquérito o relatório de perícia à personalidade (…) tendo presente que a medida de coacção de prisão preventiva se extingue no dia 28.5.2025, sem que seja deduzida acusação, impõe-se proferir despacho de encerramento de inquérito”.
E, assim foi o arguido acusado, como autor imediato, na forma consumada, em concurso real, pela prática de,
- 1 (um) crime de abuso sexual de crianças agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 94 (noventa e quatro) crimes de abuso sexual de crianças agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 2, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 1 (um) crime de abuso sexual de crianças agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 2, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 16 (dezasseis) crimes de abuso sexual de crianças agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 267 (duzentos e sessenta e sete) crimes de abuso sexual de crianças agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 2, e 177.º, n.º 2, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 78 (setenta e oito) crimes de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 2, e 177.º, n.º 2, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 42 (quarenta e dois) crimes de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 2, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal;
- 186 (cento e oitenta e seis) crimes de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 1, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal;
- 1 (um) crime de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 1, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal e,
- 1 (um) crime de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 2, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal.
4. Convocada a Secção Criminal e notificados o Ministério Público e o mandatário/defensor do arguido, procedeu-se à realização da audiência, com o formalismo legal e em conformidade com o disposto nos artigos 11.º/4 alínea c), 223.º/1, 2 e 3 e 435.º CPPenal.
Cumpre decidir.
II. Fundamentação
1. O circunstancialismo factual relevante para o julgamento resulta da petição de habeas corpus, da informação e da certidão que a acompanha é a seguinte:
- o arguido, detido a 26.11.2024, submetido a 1.º interrogatório de arguido detido, viu, por despacho de 28.11.2024 ser-lhe aplicada a medida de coacção de prisão preventiva, fortemente indiciado pela prática de,
- 1 (um) crime de abuso sexual de crianças agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 60 (sessenta) crimes de abuso sexual de crianças agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 2, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 1 (um) crime de abuso sexual de crianças agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 2, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- pelo menos 4 (quatro) crimes de abuso sexual de crianças agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- pelo menos 2 (dois) crimes de abuso sexual de crianças agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 2, e 177.º, n.º 2, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 1 (um) crime de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 2, e 177.º, n.º 2, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 1 (um) crime de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 2, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal;
- 91 (noventa e um) crimes de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas a) e b)), por referência ao artigo 171.º, n.º 2, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal;
- 1 (um) crime de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 1, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal e,
- 2 (dois) crimes de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 2, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal;
- 2 (dois) crimes de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 2, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal;
- a 27.5.2025 foi deduzida acusação pública contra o arguido, constando do seu intróito que “pese embora ainda não se encontre junto ao inquérito o relatório de perícia à personalidade (…) tendo presente que a medida de coacção de prisão preventiva se extingue no dia 28.5.2025, sem que seja deduzida acusação, impõe-se proferir despacho de encerramento de inquérito”.
E, assim foi o arguido acusado, como autor imediato, na forma consumada, em concurso real, pela prática de,
- 1 (um) crime de abuso sexual de crianças agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 94 (noventa e quatro) crimes de abuso sexual de crianças agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 2, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 1 (um) crime de abuso sexual de crianças agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 2, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 16 (dezasseis) crimes de abuso sexual de crianças agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 267 (duzentos e sessenta e sete) crimes de abuso sexual de crianças agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 171.º, n.º 2, e 177.º, n.º 2, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 78 (setenta e oito) crimes de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 2, e 177.º, n.º 2, alíneas a) a c), todos do Código Penal;
- 42 (quarenta e dois) crimes de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 2, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal;
- 186 (cento e oitenta e seis) crimes de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previstos e punidos pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 1, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal;
- 1 (um) crime de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 1, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal e,
- 1 (um) crime de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável agravado, previsto e punido pelos artigos 26.º, 30.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, alíneas b) e c), por referência ao artigo 171.º, n.º 2, todos do Código Penal, e 177.º, n.º 1, alíneas a) a c) do Código Penal.
2. O Direito
1. As razões do requerente.
Invocando a alínea c) do n.º 2 do artigo 222.º CPPenal, pretende o peticionante se declare ilegal a prisão preventiva e, que por isso, seja restituído à liberdade.
Estrutura esta sua pretensão no facto de que tendo sido aplicada a medida de coacção de prisão preventiva por despacho de 28.11.2024, até ao dia 29.5.2025 não tinha ainda sido deduzida acusação contra si, estando assim excedido o prazo máximo de 6 meses, previsto no artigo 215.º/2 CPPenal.
2. O texto legal.
O habeas corpus é um meio, procedimento, de afirmação e garantia do direito à liberdade, cfr. artigos 27.º e 31.º da CRP, constituindo uma providência expedita e excecional – a decidir no prazo de oito dias em audiência contraditória, cfr. Artigo 31.º/3 da CRP – para fazer cessar privações da liberdade ilegais, isto é, não fundadas na lei, sendo a ilegalidade da prisão verificável a partir dos factos documentados no processo.
Sobre o pedido de habeas corpus por prisão ilegal, dispõe o artigo 222.º CPPenal que,
“1 - A qualquer pessoa que se encontrar ilegalmente presa o Supremo Tribunal de Justiça concede, sob petição, a providência de habeas corpus.
2 - A petição é formulada pelo preso ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos, é dirigida, em duplicado, ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, apresentada à autoridade à ordem da qual aquele se mantenha preso e deve fundar-se em ilegalidade da prisão proveniente de:
a) Ter sido efetuada ou ordenada por entidade incompetente;
b) Ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite; ou
c) Manter-se para além dos prazos fixados pela lei ou por decisão judicial”.
São taxativos os pressupostos do habeas corpus - que também tem consagração constitucional, cfr. artigo 31.º da CRP.
Enquanto no Decreto Lei 35.043, de 20 de outubro de 1945, «o habeas corpus é um remédio excepcional para proteger a liberdade individual nos casos em que não haja qualquer outro meio legal de fazer cessar a ofensa ilegítima dessa liberdade», hoje, e mais nitidamente após as alterações de 2007, com o aditamento do n.º 2 ao artigo 219.º do CPPenal, o instituto não deixou de ser um remédio excecional, mas coexiste com os meios judiciais comuns, nomeadamente com o recurso.
A providência de habeas corpus que não se confunde com o recurso, nem com os fundamentos deste, como diz Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II, Lisboa, Editorial Verbo, 1993, 260, o habeas corpus “não é um recurso, é uma providência extraordinária com a natureza de acção autónoma com fim cautelar, destinada a pôr termo em muito curto espaço de tempo a uma situação de ilegal privação de liberdade”.
Convém ter presente, como se refere no artigo 31.º/1 CRP, que “haverá habeas corpus contra o abuso de poder, por virtude de prisão ou detenção ilegal, a requerer perante o tribunal competente.” Ou seja, esta providência, que inclusivamente pode ser interposta por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos, artigo 31.º/2 CRP, tem apenas por finalidade libertar quem está preso ou detido ilegalmente e, por isso, é uma medida excecional e muito célere.
De resto, quando se aprecia a providência de habeas corpus não se vai analisar o mérito da decisão que determina a prisão, nem tão pouco erros procedimentais (cometidos pelo tribunal ou pelos sujeitos processuais) já que esses devem ser apreciados em sede de recurso, mas tão só incumbe decidir se ocorrem quaisquer dos fundamentos indicados no artigo 222.º/2 CPPenal.
O habeas corpus não serve para discutir decisões proferidas em outros Tribunais, mormente nos Tribunais de 1.ª instância, que aplicaram pena de prisão ao peticionante.
Irregularidades que aí possam ter sido praticadas, verificando-se os respectivos pressupostos deverão ser impugnadas pelos meios próprios.
E, naturalmente, como, de resto, é jurisprudência constante e pacífica deste Tribunal, para que possa merecer acolhimento o pedido de habeas corpus é ainda necessário que a ilegalidade da prisão seja actual - actualidade reportada ao momento em que é apreciado o pedido.
E, assim, a questão a decidir, nesta sede, reporta-se, tão só, à questão de saber se a prisão se mantém, ou não, para além dos prazos fixados na lei.
3. Baixando ao caso concreto.
O arguido não coloca em causa que no caso concreto o aludido prazo máximo da prisão preventiva é de 6 meses.
Também não coloca em causa que o início da contagem do prazo máximo de prisão preventiva se inicia com a prolação do despacho que a decreta.
E, bem.
Com efeito a contagem não se inicia na data da detenção, mas apenas com a prolação do despacho que decreta a prisão preventiva.
Este é o entendimento repetido, invariavelmente, por este Supremo Tribunal, cfr. por ser o mais recente o acórdão de 31.10.2024, processo 6/23.1PJLRS, consultado no site da dgsi.
Apenas coloca em causa que, iniciado, então a contagem do prazo a 28.11. 2024, a 29.5.2025 - já depois de completado o prazo máximo de 6 meses, no caso, cfr. artigo 215.º/2 CPPenal - ainda não tenha sido deduzida acusação.
No entanto, como resulta da mera literalidade do artigo 215.º/1 CPPenal, o momento decisivo é aqui “sem que tenha sido deduzida acusação”.
Entendimento, invariavelmente, também, entendido neste Supremo Tribunal, cfr. por ser o mais recente, também, acórdão de 30.4.2025, processo 634/24.8PILRS, consultado, também, nesta data, no site da dgsi.
O que o arguido nem sequer coloca, também, em causa, de forma expressa.
A sua questão centra-se no facto de a acusação não ter sido deduzida até 29.5. Quando afinal foi a 27.5. Facto de que ainda não tinha conhecimento. Nem o arguido, nem o advogado.
Factos que para o caso não relevam, de todo.
A notificação da acusação, o seu conhecimento por parte do arguido não assume aqui qualquer relevo.
E, de facto a acusação tendo sido deduzida a 27.5, quando o prazo máximo dos 6 meses se atingia a 28.5, foi-o em tempo.
Está, pois, perante o exposto, a presente providência votada ao insucesso.
Não é caso de a prisão preventiva se manter para além do prazo fixado na lei. No caso o prazo máximo até à prolação da acusação.
III. Decisão
Pelo exposto, acordam nesta Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em indeferir a presente providência de habeas corpus apresentada pelo peticionante AA.
Custas pelo requerente, fixando-se em 4 UC, a taxa de justiça, cfr. n.º 9 do artigo 8.º do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III anexa.
Processado em computador, elaborado e revisto integralmente pelo Relator (artigo 94.º/2 CPPenal), sendo assinado pelo próprio, pelos dois Senhores Juízes Conselheiros Adjuntos e pela Senhora Juíza Conselheira Presidente.
Supremo Tribunal de Justiça, 26.6.2025
Ernesto Nascimento - Relator
Vasques Osório – Juiz Conselheiro Adjunto
Jorge Gonçalves - Juiz Conselheiro Adjunto
Helena Moniz – Juíza Conselheira Presidente