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STRESS
DANO NÃO PATRIMONIAL
INDEMNIZAÇÃO
DIREITO AO BOM NOME
HONRA
Sumário
I – Juridicamente, e no estrito campo civilístico, pode qualificar-se o stress como um dano psíquico ou emocional, ressarcível como perda não patrimonial quando seja susceptível de afectar gravemente o bem-estar da pessoa ; II – Concretizando, ultrapassados os limites da normalidade, com consequente conversão num estado clínico de sofrimento psíquico, o stress surge como indemnizável enquanto dano não patrimonial, nos quadros do transcrito artº. 496º, do Cód. Civil ; III - Estando-se perante stress causado por injúrias e difamações, a sua indemnizabilidade enquanto dano não patrimonial depende do grau de seriedade e relevância do impacto na pessoa afectada ; IV - E isto, desde logo, na consideração de que as ofensas á honra, tal como as resultantes de difamação ou injúria, determinam ou incluem, automaticamente, o stress causado, sem que este careça de ser alegado como concreto e efectivo dano autónomo ; V – In casu, tendo em consideração a reiterada imputação das ofensas ao bom nome das Autoras, a divulgação operada por vários meios (cartas, e-mails), a constatação de que as mesmas, num juízo de normalidade e de experiência comum, não podem deixar de provocar um dano no seu bem jurídico honra (merecedor, por si só, de uma tutela constitucionalmente garantida), bem como o grau de afectação atingido ao provocarem uma situação de stress qualificada como enorme, entendemos lograr-se como bastante ao preenchimento do quadro de relevância e gravidade legalmente exigíveis para que mereçam tutela ressarcitória em sede de dano não patrimonial. Sumário elaborado pelo Relator – cf., nº. 7 do artº. 663º, do Cód. de Processo Civil
Texto Integral
ACORDAM os JUÍZES DESEMBARGADORES da 2ª SECÇÃO da RELAÇÃO de LISBOA o seguinte 1:
I – RELATÓRIO
1 – AA e BB, ambas com residência profissional na ..., Cacém, intentaram a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra:
• CC, residente na ... ..., Agualva-Cacém,
deduzindo petitório no sentido do Réu ser condenado a pagar, a cada uma delas:
a. 5.000,00 € (cinco mil euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais.
Para tanto, alegaram, em resumo, o seguinte:
• exercem a função de gestoras de condomínios na sociedade comercial Domuscacém – Administração de Condomínios, Unipessoal, Lda. que administra o condomínio onde o Réu é condómino e reside ;
• o Réu dirige cartas e e-mails às AA., à sociedade que é entidade patronal das AA., ao seu gerente e aos condóminos e antigos condóminos do prédio ;
• contendo tais comunicações juízos e referindo factos, muitos deles falsos ou deturpados, que põem em causa o bom nome das Autoras ;
• o Réu, aproveitando o facto de ser beneficiário de apoio judiciário, usa e abusa dos meios judiciais para transtornar as Autoras e sua entidade patronal ;
• obrigando as Autoras a, por diversas vezes, se deslocarem ao Tribunal ou à esquadra da PSP ;
• as AA. toda a vida residiram e fizeram a sua vida no Cacém, conhecendo muitas pessoas naquela localidade ;
• sendo que começam a circular rumores de que as Autoras são desonestas, sendo que tal facto poderá prejudicar gravemente a sua credibilidade e bom nome ;
• o Réu, com a sua conduta, tem intenção de prejudicar a atividade profissional das AA. e, consequentemente, o seu sustento e do seu agregado familiar ;
• tais injúrias e difamações têm provocado um enorme stress nas Autoras, tanto mais que, para além de poderem prejudicar o seu bom nome na localidade onde desde sempre fazem a sua vida, podem prejudicá-las perante a sua entidade patronal ;
• sendo que todas estas preocupações, stress e horas perdidas em Tribunais e Esquadras da PSP são prejudiciais à saúde e bem-estar das Autoras, que para além das normais preocupações decorrentes da gestão de condomínios ainda têm o stress acrescido inerente às acusações difamatórias e injuriosas difundidas pelo Réu ;
• a actuação do Réu põe em causa a reputação e bom nome das Autoras, tanto a nível pessoal como profissional e é suscetível de por em causa a confiança na capacidade das mesmas no cumprimento das suas obrigações e exercer a sua atividade comercial.
2 – Devidamente citado, veio o Réu apresentar contestação, referenciando, em súmula, que:
• nunca difamou ou injuriou as Autoras ;
• os factos por estas alegados não correspondem à verdade, ou distorcem-na.
Conclui, no sentido da improcedência da acção, com a sua consequente absolvição do pedido.
3 – Conforme despacho de 09/05/2022, fo(i)(ram):
• dispensada a realização da audiência prévia ;
• fixado o valor da causa ;
• proferido saneador stricto sensu ;
• definidos o objecto do litígio e os temas da prova ;
• foram apreciados os requerimentos probatórios.
4 – Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, com observância do formalismo legal
5 – Posteriormente, foi proferida sentença, datada de 15/01/2024, traduzindo-se a Decisão nos seguintes termos:
“Em face do exposto, vistas as já indicadas normas jurídicas e os princípios expostos, o Tribunal julga a ação totalmente improcedente, por não provada, e consequentemente absolve o R. do pedido.
*
Fixa-se o valor da causa em €10.000,00 (dez mil euros), cfr. arts. 296º, 297º, n.º 1 e 306º do C.P.C.
*
Custas pelas AA. – art. 527º do C.P.C.
Registe e notifique”.
6 – Inconformadas com o decidido, as Autoras interpuseram recurso de apelação, por referência à sentença prolatada.
Apresentaram, em conformidade, as Recorrentes as seguintes CONCLUSÕES:
1. “Vem o presente recurso interposto da douta sentença de fls. … que absolveu o réu do pedido.
2. Não concordam as apelantes com a supra descrita decisão, pelos motivos e fundamentos que passam a expor.
3. Na sentença ora em apreço o Tribunal a quo considera que “pese embora da alegação e prova das expressões proferidas, as AA. não lograram alegar e provar danos relevantes, patrimoniais ou não patrimoniais, que daí tenham resultado e que se tratassem de danos indemnizáveis”
4. Com a sentença ora em análise, recai sobre as autoras um enorme sentimento de injustiça e de que estes actos ilícitos ficam impunes.
5. Perante esta sentença, qualquer pessoa tem carta branca para insultar e ofender outra gratuitamente, difundir esses insultos e ofensas por terceiros e sair impune.
6. As autoras foram insultadas e ofendidas na sua honra e bom nome, de forma reiterada e objectivamente lesiva dos seus direitos de personalidade, e não têm direito a qualquer compensação pelo facto.
7. No caso em apreço, os insultos e ofensas eram constantes e reiterados, situação objectivamente causadora de dano a qualquer pessoa honrada.
8. Danos não patrimoniais atingem bens, como a vida, a saúde, a liberdade, a honra, o bom nome, a reputação, e dos quais resulta o inerente sofrimento físico e psíquico, o desgosto pela perda, os vexames, a perda de prestígio ou reputação, tudo constituindo prejuízos que não se integram no património do lesado, apenas podendo ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo mais uma satisfação do que uma indemnização, assumindo o seu ressarcimento uma função essencialmente compensatória, embora sob a envolvência de uma certa vertente sancionatória ou de pena privada.
9. O que é facto, dado como provado, é que o réu proferiu e difundiu, reiteradamente, afirmações que põem em causa a honra e o bom nome das autoras, no âmbito da actividade profissional de ambas.
10. As autoras alegam, nomeadamente que “Esta espécie de assédio por parte do réu tem sido uma constante.”; que “Sobre qualquer comunicação ou convocatória que a Domuscacém envie, existe uma resposta por parte do réu onde são feitas acusações infundadas e injúrias e difamações contra as autoras.”.
11. As autoras alegam ainda que tiveram que prestar declarações por diversas vezes perante as Autoridades por força de processos crime iniciados pelo réu, sendo certo que o estigma social que recai sobre qualquer cidadão comum, consequente de um processo crime contra si, é passível de causar enorme preocupação e stress.
12. É ainda alegado pelas autoras que todas estas preocupações, stress e horas perdidas em Tribunais e Esquadras da PSP, são prejudiciais à saúde e bem-estar das autoras.
13. É razoável concluir que qualquer pessoa, dependendo a sua subsistência e a do seu agregado familiar do seu salário, sofre enorme stress e angústia quando a estabilidade do seu emprego é ameaçada.
14. No caso em apresso, estando alegado e provado que as autoras residem e trabalham no Cacém, sendo no meio dessa localidade e entre pessoas dessa localidade que o réu difunde as suas injúrias, subsumindo esta realidade fáctica à cláusula geral da diligência de um bom pai de família, a que alude o artigo 487.º, n.º 2, deverá aferir-se que houve dano grave ao bom nome das autoras e que os actos praticados pelo réu são suficientes para causar enorme ansiedade e stress, stress esse que tem consequências físicas e psicológicas em qualquer homem comum.
15. De realçar que foi alegado e provado que os actos praticados pelo réu não se resumiram a uma, duas ou três ocasiões.
16. Os actos praticados pelo réu eram constantes, reiterados e persistentes, sendo as injurias e acusações graves e a forma como se dirigia às autoras violenta e agressiva, sendo tais factos notórios nos documentos juntos aos autos.
17. Como se mostra provado nos presentes autos, o réu “apelidou” as autoras de mentirosas, vigaristas, desonestas, falsas, e fê-lo por escrito, com conhecimento de diversas pessoas das relações profissionais das mesmas e por inúmeras vezes.
18. Qualquer pessoa normal e honesta, ao receber com regularidade correspondência desta natureza, sofrerá stress e ansiedade para além do normal e razoável.
19. O Tribunal menosprezou as consequências da conduta do réu.
20. Caso o Tribunal se tivesse colocado no lugar das autoras, a receber cartas e e-mails ofensivos com regularidade, teria necessariamente chegado a uma conclusão diferente da constante na decisão em apresso.
21. Caso o Tribunal se tivesse colocado na posição das autoras, sabendo que o cumprimento das suas funções profissionais iria resultar em insultos e injúrias, teria certamente decidido de forma diferente.
22. Considera o Tribunal a quo, não ser o stress um dano suficiente para ser tutelado juridicamente e para ser indemnizável. No entanto, a comunidade médica discorda desta afirmação.
23. efectivamente, pode ler-se em diversos documentos médicos e já é do conhecimento comum, que, quando em excesso, o stress pode ter um impacto negativo no nosso humor, bem-estar físico e mental, ou relações interpessoais.
24. O stress persistente leva a alterações no organismo: no sistema nervoso autónomo; no sistema cardiovascular; na coagulação; nos fatores de imunidade.
25. Apesar do stress não ser considerado um problema de saúde mental, pode agravar ou desencadear problemas como a ansiedade ou depressão.
26. Na população em geral, o stress tem sido associado a um risco 30% superior de desenvolver problemas cardiovasculares.
27. O tribunal a quo até poderia, analisando a questão sob juízos de equidade, atribuir às autoras um valor inferior ao peticionado, no entanto, não atribuir qualquer valor de indemnização é deixar impune a conduta grave do réu e não atribuir qualquer valor ao Direito ao bom nome, que é um Direito que merece tutela Constitucional.
28. Nessa medida, salvo o devido respeito, entendem as autoras que, uma vez que a indemnização peticionada se refere a danos não patrimoniais, não fundamenta o Tribunal a quo porque entende não ser a conduta do réu, conduta essa lesiva dos direitos de personalidade das autoras, geradora de indemnização.
29. Entendem as autoras que o caracter reiterado e agressivo da conduta do réu não foi tido em consideração pelo Tribunal, sendo que, tal característica é evidenciadora da gravidade dos danos sofridos e alegados pelas autoras.
30. Termos em que, só nos resta concluir que a sentença ora em apreço, viola os artigos 154.º e 607.º, n.ºs 4 e 5, do CPC, bem como os artigos 70.º, 484.º e 483.º, 562.º e 566.º, todos do Código Civil”.
Conclui pela procedência do recurso, revogando-se a sentença recorrida, com consequente condenação do Réu no pagamento da peticionada indemnização.
7 – O Apelado/Recorrido Réu apresentou contra-alegações, nas quais formulou as seguintes Conclusões:
“A) A Douta sentença do tribunal a quo não viola os arts 154º e 607º nº 4 e 5 CPC.
B) O fato das AA. não concordarem com a fundamentação apresentada não equivale à falta de fundamentação.
C) Esteve bem o Douto Tribunal a quo ao julgar e fundamentar a inexistência de alegação e prova de danos suscetíveis de indemnização,
D) Dispõe o art. 483º do C. Civil que: “1. Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.
E) Deste preceito resulta que são vários os elementos constitutivos da responsabilidade civil por factos ilícitos, a saber: o facto, a ilicitude, a imputação do facto ao lesante, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano.
F) Efetivamente, dos autos não resulta que dos factos praticados pelo R. e do seu comportamento tenham advindo danos patrimoniais ou não patrimoniais para as AA., os quais constituem pressuposto essencial da responsabilidade civil
G) Às AA. incumbia, assim, a prova da prática, pelo R., de um facto voluntário, ilícito, culposo e danoso, cabia-lhes também a prova da existência de danos, e que existia nexo de causalidade entre o facto e os danos
H) Com efeito, não basta a violação de direitos ou interesses legalmente protegidos sendo imprescindível que tal ofensa gere danos – cfr. arts. 483º e 484, in fine, do Código Civil.
I) Nos termos do art. 342º CC Àquele que invoca um direito cabe fazer prova dos factos constitutivos do direito alegado.
J) As AA. não alegaram e muito menos provaram a existência de danos.
K) Não se provou que as afirmações do R. tenham provocado um enorme stress nas AA. ou que tenham prejudicado a saúde e o bem-estar
L) De forma mais abrangente não se provou que as AA., em consequência do comportamento do R., tenham sofrido quaisquer consequências negativas e portanto, que tenham sofrido quaisquer danos.
M) Não existiu na petição a alegação de qualquer dano indemnizável, apenas uma breve referencia à existência de stress e de rumores no local onde habitam e trabalham (nada disso provado saliente-se),
N) Alegação de um conceito indeterminado como stress ou incómodo não corresponde à real invocação da existência de um dano e não foi carreado para o processo qualquer meio de prova donde sequer se concluísse pela existência de stress ou que esse eventual stress tivesse gerado na esfera das AA. algum tipo de dano;
O) Não existindo sequer alegação de dano nem prova do mesmo como podem as AA. pretender que lhes seja arbitrada uma indemnização.
P) Não estando preenchido um dos pressupostos fundamentais da responsabilidade civil – existência de danos – não pode considerar-se existir obrigação de indemnizar por parte do R., razão pela qual soçobra o recurso, devendo manter-se a sentença do tribunal a quo”.
Conclui, no sentido da improcedência do recurso interposto, com consequente manutenção da sentença apelada.
8 – O recurso foi admitido por despacho de 24/06/2024, como apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.
9 – Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar, valorar, ajuizar e decidir.
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II – ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO
Prescrevem os nºs. 1 e 2, do artº. 639º do Cód. de Processo Civil, estatuindo acerca do ónus de alegar e formular conclusões, que:
“1 – o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão. 2 – Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar: a) As normas jurídicas violadas ; b) O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas ; c) Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada”.
Por sua vez, na esteira do prescrito no nº. 4 do artº. 635º do mesmo diploma, o qual dispõe que “nas conclusões da alegação, pode o recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objecto inicial do recurso”, é pelas conclusões da alegação das recorrentes Apelantes que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Pelo que, no sopesar das conclusões expostas, a apreciação a efectuar determina, em sede de enquadramento jurídico, aferir acerca da existência de danos sofridos pelas Autoras conducentes à responsabilização extracontratual do Réu, e ao consequente ressarcimento em sede de dano não patrimonial.
Na apreciação deste, conhecer-se-á, fundamentalmente, acerca:
• Dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, aquiliana ou por factos ilícitos ;
• Da indemnização por danos não patrimoniais ;
• Eventualmente, da fixação do quantum indemnizatório ou ressarcitório.
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III - FUNDAMENTAÇÃO
A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Na sentença recorrida/apelada, foi considerado como PROVADO o seguinte:
i. No dia 13 de novembro de 2020, foi rececionada nas instalações da entidade patronal das autoras uma carta endereçada ao seu sócio gerente, remetida pelo réu.
ii. Uma vez que o sócio gerente não se desloca todos os dias à loja da DomusCacém, são as funcionárias daquela empresa quem abre e lê a correspondência a si dirigida recebida na loja, até porque a maioria dessa correspondência diz respeito aos Condomínios por elas gerido.
iii. Neste caso foi a segunda autora, BB, quem abriu e leu a carta remetida pelo réu, tendo, depois disso, e como é sua obrigação, dado conhecimento da mesma ao seu destinatário.
iv. Nesta carta, o réu começa por exigir que seja enviada cópia da mesma a todos os condóminos do n.º 1 da ....
v. Ao longo das 46 páginas que constituem a carta enviada pelo réu, pode-se ler, nomeadamente que: - “E CHEGADOS AQUI, CHEGAMOS A MAIS UMA FUNCIONÁRIA MENTIROSA DA DOMUSCACÉM:”; - “Cumpre recordar a resposta da Domuscacém que não é nada mais que MAIS UMA MENTIRA E REVELA O CARAC'TER DESONESTO DAS FUNCIONÁRIAS DA VOSSA EMPRESA.”; - “Eis parte da Resposta mentirosa, falsa e fantasiosa escrita pela vossa funcionária ...”; - “(…) a Domuscacém contrata pessoas mentirosas para enganar os condóminos e mentir :”; - Na página 13, ponto iii), o réu, de uma forma um pouco confusa, alega que as autoras ocultaram alegados desvios de dinheiro do Condomínio; - “… SABENDO SER FALSO, A SUA FUNCIONÁRIA QUE FORMULOU A ATA nº 29 ALEGANDO FALSAMENTE QUE HOUVERA QUÓRUM PARA DEFRAUDAR E FALSEAR A ATA nº 29 …”; - “(…) … e AA …… ambas as pessoa que ocultaram a todos os condóminos que a Domuscacém estava a exercer ilegalmente a administração desde o dia 15/01/2018 … tendo ambos mentido ainda sobre os acontecimentos históricos da reunião de 20/02/2018 … tendo inclusive ambos contado uma versão diferente a aquela que a mentirosa AA tinha atestado perante o agente DD (Matricula nº ......) da PSP no dia 16/08/2020.” (sublinhado nosso); - “ i) É comprovativo que na reunião de 20/02/2018 houve conluio entre EE, FF, as funcionárias da Domuscacém AA e BB … no sentido que foi ocultado aos condóminos presentes na A. G. de 20/02/2018, incluindo o Sr. GG … que a Domuscacém estava a exercer desde o dia 15/01/2018 as funções de administração, ilegalmente;” - “DO CARÁCTER MENTIROSO DAS FUNCIONÁRIAS DA DOMUSCACÉM – nomeadamente de AA:”; - “A AA, gestora da Domuscacém (…) ocultou a ilegalidade da Domuscacém (…) falseou a Ata nº 29 para dar a falsa impressão a todos os condóminos (presentes e ausentes) que tinha havido quórum (obviamente para registar votos e deliberações fraudulentas) e que a A. G. tinha sido realizada em 2.ª Convocatória (sabendo ser falso).” - “A CONTESTAÇÃO (AS MENTIRAS) FORMULADAS NO PROCESSO DE IMPUGANÇÃO POR AMBOS OS MENTIROSOS E VIGARISTAS, AA E HH (1.º Esq.), SÃO CLARAS E ATÉ CONTRADIZEM OQUE A AA TINHA ATESTADO ANTERIORMENTE PERANTE A PSP. VEJAMOS AS MENTIRAS DESTAS DUAS PESSOA A FIM DE CONVENCER O TRIBUNAL DAS SUAS MENTIRAS E A FIM DE MANTER DELIBERAÇÕES ILEGÍTIMAS. HÁ QUE NOTAR QUE ESTAS DUAS PESSOAS MENTIROSAS E VIGARISTAS, ATÉ OCULTARAM AO TRIBUNAL SOBRE A ENTREGA ILEGITIMA DE 15/01/2018 ……”; - “VEJAMOS AS NOVAS DECLARAÇÕES DE AA PERANTE A P.S.P. (…). Esta senhora (…) ocultou novamente perante a PSP a realidade (…). Pois até mentiu … porque é mentirosa … que a Domuscacém começou a exercer as funções a partir de março 2018 (…). Aqui temos uma parte-mentira de AA para encobrir as ilegalidades da Domuscacém.”.
vi. Foi proferido acórdão pelo Tribunal da Relação de Lisboa no âmbito da Apelação 13517/18, em que é recorrente/A. CC e recorridos/RR. II, JJ, FF, GG, KK, LL e MM, no âmbito de ação em que o A. formulou o pedido de que se declare a nulidade de todas as deliberações da assembleia de condóminos do prédio urbano sito no..., Agualva Cacém, realizada em 20.02.2018.
vii. No acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa no âmbito da Apelação 13517/18 foi acordado conceder provimento ao recurso e “revogar a decisão recorrida e, julgando a acção parcialmente procedente, declarar a nulidade das aludidas deliberações, tomadas na assembleia de condóminos realizada em 20/2/2018.”.
viii. Na carta datada de 16.11.2020, o R, diz, nomeadamente:
- “(…) no casos da elaboração de Atas Fraudulentas e sobre Atas que descrevem falsidades, como as que tem sido elaboradas pelas suas funcionárias mentirosas e vigaristas, como AA, BB (…)”;
- “Ora bem, sendo causa comum que houve um conluio secreto entre a vossa funcionária AA e HH e II, na noite de 15/01/018... após a assembleia dessa mesma noite para que fosse ilegalmente feita toda a entrega da anterior administração, sem o conhecimento dos restante condóminos (…)”;
- “Antes de concluir, vejamos como comportam uma ou duas mulher(es) mentirosa(s) e vigarista(s) num assembleia de condóminos. Ocultam a verdade aos condóminos presentes que a sua empresa já estava ilegalmente a exercer as funções da administração ... e depois falseiam uma Ata com falsidades tais como: (1) houve quórum da assembleia sabendo ser falso julgando que todos os condóminos presentes são pessoas estupidas falsas de serem enganado(a)s ... e (2) que a assembleia realizou-se em 2ª convocatória sabendo ser falso, para criar uma Ata com votos de deliberações falas a fim de defraudar todos os condóminos do prédio e (3) sabendo que há pessoas que não tem procurações nem são parte legitimas, ocultam tal facto na Ata para criar a falsa ideia de um quórum deliberativo, de facto inexistente,”;
- “E depois, vem mais mentiras dessa mesma pessoa. Sabendo não ser proprietária de qualquer imóvel, contesta uma acção, ... finalmente afirma que tinha mentido anteriormente e que a assembleia tinha de facto sido realizada em 1ª convocatória (confissão que foi mentirosa em conluio com a sua colega em terem ambas formulado uma Ata falseada) ... e mente novamente na sua contestação que toda a gente tinha estado presente na assembleia pelas 20H30, e que houvera quórum naquela hora sabendo ser falso, que era uma mentira ... porque está no seu ADN ser mentirosa e ser vigarista e É ESTE O TIPO DE PESSOA COM CARÁCTER MENTIROSO, QUE UMA EMPRESA que alega ser idónea, TEM COMO GESTORA ... PARA FALSEAR, SER MENTIROSA E SER VIGARISTA, a fim de tentar enganar e ludibriar os condóminos.”;
- “Neste sentido, há que fazer referência ao esquema de vigarice montado pela Domuscacém para vigarizar os condóminos. Mandam para uma assembleia duas vigaristas bem treinadas para elaborarem Atas com acontecimentos históricos falseados (como por exemplo que a assembleia realizou-se mentirosamente em 2ª convocatória) porque tais vigaristas, apercebem-se que a maioria do(s) cidadãos desconhecem a lei e assinam a Ata falseada em boa fé com deliberações de facto inválidas, nulas e ultra vires que, caso não impugnadas, ficam vinculadas e aprejuízo dos restantes condóminos do prédio ... - e assim fica à priori vinculada uma Ata falseada e deliberações vigarizadas. As duas Atas 29 e 30, elaboradas por pessoas vigaristas, enviadas e treinadas pela Domuscacém para estarem presentes numa assembleia para elaborarem tais Atas falseadas; ... são provas desta vossa habitual práctica - desta vossa já habitual vigarice usada para vigarizar os condóminos com deliberações falseadas, a benefício da Domuscacém.”.
ix. O R., constantemente envia cartas e e-mails, dirigidos ao sócio gerente da Domuscacém, ao e-mail geral da Domuscacém ou das autoras e até a todos ou apenas alguns condóminos do condomínio da ...
x. A 10 de Julho de 2021, em resposta a uma convocatória para assembleia geral do Condomínio, o réu enviou para a autora BB, e para três condóminos do Condomínio da ..., um e-mail no qual acusa as autoras, a sua entidade patronal e outros colaboradores da mesma, de serem mentirosos, de falsearem as contas do Condomínio e de desviarem fundos: - “Porque na A. G. do dia 20/02/2018 não informou a gestora AA nem a vossa funcionária BB que de facto, a pessoa com o nome de NN já tinha recebido toda a documentação do condomínio (…) e que tinha havido secretamente uma entrega ilicita (…)”; - “Porque na A. G. do dia 20/02/2018 não informou a gestora AA nem a vossa funcionária BB que a DOMUSCACÉM TINHA RECEBIDO O MONTANTE DE € 3642,03 (…)”; - “(…) CHEGAMOS A MAIS UMA FUNCIONÁRIA MENTIROSA DA DOMUSCACÉM”; - “(…) a resposta da Domuscacém que não é nada mais que MAIS UMA MENTIRA E REVELA O CARAC´TER DESONESTO DAS FUNCIONÁRIAS DA VOSSA EMPRESA (…)”; - “(…) Resposta mentirosa, falsa e fantasiosa escrita pela vossa funcionária …”; - “(…) a Domuscacém contrata pessoas mentirosas e para enganar os condóminos e mentir :”; - “(…) é uma mentira que certamente foi transmitida à dita OO pela vossa mentirosa AA (…)”;- “(…) eram falsidades que foram certamente transmitidas pela mentirosa AA.”.
xi. A Domuscacém enviou um e-mail a todos os Condóminos em sua defesa.
xii. Nesse mesmo dia, 21 de Julho de 2021, o réu respondeu ao e-mail supra, com conhecimento dos outros condóminos do Condomínio da ...
xiii. No referido e-mail o réu acusa a entidade patronal das autoras de desvio de fundos das contas do Condomínio e falsificação das contas.
xiv. A 7 de Setembro de 2021, o réu enviou novo e-mail, dirigido à autora BB, com conhecimento de vários condóminos do Condomínio da ...
xv. No referido e-mail o réu profere as seguintes afirmações, que se transcrevem: “(…) nem o NN, nem AA, nem a BB estão acima da lei para poderem vigarizar quem querem vigarizar ...”; “(…) face ao vosso carácter que nada de idoneidade tem (…)”; “(…) para encobrir mais um roubo de dinheiros por vossa parte e que consta no documento Fraudulento, inter alia outros que foram fabricados, e que a dita embusteira BB enviou para o Ministério Público no dia 28/06/2021 para defraudar a administração da Justiça e para mostrar o seu carácter de aldrabona e claro, de embusteira.”; “(…) FACE À ANULAÇÃO QUE FOI FEITA NO DIA 12/07/2021 PELA EMBUSTEIRA BB (…)”.
xvi. A 20 de Setembro de 2021, o réu enviou novo e-mail para a autora BB, para o email geral da Domuscacém e para seis condóminos do Condomínio da ...
xvii. No referido e-mail o réu profere as seguintes afirmações, que se transcrevem: “(…) para que os condóminos presentes estejam cientes que o que está em discussão são contas fraudulentas elaboradas por vocês e que as mesmas já foram denunciadas perante o Ministério Público (…)”; “Exigo ler esta carta porque os condóminos tem o direito de saber que estão a ser vigarizados para deliberarem sobre contas fraudulentas que estão a ser elaboradas por vigaristas. Pois têm os condóminos presentes nesta assembleia o direito saber que vou gravar esta reunião e que vou impugnar as deliberações desta assembleia porque não posso permitir que vocês vigaristas continuem a apresentar contas fabricadas e fraudulentas. Pois tendo vocês enviado estas contas fraudulentas a todos os condóminos, não pode o Condómino que contestar a acção de impugnação, negar que não sabia que votou a favor de contas fraudulentas para vosso benefício e que os mesmos não tinham sido notificados destas vossas vigarices.”; “Como prova que a BB não passa de uma vigarista e sabe que enviou um documento fraudulento para o Ministério Público (…)”; “Pois não podem vocês, negarem que não sabem que o montante de € 464,93 descrito supra, MENTIROSAMENTE PAGO no dia 20/11/2019, constitui informação falsa e fraudulenta que foi fornecida ao Ministério Público pela dita embusteira (…)”; “(…) e que esta mesma informação que consta nas vossas contas, foi conscientemente contabilizada fraudulentamente para encobrir roubos de dinheiros para o vosso beneficio e ludibriar os condóminos do prédio. Como condómino, não posso permitir que vocês continuem a roubar os dinheiros dos condóminos, para depois alegarem que a culpa é minha, para depois solicitarem “quotas extras” para vosso roubo.”; “(…) cancelaram a reunião com o falso pretexto que havia um problema informático ... a fim de vocês virem agora em Setembro a requerer que os condóminos venham a deliberar e a votar favoravelmente as mesmas vossas contas fraudulentas e os vossos desvios dos dinheiros, dos condóminos.”; “Pois as vossas vigarices tem que ser gravadas e registadas na assembleia desta noite (…) Chegou a hora de revelar aos condóminos as vossas vigarices e trafulhices.”; “(…) para depois ver o que vai alegar o condómino que contestar as vossas contas falsificadas e juntar a mesma ao Ministério Público.”.
xviii. A 22 de Setembro de 2021, o réu enviou novo e-mail para a autora BB, para o email geral da Domuscacém e para três condóminos do Condomínio da ...
xix. No referido e-mail o réu profere as seguintes afirmações, que se transcrevem: “(…) visto que a assembleia em 2ª Convocatória de 12/07/2021 foi anulada na base de mentiras (…)”; “(…) e que me é fácil detectar contabilidade fraudulenta e detectar lançamentos fraudulentos como aqueles que a LDC tem andado a apresentar nas assembleias de condóminos (…)”; “(…) como, idem, detectar documentação e informação falsa, como o documento enviado por si ao Ministério Público (…)”; “(…) TRAFULHAS COMO VOCÊS (…)”; “.... Que a vossa funcionária AA sabe, porque não sendo proprietária de qualquer imóvel no nosso prédio, a fim de proteger os vossos interesses fraudulentos, sem qualquer legitimidade para contestar a acção de impugnação da Ata 29, contestou na mesma e portanto sabe que desde o dia 20/02/2018, vocês tem administrado o prédio ilegalmente: (…)”; “(…) AS DECLARAÇÕES DA BB (requerimento perante o Ministério Público) E AS DECLARAÇÕES DE AA (perante a PSP) teve como objectivo ludibriar a justiça (…)”; “(…) É TAMBEM ÓBVIO QUE AS REFERIDAS DECLARAÇÕES DE AA e DE BB TEM COMO OBJECTIVO LUDIBRIAR A JUSTIÇA .... NO SENTIDO QUE AS MESMAS E QUE A LOJA DO CONDOMÍNIO NÃO SÃO RESPONSÁVEIS PELO ROUBO DAS RECEITAS REFERENTE AOS MESES DE JANEIRO 2018 E FEVEREIRO 2018 E DO MONTANTE DE € 975,51 ... E TIVERAM COMO OBJECTIVO, ÓBVIAMENTE, ENCOBRIR O TRAFULHA DO SÓCIO GERENTE NN (…)”; “....... TUDO BEM FEITO, CONTAS FRAUDULENTAS, DESVIO DE DINHEIROS, DESPESAS FALSIFICADAS, REQUERIMENTOS ENVIADOS AO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA INCRIMINAR OS VIZINHOS DO PRÉDIO ... QUE VOCÊS QUEREM CONTINUAR A ADMINISTRAR E A ENGANAR, PARA VOSSO PROVEITO PRÓPRIO e ILIBAR O DITO NN e a LDC DE QUALQUER ILEGALIDADE E/OU DE DESVIO DE DINHEIROS REFERENTE AOS MESES DE JANEIRO 2018 E FEVEREIRO 2018, não obstante o facto que há documentos contabilísticos que provam a saciedade vossa administração antes do dia 01/03/2018 e desmente a BB e a sua amiga AA. Pois não há qualquer dúvida que o vosso grande motivo para requerer a ractificação das deliberações da Assembleia Geral do dia 20/02/2018, é para que seja deliberado que a Domuscacém só iria começar a exercer a gestão do prédio a partir do dia 01/03/2021 para incriminar HH e II sobre a gestão do prédio até dia 28/02/2021 e como tal justificar o desvio das receitas (Janeiro 2018 e Fevereiro 2018) e o roubo do dinheiro que havia em caixa (€ 975,51) e incriminar os mesmos.”; “(…) vocês sem um contrato legitimo, exercem as vossas funções de forma fraudulenta.”.
xx. A 10 de Outubro de 2021, o réu enviou novo e-mail para a autora BB, para o email geral da Domuscacém e para seis condóminos do Condomínio da ...
xxi. No referido e-mail o réu profere as seguintes afirmações, que se transcrevem: “Sou a juntar o comprovativo de mentiras dita pela AA na reunião do dia 27/09/2021 (…)”; “(…) quero aqui registar VÁRIA MENTIRAS QUE FORAM DITAS PELA SRª AA NA ASSEMBLEIA DO DIA 27/09/2021.... QUE ESTA SENHORA POR SER MENTIROSA, NÃO PODE NEGAR, PORQUE AS SUAS MENTIRAS ESTÃO GRAVADAS, E SÃO AS VOSSAS MENTIRAS QUE FAZEM COM QUE VÁRIOS CONDÓMINOS SÃO POR VÓS ENGANADOS.”; “(…) A Srª AA MENTIU ..... COMO VOLTOU A MENTIR. (…)”; “(…) QUE A AA MENTIU - QUE A CONTA DO CONDOMINIO ESTAVA SEM PROVISÃO E QUE TAIS PAGAMENTOS FORAM DEVOLVIDOS PARA JUSTIFICAR A SUA MENTIRA NA ASSEMBLEIA: (…)”; “(…) E A Srª AA MENTIU AOS CONDÓMINOS PRESENTES PARA OCULTAR A TENTATIVA DO VOSSO FRAUDE . (…)”; “(…) ORA COMO É INEGÁVEL QUE A AA mentiu, porque a verdade é que esse valor de € 324,93 ainda não tinha sido restituído como a AA e a Srª BB bem sabem (…)”; “(…) COMPROVATIVO DA MENTIRA DA AA QUE ANTES DA ASSEMBLEIA JÁ ESTAVA RESOLVIDA A CONTA DO CONDOMINIO (…)”; “(…)...e sabendo deste fraude, a AA conscientemente mentiu. (…)”.
xxii. Já por diversas vezes as autoras tiveram que se deslocar ao Tribunal ou à esquadra da PSP para prestar declarações por força de queixas e processos intentados pelo réu.
xxiii. As autoras trabalham na área da administração de condomínios, sendo o seu local de trabalho e residência no Cacém.
xxiv. O réu propôs diversos processos judiciais contra o Condomínio do prédio sito na Praça da Fraternidade, n.º 1, contra outros condóminos e contra administradores e anteriores administradores do mesmo.
xxv. Todas estas injúrias e difamações têm provocado um enorme stress nas autoras.
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Na mesma sentença, foi CONSIDERADA NÃO PROVADA a seguinte factualidade:
a. O Acórdão da Relação de Lisboa a que o réu faz referência inúmeras vezes nas suas cartas e no qual baseia a sua acusação de ilegitimidade por parte da DomusCacém para administrar o Condomínio, não “anulou todas as deliberações tomadas na Assembleia Geral de 20/02/2018”.
b. A Assembleia objeto da ação em causa realizou-se no dia 20 de Fevereiro de 2018 com a seguinte ordem de trabalhos: ponto um – eleição da administração interna; ponto dois: contas bancárias do condomínio; ponto três – seguro das frações; ponto quatro - apresentação e aprovação do orçamento para os próximos meses; ponto cinco - valor de quotas que cabe a cada condómino, modalidades e prazo de pagamento das mesmas; ponto seis – ponto de situação das dívidas dos condóminos; ponto sete – outros assuntos de interesse geral.
c. No âmbito do ponto um, os condóminos nomearam a senhora FF enquanto administradora adjunta e, ainda no âmbito do ponto um, a essa administradora foram atribuídos poderes para assinar o contrato de prestação de serviços celebrado entre o condomínio e a DomusCacém.
d. O réu, na referida ação judicial pediu que fossem declaradas nulas todas as deliberações tomadas na Assembleia de 20/02/2018, no entanto, ainda em sede de Primeira Instância, foi decidido julgar “verificada a excepção dilatória de ilegitimidade activa, na parte em que se pede que seja declarada a nulidade das deliberações sobre os pontos um e sete da ordem de trabalhos da assembleia de condóminos de 20 de Fevereiro de 2018, absolvendo-se os réus da instância, nessa parte”.
e. Do relatório da sentença, que foi proferida em 12 de Julho de 2019, consta aquela absolvição da instância, tal como do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, a que o réu faz referencia constantemente – “decretada, no despacho saneador, a absolvição dos réus da instância, relativamente ao pedido de nulidade das deliberações constantes dos pontos um e sete (…), a questão a decidir centra-se, pois, na apreciação da invocada nulidade das demais deliberações tomadas na assembleia em causa”.
f. As deliberações constantes dos pontos um e sete permaneceram válidas e eficazes.
g. Na Assembleia realizada a 27 de Setembro de 2021, Assembleia que foi suspensa para continuar em nova data a convocar, as contas apresentadas pelas autoras foram aprovadas pela maioria dos condóminos presentes e representados.
h. O réu gravou a referida assembleia, sem autorização dos demais presentes, após a maioria dos participantes na Assembleia, incluindo as autoras, terem expressamente afirmado que não o autorizavam a gravar a mesma.
i. As autoras toda a vida residiram e fizeram a sua vida no Cacém, conhecendo, por esse motivo, muitas pessoas naquela localidade.
j. Estes juízos ofensivos proferidos pelo réu têm como objetivo prejudicar a atividade profissional das autoras e, consequentemente, o seu sustento e do seu agregado familiar.
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B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
I. DA VERIFICAÇÃO DE ERRO DE JULGAMENTO NA SUBSUNÇÃO JURÍDICA EXPOSTA NA DECISÃO RECORRIDA, TENDO EM CONSIDERAÇÃO OS FACTOS APURADOS
A sentença apelada ajuizou, em súmula, nos seguintes termos:
• Como questão decidenda, urge apurar se existe responsabilidade civil do Réu e, nessa sequência, se existe obrigação de indemnizar as Autoras ;
• Pretendem as Autoras ser indemnizadas pelo Réu pela conduta deste, alegadamente ofensiva da sua reputação e bom nome ;
• O direito ao bom nome e reputação são elementos integrantes do núcleo fundamental dos direitos de personalidade ;
• Os quais são tidos como direitos subjectivos pessoais e absolutos, cuja violação poderá ser geradora de responsabilidade civil ;
• À responsabilidade pela ofensa ao crédito ou bom nome – o artº. 484º, do Cód. Civil – aplica-se o regime da responsabilidade civil por factos ilícitos – os artºs. 483º e segs. do Cód. Civil ;
• O qual tem como elementos constitutivos:
i. O facto ;
ii. A ilicitude ;
iii. A imputação do facto ao lesante ;
iv. O dano ;
v. O nexo de causalidade entre o facto e o dano ;
• Da factualidade provada não resulta, desde logo, a existência do dano, o qual não foi sequer alegado ;
• Com efeito, não resulta da factualidade provada que dos factos praticados pelo Réu e do seu comportamento tenham advindo danos patrimoniais ou não patrimoniais para as Autoras ;
• O que constitui pressuposto essencial da responsabilidade civil ;
• Tendo-se as Autoras limitado a alegar terem sofrido stress (o que resultou provado) ;
• De acordo com o artº. 496º, do Cód. Civil, só são indemnizáveis os danos que, correspondendo a meros incómodos ou aborrecimentos, mereçam a tutela do direito ;
• Apesar da alegação e prova das expressões proferidas pelo Réu, não lograram as Autoras alegar e provar danos relevantes, patrimoniais ou não patrimoniais, que daí tenham resultado e que se tratassem de danos indemnizáveis ;
• Com efeito, a alegação de várias consequências enunciadas resulta manifestamente insuficiente para se considerar verificada a existência de danos relevantes, tal como legalmente previstos e jurisprudencialmente reconhecíveis ;
• Donde se conclui inexistir a pretendida obrigação de indemnizar do Réu, conducente á improcedência da acção.
Na pretensão apelatória apresentada, as Autoras recorrentes alegam, em súmula, o seguinte:
• In casu, as ofensas e insultos foram constantes e reiterados, o que configura situação objectivamente causadora de dano a qualquer pessoa honrada ;
• Atenta a factualidade provada deve concluir-se ter ocorrido dano grave ao bom nome das Autoras, revelando-se os actos praticados pelo Réu como suficientes para causar enorme ansiedade e stress, o qual tem consequências físicas e psicológicas em qualquer homem comum ;
• Qualquer pessoa, normal e honesta, que receba com regularidade correspondência com a imputação que é efectuada pelo Réu sofrerá stress e ansiedade para além do normal e razoável ;
• O stress configura-se como um dano suficiente para merecer tutela jurídica e para ser indemnizável ;
• Conduzindo a sua persistência a alterações no organismo: no sistema nervoso autónomo, no sistema cardiovascular, na coagulação e nos factores de imunidade ;
• Configurando-se o carácter reiterado e agressivo do Réu como característica evidenciadora da gravidade dos danos sofridos pelas Autoras.
Analisemos.
- dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, aquiliana ou por factos ilícitos
No âmbito da responsabilidade civil extracontratual, delitual ou por factos ilícitos, dispõe o nº1 do art.º 483º do Cód. Civil 2 que “aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios, fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação”.
Surgem, deste modo, como pressupostos da responsabilidade civil delitual, os seguintes:
- o facto voluntário;
- a ilicitude da conduta;
- o nexo de imputação do facto ao lesante (culpa);
- o dano;
- o nexo de causalidade entre o facto e o dano.
Por outro lado, dispõe o nº1 do art.º 487º ”é ao lesado que incumbe provar a culpa do autor da lesão, salvo havendo presunção legal de culpa”. Acrescente-se ainda, já no âmbito específico da obrigação de indemnização, dispor o art.º 562º que “quem estiver obrigado a reparar um dano, deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação”, estando a teoria da causalidade adequada prevista de forma clara no art.º 563º.
De uma forma exegética, mas necessariamente breve, analisemos cada um dos pressupostos elencados.
O FACTO
Refere Antunes Varela 3 que o facto praticado pelo agente civilmente responsável consiste, em regra, “num acto, numa acção, ou seja, num facto positivo (apropriação ou destruição de coisa alheia, afirmação de um facto injurioso ou difamatório ( ....), que importa a violação de um dever geral de abstenção, do dever de não ingerência na esfera de acção do titular do direito absoluto”.
Assim, a voluntariedade do facto tem como regra ser o mesmo objectivamente controlável ou dominável pela vontade.
Só o homem, como destinatário dos comandos emanados da lei, é capaz de violar a lei. O elemento básico da responsabilidade é o facto do agente – um facto dominável ou controlável pela vontade, um comportamento ou uma forma de conduta humana, activa ou omissiva - pois que só quanto a factos dessa índole têm cabimento a ideia da ilicitude, o requisito da culpa e a obrigação de reparar o dano nos termos em que a lei a impõe 4. Este facto consiste, em regra, num acto, numa acção, ou seja, num facto positivo, facto positivo para efeitos do citado art. 483º, nº1, do Cód. Civil, mas também pode traduzir-se numa omissão, num non facere, ou seja, num facto negativo. Nestes termos, aduz o art.º 486º que “as simples omissões dão lugar á obrigação de reparar os danos, quando, independentemente dos outros requisitos legais, havia, por força da lei ou de negócio jurídico, o dever de praticar o acto omitido”.
A ILICITUDE
Para que exista responsabilidade é ainda necessário que o facto do agente seja ilícito, em termos de violar um direito de outrem ou em termos de violar a lei que protege interesses alheios.
Entre os direitos subjectivos abrangidos no âmbito de protecção dos direitos de outrem, podemos referir os direitos de personalidade, entre os quais realçamos o direito à integridade física - cfr. nº 1 do art.º 70º -, e a ofensa do crédito ou do bom nome – cf., artº. 484º.
A ilicitude configura-se, deste modo, como a vertente objectiva da violação dos direitos, reportando-se “ao facto do agente, à sua actuação, não ao efeito (danoso) que dele promana, embora a ilicitude do facto possa provir (e provenha até as mais das vezes) do resultado ( lesão ou ameaça de lesão de certos valores tutelados pelo direito) que ele produz” 5.
IMPUTAÇÃO DO FACTO AO LESANTE ( CULPA)
Refere o mesmo autor 6 que “agir com culpa significa actuar em termos de a conduta do agente merecer a reprovação ou censura do direito. E a conduta do lesante é reprovável quando, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, se concluir que ele podia e devia ter agido de outro modo”.
Assim, torna-se necessária a existência de um certo nexo psicológico entre o facto praticado e a vontade do lesante, o qual pode assumir duas formas diferenciadas: o dolo ou a mera culpa. Esta distinção releva para a fixação do montante indemnizatório pois, conforme estatui o art.º 494º, quando a responsabilidade se fundar em mera culpa, e desde que se verifiquem outros pressupostos, “poderá a indemnização ser fixada, equitativamente, em montante inferior ao que corresponderia aos danos causados (....)”.
No que concerne à categoria da mera culpa ou negligência, pode esta ainda desdobrar-se em culpa ou negligência consciente, na qual o agente “prevê a produção do facto ilícito como possível, mas por leviandade, precipitação, desleixo ou incúria crê na sua não verificação, e só por isso não toma as providências necessárias para o evitar”, e na culpa ou negligência inconsciente, na qual o lesante não chega sequer a representar a possibilidade de verificação do facto, seja por “imprevidência, descuido, imperícia ou inaptidão”, mas podia e devia prevê-lo, acaso usasse a diligência que lhe era exigível 7.
Exige-se, assim, que o facto ilícito seja imputado ao agente a título de culpa, isto é, exige-se que o facto foi não só obra do agente, como também devia ele ter agido diversamente. Ter-se-á de verificar um juízo de censura ou reprovação à conduta do agente.
O DANO
O dever de indemnizar só nasce caso alguém tenha sofrido um efectivo prejuízo.
Refere Antunes Varela 8 que o dano “é a perda in natura que o lesado sofreu, em consequência de certo facto, nos interesses (materiais, espirituais ou morais) que o direito violado ou a norma infringida visam tutelar”.
Dispõem ainda os art.º 562º e 564º n.º 1 que quem se encontra constituído na obrigação de indemnizar deve reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação, compreendendo-se nesta não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão.
Tendo em atenção a natureza dos bens jurídicos violados, os danos dividem-se normalmente entre danos patrimoniais e danos não patrimoniais, denominando-se como danos patrimoniais indirectos aqueles que derivam da ofensa de bens não patrimoniais, tal como a vida, o que acontece com os elencados no art.º 495º e os resultantes da perda de capacidade de trabalho 9. Por sua vez, o dano de natureza patrimonial desdobra-se ainda nas modalidades de dano emergente ou positivo e na de lucro cessante ou frustrado, traduzindo-se aquele na perda de um activo que já pertencia ao património do lesado, e este, na frustração do direito a um ganho.
Por outro lado, conforme resulta do art.º 496º, os danos de natureza não patrimonial, sendo insusceptíveis de uma avaliação pecuniária, dado atingirem bens que não integram o património do lesado, apenas podem ser alvo de uma compensação com obrigação pecuniária imposta ao agente, a qual reveste a natureza mais de uma satisfação do que de uma indemnização propriamente dita.
Em termos jurídicos, o dano pode ser definido como “a supressão ou diminuição duma situação favorável que estava protegida pelo direito”, ao qual é atribuída natureza concreta, traduzida na lesão de uma vantagem, de um interesse, e recorrendo-se “à generalidade do património apenas com fins de avaliação”. Pelo que, em desenvolvimento daquela noção, o dano deve ser entendido como “diminuição duma qualquer vantagem tutelada pelo Direito, ou de um bem, em sentido amplo, que seja protegido” 10.
Antunes Varela 11 define o dano patrimonial como o reflexo do dano real sobre a situação patrimonial do lesado – ou diminui o valor de um património ou impede-o de aumentar -, sendo concebido “como uma diferença de valor patrimonial, pelo que, quando não seja possível a reparação in natura, a indemnização se deve reduzir a cobrir essa diferença mediante uma soma em dinheiro, o que o direito não considera geralmente reparação perfeita” 12.
NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE O FACTO E O DANO
Nem todos os factos decorrentes da ilicitude e avaliáveis como danos são susceptíveis de merecerem serem indemnizados. É ainda necessário que os danos sejam causados e sobrevenham daquele facto ilícito, ainda que eventualmente tenham uma causa próxima com o mesmo.
Além do facto e do dano, exige-se que entre ambos exista uma relação, sendo apenas de ressarcir aqueles danos que o facto tenha ocasionado. O nexo de causalidade constitui pois, ao mesmo tempo, pressuposto e medida dos danos a ressarcir.
Conforme estipula o art.º 563º, “a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”. Deste modo, para o apuramento do nexo de causalidade naturalístico, torna-se pertinente “indagar se, na sequência do processamento naturalístico dos factos, estes funcionaram ou não como factor desencadeador ou como condição detonadora do dano”, o que se insere no puro plano factual. E, ainda, apurar ou determinar, mas já como questão de direito ou normativa, “se, no plano geral ou abstracto, a condição verificada é ou não causa adequada do dano, isto é, se dada a sua natureza geral, era de todo indiferente para a verificação do dano e só o provocou em virtude de circunstâncias excepcionais, anormais, extraordinárias ou anómalas que hajam intercedido no caso concreto. Isto sendo sabido que a nossa lei civil adoptou (conf. art. 563º) a doutrina da causalidade adequada, na sua formulação negativa, adoptada por Ennecerus Lehman, in “Recht der Shuldverhaltnisse, 14ª ed., 1954, pág. 63” 13.
Causalidade que pode mesmo ser indirecta, admitindo-se a verificação deste nexo quando “o facto não produz ele mesmo o dano, mas desencadeia ou proporciona um outro que leva à verificação deste” 14. Ao aceitar-se esta causalidade indirecta admite-se assim a formulação negativa da teoria da causalidade adequada como suficiente para preencher este pressuposto da responsabilidade civil: a condição deixará de ser causa do dano sempre que, segundo a sua natureza geral, era de todo indiferente para a produção do dano e só se tornou condição dele em virtude de circunstâncias extraordinárias 15.
- No que concerne aos danos não patrimoniais
A sentença apelada considerou, por referência ao artº. 496º, apenas serem indemnizáveis os danos não patrimoniais que, não correspondendo a meros incómodos ou aborrecimentos, mereçam a tutela do direito.
Pelo que, apesar da prova das expressões proferidas pelo Réu, as Autoras, potenciais lesadas, não lograram alegar e provar danos não patrimoniais relevantes susceptíveis de indemnizabilidade.
Com efeito, a alegação de várias consequências resulta manifestamente insuficiente para se considerar verificada a existência de danos relevantes, o que determina a inexistência de qualquer obrigatoriedade indemnizatória, conducente a juízo de improcedência da acção.
As Recorrentes Autoras questionam este entendimento, pois consideram terem sofrido danos com suficiente gravidade para efectiva responsabilização extracontratual do Réu, e consequente ressarcimento em sede e dano não patrimonial.
Analisemos.
O presente dano consiste nos prejuízos (dor física, desgosto moral, complexos de ordem estética) que, sendo insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens (como a saúde, o bem-estar, liberdade, beleza, perfeição física, honra, etc) que não integram o património do lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação.
No que aos presentes danos respeita, dispõe o art. 496.º, n.º 3 que o montante da indemnização será fixado equitativamente1617 pelo Tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no art. 494.º do mesmo diploma (o grau de culpabilidade do agente; a situação económica deste e do lesado; e as demais circunstâncias do caso que o justifiquem). Dispõe este normativo que “quando a indemnização se fundar na mera culpa, poderá a indemnização ser fixada, equitativamente, em montante inferior ao que corresponderia aos danos causados, desde que o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso o justifiquem”.
Esta categoria geral de danos tem sido progressivamente subdividida em danos que respeitam a diversas facetas da vida humana.
Desde logo, a dor física sofrida pelos lesados como consequência dos ferimentos e respectivos tratamentos e operações; a afectação da integridade anatómica, fisiológica ou estética 18; o dano biológico (com carácter eventual, nos termos e condições já supra expostas) 19; o prejuízo de distracção ou de afirmação pessoal e a perda de expectativas de duração de vida.
Invocando a jurisprudência do nosso Tribunal superior, refere o citado Acórdão do STJ de 25/06/2002 20 que aquela “em matéria de danos não patrimoniais tem evoluído no sentido de considerar que a indemnização, ou compensação, deverá constituir um lenitivo para os danos suportados, não devendo, portanto, ser miserabilista. Como se decidiu recentemente neste STJ, a compensação por danos não patrimoniais, para responder actualizadamente ao comando do artigo 496º e constituir uma efectiva possibilidade compensatória, tem de ser significativa, viabilizando um lenitivo para os danos suportados e, porventura, a suportar”. E, citando Antunes Varela 21, refere que o “montante da indemnização deve ser proporcionado à gravidade do dano, devendo ter-se em conta na sua fixação todas as regras da prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida. É este, como já foi observado por alguns autores, um dos domínios onde mais necessário se tornam o bom senso, o equilíbrio e a noção das proporções com que o julgador deve decidir” 2223.
Por ora, convoquemos os citados artigos 70º e 484º, do Cód. Civil.
Incluído nos direitos de personalidade, o primeiro normativo dispõe acerca da tutela geral da personalidade, dispondo que:
“1. A lei protege os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral. 2. Independentemente da responsabilidade civil a que haja lugar, a pessoa ameaçada ou ofendida pode requerer as providências adequadas às circunstâncias do caso, com o fim de evitar a consumação da ameaça ou atenuar os efeitos da ofensa já cometida”.
Por sua vez, o segundo normativo, no âmbito da responsabilidade por factos ilícitos, e prevendo acerca da ofensa do crédito ou do bom nome, estatui que “quem afirmar ou difundir um facto capaz de prejudicar o crédito ou o bom nome de qualquer pessoa, singular ou colectiva, responde pelos danos causados”.
Referencia Luísa Neto, em anotação ao transcrito artº. 70º 24, poder-se entender “a existência de um direito geral de personalidade que abranja as suas diversas manifestações fenomenológicas”. E que, admitida ou não a existência de tal direito geral de personalidade, “à responsabilidade por ofensas à personalidade física ou moral são aplicáveis, em termos gerais, os arts. 483º e seguintes, sem prejuízo de tutela penal. O artigo limita-se a declarar, em termos muito genéricos e muito sucintos, a ilicitude das ofensas ou das ameaças à personalidade física ou moral dos indivíduos, sem descer a minuciosa referência analítica. A delimitação de acordo com as circunstâncias do caso é deixada á lei, à jurisprudência e à doutrina (…)”.
Desta forma, atenta a previsão do artº. 70º, considera Rodrigues Bastos 25que o citado artº. 484º “não era, em rigor necessário”, entendendo que o mesmo não abrange “a afirmação de factos verdadeiros que, embora não integrando as figuras penais correspondentes, façam diminuir o crédito ou o bom nome do visado”.
Referem Pires de Lima e Antunes Varela 26que “exista ou não, por parte das pessoas singulares ou colectivas, um direito subjectivo ao crédito e ao bom nome, considera-se expressamente como antijurídica a conduta que ameace lesá-los”.
Todavia, e diferentemente de Rodrigues Bastos, entendem que “pouco importa que o facto afirmado ou divulgado corresponda ou não à verdade, contanto que seja susceptível, dadas as circunstâncias do caso, de diminuir a confiança na capacidade e na vontade da pessoa para cumprir as suas obrigações (prejuízo do crédito) ou de abalar o prestígio de que a pessoa goze ou o bom conceito em que seja tida (prejuízo do bom nome) no meio social em que vive ou exerce a sua actividade”.
Posição que é partilhada por Ana Prata 27, ao referenciar que, “na verdade, se alguém afirma publicamente ou difunde o insucesso de um profissional, pessoa singular ou colectiva (facto verdadeiro), pode causar-lhe graves prejuízos que este texto legal não exclui de ressarcimento. E não estão a referir-se os casos em que os factos verídicos imputados a alguém no quadro de uma causa de justificação, como o cumprimento do dever de colaboração com a justiça em prestação de testemunho judicial”.
Ora, conforme já referenciámos, a reparabilidade dos danos não patrimoniais limita-se àqueles que, atenta a sua gravidade, mereçam a tutela do direito, pelo que “a gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de factores subjectivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada). Por outro lado, a gravidade apreciar-se-á em função da tutela do direito: o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado” 28.
Por sua vez, Rodrigues Bastos 29 esclarece que “o dano compensável há-de ser de certa gravidade, excluindo-se, assim, os danos insignificantes, destituídos de gravidade que justifique a compensação pecuniária deles”.
Convocados o quadro legal e doutrinário em equação, retornemos ao caso concreto.
Relembremos que, conforme supra balizámos, não está em equação no presente recurso o preenchimento de quaisquer outros pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, que não a concreta verificação de dano na esfera jurídica das demandantes Autoras.
Com efeito, a sentença apelada não tratou casuisticamente os demais pressupostos, que implicitamente deu como verificados ou existentes, centrando-se naquele que considerou omisso.
E, o Réu, por outro lado, não suscitou qualquer ampliação do objecto recursório, na salvaguarda da atendibilidade da concreta existência daquele pressuposto de responsabilidade, nos termos do artº. 636º, do Cód. de Processo Civil, pelo que é sobre a sua eventual existência que se deve centrar o objecto recursório em apreciação.
Compulsada a petição inicial, e no que concerne ao pressuposto dano, as alegações das demandantes consubstanciam-se no seguinte:
- as afirmações produzidas pelo Réu são falsas e caluniosas, “pondo em causa o bom nome e reputação das autoras” – cf., artº. 11º ;
- foi recebida nova carta do Réu, da qual constava “diversos juízos e acusações ofensivos da honra, reputação e bom nome das autoras” – cf., artº. 19º ;
- nas várias cartas e e-mails que envia, o Réu “injuria e ofende a honra, reputação e o bom nome das autoras, da sua entidade patronal e respectivos colaboradores, fazendo acusações infundadas, acusações essas que podem por em causa o seu nome e reputação no mercado e na zona em que as autoras vivem e trabalham” – cf., artº. 22º ;
- o Réu “ao acusar a Domuscacém perante todos os condóminos de desvio de fundos e falsificação de contas, (…) difama as autoras e põe em causa o seu bom nome e idoneidade” – cf., artº. 30º ;
- o Réu vem produzindo constantemente afirmações “injuriosas e difamatórias para com as autoras e a sua entidade patronal” – cf., artºs. 36º, 38º e 40º ;
- aproveitando o facto de ser beneficiário de apoio judiciário, “o réu usa e abusa dos meios judiciais para transtornar as autoras, os outros condóminos, a sua entidade patronal e respectivos colaboradores” – cf., artº. 44º ;
- as Autoras toda a vida residiram e fizeram a sua vida no Cacém, conhecendo muitas pessoas naquela localidade, pelo que “se começam a circular rumores de que as autoras são desonestas, tal facto poderá prejudicar gravemente a sua credibilidade e bom nome” – cf., artºs. 49º e 50º ;
- tais juízos ofensivos proferidos pelo réu “têm como objectivo prejudicar a actividade profissional das autoras e, consequentemente, o seu sustento e do seu agregado familiar” – cf., artº. 51º ;
- através das cartas e e-mails era “notório que a intenção do réu era denegrir o bom nome e reputação das autoras junto de um grande número de pessoas, prejudicando, desta forma a sua actividade profissional e o seu bom nome” – cf., artº. 60º ;
- todas estas “injúrias e difamações têm provocado um enorme stress nas autoras, tanto mais que, para além de poderem prejudicar o seu bom nome na localidade onde desde sempre fazem a sua vida, podem prejudicá-las perante a sua entidade patronal” – cf., artº. 61º ;
- todas “estas preocupações, stress e horas perdidas em Tribunais e Esquadras da PSP, são prejudiciais à saúde e bem-estar das autoras, que para além das normais preocupações decorrentes da gestão de Condomínios, ainda têm o stress acrescido inerente a estas acusações difamatórias e injuriosas difundidas pelo réu” – cf., artº. 62º ;
- sendo as afirmações proferidas pelo Réu difundidas, pelo menos e que se saiba, junto dos condóminos do condomínio, “o «passa palavra» entre condóminos pode prejudicar e muito o bom nome das autoras no local onde vivem e trabalham” – cf., artº. 75º ;
- e, ficando tais comunicações do Réu arquivadas na pasta do Condomínio, e sendo objecto de análise por parte do master Loja do Condomínio, nas auditorias que frequentemente realiza, tal “pode prejudicá-las junto da sua entidade patronal” – cf., artº. 76º ;
- as acusações infundas imputadas pelo Réu às Autoras põem em causa a sua reputação e bom nome, “tanto ao nível pessoal como profissional, e são, de facto, susceptíveis de pôr em causa a confiança na capacidade destas para cumprir as suas obrigações e exercer a sua actividade comercial” – cf., artº. 77º.
Ora, resulta com evidência ser o descrito conteúdo maioritariamente evasivo, finalístico, descrevendo potenciais efeitos ou perdas, mas sem as definir, especificar ou declarar terem efectivamente ocorrido, e mesmo conclusivo (susceptível de traduzir conceitos jurídicos), longe de qualquer relato concretamente factual donde decorra a enunciação de reais danos ou perdas suportados pelas demandantes Autoras.
Donde resulta, sem surpresa, que relativamente a putativos danos suportados pelas demandantes, ter-se logrado apenas provar que “todas estas injúrias e difamações têm provocado um enorme stress nas autoras” – cf., facto provado XXV -, sendo que relativamente a demais potenciais perdas o juízo foi da sua não concreta prova – cf., facto j. não provado.
Aqui chegados, impõe-se, então, apurar se o facto ilícito e culposo em que se traduziram as injúrias e difamações praticadas pelo Réu, causadoras de enorme stress nas Autoras, traduzem ou não um concreto dano merecedor de tutela compensatória em sede não patrimonial.
Ou se, ao invés, conforme consignado na sentença sob apelo, não lograram as Autoras alegar, e provar, danos não patrimoniais com relevância suficiente a serem indemnizáveis em tal sede, ou seja, a alegação das várias consequências decorrentes dos factos ilícitos evidenciam manifesta insuficiência para que se possa considerar a existência de danos relevantes, tal como legalmente previstos e jurisprudencialmente reconhecíveis.
Juridicamente, e no estrito campo civilístico, pode qualificar-se o stress como um dano psíquico ou emocional, ressarcível como perda não patrimonial quando seja susceptível de afectar gravemente o bem-estar da pessoa.
Ou seja, ultrapassados os limites da normalidade, com consequente conversão num estado clínico de sofrimento psíquico, o stress surge como indemnizável enquanto dano não patrimonial, nos quadros do transcrito artº. 496º, do Cód. Civil.
Assim, estando-se perante stress causado por injúrias e difamações, tal como sucede in casu, a sua indemnizabilidade enquanto dano não patrimonial depende do grau de seriedade e relevância do impacto na pessoa afectada. E isto, desde logo, na consideração de que as ofensas á honra, tal como as resultantes de difamação ou injúria, determinam ou incluem, automaticamente, o stress causado, sem que este careça de ser alegado como concreto e efectivo dano autónomo.
Todavia, reitera-se, tendo-se logrado apenas provar que as difamações e injúrias praticadas pelo demandado Réu provocaram enorme stress nas Autoras, configura-se este com relevância jurídica suficiente a determinar aquela ressarcibilidade ?
No douto Acórdão da RP de 05/04/2017 – Relator: Moreira Ramos, Processo nº. 671/14.0GAMCN.P1, in www.dgsi.pt – confirmou-se sentença que reconheceu indemnização civil por danos morais a pessoas difamadas nas redes sociais, no montante fixado de 1.000,00 €, com base, entre outra, na seguinte factualidade:
“13. A conduta do demandado causou aos demandantes forte abalo psíquico, ficaram perturbados, tristes, envergonhados; 14. Nos dias seguintes evitaram, por terem receio de ser confrontados com tais declarações, os locais que habitualmente frequentavam; 15. Nos primeiros dias andaram irritados e não conseguiram conciliar o sono; 16. Foram várias vezes confrontados com questões relacionadas com o facto do demandado ter dito que faziam tráfico de pessoas e que eram ladrões; 17. Tais factos causaram humilhação, vergonha e nervosíssimo”.
Ou seja, decorre do exposto manancial fáctico a tradução dos efeitos de um aludido stresse emocional e psicológico sofrido pelos lesados, que se evidenciou em tristeza, vergonha, perturbação, abalo psíquico, irritabilidade, insónias, humilhação e nervosismo.
Todavia, no caso concreto, apenas surge provado terem as Autoras sofrido stress, adjectivado como enorme, configurando-se este conceptualmente como sinónimo de excessivo, colossal, descomunal, agigantado, desmedido, desmesurado ou intenso, mas sem que se tenha logrado determinar facticiamente em que se traduz esta amplitude, ou seja, sem que se encontre devidamente especificado, detalhado ou concretizado o efeito ou decorrência deste afirmado grau.
Nomeadamente, e exemplificativamente, se aquela provada graduação do stress, e a perturbação emocional que lhe subjaz e os efeitos daquele decorrentes, tem natureza constante, se é provocadora de ansiedade, insónias, afectadora do apetite, de constrangimento social, vergonha, embaraço, humilhação, abalo emocional, prejudiciais efeitos laborais ou reiterada tristeza. O que efectivamente indicia uma certa omissão na alegação e descrição factual dos efeitos presumivelmente decorrentes do enorme stress alegado e sentido.
Todavia, tendo em consideração a reiterada imputação das ofensas ao bom nome das Autoras, a divulgação operada por vários meios (cartas, e-mails), a constatação de que as mesmas, num juízo de normalidade e de experiência comum, não podem deixar de provocar um dano no seu bem jurídico honra (merecedor, por si só, de uma tutela constitucionalmente garantida), bem como o grau de afectação atingido ao provocarem uma situação de stress qualificada como enorme, entendemos lograr-se como bastante ao preenchimento do quadro de relevância e gravidade legalmente exigíveis para que mereçam tutela ressarcitória em sede de dano não patrimonial.
O que implica, neste contexto, juízo de acolhimento das conclusões recursórias, sendo insubsistente o juízo de total improcedência acional questionado.
Ora, assim sendo, urge então proceder à fixação do montante ressarcitório ou compensatório, ponderando-se os critérios definidos no artº. 494º, ex vi do nº. 3, do artº. 496º, ambos do Cód. Civil.
Pelo que, in casu, ponderando-se:
- o grau de culpabilidade do Réu, traduzido na imputação reiterada e gratuita operada, numa clara atitude intencional e dolosa ;
- o período temporal em que tais imputações vêm sendo efectuadas – de 13/11/2020 a 10/10/2021 -, o que ocorreu, pelo menos, mediante sete diferenciadas comunicações (13/11/2020, 10/07/2021, 21/07/2021, 07/09/2021, 20/09/2021, 22/09/2021 e 10/10/2021) ;
- a disseminação de tais imputações junto de terceiros, nomeadamente de outros condóminos, potenciais avaliadores do trabalho realizado pelas Autoras, Julga-se adequado fixar em 2.500,00 € (dois mil e quinhentos euros) o montante ressarcitório/compensatório a pagar pelo Réu, a cada uma das Autoras, a título de dano não patrimonial.
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Nos quadros do artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, as custas da acção e da presente instância recursória, são suportadas, por Autoras e Réu, na proporção do vencimento, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário de que este goza.
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IV. DECISÃO
Destarte e por todo o exposto, acordam os Juízes desta 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em:
I. Julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto pelas Apelantes/Recorrentes/Autoras AA e BB, em que figura como Apelado/Recorrido/Réu CC ;
II. Em consequência, revoga-se a sentença recorrida/apelada ;
III. A qual se substitui por decisão que, num juízo de parcial procedência da acção, condena o Réu a pagar a cada uma das Autoras, a título de ressarcimento/compensação por dano não patrimonial, a quantia de 2.500,00 € (dois mil e quinhentos euros) ;
IV. Nos quadros do artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, as custas da acção e da presente instância recursória, são suportadas, por Autoras e Réu, na proporção do vencimento, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário de que este goza.
Lisboa, 10 de Julho de 2025
Arlindo Crua
Pedro Martins
Higina Castelo
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1. A presente decisão é elaborada conforme a grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, salvaguardando-se, nas transcrições efectuadas, a grafia do texto original.
2. Todas as referências legais infra, salvo expressa menção em contrário, referem-se ao presente diploma.
3. Das Obrigações em Geral, Vol. I, 6ª Edição, Almedina, pág. 496 e 497.
4. Idem, 10ª Edição, pág. 527.
5. Idem, pág. 502.
6. Ibidem, pág. 531.
7. Ibidem, pág. 542.
8. Ibidem, pág. 568.
9. cf., Dario M. de Almeida, Manuel dos Acidentes de Viação, pág. 82.
10. Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, 2º Volume, 2001, AAFDL, pág. 293 e 300.
11. Ob. Cit., Vol. I, pág. 620.
12. Cf., o douto Acórdão do STJ de 23/04/2002 – Doc. nº SJ200204230010181, in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf -, o qual defende que o dano “não pode ser concebido como uma diferença de valor patrimonial”, pois para o direito o dano “não interessa apenas no seu aspecto de «diferença», aspecto matemático ou abstracto ; mas interessa toda a individualização do objecto efectivamente lesado, a qual será a base da reparação futura”.
13. cf., o douto Acórdão do STJ de 18/03/2004, Relator: Ferreira de Almeida, Doc. nº SJ200403180006752, in http://www.dgsi..pt/jstj.nsf .
14. A. Varela, ob. cit., vol. I, pp. 579 e Manuel de Andrade, Teoria Geral das Obrigações, pp. 357.
15. Preceitua o Acórdão do STJ de 15/04/93 – in CJSTJ, Tomo 2, pág. 5 - que «na variante positiva um facto é causa de um efeito quando é previsível que, atendendo ás circunstâncias que o agente conhecia, esse facto conduza àquele efeito.
Na modalidade negativa de causalidade adequada, mais abrangente do que a positiva, um facto é causal de um dano sempre que é uma das várias condições da sua produção, sem a qual portanto, não teria ocorrido. Mais aproximada da teoria de equivalência das condições, na variante negativa da causalidade adequada o agente é responsável quando previu ou devia prever o facto, mas já não os seus efeitos que ficam de fora do seu circulo de previsibilidade; o facto- condição só não é causa do dano se era totalmente indiferente para a sua produção segundo as regras da experiência comum».
16. A equidade constitui assim fonte, mediata, de direito - art. 4.º do C. Civil..
17. O recurso à equidade justifica-se, desde logo, por ser difícil, se não mesmo por vezes impossível, a prova do montante de tais danos, assim se afastando “a estrita aplicabilidade das regras porque se rege a obrigação de indemnização” – Ribeiro de Faria, Direito das Obrigações, 1, pág. 491 e segs..
18. O dano estético, no entanto, poderá também ser avaliado enquanto dano patrimonial, se tiver reflexo económico na vida da pessoa afectada, como seria, p. ex., o caso de um modelo ou actor.
19. Neste sentido, vide acórdão da Relação do Porto de 07.04.1997, in CJ, II, p. 204.
20. Pág. 134.
21. Ob. Cit., págs. 599-600, nota 4.
22. Refere o Acórdão do STJ de 23/09/98 – Processo n.º 553/98, 1ª Secção -, que “o julgador ao atribuir esta compensação não está subordinado a critérios normativos fixados na lei. O que aqui tem força são razões de conveniência, de oportunidade, de justiça concreta em que a equidade se funda”.
23. O douto Acórdão do STJ de 05/07/2007 – Doc. nº SJ200707050017346, Relator: Nuno Cameira, in http://www.dgsi.pt/jstj - elenca 5 critérios ou ponderações a aplicar na avaliação dos danos não patrimoniais, que enunciamos resumidamente:
“Primeiro: definitivamente ultrapassado o tempo das indemnizações insignificantes, excessivamente baixas, verifica-se que os tribunais estão hoje sensibilizados para a quantificação credível dos danos não patrimoniais – credível para o lesado e credível para a sociedade, respeitando a dignidade e o primado dos valores do ser, como acontece com a integridade física e a saúde, que o Estado garante a todos os cidadãos (art.ºs 9º, b), e 25º, nº 1, da Constituição; cfr, neste exacto sentido, o acórdão deste Tribunal de 20.2.01- Revista nº 204/01-6ª); e este “movimento” contra indemnizações meramente simbólicas não deixa de estar relacionado muito directamente, além do mais, com o aumento continuado e regular dos prémios de seguro que tem ocorrido no nosso país por imposição das directivas comunitárias, aumento esse cujo objectivo fulcral (pelo menos no âmbito do seguro obrigatório de responsabilidade civil por acidentes de viação) não é o de garantir às companhias seguradoras lucros desproporcionados, mas antes o de, em primeira linha, assegurar aos lesados indemnizações adequadas. Segundo: As indemnizações adequadas passam com cada vez maior frequência por uma valorização mais acentuada dos bens da personalidade física, espiritual e moral atingidos pelo facto danoso, bens estes que, incindivelmente ligados à afirmação pessoal, social e profissional do indivíduo, “valem” hoje mais do que ontem; e assim, à medida que com o progresso económico e social e a globalização crescem e se tornam mais próximos toda a sorte de riscos – riscos de acidentes os mais diversos, mas também, concomitantemente, riscos de lesão do núcleo de direitos que integram o último reduto da liberdade individual, - os tribunais tendem a interpretar extensivamente as normas que tutelam os direitos de personalidade, particularmente a do art.º 70º do Código Civil. Terceiro: É necessário, em todo o caso, agir cautelosamente; e o Supremo Tribunal, nesta matéria, tem uma responsabilidade acrescida, dada a função que lhe está cometida de contribuir para a uniformização da jurisprudência; não é conveniente, por isso, alterar de forma brusca os critérios de valoração dos prejuízos; não deve perder-se de vista a realidade económica e social do país; e é vantajoso que o trajecto no sentido duma progressiva actualização das indemnizações se faça de forma gradual, sem rupturas e sem desconsiderar (muito pelo contrário) as decisões precedentes acerca de casos semelhantes. Isto porque os tribunais não podem nem devem contribuir para alimentar a noção de que neste domínio as coisas são mais ou menos aleatórias, vogando ao sabor do acaso ou do arbítrio judicial. A justiça tem ínsita a ideia de proporção, de medida, de adequação, de relativa previsibilidade; é tudo isto que no seu conjunto origina o sentimento de segurança, componente essencial duma sociedade assente em bases sólidas (uma das quais é justamente a do primado do direito). Ora, de certo modo os tribunais são os primeiros responsáveis e sobretudo os principais garantes da afirmação de tais valores: cabe-lhes contrariar com firmeza a ideia de que os factos danosos geradores de responsabilidade civil, muitas vezes tragédias pessoais e familiares de enorme dimensão material e moral, possam ser transformados em negócios altamente rendosos para pessoas menos escrupulosas. Quarto: A indemnização prevista no art.º 496º, nº 1, do CC, mais do que uma indemnização, é uma verdadeira compensação: segundo a lei, o objectivo que lhe preside é o de proporcionar ao lesado a fruição de vantagens e utilidades que contrabalancem os males sofridos e não o de o recolocar “matematicamente” na situação em que estaria se o facto danoso não tivesse ocorrido; a reparação dos prejuízos, precisamente porque são de natureza moral (e, nessa exacta medida, irreparáveis, é uma reparação indirecta). Quinto: Os componentes mais importantes do dano não patrimonial, de harmonia com a síntese feita num acórdão deste Tribunal de 15.1.02 (Revª 4048/01-2ª) são os seguintes: o “dano estético” - que simboliza o prejuízo anátomo-funcional associado às deformidades e aleijões que resistiram ao processo de tratamento e recuperação da vítima; o “prejuízo de afirmação social” - dano indiferenciado que respeita à inserção social do lesado, nas suas variadas vertentes (familiar, profissional, sexual, afectiva, recreativa, cultural, cívica); o prejuízo da “saúde geral e da longevidade” - em que avultam o dano da dor e o défice de bem-estar, e que valoriza os danos irreversíveis na saúde e bem-estar da vítima e o corte na expectativa de vida; e o “pretium juventutis” - que realça a especificidade da frustração do viver em pleno a chamada primavera da vida; e o “pretium doloris” - que sintetiza as dores físicas e morais sofridas no período de doença e de incapacidade temporária”.
24. Código Civil Anotado, Vol. I, Coordenação de Ana Prata, Almedina, 2017, pág. 107 e 108.
25. Notas ao Código Civil, Vol. II, Lisboa, 1988, pág. 282.
26. Código Civil Anotado, Vol. I, 4ª Edição Revista e Actualizada, Coimbra Editora, pág. 486.
27. Código Civil Anotado, Vol. I, Coordenação…, ob. cit., pág. 631.
28. Antunes Varela, ob. cit., pág. 576.
29. Ob. cit., pág. 295.