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EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO
EMBARGOS
INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE
LISTA PÚBLICA DE EXECUÇÕES
Sumário
SUMÁRIO (da responsabilidade do relator) I- Tendo o executado deduzido embargos, alegando exceções de direito material que, a procederem, conduzem à extinção da obrigação exequenda, a extinção da execução nos termos do artº 750º/2 do CPC não determina a extinção dos embargos por inutilidade superveniente da lide. II- O interesse no prosseguimento resulta ainda da circunstância de a extinção da execução naqueles termos implicar a automática inclusão dos executados numa lista pública de execuções (Portaria 313/2009), o que acarreta consequências deveras negativas para aqueles.
Texto Integral
Acordam os Juízes Desembargadores que compõem este Coletivo da 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
RELATÓRIO
AA, executado nos autos referenciados, que foram instaurados por SANTANDER CONSUMER FINANCE S.A – Sucursal em Portugal, veio, por apenso, deduzir oposição à execução.
Invocou as exceções de prescrição quer do capital, quer dos juros, e de nulidade do processo por ineptidão do requerimento executivo. Invocou ainda que não teve conhecimento da cessão de crédito invocada pela exequente para fundamentar a sua legitimidade.
A oposição não foi objeto de despacho de admissão, tendo antes sido proferida a seguinte decisão:
“Nos autos de execução a que os presentes embargos se encontram apensos, e após o cumprimento das diligências previstas no art. 748.º do CPC, deu-se igualmente cumprimento ao disposto no 750.º, n.º 1 do CPC. Nos termos do 750.º, n.º 2 do CPC, se o exequente e o executado não indicarem bens à penhora, extingue-se sem mais a execução. Conforme decorre dos autos principais, a execução foi extinta, nos termos do referido art. 750.º, n.º 2 do CPC, o que importa também a extinção da presente oposição, que dela é dependência (cfr., neste sentido, o Acordão da Relação do Porto de 24/02/2015, P. 33364/03.4TJPRT-A.P1, em www.dgsi.pt). Em face do exposto, julga-se extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, na presente oposição por embargos do executado AA (art. 277.º, al. e] do CPC). Custas pelo embargante (art. 536.º, n.º 3 do CPC). Registe e notifique”.
* DA APELAÇÃO
O presente recurso de apelação visa exatamente este despacho, tendo o recorrente apresentado alegações e as seguintes conclusões:
I.
A 03/02/2025 foi o ora Apelante notificado da sentença proferida no âmbito do apenso de oposição mediante embargos de executado, pelo Juiz 3 do Juízo de Execução de Lisboa do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, que julgou extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, em virtude de, nem Exequente nem Executado terem indicados bens à penhora, nos termos do 750.º, n.º 2 do CPC, extinguindo-se sem mais a instância executiva e, consequentemente, a presente oposição mediante embargos de executado, que dela é dependência (art. 277.º, al. e) do CPC), condenando ainda o Embargante em custas.
II.
Considera o Apelante que o Tribunal “a Quo” fez errada aplicação do direito, por isso não pode concordar com a sentença em apreço, nem com a fundamentação nela invocada, pretendendo ver a mesma alterada por uma que admita a oposição mediante embargos de executado, seguindo os seus trâmites legais e vindo, a final, a ser proferida uma decisão de mérito.
III.
Os autos de execução foram intentados em 02/11/2004, apresentando a Exequente como título executivo uma livrança no valor de 5.452,78€ que foi subscrita pelos Executados com data de vencimento a 09/09/2003.
IV.
O Executado, ora Apelante, foi citado para os autos de execução em 27/11/2023, mais de 20 anos após o preenchimento da livrança.
V.
A 23/01/2024 deduziu o Executado oposição à execução mediante embargos de executado, deduzindo defesa por impugnação e mais invocando excepções peremptórias e dilatórias que, a proceder, absolveriam o
Executado/Embargante do pedido e/ou da instância, designadamente, a prescrição da dívida e por mera cautela de patrocínio a prescrição dos juros e ineptidão do requerimento executivo.
VI.
A 28/03/2024 foi o Executado notificado para, no prazo de 10 dias, indicar bens à penhora, ignorando-se a oposição mediante embargos de executado por si deduzida, tendo o Executado/Embargante solicitado no processo executivo, a 10/04/2024, que os autos aguardassem que fosse proferida uma decisão no âmbito do apenso de embargos de executado (Processo 39510/04.3YYLSB-A).
VII.
A 04/12/2024 o Agente de Execução nomeado nos autos comunicou ao Executado a extinção da execução ao abrigo do disposto no artigo 750º nº2 CPC, uma vez que nem exequente nem executado(a) indicaram bens à penhora.
VIII.
A 17/12/2024 foi o nome do Executado/Embargante inserido pelo Agente de Execução na lista pública de execuções com o valor em dívida de 5.538,00€ (Ref. Citius 41391075).
IX.
Não obstante a extinção da execução, ficou o Executado/Embargante a aguardar o prosseguimento do apenso dos embargos de executado, uma vez que haviam sido invocadas excepções que colocavam em causa a própria existência do título executivo e exigibilidade da dívida, tendo sido surpreendido com a sentença proferida a 28/01/2025, que julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide em virtude da extinção da instância executiva.
X.
A sentença proferida nos embargos de executado implica, desde logo, que o nome do Embargante conste da lista pública das execuções o que configura uma violação dos seus direitos de personalidade: o direito ao bom nome, à reputação, à identidade pessoal, à cidadania, pelo que, a douta sentença viola o artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, ao fazer aplicar o n.º 2 do artigo 750.º CPC nos presentes autos assim como viola o artigo 32º da CRP referente ao direito à defesa uma vez que é limitadora do direito de defesa que assiste ao Executado que vê a sua posição processual limitada e sem possibilidade de ver apreciada a viabilidade e exigibilidade da dívida exequenda que, a serem procedentes os fundamentos aduzidos na oposição, nem sequer é devida!
XI.
A subsistência de interesse na manutenção da instância da oposição mediante embargos obsta ao decretamento da sua extinção, nos termos da convocada alínea e) do artigo 277.º do CPC que foi claramente violada.
XII.
A simples inclusão do ora Apelante na lista pública de execuções prejudica o seu bom nome e tem fortes repercussões negativas pessoal e profissionalmente, por outro lado, caso os embargos fossem apreciados e a dívida declarada prescrita como se requer, já estaria vedada a possibilidade do Exequente vir renovar a instância executiva nos termos do art. 850°, n° 5 do CPC.
XIII.
A extinção da instância foi altamente prejudicial ao Executado que tem de aguardar por uma renovação da instância pelo Exequente para poder ver apreciada a sua oposição e a existência da dívida, pelo que, o prosseguimento da oposição mediante embargos é de extrema utilidade, não se justificando a extinção da instância da oposição mediante embargos por inutilidade superveniente da lide.
XIV.
O prosseguimento dos embargos ainda tinha o interesse – sempre muito relevante – de poder evitar a condenação do Executado/Embargante nas custas judiciais, o que veio a suceder.
XV.
Neste sentido supra exposto se tem pronunciado a nossa jurisprudência, designadamente Ac. do Tribunal da Relação de Évora de 22-09-2016, Ac. do TRL de 07-11-2019, de 11/02/2021 in proc. 22854/16.9T8LSB-A.L1 e Ac. do TRP de 27-01-2020 in Processo 2666/14.5YYPRT-A.P1, Acórdão do TRL de 07/11/2024 in Processo 6578/20.5T8LSB-A.L1-6, entre outros.
*
Não foram apresentadas contra-alegações.
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FUNDAMENTAÇÃO
Objeto do Recurso
O objeto do recurso é balizado pelo teor do requerimento de interposição (artº 635º nº 2 do CPC), pelas conclusões (artºs 635º nº 4, 639º nº 1 e 640º do CPC), pelas questões suscitadas pelo recorrido nas contra-alegações em oposição àquelas, ou por ampliação (artº 636º CPC) e sem embargo de eventual recurso subordinado (artº 633º CPC) e ainda pelas questões de conhecimento oficioso cuja apreciação ainda não se mostre precludida.
Assim, em face das conclusões apresentadas pelos recorrentes, a questão a apreciar é a de saber se, apesar de ter sido declarada extinta a execução nos termos constantes da decisão recorrida, os autos de oposição à execução devem prosseguir.
* DOS FACTOS
A factualidade a atender para a apreciação do recurso é a que consta do relatório supra, sem necessidade de mais acrescentos.
* DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
Por via do presente recurso pretende o recorrente que os autos de oposição à execução prossigam os seus termos, não obstante a decisão de extinção da execução com fundamento no artº 750º/2 do CPC.
Na decisão recorrida entendeu-se que aquela extinção determinava a inutilidade superveniente a oposição.
O recorrente cita vários acórdãos no sentido da posição que defende, ou seja, que a extinção da execução nos termos do art. 750º/2 do CPC, não implica a extinção, por inutilidade superveniente, da oposição à execução, nomeadamente os seguintes:
- da Relação do Porto de 27.01.202011, de cujo sumário, na parte que interessa, consta o seguinte:
“II - Tendo o executado deduzido embargos, alegando que o pagamento que efetuou extingue a execução (face a um acordo que invoca), a extinção da execução nos termos do n.º 2 do artigo 750.º do CPC não determina a extinção dos embargos por inutilidade superveniente da lide. III - Na situação referida, caso se venha a renovar a execução, com posterior penhora de bens do executado, voltará a tornar-se premente a averiguação sobre se houve ou não acordo de pagamento, sobre se a quantia paga pelo executado era ou não suscetível de extinguir a execução, pelo que, com a extinção da instância nos embargos por invocada inutilidade da lide, [depois de produzida prova e de realizadas duas sessões de julgamento], não se previne a eventual renovação da execução, abrindo-se a possibilidade de inutilização de toda a tramitação dos embargos, e da sua posterior (e desnecessária) repetição, o que poderá traduzir-se na realização de atos processuais inúteis, expressamente proibida pelo disposto no artigo 130.º do código de processo civil”.
- da Relação de Lisboa de 11.02.202122, de cujo sumário, na parte que interessa, consta o seguinte:
“I – A extinção da execução, nos termos do art. 750/2 do CPC, não implica a extinção, por inutilidade superveniente, dos embargos deduzidos contra a execução. II – Tanto mais que aquela extinção, implica a automática inclusão dos executados numa lista pública de execuções (Portaria 313/2009), com as inerentes consequências negativas para os executados e com uma função compulsória do pagamento da dívida que os executados nos embargos põem em causa nos termos que está a ser executada”.
E cita também o recente acórdão desta Relação3, e desta secção, de 07.11.2024, que, de forma bastante completa, analisou a questão, confrontando os fundamentos que sustentam, quer a posição assumida na decisão recorrida, quer a posição propugnada pelo recorrente, e concluiu o seguinte:
“II. A subsistência de interesse, ainda que residual, na manutenção da instância obsta ao decretamento da sua extinção nos termos da convocada alínea e) do artigo 277.º do CPC, precisamente porque não se verifica então uma situação de inutilidade/impossibilidade. III. Pretendendo o embargante, com a oposição à execução, colocar em causa o próprio título executivo, visando a improcedência total ou parcial da execução, a inutilidade superveniente da sua pretensão só ocorre se, por via de um comportamento concludente - como é o pagamento voluntário ou acordo de pagamento (transacção) da quantia exequenda - aceita o direito do credor tal qual este se encontra representado no título executivo. IV. Caso se renove a execução, com posterior penhora de bens da executada, voltará a tornar-se premente o conhecimento do mérito dos embargos, o que, só por si nos indicia que nenhuma inutilidade se antevê, na medida em que a extinção da execução não configura uma “extinção” relacionada com o pagamento/acordo de pagamento, única da qual se podem extrair conclusões acerca da existência, validade e exigibilidade da obrigação exequenda. V. Em abono desta posição milita a circunstância de o CPC, no art. 848.º, n.º 2, do CPC – referente à desistência do exequente (outra causa de extinção da execução) – prever a necessidade, em caso de pendência de embargos de executado, de aceitação do embargante (artigo 848.º do CPC). VI. Para além disto, a existência de uma lista pública de execuções, onde os executados serão inscritos quando a execução for extinta nos termos do art. 750.º, n.º 2, do CPC (Portaria 313/2009, de 30-03), torna, só por si, evidente que o executado tem sempre interesse na decisão final de embargos que tenham deduzido, nem que seja para evitar a sua inscrição naquela lista”.
Na fundamentação cita-se ainda a posição do Prof. Miguel Teixeira de Sousa, que entende que “Os embargos de executado cumprem uma função de oposição a uma execução pendente, mas, como o acórdão mostra, também podem cumprir a função de prevenir a renovação de uma execução entretanto extinta. Assim, se a oposição à execução deduzida pelo executado puder obstar à renovação de uma execução extinta (o que apenas é possível saber em função do concreto fundamento alegado pelo executado), essa oposição não se torna inútil com a extinção da execução. Pelo contrário: a oposição à execução deve subsistir, embora apenas com a finalidade de prevenir a eventual renovação da execução. Sob o ponto e vista formal (que não é o mais relevante na situação em análise), importa referir que, como decorre do disposto nos art. 779.º, n.º 5, e 850.º, n.º 5, CPC (e, em especial, da remissão para o art. 850.º, n.º 4), a execução extinta e a execução renovada são uma e mesma execução”.
Concordamos na íntegra com este entendimento, do qual resulta a procedência das conclusões X a XII e, consequentemente, a procedência integral do recurso, devendo determinar-se o prosseguimento dos autos de oposição de acordo com a tramitação que se impunha à data da decisão recorrida, a qual terá de ser revogada.
***
DECISÃO
Face ao exposto, acordam os Juízes Desembargadores que compõem este coletivo da 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar o recurso procedente e, em consequência, revoga-se a decisão recorrida, devendo estes autos de oposição à execução prosseguir os seus termos de acordo com a tramitação legalmente adequada à data da decisão recorrida.
Sem custas em virtude da integral procedência do recurso e por não terem sido apresentadas contra-alegações.
TRLx, 10jul2025
Jorge Almeida Esteves
Elsa Melo
Anabela Calafate
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1. Proferido no procº nº 2666/14.5YYPRT-A.P1 (in dgsi.pt).
2. proferido no procº nº 22854/16.9T8LSB-A.L1 (in outrosacordaostrp.com)
3. Proferido no procº nº 6578/20.5T8LSB-A.L1-6 (in dgsi.pt)