I. Exaurindo as instâncias a apreciação e fixação da matéria de facto, a intervenção residual do Supremo sedia-se no domínio do direito probatório material, nos casos em que ocorra ofensa de disposição expressa de lei, que exija certa espécie de prova para a existência de um facto, ou imponha a força de determinado meio de prova, com força probatória plena.
II. E, embora o Supremo possa alterar a decisão de facto no caso de atestada violação de regra de direito probatório, fica precludida a intervenção se, em paralelo, as instâncias formaram a sua convicção sobre a realidade do facto lançando mão de outra prova sujeita à livre a apreciação, e por consequência, excluída do crivo da revista.
III. A pretensão que os Autores ora dirigem aos Réus - restituição do capital e juros - por efeito da nulidade dos contratos de intermediação financeira em aplicação do Regime Geral das Cláusulas Contratuais Gerais, redunda em contradição com a causa de pedir, a responsabilidade civil contratual por violação dos deveres de informação do intermediário financeiro que motivou o pedido inicial de indemnização por danos patrimoniais, e por outro lado, incompatível com os efeitos estabelecidos neste âmbito nos artigos 5º e 6º daquele diplomam legal.
IV. Os valores do capital que o Autor foi investindo, com recurso parcial a mútuo, as taxas de remuneração significativas pagas, a reiterada mobilização antecipada e reaplicação dos valores dos resgates em idênticos produtos financeiros, agregando parte da rentabilidade dos produtos trazidos aos autos, permitem inferir que o Autor, era ao tempo um investidor esclarecido, experiente e de sólida literacia na área.
V. Afigura-se ao arrepio das regras da experiência, afirmar que o Autor desconhecia o risco de perda de capital investido na data da maturidade da obrigação, ao optar pela compra/subscrição dos produtos complexos em causa, e dificilmente se aceita que confundisse a álea deste tipo de investimento com a garantia da salvaguarda do capital no depósito a prazo.
1. Da acção
1.1. Nos presentes autos de acção declarativa, sob a forma de processo comum, intentada por AA e BB contra, Deutsche Bank Aktiengesellschaft, CC, DD e EE, foi pedido:
a) a condenação solidária dos réus a pagarem aos autores a quantia de € 26. 875,14, relativa à subscrição de “Notes db Cabaz Global ago. 2017”, acrescida dos juros legais vencidos e vincendos desde 9 de agosto de 2017;
b) a declaração de resolução do contrato de subscrição das “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead” e, em consequência, a condenação solidária dos réus na restituição ou no pagamento aos autores da quantia de € 216 000,00, acrescida dos juros legais vencidos e vincendos desde 11 de maio de 2015, a qual foi, posteriormente reduzida para o montante de € 154 110,86.
Em síntese, alegaram que: na agência do 1ºRéu em ... o Autor assinou em Julho de 2013 o boletim de subscrição de tal aplicação “Notes db Cabaz Global Ago. 2017” ; o montante da subscrição foi de € 190 000,00, constituído por € 95 000,00 de capital próprio dos Autores e por € 95 000,00 de “alavancado”; o prazo de vencimento foi de quatro anos; os Réus CC, EE e DD intervieram como “mediadores ou funcionários do DB” (sic), tendo garantido aos Autores que o produto subscrito era seguro, sem quaisquer riscos, idêntico a um depósito a prazo. Um mês antes do respetivo vencimento, os Réus CC, EE e DD, “agindo como funcionários ou promotores do DB” (sic), promoveram e patrocinaram o resgate (sic) da referida aplicação, operação denominada “alienação onerosa de valores mobiliários”, pelo valor de € 163 124,86;
sobre a diferença entre o valor da subscrição e o valor do resgate os 2º, 3º e 4º Réus comprometeram-se perante os Autores a recuperar € 25 000,00 no espaço de quatro anos, através de aplicações junto do Réu DB, amortizando em cada ano, até ao dia 30 de agosto, € 6 250,00; no mesmo ato, o Autor comprometeu-se a dar as necessárias ordens de execução; para pagamento da prestação que se venceu em agosto de 2018, os Réus entregaram ao Autor o cheque n.º ........42, sacado sobre a conta n.º .........18, de que é titular “V..., Lda, no DB, no valor de € 6 250,00; apresentado a pagamento, esse cheque foi devolvido com a menção aposta de falta de provisão.
Em maio de 2015, nos mesmos termos e intervenientes, o Autor assinou um boletim de subscrição de Notes DB Intesa GDF Suez & Gilead, no montante global de € 400 000,00, constituído por € 216 000,00 de capital próprio, € 24 000,00 de antecipação de juros e € 160 000,00 de alavancado, através de um contrato de mútuo preparado pelo DB e assinado pelos Autores, com o prazo de cinco anos. Os 2º, 3º e 4ªRéus garantiram também aos Autores que o produto subscrito era seguro, sem quaisquer riscos, em tudo idêntico a um depósito a prazo; garantiram ainda que do terceiro ano em diante receberiam juros de 5% ao ano. Aqueles Réus que assumiram o pagamento das prestações do contrato de mútuo celebrado entre os Autores e o Réu DB, cumpriram nos anos de 2016 e 2017.A partir de 2018, o Réu DB passou a debitar essas prestações na conta de depósitos à ordem dos Autores, tendo os referidos Réus se obrigado a restituir aos Autores o dinheiro das prestações através de cheque, para o que lhe entregaram cheque no valor de € 1 465,98, sacado sobre a conta n.º .........18, de que é titular a referida V..., Lda, no DB, que apresentado a pagamento, foi devolvido por falta de provisão.
Em 2017, face às dificuldades financeiras do Réu DB; os Autores exigiram a entrega dos documentos relativos à subscrição das Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead, e só então “constataram que estas são um produto complexo” que implica risco de perda total do capital investido, e caso tivessem tomado conhecimento deste facto, nunca teriam subscrito tal produto.
1.2. O Réu DB contestou, alegando em suma que: no exercício da sua atividade comercial, celebrou com os Autores, em dezembro de 2005, um “Contrato de Abertura de Conta de depósito à Ordem”, com o n.º .......05.............44; os Autores ficaram, por sua iniciativa, afetos à agência de promotores externos do DB em ...; de facto, o DB tinha celebrado com o Réu EE o respetivo contrato de promoção desde 20/12/2007; em termos práticos, este Réu, como promotor / agente vinculado assegurou a relação com os Autores, nomeadamente no que concerne à apresentação dos produtos financeiros por estes subscritos; posteriormente à abertura da conta, o Autor respondeu a um questionário destinado a apurar o seu perfil de investidor; atentas as respostas dadas pelo Autor, o seu perfil de investidor e de risco foi classificado pelo Banco como investidor “nível 5 – Agressivo”, ao abrigo dos critérios constantes naquela data da Diretiva dos Mercados de Instrumentos Financeiros (DMIF), transposta para a legislação portuguesa pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007; na sequência, os Autores subscreveram, ao longo do tempo, diversos produtos financeiros (Depósito db Cabaz Mundial, 3ª Versão, Obrigações Db China Brasil Rendimento, Notes db Cabaz Global, Notes db Cabaz Global, 3ª Versão, Notes db Rendimento Europa), todos eles de risco, que lhes renderam elevados juros remuneratórios; estiveram sempre cientes dos riscos, demonstrando ser investidores esclarecidos; aquando da subscrição do produto Notes db Cabaz Global Ago.2017, o Autor foi alertado para os riscos inerentes, que consistiam na “perda total ou parcial do capital investido”, “remuneração não garantida”, “remuneração inexistente ou baixa” e “risco de reembolso antecipado”; foi-lhe apresentado o formulário que continha essas informações, o qual foi por ele datado e assinado; o referido produto foi constituído com € 95 000,00 de capitais próprios e € 95 000,00 por meio de um empréstimo concedido pelo Réu; para garantia de reembolso do capital mutuado, foram empenhadas a favor do DB as Notes db Cabaz Global Ago.2017 subscritas; os Autores estavam plenamente cientes desta realidade, tendo inclusivamente assinado, não apenas o contrato de mútuo, mas também uma livrança; com este produto, os Autores conseguiram um ganho, em juros brutos, de € 39 000,00; o resgate antecipado do produto foi feito a pedido dos Autores; concomitantemente com esse resgate, foi amortizado o empréstimo que a ele estava associado; na subscrição do produto Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead, os Autores investiram € 268 000,00, dos quais € 160 000,00 decorreram de empréstimo concedido, para esse efeito, pelo Réu DB; os Autores estavam cientes dos riscos inerentes a tal produto, especificados nas Informações Fundamentais ao Investidor; os Autores ainda não sofreram qualquer perda decorrente deste produto, uma vez que o mesmo ainda não atingiu a sua maturidade; os Autores tiveram “conhecimento da conclusão do negócio e dos respetivos termos” aquando da subscrição dos produtos em causa, ou seja, 30.07.2013 e 11.05.2015; tendo decorrido mais de dois anos desde a data em que os Autores tiveram conhecimento da conclusão da subscrição do produto “Notes db Cabaz Global Ago.2017” e “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead” e dos respetivos termos, mesmo que se admitisse que o Banco havia incumprido os seus deveres de intermediário financeiro, a sua responsabilidade estaria já prescrita, nos termos do art. 324/2 do Código dos Valores Mobiliários (CVM). Pediu a improcedência da ação.
O Réu DB pediu a intervenção, como sua associada, da Seguradora AIG Europe Limited – Sucursal em Portugal, alegando que, por via do contrato de seguro titulado pela apólice n.º PA......44, transmitiu para esta a responsabilidade civil emergente da sua atividade em Portugal.
1.3.Os Réus CC e EE contestaram, alegando, em síntese, que: atuavam como promotores do Réu DB, recebendo uma comissão por cada investidor que angariassem; eram também sócios e gerentes da sociedade J..., Lda, que tinha como objeto a atividade promocional de divulgação de produtos bancários e financeiros; esta sociedade prestava serviços de negociação ao DB, ocorre a exceção dilatória da ilegitimidade passiva, por preterição de um litisconsórcio necessário. Alegam que os Autores manifestaram sempre vontade de rentabilizar o capital que detinham, e dispostos a investir em produtos de risco, e o Autor possuía os conhecimentos necessários que o habilitavam a acompanhar e avaliar o comportamento de aplicações financeiras, bem como o potencial impacto destas, como resulta da subscrição ao longo dos anos, diversos investimentos em produtos estruturados de elevado risco, com eles obtendo rendimentos elevados.
Quanto ao resgate antecipado das Notes db Cabaz Global Ago.2017 partiu da iniciativa dos Autores, e obtiveram um montante elevado de juros; os Réus contestantes comprometeram-se, juntamente com o Réu DD, a recuperar € 25 000,00 no espaço de quatro anos, através de aplicações junto do DB que seriam sugeridas aos Autores, amortizando, anualmente, € 6 250,00; ainda sugeriram algumas aplicações aos Autores, mas estes não as aceitaram; entregaram aos Autores o cheque de € 6 250,00 por um sentimento de pena; mais tarde, refletiram e concluíram que não tinham a obrigação de reembolsar aquele montante aos Autores; o montante de € 268 000,00 investido pelos Autores no produto Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead foi constituído com € 108 000,00 de capitais próprios e € 160 000,00 obtidos através de um empréstimo do DB; para garantia de cumprimento deste, foram empenhadas as Notes subscritas pelos Autores; os Autores assinaram ainda uma livrança em branco; este produto é adequado ao perfil de risco dos Autores; tendo decorrido mais de dois anos desde data em que os Autores tiveram conhecimento da conclusão da subscrição do produto “Notes db Cabaz Global Ago.2017” e “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead” e dos respetivos termos, mesmo que se admitisse que haviam incumprido os seus deveres de intermediário financeiro, a sua responsabilidade estaria já prescrita nos termos do art. 324/2 do CVM. Concluíram que a ação deve improceder. Pediram a intervenção, como sua associada, da Seguradora AIG Europe Limited – Sucursal em Portugal, alegando que, por via do contrato de seguro titulado pela apólice n.º PA......44, o DB transmitiu para esta a responsabilidade civil emergente da sua atividade em Portugal, incluindo a desenvolvida pelos seus promotores.
1.4. Foi admitida a intervenção da AIG Europe Limited – Sucursal em Portugal, mas apenas a título acessório.
Contestou, a interveniente, e, em síntese, alegou que: desde 1 de dezembro de 2018, por efeitos da cisão da AIG Britânica (AEL), a parte seguradora nos contratos de seguro em causa passou a ser a sucursal em ... da AIG Europe S.A (AESA), Companhia de Seguros, tendo assumido a denominação de AIG Europe S.A. - Sucursal em Portugal; o contrato de seguro celebrado com o Réu DB não cobre a responsabilidade civil decorrente da prestação de serviços financeiros e profissionais por parte deste. No mais, aderiu à contestação do Réu DB.
A arguida exceção dilatória da ilegitimidade passiva foi julgada improcedente no despacho saneador.
Os Autores declararam reduzir o 3.º pedido formulado.
1.5. Realizada a audiência final, seguiu-se sentença que julgou a acção procedente, que culminou com o seguinte dispositivo:
«a) condenar solidariamente os Réus a pagarem aos Autores a quantia de € 26 875,14, relativa à subscrição de “Notes db Cabaz Global ago. 2017”, acrescida dos juros legais vencidos e vincendos, desde 9 de agosto de 2017;
b) declarar a resolução do contrato de subscrição das “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead” e, em consequência, condenar solidariamente os Réus a restituírem ou pagarem aos Autores a quantia de € 154 110,86, acrescida dos juros legais vencidos e vincendos desde 11 de maio de 2015.»
2. Da apelação
O Réu BD e os Réus CC e EE interpuseram recurso da sentença, pedindo a sua revogação e consequente absolvição dos pedidos.
O Tribunal da Relação de Guimarães julgou procedentes os recursos; o acórdão tem o seguinte dispositivo:
«Revogando a sentença recorrida, julgar a presente ação totalmente improcedente e absolver os Réus / Recorrentes Deutsche Bank Aktiengesellschaft, Sucursal em Portugal (DB), CC, DD e EE dos pedidos formulados pelos Autores / Recorridos AA e BB;»
3. A Revista
Inconformados, agora, os autores, interpuseram revista do acórdão.
Em síntese, pugnam pela revogação do julgado, invocando, além do mais, a nulidade dos contratos financeiros notes db Cabaz Global agosto 2017 e notes db Intesa, GDF Suez & Gilead, bem como dos contratos de mútuo coligados; se assim se não entender, a declaração de resolução do contrato financeiro notes db Intesa, GDF Suez & Gilead, e em consequência, procedentes os seus pedidos.
As suas alegações finalizam com as conclusões que se transcrevem:
«1. A estratégia processual do 1º Réu, passou por não juntar aos autos documentos importantes (identificados na página 4 do corpo das alegações), omitir aspetos relevantes (indicados na página 4 do corpo das alegações, particularmente não dar a conhecer a origem e causa do PFC recuperação/recovery notes db Intesa, GDF Suez & Gilead), aproveitar factos alegados pelos AA que não correspondem ao ocorrido (identificados nas páginas 4 e 5 do corpo das alegações).
2. Analisados os documentos juntos com a contestação há indícios fortes de falsificação de assinaturas, rúbricas e expressões – referimo-nos ao DOC 8 da contestação (sugestão personalizada de investimento); DOC 12 e 13 contestação (obrigações db China Brasil Rendimento); DOC 14 e 15 contestação (notes db Cabaz Global); DOC 16 e 17 contestação (notes db Cabaz Global (3ª versão)); DOC 18, 19 e 20 contestação (notes db Rendimento Europa e mútuo); DOC 21, 22 e 23 da contestação (notes db Cabaz Global Agosto 2017 e mútuo); DOC 24, 25 e 26 (notes db Intesa, GDF Suez & Gilead e mútuo) – embora, nesta fase, não seja possível requerer um exame pericial à escrita.
3. A contestação 2º e 4º RR seguiu a cartilha da contestação do DB e não revela um pingo de arrependimento pelas maldades que fizeram aos AA.
4. Brincaram com a iliteracia bancária e de intermediação financeira dos AA e ainda tiveram o desplante de ter retirado dinheiro da conta à ordem dos AA, cuja dimensão está em apuramento (pode ter atingido milhares de euros) - oportunamente, quando forem conclusos o estudo e o cruzamento de dados, será reclamado judicialmente.
5. O 1º Réu não alegou e não juntou aos autos os PFC notes db cabaz global fevereiro 2016 e notes db cabaz global fevereiro 2019 (percecionáveis pela leitura dos extratos dos meses de fevereiro 2013, agosto 2013 e março 2014 (DOC 9 da contestação).
6. Não o fez para esconder que foram esses produtos que geraram o prejuízo que originou o PFC recovery/recuperação notes db Intesa, GDF Suez & Gilead, provavelmente por ter receio que fosse pedido um exame pericial à escrita…
A nulidade das operações de aquisição dos PFC notes db Cabaz Global agosto 2017 e notes db Intesa, GDF Suez & Gilead, por inexistência de contrato de cobertura e dos mútuos com elas coligados.
7. Esta questão é trazida aos autos pela primeira vez no recurso de revista, mas como se trata de uma nulidade, por falta de forma, é de conhecimento oficioso, pelo que pode ser suscitada e apreciada a todo o tempo.
8. Na página 184 do douto acórdão sob recurso é dito que “a receção, a transmissão e a execução de ordens são serviços prestados por conta de outrem (artigos 290/1, a) e b) e 325 a 334 do CVM) ao abrigo de um negócio de cobertura, pelo qual o cliente concede ao intermediário os poderes necessários a receber ou transmitir as ordens com vista à celebração dos negócios de execução que têm por objeto instrumentos financeiros”; “o negócio jurídico de cobertura é normalmente um contrato de mandato sem representação, podendo constituir um mandato representativo”; e “o negócio de execução em que a compra se integra é, portanto, celebrado por conta, eventualmente também em representação, do cliente, em cumprimento da obrigação assumida no negócio de cobertura”.
9. Nos termos do artigo 321º, nº 1 do CVM “os contratos de intermediação financeira relativos aos serviços previstos nas alíneas a) a d) do nº 1 do artigo 290º e a) e b) do artigo 291º e celebrados com investidores não qualificados revestem a forma escrita e só estes podem invocar a nulidade resultante da inobservância de forma”.
10. As ordens de compra dos PFC notes db Cabaz Global agosto 2017 e notes db Intesa, GDF Suez & Gilead, integram-se nos serviços e atividades de investimento a que se refere o artigo 290º, nº 1, alínea a) do CVM são contratos financeiros sujeitos a forma (artigo 321º do CVM), sendo que a nulidade só pode ser invocada pelo cliente não qualificado, como é o caso dos AA.
11. O artigo 321º, nº 3 do CVM, estabelece que aos contratos financeiros se aplica o regime das cláusulas contratuais gerais, equiparando-se o investidor não qualificado a consumidor.
12. Não foi alegado pelo 1º Réu – e pelos demais RR - a existência de contrato de cobertura.
13. Também não foi junto aos autos qualquer contrato que prove a sua existência, sendo que é o contraente banco o onerado com a prova da sua existência (342º, nº 1 do CC) – trata-se de um requisito de validade do contrato financeiro, cuja verificação compete a quem dele pretende prevalecer-se (o 1º Réu).
14. O contrato de abertura de conta junto como DOC 1 da contestação (factos provados 12 e 13) não contempla qualquer cláusula donde se extraia a existência de um negócio de cobertura que atribua poderes ao mandatário (DB) para, em nome e a pedido dos AA, executar as ordens de compra dos PFC notes db Cabaz Global agosto 2017 e notes db Intesa, GDF Suez & Gilead.
15. Posição sufragada pelo douto acórdão do STJ de 23.3.2021, relatado pela Ilustre Sraª Juíza Conselheira Maria Clara Sottomayor (proc. 1719. 5T8LRA.C1. S1), cujo sumário consta das páginas 11, 12 e 13 do corpo das alegações, assim como se mostram identificados outros acórdãos no mesmo sentido.
16. Na doutrina pode ver-se ENGRÁCIA ANTUNES, em Direito dos Contratos Comerciais, Almedina, 4ª reimpressão da edição de outubro 2009, pág.160, que sustenta a exigência de forma nos contratos financeiros.
17. Inexistindo negócio de cobertura (mandato sem representação para executar a compra do PFC), os contratos de intermediação financeira dos PFC notes db Cabaz Global agosto 2017 e notes db Intesa, GDF Suez & Gilead são nulos, nos termos do art artigo 321º, nº 1 do CVM, assim como os mútuos com eles coligados (de €:95.000,00 e €:160.000,00 que alavancaram a sua aquisição) por arrastamento.
18.O que implica a restituição do capital próprio investido e anular todos os encargos (juros, imposto de selo e comissões cobrados ao abrigo dos empréstimos, comissões e impostos cobrados com a aquisição e venda dos PFC).
19. Estando os AA de boa-fé, não têm de devolver os juros auferidos sobre o capital entregue ao banco e têm direito a juros de mora sobre essas importâncias, desde a citação até integral pagamento - neste sentido, veja-se a transcrição na página 13 do douto acórdão de 23.3.2021 do STJ, relatado pela Sra Conselheira Maria Clara Sottomayor e a transcrição na página 14 do douto acórdão da RG, de 24.09.2020 (proc.2903/17.4 T8VCT. G1, 1ª secção Cível), relator José Manuel Flores.
A expressão “tomei conhecimentos das advertências” e “recebi um exemplar do documento previamente à aquisição” configura uma confissão?
20. Segundo a decisão recorrida, as expressões “tomei conhecimentos das advertências” e “recebi um exemplar do documento previamente à aquisição” constituem confissões exaradas em documentos particulares (IFI dos PFC notes db Cabaz Global agosto 2017 (DOC 22 da contestação) e notes db Intesa, GDF Suez & Gilead (DOC 25 da contestação)), insuscetíveis de serem postas em crise.
21. As expressões tomei conhecimentos das advertências” e “recebi um exemplar do documento previamente à aquisição” no PFC notes db Cabaz Global agosto 2017 (DOC 22 da contestação), com data de 30.07.2013, estão em letra maiúscula e não são do punho do Autor.
22. Do DOC 25 da contestação que integra a contestação não constam essas expressões.
23. Em 09.09.2020 (já depois de marcado julgamento), através do requerimento com a ref. ......27, o 1º R. juntou aos autos o DOC 25 da contestação, ou seja, o IFI das notes db Intesa, GDF Suez & Gilead, donde constam as referidas expressões e assinaturas imputadas ao Autor.
24. O DOC 25 da contestação, junto aos autos em 09.09.2020, tem data de 05.11.2015, ao passo que o boletim de subscrição tem data de 11.05.2015 (DOC 24 da contestação).
25. Não se trata de uma inversão de datas.
26. O IFI (DOC 23 da contestação) das notes db Cabaz Global agosto 2017 tem data de 30.07.2013 a mesma do boletim de subscrição das notes db Cabaz Global agosto 2017 (DOC 22 da contestação), sendo que a que a letra que consta da data dos DOC 22 e 23 da contestação é igual.
27. E é a mesma que consta do boletim de subscrição das notes db Intesa, GDF Suez & Gilead (DOC 24 da contestação) e do IFI das notes db Intesa, GDF Suez & Gilead (DOC 25 da contestação), que pertence ao 4º Réu EE.
28. Como o 4º Réu preencheu tardiamente o DOC 25 da contestação (junto aos autos em 09.09.2020), esqueceu-se como tinha preenchido a data no DOC 23 da contestação, e cometeu um erro, o que comprova que “tomei conhecimentos das advertências” é letra morta
29. A declaração confessória que o douto acórdão da Relação atribui à declaração “tomei conhecimentos das advertências” não é inequívoca como o exige o art 357º, nº1 do CC
30. A expressão foi induzida pelo 1º Réu, entidade que elaborou o IFI dos PFC notes db Cabaz Global Agosto 2017 e db Intesa, GDF Suez & Gilead.
31. A seguir à expressão “tomei conhecimentos das advertências” consta o seguinte: “a manuscrever pelo cliente”, o que significa que foi o 1º Réu que emitiu uma declaração dirigida ao cliente-adquirente do PFC para escrever “tomei conhecimentos das advertências”
32. Por outro lado, as advertências não foram escritas pelo Autor, mas sim pelo 1º Réu (responsável pela elaboração do IFI, como resulta da página 5/6 do IFI dos DOC 22 e 25 da contestação).
33. Não estamos perante uma declaração confessória inequívoca, porque não é espontânea, não é livre de constrangimentos, foi induzida pela pessoa jurídica que dela beneficia – o 1º Réu responsável (veja-se o douto acórdão da RG de 24.09.2020, proc 2903/17.4... focado no corpo das alegações).
34. Acresce que à expressão “tomei conhecimentos das advertências” não pode ser atribuída eficácia confessória porque o facto desfavorável ao Autor não é contemporâneo da declaração confessória emitida – neste sentido, veja-se o douto acórdão do STJ, de 07.03.2019, relatado pela Srª Juíza Conselheira Rosa Ribeiro Coelho (proc 2293/10.6 TBVIS.C1. S1) e que consta das páginas 17 e 18 do corpo das alegações.
35. Transpondo a doutrina do douto acórdão do STJ para o caso dos autos: em 30.07.2013 (DOC 22 contestação) e em 05.11.2015 (DOC 25 contestação), momento de emissão das declarações, não se sabia se os PFC poderiam implicar perda total de capital, proporcionar rendimento nulo ou negativo, taxa de rentabilidade inferior à exigida pelos investidores institucionais para níveis de risco idênticos, serem reembolsados antecipadamente por verificação de condição de reembolso antecipado automático e ser cancelado antecipadamente por opção do emitente, sujeitos a risco de crédito do emitente, etc.
36. São tudo eventuais eventos futuros, não verificáveis à data de emissão da declaração, pelo que, de acordo com a doutrina do douto acórdão do STJ de 07.03.2019, não pode ser atribuída eficácia confessória à expressão “tomei conhecimentos das advertências”.
37. No mesmo sentido, o Ilustre Juiz Desembargador Luis Filipe Pires de Sousa, em “Direito Probatório Material”, 2ª edição, Almedina, pág. 171, que diz: “é necessário que os factos declarados sejam desfavoráveis ao declarante já quando o escrito é produzido, sem o que a declaração dele constante não pode ser tida como proferida em contrário aos interesses do declarante”
38. Por outro lado, as “advertências” foram predispostas pelo DB, têm caráter genérico e “atestam conhecimentos…relativos ao contrato, quer em aspetos jurídicos, quer em questões materiais” (art 21º alínea e) da LCCG).
39. As “advertências” para terem valor jurídico implicava que o 1º Réu demonstrasse o que esclareceu o Autor em que circunstâncias podia perder a totalidade do capital investido? Em que circunstâncias poderia haver rendimento negativo? Isso significa perda de capital?
40. E o que quer dizer, que o produto pode gerar uma taxa de rentabilidade inferior à exigida pelos investidores institucionais para níveis de risco idênticos? E ainda o que significa e em que circunstâncias pode ser reembolsado antecipadamente por verificação de condição de reembolso antecipado automático e ser cancelado antecipadamente por opção do emitente?
41. O que significa o PFC estar sujeito a risco de crédito do emitente? Está em dificuldades económicas? Pode vir a estar? As contas do emitente apresentam risco?
42. Há uma panóplia de questões à volta das advertências que sem um esclarecimento do seu significado, pelo intermediário financeiro (1º Réu), não passam de generalidades.
43. Ora, as advertências atribuem conhecimentos que o Autor não tem, devendo considerar-se excluídas (art. 8º, alínea b), da LCCG), por serem absolutamente proibidas (art. 21º, alínea e), da LCCG).
44. Em suma, as declarações “tomei conhecimentos das advertências” são genéricas e anteriores à sua ocorrência e atestam conhecimentos que o aderente (Autor) não tem, pelo que não têm a virtualidade de constituírem declarações confessórias.
45. O douto acórdão violou os artigos 376, nº 2, 352º, 357º e 21º, alínea e) da LCCG.
A natureza e caraterísticas dos instrumentos financeiros: notes db Cabaz Global agosto 2017 e notes db Intesa, GDF Suez & Gilead. Violação do dever de informação.
46. As notes db Cabaz Global agosto 2017 e notes db Intesa, GDF Suez & Gilead são produtos financeiros complexos vocacionados para investidores qualificados e a sua aquisição transforma-os em especuladores (vejam-se as explicações a partir do estudo financeiro do Sr Prof. Paulo Mota focado nas páginas 19 a 21 do corpo das alegações).
47. As notes db Cabaz Global agosto 2017: este PFC é uma note, cujo pagamento estava dependente da performance de três índices acionistas (DJ EURO STOXX 50 INDEX, ETF i-shares MSCI BRAZIL INDEX FUND e HANG SENG CHINA ENTERPRISES INDEX).
48. Se no momento de observação da barreira um dos índices transacionasse a um valor inferior a 60% do valor na data de emissão do produto, o capital a reembolsar refletiria a desvalorização do índice com pior desempenho. A note tem incorporada uma opção de venda.
49. O investidor expõe-se ao risco, atuando como um vendedor de uma opção de venda, em que o preço de exercício corresponde ao nível da barreira, ou seja, o vendedor da opção está na dependência do exercício do direito pelo comprador da opção (emitente do PFC), a um preço pré-determinado (60% do valor de um dos índices).
50. As opções são compradas para cobrir um risco ou para especular, não se enquadrando num comportamento de investimento de investidores não qualificados.
51. As notes db Intesa, GDF Suez & Gilead: este PFC é uma note cujo desempenho -remuneração, montante do reembolso do capital e o timing do reembolso - estava dependente da performance das cotações das ações ordinárias da INTESA SANPAOLO, GDF SUEZ e GILEAD SCIENCES.
52. Se nos momentos de observação do reembolso antecipado, a cotação de todos os ativos subjacentes fosse igual ou superior à respetiva cotação na data de referência inicial, o produto terminava e o subscritor receberia 100% do capital juntamente com juros calculados em função de uma taxa de cupão bruta de 5%.
53. Se a condição de reembolso antecipado não se verificasse, o produto continuava até à maturidade.
54. Na maturidade se a cotação do ativo com pior desempenho não se tivesse desvalorizado em relação à data de referência inicial, o subscritor receberia 100% do capital, e juros seriam calculados à taxa de cupão bruta de 1%.
55. Se a cotação do ativo com pior desempenho exibisse uma desvalorização compreendida entre 0% e 25%, o subscritor receberia 100% do capital investido, mas não receberia juros. 56. Se a cotação do ativo com pior desempenho exibisse uma desvalorização superior a 25%, o subscritor receberia o capital investido deduzido do valor que resultaria da multiplicação do capital investido pela percentagem de desvalorização do ativo com pior desempenho, e não receberia juros.
57. A note incorpora um derivado que é uma opção de venda, em que o subscritor das notes passa a ter uma posição, com consequente exposição ao risco, que se assemelha à de um vendedor de uma opção de venda, em que o preço de exercício corresponde ao nível barreira (ou seja, ao preço dos ativos financeiros que despoleta o reembolso parcial do capital e ou pagamento dos juros).
58. As notes são instrumentos financeiros que expõem os subscritores ao risco de perda total ou parcial do capital investido e/ou da remuneração, relacionado com risco de mercado inerente à variação das cotações dos ativos subjacentes.
59. O facto de preverem a possibilidade de reembolso antecipado por vontade discricionária da entidade emitente e, ou pela verificação de certas condições potencia o risco de remuneração e cria o risco de reinvestimento do capital.
60. A estes riscos acrescenta-se o risco de crédito da entidade emitente (comum à generalidade dos instrumentos financeiros), o risco de taxa de juro (associado a instrumentos não indexados), o risco de liquidez, o risco cambial e o risco de conflito de interesses associado a todos os produtos complexos emitidos pelo Grupo DB.
61. Não são produtos, em regra, direcionados a investidores não qualificados porque implica uma expertise especial, não estando ao alcance de um investidor médio e minimamente informado; em suma, não se trata de um investimento normalmente ajustado a um investidor não q qualificado e, ao adquiri-lo, transforma-se num investidor com perfil de especulador.
62. Em síntese: os PFC são notes que incorporam opções, em que os AA tomaram uma posição equiparada a uma opção de venda, expondo-se, desse modo, ao risco, o qual se materializa se o comprador da opção (emitente do PFC) exercer o direito a um preço pré-determinado (60% do valor de um dos índices).
63. As opções são compradas para cobrir um risco ou para especular.
64. Ora, nada disto está escrito no IFI dos PFC, constituindo uma omissão de informação relevante: há uma violação clara do artigo 7º do CVM, porque a informação não é completa, verdadeira, clara e objetiva.
65. E é ilícita porque não dá a conhecer aos AA que os produtos em causa não se destinam a investidores não qualificados e que os transforma em especuladores.
66. Também o documento IFI das notes db Intesa, GDF Suez & Gilead, não informa que, desde 01.01.2014, o DB se autoexcluíra de comercializar PFC (acordo celebrado com a CMVM e 15 bancos, onde se incluía o DB, o qual pode ser consultado no site da CMVM no link https://www.apb.pt/content/files/PFC_Protocolo__FINAL.pdf) com as caraterísticas deste, a investidores não qualificados com património inferior a €:500.000,00.
67. As necessidades constantes de obter financiamento falaram mais alto que o dever de não comercializar junto dos AA (e de outros clientes) estes PFC. 68. Trata-se de uma violação do dever de informação.
O dever de adequação dos instrumentos financeiros ao perfil de investidor. O facto provado 3, 5 e o DOC 8 da contestação.
69. DOC 8 da contestação (sugestão de investimento personalizado): embora saibamos que, nesta fase, não é possível pedir um exame pericial à escrita, não podemos deixar de afirmar que a assinatura que consta deste documento não pertence ao Autor.
70. Não é razoável supor que sendo os AA pessoas que aplicavam as suas poupanças no BPI, em depósitos a prazo (facto provado 5) e só possuem a antiga 4ª classe (facto provado 3), passassem a ter um perfil de investidor agressivo – 5, que é o perfil de especulador e que tenha uma formação específica em finanças, como decorre do DOC 8 da contestação.
71. Trata-se de um documento forjado pelos 2º, 3º e 4º RR (ou só por algum deles).
72. Diz o facto provado 3: “os AA possuem ambos como grau académico o quarto ano de escolaridade não possuindo conhecimentos ou formação que os habilitasse a compreender os vários tipos de produtos financeiros e avaliar os riscos de cada um deles”.
73. Tendo em conta este facto provado e a complexidade e risco dos PFC notes db Cabaz Global agosto 2017 e notes db Intesa, GDF Suez & Gilead (com opções neles embutidas) não é possível sustentar que exista adequação entre o perfil de investidor do A e os produtos.
74. Os RR não prestaram “todas as informações necessárias a uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada” (art 312º CVM).
75. Ocorreu violação do art 7º, 304º, nº1 e 2 do CVM D.8. A relação jurídica 1º R/2º, 3º e 4º RR.
76. A relação jurídica entre o 1º R e os 2º, 3º e 4º RR subsume-se na figura do contrato de agência, agindo estes como mandatários daquele.
77. Os 2º, 3º e 4º RR atuavam como funcionários do DB, estavam sob a total dependência do comitente (DB), dele recebendo ordens, instruções e diretivas de como deviam atuar.
78. A entender-se assim, estamos perante uma relação jurídica de comissão, a que se aplica o art 500º do CC: “aquele que encarrega outrem de qualquer comissão responde, independentemente de culpa, pelos danos que o comissário causar, desde que sobre este recaia também a obrigação de indemnizar”.
79. Os autores dos ilícitos – em co-autoria – foram os 2º, 3º e 4º RR, respondendo quer por força do artigo 304º, nº 5 do CVM, quer em via de regresso (artigo 500, nº 3 do CC). E a responsabilidade é solidária, nos termos dos artigos 490º e 497º do CC.
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4.1. Os Réus DB e EE apresentaram articulado de resposta, infirmando a argumentação dos Autores e concluíram pela improcedência da revista.
II. Admissibilidade e objecto do recurso
Atestados os requisitos gerais de recorribilidade e de impugnação do acórdão da Relação, vistos os fundamentos, a revista é admissível - cfr. arts. 629.º, n.º 1, 671.º, n.º 1, e 674º, nº1, do CPC.
Percorridas as conclusões dos recorrentes, em interface com o acórdão da Relação, haverá que decidir se, em adverso ao julgado pela Relação, os Réus devem ser condenados nos pedidos. Para o que se apreciarão as questões seguintes:
• Da falsificação de documentos juntos com a contestação;
• A alteração da matéria de facto – o valor probatório da expressão “tomei conhecimentos das advertências” e “recebi um exemplar do documento previamente à aquisição”;
• Da nulidade das operações de aquisição dos PFC notes db Cabaz Global agosto 2017 e notes db Intesa, GDF Suez & Gilead, por inexistência de contrato de cobertura e dos mútuos com elas coligados;
• Da natureza - caraterísticas dos produtos financeiros subscritos; a violação do dever de informação e da violação do dever de adequação dos instrumentos financeiros ao perfil de investidor
• Da responsabilidade dos demais Réus; a relação jurídica de comissão estabelecida com o 1ºRéu DB.
III - Fundamentação A. Os Factos
Vem provado das instâncias:
1) Os Autores foram emigrantes na ..., o Autor desde 1982 e a Autora desde 1986. 2) O Autor trabalhava na construção civil; a Autora era operária têxtil.
3) Os Autores possuem ambos como grau académico o quarto ano de escolaridade, não possuindo conhecimentos ou formação que os habilitasse a compreender os vários tipos de produtos financeiros e avaliar os riscos de cada um deles.
4) Os Autores regressaram definitivamente a Portugal em 1993, tendo passado a exercer a atividade comercial de ..., no estabelecimento denominado “...”, sito na freguesia de ..., do concelho de ....
5) Enquanto foram emigrantes, os Autores aplicaram as suas poupanças de dinheiro em depósitos a prazo no antigo “Banco Borges & Irmão”, agora Banco BPI, balcão de ....
6) Os Autores eram pessoas que pretendiam rentabilizar o capital do seu agregado familiar.
7) Os Autores tinham conhecimento das taxas de juro praticadas pelas instituições de crédito nos depósitos a prazo.
8) Procuravam soluções financeiras que lhes permitissem obter rentabilidade superior.
9) Sabiam que isso implicava riscos acrescidos por comparação com os inerentes a um depósito a prazo.
10) Em 2005, o Autor viu na montra da agência do “Deutsche Bank”, sita na ..., uma inscrição que anunciava uma aplicação financeira de cinco anos, com juros de 6% ao ano, capital garantido na maturidade e pagamento dos juros de seis em seis meses.
11) Interessado, o Autor entrou nessa agência do “Deutsche Bank”, onde lhe confirmaram as referidas condições da aplicação.
12)No exercício da sua atividade comercial, o 1.º Réu celebrou com os Autores, em Dezembro de 2005, um “Contrato de Abertura de Conta de depósito à Ordem” com o n.º......................44, contrato este composto por “Condições Gerais” e por “Condições Particulares” – cf. doc. de fls. 80 e ss.
13) O contrato de depósito à ordem celebrado com os Autores era composto pelas Condições Gerais inerentes aos serviços bancários, cuja redação nunca foi posta em causa por eles.
14) Em consequência, os Autores subscreveram a aplicação anunciada, cuja designação ignoram.
15) Entretanto, os Autores tomaram conhecimento da existência da agência do “Deutsche Bank” em ....
16) Por razões de comodidade, em 2006, os Autores transferiram da agência de Braga para a agência de ... os assuntos que tinham com o “Deutsche Bank”.
17) Posteriormente, os Autores ficaram, por sua iniciativa, afetos à agência de promotores externos do Deutsche Bank, aqui 1.º Réu, em ....
18) Na circunscrição territorial de ..., o Deutsche Bank operava por via de promotores externos, com os quais tinha celebrado um contrato de promoção.
19) O Deutsche Bank tinha celebrado com o 4.º Réu EE o respetivo contrato de promoção desde 20/12/2007 (cf. doc. de fls. 87 e ss), contrato esse que, 10 anos mais tarde, foi alvo de atualização (cf. doc.3 de fls. 106 vº).
20) O 4.º Réu EE foi um dos promotores/ agente vinculado que assegurou a relação com os Autores, nomeadamente, no que concerne à apresentação dos produtos financeiros por aqueles subscritos, sendo que o contrato de promoção já se encontra extinto desde 31 de maio de 2018 (cf. doc.4 de fls. 128 vº e ss)
21) Paralelamente, o 1.º Réu tinha também relação contratual com a sociedade J..., Lda, tendo celebrado com esta empresa um contrato de prestação de serviços de negociação em 2005 (cf. doc.5de fls. 130 e ss) e que fora atualizado em 2017 (cf. doc.6 de fls. 133 e ss), sendo que este também já se encontra findo desde 31 de Maio de 2018 (cf. doc.7 de fls. 138 e ss).
22) À data dos factos vertidos na p.i., o 2.º e 4.º Réus eram sócios-gerentes da sociedade por quotas J..., Lda (doravante abreviadamente designada por ‘J..., Lda’), com o NIPC .......90, e com sede na Rua ..., Loja D, ... ... – cf. doc. n.º 1 junto a fls. 437.
23) Esta sociedade por quotas tinha como objeto a atividade promocional de divulgação de produtos bancários e financeiros, nomeadamente crédito à habitação, crédito pessoal, crédito automóvel, leasing mobiliário e imobiliário, fundos de investimento, contas poupança e depósitos a prazo, atuando no campo não exclusivo das instituições de crédito ou sociedades financeiras.
24) Atuava, ainda, no âmbito da consultoria estratégica e de investimento na área financeira e económica.
25) A J..., Lda era uma agência de promotores externos do Deutsche Bank.
26) O Deutsche Bank celebrou contratos de promoção com o 2.º e 4.º Réus, sócios-gerentes da referida sociedade – cf. doc. n.º 2 de fls. 441 vº e ss tendo estes contratos sido revogados a 31 de maio de 2018 – cf. doc. n.º 3 de fls. 461 e ss.
27) No âmbito destes contratos de promoção, o 2.º e 4.º Réus emitiam recibos verdes ao Deutsche Bank, porquanto recebiam uma comissão de € 5,00 (cinco euros) por cada Investidor que ainda não tivesse estabelecido qualquer relação contratual com o Deutsche Bank e que viesse, em resultado da atividade de promoção desenvolvida pelos promotores, a abrir uma conta de depósito à ordem junto deste Banco – cf. cláusula 7 do contrato de promoção supra aludidos.
28) Os promotores – 2.º e 4.º Réus – foram constituídos, no âmbito desses contratos, como “mandatários” do Deutsche Bank para, “nas condições aí estabelecidas, desenvolverem, em nome e representação” deste, “atividades de promoção de produtos e serviços bancários e financeiros disponibilizados pelas empresas que integram o Grupo Deutsche Bank em Portugal”.
29) Para poderem exercer a atividade de promotores, o 2.º e 4.º Réus estavam registados enquanto tal junto do Banco de Portugal e da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários.
30) Nos termos da cláusula 3, alínea c), do “Contrato de Promotor Deutsche Bank” constituem deveres deste último “supervisionar o exercício da atividade desenvolvida pelo Promotor (...) assegurando que a mesma é exercida com rigorosa observância do disposto: i) nas normas legais e regulamentares aplicáveis, designadamente as estabelecidas no Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, no Código dos Valores Mobiliários, no DELFIM, na Instrução e no Regulamento CMVM; ii) nos Regulamentos e demais Documentos Informativos; iii) no Código de Conduta; iv) no Regulamento Interno; e v) no presente Contrato.”
31) Nos termos da cláusula 9 do “Contrato de Promotor Deutsche Bank” que, sob a epígrafe “Responsabilidade”, dispõe o seguinte: “O DB Portugal é responsável perante o público, Investidores e Participantes por todos os atos praticados pelo Promotor, nomeadamente pelas informações ou pelo aconselhamento sobre as operações a realizar (...)”, devendo os “Investidores” e “Participantes” ser entendidos, neste contexto, como, respetivamente, “quaisquer pessoas (singulares e/ou coletivas) que possam subscrever ou contratar unidades de participação e/ou qualquer dos demais produtos” e “os titulares de unidades de participação”.
32) Foi celebrado entre o Deutsche Bank e a J..., Lda um “Contrato de prestação de serviços de negociação” – cf. doc. n.º 4 de fls. 462 vº.
33) Posteriormente, foi este contrato revogado por acordo – cf. doc. n.º 5 de fls. 467.
34) Por conseguinte, também a referida sociedade, no decorrer da sua atividade, emitia recibos verdes ao Deutsche Bank.
35) No contrato de prestação de serviços de negociação ficou assente que o Deutsche Bank recorria à J..., Lda para esta proceder, “junto dos clientes e de acordo com determinadas linhas orientadoras previamente estabelecidas (...) à negociação de termos e condições aplicáveis à contratação dos demais produtos”, sendo que se deve entender por “demais produtos”, no contexto do contrato em análise, “os produtos e serviços bancários e financeiros, com exceção das unidades de participação, disponibilizados e/ou comercializados pelas empresas que integram o Grupo Deutsche Bank em Portugal e que se encontram devidamente identificados” no Anexo II do contrato de promotor Deutsche Bank supra referido doc. de fls. 441 vº e ss: “contas, depósitos, cartões de débito e crédito, organismos de investimento coletivo, títulos, crédito, leasing, aluguer de longa duração, aluguer operacional, seguros”.
36) Como obrigações do Deutsche Bank, constam da cláusula 3 do referido contrato as seguintes: “a) Colaborar com a Sociedade por forma a permitir a correta prestação dos serviços ora contratados, disponibilizando os documentos e prestando todas as informações que para o efeito se mostrem necessárias; b) Supervisionar o exercício da atividade desenvolvida pela Sociedade, nomeadamente com o intuito de avaliar se a mesma é exercida com rigorosa observância do disposto no presente Contrato e nas normas legais e regulamentares aplicáveis; c) Informar a Sociedade sobre as condições a cada momento aplicáveis à contratação de qualquer dos demais produtos (nomeadamente os limites máximos e mínimos de comissões, margens, taxas, e/ou outros encargos estabelecidos para cada produto e/ou serviço); d) Informar de imediato a Sociedade sobre quaisquer factos de que tenha conhecimento e que possam ser considerados objetivamente relevantes para a prestação dos serviços objeto deste contrato; e) Pagar à Sociedade a remuneração prevista no art. 6.”
37) Já na cláusula 4.1 do referido contrato, estão previstas as obrigações da J..., Lda destacando-se as seguintes: “K) Sem prejuízo do disposto na alínea seguinte, não reconhecer, para quaisquer efeitos, qualquer alteração na distribuição do respetivo capital social sem antes obter o acordo expresso e por escrito do Banco”; L) Assegurar que a totalidade do respetivo capital social é, a todo o tempo, detido apenas por Promotores ou por outras pessoas físicas previamente aprovadas pelo Banco, e a comprovar documentalmente tal situação perante o Banco, sempre que solicitada para o efeito”.
38) Nos termos da cláusula 6 do contrato em estudo, “Para remuneração dos serviços prestados no âmbito deste contrato, e desde que se mostrem cumpridos os termos de prestação de serviços prestados nos contratos de penhor, o Banco pagará à Sociedade as comissões de negociação, em valor calculado nos termos descritos no anexo ao contrato, a cujo valor serão deduzidos os custos de promoção suportados pelo Banco nos termos de cada um dos contratos de promotor.”
39) Todos os produtos financeiros apresentados pela J..., Lda eram elaborados, comercializados, controlados e aprovados pelo Deutsche Bank, na pessoa do Diretor Regional responsável pelas agências de promotores externos do Deutsche Bank.
40) Ou seja, toda e qualquer proposta que fosse realizada pelos 2.º e 4.º Réus, e pela J..., Lda, a um cliente, era sempre aprovada e Autorizada pelo Deutsche Bank, nomeadamente pelo seu Departamento de Risco, e por este retificada, se assim fosse necessário.
41) Sendo que todas estas Autorizações eram sempre realizadas por escrito, nomeadamente via e-mail.
42) Todos os processos negociais estavam dependentes do aval do Deutsche Bank, não tendo os promotores – 2.º e 4.º Réus – ou a J..., Lda, qualquer autonomia na aprovação dos mesmos.
43) Pois estes apenas promoviam os produtos financeiros do Deutsche Bank.
44) E porque a J..., Lda e, por conseguinte, os promotores – 2.º e 4.º Réus - obedeciam à hierarquia do Deutsche Bank, respondendo perante o Diretor Regional.
45) Foi nesta agência de ... que os Autores conheceram os Réus CC, EE e DD.
46) Na fachada da agência de promotores externos do Deutsche Bank em ..., a J..., Lda, constava a palavra “Promotores”.
47) No âmbito das relações com os Réus DD e EE foram apresentadas ao Autor diversos produtos financeiros.
48) Posteriormente à abertura de conta o primeiro titular da mesma, ou seja, o aqui Autor AA, com data de 23 de junho de 2009, assinou documento denominado de “Sugestão Personalizada de Investimento” – cf. doc. de fls. 139.
49) Do referido documento consta que se trata de “um resumo com a informação que nos facultou com a data de 23-06-2009” e designadamente que o 1.º Autor AA: a) o investimentos de maior risco foi ações nacionais e internacionais; que experiência de investimento era de que efetua alguns investimentos de volume relevante por ano; que não nenhuma relação entre a profissão do A. com o sector financeiro; que possui o ensino básico; que tem formação específica em finanças; que tinha até 75% do seu património investido em ativos financeiros líquidos (ações cotadas, obrigações, FIM, depósitos e estruturados mobilizáveis antecipadamente); Que tem como rendimento anual regular entre €25.000,00 e €50.000,00; Que o seu objetivo nos investimentos seria a “Especulação”.
50)Em consequência das respostas constantes do documento foi o 1.º Autor classificado pelo Banco, ao nível do seu perfil de investidor e de risco como investidor “nível 5 – Agressivo”. 51) Em 04 de Março de 2009, o Autor AA investiu num primeiro produto estruturado denominado “Depósito db Cabaz Mundial (3ª Versão)”, nos termos do (i) “Boletim de Subscrição” e (ii) Prospeto Informativo - docs. ns. º 10 e 11 junto com a contestação do co-Réu Banco, com as seguintes características:
-Era um produto com um nível de risco agressivo, porquanto estava sujeito às cotações dos ativos “DJ EURO STOXX 50, S&P 500 e Nikkei 225”, não existia garantia de remuneração ou de capital na maturidade do produto e havia a possibilidade da existência de um evento de crédito, o que daria origem a um reembolso antecipado –cf. boletim e prospeto doc.10 e 11 juntos com a contestação do Banco Réu;
- O valor da operação foi de € 100.000,00 (cem mil euros), tendo como prazo de vencimento 4 anos, ou seja, iniciou a sua vigência em 11.03.2009 e teria o seu termo em11.03.2013;
- O referido produto foi constituído com € 86.000,00 por parte dos Autores.
52) O produto em causa pagou, pelo menos, juros no montante bruto de €7.561,55 (cf. doc. n.º 9): (i) € 1.228,94 em 18.03.2010; (ii) € 1.215,18 em 18.06.2010; (iii) € 1.229,37 em 18.09.2010; (iv) € 1.264,20 em 17.12.2010; (v) € 1.296,02 em 18.03.2011; (vi) € 1.327,84 em 17.06.2011;
53) O produto correu os seus termos, tendo o Autor procedido ao resgate antecipado do mesmo em 05 de julho de 2011, pelo montante de € 86.000,00 (sem perda).
54) (1.89.) Em 23/09/2009 é adquirido o produto “Obrigações Db China Brasil Rendimento” nos termos do (i) “Boletim de Subscrição” e (ii) “Documento Informativo” – cf. docs. ns. º 12 e 13 - com as seguintes características:
- O valor da operação foi de € 20.000,00 (vinte mil euros) tendo como prazo de vencimento 3 anos e quatro dias, ou seja, iniciou a sua vigência em 16.11.2009 e teria o seu termo em 20.11.2012,
- Este produto complexo subscrito comportava vários riscos e foi classificado como um produto de perfil 5 – Agressivo, porquanto tanto o capital investido, como a sua rentabilidade, não se encontram garantidos na data da sua maturidade, cf. resulta expressamente de toda a documentação contratual já junta, onde constam por diversas vezes as expressões “risco de perda total ou parcial do capital investido”, “remuneração não garantida”, e “risco de reembolso antecipado”.
- Este produto tinha o reembolso e remuneração do capital associado à evolução do “i-Shares MSCI Brazil Index Fund e do Hang Seng China Enterprises Index”.
- Quanto ao produto em causa, este pagava um juro anual, tendo os AA auferido a este título, em juros brutos, €3.600, 00: (i) 18.11.2010 – pagamento de € 1.200,00 a título de juros; (ii) 18.11.2011 – pagamento de € 1.200,00 a título de juros; (iii) 18.11.2012 – pagamento de € 1.200,00 a título de juros – doc. 9;
55) O produto correu os seus termos, tendo o mesmo chegado à sua maturidade prevista no contrato e, em conformidade com o convencionado, foi creditado o valor de €20.000,00 na conta titulada pelos Autores (cf. doc.9).
56) Três meses depois da subscrição do produto “Obrigações Db China Brasil Rendimento”, em 11/12/2009 é adquirido o produto “Notes db Cabaz Global”, nos termos do (i) “Boletim de Subscrição” e (ii) “Documento Informativo” – cf. doc. 14 e 15 juntos com a contestação do Banco Réu, com as seguintes características:
- O valor da operação foi de € 45.000,00 (quarenta e cinco mil euros) tendo como prazo de vencimento 3 anos e 3 dias, ou seja, iniciou a sua vigência em 18.12.2009 e teria o seu termo em 21.12.2012
- Um produto agressivo, classificado como nível 5 – Agressivo,
- Este produto concebido e emitido sob a forma de notes, estava dependente da evolução do Cabaz de Índices mais bem identificados
- o produto em causa pagava um juro trimestral, tendo os Autores recebido só em juros brutos nomeadamente, €10.800,00, nos termos dos pagamentos que se descrevem): (i) 18.03.2010 – pagamento de €900,00 a título de juros; (ii) 18.06.2010 – pagamento de €900,00 a título de juros; (iii) 18.09.2010 – pagamento de €900,00 a título de juros; 23/175 (iv) 20.12.2010 – pagamento de €900,00 a título de juros; (v) 24.03.2011– pagamento de €900,00 a título de juros; (vi) 27.06.2011– pagamento de €900,00 a título de juros; (vii) 26.09.2011– pagamento de €900,00 a título de juros; (viii) 28.12.2011– pagamento de €900,00 a título de juros; (ix) 27.03.2012– pagamento de €900,00 a título de juros; (x) 27.06.2012– pagamento de €900,00 a título de juros; (xi) 26.09.2012– pagamento de €900,00 a título de juros; (xii) 21.12.2012– pagamento de €900,00 a título de juros;
57) O produto correu os seus termos, tendo o mesmo chegado à sua maturidade prevista no contrato e, em conformidade com o convencionado, foi creditado o valor de €45.000,00 na conta titulada pelos Autores (cf. extrato junto como doc.9).
58) Em 15.06.2010 é subscrito pelos clientes o produto “Notes db Cabaz Global (3ª Versão)”, nos termos do (i) “Boletim de Subscrição” e (ii) “Documento Informativo” que ora se juntam como docs. ns. º 16 e 17, com as seguintes características: - o valor da operação foi de € 50.000,00 (cinquenta mil euros) tendo como prazo de vencimento 3 anos e 4 dias, ou seja, iniciou a sua vigência em 26.07.2010 e teria o seu termo em 31.07.2013
- Produto agressivo, classificado como nível 5 – Agressivo,
- Produto concebido e emitido sob a forma de notes, estava dependente da evolução e inexistência de um incumprimento por parte das “Entidades de Referência”, no caso, “ETF i-Shares MSCI Brazil Index Fund, do DJ Euro Stoxx 50 e do Hang Seng China Enterprises Index”.
59) O produto em causa pagava um juro trimestral, tendo os Autores recebido só em juros brutos, €11.000,00, nos termos dos pagamentos que se descrevem infra (cf. extratos já juntos como doc. n.º 9): (i) 26.10.2010 – pagamento de € 1.000,00 a título de juros; (ii) 26.01.2011 – pagamento de € 1.000,00 a título de juros; (iii) 26.04.2011 – pagamento de € 1.000,00 a título de juros; (iv) 26.04.2011 – pagamento de € 1.000,00 a título de juros; (v) 27.07.2011 – pagamento de € 1.000,00 a título de juros; (vi) 03.11.2011 – pagamento de € 1.000,00 a título de juros; (vii) 02.02.2012– pagamento de € 1.000,00 a título de juros; (viii) 04.05.2012 – pagamento de € 1.000,00 a título de juros; (ix) 02.08.2012 – pagamento de € 1.000,00 a título de juros; 25/175 (x) 02.11.2012 – pagamento de € 1.000,00 a título de juros; (xi) 04.02.2012 – pagamento de € 1.000,00 a título de juros;
60) O produto apenas pagou juros nos 11 trimestres acima identificados, uma vez que ocorreu o resgate antecipado de fundos em 11.03.2013, pelo montante de € 50.275,00 (ou seja, com ganho de €275,00, ao que acrescem os juros pagos supra descritos).
61) Em 21.03.2011 subscrever o produto “Notes db Rendimento Europa” nos termos do (i) “Boletim de Subscrição” e (ii) “Documento Informativo” docs. ns. º 18, com as seguintes características:
- O valor da operação foi de € 50.000,00 (cinquenta mil euros) tendo como prazo de vencimento 4 anos, 11 meses e 5 dias, ou seja, iniciou a sua vigência em 15.04.2011 e teria o seu termo em 20.03.2016,
- Este produto complexo subscrito pelo Autor comportava vários riscos, tendo sido classificado como Perfil 4 – Dinâmico, porquanto tanto o capital investido, como a sua rentabilidade, não se encontram garantidos na data da sua maturidade, conforme resulta expressamente de toda a documentação contratual já junta.
- Nos termos do expresso no “Documento Informativo”, o reembolso e a rentabilidade do produto estavam dependentes da evolução de 20 entidades de referência.
- Foi constituído com € 10.000,00 de capitais próprios por parte dos Autores e os remanescentes € 40.000,00 por meio de empréstimo concedido pelo ora réu (cf. contrato de mútuo que ora se junta como doc. n.º 20), e para efeitos de garantia do empréstimo concedido, foram empenhadas a favor do Banco as Notes db Rendimento Europa.
62) Os AA subscreveram e avalizaram uma livrança, a qual faz parte integrante da documentação do mútuo
63) O produto em causa pagava trimestralmente, sendo que neste produto os Autores ganharam só em juros brutos a maquia de €2.838,87 nos termos dos seguintes pagamentos (cf. extratos de conta já juntos como doc. n.º 9): a) 23.06.2011 – pagamento de € 290,60 a título de juros; b) 23.09.2011 – pagamento de € 436,75 a título de juros; c) 23.12.2011 – pagamento de € 441,88 a título de juros; 27/175 d) 23.03.2012 – pagamento de € 427,13 a título de juros; e) 25.06.2012 pagamento de € 356,63 a título de juros; f) 25.09.2012 pagamento de € 332,38 a título de juros; g) 24.12.2012 pagamento de € 280,50 a título de juros; h) 22.03.2013 pagamento de € 273,00 a título de juros;
64) O produto nunca chegou a atingir a sua maturidade, uma vez que ocorreu o seu resgate antecipado, sem qualquer perda associada.
65) Concomitantemente à venda e desmobilização deste produto, foi amortizado o empréstimo que estava associado ao mesmo.
66) Os Réus EE e DD convenceram os Autores a subscrever uma aplicação financeira.
67) No dia 30 de julho de 2013, o Autor assinou um “Boletim de Subscrição” de “Notes db Cabaz Global ago. 2017”, em que foi promotor o “Deutsche Bank” – cf. doc. 1 junto com a p.i., fls. 11 e ss.
68) O montante da subscrição foi de € 190.000,00 (cento e noventa mil euros), constituído por € 95.000,00 de capital próprio dos Autores e por € 95.000,00 de alavancado.
69) O prazo de vencimento da subscrição foi de 4 anos (09-08-2013 a 09-08-2017).
70) Nos termos do (i) “Boletim de Subscrição” e das (ii) “Informações Fundamentais ao
Investidor (IFI)”, assinados pelo Autor, o produto tinha as seguintes características:
- O valor da operação foi de € 190.000,00 (cento e noventa mil euros) tendo como prazo de vencimento 4 anos, ou seja, iniciou a sua vigência em 09.08.2013 e teria o seu termo em 09.08.2017, cf. doc. n.º 21;
- Produto complexo subscrito pelo Autor comportava vários riscos, tendo sido classificado como Perfil 5 – Agressivo,
- Tanto o capital investido, como a sua rentabilidade, não se encontram garantidos na data da sua maturidade, constando das Informações Fundamentais ao Investidor (doc.22) diversas vezes as expressões “risco de perda total ou parcial do capital investido”, “remuneração não garantida”, “remuneração inexistente ou baixa” e “risco de reembolso antecipado”,
-o reembolso e a rentabilidade do produto estavam dependentes da evolução do índice Hang Seng China Enterprises Index (“HSCE”), do índice DJ Eurostoxx50 Index (“DJ EuroStoxx”) e do fundo ETF iShares MSCI Brazil Index Fund (“MSCI Brazil”) – cada um o “Constituinte do Cabaz”
71) Do documento (IFI – doc.22), resulta a expressão manuscrita pelo próprio punho do Autor AA “Tomei conhecimento das advertências”, em conformidade com a exigência prevista no art. 8.º n. º4 do Regulamento da CMVM n.º 2/2012. 120.
72) O referido produto foi constituído com € 95.000,00 de capitais próprios por parte dos Autores e os remanescentes € 95.000,00 por meio de empréstimo concedido pelo ora réu (cf. contrato de mútuo - doc. n.º 23).
73) Nos termos do contrato de mútuo e para efeitos de garantia do empréstimo concedido, foram empenhadas a favor do Banco as “Notes db Cabaz Global ago.2017” tendo ainda subscrito e avalizado, respetivamente Autor e Autora, uma livrança, a qual faz parte integrante da documentação do mútuo já junta como doc.23. 124.
74) O produto em causa pagava trimestralmente, sendo que neste produto os Autores ganharam só em juros brutos a maquia de €39.900,00 nos termos dos seguintes pagamentos (cf. extratos de conta já juntos como doc. n.º 9): a) 14.11.2013 – pagamento de € 3.325,00 a título de juros; b) 13.02.2014 – pagamento de € 3.325,00 a título de juros; c) 14.05.2014 – pagamento de € 3.325,00 a título de juros; d) 14.08.2014 – pagamento de € 3.325,00 a título de juros; e) 13.11.2014 – pagamento de € 3.325,00 a título de juros; f) 12.02.2015 – pagamento de € 3.325,00 a título de juros; g) 14.05.2015 – pagamento de € 3.325,00 a título de juros; h) 13.08.2015 – pagamento de € 3.325,00 a título de juros; i) 14.11.2016 – pagamento de € 3.325,00 a título de juros; j) 14.02.2017 – pagamento de € 3.325,00 a título de juros; k) 12.05.2017 – pagamento de € 3.325,00 a título de juros; l) 09.08.2017 – pagamento de € 3.325,00 a título de juros;
75) A referida subscrição foi feita no extinto balcão de ... do “Deutsche Bank”. 76) Ao longo da vigência deste produto e até à sua desmobilização antecipada, o mesmo pagou mais de 8% em juros, pelo que os Autores entre reembolso e juros brutos, receberam o correspondente a um lucro de 42% por referência ao capital (próprio) inicialmente investido. 77) Concomitantemente à desmobilização deste produto, foi amortizado o empréstimo que estava associado ao mesmo, conforme movimento no valor de €95.494,30 com data-valor de 09/08/2017 e que aparece refletido no extrato do mês correspondente - doc.9
78) Intervieram nessa operação, como promotores do “Deutsche Bank”, os Réus EE e DD.
79) No dia 9 de agosto de 2013 foi depositada na conta de depósitos à ordem aberta pelos Autores no DB a quantia de € 163 124,86, relativa ao capital à data não perdido que havia sido investido no produto notes db Cabaz Global ago. 2017.
80) A diferença entre o valor da subscrição e o valor do resgaste foi de € 26.875,14 (190.000,00 - 163.124,86).
81) No dia 11 de maio de 2015, o Autor assinou um “Boletim de Subscrição” de “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead”, em que foi promotor o Réu “Deutsche Bank AG” [cf. documento n.º 6 de fls. 17 e ss).
82) O custo total da subscrição foi de € 268 000,00, correspondente a 67% do valor nominal de € 400 000,00, suportado da seguinte forma: - Capital próprio: € 108 000,00; -Alavancagem: € 160 000,00.
83) O produto “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead” consubstanciou uma operação de subscrição de quatrocentas unidades, cada uma delas com o valor nominal de € 1 000,00, pelo preço correspondente a 67% do valor nominal, num total de € 268 000,00, assim constituído: € 108 000,00 de capital próprio; € 160 000,00 decorreram de empréstimo concedido pelo ora Réu (cf. contrato de mútuo de fls. 19 onde igualmente consta que o nº total de títulos é 400, com o valor nominal de 1.000 euros).
84) Para efeitos de garantia do empréstimo concedido, foi subscrita pelos AA uma livrança e foram empenhadas a favor do Banco as Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead.
85) Consta do “Boletim de Subscrição” onde é identificado o produto subscrito “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead – Produto complexo”, o seu prazo de vencimento é de 4 anos, 11 meses e 26 dias, ou seja, iniciou a sua vigência em 26.05.2015 e teria o seu termo em 22.05.2020.”
86) Das Informações Fundamentais ao Investidor que A. assinou consta que se trata de produto financeiro complexo: “• Pode implicar a perda da totalidade do capital investido; • Pode proporcionar rendimento nulo ou negativo; • Proporciona uma taxa de rentabilidade inferior à exigida pelos investidores institucionais para níveis de risco idênticos; • Pode ser reembolsado antecipadamente por verificação de condição de reembolso antecipado automático e pode ser cancelado antecipadamente por opção do Emitente; • Está sujeito ao risco de crédito do emitente (Deutsche Bank AG); • Implica que sejam suportados custos, comissões ou encargos; • Está sujeito a potenciais conflitos de interesses na atuação do agente de cálculo e do Deutsche Bank AG; • Não é equivalente à aquisição ou transação inicial dos Ativos subjacentes; • Este produto financeiro é especialmente complexo e pode ser de difícil entendimento por investidores não qualificados”.
87) O prazo de vencimento da subscrição é em 22 de maio de 2020.
88) O produto de recuperação “Notes Db Intesa, GDF, Gilead”, permanecia em vigor até à data a dedução da contestação, não tendo atingido a sua maturidade.
89) A alavancagem foi feita através de contrato de mútuo, preparado pelo Réu “Deutsche Bank” e assinado pelos Autores, com o prazo de cinco anos, com início em 26 de maio de 2015 e fim em 26 de maio de 2020 [vide documento de fls. 19 e ss).
90) Os Réus CC, EE e DD assumiram o pagamento das prestações do contrato de mútuo referido em 89).
91) E pagaram essas prestações nos anos de 2016 e 2017.
92) A partir de 2018, o “Deutsche Bank” passou a debitar as prestações na conta de depósitos à ordem dos Autores com o n.º .... .... ........... 44.
93) No ano de 2018, os Réus CC, DD e EE obrigaram-se a restituir aos Autores o dinheiro das prestações através de cheque.
94) Para reembolso da prestação de 2018, os ditos Réus entregaram ao Autor o cheque n.º ........41, do Deutsche Bank, do valor de € 1.465,98, datado de 30-07-2018, sacado sobre a conta n.º .........18, de que é titular a referida “V..., Lda”doc fls. 25.
95) Apresentado a pagamento no Banco BPI no dia 02-08-2018, o dito cheque foi devolvido na Compensação do Banco de Portugal em 03-08-2018, por falta de provisão [vide documento de fls. 25).
96) A referida subscrição foi feita no balcão, agora extinto, do “Deutsche Bank”, sito na Rua ..., em ....
97) Intervieram nessa operação, como promotores do “Deutsche Bank”, os Réus EE e DD.
98) Mais foi garantido aos Autores que, nos 3.º, 4.º e 5.º anos do contrato, receberiam o pagamento de 5% de juros ao ano.
99) Nos dois primeiros anos do contrato o “Deutsche Bank” não pagava juros.
100) No dia 24 de agosto de 2017, os referidos Réus comprometeram-se [, por escrito,] a recuperar € 25.000,00, no espaço de 4 anos a contar dessa data, através de aplicações junto do “Deutsche Bank”, sugeridas ao Autor, sendo que anualmente deveria ser amortizado o valor de € 6.250,00 até 30 de agosto [cf. documento n.º 3, cláusula segunda, fls. 13 vº).
101) O Autor comprometeu-se a dar ordem de execução nos impressos próprios, como subscrição ou resgate de alguma aplicação sugerida pelos ditos.
102) Em agosto de 2018, o Autor instou esses Réus para lhe pagarem a 1.ª prestação de € 6.250,00.
103) Os mencionados Réus entregaram ao Autor o cheque n.º ........42, do Deutsche Bank, do valor de € 6.250,00, datado de 15-09-2018, sacado sobre a conta n.º .........18, de que é titular “V..., Lda” [cf. doc. 4, de fls. 15 vº)).
104) Nessa altura eram sócios e gerentes da “V..., Lda.” os Réus CC e DD [cf. documento n.º 5 - certidão permanente ............58, fl. 16 e vº).
105) Apresentado a pagamento no Banco BPI no dia 18-09-2018, o dito cheque foi devolvido na Compensação do Banco de Portugal em 19-09-2018, por falta de provisão (vide documento n.º 4).
106) Em meados de 2017 tornou-se público que o “Deutsche Bank” atravessava uma grave crise financeira.
107) Preocupados, os Autores contactaram os Réus CC, EE e DD.
108) Os Autores solicitaram a essas Réus cópias dos documentos que haviam assinado no balcão do “Deutsche Bank” de ....
109) Os ditos Réus diziam ao Autor que os documentos iam para Lisboa e que depois o “Deutsche Bank” lhos enviaria; o que nunca aconteceu.
110) Os Autores não receberam os juros do 3.º ano vencidos em maio de 2018.
111) Os Réus EE e DD intervieram nas operações de subscrição das “Notes db Cabaz Global ago. 2017” e das “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead”, como promotores do “Deutsche Bank”.
112) Os Autores recebiam em sua casa os extratos mensais que lhes eram enviados para a morada contratual pelo Banco Réu, de onde resultava não só os investimentos realizados, mas também a sua evolução em termos de valorização a cada momento, bem como os juros que eram depositados nos termos contratados (sempre que se verificam as condições contratuais para o seu pagamento).
113) No dia 27 de dezembro de 2018 os Autores requereram a notificação judicial avulsa da ré “Deutsche Bank Aktiengesellschaft”, com os seguintes fins:” a) Resolução do contrato de subscrição referido no art. 34.º deste articulado; b) Para, no prazo de 30 dias a contar da sua notificação, restituir aos Autores o dinheiro por eles investido na mencionada subscrição [cf. documento n.º 9 junto com a pi., a fls. 26 vº e ss).
114) A mencionada ré foi notificada judicialmente no dia 10 de janeiro de 2019.
115) Até à presente data, a ré “Deutsche Bank Aktiengesellschaft” não se pronunciou sobre a notificação judicial avulsa nem restituiu aos Autores qualquer dinheiro.
116) Os Autores deram entrada da presente ação em tribunal em 29/04/2019.
117) Por via do contrato de seguro titulado pela apólice número PA......44, o ora Réu, transferiu a sua Responsabilidade Civil emergente da prestação de serviços financeiros ou profissionais pelos promotores por si designados, para a Seguradora AIG Europe Limited – Sucursal em Portugal (conforme doc. 27 junto com a contestação), através da apólice número PA......44, de base de reclamação (“claims made”).
118) Por via do contrato de seguro titulado pela apólice número C......04, o Banco Réu, transferiu a sua Responsabilidade Civil emergente da atividade por si exercida, de novo, para a Seguradora AIG Europe Limited – Sucursal em Portugal (cf. doc. 28), através da apólice C......04.
119) O 2.º e 4.º Réus, enquanto promotores associados do Deutsche Bank, celebraram um contrato designado por contrato de seguro de responsabilidade civil profissional, destinado a cobrir eventuais danos resultantes da atividade por estes desenvolvida no seio da J..., Lda 120) Nos termos do contrato de seguro junto a fls. 468, o tomador do seguro era o Deutsche Bank AG – Sucursal em Portugal, sendo titulado pela apólice PA......44 – cf. condições gerais e particulares.
E, não provados:
a) Os Autores apenas queriam colocar as suas poupanças em dinheiro em aplicações seguras e confiáveis, o que lhes foi assegurado pelos Réus.
b) O Autor respondeu ao questionário referido em 48) porque nessa ocasião era sua intenção investir em produtos que comportavam o risco de perda do capital.
c) O Autor tinha então os conhecimentos sobre investimentos financeiros e a experiência, bem como as suas capacidades de avaliar o risco associado aos investimentos.
d) O Autor possuía, os conhecimentos necessários que o habilitavam a acompanhar e avaliar o comportamento de aplicações financeiras, bem como avaliar o potencial impacto destas.
e) O Réu CC convenceu os Autores a subscreverem o produto notes db Cabaz Global ago. 2017.
f) Os Réus CC, DD e EE garantiram aos Autores que o produto subscrito era seguro, sem quaisquer riscos, idêntico a um depósito a prazo.
g) Os Autores questionaram os Réus CC, EE e DD, que sempre lhes asseguraram que a operação em causa não tinha quaisquer riscos e que o capital seria recebido integralmente na maturidade.
h) O produto “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead” foi adquirido pelo seu valor nominal, num total de € 400 000,00.
i) Esse preço foi constituído, para além dos € 160 000,00 do alavancado, por € 216 000,00 de capitais próprios dos Autores e € 24 000,00 de juros pagos adiantadamente.
j) O Réu CC teve intervenção na subscrição do produto notes db Intesa, GDF Suez & Gilead.”
k) Os Réus CC, EE e DD garantiram aos Autores que o produto subscrito era seguro, sem quaisquer riscos, idêntico a um depósito a prazo.
l) Relativamente à alavancagem, foi afirmado aos Autores pelos referidos Réus que era uma imposição do “Deutsche Bank”, que não aceitaria a operação sem ela.
m) Nunca foi “afirmado aos Autores pelos referidos Réus que era uma imposição do Deutsche Bank, que não aceitaria a operação” sem o alavancado, nem foi garantido aos Autores que estes iriam receber o pagamento de 5% de juros ao ano.
n) Apenas depois de serem advertidos de que a entrega seria requerida judicialmente é que os mesmos Réus entregaram aos Autores, em agosto de 2017, cópias dos documentos de subscrição das “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead”.
o) Com a leitura desses documentos, os Autores constataram que as “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead” são um produto complexo, de risco 4 (alerta), isto é, risco de perder a totalidade do capital investido.
p) Nunca os Réus alertaram os Autores para esse risco.
q) Se tivessem sido informados desse risco, os Autores nunca teriam subscrito as “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead”.
r) Aquando do referido no ponto 106), os referidos Réus responderam aos Autores que não se preocupassem, que era estratégia do “Deutsche Bank” e que o capital estava garantido.
s) Os Autores apenas se aperceberam que os produtos financeiros vendidos pelos Réus não garantiam o capital investido aquando do referido no ponto 79) das “Notes db Cabaz Global ago. 2017”, conforme descrito supra em 1.18. a 1.23., ou seja, em Agosto de 2017.
t) O Réu “Deutsche Bank Aktiengesellschaft” não informou os Autores das caraterísticas e riscos das “Notes db Cabaz Global ago. 2017” e das “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead”. u) O Réu “Deutsche Bank Aktiengesellschaft” não explicou aos Autores as diferenças entre o investimento nas “Notes db Cabaz Global ago. 2017” e nas “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead” e a constituição de um depósito a prazo.
v) Aquando da subscrição das “Notes db Cabaz Global ago. 2017” e das “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead”, o “Deutsche Bank” não entregou aos Autores quaisquer documentos dos contratos.
w) O “Deutsche Bank” colheu a assinatura do Autor nos boletins de subscrição, num “papel” preenchido pelo Réu DD ou pelo Réu EE, mas nunca foi entregue aos Autores cópia de qualquer documento que contivesse cláusulas respeitantes às “Notes db Cabaz Global ago. 2017” e às “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead”.
x) Os Autores desconheciam que tinham feito aplicações financeiras com características diferentes de um depósito a prazo.
y) Caso soubessem que se tratava de produtos de risco, com perda do seu capital, os Autores nunca as teriam autorizado.
z) (1.69.) Os ditos Réus garantiram aos Autores que os produtos subscritos eram seguros, sem quaisquer riscos, idênticos a um depósito a prazo.
aa) Os Réus não informaram os Autores das caraterísticas e riscos das “Notes db Cabaz Global ago. 2017” e das “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead”.
bb) Os Réus não explicaram aos Autores as diferenças entre o investimento nas “Notes db Cabaz Global ago. 2017” e nas “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead” e a constituição de um depósito a prazo.
cc) Aquando da subscrição das “Notes db Cabaz Global ago. 2017” e das “Notes db Intesa,
GDF Suez & Gilead” estes Réus não entregaram aos Autores quaisquer documentos dos contratos.
dd) A operação referida no ponto 79) dos factos provados foi feita a pedido dos aqui Autores; a instrução de venda antecipada deste produto foi da iniciativa do Autor AA.
ee) (2.14.) Os promotores – 2.º e 4.º Réus -, como a J..., Lda reportaram tudo quanto fosse por eles realizado ao Deutsche Bank e assim fizeram e agiram.
ff) (1.25.) Desde a data do escrito referido em 100), os Réus CC, DD e EE nada promoveram com vista à recuperação dos mencionados € 25 000,00.
gg) (1.126.) Os Réus ainda sugeriram algumas aplicações, mas os Autores não as aceitaram, nunca tendo estes dados qualquer ordem de execução, subscrição ou resgate de qualquer aplicação sugerida pelos Réus.
hh) (2.29.) Os 2.º e 4.º Réus entregaram aos Autores o cheque, no montante de € 6.250,00 (seis mil duzentos e cinquenta euros), sacado sobre a V..., Lda (uma outra sociedade de promotores externos do Deutsche Bank da qual os Réus eram sócios-gerentes, por um sentimento de “pena” dos Autores, uma obrigação moral, e por residirem num meio pequeno, dando o 2.º e 4.º Réus a cara pelo 1.º Réu, o Deutsche Bank.
ii) (2.30.) Mais tarde, o 2.º e 4.º Réus refletiram melhor e, como não era sua obrigação reembolsar os Autores de qualquer montante que haviam perdido na aplicação, o cheque foi devolvido por falta de provisão.
1. Sinopse
Os Autores demandam os Réus reclamando indemnização pelos elevados prejuízos sofridos em resultado da sua actuação ilícita no âmbito da relação contratual firmada.
Em súmula breve, invocam perdas patrimoniais avultadas com a aquisição dos produtos
financeiros notes db Cabaz Global agosto 2017 e notes db Intesa, GDF Suez & Gilead, emitidos pelo Réu DB, e promovidos pelos restantes, que ocultaram as características do investimento, garantindo que se tratava de aplicação financeira segura, equivalente ao depósito a prazo, e sem risco de perda de capital.
Alegaram que os Réus aos omitiram os deveres de informação sobre a natureza complexa do produto e riscos elevados respondem pelos prejuízos dos Autores, de acordo com a responsabilidade do intermediário financeiro assente nos artigos 7.º, nº 1, 312º nº 1, alínea a), e 314º do Código dos Valores Mobiliários, na redação anterior à introduzida pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de outubro.
Imputam a infração ao dever de informação em ambos os contratos de intermediação, em momento pré-contratual, tendo os 2º,3º e 4ºRéus, agido na qualidade de agentes vinculados do Réu DB, ocultado a natureza e os riscos dos produtos financeiros e, garantido que os produtos correspondiam a depósitos a prazo ou algo equivalente, sem qualquer risco de perda de capital.
Os Réus impugnaram a versão dos factos; de relevante, sustentaram que o Autor foi devidamente esclarecido sobre os produtos que subscreveu, não garantiram o reembolso do capital e que o Autor era um investidor habitual, com o perfil “5”, incluindo em produtos congéneres com encaixe elevado de ganhos, conhecedor da natureza e riscos associados.
Em primeira instância, o tribunal julgou procedente a pretensão dos Autores, alicerçada na responsabilidade contratual dos Réus, comprovada a violação do dever de informação dos riscos dos produtos financeiros adquiridos e causador dos prejuízos.
O Tribunal da Relação, na procedência dos recursos interpostos pelos Réus, maxime na alteração da decisão sobre a matéria de facto, revogou o julgado, considerando no essencial, que não resultaram provados os factos fundantes da imputada actuação ilícita, v.g., a omissão do dever de informação esclarecida sobre os produtos, e em consequência, absolveu os Réus dos pedidos.
Os Autores pedem revista, pugnando pela condenação dos Réus.
Corroboram a posição defendida. De novo, aludem agora à falsidade da sua assinatura em documentos juntos com a contestação, invocam a nulidade dos contratos celebrados por falta
de forma; e, questionam o acórdão recorrido ao relevar na reapreciação da matéria de facto as
expressões insertas nos documentos que assinou com o valor de declaração confessória.
As questões suscitadas pelos recorrentes serão apreciadas por ordem de precedência lógico-jurídica, conforme ao disposto no artigo 608º ex vi artigos 679º, e 663º, nº2, do CPC.
2. Da eficácia probatória dos documentos contratuais
Os recorrentes defendem que a reapreciação da matéria de facto contraria o disposto nos artigos 376.º, n.º 2, 352.º, 357.º e 21.º, al. e), da LCCG.
Alegam que as expressões “tomei conhecimentos das advertências” e “recebi um exemplar do documento previamente à aquisição” no PFC notes db Cabaz Global agosto 2017 (DOC 22 da contestação), com data de 30.07.2013, estão em letra maiúscula e não são do punho do Autor, existindo discrepâncias relativamente a outros documentos juntos aos autos.
Sustentam ainda que, não podia a Relação considerar que a expressão “tomei conhecimentos das advertências” ali exarada corresponde à declaração confessória dos factos pelos Autores, por ter sido induzida pelo Réu DB, à margem da previsão do artigo 357º do CC.
Reforçam o seu argumento, dizendo que se trata de declarações genéricas e anteriores à sua ocorrência, e que atestam conhecimentos que o aderente (Autor) não tem, não constituindo, também, por esse motivo, declarações confessórias.
2.1. Os recorrentes questionam, pois, a fundamentação da convicção do Tribunal da
Relação em matéria de facto decisiva para o desfecho da acção, v.g.- o conhecimento do Autor das características e riscos dos produtos financeiros.
Em concreto, dirigem a crítica à desconsideração das suas declarações e depoimentos das testemunhas, que no seu entender, provam que os Réus violaram os deveres de informação acerca dos produtos financeiros, cuja subscrição propuseram aos Autores, tal como decidiu a primeira instância.
E, colocam em crise a força probatória atribuída pela Relação aos documentos
assinados pelo Autor, para concluir, em adverso, que tomou conhecimento das características dos produtos financeiros, do risco de perda da totalidade do capital investido, e, bem assim, de que recebeu uma cópia do escrito que continha aquela informação.
2.2. A matéria de facto provada que releva consta dos pontos 67, 70 e 71 (Notes db Cabaz Global ago.2017”), 81 e 86 “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead) diz respeito à informação descritiva dos produtos financeiros que consta dos documentos assinados pelo Autor e de que lhe foi dada cópia.
“ 67) No dia 30 de julho de 2013, o Autor assinou um “Boletim de Subscrição” de “Notes db Cabaz Global Ago. 2017”, em que foi promotor o “Deutsche Bank” – cf. doc. 1 junto com a p.i., fls. 11 e ss.; 70) Nos termos do (i) “Boletim de Subscrição” e das (ii) “Informações Fundamentais ao Investidor (IFI)”, assinados pelo Autor, o produto tinha as seguintes características[…]; 71) Do documento (IFI – doc.22), resulta a expressão manuscrita pelo próprio punho do Autor AA “Tomei conhecimento das advertências”, em conformidade com a exigência prevista no art. 8.º n.º4 do Regulamento da CMVM n.º 2/2012. 120; 85) Consta do “Boletim de Subscrição” onde é identificado o produto subscrito “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead – Produto complexo”, o seu prazo de vencimento é de 4 anos, 11 meses e 26 dias, ou seja, iniciou a sua vigência em 26.05.2015 e teria o seu termo em 22.05.2020.”86) Das Informações Fundamentais ao Investidor que A. assinou consta que se trata de produto financeiro complexo: “Pode implicar [..]”
Como ponto prévio, não colhe a falsidade da letra insinuada por ser extemporânea e à margem da apreciação do Supremo Tribunal, pelas razões que já se mencionaram; e o mesmo se diga a propósito das invocadas discrepâncias entre documentos dos autos.
Posto isto.
É incontroverso que não cabe nas atribuições do Supremo Tribunal, enquanto tribunal de revista, sindicar o modo como a Relação reapreciou os meios de prova sujeitos a livre apreciação, fora dos limites enunciados no artigo 674.º, n.º 3, do CPC.
A intervenção cinge-se, portanto, a assegurar a legalidade processual do método
apreciativo prosseguido, que não se confunde com a interferência sob o alegado e eventual erro do julgamento da Relação, seja na apreciação, ou valoração da prova livre, nem da prudente convicção do julgador.
Exaurindo as instâncias a apreciação e fixação da matéria de facto, a intervenção residual do Supremo sedia-se no domínio do direito probatório material, nos casos em que ocorra ofensa de disposição expressa de lei, que exija certa espécie de prova para a existência de um facto, ou imponha a força de determinado meio de prova, com força probatória plena.
De acordo com o disposto no artigo 607º, nº 5, do CPC o juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto; a “livre apreciação não abrange os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes”.
Na adversativa plasmada na segunda parte do preceito, estão em causa situações de imposição de regras vinculativas extraídas do direito probatório material, como são as regras relativas ao ónus de prova, à admissibilidade dos meios de prova, e à força probatória de cada um deles.
Na circunstância de o tribunal a quo na fixação da matéria de facto ter-se afastado dessas regras de direito probatório, deverá o Tribunal da Relação no âmbito dos poderes de reapreciação, corrigir o vício, caso se imponha decisão diversa.
O acórdão recorrido, no que se refere ao produto financeiro “Notes db Cabaz Global ago.
2017”, decidiu considerar não provados os factos constantes dos pontos (numeração da sentença) 1.17, 1.22, 1.23 (no segmento ciente disso), 1.50, 1.61, 1.64, 1.65, 1.66, 1.67, 169, 1.70. 1.71 e 1.72, eliminou os factos não provados constantes dos pontos 2.9, 2.11, 2.24 e 2.28, por considerá-los redundantes, e considerou provado o facto constante do ponto 2.10.
E, sustentou a sua convicção, no essencial, do seguinte modo: «(…) Dito de outra forma, assente que um documento particular tem força probatória plena, as declarações do seu Autor, indiscutíveis na sua materialidade, têm a eficácia que lhes competir segundo outras normas de direito material alheias ao instituto do documento: se revestirem a natureza de declarações de ciência, terão, se desfavoráveis, eficácia como confissão (arts. 376/2 e 358); se forem declarações de vontade, há que ver se por si constituem ou integram um negócio jurídico.
(…) Isto dito, estão em causa, como vimos, as declarações atribuídas ao Autor, o único que subscreveu o produto financeiro, no sentido de que tomou conhecimento das suas características, mais concretamente do risco de perda da totalidade do capital investido, e, bem assim, de que havia já recebido uma cópia do escrito que continha aquela informação. Essas declarações tiveram como destinatário o Réu DB na sua qualidade de intermediário financeiro.
Como facilmente se conclui, reportam-se a factos que são desfavoráveis ao declarante, na medida em que deles resulta que, ao contrário do alegado na petição inicial, o intermediário financeiro informou o investidor do risco de perda do capital investido e disponibilizou-lhe a informação escrita de que resultavam as características do produto financeiro.
Não vemos, assim, como negar a natureza confessória das declarações em causa por parte do Autor, seu único subscritor, e, por decorrência, a sua força probatória plena, o que foi erradamente – e sem qualquer fundamentação – desconsiderado na sentença recorrida, que assim cometeu uma violação das regras de direito probatório material aplicáveis, a qual sempre seria do conhecimento oficioso da Relação, ut arts. 662/1 e 665/2 do CPC. (…) 1
(..), considerando, por um lado, que os Autores não alegaram que aquela declaração do Autor foi desconforme com a sua vontade nem que esta foi formada com base num qualquer vício e, por outro, que a única prova produzida para a contrariar foram as declarações orais por eles próprios prestadas na audiência final, temos necessariamente de concluir que assiste razão ao Réu DB e que, em conformidade, com arrimo no disposto no n.º 1 do art. 662 do CPC, se impõe a alteração da matéria de facto no sentido pretendido – ou seja, considerando como não provadas as afirmações dos pontos 1.17, 1.22, 1.23 (segmento “cientes disso”), 1.50, 1.61, 1.64, 1.65, 1.66, 1.67, 1.69, 1.70, 1.71 e 1.72, umas e outras quando referidas ao produto Notes db Cabaz Global Ago. 2017.(…)” (…)
No que concerne ao produto financeiro “Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead” e idêntica fundamentação, alterou também o juízo probatório da sentença sobre a matéria, que considerou não provada.
Em linha subsequente, a Relação optou por suportar a convicção a propósito, atendo-se agora e apenas, aos depoimentos de parte e das testemunhas e à análise de outros documentos juntos.
E, após exaustiva reflexão e confronto entre aqueles meios de prova (para a qual nos remetemos brevitatis causa pela sua extensão) – concluiu pela alteração da matéria de facto em apreço, ou seja, que a informação sobre os produtos foi prestada pelos Réus e o Autor tinha conhecimento das características dos produtos financeiros que subscreveu, v.g., risco de perda do capital 2.
Aludiu o acórdão recorrido no ponto que aqui importa o seguinte:
“(..).4.2.2. Sem prejuízo do que antecede, impõe-se deixar aqui claro que, caso fosse de recusar a natureza confessória da declaração do Autor, ficando assim afastada a proibição de prova a que fizemos referência, o resultado final seria o mesmo.”
Fê-lo em exercício dialético, ao antecipar a hipótese de entendimento diverso quanto à eficácia probatória das declarações ínsitas nos documentos contratuais assinados pelo Autor3.
E, embora o Supremo possa alterar a decisão de facto no caso de atestada violação de
regra de direito probatório, fica precludida a intervenção se, em paralelo, as instâncias formaram a sua convicção sobre a realidade do facto lançando mão de outra prova sujeita à livre a apreciação, e por consequência, excluída do crivo da revista.
Resulta, em consequência, prejudicado e desprovido de efeito útil, a indagação do valor confessório de tais declarações neles constantes.
Donde, em face da reapreciação da matéria de facto em questão motivada pela Relação também nos meios de prova sujeitos à livre apreciação, o seu juízo é definitivo.
3. Da arguida falsidade
O recorrente alega deliberadamente, de modo impreciso e não peremptório, que os documentos juntos com a contestação do Réu DB “apresentam indícios fortes de falsificação de assinatura, rúbricas e expressões” 4
Os documentos sinalizados têm a natureza de documentos particulares (cf. artigo 363.º, n.º 2, do CPC) e como bem sabe o recorrente, a arguição da excepção é inovatória na causa e por isso não foi objecto de prova e apreciação pelas instâncias (cfr. artigo 446.º do CPC).
Na esteira da jurisprudência constante do Supremo Tribunal de Justiça, os recursos visam o reexame, por parte do tribunal superior, de questões precedentemente resolvidas pelo tribunal a quo e não a pronúncia do tribunal ad quem sobre questões novas, salvo caso a lei estabeleça excepção, ou tenha por objecto matéria de conhecimento oficioso5.
Dispensando outros considerandos, improcede nesta parte o recurso.
donde resultará, ou não, a conformidade do declarado com o facto ali inscrito (artigo 393.º, n.º 3, do Código Civil).
4. Da nulidade – inexistência das operações de aquisição
4.1. Outra questão ex-nova vinda à revista, esta do conhecimento oficioso.
Os recorrentes alegam que não consta documentado o negócio relativo à subscrição dos produtos financeiros “não constando qualquer cláusula donde se extraia a existência de um negócio de cobertura...”.
Defendem, pois que, a nulidade do contrato por falta de forma, determina a nulidade dos mútuos celebrados, e em consequência a restituição do capital que aplicaram e juros de mora.
Nos termos do artigo 321.º, n.º 1, do CVM6, os contratos de intermediação financeira relativos aos serviços previstos nas alíneas a) a d) do n.º 1 do artigo 290.º do CVM, entre os quais se incluem os de receção, transmissão e execução de ordens por conta de outrem, e celebrados com investidores não qualificados, devem observar a forma escrita.
Uma nulidade especial, cominada no contrato de intermediação financeira para garantir a transparência da formação da vontade negocial dos subscritores dos produtos financeiros, e para proteger o direito dos investidores a uma correta e detalhada informação sobre os títulos em causa, dada a profunda assimetria informativa normalmente existente entre o Banco e os clientes, sobretudo quando investidores não qualificados.
Rui Pinto Duarte7, a propósito do artigo 321.º do CVM, esclarece que8:
«(…) o legislador estabeleceu três regras sobre contratos em que sejam partes investidores não institucionais, todas elas de protecção a tais investidores, entendidos como a parte mais fraca.
A primeira (n.º 1) estabelece que a nulidade resultante da observância da forma legal só pode ser invocada pelo investidor. (…)
A segunda regra sobre contratos com investidores não institucionais é a de equipação destes a consumidores, para efeitos da aplicação do regime das cláusulas contratuais gerais (art. 32.º, n.º 2). (…)
A terceira regra sobre contratos com investidores não institucionais (art. 321.º, n.º 3) respeita a situações internacionais, em que o investidor reside em Portugal e as operações relevantes devam ter lugar em Portugal e determina que nessas situações aplicação de um Direito estrangeiro não pode privar o investidor da protecção que lhe é dada pelo CVM sobre contratos de intermediação (…).»
Falamos de nulidade invocável pelos “investidores não qualificados” como tal designadas por” nulidades de proteção nulidades axiológicas “com o objetivo legal de ultrapassar a desigualdade de informação entre as partes e proteger os mais vulneráveis.
Nulidade invocável a todo o tempo pelo interessado, sendo de conhecimento oficioso, atento o disposto no artigo 286.º do Código Civil.
4.2. De qualquer modo, o contexto factual provado e documentado no processo de divulgação, preparação e subscrição das ordens de compra dos produtos financeiros em juízo, inviabiliza o propósito recursivo da arguição da nulidade.
Em contrário ao que advogam(concl.30) cabe aos recorrentes o ónus da alegação e prova dos factos adrede, que pretendem invocar em seu benefício a nulidade dos contratos de intermediação financeira9.
O factualismo provado sob os pontos 67 a 96 demonstra, em segurança, que os instrumentos- base de contratação dos referidos produtos, foram reduzidos a escrito e incorporam de forma expressa e inequívoca a autorização firmada pelo punho do Autor, atestando a vontade de aquisição e a subscrição dos produtos financeiros, comercializados pelo Réu BD e promoção dos restantes Réus.
Mais ilustram os factos que as normas de regulação do negócio estão inclusas no suporte documental dos contratos.
Os contratos observaram, pois, a forma escrita e contêm as regras de regulação10, conforme imposto pelos artigos 321º, nº1 e 321ºA, nº1, do CVM - relativos aos serviços previstos nas alíneas a) a d) do n.º 1 do artigo 290.º- entre os quais, se incluem os de receção, transmissão e execução de ordens por conta de outrem, celebrados com investidores não qualificados.
4.3. Os recorrentes apontam também a nulidade do negócio por violação do Regime Geral da Cláusulas Contratuais Gerais PO, por falta de comunicação ou explicação das cláusulas contratuais e, ou entrega da cópia dos referidos contratos aos recorrentes.
A alegação soçobra na total ausência de prova -cfr. factos não provados (als. t), u), v) e w))11.
4.4. Outro obstáculo, de natureza adjectiva – a inevitável impossibilidade de coexistência entre a causa de pedir e o efeito da nulidade dos contratos 12.
A pretensão que os recorrentes ora dirigem aos Réus - restituição do capital aplicado e juros - por efeito da nulidade dos contratos, redunda em contradição com a causa de pedir - a responsabilidade civil contratual por violação dos deveres de informação do intermediário financeiro que motivou o pedido de condenação a pagar indemnização por danos patrimoniais da petição inicial.
O pedido mostra-se, por outro lado, incompatível com os efeitos estabelecidos no Regime Geral das Cláusulas Contratuais Gerais- cfr. artigos 5º e 6º - em caso de incumprimento dos deveres de comunicação e de informação das cláusulas pelo proponente, que se traduzem na exclusão das cláusulas afetadas ou, em determinadas hipóteses, na nulidade do contrato- artigos 8º e 9º.
Questão já decidida nesse sentido pelo Supremo Tribunal no Acórdão de 30.05. 2019 e destaque no seguinte passo da fundamentação13:
« Não estando em dúvida que, de acordo com o disposto no art. 321º, nº 3, do CVM, “Aos contratos de intermediação financeira é aplicável o regime das cláusulas contratuais gerais, sendo para esse efeito os investidores não qualificados equiparados a consumidores”, o pedido formulado pelas AA. teria de ser compatível com os efeitos que o diploma legal das Cláusulas Contratuais Gerais (aprovado pelo Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro) prevê para o desrespeito dos deveres de comunicação e de informação das cláusulas (arts. 5º e 6º), os quais consistem na exclusão das cláusulas afectadas ou, em determinadas hipóteses, na nulidade do contrato (arts. 8º e 9º). Tal compatibilidade não se verifica, uma vez que o pedido em causa consiste em pretensão indemnizatória dirigida contra o R., com fundamento em responsabilidade civil por violação dos deveres de informação do intermediário financeiro. Não pode, por isso, ser equacionada a aplicabilidade, invocada pela primeira vez em sede de recurso de revista, do regime das Cláusulas Contratuais Gerais.»
Improcede neste segmento o recurso.
5. Da natureza e das caraterísticas dos instrumentos financeiros; o perfil do investidor
Defendem os recorrentes que os produtos financeiros em causa são produtos complexos que incorporam opções, equiparada a uma opção de venda, expondo-se a risco não se destinando a investidores não qualificados, o que não foi objecto de informação pelos réus aos autores, constituindo uma violação do art. 7.º do CVM14.
Alegam que o documento n.º 8 junto com a contestação (sugestão de investimento personalizado) tem uma assinatura que não pertence ao autor.
E, dada a complexidade e risco dos produtos financeiros subscritos pelos autores, o grau académico dos autores, e a sua falta de conhecimentos ou formação para avaliar e compreender esses produtos, é admissível sustentar que tais produtos não se mostram adequados ao perfil de investidor do autor, que até aí, investiu em depósitos a prazo.
5.1. Ficou assente que o Réu DB actuou como intermediário financeiro perante o Autor marido - que assinou os contratos de intermediação financeira - na aquisição de produtos, concretizando-se duas ordens de subscrição “Notes db Cabaz Global agosto 2017 e notes db Intesa, GDF Suez & Gilead”, respetivamente em 30-07-2013 e 11-05-2015.
Acerca da impugnação da assinatura, a sua alegação nesta fase do processo, é inócua, como anteriormente se detalhou.
Em segunda linha, haverá que convocar a matéria de facto provada sob os pontos 48 a 66, que enuncia o historial dos investimentos e documentação correlativa que o Autor realizou anteriormente à subscrição dos produtos visados, sendo o Réu DB o intermediário financeiro. Dali se extrai de relevante que a partir, pelo menos, de março de 2009 e até agosto 2013, o Autor movimentou uma significativa carteira de títulos (bem-sucedida nos ganhos) que negociou com o Réu DB (apenas na agência de ...) e com a promoção dos outros Réus.
Os produtos financeiros apresentavam iguais características aos produtos dos autos, como espelha a leitura comparativa das condições e resultados que se inferem dos extractos bancários que estão nos autos.
Ficamos a saber, entre o mais, que o Autor tinha como finalidade do investimento “especular” e cumpria o perfil do investidor 5, agressivo ou de perfil 415.
Os valores do capital que o Autor foi investindo até então (e obrigações assumidas para a obtenção do capital em alguns deles), as elevadas taxas de remuneração pagas pelo Réu, a reiterada mobilização antecipada e reaplicação dos valores dos resgates em idênticos produtos, agregando parte da rentabilidade dos produtos trazidos aos autos, permitem inferir que o Autor, ao tempo, era um investidor esclarecido, experiente e de sólida literacia na área financeira.
Acompanhamos, pois, o acórdão recorrido ao observar:
“(..) extratos bancários apresentados como documento 9 com a contestação do Réu DB, pelos quais se pode constatar a evolução dos investimentos realizados pelo Autor no período subsequente a 1 de janeiro de 2010, incluindo os dois que aqui estão em discussão. Em tais extratos pode ver-se que o Autor fez diversos investimentos anteriores que, em determinados períodos, sofreram desvalorização.
(…) Referimo-nos ainda aos termos em que o Autor fez o investimento no produto: através do recurso ao denominado alavancado, cujo modo de funcionamento explicou de forma correta, assim evidenciando, à luz das regras do id quod plerum que accidit, que o seu objetivo não era apenas o aforro, mas a obtenção do máximo dividendo possível.
A tudo isto soma-se o contexto histórico em que ocorreu a subscrição. Por um lado, estávamos em 2013, altura em que os juros pagos pelos bancos como contrapartida dos depósitos a prazo eram inferiores a 2%. Qualquer pessoa minimente informada sabia que apenas investimentos com risco acrescido possibilitariam ganhos superiores. Neste contexto, a explicação dos Autores para o facto de, não obstante a generosa remuneração, mais de três vezes superior à que era expectável num depósito a prazo (veja-se que, em três anos, obtiveram um lucro bruto de € 39 900,00, correspondente a 42% do capital próprio
investido), nunca terem suspeitado que se tratava de um investimento de risco, apresenta-se inverosímil. Por outro lado, já tinham ocorrido e sido amplamente noticiadas as situações ocorridas com clientes de outras instituições de crédito que subscreveram produtos de risco na convicção de que se tratava de simples depósitos a prazo. O alerta estava dado. Funcionou do lado do regulador, que impôs regras mais apertadas para a intermediação bancária. Funcionou também do lado dos clientes bancários que redobraram a sua atenção. E o Autor era pessoa especialmente atenta. (…)”
É ousado, pois, afirmar que o Autor seria um investidor inexperiente (“altamente conservador”) com dificuldade em antever que os produtos em referência, propícios ao elevado retorno, estariam isentos de perdas ou riscos.
Afigura-se, ao arrepio das regras da experiência, afirmar que o Autor desconhecia o risco de perda de capital na data da maturidade, ao optar pela compra/subscrição dos produtos complexos em causa. Observe-se que dificilmente se aceita que o Autor confundisse a álea deste tipo de investimento com a garantia da salvaguarda do capital no depósito a prazo, ao comprometer parte do capital à obrigação paralela de mútuo com o Réu DB.
5.2. Discute-se nos presentes autos a responsabilidade (solidária) dos Réus no âmbito da celebração de dois contratos de intermediação financeira entre os Autores e o 1.º réu, banco, representado pelos demais réus, promotores, pelo pagamento de indemnização por violação dos deveres de informação perante o investidor na fase pré-contatual.
Breve enquadramento normativo.
Os princípios de actuação dos intermediários financeiros que se estendem ou do agente vinculado e aos colaboradores do intermediário financeiro estão enunciados no artigo 304.º do CVM 16.
Princípios e deveres englobados no princípio geral de intermediação financeira, que abre o elenco legal daquele normativo – o princípio da proteção interesses do cliente – segundo o qual “Os intermediários financeiros devem orientar a sua atividade no sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus clientes”.
E, que merecem também consagração na Diretiva 2004/39/CE, de 21 de abril- artigo 19.º, n. º1- “os Estados-Membros devem exigir que as empresas de investimento, ao prestarem serviços de investimento e/ou, sendo o caso, serviços auxiliares aos clientes, atuem de forma honesta, equitativa e profissional, em função do interesse dos clientes”.
Na análise do preceito, J. ENGRÁCIA ANTUNES refere que o seu sentido consiste em erigir os interesses legítimos dos clientes investidores em “estrela polar” da atividade de intermediação financeira, vinculando os intermediários financeiros ao i) princípio da proteção dos interesses dos clientes; ii) princípio da proteção da eficiência do mercado; iii) princípio da atuação de boa-fé; iv) princípio do conhecimento do cliente; e v) princípio do sigilo profissional17.
Em particular, o dever de informação contemplado no artigo 312.º, n.ºs 1 a 5, do CVM, com a epígrafe Deveres de informação.
O dever de informação é um dos princípios basilares do mercado de capitais, sendo que, por força do disposto no art. 7.º do CVM, a informação respeitante a instrumentos financeiros deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita.
Com apelo à lição de M. CARNEIRO DA FRADA 18, “o CVM funda seguramente uma protecção extracontratual – de natureza delitual – dos clientes em virtude do carácter de disposições de protecção de diversas das suas normas que preveem deveres de informação a cargo dos intermediários. (…)
Assim, a informação devida pelos intermediários aos seus clientes pode chegar a implicar o dever de mostrar a estes – mesmo quando negoceiam por conta própria – os principais factores de cálculo das vantagens e desvantagens de um certo produto financeiro a subscrever por estes; ou de indicar o cenário mais mal relacionado com essa mesma subscrição (…).Não se trata, nem deve tratar de impor aos intermediários financeiros uma transparência total ou uma transferência integral das informações que possuem para o cliente (sobretudo quando são contraparte dele), mas há aspectos sobre os quais deve, de harmonia com a boa-fé, ser elucidado.»
O dever de informação encontra-se directamente conexionado com o dever de adequação, previsto no art. 314.º do CVM, porquanto o intermediário financeiro se encontra adstrito a um particular e cuidado dever de informação quando estamos perante um investidor não qualificado, sendo obrigação do intermediário financeiro inteirar-se do tipo de cliente que tem perante si.
« (..)Já a falta de adequação de um certo produto às necessidades de um cliente, se bem que susceptível de apreciação objectiva á luz de um modelo correctivo, sindicante da justiça dos contratos, pode ser interpretada como expressão ou sinal da violação de um dever de informação, a saber a falta de elucidação sobre a desadequação de certo instrumento financeiro: entendendo-se então tal dever de adequação como dever de índole informativa destinado a proporcionar a aptidão do contrato a celebrar para a satisfação das necessidades do sujeito.19»
No âmbito de acções de responsabilidade civil emergente da violação de deveres contratuais de informação também a jurisprudência fixada neste tribunal no AUJ n.º 8/202220, nos seguintes termos:
1. No âmbito da responsabilidade civil pré-contratual ou contratual do intermediário financeiro, nos termos dos artigos 7.°, n° 1, 312° n° 1, alínea a), e 314° do Código dos Valores Mobiliários, na redação anterior à introduzida pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de outubro, e 342.°, n° 1, do Código Civil, incumbe ao investidor, mesmo quando seja não qualificado, o ónus de provar a violação pelo intermediário financeiro dos deveres de informação que a este são legalmente impostos e o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano.
2. Se o Banco, intermediário financeiro - que sugeriu a subscrição de obrigações subordinadas pelo prazo de maturidade de 10 anos a um cliente que não tinha conhecimentos para avaliar o risco daquele produto financeiro nem pretendia aplicar o seu dinheiro em "produtos de risco" - informou apenas o cliente, relativamente ao risco do produto, que o "reembolso do capital era garantido (porquanto não era produto de risco"), sem outras explicações, nomeadamente, o que eram obrigações subordinadas, não cumpre o dever de informação aludido no artigo 7.°,nº 1l, do CVM.
3. O nexo de causalidade deve ser determinado com base na falta ou inexatidão, imputável ao intermediário financeiro, da informação necessária para a decisão de investir.
4. Para estabelecer o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano decorrente da decisão de investir, incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir.
Atenta a data da subscrição dos produtos financeiros dos autos, em sintonia com o consignado no Acórdão STJ de 20.6.202321:
«I - Relativamente às obrigações subscritas no domínio de vigência do DL n.º 357-A/2007, de 31-10, não se aplica diretamente o AUJ n.º 8/2022 que foi proferido ao abrigo do CVM na sua versão originária. Todavia, há que ter em conta as orientações nele expressas, desde que não impliquem soluções mais desfavoráveis para o investidor do que as previstas no DL n.º 357-A/2007 quanto ao conteúdo do dever de informação.
II- Já quanto à questão de saber a quem compete o ónus da prova do incumprimento do dever de informação e do nexo causal, a orientação do AUJ é aplicável, pois não se verificou
21 proc.15440/17.8T8LSB.L1. S1 qualquer mudança legislativa que possa ter consequências na distribuição do ónus da prova.
(…)”
E, por pertinente, acerca do dever de informação, salientamos o seguinte trecho constante do AUJ n.º 8/2022, Em conclusão, a informação a prestar pelo intermediário financeiro ao investidor (cliente) relativa a atividades de intermediação e emitentes, que seja suscetível de influenciar as decisões de investimento, deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita (artigo 7.° do CVM), devendo o intermediário financeiro prestar todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, sendo que a extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimento e de experiência do cliente, informando dos riscos especiais que as operações envolvem (artigo 312.° do CVM) e orientar a sua atividade no sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus clientes, devendo observar os ditames da boa fé, com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência, informando-se, previamente, sobre a situação financeira dos clientes, a sua experiência e investimentos (aspetos que o intermediário financeiro tem o dever de conhecer) e sem esquecer que compete ao intermediário financeiro tomar a iniciativa de prestar todas as informações e não aguardar que o investidor (cliente) as solicite.”.22
5.3.A responsabilidade pré-contratual e contratual- artigo 798.º do Código Civil- pressupõe :i) o facto voluntário; ii)a ilicitude da actuação do contraente que se consubstancia na violação dos deveres de boa-fé contratual, como sejam a violação do dever de informação ou de adequação; iii) a culpa, que no caso do intermediário financeiro se presume, por força do disposto no art. 304.º-A, n.º 2, do CVM, ainda que ilidível nos termos do art. 350.º, n.º 2, do CC; iv) o nexo de causalidade, entre a violação do dever de informação ou de adequação e o dano, o qual deve ser cotejado nos termos do critério da causalidade adequada, previsto no art. 563.º do CC, cabendo aos autores provar quer a ilicitude quer o nexo causal, de acordo com o citado AUJ n.º 8/2022; v) o dano que integra o prejuízo que resultou na operação de investimento no mercado financeiro.
O acórdão recorrido, em coerência com a alteração da matéria, concluiu que pela inexistência de infracção ao dever de informação ou do dever de adequação por parte do Réu DB, através dos 2º, 3, e 4º Réus, agentes vinculados e dos poderes de representação que lhe conferiu.
Ou seja, não resultou provado que os agentes vinculados tenham, a um tempo, ocultado a natureza e os riscos dos produtos financeiros e, a outro, afirmado que se tratava de depósitos a prazo ou algo equivalente, sem qualquer risco de perda de capital, imputada pelos Autores. De acordo com a factualidade provada, os Autores pretendiam soluções financeiras que lhe permitissem rentabilidade superior aos depósitos a prazo, conheciam e compreendiam a sua exposição ao risco de mercado. Subscreveram outros produtos financeiros complexos, pelo menos em 2009, 2010 e 2011, nos quais também não existia garantia de remuneração que atingiram a maturidade com ganhos ou foram antecipadamente resgatados sem prejuízo para os autores – cfr. pontos 51 a 65.
No que se refere aos dois produtos financeiros em crise, resultou provado que o Autor, porque os 2.º, 3.º e 4.º réus o aconselharam, subscreveu junto do banco réu, os referidos produtos Note db Cabaz Global Ago. 2017 – pontos 67 a 80; e Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead -pontos 81 a 89, com capital próprio e também com capital mutuado (alavancagem), sendo que de acordo teor dos boletins de subscrição dos dois produtos e, bem assim, das Informações Fundamentais ao Investidor anexas a cada um deles, não foi identificado, pelos Autores, qualquer segmento deles que contenha informação que possa ser considerada incompleta ou obscura, o que sempre poderia configurar um minus ao nível da alegação da ilicitude.
Por último.
Nas conclusões (66) os recorrente afirmam que, desde 01.01.2014, o DB se autoexcluíra de comercializar PFC (acordo celebrado com a CMVM e 15 bancos, onde se incluía o DB, o qual pode ser consultado no site daCMVM no link https://www.apb.pt/content/files/PFC_Protocolo__FINAL.pdf) com as caraterísticas deste, a investidores não qualificados com património inferior a €:500.000,00.
Trata-se de alegação de factos supervenientes, cujo link de acesso não se encontra acessível, excluindo desde logo a sua relevância como eventuais factos notórios (artigo 412.º do CPC).
Em súmula.
De acordo com a factualidade estabilizada, os Autores não lograram provar que os Réus tenham violado, quer o dever de informação, quer o dever de adequação junto do autor(es), uma vez que de acordo com o teor dos referidos boletins que o autor assinou e tomou conhecimento mostravam-se aí reunidas todas as informações necessárias para que os autores se mostrassem devidamente esclarecidos na subscrição dos referidos produtos financeiros, tendo o autor conhecimento do risco que aqueles produtos representavam, por não constituírem meros depósitos a prazo, que antes já haviam subscrito e que deixaram de o fazer para investir em produtos que representassem um maior lucro.
De igual modo, resulta que não se verificou infracção ao dever de adequação, tendo os Autores a partir de 2009 adquirido junto do Réu DB outros produtos financeiros complexos com risco associado, que retornaram lucro avultado, sendo parte do capital investido alavancado, o que não corresponde ao perfil conservador, nem de prudentes investidores23.
A actuação dos Réus na proposta e venda dos produtos financeiros em referência é conforme aos deveres pré-contratuais e deveres no âmbito dos mercados financeiros.
Obiter dictum, a pretensão dos Autores sempre estaria comprometida face à ausência de prova do nexo de causalidade entre a alegada infracção dos RR e o dano- cfr. ponto y dos factos não provados) “Caso soubessem que se tratava de produtos de risco, com perda do seu capital, os Autores nunca as teriam Autorizado.
IV. Decisão
Pelas razões expostas, improcede a revista e confirma-se o acórdão recorrido.
As custas são a cargo dos recorrentes.
Lisboa, 3 de Julho de 2025
Isabel Salgado (relatora)
Ana Paula Lobo
Orlando dos Santos Nascimento
________
1. Seguindo de perto o Acórdão do STJ 30.05.2019 no proc. nº 22244/16.3T8LSB.L1. S1 e no Acórdão do STJ 16.11.2023, no proc 1094/17.5T8EVR.L1. S1.
2. “Estão em causa as afirmações de facto relacionadas com a prestação de informação sobre os riscos associados à subscrição Notes db Intesa, GDF Suez & Gilead e seu conhecimento pelos Autores, mais concretamente as que foram consideradas\ como provadas sob os pontos 1.37, 1.50, 1.53, 1.54, 1.55, 1.56, 1.61, 1.62, 1.63, 1.64, 1.65, 1.66, 1.67, 1.69, 1.70, 1.71 e 1.72 e as que foram consideradas como não provados sob os pontos 2.9, 2.10, 2.11 e 2.24.”
3. De qualquer modo, entende-se que a prova testemunhal complementar não colide com o estabelecido nos artigos 394.º e 395.º do Código Civil, afecta ao fim de completar e esclarecer o significado das circunstâncias objetivas inerentes ao negócio, em ordem a interpretar o contexto do documento confessório
4. “Como sejam DOC 8 da contestação (sugestão personalizada de investimento); DOC 12 e 13 contestação (obrigações db China Brasil Rendimento); DOC 14 e 15 contestação (notes db Cabaz Global); DOC 16 e 17 contestação (notes db Cabaz Global (3ª versão)); DOC 18, 19 e 20 contestação (notes db Rendimento Europa e mútuo); DOC 21, 22 e 23 da contestação (notes db Cabaz Global agosto 2017 e mútuo); DOC 24, 25 e 26 (notes db Intesa, GDF Suez & Gilead e mútuo)”
5. No proc. n.º 3994/20.STSVCT.G1. S1; e entre outros, os Ac. do STJ de 15.12.2022, proc. n.º 125/20.6T8TND.C1-A. S, e de 19.01.2023, proc. n.º 682/18.7T8PVZ.P1. S1, consultáveis in www.dgsi.pt, bem como os demais arestos citados no texto.
6. Na versão da lei à data da celebração dos negócios de subscrição dos instrumentos financeiros, na versão dada pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31-10:
7. RUI PINTO DUARTE, in Contratos de Intermediação no Código dos Valores Mobiliários, Separata n.º 7 dos Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários, abril de 2000, CMVM, p. 360 e ss.
8. Na versão do Dec.-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de outubro, vigente à data da prática dos factos, verificados a partir de fevereiro de 2008.
9. Em termos gerais, o ónus da prova recai sobre quem invoca um direito - artigo 342.º do CC. «Quem invoca ou ostenta um direito tem de provar os respectivos factos constitutivos e apenas eles. Provados estes, cumpre à outra parte provar os factos impeditivos ou extintivos do direito que se lhe contraponham. Quer isto dizer que o ónus da prova aparece sempre como inerente à própria norma jurídica a aplicar» cfr. ANSELMO DE CASTRO, Direito Processual Civil Declaratório, vol. III, p. 353.
10. Observe-se que o Acórdão do STJ de 23.03.2021, no proc. nº 1/19.5T8LRA.C1. S1, citado pelos recorrentes em abono da sua tese, é notório que não tem qualquer paralelo com a situação ajuizada; naqueles autos, a declaração da nulidade com os efeitos decorrentes do artigo 289º do CC, foi ditada pela ausência de poderes conferidos pelo investidor ao banco para a aquisição do produto financeiro que ficou devidamente provada. Como evidencia de per se a matéria sumariada: «A nulidade do contrato de intermediação financeira retira ao Banco a legitimidade para atuar em nome do investidor. O negócio de compra de obrigações foi, assim, celebrado pelo Banco, sem poderes de representação, o que provoca a ineficácia do negócio de aquisição de valores mobiliários, em relação ao representado (artigo 268.º, n.º 1, do Cód. Civil), assistindo, pois, a este, como depositante bancário da quantia entregue para o efeito da dita aquisição, direito a pedir à entidade bancária a respetiva restituição.»
11. Por antinomia dos factos provados relativos às circunstâncias de contratação entre as partes, veja-se o Acórdão do STJ relatado em 14.11.2024 no proc. nº3994/20.STSVCT.G1. S1, in www.dgsi.pt.; nele se concluiu pela nulidade do contrato de intermediação financeira por violação do art. 9.º do RGCC.
12. Faz-se notar, por exemplo oposto, no Acórdão dos STJ de 14.11.2024, no proc.º 3994/20.STSVCT.G1. S1, (atrás já indicado), a confirmação da declaração de nulidade dos contratos por inserirem cláusulas por adesão, proibidas à luz da LCCC, resultou do acolhimento do pedido subsidiário nesse sentido.
13. No proc. nº 22244/16.3T8LSB.L1. S.1, in www.dgsi.pt.
14 “risco… o qual se materializa se o comprador da opção (emitente do PFC) exercer o direito a um preço pré-determinado (60% do valor de um dos índices),”
15 Acerca dos tipos de perfil de investidor desenvolvidos na praxis bancária e financeira - perfil conservador, equilibrado, dinâmico e arrojado vd. JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, obra citada, p. 41.
16 na versão em vigor à data da subscrição referidos produtos financeiros, a versão dada pelo DL 357-A/2007, de 31-10:
17 In Deveres e Responsabilidade do Intermediário Financeiro – Alguns Aspetos, in Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários, nº 56, abril de 2017, p. 37 e ss.
18 Cfr. A Responsabilidade dos Intermediários Financeiros por Informação Deficitária ou Falta de Adequação dos Instrumentos Financeiros, in O Novo Direito Dos Valores Mobiliários, I Congresso sobre Valores Mobiliários e Mercados Financeiros, Almedina, 2017, p. 401-409.
19 Do mesmo autor e obra.
20 No proc. n.º 1479/16.4T8LRA.C2. S1-A
21 proc.15440/17.8T8LSB.L1. S1
22 No proc. 15440/17.8T8LSB.L1. S1
23 Acerca dos tipos de perfil de investidor na praxis bancária e financeira - perfil conservador, equilibrado, dinâmico e arrojado vd. JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, obra citada, p. 41.