FACTOS CONCLUSIVOS
CONTRATO DE EMPREITADA
INCUMPRIMENTO DEFINITIVO
CLÁUSULA RESOLUTIVA EXPRESSA
Sumário


1 - Não pode fazer-se constar dos factos provados matéria conclusiva ou conceitos de direito, devendo estes ser substituídos pelos factos subjacentes, também alegados.
2 – O disposto no art.º 808.º do C. Civil não impede que as partes acordem que o credor pode fazer cessar de imediato o acordo celebrado em caso de não cumprimento de determinada cláusula contratual.

Texto Integral


Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I – Relatório (elaborado tendo por base o da sentença da 1.ª instância):

AA e BB intentaram a presente ação declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra EMP01..., Lda., pedindo que:
a)  se reconheça verificada a resolução do contrato de empreitada objeto dos presentes autos;
b) a ré seja condenada a restituir/devolver aos autores a quantia por si recebida a mais, por comparação com os trabalhos efetivamente executados de acordo com o auto de medições no valor de € 44.570,42, acrescida de juros legais vencidos desde 25 de março de 2022 (data da comunicação da resolução do contrato) até à data da apresentação da petição inicial, que ascendem a € 356,56, bem como os vincendos até integral e efetivo pagamento;
c) a ré seja condenada a pagar aos autores a título de indemnização o valor que se vier apurar em sede de liquidação de execução de sentença, conforme alegado em 48.º da petição inicial.
Alegaram, em síntese, que celebraram com a ré um contrato de empreitada, cujo objeto era a construção de uma moradia, estando a ré obrigada a executar os trabalhos constantes do mapa de acabamentos anexo ao mesmo e que dele fazia parte integrante.
O valor acordado para o preço da obra empreitada foi de € 145.000,00, com iva já incluído, devendo realizar-se no prazo de 12 meses, com início dos trabalhos a 01 de agosto de 2020.
Estava acordado que o preço seria pago em quatro tranches, de acordo ou conforme o avanço da obra, sendo que, na data da assinatura do contrato, 07 de julho de 2020, entregaram de imediato à ré, a título de princípio de pagamento do preço da empreitada, a quantia de € 3.000,00.
Mais alegam que foram pagando de forma adiantada à execução das obras e que, não tendo a ré realizado a obra nos tempos a que contratualmente se obrigou, foi necessário fazer um aditamento ao contrato de empreitada que também não foi cumprido pela ré.
Alegam ter enviado cartas à ré, interpelando-a para cumprir, que não obtiveram qualquer resposta, não tendo esta procedido aos trabalhos então em falta.
Regularmente citada, a ré apresentou-se a contestar por exceção e impugnação, alegando que na sua interpretação dos documentos juntos com a petição inicial decorre a impossibilidade de resolução do contrato de empreitada por parte dos autores nos termos previstos nos arts.º 808.º, 801.º e 432.º, n.º 1, todos do Código Civil (doravante abreviadamente, designado por C. Civil), concluindo pela improcedência da ação.
Os autores responderam à matéria e exceção.
Na audiência prévia realizada em 10/01/2023, conforme ata sob a ref.ª ...15 com a mesma data, foram os autores convidados ao aperfeiçoamento da petição inicial com vista a proceder à concretização fática dos danos alegados e ao pedido formulado e que relegaram para liquidação ulterior.
Mediante o requerimento sob a ref.ª ...27 de 19/01/2023, vieram os autores responder ao referido convite alegando novos factos, reformulando o pedido ilíquido deduzido em sede de petição inicial, pedindo agora a condenação da ré a pagar aos autores uma indemnização pela sua conduta culposa no incumprimento do contrato e seu aditamento, no valor global de € 4.713,20, por danos patrimoniais com origem quer nos danos emergentes, quer com fundamento nos lucros cessantes.
Em contraditório, a ré reiterou o alegado em contestação, impugnando os factos alegados e concluindo pela improcedência da pretensão indemnizatória.
Realizou-se a audiência de julgamento e, concluído esta, foi proferida sentença nos seguintes termos:
julga-se parcialmente procedente a ação e, consequentemente, condena-se a ré a:
a) Reconhecer verificada a resolução do contrato de empreitada objeto dos presentes autos por verificadas as condições objetivas e subjetivas para a resolução do mesmo;
b) Restituir/devolver aos AA. a quantia por si recebida a mais, por comparação com os trabalhos efetivamente executados de acordo com o auto de medições no valor de € 44.570,42 (quarenta e quatro mil, quinhentos e setenta euros e quarenta e dois cêntimos);
c) Pagar juros legais vencidos sobre a quantia formulada na alínea b) deste dispositivo, contados desde 25 de Março de 2022 (data da comunicação da resolução do contrato) até à data da propositura da ação, que ascendem a € 356,56 (trezentos e cinquenta e seis euros e cinquenta e seis cêntimos), e os vincendos desde a data da propositura da ação até integral e efetivo pagamento;
d) Pagar aos Autores a indemnização pela sua conduta culposa no incumprimento do contrato e seu aditamento, o valor de € €1.213,20 euros (mil duzentos e treze euros e vinte cêntimos), por danos patrimoniais com origem nos danos emergentes, absolvendo-se a ré no demais peticionado de pagamento de €3.500,00 euros a título de lucros cessantes (rendas).
e) Custas por autores e ré (art.º 527.º do Código de Processo Civil) na proporção do decaimento”.
Inconformada veio a ré apresentar recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões:
“[…]
8ª. Com o que a Ré não concorda. Do teor dos referidos nºs 1 e 2 da Clausula Primeira do Aditamento, só pode concluir-se que o alegado não cumprimento na execução da primeira etapa de tais obras no prazo de 15 dias, mesmo a ter existido, não constituiria mais do um incumprimento parcial por parte da Ré, atendendo ao volume geral das obras a realizar – 10 etapas - e ao prazo geral de 5 meses para o efeito.
9ª. O que, smo, impossibilitava os AA de proceder à resolução do Contrato de Empreitada em 25-03-2022, por força do disposto no artº 802º, nº 2, do Código Civil,  quanto estabelece que “O credor não pode, todavia, resolver o negócio, se o não cumprimento parcial, atendendo ao seu interesse, tiver escassa importância”, com o que se considera que não assistia aos AA o direito de resolver o Contrato de Empreitada.
10ª. Acresce que os AA não efetuaram qualquer notificação da Ré para, num prazo razoável, cumprir as obrigações por esta assumidas no Aditamento ao Contrato de Empreitada celebrado em 09-03-2022 e com a cominação da perda definitiva do seu interesse no cumprimento por parte da Ré e da consideração do decorrente incumprimento definitivo, ou seja, não efetuaram a interpelação admonitória prevista no art.º 808º, n.º 1 do Código Civil.
11ª. Considerando-se que da inexistência de tal interpelação para fixação de prazo admonitório decorre a impossibilidade de resolução do Contrato de Empreitada por parte dos AA nos termos previstos nos artºs 808º, 801º e 432º, nº 1, todos do Código Civil, o que expressamente se invoca, cujo douto reconhecimento se peticiona e de onde decorrerá, só por si, a improcedência da ação.
Sem prescindir: Do erro na apreciação da prova e impugnação da resposta à matéria de facto:
[…]
38ª. Acresce também que, neste âmbito dos referidos Relatórios de Vistoria do Imóvel juntos pela Banco 1..., a douta sentença expressa a fls 21 uma fundamentação que não permite conhecer quais são os “alguns dos autos de vistoria na medição dos trabalhos da Banco 1...” que “contabilizaram percentualmente trabalhos realizados pelos autores”; nem quais são estes mesmos “trabalhos realizados pelos autores e que não eram da responsabilidade da ré/ ou que por esta não foram realizados “; nem quais “as fotografias existentes nos autos” que “não corroboram as medições feitas pela Banco 1...”; nem qual é “a quantidade de trabalhos que se encontrava por fazer quando das medições constantes de tais relatórios de vistoria da Banco 1...”.
39ª. Tratando-se de meras expressões genéricas, vagas e não concretizadas, que não cumprem o dever de fundamentação previsto nos artºs 607º, nº 4 e 154º do CPC e traduzem nulidade da douta Motivação nos termos daquele artº 607º, nº4, e ainda do 615º, nº1, als. c) e d) do CPC.
40º. Neste contexto e na procedência da impugnação da matéria de facto conforme requerido, considera-se que, tendo a seu cargo o respetivo ónus da prova (cfr. 342º, nº 1, do Código Civil), os Autores não lograram produzir prova válida dos factos e dos direitos por si alegados e invocados.
41ª. Com o que carece de fundamentação factual e legal a manutenção da condenação da Ré, o que deverá determinar a improcedência da ação, a respetiva absolvição dos pedidos contra si formulados e a revogação da douta sentença recorrida”.
Os autores responderam à apelação apresentada, pugnando pela manutenção da decisão proferida, nos seus precisos termos.

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O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II - Questões a decidir:

Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões das alegações dos recorrentes – arts.º 635.º, n.º 4, e 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por C. P. Civil) -, as questões que se colocam à apreciação deste Tribunal consistem em saber:

1 - Da nulidade da sentença proferida.
2 - Da impugnação da matéria de facto suscitada pela ré.
3 - Se, alterada ou não a decisão sobre a matéria de facto, deve ser alterada a decisão de direito e, aqui, em concreto, apreciar a alegada impossibilidade de resolução do contrato de empreitada celebrado.

III - Fundamentação de facto:

Os factos que foram dados como provados na decisão proferida são os seguintes:
“1.º Os Autores são legítimos donos/proprietários e possuidores do seguinte prédio: Rústico, composto de terra de pastagem com seis castanheiros, sito em “...”, a confrontar do Norte com CC; Sul: Caminho Público; Nascente: DD; Poente: EE. Inscrito no ano de 1976 na matriz predial rústica da freguesia ... sob o artigo ...62, com o valor patrimonial de € 3,77, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...25 (AP. ...68 de 2019/10/25) - cfr. cópia da caderneta predial e certidão permanente juntas sob doc. n.º 1 com a petição inicial.
2.º Prédio que, embora tenha sido registado como rústico, é do “tipo 6”, estando o mesmo inserido no Plano Diretor Municipal, pelo que está apto a nele se poder construir.
3.º No referido terreno está a ser levada a efeito uma moradia que se encontra em fase de construção, tendo inclusivamente os aqui Autores recorrido a crédito bancário para esse fim encontrando-se, por isso, constituída uma Hipoteca Voluntária a favor da Banco 1..., S.A. (AP. ...7 de 2020/08/09) - certidão permanente junta sob o referido doc. nº 1 com a petição inicial.
4.º A Ré dedica-se à construção e renovação de edifícios; promoção imobiliária; compra e venda de bens imobiliários e revenda dos adquiridos para esse fim e arrendamento de bens imobiliários.
5.º Autores e Ré na pessoa do seu legal representante e no âmbito da atividade desta, celebraram um contrato de empreitada, cujo objeto era a construção da moradia referida em 3.º - conforme consta da cláusula 1.ª do referido contrato junto sob documento nº 2 com a petição inicial;
6.º Através deste contrato, a Ré obrigou-se a executar os trabalhos constantes do mapa de acabamentos anexo ao mesmo e que dele faz parte integrante cfr. doc. nº 2.1) junto com a petição inicial que se dá por integralmente reproduzido.
7.º O valor acordado da empreitada foi de € 145.000,00, com iva já incluído (cláusula 2.ª do contrato – doc. 2).
8.º AA. e Ré acordaram que seria da responsabilidade desta última a execução da referida obra segundo as boas práticas e de acordo com as normas e técnicas de boa execução e em cumprimento da legislação aplicável e que o prazo de execução da mesma seria um prazo razoável de 12 (doze) meses, ou seja: início dos trabalhos a 01 de agosto de 2020 e termo dos trabalhos a 30 de julho de 2021, (cfr. cláusula 4.ª do contrato – doc. 2).
9.º Os Autores comprometeram-se contratualmente a pagar o preço referido em 7.º em 4 (quatro) tranches, de acordo ou conforme o avanço da obra, sendo que, na data da assinatura do contrato (07 de julho de 2020), os Autores entregaram de imediato à Ré, a título de princípio de pagamento da empreitada, a quantia de € 3.000,00 (três mil euros) de que foi dado o respetivo recibo de quitação.
10.º Resulta da 6.ª cláusula daquele contrato de empreitada que a Ré se obrigou perante a Autora a cumprir o contrato de empreitada aqui em apreço de acordo e “em conformidade com a sua proposta, o projeto, o caderno de encargos e plano de trabalhos e a legislação aplicável em vigor, … e ainda de acordo com as instruções que lhe venham a ser dadas pelo Primeiro Outorgante ou pela fiscalização, pela qual será responsável”.
11.º Mais se obrigou Ré a executar todos os trabalhos e acabamentos do mapa de acabamentos (cfr. cláusula 8.ª do contrato) com exceção dos materiais identificados nas alíneas a) e b).
12.º Apesar do referido em 9.º, 1.ª parte, quando ali se diz que os Autores se comprometeram contratualmente a pagar o preço global de € 145.000,00 em 4 (quatro) tranches conforme o avanço da obra, os Autores cumpriram com tal obrigação e pagaram mais do que aquilo a que estavam obrigados por equiparação aos trabalhos que iam sendo executados.
13.º A Ré não cumpriu com a sua obrigação, nomeadamente com o prazo de execução dos trabalhos e da conclusão da obra, o que constitui uma violação clara da cláusula 4.ª do contrato de empreitada entre as partes celebrado.
14.º Com efeito, a obra deveria estar concluída até ao dia 30 de Julho de 2021, quando na verdade apenas estava executada em 53,3%, isto em 30 de Março de 2022 ou seja, 8 meses para além da data indicada para a conclusão dos trabalhos, (cfr. Auto de Medição junto sob doc. n.º 3 cujos dizeres aqui se dão por integrados e reproduzidos para os devidos e legais efeitos).
15.º Antes do final de julho de 2021, o pagamento da mesma já tinha sido efetuado não em 85%, mas muito próximo desta percentagem (cfr. documentos comprovativos/transferências juntos sob doc. n.º 4 cujos dizeres aqui se dão por integrados e reproduzidos para os devidos e legais efeitos).
16.º Até 10 de Janeiro de 2022, (data do último pagamento efetuado) os donos da obra e aqui Autores haviam pago ao empreiteiro, ora Ré, por via do seu legal representante, FF, o montante global de € 124.000,00 (cento e vinte e quatro mil euros) - cfr. documentos bancários que se juntam como doc. n.º 4 da petição inicial - e que se dão por integralmente reproduzidos para todos os devidos e legais efeitos.
17.º Quando a Ré apenas justificava o recebimento pelos serviços e trabalhos efetuados de € 79.429,58 - cfr. documento n.º 5 (frente) junto com a petição inicial e que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos.
18.º) Recebeu a Ré a mais o valor de € 44.570,42, cfr. documento n.º 5 (verso) junto com a petição inicial.
19.º Alguns elementos de construção encontram-se incompletos e outros em falta.; por exemplo: é notório que os elementos 5.0 cobertura (identificados no auto de medições - doc. 3) já deviam estar completos, (o que não acontece) uma vez que se verifica a execução de elementos no interior da obra, que de acordo com as boas práticas de construção só deveriam ser realizadas após a conclusão do referido elemento 5.0 (Cobertura).
20.º Esta situação de incumprimento por parte da Ré, levou a que os Autores reclamassem junto daquela, pedindo de volta o valor pago a mais e deste modo o contrato ficaria resolvido amigavelmente, tendo o seu representante legal, Sr. FF, reconhecido, de facto, o incumprimento e, ao mesmo tempo foi proposto pelos aos Autores fazer-se um Aditamento ao contrato de empreitada, que a Ré aceitou.
21.º E os Autores acordaram com aquele e foi lavrado um Aditamento ao contrato de empreitada junto como documento n.º 2; aditamento que se juntou com a petição inicial como doc. n.º 6 e se aqui dá por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos.
22.º Os donos da obra, aqui Autores, efetuaram o pagamento de 85% do valor total da obra, facto que a Ré reconheceu, pela sua assinatura aposta no aditamento ao contrato (ponto 2. do aditamento).
23.º Resulta do aditamento (ponto 3. dos considerandos) e do acordado por ambas as partes, quais os trabalhos que se encontram concluídos; e no ponto 4. dos mesmos considerandos, quais os trabalhos que se encontram por executar - (Doc. 5).
24.º Uma vez que o principal motivo da celebração do Aditamento foi o incumprimento do prazo de execução da empreitada aposto no contrato inicial por parte do Empreiteiro, os Autores e Ré acordaram novos prazos para a fornecimento dos materiais e realização/execução dos trabalhos não efectuados, mas com as condições descritas na “Cláusula Primeira” do Aditamento - cujos dizeres aqui e expressamente se dão por integrados e reproduzidos para os devidos efeitos, (doc. 5).
25.º Apesar de os Autores terem dado mais uma oportunidade à Ré para concluir a obra, esta não cumpriu, mais uma vez, o primeiro prazo por etapas estipulado no aditamento.
26.º nem foi efetuado qualquer serviço ou trabalho na obra durantes esse período e até à data da instauração da ação a Ré não realizou qualquer trabalho como se obrigou a realizar.
27.º A Ré nunca mais voltou à obra tendo a Ré abandado definitivamente a obra, sem terminar os trabalhos, no momento em que apenas se encontravam executados, 53,3% do total dos ditos.
28.º A Ré não mais se mostrou disponível para cumprir o contrato e (ou) o aditamento.
29.º Os aqui AUTORES ficaram indignados e revoltados com os sucessivos incumprimentos da RÉ, e, não se mostrando esta disponível para cumprir o contrato e (ou) o aditamento, aqueles só puderam concluir que a RÉ abandonou a obra.
30.º Pelos incumprimentos dos prazos por parte da Ré, os Autores comunicaram à Ré, através de carta registada com A/R, em 25 de Março de 2022, a sua intenção de fazer cessar o contrato inicial de empreitada, considerando-o resolvido e, considerando-se desobrigados do pagamento da quantia ainda não entregue de € 21.000,00 (vinte e um mil euros).
31.º Simultaneamente, consideraram-se os Autores no direito de exigir da Ré a restituição, pelo menos, do valor pago em excesso comparativamente com o valor real de trabalhos efetuados, no montante de € 44.570,42 (quarenta e quatro mil, quinhentos e setenta euros e quarenta e dois cêntimos) e respetivos juros legais vencidos contados desde 25 de Março de 2022 (data da comunicação da resolução do contrato) até à presente data, que ascendem a € 356,56 (trezentos e cinquenta e seis euros e cinquenta e seis cêntimos), bem como os vincendos até integral e efetivo pagamento - cfr. doc. 7 junto com a petição inicial que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos.
32.º Na expectativa de resolverem o litígio pela via extrajudicial, os aqui Autores enviaram uma segunda comunicação à Ré, em 18 de Abril de 2022 – cfr. doc. 8 junto com a petição inicial que aqui se dá integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos
33.º A Ré ignorou o assunto.
34.º A Ré, aquando da feitura e assinatura do aditamento ao contrato inicial, foi alertada pelos Autores de que caso incumprisse mais uma vez, o seu comportamento culposo trazer-lhe-ia várias consequências – as quais se encontram taxativamente enumeradas na cláusula segunda (n.ºs 1. a 5. do referido aditamento junto à petição inicial sob doc. nº 6, que aqui se dá por integrado e reproduzido para os devidos efeitos).
35.º E mesmo assim, a Ré, continuou a ignorar tudo e todos, sabendo que o prazo para conclusão da empreitada assumia extrema relevância, tendo em vista as condições de financiamento acordadas entre os Autores enquanto DONOS DA OBRA e a Instituição Bancária, Banco 1...;
36.º Devido ao incumprimento dos prazos e à conduta culposa da Ré na não execução atempada dos trabalhos, levou a que os AA. não tivessem conseguido cumprir com as condições de financiamento de crédito acordadas com a Instituição Bancária Banco 1....
37.º Devido à conduta culposa da Ré, viram-se os Autores obrigados a terem de contrair novo empréstimo junto daquela Instituição Bancária em 03-10-2022 para poderem concluir a obra, conforme Ficha de Informação Normalizada Europeia que junto com o requerimento de aperfeiçoamento e constitui o documento designado pela letra ....
38.º Do referido documento (segunda página, na rubrica “outras componentes da TAEG”) consta que os Autores, na obtenção do novo empréstimo, tiveram de despender novamente, por culpa exclusiva da Ré, as seguintes quantias: a) € 239, 20 na Comissão de Avaliação – valor este debitado automaticamente da conta dos Autores (cfr. Doc. A.1); b) € 202,80 na Comissão de Formalização Contratual, exigida pela Banco 1... com a contratação do novo empréstimo (doc. comprovativo por ora não disponível mas que se protesta juntar); c) € 226,20 na Comissão de Estudo – valor debitado automaticamente da conta dos Autores (cfr. Doc. A.2); d) € 545,00 em outros custos: pela autenticação de documento particular (ato: mútuo) – valor pago diretamente ao Advogado no momento da realização da escritura, em simultâneo com a contratação do empréstimo (cfr. Doc. A.3).
Da contestação:
39.º A Ré recebeu a comunicação remetida pelos AA com data de 25-03-2022, correspondente ao documento nº 7, acompanhado do documento junto sob o nº 5, com a PI, e ainda a comunicação remetida por aqueles em 18-04-2022”.
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Os factos que foram considerados não provados não foram objeto de impugnação e, como tal, não relevam para a apreciação desta apelação.

IV - Do objeto do recurso:

Começa por dizer-se que não faz sentido apreciar as questões suscitadas na apelação pela ordem que consta das alegações de recurso da ré, pois que a licitude da resolução do contrato só deve ser verificada depois de se apreciar se a sentença não é nula, como invocado, e depois de fixada a matéria de facto provada relevante para a aplicação do direito.

1. Da nulidade da sentença:

A ré veio arguir a nulidade da sentença, com fundamento nas alíneas c) e d) do n.º 1 do art.º 615.º e art.º 607.º, ambos do C. P. Civil, alegando que as expressões que constam dos factos provados com os n.ºs 12, 13 e 15 traduzem meras expressões genéricas, vagas e não concretizadas.
Alega ainda que as expressões utilizadas a fls. 21 da motivação da decisão não permitem apreender que meios de prova estão efetivamente a ser considerados pelo Tribunal, arguindo as mesmas causas de nulidade da sentença (“alguns dos autos de vistoria”, “trabalhos realizados pelos autores”, “as fotografias existentes nos autos” ….).
As nulidades da sentença, como seus vícios intrínsecos, são apreciadas em função do texto e do discurso lógico nela desenvolvidos, não se confundindo com erros de julgamento (error in judicando), que são erros quanto à decisão de mérito explanada na sentença, decorrentes de má perceção da realidade factual (error facti) e/ou na aplicação do direito (error juris), de forma que o decidido não corresponde à realidade ontológica ou normativa, com a errada aplicação das normas jurídicas aos factos, erros de julgamento estes a sindicar noutro âmbito (vide, neste exato sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 04/10/2018, proc. 1716/17.8T8VNF.G1 in www.dgsi.pt).
Apreciemos.
A sentença é nula quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível (alínea c) citada pela ré recorrente) ou quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou apreciasse questões de que não podia tomar conhecimento (alínea d) do mesmo normativo).
O alegado caráter genérico ou conclusivo da matéria de facto provada ou da sua motivação, ainda que exista e que possa ser apreciado em sede de impugnação da decisão sobre a matéria de facto, não se traduz em qualquer nulidade da sentença, bastando para tal atentar na previsão legal a que a recorrente faz referência.
Não existe, assim, qualquer das nulidades invocadas pela ré recorrente (conclusões 12.ª, 13.ª e 39.ª).
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2. Da impugnação da matéria de facto:

2.1. Em sede de recurso, os apelantes impugnam a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância.
Nada obsta a sua apreciação, tendo a ré recorrente cumprido o ónus a que se reporta o art.º 640.º do C. P. Civil.
Entende que devem considerar-se como não provados os factos n.ºs 12, 13, 14, 15, 17, 18, 19, 20, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 36 e 37.
Assiste razão à recorrente quando refere que consta de alguns dos itens enumerados como factos provados a afirmação de matéria de direito ou de natureza absolutamente conclusiva.
Saber se os autores ou a ré cumpriram ou deixaram de cumprir o que foi acordado resulta da apreciação jurídica que se faz considerando os factos relativos ao acordo das partes e aos termos em que tal acordo seria executado e os factos relativos à sua efetiva execução, não fazendo sentido que se faça constar da matéria de facto provada que esta ou aquela conduta viola esta ou aquela cláusula do acordo escrito celebrado, pois que para tal tem de subsumir-se os factos ao direito aplicável, o que deve ser realizado em sede de fundamentação jurídica da decisão.
É questão jurídica e não matéria de facto, saber quem e em que termos violou o acordo celebrado.
Tais expressões têm, pois, de ser eliminadas da matéria de facto provada, sendo substituídas pela matéria de facto, também ela alegada, correspondente.
Do mesmo modo, não deve constar da matéria de facto provada a referência aos documentos que permitiram a afirmação de cada um dos factos provados pois que estes, como meios de prova que determinaram a convicção do Tribunal, devem ser mencionados na motivação da decisão sobre a matéria de facto (admitindo-se apenas que, estando em causa os factos relacionados com os acordos escritos celebrados, se possa fazer menção aos documentos de onde constam as declarações de vontade, por comodidade de exposição, considerando-se o conteúdo dos documentos como reproduzido).
Existem factos provados não impugnados que contêm a afirmação de verdadeiros conceitos jurídicos (“contrato de empreitada”, “legítimos donos/ proprietários”). Ainda assim, não se referindo estes às questões de facto invocadas na presente impugnação, não será alterada a sua redação, ainda que se reconheça a impropriedade da mesma.
A ré questiona a credibilidade da prova produzida para que a afirmação dos factos 12 e 13 (bem como muitos outros), considerando que as declarações prestadas pelos autores não podem ser valoradas, como foram, nem as das testemunhas que arrolaram, considerando a sua natural parcialidade e a ausência de concretos conhecimentos em matéria de construção civil e desvalorizando os documentos n,ºs 3 e 5 que foram juntos com a petição inicial.
Sem razão, no que se refere ao que foram as obrigações assumidas, aos pagamentos efetuados e à execução da obra, considerando o tempo decorrido desde a celebração do acordo.
A credibilidade dos depoimentos prestados (e, note-se, a ré não fez qualquer esforço probatório, como veremos, fazendo notar-se que tal esforço não existe sequer em sede de alegação) é confirmada pelo aditamento ao acordo inicial e que está assinado pela ré.
A ré explicou o atraso na realização da obra invocando os efeitos da pandemia Covid 19 (art.º 25.º da sua contestação), facto esse que resultou não provado e não foi objeto de impugnação.
Ora, tal como ambas as partes declararam no aditamento ao acordo escrito inicial, em 09 de março de 2022, “o dono da obra já efetuou o pagamento de cerca de 85% do valor total da empreitada”, afirmando-se de seguida o que estava efetivamente realizado e assumindo-se então que tudo o mais que estava previsto no acordo inicial não estava, então, realizado, calendarizando-se a sua realização para os cinco meses seguintes neles se incluindo todos os dias úteis e os não úteis.
Sabemos todos que se os autores pagaram a quantia de € 124.000,00 a título de preço da empreitada, como aceita a ré no art.º 27.º da sua contestação e está demonstrado através dos documentos de transferência juntos aos autos, tal significa que, do preço acordado de € 145.000,00, aqueles pagaram não 85%, mas a exata percentagem de 85,517%, pois que o que está em causa uma mera operação de cálculo.
 Note-se que ficou desde logo acordado que os autores teriam o direito de reaver as prestações já pagas (cláusula segunda, n.º 5, do documento n.º 6 junto com a petição inicial), o que significa admitir que o preço já adiantado era superior à percentagem de execução da obra já realizada pela ré.
O mesmo se diga quanto à execução da obra, considerando o tempo acordado para a sua realização. O pressuposto desse aditamento é, como dele consta, que “o prazo de conclusão da obra referente ao contrato supra mencionado não foi respeitado pelo empreiteiro, refira-se que o prazo era a 31 de julho de 2021”.
Assim, são as declarações da própria ré, vertidas no aditamento escrito que acordou fazer ao contrato inicial que confirmam os depoimentos prestados em audiência, quer no sentido de que a quantia total entregue - € 124.000,00 – excedia o volume de obra já realizada pela ré, quer quanto à não observância do prazo acordado inicialmente e que, como consta do documento 2 junto com a petição inicial era 30 de julho de 2021 (e não 31 como consta do aditamento).
Deverá manter-se assim como provado o que consta da matéria de facto impugnada nos factos 12 e 13, alterando-se, porém, a sua redação de forma a dele expurgar o que constituiu matéria conclusiva ou de direito.
“12.º Apesar do referido no facto 9.º, 1.ª parte, os autores procederam ao pagamento à ré, a título de preço da obra, da quantia global de € 124.000,00, em tranches, sendo este valor superior ao valor dos trabalhos até então realizados pela ré, no âmbito do acordo celebrado.
13.º A ré não concluiu a obra que acordou realizar no âmbito do acordo celebrado até à data de 30 de julho de 2021”
A redação dada ao facto 12 exige que se elimine o facto 22. Como se disse já, a quantia que se reconhece estar paga é de € 124.000,00 e esta não corresponde à percentagem de 85% do preço, como se afirma no facto 22, mas de 85,517%. Assim, não pode estar provado que os autores pagaram a quantia de € 124.000,00 e, mais à frente, que pagaram 85% do preço.
Aliás, o que está reconhecido pela autora através da assinatura do documento é que os autores haviam pago “cerca de 85%” do valor total, o que, estando provado que os autores pagaram a quantia de € 124.000,00, que a ré reconhece ter sido paga, nada mais de relevante acrescentaria aos factos provados.
O facto 22 deverá, assim, ser eliminado, nos termos do art.º 662.º, n.º 1, do C. P. Civil. 
No facto 14 está em causa, como novo facto relevante, saber a que percentagem  de execução da obra correspondiam os trabalhos realizados pela ré, na data então indicada de 30 de março de 2022.
Com efeito, a primeira afirmação que dele consta, “a obra deveria estar concluída até ao dia 30 de julho de 2021”, resulta já do que está acordado e está considerado provado – facto 8 -, sem que este facto tenha sido impugnado pela ré.
A matéria de facto relevante e em apreciação estava alegada no art.º 14.º da petição inicial.
Em sede de contestação a ré alegou que “carece de qualquer fundamento e impugna-se o invocado no art.º 14.º da PI e respetivo documento junto pelos AS sob n.º3, alegado “auto de medição com data de 30/03/2022, elaborado de forma exclusiva pelos AA e no qual a Ré nunca interveio e não conhecia – nesse sentido. Protesta juntar documento comprovativo, logo que disponibilizado”.
Note-se que foi a ré quem, até março de 2022, esteve a realizar a obra.
Seria fácil à ré esclarecer, analisando o documento n.º 3, que partes da obra tinha realizado e não estavam identificados nesse documento, ou estando, estavam indevidamente calculados em termos de percentagem do valor total de execução da obra.
Nada, porém, alegou, tendo tão-só solicitado que fossem juntos os autos de medição que foram realizados pela Banco 1... no âmbito do financiamento solicitado pelos autores. O tal documento comprovativo protestado juntar nunca foi junto, nem, sobre esta matéria, produziu a ré, que se dedica à construção civil, qualquer prova.
Mais uma vez, o que dá conforto à prova produzida pelos autores e confirma o que foi declarado pelos autores são as declarações da própria ré.
É que foi esta quem, juntamente com os autores, declarou no documento de aditamento ao acordo inicial o que estava em 09 de março de 2022 realizado em obra, estando por concluir “os restantes serviços que constam do mapa de acabamentos anexo ao contrato” – documento n.º 6 já citado.
 Ora, o que estava então efetuado era, apenas:
- escavações para as fundações da moradia;
- alicerces e respetiva laje inferior;
- elevação das paredes exteriores e interiores;
- laje superior;
- revestimento com ceral das paredes interiores;
- colocação do telhado, faltando acabar o isolamento do mesmo;
- pré instalação da canalização;
- pré instalação da tubagem para a eletricidade;
- colocação do capoto acordado nas paredes exteriores, faltando efetuar o revestimento e respetiva pintura;
- colocação de azulejo nas casas de banho, estando por concluir os respetivos acabamentos;
- colocação de pedras de granito nas bases das janelas e portas exteriores.
São estes elementos que conferem credibilidade ao documento n.º3, elaborado por quem exercia a atividade de fiscalização da obra, GG, quando se compara o que estava acordado e que deveria ser efetuado pela ré e que constava já do documento n.º2 junto com a petição inicial..
Não releva, aqui, o facto de apenas a primeira folha do auto de medição estar assinada. Tal como aconteceu, por exemplo, com a sentença proferida ou a contestação que a ré apresentou (para utilizar o exemplo que o Mandatário da ré utilizou para ilustrar a irrelevância do documento por não estar, todo ele, assinado), sempre que a assinatura é digital, a mesma consta apenas da primeira (ou última) folha do documento, não havendo nas restantes qualquer outra assinatura.
Esta realidade não é, em si mesma, fundamento para colocar em causa o que no documento se declara, tanto mais que, como se disse supra, a ré melhor do que ninguém poderia ter alegado o que mais fez na obra ou o que foi insuficientemente objeto de medição por GG. 
Apesar das dúvidas sobre a profissão exercida pelo referido GG (seria arquiteto, como referiram os autores, tendo o seu nome no projeto da casa, ou engenheiro como chegou a referir o Mandatário da ré, sem que, contudo, pudesse depor como testemunha nos autos), certo é que ambos os autores indicaram que esta pessoa exercia funções de fiscalização da obra, tendo a autora sido muito perentória em afirmar que esta pessoa lhes foi apresentada pelo legal representante da ré e seria, assim, da confiança desta (sendo aqui muito relevante, para conferir ainda maior credibilidade ao depoimento da autora, o que referiu quanto à circunstância de este GG ter continuado a fazer a fiscalização da obra depois da saída da ré, assim como continuaram os trabalhadores da ré, que passaram a trabalhar diretamente para os autores).
Existe, porém, nos autos, prova documental que se refere a GG como arquiteto, com número de inscrição na Ordem dos Arquitetos, como sendo o autor do projeto de arquitetura, coordenador do projeto e responsável pela fiscalização da obra – alvará de utilização junto aos autos a fls. 163 verso, com o requerimento de 07 de junho de 2024, sem que a ré tivesse alegado o que quer que fosse no exercício do contraditório.
Note-se que, como se referiu supra, foi também a ré que fez constar desse acordo de aditamento que o dono de obra tinha o direito de reaver as prestações já pagas.
É também esta posição da ré – claramente descrita no aditamento ao contrato – que retira também credibilidade, para este efeito, aos relatórios de avaliação que foram sendo efetuados por solicitação da Banco 1..., visando a libertação das tranches do financiamento solicitados pelos autores.
Começa por assinalar-se o que foi referido pelos autores e que é facilmente percetível. Estando a obra em curso, a ser realizada pela ré, a libertação das tranches do financiamento interessava a autores e à ré. Aos autores porque podiam pagar à ré as quantias parcelares que a ré ia solicitando e à ré porque assim ia sendo paga pela obra realizada ou a realizar.
Daí que não surpreenda que, neste contexto, fosse irrelevante para os autores e para a ré a indicação da percentagem da obra realizada, sendo tal informação apenas relevante para a Banco 1....
Ora, os relatórios de avaliação realizados por solicitação da Banco 1..., para além da indicação da percentagem da obra que se considerava estar já realizada, têm também fotografias.
Existe um relatório datado de 05 de janeiro de 2021 que refere a percentagem de execução da obra de 47%, bastando atentar nas fotografias anexas que a obra que surge nessas fotografias não está concluída em 47%.
Existe um relatório seguinte datado de 22 de março de 2021 que refere a percentagem de execução da obra de 71%. As fotografias anexas são ainda mais expressivas, sendo evidente que, sendo os trabalhos a realizar pela ré os que constam do documento n.º 2 junto da petição inicial, a obra por esta realizada, na data em questão, não representava 71% do total da obra.
Ainda mais claro é, porém, o relatório de 27 de setembro de 2021, e que reporta uma percentagem de execução da obra de 82%. Respondendo à questão da ré que alega que, lida a sentença, se fica sem saber a que fotografias se refere o Mm.º Juiz a quo, dir-se-á que todas as fotografias anexas a esses relatórios evidenciam que a percentagem de execução da construção realizada não é a que consta desse mesmo relatório.
Note-se que, aqui, não nos merece qualquer reserva a afirmação efetuada pelo autor de estar a ser considerada nesse relatório de 27 de setembro de 2021 o piso radiante que é visível nas fotografias 3 e 6, quando é certo que tal trabalho não foi executado pela ré pois que, claramente, não consta da descrição do documento n.º2 como trabalho a realizar pela ré.
Mas se dúvidas tivesse tido o Tribunal sobre esta matéria – e não teve, como também não tem esta instância – estas ter-se-iam dissipado depois de comparar o estado da obra descrito no relatório de 27 de setembro de 2021 com e aquele que foi descrito no relatório de 09 de junho de 2022. Como se retira das fotografias anexas a este último relatório, a percentagem de obra realizada nesta última data é muito superior à que é visível nas fotografias anteriores e, ainda assim, foi considerado que a percentagem de obra realizada era agora de apenas 78%.
Ou seja, tendo sido realizadas as obras que resultam claras das fotografias tiradas em 09 de junho de 2022 (e a ré já não estava em obra desde março de 2022), quando comparadas com o estado da obra em 27 de setembro de 2021, a avaliadora da Banco 1..., para efeito de libertação do financiamento, considerou que o estado da obra representava uma percentagem de execução inferior.
Não é preciso ter conhecimentos especiais em construção civil para perceber que a percentagem de execução da construção visível nas fotografias do relatório de 09 de junho de 2022 é muito superior à que existia aquando da elaboração do relatório de 27 de setembro de 2021.
Basta analisar comparativamente as fotografias com espirito crítico.
Note-se que, como bem questionou o seu Mandatário aquando do depoimento de parte do autor, nessa data de 27 de setembro de 2021, a Sr.ª avaliadora da Banco 1... atribui percentagens de conclusão dos trabalhos de redes de água e instalação elétrica absolutamente incompatíveis com o que as partes declararam, no aditamento ao contrato inicial, em março de 2022, declarando estar apenas realizada a pré instalação.
Daí que a explicação dada pela avaliadora da Banco 1... para tal discrepância (fls. 118 dos autos, requerimento de 19 de outubro de 2023) seja quase pueril (o impacto da covid e a deterioração dos elementos da obra pelo facto de esta ter estado parada), quando existem fotografias e estas podem ser vistas e comparadas por quem quer que seja.
O que evidencia este último relatório de avaliação é tão-só que a Banco 1..., tendo até então libertado tranches do financiamento equivalentes a 82% do valor global da obra, não estava, então, disposta a libertar qualquer outra quantia.
Basta atentar nas dez etapas que estão definidas no aditamento realizado - e que correspondem ao que faltava ainda fazer - e o prazo global estabelecido de cinco meses para a sua execução, considerando os dias úteis e os não úteis desses cinco meses, quando os autores tinham já muita urgência na conclusão da obra, para se perceber que o que faltava realizar não correspondia a 18% da obra ou mesmo a 22% (considerando a percentagem que a avaliadora atribuiu em 09 de junho de 2022 ao que estava já efetuado), se para a realização de toda a obra estava inicialmente acordado o prazo de um ano e, neste caso, não havia qualquer menção a que fossem também considerados os dias não úteis.
Tal como aconteceu com o Mm.º Juiz a quo, não temos dívidas em entender que o documento n.º3, emitido nas circunstâncias referidas pelos autores, tendo em atenção o que consta do acordo escrito de aditamento ao acordo inicial, é prova bastante para a afirmação da percentagem de execução realizada pela ré, na data referida.
O facto 14 passará, assim, a ter a seguinte redação:
“14.º Em 30 de março de 2022 a obra realizada pela ré para os autores estava executada na percentagem de 53,3%”.
Quanto ao facto 15, este facto refere-se, mais uma vez, à quantia que foi paga pelos autores, sendo imprecisa a referência à percentagem de pagamento quando, como se fez já constar do facto 12 e consta do facto 7, sabemos quanto foi pago (€124.000,00) e sabemos qual o valor do preço acordado (€ 145.000.00).
Aquela percentagem, neste contexto, é supérflua.
O que de novo aqui se refere é que, antes do final de julho de 2021, os autores já haviam efetuado o pagamento referido de € 124.000,00.
Não é verdade.
Estão juntos os comprovativos das transferências realizadas pelos autores – documento n.º 4 junto com a petição inicial -, num total de € 124.000,00, (como admitiu a ré ter sido pago pelos autores), mas após julho de 2021 foram pagas as quantias € 500,00, €500,00, €500,00, € 500,00, € 3.000,00, € 5.000,00 e € 5.000,00, respetivamente em 01/10/2021, 01/010/2021, 03/10/2021, 03/01/2021, 03/10/2021, 06/10/2021 e 10/01/2022.
Assim, daquela quantia de € 124.000,00, em julho de 2021, estava paga apenas quantia de € 109.000,00.
O facto 15 passará, assim, a ter a seguinte redação:
15.º Da quantia de € 124.000,00 que os autores pagaram à ré, a quantia de € 109.000,00 já estava paga antes do final de julho de 2021”.
 O facto 16 repete a questão do pagamento, limitando-se a acrescentar a data em que foi efetuada a última tranche daquele e que, como se disse, resulta dos documentos juntos e que corporizam as transferências para pagamento realizadas – documento n.º 4 junto com a petição inicial.
Assim, de modo a não repetir de forma desnecessária o que está já considerado como provado nos demais factos, o facto 16 passará assim a ter a seguinte redação;
16.º A última tranche dessa quantia de € 124.000,00 foi entregue pelos autores à ré em 10 de janeiro de 2022”.
No que se refere aos factos 17 e 18, o Tribunal considerou os mesmos depoimentos prestados e o documento n.º 5 junto com a petição.
Neste documento n.º5, o próprio autor, como admitiu no depoimento prestado, traduziu em dinheiro os trabalhos que estavam até então efetuados pela ré, considerando o que estava já pago e que, como se disse supra, nunca esteve em discussão: € 124.000,00 do preço total de € 145.000,00.
Ora, o que estava realizado em obra era, em 30 de março de 2022, 53,3% da obra (facto provado 14, com a fundamentação supra expendida). Se as partes acordaram que o preço total da obra era de € 145.000,00, 53.3% do preço corresponde a € 77.285,00.
Os autores foram perentórios em afirmar que, após a outorga do aditamento ao acordo inicial, nenhum trabalho foi realizado em obra pela ré, sendo certo que a ré, tendo impugnado os factos que foram alegados pelos autores nessa matéria, nunca alegaram ter efetuado qualquer outro novo trabalho na obra em questão (vide art.º 30.º da contestação).
Daí que seja muito difícil de compreender como é que, estando medidos trabalhos realizados que correspondem a 53,3% da obra final, tal percentagem representa afinal uma execução equivalente a € 79.429,58 do preço de € 145.000,00
Sendo a matemática uma ciência, este valor de € 79.429,58 corresponde a 54,779% do preço de € 145.000,00.
Não é pelo facto de o valor em causa - € 79.429,58 – ser superior ao valor que corresponde a 53,3% da obra que foi executada pela ré - €77.285,00 –, que se pode afirmar ser esse o valor da obra realizada pela ré.
 É certo que os autores reclamam da ré apenas a diferença entre o que pagaram, € 124.000,00, e a quantia de € 79.429,58, num total de € 44.570,42.
Porém, saber se tal quantia lhes é devida ou se até seria devida quantia superior é matéria que cumpre apreciar em sede de fundamentação de direito e não permite que se afirme como provado que a execução de 53,3% da obra corresponde ao preço de € 79.429,58 quando, matematicamente, este valor corresponde a 54,779%.
Assiste razão à ré quando questiona, nesta particular questão, a competência do autor para realizar a avaliação que realizou e que consta do documento n.º5 junto com a petição inicial, considerando os trabalhos já realizados pela ré em obra.
 O autor, como o próprio admitiu, nenhum conhecimento específico tinha em matéria de construção civil, tendo apenas considerado os valores que entendia serem devidos pela ré, atendendo ao auto de medição junto (e já explicamos porque deverá o mesmo ser valorado) e os trabalhos que não estavam ainda realizados.
Terão, assim, que considerar-se tais factos como não provados, eliminando-se assim da factualidade provada os factos 17 e 18.
No que se refere ao facto 19, o que está em causa na alegação dos autores é o que GG fez constar do documento n.º3 junto com a petição inicial.
Ou seja, o que nele está vertido refere-se ao estado do imóvel na data em que foi efetuado esse ato de medição e que, precisamente, justificou que fosse considerado que estava apenas executada a percentagem de 53,3% da obra.
Pelas razões supra referidas, tal elemento probatório mereceu e deve merecer a credibilidade do Tribunal e, como tal, deverá ser considerado o seu teor, corrigindo-se apenas a linguagem utilizada e fazendo-se apenas menção que tal afirmação se reporta à data do documento e, assim, não é anterior ao aditamento escrito realizado, referido nos factos seguintes.
“19.º Em 30/03/2022 alguns elementos de construção da obra encontravam-se incompletos e outros em falta: por exemplo: era notório que os elementos 5.0 referentes à cobertura já deviam estar completos (o que não acontecia), uma vez que se verifica a execução de elementos no interior da obra que, de acordo com as boas práticas de construção, só deveriam ser realizadas após a conclusão do referido elemento 5.0 (Cobertura)”.
Já o facto 20 reporta-se ao momento anterior, ou seja, às circunstâncias que determinaram que as partes celebrassem o acordo escrito que corporiza um aditamento ao contrato inicial, datado de 09 de março de 2022.
Ora, a forma conclusiva como tal matéria estava alegada e foi considerada provada pode e deve ser corrigida, considerando os factos que foram efetivamente alegados e o que consta do próprio documento e que corporiza as declarações de vontade de cada uma das partes, nos termos anteriormente expostos e descritos nos próprios “considerandos” que precedem as cláusulas definidas.
O que determinou que fosse assinado o aditamento ao acordo inicial foi o atraso da realização da obra, considerando o prazo inicial que naquele estava definido, bem como a diferença existente entre a percentagem de obra realizada pela ré quando comparada com o montante de preço que então já havia sido adiantado pelos autores. Este reconhecimento por parte da ré resulta, como se disse supra, das suas próprias declarações de vontade vertidas no documento que assinou e a que já se fizeram referência, nomeadamente as que se referem ao prazo para conclusão da obra estar ultrapassado, estar realizada apenas a obra descrita (e não tudo o mais acordado, quando aquele prazo estava já ultrapassado por mais de sete meses) e o direito de aos autores ser devolvido o que haviam pago a mais, no caso de cessação do acordo por iniciativa do dono de obra (de “rescisão”, nas palavras do acordo).
Assim, com fundamento nas declarações prestadas pelos autores, mas sobretudo no que delas resulta que encontra conforto no aditamento ao acordo inicial que ambas as partes celebraram, a redação do facto 20 passará a ter a seguinte redação:
20.º Os autores reclamaram junto da ré pelo atraso na realização da obra, considerando a quantia que até então já lhe haviam entregue a título de preço e que excedia o valor da obra já realizada, tendo o seu representante legal reconhecido que estava já ultrapassado o prazo fixado para a realização da obra e que a obra realizada era de percentagem inferior ao preço já referido, tendo os autores proposto à ré a realização de um aditamento ao acordo escrito inicialmente realizado, o que esta aceitou”.
Ora, considerando este mesmo documento, não se percebe sequer como pode a ré impugnar o que resultou provado no facto 23 e que traduz o que dele consta, sendo certo que, estando em causa a redação do que nele se encontra escrito, melhor seria fazer constar do facto provado a redação que as próprias partes então utilizaram, só nesta medida se corrigindo a sua redação. 

O facto 23 passará a ter a seguinte redação:
“23.º Resulta do aditamento escrito realizado em 09 de março de 2022:
- no ponto 3. dos “considerandos”: dos serviços constantes no mapa de acabamentos anexo ao contrato supra mencionado foram concluídos apenas os seguintes:
. Escavações para as fundações da moradia
. Alicerces e respetiva laje inferior
. Elevação das paredes exteriores e interiores;
. Laje superior
. Revestimento com ceral das paredes interiores
. Colocação do telhado, faltando acabar o isolamento do mesmo
. Pré instalação da canalização
. Pré instalação da tubagem para a eletricidade
. Colocação do capoto acordado nas paredes exteriores, faltando efetuar o revestimento e respetiva pintura
. Colocação de azulejo nas casas de banho, estando por concluir os respetivos acabamentos
. Colocação de pedras de granito nas bases das janelas e portas exteriores.
- no ponto 4. dos mesmos considerandos: estão por concluir, portanto, os restantes serviços que constam no mapa de acabamentos ao anexo supra mencionado”.
Já os factos provados 24 e 25 traduzem o que foi referido pelos autores, é certo, mas que está em absoluta concordância com o teor do aditamento que corporiza as declarações, voltamos a repetir, de ambas as partes e a posição que estas assumem nos articulados desta ação.
Note-se, como se referiu supra, que a ré nunca alegou ter efetuado qualquer outro trabalho para os autores após o referido aditamento ao acordo inicial, não havendo, pois, sequer alegação divergente nesta matéria.
Era a si que competia ter alegado e provado que, no prazo acordado de quinze dias, havia procedido ao isolamento e impermeabilização dos alicerces da moradia e drenagem à volta da mesma, como facto impeditivo do direito dos autores, nos termos do art.º 342.º, n.º 2, do C. Civil.
Tal alegação não existe.
Aliás, o que a ré discute é a relevância jurídica do não cumprimento do prazo de quinze dias que estava referido no aditamento para a realização daqueles trabalhos, quando estavam estabelecidas dez novas etapas para a execução da obra e aquele correspondia apenas ao primeiro de dez prazos fixados.
Tal relevância deve ser apreciada na fundamentação jurídica da decisão, nenhum interesse tendo para a apreciação da impugnação da matéria de facto apresentada pela ré.
Justifica-se, assim, naturalmente que se mantenham tais factos como provados, sem mais considerações:
25.º Apesar de os autores terem dado mais uma oportunidade à ré para concluir a obra, esta não cumpriu, mais uma vez, o primeiro prazo por etapas estipulado no aditamento.
26.º Nem foi por si efetuado qualquer serviço ou trabalho na obra durante esse período e, até à data da instauração da ação, a ré não realizou qualquer trabalho como se obrigou a realizar.
Ora, considerando estes factos, os que de seguida se elencaram sob os pontos 27, 28 e 29 são não só uma manifesta duplicação dos que já estavam considerados provados (a não execução de mais trabalhos, a percentagem dos trabalhos realizados), como representam matéria conclusiva (não estar a ré disponível para cumprir o acordado e o abandono de obra).
Note-se que a afirmação que consta do facto 29 no sentido de terem os autores ficado indignados e revoltados é manifestamente inócua nos presentes autos, pois que nenhuma pretensão indemnizatória foi formulada a título de danos não patrimoniais sofridos pelos autores.
Devem, por essa razão ser eliminados, não porque não estejam provados, mas porque o que deles consta de matéria de facto relevante para a apreciação dos pedidos formulados resulta já da matéria de facto provada nos demais factos impugnados analisados.
No que se refere aos factos 36 e 37, começa por dizer-se que a ré os impugna dizendo que foram afirmados apenas com base nos documentos n.ºs 3 e 5 juntos com a petição inicial.
Esses factos nada têm que ver com esses documentos, mas com a questão da inobservância do prazo inicial da obra, confessado pela própria ré no aditamento escrito que realizou ao acordo inicial.
Nenhuma referência é efetuada pela ré ao que nesses factos consta quanto ao novo financiamento contraído junto da Banco 1..., afirmado pelos autores, e que consta também daquela factualidade (e que nada tem a ver com os citados documentos n.ºs 3 e 5).
Veja-se, aliás, que a ré não impugnou a matéria de facto que foi considerada provada no facto 35.
Assim, demonstrado que está a inobservância pela ré do prazo inicial da obra, e não resultando da impugnação qualquer outra crítica ao que nesses factos resulta provado no que diz respeito a esse novo financiamento, têm apenas de ser eliminadas as menções à culpa da ré, pois que a sua afirmação resultará, necessariamente, da aplicação do direito aos factos.
O que foi determinante da necessidade de realização de um novo pedido de financiamento foi a inobservância do prazo de execução da obra, a que estava vinculada a ré e, assim, apenas tal realidade de facto deve ser transposta para a matéria de facto provada, mais uma vez sem menção do meio de prova que se refere ao novo pedido de financiamento.
Os factos 36 e 37 passarão, assim, a ter seguinte redação:
36.º A inobservância do prazo de execução da obra por parte da ré levou a que os autores não tivessem conseguido cumprir com as condições de financiamento de crédito acordadas com a Instituição Bancária Banco 1....
37.º Por essa razão, os autores tiveram de contrair novo empréstimo junto daquela Instituição Bancária em 03 de outubro de 2022 para poderem concluir a obra.
Decorre do exposto que procede, em parte, a impugnação da matéria de facto efetuada pela ré (conclusões 14.ª a 38.ª).
**
São, assim, de considerar os seguintes factos (corrigindo-se a redação de alguns factos em matéria de linguagem, sem relevância quanto ao conteúdo dos factos que resultaram provados e que não foram objeto de apreciação no ponto 2 da impugnação da decisão sobre a matéria de facto):

1.º Os autores são legítimos donos/proprietários e possuidores do seguinte prédio: Rústico, composto de terra de pastagem com seis castanheiros, sito em “...”, a confrontar do Norte com CC; Sul: Caminho Público; Nascente: DD; Poente: EE. Inscrito no ano de 1976 na matriz predial rústica da freguesia ... sob o artigo ...62, com o valor patrimonial de € 3,77, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...25 (AP. ...68 de 2019/10/25)
2.º Prédio que, embora tenha sido registado como rústico, é do “tipo 6”, estando o mesmo inserido no Plano Diretor Municipal, pelo que está apto a nele se poder construir.
3.º No referido terreno está a ser levada a efeito uma moradia que se encontra em fase de construção, tendo os autores recorrido a crédito bancário para esse fim encontrando-se, por isso, constituída uma Hipoteca Voluntária a favor da Banco 1..., S.A. (AP. ...7 de 2020/08/09)
4.º A ré dedica-se à construção e renovação de edifícios; promoção imobiliária; compra e venda de bens imobiliários e revenda dos adquiridos para esse fim e arrendamento de bens imobiliários.
5.º Os autores e a ré, na pessoa do seu legal representante e no âmbito da atividade desta, celebraram um contrato de empreitada, cujo objeto era a construção da moradia referida em 3.º - conforme consta da cláusula 1.ª do referido contrato junto sob documento nº 2 com a petição inicial;
6.º Através deste contrato, a ré obrigou-se a executar os trabalhos constantes do mapa de acabamentos anexo ao mesmo e que dele faz parte integrante cfr. doc. nº 2.1) junto com a petição inicial que se dá por integralmente reproduzido.
7.º O valor acordado da empreitada foi de € 145.000,00, com iva já incluído (cláusula 2.ª do contrato – doc. 2).
8.º Autores e ré acordaram que seria da responsabilidade desta última a execução da referida obra segundo as boas práticas e de acordo com as normas e técnicas de boa execução e em cumprimento da legislação aplicável e que o prazo de execução da mesma seria um prazo razoável de 12 (doze) meses, ou seja: início dos trabalhos a 01 de agosto de 2020 e termo dos trabalhos a 30 de julho de 2021, (cfr. cláusula 4.ª do contrato – doc. 2).
9.º Os autores comprometeram-se a pagar o preço referido em 7.º em quatro tranches, de acordo ou conforme o avanço da obra, sendo que, na data da assinatura do contrato (07 de julho de 2020), os autores entregaram de imediato à ré, a título de princípio de pagamento da empreitada, a quantia de € 3.000,00 (três mil euros) de que foi dado o respetivo recibo de quitação.
10.º Resulta da 6.ª cláusula daquele contrato de empreitada que a ré se obrigou perante a autora a cumprir o contrato de empreitada aqui em apreço de acordo e “em conformidade com a sua proposta, o projeto, o caderno de encargos e plano de trabalhos e a legislação aplicável em vigor, … e ainda de acordo com as instruções que lhe venham a ser dadas pelo Primeiro Outorgante ou pela fiscalização, pela qual será responsável”.
11.º Mais se obrigou ré a executar todos os trabalhos e acabamentos do mapa de acabamentos (cfr. cláusula 8.ª do contrato) com exceção dos materiais identificados nas alíneas a) e b).
12.º Apesar do referido no facto 9.º, 1.ª parte, os autores procederam ao pagamento à ré, a título de preço da obra, da quantia global de € 124.000,00, em tranches, sendo este valor superior ao valor dos trabalhos até então realizados pela ré, no âmbito do acordo celebrado.
13.º A ré não concluiu a obra que acordou realizar no âmbito do acordo celebrado até à data de 30 de julho de 2021.
14.º  Em 30 de março de 2022 a obra realizada pela ré para os autores estava executada na percentagem de 53,3%.
15.º Da quantia de € 124.000,00 que os autores pagaram à ré, a quantia de € 109.000,00 já estava paga antes do final de julho de 2021.
16.º A última tranche dessa quantia de € 124.000,00 foi entregue pelos autores à ré em 10 de janeiro de 2022.
17.º Eliminado
18.º Eliminado
19.º Em 30/03/2022 alguns elementos de construção da obra encontravam-se incompletos e outros em falta: por exemplo: era notório que os elementos 5.0 referentes à cobertura já deviam estar completos (o que não acontecia), uma vez que se verifica a execução de elementos no interior da obra que, de acordo com as boas práticas de construção, só deveriam ser realizadas após a conclusão do referido elemento 5.0 (Cobertura).
20.º Os autores reclamaram junto da ré pelo atraso na realização da obra, considerando a quantia que até então já lhe haviam entregue a título de preço e que excedia o valor da obra já realizada, tendo o seu representante legal reconhecido que estava já ultrapassado o prazo fixado para a realização da obra e que a obra realizada era de percentagem inferior ao preço já referido, tendo os autores proposto à ré a realização de um aditamento ao acordo escrito inicialmente realizado, o que esta aceitou”.
21.º Os autores acordaram com a ré e foi lavrado um aditamento ao contrato de empreitada junto como documento n.º 2; que consta dos autos como doc. n.º 6 junto com a petição inicial e aqui se dá por integralmente reproduzido.
22.º Eliminado.
23.º Resulta do aditamento escrito realizado em 09 de março de 2022:
- no ponto 3. dos “considerandos”: “dos serviços constantes no mapa de acabamentos anexo ao contrato supra mencionado foram concluídos apenas os seguintes:
. Escavações para as fundações da moradia
. Alicerces e respetiva laje inferior
. Elevação das paredes exteriores e interiores;
. Laje superior
. Revestimento com ceral das paredes interiores
. Colocação do telhado, faltando acabar o isolamento do mesmo
. Pré instalação da canalização
. Pré instalação da tubagem para a eletricidade
. Colocação do capoto acordado nas paredes exteriores, faltando efetuar o revestimento e respetiva pintura
. Colocação de azulejo nas casas de banho, estando por concluir os respetivos acabamentos
. Colocação de pedras de granito nas bases das janelas e portas exteriores”.
- no ponto 4. dos mesmos “considerandos”: “estão por concluir, portanto, os restantes serviços que constam no mapa de acabamentos ao anexo supra mencionado”.
25.º Apesar de os autores terem dado mais uma oportunidade à ré para concluir a obra, esta não cumpriu, mais uma vez, o primeiro prazo por etapas estipulado no aditamento.
26.º Nem foi por si efetuado qualquer serviço ou trabalho na obra durante esse período e, até à data da instauração da ação, a ré não realizou qualquer trabalho como se obrigou a realizar.
27.º Eliminado
28.º Eliminado
29.º Eliminado.
30.º Pelos incumprimentos dos prazos por parte da ré, os autores comunicaram à ré, através de carta registada com A/R, em 25 de Março de 2022, a sua intenção de fazer cessar o contrato inicial de empreitada, considerando-o resolvido e, considerando-se desobrigados do pagamento da quantia ainda não entregue de € 21.000,00 (vinte e um mil euros).
31.º Simultaneamente, consideraram-se os autores no direito de exigir da ré a restituição, pelo menos, do valor pago em excesso comparativamente com o valor real de trabalhos efetuados, no montante de € 44.570,42 (quarenta e quatro mil, quinhentos e setenta euros e quarenta e dois cêntimos) e respetivos juros legais vencidos contados desde 25 de Março de 2022 (data da comunicação da resolução do contrato) até à  data da petição inicial, que ascendiam a € 356,56 (trezentos e cinquenta e seis euros e cinquenta e seis cêntimos), bem como os vincendos até integral e efetivo pagamento – nos termos do doc. 7 junto com a petição inicial que aqui se dá por integralmente reproduzido.
32.º Na expectativa de resolverem o litígio pela via extrajudicial, os aqui autores enviaram uma segunda comunicação à ré, em 18 de Abril de 2022 – nos termos do doc. 8 junto com a petição inicial que aqui se dá integralmente reproduzido.
33.º A ré ignorou o assunto.
34.º A ré, aquando da feitura e assinatura do aditamento ao contrato inicial, foi alertada pelos autores de que caso incumprisse mais uma vez, o seu comportamento culposo trazer-lhe-ia várias consequências – as quais se encontram taxativamente enumeradas na cláusula segunda (n.ºs 1. a 5. do referido aditamento junto à petição inicial sob doc. nº 6, que aqui se dá por integrado e reproduzido).
35.º E mesmo assim, a ré, continuou a ignorar tudo e todos, sabendo que o prazo para conclusão da empreitada assumia extrema relevância, tendo em vista as condições de financiamento acordadas entre os autores enquanto DONOS DA OBRA e a Instituição Bancária, Banco 1...;
36 º A inobservância do prazo de execução da obra por parte da ré levou a que os autores não tivessem conseguido cumprir com as condições de financiamento de crédito acordadas com a Instituição Bancária Banco 1....
37º Por essa razão, os autores tiveram de contrair novo empréstimo junto daquela Instituição Bancária em 03 de outubro de 2022 para poderem concluir a obra.
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3. Do Direito:

3.1. Da alegada impossibilidade de resolução do contrato:
Contesta a ré recorrente o direito dos autores de procederem à resolução do contrato celebrado, alegando que, por um lado, não estava ainda decorrido o prazo estabelecido para o cumprimento da obrigação e que, por outro lado, os autores não realizaram qualquer interpelação admonitória, sendo esta exigida para tornar válida a resolução, nos termos do art.º 808.º do Código Civil (doravante com a abreviatura C. Civil). Invoca ainda a violação do n.º2 do art.º 802.º, n.º2, do C. Civil, considerando que o incumprimento de um prazo de apenas quinze dias não permitiria a resolução do contrato celebrado, quando estava acordado que a conclusão da obra se faria em cinco meses.
As partes não discutem e não é juridicamente discutível que o acordo celebrado entre as partes se reconduz ao contrato de empreitada, sendo a este regime e às disposições gerais aplicáveis em matéria de contratos que teremos de recorrer para apreciar as questões suscitadas.
Não tem a ré recorrente qualquer razão.
Em matéria contratual vigora o princípio da liberdade contratual e, assim, os termos em que pode ser realizada a resolução do contrato tem umas de duas fontes: a lei ou o contrato.
Ora, as normas que a ré invoca para considerar impossível a resolução (e que se reconduziriam à inexistência dos seus pressupostos e, assim, não à sua impossibilidade mas à afirmação de uma resolução inválida) são as aplicáveis quando se pretende transformar uma situação de mora do devedor em incumprimento definitivo.
Não é essa a situação dos autos.
O que aqui está em causa é o acordo que as partes celebraram, e que lhes era lícito celebrar, a que se reporta o facto 21.º da matéria de facto provada e que considerou reproduzido o aditamento que as partes fizeram ao acordo inicial e que está junto aos autos como documento 6 junto com a petição inicial.

Pelas razões que, então, expressamente declararam nos “considerandos” desse acordo, datado de 09 de março de 2022, as partes acordaram em estabelecer novos prazos para a execução global da obra e por etapas, estabelecendo que:
Cláusula 1.ª
1. A execução total da empreitada deverá estar concluída impreterivelmente até 5 meses (inclui sábados, domingos e feriados), contados desde a data da assinatura do presente aditamento.
2. Uma vez que o principal motivo da celebração do presente aditamento doi o incumprimento do prazo de execução da empreitada no contrato inicial por parte do empreiteiro irão ser definidos no presente documento prazos por etapas assim descriminados:
- isolamento e impermeabilização dos alicerces da moradia e drenagem à volta da mesma até 15 dias (inclui sábados, domingos e feriados, contados desde a data da assinatura do presente aditamento”,
(estabelecendo-se de seguida mais nove etapas, com prazos específicos e sequenciais.
“3. O prazo para a conclusão da empreitada assume extrema relevância, tendo em vista as condições de financiamento acordadas entre o dono da obra e uma entidade bancária, e também pelo facto de o dono da obra ter acordado e feito vários aditamentos do seu atual apartamento onde mora neste momento, sendo que o incumprimento dos prazos de execução da empreitada está a originar avultados prejuízos para o dono da obra.
4. No caso de incumprimento de quaisquer dos prazos ínsitos na presente cláusula, por motivo aplicável ao empreiteiro serão aplicadas sanções conforme cláusula seguinte.
Cláusula Segunda:
1. Caso se verifique o incumprimento de qualquer dos prazos ínsitos na cláusula anterior do presente aditamento, o dono de obra reserva-se o direito de rescindir unilateralmente o contrato inicial de empreitada supra mencionado e contratar com uma outra empresa a execução dos trabalhos
(…)”.
O sentido do acordo celebrado entre as partes é inequívoco.
Cada um dos dez prazos estabelecidos, um por cada etapa definida, eram perentórios e a não execução dos trabalhos permitiria, sem mais interpelações, que se considerasse incumprido o contrato e a sua resolução pelos autores (que, no acordo, está apelidada de “rescisão”), enquanto donos de obra.
Está provado que tal acordo foi assinado em 09 de março de 2022 e que, nos quinze dias seguintes, nenhum trabalho foi realizado na obra.
Presumindo-se a culpa da ré na não execução da obra no prazo indicado – nos termos do art.º 799.º do C. Civil – e decorridos que estavam os quinze dias estabelecidos como prazo para a realização da primeira das dez etapas para a conclusão da obra, podiam os autores resolver o acordo celebrado, como fizeram, por carta registada com aviso de receção datada de 25 de março de 2022.
De notar que, tendo as partes estabelecido que a inobservância de qualquer desses prazos permitia a resolução do contrato, é claro que ambas consideravam cada um dos dez prazos estabelecidos como essenciais e não vemos como possa entender-se que qualquer deles tem a escassa importância a que se reporta o n.º 2 do art.º 802.º do C. Civil sendo, por isso, inaplicável este normativo.
Ainda que assim se não entendesse, no contexto dos autos e em face do acordo inicial celebrado, tendo em consideração o que consta do próprio aditamento de 09 de março de 2022, sempre entenderíamos que a situação de mora em que se encontrava a ré perante os termos e prazos definidos no acordo inicial, e que está espelhada na matéria de facto provada, a celebração daquele aditamento consubstancia uma clara interpelação admonitória realizada pelos autores à ré, ficando claro para qualquer contraente empreiteiro que o não cumprimento de qualquer um dos dez prazos estabelecidos transformaria a sua mora em incumprimento definitivo, nos termos do art.º 808.º, n.º1, do C. Civil. 
Sempre seria, por isso, válida a resolução do contrato que foi efetuada pelos autores, improcedendo este fundamento da apelação (conclusões 1.ª a 11.ª).

3.2. Do reflexo da alteração da matéria de facto na fundamentação jurídica da decisão:
Cumpre, por último, verificar se, alterada que foi a matéria de facto provada, tal implicará uma alteração da decisão proferida, considerando essencialmente a eliminação dos pontos 17 e 18 da matéria de facto provada.
Começa por notar-se que a ré recorrente apenas formula duas conclusões quanto à fundamentação de direito e que não constam do ponto 3.1. desta decisão (e nenhuma outra consta do corpo das suas alegações).
Estão em causa as conclusões 40.ª e 41.ª, alegando a ré que a autora não cumpriu as regras do ónus da prova que sobre si recaíam.

Não lhe assiste razão.
Os autores alegaram e provaram que a ré não executou a totalidade da obra no prazo inicialmente acordado e que não executou a obra que estava acordado que realizasse no prazo de quinze dias depois de assinado o aditamento ao acordo inicial.
Demonstraram que, nos termos deste último aditamento, acordaram que tal lhes permitia fazer cessar imediatamente o acordo celebrado, tendo comunicado tal cessação à ré por carta registada com aviso de receção.
Demonstraram, por último, que, na data em que cessou o acordo, encontrava-se já paga a quantia de € 124.000,00 do preço total de € 145.000,00, estando a execução da obra em 53,3% da que deveria ter sido realizada pela ré.
Tal significa que estava pago preço, em excesso, no valor de € 46.715,00.
Mesmo que tal não resultasse já da lei (efeito retroativo da resolução que resulta do disposto no art.º 434.º do C. Civil), as partes expressamente acordaram no aditamento realizado que a cessação do acordo por facto imputável à ré permitiria aos autores exigir o valor que tivessem pago em excesso.
Presume-se a culpa da ré na não observância dos prazos acordados, nos termos do art.º 799.º do C. Civil
Ora, estando apenas realizada a percentagem de 53,3% da obra, o valor que os autores pagaram em excesso foi de € 46.715,00.
A circunstância de os autores apenas exigirem a restituição de € 44.570,42, com base em cálculos efetuados pelo autor que este Tribunal não considerou credíveis, implica apenas que a ré seja condenada a restituir tal menor quantia (porque foi esta a peticionada) e não que esta não seja devida.
Não existe assim fundamento para alterar a condenação da ré na obrigação de restituir aos autores a quantia de € 44.570,42.
Quanto ao mais decidido (a condenação da ré no pagamento da quantia de € 1.213,20 e os juros de mora), nenhum fundamento concreto invocou a ré para colocar em causa o que foi decidido em 1.ª Instância, mantendo-se a matéria de facto que resultava já provada em 1.ª Instância e não havendo assim qualquer questão de direito suscitada que cumpra apreciar.
Terá, pois, de manter-se a decisão proferida, sendo a apelação improcedente (conclusões 40.ª e 41.ª).
A ré é responsável pelas custas desta apelação, nos termos do art.º 527.º do C. P. Civil.
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VI – Decisão:

Perante o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação apresentada pela ré, confirmando-se a decisão recorrida.
A ré é responsável pelas custas do recurso, nos termos do art.º 527.º do C. P. Civil.
Guimarães, 18 de junho de 2025

Relator: Paula Ribas
1.ª Adjunta: Conceição Sampaio
2.ª Adjunta: Maria Amália Santos
(elaborado, revisto e assinado eletronicamente)