SANTA CASA DA MISERICÓRDIA
ACÇÃO LABORAL
ISENÇÃO DE CUSTAS
Sumário

A Santa Casa da Misericórdia do Barreiro beneficia da isenção de custas contemplada na alínea f) do n.º 1 do artigo 4.º do RCP, ainda que esteja a exercer uma competência necessária à prossecução da sua actividade e seus fins apenas de forma instrumental, ou mediata, tal como sucede quando a mesma, no âmbito de uma acção com processo comum laboral, se está a defender de pretensão contra si deduzida por trabalhador(a) que para si laborava na vertente de acção social, na valência de apoio à população idosa.

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa

AA intentou 1acção Impugnação Judicial Regularidade e Licitude do Despedimento contra Santa Casa da Misericórdia do Barreiro.
Apresentou formulário.
Realizou-se audiência de partes.
A Irmandade da Santa Casa da Misericórdia do Barreiro, notificada para o efeito, veio nos termos previstos pelos artigos 98°-I e 98°-J do CPT, apresentar articulado para motivar o despedimento individual por facto imputável à trabalhadora.2
Sustentou que a acção deve ser julgada improcedente, por não provada, e, consequentemente, a Empregadora Irmandade da Santa Casa da Misericórdia do Barreiro deve ser absolvida de todos os pedidos formulados na causa.
Referiu que:
«165. Por último, diga-se ainda que a Empregadora goza de isenção subjectiva do pagamento de taxas de justiça e encargos processuais, nos termos do disposto pelo art.° 4° n.° 1 al. f) do Regulamento das Custas Judiciais, uma vez que actua exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições — doc. n.° 3.».
No doc. n.° 3 emitido pela Segurança Social e comprovativo do seu registo como IPSS, pode ler-se o seguinte:
«Declaramos que a instituição acima identificada encontra-se registada, a titulo definitivo, na Direção-Geral da Segurança Social, desde 26/02/1987. no Livro n.° 2 das Irmandades da Misericórdia, sob o n 09187, nas folhas 58 verso, em conformidade com o Regulamento de Registo das Instituições Particulares de Solidariedade Social.
As atividades desenvolvidas no âmbito das Respostas Sociais objeto de acordos de cooperação em vigor e ativos, celebrados com o ISS, IP/ Centro Distrital de Setúbal são:
· Creche, desde 07/10/2010;
· Centro de Acolhimento Temporário. desde 12/12)2007;
· Serviço de Apoio Domiciliário, desde 29111/2001,
· Estrutura Residencial para Pessoas Idosas (3), desde 29/09/1997. 29/11/2001 e 29/12/2014;
· Comunidade de Inserção (2). desde 14/12/2007».
Em 20 de Novembro de 2024, foi proferido o seguinte despacho:3
«Veio a Ré requerer que seja verificada a isenção de custas alegando, em síntese, ser uma pessoa coletiva de utilidade pública, atuando exclusivamente no âmbito das suas principais atribuições.
Nos termos do disposto no art. 4.' n.' 1 alínea f) do Regulamento das Custas Processuais:
"1 - Estão isentos de custas: (...)
f) As pessoas colectivas privadas sem fins lucrativos, quando actuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável;"
Decorre da leitura de tal normativo que constituem pressupostos legais da aplicação da isenção de custas nele previstos:
a) Que estejamos na presença de uma pessoa coletiva privada, sem fins lucrativos.
b) Que essa pessoa coletiva privada atue no processo exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou;
c) Para defender os interesses que lhes estão especialmente conferidos pelo respetivo estatuto ou nos termos da legislação que lhes seja aplicável.
Considerando que as pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos nem sempre prosseguem, indireta e instrumentalmente, as atribuições e interesses que lhes cabe, importa aferir se, com vista a operar ou não a referida isenção, o assunto em discussão na ação tem por objeto relações jurídicas estabelecidas pela pessoa coletiva com terceiros com vista à prossecução das atribuições (isto é, fins) especiais que lhe estão cometidos pelos respetivos estatutos, por serem uma seu atuar na concretização desses fins e/ou interesses, quer por traduzirem a concretização desses fins e/ou interesses, quer por serem necessárias à concretização dos mesmos. (neste sentido cfr. por todos Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 27.04.2022 in www.dgsi.pt).
A causa de pedir no âmbito dos presentes autos é a existência de uma relação jurídica laboral entre Autora e Ré, tendo a Ré procedido ao despedimento imputável ao trabalhador com fundamento em justa causa.
Desta análise constata-se que o thema decidendum no âmbito dos presentes autos não está relacionado com as especiais atribuições da Ré: está, sim, ligado com a sua atividade privatística na celebração de um negócio jurídico laboral.
Em face do exposto, por não se verificarem os requisitos de que a lei faz depender para o efeito, não se verifica a isenção de custas da Ré.
*Notifique a Ré para em 10 dias proceder ao pagamento da taxa de justiça devida pelo impulso processual.» - fim de transcrição.
A Ré foi notificada desse despacho com a referência 439859541, sendo que, em 5 de Dezembro de 2024, apresentou recurso.4
Concluiu que:
«1. Vem o presente recurso de apelação interposto do despacho de 20.11.2024, com a referência 439859541, que determinou que a Recorrente, no prazo de 10 dias, procedesse ao pagamento da taxa de justiça devida pelo impulso processual, por o Tribunal a quo entender que a mesma não beneficia da isenção de custas prevista no art.° 4', n.° 1, al. f) do Regulamento das Custas Processuais.
2. A questão trazida à apreciação deste Tribunal da Relação é assim a de saber se a Recorrente/Ré que é uma IPSS (vide doc. n.° 3 junto à motivação do despedimento, emitido pela Segurança Social e comprovativo do seu registo como IPSS) está ou não isenta de custas na acção de impugnação de despedimento instaurada por uma trabalhadora que exercia funções numa das respostas sociais da Ré, mais precisamente no Lar Nossa Senhora do Rosário.
3. Nos termos previstos no art.° 40 dos Estatutos da Ré refere-se que "Embora o seu campo de ação possa transcender as limas da chamada Segurança Social, os fins que, de modo principal prosseguirá, serão, efetivamente, o apoio à família, à comunidade carenciada, a proteção à infanda e à velhice, através da criação e manutenção de serviços de saúde, lares, centros de dia, creches, jardins-de-infância e serviços Domiciliários".
4. Tudo isto resulta, aliás, da própria definição e fins das IPSS previstos nos arts. 1° e 2° do Estatuto das Instituições Particulares de Solidariedade Social — D.L. n.° 119/83 de 25 de Fevereiro, republicado pelo D.L. n.° 172-A/2014 de 14 de Novembro.
5. De modo a prosseguir todos os fins a que está adstrita, nomeadamente o da protecção na velhice, a Ré dispõe de diversas respostas sociais, sendo certo que, para a organização e funcionamento das mesmas, é necessária a contratação de recursos humanos, designadamente, através da celebração de contratos de trabalho.
6. Uma dessas respostas sociais é o Lar Nossa Senhora do Rosário, Estrutura Residencial para Pessoas Idosas (ERPI), com 78 utentes, na sua maioria idosos, com diferentes níveis de dependência e graus de complexidade, onde são assegurados os cuidados de alojamento (temporário ou permanente), alimentação, higiene pessoal, apoio no desempenho das atividades da vida diária, cuidados de enfermagem e assistência médica.
7. A A. foi admitida ao serviço da Ré em 30 de dezembro de 2015, para, sob a sua autoridade e direção, exercer as funções inerentes à categoria profissional de ajudante de lar, sendo que prestava a sua atividade profissional no Lar de Nossa Senhora do Rosário.
8. No âmbito das funções inerentes àquela categoria profissional incluem-se, entre outras, as de proceder ao acompanhamento diurno e ou noturno dos utentes, dentro e fora dos serviços e estabelecimentos; colaborar nas tarefas de alimentação do utente; participar na ocupação dos tempos livres; prestar cuidados de higiene e conforto aos utentes; procederá arrumação e distribuição das roupas lavadas e à recolha de roupas sujas e sua entrega na lavandaria, conforme CCT em vigor.
9. Nos presentes autos, a A. impugna a regularidade e licitude do despedimento de que foi alvo por parte da Ré e tal despedimento ocorreu na sequência de um processo disciplinar instaurado pela Empregadora, ora Ré, contra a ora A.
10. Em tal processo disciplinar concluiu-se que:
- No dia 21 de outubro de 2023, ao fazer a higiene a um utente idoso e entregue aos cuidados da Ré, a A. ignorou a zona de pressão na região sagrada do utente e não chamou nenhum profissional de saúde para que indicasse qual o procedimento a seguir com aquele utente;
- A A. também não referenciou a zona de pressão no livro de ocorrências, nem no livro de registo de feridas, contrariando assim regras e procedimentos instituídos na sua Empregadora, desrespeitando ordens diretas dos seus superiores hierárquicos e contribuindo para que a situação do utente se agudizasse, colocando em risco a vida do mesmo;
- Devido ao facto da zona de pressão não ter sido sinalizada, nem observada por um profissional de saúde, o utente não recebeu o tratamento adequado;
- Consequentemente, a zona de pressão continuou a agravar, levando ao aparecimento de uma ferida na zona sagrada do utente;
- Assim, o que começou com uma zona de pressão acabou por evoluir para uma úlcera de pressão com deterioração de tecido;
- Uma úlcera de pressão não aparece de um momento para o outro, havendo um estágio de evolução: começa com um rubor, a zona deixa de ter vascularização e, finalmente, há perda de integridade cutânea.
A partir daí, evolui como uma ferida normal, com riscos sérios para a saúde e vida do utente, uma vez que pode dar origem a uma septicémia caso não seja controlada;
- Só no dia 24 de outubro de 2023, é que a úlcera de pressão do utente foi sinalizada por uma outra ajudante de lar e a enfermeira BB concluiu que, pelas suas características, a ferida tinha uma evolução de, pelo menos, 5 dias, pois já existia deterioração de tecido.
- Tudo isso poderia ter sido evitado, caso o utente tivesse recebido o tratamento adequado assim que apareceu a zona de pressão que a A. não sinalizou.
11. No Lar Nossa Senhora do Rosário, a Ré prossegue especificamente um dos fins supra referidos: a protecção à velhice.
12. Recai assim sobre a Ré uni especial cuidado e, por outro lado, o dever de assegurar que os utentes que acolhe têm ao seu dispor um grupo de profissionais que, de forma profissional, zelosa e diligente, cumprem as suas funções, tendo sempre em conta o bem-estar e o superior interesse dos utentes, tratando-os com dignidade, cuidando das limitações físicas e zelando pelo bem-estar, saúde e integridade física dos utentes que se encontram em situação de dependência e fragilidade e que, de outro modo, não estariam entregues aos cuidados da Ré.
13. O comportamento da Trabalhadora Arguida colocou em crise as atribuições e fins da Ré, sua Empregadora, nomeadamente o fim de proteção da velhice e pés em causa a qualidade dos serviços prestados pela Ré.
14. Nos presentes autos, incumbe à Ré provar a licitude do despedimento da A., despedimento esse que fez cessar a relação laboral que, por sua vez, se iniciou pela necessidade de contratação da A. como ajudante de Lar.
15. Deste modo, ainda que se entenda que o faz de unia forma indirecta, a Ré actua na defesa dos interesses que lhe estão especialmente conferidos e com vista a garantir a prossecução dos seus fins, nomeadamente o de protecção da velhice.
16. Sem o recurso a pessoal e a vínculos contratuais adequados, mormente laborais, não é possível prosseguir os fins da pessoa colectiva.
17.Veja-se, nesse sentido, o entendimento dos tribunais superiores em situações análogas à dos presentes autos, nomeadamente o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 17/03/2022 (Processo n.° 4861/21.1T8GMR.G1), relatado pela Sr.' Juiz Desembargadora Maria Leonor Chaves dos Santos Barroso, o acórdão da Relação de Guimarães de 19-05-2022 (processo n.° 4943/21.0T8GMR-A.G1) relatado pela Sra. Desembargadora Vera Sottomayor e o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 04/12/2019 (processo 1642/18.3T8CSC-A.L1-4), relatado pelo senhor Juiz Desembargador José Eduardo Sapateiro.
18.Ensina Salvador da Costa in As custas Processuais, 7a ed., p. 104, 108 que "A isenção subjectiva, ligada à qualidade da parte litigante, é motivada pela tutela do interesse público prosseguido por estas entidades. Visa-se estimular entidades que, sem fins lucrativos, contribuam para o bem comum, justificando-se que o Estado facilite o exercício das suas tardas".
19. O vinculo laboral em causa era necessário ao prosseguimento da actividade da Ré e, ainda que por uma via indirecta ou instrumental, o recurso à acção judicial para dirimir conflito dele emergente relaciona-se com as atribuições ou defesa dos interesses da Ré.
20. É esta a interpretação que melhor serve o fim último da norma em causa: "o estímulo e a facilitação das entidades privadas sem fins lucrativas que desenvolvam actividade que contribuem para o bem da comunidade. Se a entidade tem de dirimir um litígio respeitante a relação jurídica essencial à sua actividade que beneficia a comunidade, justifica-se que seja o Estado a suportar o custo".
21. Estamos perante uma ré Empregadora com cerca de 300 trabalhadores e, tendo em conta os fins por ela prosseguidos, tem esta Ré o dever acrescido de agir disciplinarmente quando os seus fins, nomeadamente o de apoio à velhice, são postos em causa por trabalhadores, como sucedeu in casu.
22. Nos últimos anos, penderam no Tribunal a quo algumas acções judiciais em que é impugnado o despedimento de um trabalhador por parte da Ré, sem que alguma vez tivesse sido posta em causa a isenção de custas da Ré.
23.0 processo disciplinar instaurado à ora A. teve por base uma participação disciplinar que deu lugar a vários processos disciplinares, sendo que, em quatro desses processos disciplinares, incluindo o que foi colocado em crise nos presentes autos, foi proferida a decisão de despedimento.
24. Consequentemente, pendiam no Tribunal a quo, quatro acções judiciais de Impugnação Judicial da Regularidade e Licitude do Despedimento propostas por quatro trabalhadoras contra esta mesma Ré.
25. Todos estes processos tiveram por base a mesma situação de facto: a descoberta, num utente, de uma úlcera de pressão, com deterioração de tecido, que não foi sinalizada pelas trabalhadoras, as quais são as A.A. nas referidas acções.
26. Ora, em dois destes processos foi atendida a isenção subjectiva da Ré.
27. Por todo o exposto e até por uma questão de coerência dentro do mesmo Tribunal, andou mal o Tribunal a quo ao não concluir pela verificação do cumprimento dos requisitos inscritos na parte final do artigo 4.°, n.° 1, al. f) do RCP, devendo, por conseguinte, a decisão ser substituída por outra que reconheça a isenção de custas à ora Recorrente.
Termos em que deve ser julgado procedente o presente recurso e, em conformidade, ser revogado o despacho de 20.11.2024, com a referência 439859541, substituindo-o por outro que reconheça a isenção de custas da ora Recorrente, nos termos do artigo 4.", n." 1, al. f) do RCP.» - fim de transcrição.
Não foram apresentadas contra alegações.
Em 7 de Janeiro de 2025, foi proferido o seguinte despacho:5
«Requerimento de interposição de recurso:
Veio a Ré interpor recurso da decisão que indeferiu o pedido de isenção de custas e determinou que a Ré procedesse ao pagamento da taxa de justiça pela apresentação do articulado motivador do despedimento.
Não foram apresentadas contra alegações.
Cumpre apreciar e decidir.
Nos termos do disposto no art. 79.º a) do Código de Processo do Trabalho, a decisão é recorrível.
Relativamente à oportunidade do requerimento apresentado, cumpre analisar o que resulta do art. 79.º-A do Código de Processo do Trabalho.
Nos termos de tal preceito:
1 - Cabe recurso de apelação:
a) Da decisão, proferida em 1.ª instância, que ponha termo à causa ou a procedimento cautelar ou incidente processado autonomamente;
b) Do despacho saneador que, sem pôr termo ao processo, decida do mérito da causa ou absolva da instância o réu ou algum dos réus quanto a algum ou a alguns dos pedidos.
2 - Cabe ainda recurso de apelação das seguintes decisões do tribunal de 1.ª instância:
a) Da decisão que aprecie o impedimento do juiz;
b) Da decisão que aprecie a competência absoluta do tribunal;
c) Da decisão que ordene a suspensão da instância;
d) Do despacho de admissão ou rejeição de algum articulado ou meio de prova;
e) Da decisão que condene em multa ou comine outra sanção processual;
f) Da decisão que ordene o cancelamento de qualquer registo;
g) Da decisão prevista na alínea a) do n.' 3 do artigo 98.'-J;
h) Do despacho que, nos termos do n.' 2 do artigo 115.', recuse a homologação do acordo;
i) Da decisão prevista na alínea a) do n.' 5 do artigo 156.';
j) De decisão proferida depois da decisão final;
k) Da decisão cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil;
l) Nos demais casos especialmente previstos na lei.
3 - As restantes decisões proferidas pelo tribunal de 1.ª instância podem ser impugnadas no recurso que venha a ser interposto das decisões previstas no n.º 1.
4 - No caso previsto no número anterior, o tribunal só dá provimento às decisões impugnadas conjuntamente com a decisão final quando a infração cometida possa modificar essa decisão ou quando, independentemente desta, o provimento tenha interesse para o recorrente.
5 - Se não houver recurso da decisão final, as decisões interlocutórias que tenham interesse para o apelante independentemente daquela decisão podem ser impugnadas num recurso único, a interpor após o trânsito da referida decisão.
Atento o fundamento apresentado pela Ré para atribuição do efeito suspensivo ao recurso, há que analisar o disposto na alínea k) do supra referido preceito.
Uma decisão que seja absolutamente inútil é aquela que mantém o efeito do despacho, sem haver possibilidade de reverter, mesmo com o recurso, o ato do qual se recorre.
A situação paradigmática é a do recurso de decisão que determine a suspensão dos autos ou do despacho que determine a prossecução dos autos).
Relativamente à situação em apreço, no caso de procedência do recurso, os autos poderão sempre voltar à situação processual em que encontravam, para alteração do despacho proferido e prosseguimento da ação em conformidade.
A circunstância de o no processo serem produzidos atos que, em caso de revogação do despacho proferido, foram praticados não impede a sua ulterior alteração.
Aqui chegados, constata-se que o despacho recorrido não se insere em qualquer das alíneas supra referidas (diferente situação é aquela que rejeita um articulado ou meio de prova, caso em que o recurso a interpor de tal despacho é de apelação).
Aqui chegados, e não se tratando de um recurso de apelação mas sim recurso de uma decisão interlocutória, as normas constam dos números 3 e 4 do Código de Processo do Trabalho, a saber:
- Havendo recurso da decisão final, poderá ser interposto recurso das decisões interlocutórias quando do recurso a interpor;
- Não havendo recurso da decisão final, poderá ser interposto recurso das decisões interlocutórias após o trânsito em julgado da decisão final.
Constata-se assim que o recurso é intempestivo.
Por tudo o exposto, ao abrigo do disposto no art. 82.º n.º 1 do Código de Processo do Trabalho, o tribunal indefere o requerimento apresentado.
Notifique.
*
Notifique a Ré nos termos do disposto no art. 570º n.º 3 do Código de Processo Civil » - fim de transcrição.
Tal despacho foi notificado à Ré, com a referência 441517347, ordenando-se , igualmente , a sua notificação nos termos do disposto pelo artigo 570.°, n.° 3 do CPC, para efetuar o pagamento da taxa de justiça devida acrescida de uma multa.
Em 29 de Janeiro de 2025, por não se conformar com o ali decidido a Ré , por mera cautela de patrocínio, veio apresentar novo recurso caso o Tribunal “a quo “não mandasse subir o recurso já apresentado e que agora , a seu ver , já era tempestivo[ vide fls. 1 a 15 v].
Nesse recurso concluiu nos seguintes termos:
«1. Vem o presente recurso de apelação interposto do despacho de 07.01.2025, com a referência 441517347, na parte em que a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo determinou que a Recorrente fosse notificada nos termos do disposto pelo artº. 570º, n.º 3 do CPC para efectuar o pagamento da taxa de justiça devida acrescida de uma multa.
2. Vem ainda o presente recurso de apelação interposto também do despacho de 20.11.2024, com a referência 439859541, o qual determinou que a Recorrente,
no prazo de 10 dias, procedesse ao pagamento da taxa de justiça devida pelo impulso processual, por o Tribunal a quo entender que a mesma não beneficia da isenção de custas prevista no art.º 4º, n.º 1, al. f) do Regulamento das Custas Processuais.
A Ré recorreu de imediato de tal despacho em 5.12.2024, mas este foi considerado intempestivo pelo Tribunal a quo, por entender aquele despacho como uma decisão interlocutória. Nessa medida e porque, no entendimento do Tribunal, tal despacho só poderia ser posto em causa num recurso final, vem, desde já e por mera cautela de patrocínio, apresentar também o respectivo recurso de tal despacho, caso o Tribunal a quo não mande subir aquele recurso anteriormente apresentado, o qual será agora tempestivo, conforme solicitado aliás, no requerimento de transacção apresentado pelas partes nos presentes autos e sem prejuízo da mesma.
3. Em 5 de Dezembro de 2024, a ora recorrente Irmandade da Santa Casa da Misericórdia do Barreiro apresentou recurso de apelação, do despacho de 20.11.2024, com a referência 439859541, para este Tribunal ad quem, em virtude
do Tribunal a quo ter determinado que a Recorrente, no prazo de 10 dias, procedesse ao pagamento da taxa de justiça devida pelo impulso processual, por entender que a mesma não beneficiava da isenção de custas prevista no art.º 4º, n.º
1, al. f) do Regulamento das Custas Processuais.
4. No recurso de imediato apresentado, a recorrente pediu que fosse fixado o efeito suspensivo, com subida imediata e nos próprios autos, sob pena do mesmo se revelar inútil, atentas as penosas consequências previstas no artigo 570º do CPC
aplicável ex vi art.º 1, n.º 2, alínea a) do CPT (podendo culminar no desentranhamento da motivação), bem como nas também penosas consequências previstas no art. 14º, n.ºs 2, 3 e 4 do Regulamento das Custas Processuais (podendo o tribunal determinar a impossibilidade de realização das diligências de prova que tenham sido ou venham a ser requeridas pela Ré).
5. Sucede que o Tribunal a quo, por despacho de que agora se recorre em parte, entendeu que aquele recurso era intempestivo, indeferiu o requerimento de recurso e determinou a notificação da ora recorrente nos termos do disposto pelo
artº. 570º, n.º 3 do CPC, ou seja, para esta efectuar o pagamento da taxa de justiça devida acrescida de uma multa.
6. Não pode a Ré conformar-se com tais despachos, uma vez que é convicção da mesma que beneficia da isenção subjectiva de custas prevista no art.º 4º, n.º 1, al. f) do Regulamento das Custas Processuais, pelo que a taxa de justiça inicial não
será devida e, consequentemente, nenhuma multa poderá ser-lhe aplicada.
7. Nos termos previstos no art.º 4º dos Estatutos da Ré refere-se que “Embora o seu campo de ação possa transcender as áreas da chamada Segurança Social, os fins que, de modo
principal prosseguirá, serão, efetivamente, o apoio à família, à comunidade carenciada, a proteção à infância e à velhice, através da criação e manutenção de serviços de saúde, lares, centros de dia, creches, jardins-de-infância e serviços Domiciliários”.
8. Tudo isto resulta, aliás, da própria definição e fins das IPSS previstos nos arts. 1º e 2º do Estatuto das Instituições Particulares de Solidariedade Social – D.L. n.º
119/83 de 25 de Fevereiro, republicado pelo D.L. n.º 172-A/2014 de 14 de Novembro, resultando ainda do documento que enumerou como doc. n.º 3 emitido pela Segurança Social e comprovativo do seu registo como IPSS, documento autêntico nos termos do art.º 371º do Código Civil.
9. De modo a prosseguir todos os fins a que está adstrita, nomeadamente o da protecção na velhice, a Ré dispõe de diversas respostas sociais, sendo certo que, para a organização e funcionamento das mesmas, é necessária a contratação de recursos humanos, designadamente, através da celebração de contratos de trabalho.
10. Uma dessas respostas sociais é o Lar Nossa Senhora do Rosário, Estrutura Residencial para Pessoas Idosas (ERPI), com 78 utentes, na sua maioria idosos, com diferentes níveis de dependência e graus de complexidade, onde são
assegurados os cuidados de alojamento (temporário ou permanente), alimentação, higiene pessoal, apoio no desempenho das atividades da vida diária, cuidados de
enfermagem e assistência médica.
11. Para atingir os seus fins de protecção da velhice, entre outros, a Ré teve necessidade de contratar recursos humanos, designadamente, através da celebração de contratos de trabalho.
12. A A. foi admitida ao serviço da Ré em 30 de dezembro de 2015, para, sob a sua autoridade e direção, exercer as funções inerentes à categoria profissional deajudante de lar, sendo que prestava a sua atividade profissional no Lar de Nossa
Senhora do Rosário.
13. No âmbito das funções inerentes àquela categoria profissional incluem-se, entre outras, as de proceder ao acompanhamento diurno e ou noturno dos utentes,
dentro e fora dos serviços e estabelecimentos; colaborar nas tarefas de alimentação do utente; participar na ocupação dos tempos livres; prestar cuidados de higiene e conforto aos utentes; proceder à arrumação e distribuição das roupas lavadas e à recolha de roupas sujas e sua entrega na lavandaria, conforme descrição da categoria no CCT aplicável, publicado no BTE n.º 14, de 15 de abril de 2023.
14. Nos presentes autos, a A. impugna a regularidade e licitude do despedimento de que foi alvo por parte da Ré r e tal despedimento ocorreu na sequência de um processo disciplinar instaurado pela Empregadora, ora Ré, contra a ora A
15. Em tal processo disciplinar concluiu-se que:
- No dia 21 de outubro de 2023, ao fazer a higiene a um utente idoso e entregue aos cuidados da Ré, a A. ignorou a zona de pressão na região sagrada do utente e não chamou nenhum profissional de saúde para que indicasse qual o procedimento
a seguir com aquele utente;
- A A. também não referenciou a zona de pressão no livro de ocorrências, nem no livro de registo de feridas, contrariando assim regras e procedimentos instituídos na sua Empregadora, desrespeitando ordens diretas dos seus superiores
hierárquicos e contribuindo para que a situação do utente se agudizasse, colocando em risco a vida do mesmo;
- Devido ao facto da zona de pressão não ter sido sinalizada, nem observada por um profissional de saúde, o utente não recebeu o tratamento adequado;
- Consequentemente, a zona de pressão continuou a agravar, levando ao aparecimento de uma ferida na zona sagrada do utente;
- Assim, o que começou com uma zona de pressão acabou por evoluir para uma úlcera de pressão com deterioração de tecido;
- Uma úlcera de pressão não aparece de um momento para o outro, havendo um estágio de evolução: começa com um rubor, a zona deixa de ter vascularização e, finalmente, há perda de integridade cutânea.
A partir daí, evolui como uma ferida normal, com riscos sérios para a saúde e vida do utente, uma vez que pode dar
origem a uma septicémia caso não seja controlada;
- Só no dia 24 de outubro de 2023, é que a úlcera de pressão do utente foi sinalizada por uma outra ajudante de lar e a enfermeira BB concluiu que, pelas suas características, a ferida tinha uma evolução de, pelo menos, 5 dias, pois já existia deterioração de tecido.
- Tudo isso poderia ter sido evitado, caso o utente tivesse recebido o tratamento adequado assim que apareceu a zona de pressão que a A. não sinalizou
16. No Lar Nossa Senhora do Rosário, com acordo de cooperação com a Segurança Social, a Ré prossegue um dos fins supra referidos: a protecção à velhice.
17. Recai assim sobre a Ré um especial cuidado e, por outro lado, o dever de assegurar que os utentes que acolhe têm ao seu dispor um grupo de profissionais que, de forma profissional, zelosa e diligente, cumprem as suas funções, tendo sempre em conta o bem-estar e o superior interesse dos utentes, tratando-os com dignidade, cuidando das limitações físicas e zelando pelo bem-estar, saúde e integridade física
dos utentes que se encontram em situação de dependência e fragilidade e que, de outro modo, não estariam entregues aos cuidados da Ré.
18. O comportamento da Trabalhadora Arguida colocou em crise as próprias atribuições e fins da Ré, sua Empregadora, e pôs em causa a qualidade dos serviços prestados pela Ré.
19. Nos presentes autos, incumbe à Ré provar a licitude do despedimento que fez cessar a relação laboral com a A., relação essa que se iniciou pela necessidade de
contratação da A. como ajudante de lar.
20. A Ré actua assim na defesa dos interesses que lhe estão especialmente conferidos e com vista a garantir a prossecução dos seus fins, fins esses que constituem a sua
razão de ser, nomeadamente o de protecção da velhice.
21. Sem o recurso a pessoal e a vínculos contratuais adequados, mormente laborais, não é possível à Ré prosseguir aqueles fins.
22. Andou, por isso, com o devido respeito que é muito, mal o Tribunal a quo, no despacho de 20.11.2024, com a referência 439859541, ao não considerar a Ré isenta do pagamento de custas, nos termos do disposto no art. 4.º n.º 1 alínea f) do
Regulamento das Custas Processuais.
23. Veja-se o entendimento dos tribunais superiores em situações análogas à dos presentes autos, nomeadamente o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 17/03/2022 (Processo n.º 4861/21.1T8GMR.G1), relatado pela
Sr.ª Juiz Desembargadora Maria Leonor Chaves dos Santos Barroso, o acórdão da Relação de Guimarães de 19-05-2022 (processo n.º 4943/21.0T8GMRA.G1) relatado pela Sra. Desembargadora Vera Sottomayor e o acórdão do
Tribunal da Relação de Lisboa de 04/12/2019 (processo 1642/18.3T8CSCA.L1-4), relatado pelo senhor Juiz Desembargador José Eduardo Sapateiro.
24. O artigo 63.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa garante que o Estado apoia a actividade e o funcionamento das IPSS com vista à prossecução de
objectivos de solidariedade social e a actividade da Ré, ora recorrente, no Lar de Nossa Senhora do Rosário, é desenvolvida com vista à prossecução desses
objectivos de solidariedade social: in casu o apoio à velhice.
25. A interpretação feita pelo Tribunal a quo do artigo 4.º, n.º 1, al. f), do RCP está também em violação manifesta do referido artigo da Lei Fundamental, sendo inconstitucionalmente restritiva e ilegítima, porquanto recusa o preceituado apoio
do Estado no âmbito da prossecução de finalidades que a própria Constituição elege.
26. Ensina Salvador da Costa in As custas Processuais, 7ª ed., p. 104, 108 que “A isenção subjectiva, ligada à qualidade da parte litigante, é motivada pela tutela do interesse público
prosseguido por estas entidades. Visa-se estimular entidades que, sem fins lucrativos, contribuam para o bem comum, justificando-se que o Estado facilite o exercício das suas
tarefas”.
27. O vínculo laboral em causa era necessário ao prosseguimento da actividade da Ré e, ainda que por uma via indirecta ou instrumental, o recurso à acção judicial para
dirimir conflito dele emergente relaciona-se com as atribuições ou defesa dos interesses da Ré.
28. É esta a interpretação que melhor serve o fim último da norma em causa:
“o estímulo e a facilitação das entidades privadas sem fins lucrativas que desenvolvam actividade que contribuem para o bem da comunidade. Se a entidade tem de dirimir um litígio
respeitante a relação jurídica essencial à sua actividade que beneficia a comunidade, justifica-se que seja o Estado a suportar o custo”.
29. Estamos perante uma ré Empregadora com cerca de 300 trabalhadores e, tendo em conta os fins por ela prosseguidos, tem esta Ré o dever acrescido de agir disciplinarmente quando os seus fins, nomeadamente o de apoio à velhice, são
postos em causa por trabalhadores, como sucedeu in casu.
30. Nos últimos anos, penderam no Tribunal a quo algumas acções judiciais em que é impugnado o despedimento de um trabalhador por parte da Ré, sem que alguma vez tivesse sido posta em causa a isenção de custas da Ré.
31. O processo disciplinar instaurado à ora A. teve por base uma participação disciplinar que deu lugar a vários processos disciplinares, sendo que, em quatro desses processos disciplinares, incluindo o que foi colocado em crise nos presentes autos, foi proferida a decisão de despedimento.
32. Consequentemente, pendiam no Tribunal a quo, quatro acções judiciais de Impugnação Judicial da Regularidade e Licitude do Despedimento propostas por quatro trabalhadoras contra esta mesma Ré.
33. Todos estes processos tiveram por base a mesma situação de facto: a descoberta, num utente, de uma úlcera de pressão, com deterioração de tecido, que não foi sinalizada pelas trabalhadoras, as quais são as A.A. nas referidas acções.
34. Ora, nos restantes processos foi atendida a isenção sujectiva da Ré
35. Por todo o exposto e até por uma questão de coerência dentro do mesmo Tribunal, andou mal o Tribunal a quo ao não concluir pela verificação do cumprimento dos requisitos inscritos na parte final do artigo 4.º, n.º 1, al. f) do RCP, devendo, por conseguinte, a decisão ser substituída por outra que reconheça a isenção de custas à ora Recorrente.
36. Consequentemente, no que respeita ao despacho de 07.01.2025, com a referência 441517347, do qual aqui também se recorre, por tudo o que se deixa escrito e que constitui também as alegações de recurso deste despacho, dá-se por reproduzido tudo o supra alegado, pelo que andou também aqui mal o Tribunal a quo, na parte em que ordenou a notificação da Ré, nos termos do disposto pelo artº. 570º, n.º 3
do CPC, para efectuar o pagamento da taxa de justiça devida, acrescida de uma multa.
37. Isto porque é entendimento da Ré que nenhuma taxa de justiça é devida e, consequentemente, não há lugar à aplicação de nenhuma multa.
38. Por todo o exposto e até por uma questão de coerência dentro do mesmo Tribunal, andou mal o Tribunal a quo nos dois despachos que a Ré aqui coloca em crise:
- no despacho de 20.11.2024, com a referência 439859541, ao não concluir pela isenção subjectiva da Ré conforme previsto no artigo 4.º, n.º 1, al. f) do RCP;
- no despacho de 07.01.2025, com a referência 441517347, na parte em que a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo determinou que a Recorrente fosse notificada nos termos do disposto pelo artº. 570º, n.º 3 do CPC, para efectuar o pagamento
da taxa de justiça devida acrescida de uma multa.
39. Devem, por isso, tais despachos ser revogados e substituídos por outros que reconheçam a isenção subjectiva de custas à ora Recorrente nos termos do artigo
4.º, n.º 1, al. f) do RCP e que seja dado sem efeito o determinado no despacho de 07.01.2025, com a referência 441517347, na parte em que a Meritíssima Juiz do
Tribunal a quo determinou que a Recorrente fosse notificada nos termos do disposto no artº. 570º, n.º 3 do CPC para efectuar o pagamento da taxa de justiça devida, acrescida de uma multa. » - fim de transcrição.
Mais refere que o recurso deve ser instruído com o requerimento da A. de início de processo, a motivação do despedimento da Ré, o Despacho de 20.11.2024, com a referência 439859541, as alegações da Ré de 5/12/2024 e o Despacho de 07.01.2025, com a referência 441517347.
Finaliza nos seguintes termos:
«Termos em que deve ser julgado procedente o presente recurso e, em conformidade, serem revogados o despacho de 20.11.2024, com a referência 439859541, substituindo-o por outro que reconheça a isenção de custas da ora Recorrente, nos termos do artigo 4.º, n.º 1, al. f) do RCP. e o despacho de 07.01.2025, com a referência 441517347, devendo ser dado sem efeito, na parte em que determinou que a Recorrente fosse notificada nos termos do disposto no artº. 570º, n.º 3 do CPC para efectuar o pagamento da taxa de justiça devida, acrescida de uma multa.
Assim se fazendo a Costumada JUSTIÇA! » - fim de transcrição.
O MºPº veio responder.6
Concluiu que:
1° Não se conforma a Santa Casa da Misericórdia do Barreiro, é nos autos recorridos e aqui Recorrente, com a posição do Tribunal a quo segundo a qual a mesma não beneficia da isenção de custas prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea f) do Regulamento das Custas Processuais.
2° Dispõe o artigo 4.° n.° 1 alínea f) Estão isentos de custas:
exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelo(….).
3° Com tal isenção, visou o legislador fomentar a prossecução de fins com interesse público, ou seja, aqueles que interessam à comunidade em geral, ao bem comum, e que são levados a cabo por entidades particulares que não se movem por intuitos lucrativos.
4º A isenção em apreço só terá lugar quando esteja em causa a defesa ou o reconhecimento de direitos e obrigações necessários à prossecução dos fins destas entidades, e já não os convenientes, ou seja, aqueles que apenas tem uma conexão de conveniência com os fins prosseguidos.
5º Estamos, assim, como salienta Salvador da Costa, perante uma isenção de custas condicional na medida em que só funciona em relação aos processos concernentes às suas especiais atribuições ou para defesa dos interesses conferidas pelo seu estatuto ou pela própria lei. Nesta perspetiva, esta isenção não abrange, nomeadamente os acções que tenham por objecto obrigações ou litígios derivados de contratos que estas entidades celebram com vista a obter meios para o exercício das a que não se deve ter uma interpretação estritamente literal da norma no sentido de admitir a inserção apenas quando as acções tenham a ver exactamente com as especiais atribuições ou seja para defender os interesses especialmente conferidos à pessoa colectiva, importará caso a caso verificar se o assunto sub judice é «decorrência natural» do atuar da pessoa na prossecução daquelas atribuições e/ou interesses, quer porque, a jusante, decorrentes dessa prossecução; quer porque, a montante, necessário à mesma. Assim, uma demanda laboral poderá ou não encaixar-se, conforme não decorra da prossecução do objectivo. Não se encaixarão aquelas que não decorrem da prossecução daquelas cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 29-06-2015, processo n.º 356/11.8TTPRT-D.P1, relator Exmo. Sr. Desembargador António José Ramos, disponível em www.dgsi.pt.
6º O artigo 4° do RCP estabelece o elenco e o regime de isenções de custas processuais. O n.° 1 prevê as isenções subjetivas. Note-se que não se trata de isenções subjetivas puras, visto que não são estabelecidas exclusivamente em função das entidades que são partes nos processos. O n.° 1 isenta certas entidades do pagamento das custas, mas condiciona a isenção à natureza das questões, dos direitos e dos interesses ou da relação material que é objeto do processo. ( ) Considerando a dicotomia acabada de fazer, a alínea f) do n.° 1 do artigo 4° estabelece uma isenção subjetiva de custas. )
Sucede que, nos termos da citada alínea, as pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos estão isentas de custas quando atuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelos respetivos estatutos ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável . Vê-se da norma acabada de transcrever que o benefício da isenção é reconhecido às pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos desde que: 1.-Actuem, no processo, exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições; ou 2.-Actuem, no processo, para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelos respetivos estatutos ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável . Qualquer atuação no processo fora destas condições não beneficia da isenção de custas. cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 27-11-2023, processo n.º 22446/22.3T8PRT-A.P1, relator Exmo. Sr. Desembargador Nelson Fernandes, disponível em www.dgsi.pt.
7° O objeto da presente ação versa sobre um litígio relativamente a um contrato de trabalho que a Autora AA celebrou com a Ré Santa Casa da Misericórdia do Barreiro .
8° Tal Ré, aqui Recorrente, está a atuar como qualquer pessoa jurídica atuaria, caso tivesse celebrado um contrato de trabalho ou de outra natureza com a Autora e por ela fosse demandada, não resultando a sua atuação do âmbito exclusivo das suas atribuições, ou da defesa dos seus interesses fixados pelo estatuto ou pela lei.
9° Assim e não obstante a natureza da Ré, resulta claro que a mesma não atua, nem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições que estão expressas no respetivo estatuto, nem está em juízo em defesa dos interesses que lhe estão por esse mesmo estatuto, ou por lei, especialmente conferidos, sendo certo, também, que o objeto desta ação não se traduz num meio instrumental em relação aos seus fins estatutários.
10° Na verdade, o que se discute são obrigações insuscetíveis de bulir com as finalidades que a Ré prossegue e com os objetivos que lhe conferem e que concorrem para a distinguir de outras pessoas coletivas.
11° Tendo em atenção quanto estatuído nos estatutos da Santa Casa da Misericórdia do Barreiro, logo avulta que o seu escopo pode genericamente sintetizar-se na satisfação de carências sociais e prática de atos de culto católico, de harmonia com o seu espírito tradicional, informado pelos princípios de doutrina e moral cristãs.
12° Sucede que, no caso vertente, tal entidade, assumindo a qualidade processual de Ré nos autos recorridos, após ser demandada pela Autora nesses autos, para pagamento de créditos laborais, limitou-se a defender valores próprios e comuns a qualquer pessoa coletiva, privada ou pública, com ou sem fins lucrativos, da mesma natureza ou mesmo de outra, sem qualquer conexão direta, instrumental e, muito menos, exclusiva com os seus fins estatutários.
13° Entendimento diverso levaria a considerar que, sempre que as pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos atuassem num processo judicial, no exercício de um direito, estavam a prosseguir, ainda que indiretamente, as atribuições e interesses que lhes estão atribuídos, beneficiando da isenção de custas artigo 4.°, n.° 1, alínea f) do RCP.
14° Por conseguinte, entendemos que a ora Recorrente Santa Casa da Misericórdia do Barreiro , não beneficia da isenção de custas prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea f) do RCP, donde, mais não resta do que concluir que deverá ser julgado improcedente o recurso apresentado.
Por todo o exposto, não deve ser dado provimento ao recurso interposto pelo Recorrente, devendo, em consequência, ser proferido douto Acórdão mantendo os doutos despachos recorridos nos seus exatos termos.» -fim de transcrição.
Anote-se que as partes vieram a formular o seguinte requerimento:7
«AA e Irmandade da Santa Casa da Misericórdia do Barreiro, respectivamente A. e Ré nos autos supra referenciados, acordam em pôr fim aos presentes autos nos seguintes termos:
1. A Ré pagará à A. a quantia de € 6970, quantia que a A. aceita.
2. A. e Ré imputam tal quantia a título de compensação pecuniária de natureza global.
3. A quantia supra referida será liquidada pela Ré à A. em quatro prestações mensais e sucessivas de € 1742,50, nos seguintes termos:
a. € 1742,50 até 31/01/2025;
b. € 1742,50 até 28/02/2025;
c. € 1742,50 até 31/03/2025;
d. € 1742,50 até 30/04/2025.
4. Os valores referidos no ponto anterior serão liquidados através de transferência bancária para o número de identificação bancária da A. na posse da Ré.
5. Após o pagamento de tais quantias, A. e Ré declaram-se mutuamente ressarcidas, nada mais tendo a haver uma da outra a qualquer título.
6. As custas em dívida a juízo serão suportadas em partes iguais, sem prejuízo da isenção subjectiva da A. (art.º 4º, n.º 1, h) do RCP) e da Ré manter o entendimento de que está abrangida pela isenção subjectiva prevista no art.º 4º, n.º 1, f) do RCP. Com efeito, foi essa mesma questão que motivou o recurso apresentado e considerado intempestivo por V. Ex.ª, por o despacho em crise se tratar de uma decisão interlocutória e apenas poder subir a final.
Deve, por isso, não obstante a presente transacção, V. Ex.ª manda subir aquele recurso, o qual será agora tempestivo.
Tudo isto, sem prejuízo da Ré estar ainda em tempo para apresentar, por via do art.º 644º, n.º 2, al. e) do CPC, recurso quanto ao despacho que ordenou a sua notificação nos termos do disposto pelo art.º 570º, n.º 3 do CPC, o qual irá, efectivamente, apresentar.
Termos em que requerem a V. Ex.ª a homologação do presente acordo e a condenação das partes nos seus precisos termos.
Os Advogados com procuração com poderes especiais».
Em 31 de Janeiro de 2025, a transacção foi julgada válida e homologada , tendo-se condenado e absolvido nos seus precisos termos com custas nos moldes acordados.8
Em 27 de Fevereiro de 2025, foi proferido o seguinte despacho:
«Por legal, tempestivo, e por a Recorrente ter legitimidade, o tribunal admite o recurso interposto.
O recurso sobe imediatamente e em separado.
*
Vi as contra alegações apresentadas.
*D.N. com vista à instrução do competente apenso, para além do requerimento de interposição de recurso e das contra alegações apresentadas, com o requerimento da Autora de início de processo, a motivação do despedimento da Ré, o Despacho de 20.11.2024, com a referência 439859541, as alegações da Ré de 5/12/2024 e o Despacho de 07.01.2025, com a referência 441517347.
*
Oportunamente, subam os autos ao Venerando Tribunal da Relação de Lisboa.» - fim de transcrição.
Em 8 de Abril de 2025, foi conferido valor à causa nos seguintes termos:
«Por manifesto lapso não se atribuiu valor à causa.
Assim, ao abrigo do disposto no art. 297.º do Código de Processo Civil fixa-se à causa o valor € 6.970.
*
Oportunamente remeta os autos ao Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, instruindo este apenso com o requerimento com referência CITIUS 41745050 e com a sentença proferida»- fim de transcrição.
A Exmª Procuradora Geral Adjunta formulou parecer em que sustenta que o recurso não merece provimento, devendo confirmar-se o despacho recorrido.9
A recorrente respondeu.10
Não concorda com o parecer do Ministério Público, uma vez que, como se demonstrou, verifica-se o cumprimento dos requisitos inscritos na parte final do artigo 4.º, n.º 1, al. f) do RCP, devendo, por isso, ser-lhe reconhecida a isenção de custas.
Mostram-se colhidos os vistos.
Nada obsta ao conhecimento.
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Na apreciação do recurso será levada em conta a matéria decorrente do supra elaborado relatório.
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É sabido que o objecto do recurso apresenta-se delimitado pelas conclusões da respectiva alegação (artigos 635º e 639º ambos do CPC ex vi do artigo 87º do CPT)11.
No recurso interposto pela Ré , em 29 de Janeiro de 2025 [ vide fls. 1 a 15 v] a mesma vem recorrer das decisões proferidas em:
- 20 de Novembro de 2024 que considerou que a ora recorrente não gozava de isenção de custas;
- em 7 de Janeiro de 2025 , na parte que determinou a notificação da recorrente nos termos do disposto no artigo 570º, nº 3 do CPC12.
A questão fundamental a dirimir consiste em saber se a Ré - Santa Casa da Misericórdia do Barreiro - se encontra isenta de custas nos autos daí se extraindo as inerentes consequências em termos da aplicação da norma invocada mencionada no despacho de 7.1.2025 [ artigo 570º, nº 3 do CPC] .
Segundo o artigo 4º do Regulamento das Custas Processuais [ aprovado pelo DL n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro, com as posteriores alterações]:
Artigo 4.º
Isenções
1 - Estão isentos de custas:
a) O Ministério Público nos processos em que age em nome próprio na defesa dos direitos e interesses que lhe são confiados por lei, mesmo quando intervenha como parte acessória e nas execuções por custas e multas processuais, coimas ou multas criminais;
b) Qualquer pessoa, fundação ou associação quando exerça o direito de acção popular nos termos do n.º 3 do artigo 52.º da Constituição da República Portuguesa e de legislação ordinária que preveja ou regulamente o exercício da acção popular;
c) Os magistrados e os vogais do Conselho Superior da Magistratura, do Conselho Superior do Ministério Público ou do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais que não sejam magistrados, em quaisquer acções em que sejam parte por via do exercício das suas funções;
d) Os membros do Governo, os eleitos locais, os directores-gerais, os secretários-gerais, os inspectores-gerais e equiparados para todos os efeitos legais e os demais dirigentes e funcionários, agentes e trabalhadores do Estado, bem como os responsáveis das estruturas de missão, das comissões, grupos de trabalho e de projecto a que se refere o artigo 28.º da Lei n.º 4/2004, de 15 de Janeiro, qualquer que seja a forma do processo, quando pessoalmente demandados em virtude do exercício das suas funções;
e) Os partidos políticos, cujos benefícios não estejam suspensos, no contencioso previsto nas leis eleitorais;
f) As pessoas colectivas privadas sem fins lucrativos, quando actuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável;
g) As entidades públicas quando actuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições para defesa de direitos fundamentais dos cidadãos ou de interesses difusos que lhe estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto, e a quem a lei especialmente atribua legitimidade processual nestas matérias;
h) Os trabalhadores ou familiares, em matéria de direito do trabalho, quando sejam representados pelo Ministério Público ou pelos serviços jurídicos do sindicato, quando sejam gratuitos para o trabalhador, desde que o respectivo rendimento ilíquido à data da proposição da acção ou incidente ou, quando seja aplicável, à data do despedimento, não seja superior a 200 UC;
i) Os menores ou respectivos representantes legais, nos recursos de decisões relativas à aplicação, alteração ou cessação de medidas tutelares, aplicadas em processos de jurisdição de menores;
j) Os arguidos detidos, sujeitos a prisão preventiva ou a cumprimento de pena de prisão efectiva, em estabelecimento prisional, quando a secretaria do Tribunal tenha concluído pela sua insuficiência económica nos termos da lei de acesso ao direito e aos tribunais, em quaisquer requerimentos ou oposições, nos habeas corpus e nos recursos interpostos em qualquer instância, desde que a situação de prisão ou detenção se mantenha no momento do devido pagamento;
l) Os menores, maiores acompanhados, ausentes e incertos quando representados pelo Ministério Público ou por defensor oficioso, mesmo que os processos decorram nas conservatórias de registo civil;
m) Os agentes das forças e serviços de segurança, em processo penal por ofensa sofrida no exercício das suas funções, ou por causa delas;
n) O demandante e o arguido demandado, no pedido de indemnização civil apresentado em processo penal, quando o respectivo valor seja inferior a 20 UC;
o) O Fundo de Garantia Automóvel, no exercício do direito de sub-rogação previsto no regime jurídico do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel;
p) O Fundo de Garantia Salarial, nas ações em que tenha de intervir;
q) O Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, nos processos em que intervenha na defesa dos direitos dos trabalhadores, dos contribuintes e do património do Fundo;
r) O Fundo dos Certificados de Reforma, nos processos em que intervenha na defesa dos direitos dos aderentes, dos beneficiários e do património do Fundo;
s) Os municípios, quando proponham a declaração judicial de anulação prevista no regime jurídico de reconversão das áreas urbanas de génese ilegal, em substituição do Ministério Público;
t) O exequente e os reclamantes, quando tenham que deduzir reclamação de créditos junto da execução fiscal e demonstrem já ter pago a taxa de justiça em processo de execução cível relativo aos mesmos créditos;
u) As sociedades civis ou comerciais, as cooperativas e os estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada que estejam em situação de insolvência ou em processo de recuperação de empresa, nos termos da lei, salvo no que respeita às acções que tenham por objecto litígios relativos ao direito do trabalho.
v) O Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, nas ações em que tenha de intervir na qualidade de gestor do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores.
x) Os compartes, os órgãos dos baldios e o Ministério Público, nos litígios que, direta ou indiretamente, tenham por objeto terrenos baldios.
z) As pessoas a quem tenha sido atribuído o estatuto de vítimas de crime de violência doméstica, nos termos do disposto no artigo 14.º da Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro, alterada pelas Leis n.os 19/2013, de 21 de fevereiro, 82-B/2014, de 31 de dezembro, e 129/2015, de 3 de setembro, quando intervenham no respetivo processo penal em qualquer das qualidades referidas nos artigos 67.º-A a 84.º do Código de Processo Penal.
aa) As vítimas dos crimes de mutilação genital feminina, escravidão, tráfico de pessoas, coação sexual e violação, previstos e puníveis, respetivamente, nos termos do disposto nos artigos 144.º-A, 159.º, 160.º, 163.º e 164.º, todos do Código Penal, quando intervenham no respetivo processo penal em qualquer das qualidades referidas nos artigos 67.º-A a 84.º do Código de Processo Penal.
bb) Os casos em que a Autoridade Tributária e Aduaneira revogue ou anule atos administrativos em matéria tributária ou reveja os atos tributários, ou outros, que sejam objeto de processos tributários pendentes nos tribunais administrativos e fiscais, ao abrigo do disposto no artigo 68.º-A da Lei Geral Tributária.
2 - Ficam também isentos:
a) As remições obrigatórias de pensões;
b) Os processos administrativos urgentes relativos ao pré-contencioso eleitoral quando se trate de eleições para órgãos de soberania e órgãos do poder regional ou local e à intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias;
c) Todos os processos que devam correr no Tribunal de Execução de Penas, quando o recluso esteja em situação de insuficiência económica, comprovada pela secretaria do tribunal, nos termos da lei de acesso ao direito e aos tribunais;
d) Os processos de liquidação e partilha de bens de instituições de previdência social e associações sindicais e de classe;
e) Os processos de tratamento involuntário de pessoas com necessidade de cuidados de saúde mental;
f) Os processos de confiança judicial de menor, tutela e adopção e outros de natureza análoga que visem a entrega do menor a pessoa idónea, em alternativa à institucionalização do mesmo;
g) (Revogada.)
h) Os processos de acompanhamento de maiores.
3 - Nos casos previstos nas alíneas c) e d) do n.º 1, a parte isenta fica obrigada ao pagamento de custas quando se conclua que os actos não foram praticados em virtude do exercício das suas funções ou quando tenha actuado dolosamente ou com culpa grave.
4 - No caso previsto na alínea u) do n.º 1, a parte isenta é responsável pelo pagamento das custas, nos termos gerais, em todas as acções no âmbito das quais haja beneficiado da isenção, caso ocorra a desistência do pedido de insolvência ou quando este seja indeferido liminarmente ou por sentença.
5 - Nos casos previstos nas alíneas b), f) e x) do n.º 1 e na alínea b) do n.º 2, a parte isenta é responsável pelo pagamento das custas, nos termos gerais, quando se conclua pela manifesta improcedência do pedido.
6 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, nos casos previstos nas alíneas b), f), g), h), s), t) e x) do n.º 1 e na alínea b) do n.º 2, a parte isenta é responsável, a final, pelos encargos a que deu origem no processo, quando a respetiva pretensão for totalmente vencida.
7 - Com excepção dos casos de insuficiência económica, nos termos da lei de acesso ao direito e aos tribunais, a isenção de custas não abrange os reembolsos à parte vencedora a título de custas de parte, que, naqueles casos, as suportará.
In casu, a recorrente é uma pessoa colectiva de direito privado e utilidade pública administrativa pelo que é enquadrável na alínea f) do nº 1 do artigo 4º do RCP.
***
De acordo com o artigo 4º dos Estatutos da Ré13 cujo teor não se mostra questionado nos autos14 15:
"Embora o seu campo de ação possa transcender as áreas da chamada Segurança Social, os fins que, de modo principal prosseguirá, serão, efetivamente, o apoio à família, à comunidade carenciada, a proteção à infância e à velhice, através da criação e manutenção de serviços de saúde, lares, centros de dia, creches, jardins-de-infância e serviços Domiciliários".
Aliás ,isso também decorre da definição e fins das IPSS previstos nos artigos 1º e 2° do Estatuto das Instituições Particulares de Solidariedade Social — D.L. n.° 119/83 de 25 de Fevereiro, republicado pelo D.L. n.° 172-A/2014 de 14 de Novembro. 16
O cerne da questão situa-se em saber se, no caso concreto , cumpre considerar que a Ré/ recorrente se encontra a actuar exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável.
Recorde-se que no seu articulado motivador a recorrente referiu:



Resulta , pois , evidente que a trabalhadora laborava para a Ré no âmbito de actividade destinada ao apoio de idosos e que a atinente factualidade se mostra articulada, não se vislumbrando que nesse particular tenha sido impugnada.
Ou seja estamos perante actividade que concerne de forma evidente às especiais atribuições da recorrente e também na defesa dos interesses conferidos pelo seu estatuto.
Anote-se que segundo Salvador da Costa17 a isenção referida na alínea f) do nº 1 desta norma:
«Trata-se de uma isenção de custas condicional, na medida em que só funciona em relação aos processos concernentes às suas especiais atribuições ou para defesa dos interesses conferidos pelo seu estatuto ou pela própria lei.
Nesta perspetiva, esta isenção não abrange as ações que tenham por objeto obrigações ou litígios derivados de contratos que essas pessoas celebrem com vista a obter meios para o exercício das suas atribuições.” – fim de transcrição.
Porém, a nosso ver , com todo o respeito por tão abalizada opinião, versando a presente acção sobre pretensão atinente a contrato de trabalho que a Ré celebrou com trabalhadora que exerce a sua actividade no âmbito de acção social levada a cabo na área da população idosa ( sendo que a actividade da Ré sempre tem que ser levada a cabo por pessoas ) é patente que a primeira ao contratá-la e ao na presente acção exercer o seu legítimo direito a defender-se das pretensões por ela deduzidas está - mais que não seja de forma instrumental , indirecta ,mediata - a exercer uma competência necessária à prossecução da sua actividade e seus fins.
Como tal, beneficia da isenção em causa contemplada na alínea f) do nº 1 do artigo 4º do RCP, sendo que, a nosso ver , neste sentido também aponta acórdão desta Relação , de 4-12-2019, proferido no âmbito do processo nº 1642/18.3T8CSC-A.L1-4, Relator José Eduardo Sapateiro , acessível em www.dgsi.pt.18
Assim, afigura-se-nos que a Ré beneficia da solicitada isenção, encontrando-nos no caso em exame perante situação bem diversa daquela em que uma Santa Casa da Misericórdia invoca gozar da isenção em apreço, não invocando contudo factualidade de que se possa extrair – tal como aqui acontece – que se encontra a actuar num âmbito de um processo que diz respeito directamente às suas especiais atribuições ou para defesa dos interesses conferidos pelo seu estatuto ou pela própria lei.
Em consequência cumpre revogar o despacho recorrido proferido em 20.11.2024,que deve ser substituído por outro que considere que a Ré/recorrente beneficia da solicitada isenção com as inerentes consequências a nível processual.
Tal acarreta , igualmente , a revogação do despacho proferido em 7 de Janeiro de 2025 no segmento que ordenou a notificação da Ré nos termos do disposto no nº 3 do artigo 570º do CPC.
***
Em face do exposto, acorda-se em julgar a apelação procedente e revoga-se:
- o despacho recorrido proferido em 20.11.2024, que deve ser substituído por outro que considere que a Ré/recorrente beneficia da solicitada isenção com as inerentes consequências a nível processual;
- o despacho proferido em 7 de Janeiro de 2025 no segmento que ordenou a notificação da Ré nos termos do disposto no nº 3 do artigo 570º do CPC.
Sem custas.
Notifique.
DN (processado e revisto pelo relator).

Lisboa, 30-06-2025
Leopoldo Soares
Alda Martins
Celina Nóbrega - Vencida com os fundamentos constantes do Acórdão deste Tribunal proferido no processo 22455/16.1T8LSB-A.L1 de 22.03.2017.
_______________________________________________________
1. Em 31 de Maio de 2024 – vide fls. 28.
2. Vide fls. 49 a 61 v.
3. Fls. 140 /140 v.
4. Fls. 141 a 154.
5. Vide fls. 156 e 157.
6. Vide fls. 18 v a 27.
7. Vide fls. 169 v.
8. Vide fls. 170.
9. Vide fls. 172 a 173 v.
10. Vide fls. 174 v a 177 v.
11. Anote-se, antes de mais, que o recurso interposto pela Ré , em 5 de Dezembro de 2024, do despacho proferido em 20 de Novembro de 2024, foi rejeitado por intempestividade por despacho de 7 de Janeiro de 2025 sem que se vislumbre que tenha sido apresentada reclamação.
12. Segundo essa norma:
Artigo 570.º
Documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça
1 - É aplicável à contestação, com as necessárias adaptações, o disposto nos n.os 7 e 8 do artigo 552.º, podendo o réu, se estiver a aguardar decisão sobre a concessão do benefício de apoio judiciário, comprovar apenas a apresentação do respetivo requerimento.
2 - No caso previsto na parte final do número anterior, o réu deve comprovar o prévio pagamento da taxa de justiça ou juntar ao processo o respetivo documento comprovativo no prazo de 10 dias a contar da notificação da decisão que indefira o pedido de apoio judiciário.
3 - Na falta de junção do documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida ou de comprovação desse pagamento, no prazo de 10 dias a contar da apresentação da contestação, a secretaria notifica o interessado para, em 10 dias, efetuar o pagamento omitido com acréscimo de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 5 UC.
4 - Após a verificação, por qualquer meio, do decurso do prazo referido no n.º 2, sem que o réu tenha comprovado o prévio pagamento da taxa de justiça, a secretaria notifica-o para os efeitos previstos no número anterior.
5 - Findos os articulados e sem prejuízo do prazo concedido no n.º 3, se não tiver sido junto o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida e da multa por parte do réu, ou não tiver sido efetuada a comprovação desse pagamento, o juiz profere despacho nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 590.º, convidando o réu a proceder, no prazo de 10 dias, ao pagamento da taxa de justiça e da multa em falta, acrescida de multa de valor igual ao da taxa de justiça inicial, com o limite mínimo de 5 UC e máximo de 15 UC.
6 - Se, no termo do prazo concedido no número anterior, o réu persistir na omissão, o tribunal determina o desentranhamento da contestação.
7 - Não sendo efetuado o pagamento omitido, não é devida qualquer multa.
13. De acordo com o compromisso da Ré [chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://misericordiabarreiro.pt/wp-content/uploads/2020/06/Compromisso-autenticado.pdf]
Regulamento interno [chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://misericordiabarreiro.pt/wp-content/uploads/2020/06/Regulamento-Lar-Nossa-Senhora-do-Rosa%CC%81rio.pdf
14. Vide artigos 52 e seguintes do articulado motivador [ fls. 54 e 54 v] e igualmente nas alegações de recurso [ fls. 3 v].
15. Anote-se ainda o Regulamento interno da Estrutura Residencial para Pessoas Idosas do Lar de Nossa Senhora do Rosário da Irmandade da Santa Casa da Misericórdia do Barreiro , constante de fls. 110 a 127 , que também não se detecta que tenha sido questionado.
16. Ali consta que:
Artigo 1.º
Definição
1 - São instituições particulares de solidariedade social, adiante designadas apenas por instituições, as pessoas coletivas, sem finalidade lucrativa, constituídas exclusivamente por iniciativa de particulares, com o propósito de dar expressão organizada ao dever moral de justiça e de solidariedade, contribuindo para a efetivação dos direitos sociais dos cidadãos, desde que não sejam administradas pelo Estado ou por outro organismo público.
2 - A atuação das instituições pauta-se pelos princípios orientadores da economia social, definidos na Lei n.º 30/2013, de 8 de maio, bem como pelo regime previsto no presente Estatuto.
3 - O regime estabelecido no presente Estatuto aplica-se subsidiariamente às instituições que se encontrem sujeitas a regulamentação especial.
Artigo 1.º-A
Fins e atividades principais
Os objetivos referidos no artigo anterior concretizam-se mediante a concessão de bens, prestação de serviços e de outras iniciativas de promoção do bem-estar e qualidade de vida das pessoas, famílias e comunidades, nomeadamente nos seguintes domínios:
a) Apoio à infância e juventude, incluindo as crianças e jovens em perigo;
b) Apoio à família;
c) Apoio às pessoas idosas;
d) Apoio às pessoas com deficiência e incapacidade;
e) Apoio à integração social e comunitária;
f) Proteção social dos cidadãos nas eventualidades da doença, velhice, invalidez e morte, bem como em todas as situações de falta ou diminuição de meios de subsistência ou de capacidade para o trabalho;
g) Prevenção, promoção e proteção da saúde, nomeadamente através da prestação de cuidados de medicina preventiva, curativa e de reabilitação e assistência medicamentosa;
h) Educação e formação profissional dos cidadãos;
i) Resolução dos problemas habitacionais das populações;
j) Outras respostas sociais não incluídas nas alíneas anteriores, desde que contribuam para a efetivação dos direitos sociais dos cidadãos.
Artigo 1.º-B
Fins secundários e atividades instrumentais
1 - As instituições podem também prosseguir de modo secundário outros fins não lucrativos, desde que esses fins sejam compatíveis com os fins definidos no artigo anterior.
2 - As instituições podem ainda desenvolver atividades de natureza instrumental relativamente aos fins não lucrativos, ainda que desenvolvidos por outras entidades por elas criadas, mesmo que em parceria e cujos resultados económicos contribuam exclusivamente para o financiamento da concretização daqueles fins.
3 - O regime estabelecido no presente Estatuto não se aplica às instituições em tudo o que diga respeito exclusivamente aos fins secundários e às atividades instrumentais desenvolvidas por aquelas.
4 - O disposto no número anterior não prejudica a competência dos serviços com funções de fiscalização ou de inspeção para a verificação da natureza secundária ou instrumental das atividades desenvolvidas e para a aplicação do regime contraordenacional adequado ao efeito.
Artigo 2.º
Formas e agrupamentos das instituições
1 - As instituições revestem uma das formas a seguir indicadas:
a) Associações de solidariedade social;
b) [Revogada];
c) Associações mutualistas ou de socorros mútuos;
d) Fundações de solidariedade social;
e) Irmandades da misericórdia.
2 - Para além das formas referidas no número anterior, podem as instituições, nos termos da Concordata celebrada entre a Santa Sé e a República Portuguesa em 18 de maio de 2004, assumir a forma de Institutos de Organizações ou Instituições da Igreja Católica, designadamente Centros Sociais Paroquiais e Caritas Diocesanas e Paroquiais.
3 - A especificidade de cada uma das formas de organização é objeto de regulamentação em secção própria do presente Estatuto.
4 - As instituições referidas no n.º 1 podem agrupar-se em:
a) Uniões;
b) Federações;
c) Confederações.
17. Regulamento das Custas Processuais Anotado e Comentado, 2009, Almedina, pág. 146.
18. Que logrou o seguinte sumário:
« I – A al. f) do n.º 1 do art.º 4.º do RCP obriga a uma interpretação compreensiva e abrangente das realidades que lhe podem estar subjacentes e que, em grande medida, passam por uma apreciação casuística dos litígios trazidos a tribunal ou, pelo menos, do tipo ou espécie de ações, que pela sua relação instrumental com as referidas especiais atribuições e interesses prosseguidas pelas pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos, segundo os seus estatutos e o regime legal aplicável, poderão, em regra, beneficiar, à partida dessa isenção de custas, tudo sem prejuízo do disposto nos números 5 e 6 do mesmo artigo 4.º do RCP.
II - Existirão muitas pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos que, pela sua dimensão e natureza da sua atividade, se sustentarão fundamentalmente na carolice e trabalho voluntário dos seus sócios e demais colaboradores, mas certamente outras, como a Ré, terão absoluta necessidade de celebrar contratos onerosos de trabalho e de prestação de serviços com terceiros, por só assim lhes ser possível prosseguir as suas particulares atribuições e específicos interesses (que, como sabemos e resulta dos próprios Estatutos da instituição aqui demandada são múltiplos, variados e ambiciosos em termos sociais).
III - Revelando-se essas relações de trabalho subordinado como absolutamente necessárias ao funcionamento da Ré e à realização dos seus fins e decorrendo de tais vínculos e do risco da autoridade e da atividade profissional a eles inerente a ocorrência de acidentes de trabalho, não se poderá negar, em regra, tal isenção de custas à Ré, ainda que condicionada ao desfecho final da ação laboral, nos termos dos números 5 e 6 do artigo 4.º do RCP.» - fim de transcrição.