Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
CRIME DE RESISTÊNCIA E COAÇÃO SOBRE FUNCIONÁRIO
CONCEITO DE VIOLÊNCIA
Sumário
1 - O recurso pode visar a demonstração de que a apreciação da prova do recorrente é preferível à do tribunal recorrido, porque, ao contrário do que tantas vezes se vê escrito, nada impede o recorrente de discutir e tentar alterar a convicção formada em primeira instância para que seja substituída por aquela que resulta da sua visão e convicção probatória, podendo pois pedir ao tribunal da Relação que corrija a apreciação feita em 1ª instância, até porque se a primeira instância beneficia do princípio da livre apreciação da prova, também a segunda instância dele beneficia. 2 - No caso, embora a prova produzida e examinada em audiência permitisse, eventualmente, uma decisão diferente, ela não impõe uma decisão diferente, o que basta para que o recurso da matéria de facto não possa obter provimento. 3 - Tendo o arguido agido sozinho, alcoolizado, dirigindo a ação a duas militares que, pelas regras de experiência, se fazem acompanhar de arma de fogo, bastão extensível e aerossol de defesa com gás, sem o propósito de ofender o corpo das agentes, o comportamento do arguido foi desrespeitoso, pouco refletido, imprudente e precipitado, mas inidóneo a impedir a ação de fiscalização e insuficiente “para atingir a dignidade penal que se espera da definição de violência, na vertente da ofensa à integridade física”. 4 - O gesto levado a cabo pelo arguido de colocar as mãos nas clavículas das agentes da GNR, empurrando-as, não basta para que se possa considerar preenchido o conceito de violência a que alude o art 347º, nº 1 do CP. 5 - A agente afirmou que não sofreu qualquer tipo de dor ou incómodo com o empurrão, que nem sequer a fez mover-se, sendo assim evidente que se trata de uma ação criminalmente irrelevante. 6 - Partindo das circunstâncias de cada caso, o tipo legal exige que a violência usada seja objetivamente adequada a anular, ou a dificultar de forma significativa, a capacidade de atuação do funcionário, sempre tendo em conta que os militares possuem especiais qualidades no que diz respeito à capacidade de suportar pressões e estão munidos de instrumentos de defesa que o comum dos cidadãos não tem. 7 - Mesmo que se adotasse um critério mais restritivo, sempre se teria de concluir que o respeito pelos princípios da adequação e da proporcionalidade exigíveis a qualquer decisão determinaria que um comportamento inócuo sob o ponto de vista da oposição ou do constrangimento à atuação de militares, não basta para integrar o conceito de violência do artigo 347º do CP e, como tal, também não basta para que se convole a atuação por forma a subsumir-se ao crime de ofensa à integridade física qualificada, sob pena de se criminalizarem condutas que embora incorretas, não têm, como na situação em apreço, dignidade penal.
Texto Integral
Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra.
I.
No processo comum, com intervenção de tribunal singular que, com o nº 778/22.0GBFND, corre termos pelo juízo local criminal do Fundão foi decidido (transcrição): - absolvero arguidoAA da prática, a 29-10-2022, de um crime de resistência e coacção sobre funcionário, previsto e punido pelo artigo 347.ᵒ, n.ᵒ 1, do Código penal; - condenar o arguido AA pela prática, a 29-10-2022, em autoria material e na forma consumada (cf. os artigos 10.ᵒ, n.ᵒ 1, 13.ᵒ, 14.ᵒ, n.ᵒ 1, e 26.ᵒ, primeira parte, do Código Penal), de um crime de injúria agravada, previsto e punido pelos artigos 181.ᵒ, n.ᵒ 1, 184.ᵒ e 132.ᵒ, n.ᵒ 2, alínea l), do Código Penal, na pessoa de BB, na pena de 75 (setenta e cinco) dias de multaà razão diária de 8,00 EUR (oito euros); - condenar o arguido AA pela prática, a 29-10-2022, em autoria material e na forma consumada (cf. os artigos 10.ᵒ, n.ᵒ 1, 13.ᵒ, 14.ᵒ, n.ᵒ 1, e 26.ᵒ, primeira parte, do Código Penal), de um crime de injúria agravada, previsto e punido pelos artigos 181.ᵒ, n.ᵒ 1, 184.ᵒ e 132.ᵒ, n.ᵒ 2, alínea l), do Código Penal, na pessoa de CC, na pena de na pena de 75 (setenta e cinco) dias de multaà razão diária de 8,00 EUR (oito euros); - efectuar o cúmulo jurídico das penas parcelares acima e, em consequência, condenar o arguido AA na pena única de 120 (cento e vinte) dias de multaà razão diária de 8,00 EUR (oito euros); - determinar o desconto de 01 (um) dia de multa, nos termos do artigo 80.ᵒ, n.ᵒ 2, do Código Penal; - condenar o arguido no pagamento da taxa de justiça que se fixa em 02 (duas) UC’s (unidades de conta), bem como no pagamento dos demais encargos a que a sua actividade houver dado causa. (…) *
Inconformado com a absolvição do arguido pelo crime de resistência e coação sobre funcionário, recorreu o Ministério Público para este Tribunal da Relação, concluindo o seu recurso do seguinte modo (transcrição): 1.O caso dos autos reporta-se a uma situação de facto em que o arguido emprega violência (empurrão) contra membros de força militar (Guarda Nacional Republicana), para se opor a que estes pratiquem atos relativos ao exercício das suas funções (revista de um suspeito); 2.Devem ser dadas como provadas as consequências que tais atos tiveram no corpo das militares, orafazendo deslocar o torso de umaemsentido oposto àforçaexercida (CC), ora fazendo a outra militar dar alguns passos atrás, sofrendo dores nas zonas atingidas (BB); 3.Decorre das regras da experiência comum e da lógica que quem empurra duas pessoas, nestas circunstâncias, quer sejam militares ou não, é porque quer molestar a integridade física das visadas; 4.Tais deduções e inferências estão suportadas nos depoimentos das militares da Guarda Nacional Republicana CC e BB – respetivamente, ata de audiência de discussão e julgamento (referência Citius n.º 37837341), tendo início às 15 horas e 44 minutos e termo às 16 horas e 04 minutos e ata de audiência de discussão e julgamento (referência Citius n.º 37947753), tendo o seu início pelas 16 horas e 49 minutos e o seu termo pelas 17 horas e 02 minutos; 5.Dessarte, o facto provado n.º5 daSentençapostaemcrise devepassar ater aseguinte formulação: «Após, o arguido aproximou-se quer da Guarda BB, quer da Guarda CC e, com as mãos abertas, empurrou cada uma delas uma vez na zona da clavícula, tendo o torso da militar CC se deslocado em sentido oposto à força exercida pelo arguido e outrossim a militar BB dado alguns passos atrás, sentido, ainda, esta última dores nas zonas atingidas»; 6.Bem como deve ser retirado dos factos dados como não provados e acrescentar-se o seguinte aos factos dados como provados: O arguido, ao atuar como atuou, agiu com o propósito concretizado de molestar o corpo e a saúde das militares BB e CC, desferindo-lhes empurrões no corpo, assim como de lhes produzir as lesões verificadas e dores, o que representou e quis; 7.Tal factualidade basta para a prática de um crime de resistência e coação sobre funcionário, previsto e punido pelo artigo 347.º, n.º 1 do Código Penal; 8.A exigência de gravidade vem apontada no tipo legal para a ameaça, mas não para a violência, que ou bem existe ou bem não existe; 9.Apesar de os militares da Guarda Nacional Republicana ou agentes da Polícia de Segurança Pública não serem cidadãos comuns, tal não significa que estoica e insensivelmente, devemsuportartodos os atos, quandoestes jásão, objetivamente,violentos; 10. Um empurrão deliberado e agressivo traduz o exercício de força física ou corporal e por isso integra o conceito penal de violência, com idoneidade para concretizar a oposição do autor à prática do ato devido; 11.Para que seja praticado um crime de ofensa à integridade física, não é necessário que se provoque dores no visado; 12. A sentença, ao julgar diversamente, absolvendo o arguido do crime de resistência e coação sobre funcionário, violou o artigo 347.º do Código Penal, por erro de interpretação; 13. Sem prescindir, e se assim não se entender, sempre se dirá que ao dar como provados os factos em questão e ao absolver do crime de resistênciae coação sobre funcionário, dever-se-ia ter procedido à convolação para o crime de ofensa à integridade física qualificada previsto e punido pelos artigos 131.º, n.º 2, alínea l), 143.º, n.º 1 e 145.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 do Código Penal. Nestes termos, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser revogada a sentença recorrida, alterando-se a matéria de facto dada como provada e não provada, e condenando-se o arguido AA pela prática de um crime de resistência e coação sobre funcionário, previsto e punido pelo artigo 347.º, n.º 1 do Código Penal, ou, caso assim não se entenda, convolar o referido crime para dois crimes de ofensa à integridade física qualificados, previstos e punidos pelo artigos 131.º, n.º 2, alínea l), 143.º, n.º 1 e 145.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 do Código Penal, assim se fazendo inteira e sã Justiça!
*
Respondeu ao recurso o arguido, resposta que concluiu assim (transcrição): 1º- O recurso visa a reapreciação da matéria de facto quer a decisão jurídica; 2º- Na conclusão não constam as exactas passagens de gravação que fundam a pretendida alteração da matéria factual, devendo o recurso ser rejeitado; 3º- Os depoimentos das guardas ofendidas nos presentes autos (e não testemunhas) houve discrepâncias e contradição; 4º- A guarda BB (depoimento desde o minuto 00.55 até final) afirmou que o arguido “empurrou as agentes, primeiro a colega CC e depois a BB”; Foi com os braços acima do peito, nas omoplatas. Foi com força, Sentiu Dores? Senti o impacto”; Juiz: um empurrão que refere e que referiu como tendo sido com força, até porque sentiu a dor impacto, foi apenas com força em si ou foi também com força na sua colega? Isto é, do que percepcionou naturalmente quem sentiu o impacto foi ela e não a senhora mas pergunto-lhe de outra forma para tentar chegar onde quero. Quando há empurrão na Srª. militar sua colega, ela moveu-se ou ficou no mesmo sítio? Moveu-se, sim; “Penso que ele deu passos para traz … acho que não foi muito, mas penso … penso que se chegou um bocado para trás. O corpo deslocou-se? Certo também, sim, “Andou para trás se calhar foi pela surpresa também, mais sim; 5º- A guarda, CC disse “empurrou-me” entretanto, a BB pôs-se à minha frente, empurrou a BB e, entretanto chamei a patrulha (…) empurrou-me a mim “Com os braços); “Não lhe sei dizer, responder, empurrou-me, aqui. Agora não lhe sei dizer se expandiu os braços; o dorso veio para tráz e a BB veio para a frente “Certo”. “Eu fiquei para trás mas a BB veio para a minha frente; Não … fui só mas cheguei a andar para tras. Foi só “…A BB veio para a frente; P-A sua Colega BB pos-se esta sim o procurador – Sim”; Viu o arguido empurrar a sua Colega BB? Não “; 6º- A BB à primeira pergunta respondeu afirmativamente, só depois disse que pensava; (transcrição do minuto 10:25 da gravação) 7º- Disse que se meteu entre o arguido e a colega mas disse que andou para tras, e, se tal fosse verdade, a camarada tinha de andar para traz porque estava atrás daquela; 8º- Se a mesma se tivesse mantido entre o arguido e a camarada, a então camarada teria de ter visto este a ser empurrado, e esta negou ter visto; 9º- Se a BB se tivesse mantido entre o arguido e a camarada aquela teria de ver a mesma a ser empurrada, o que não aconteceu; 10º Se a camarada estava junto ao arguido, porque este a empurrou, mas sem se mexer com o empurrão, então fica no mesmo sítio e não havia espaço para o arguido a colega para que ele se metesse no meio?!; 11º- A lesada, CC, não confirmou que a BB ofendida, foi empurrada nem que se pôs no meio delas; 12º- Estas discrepâncias e divergências só se tornam evidentes e flagrantes com a transcrição, quase total, dos respectivos depoimentos; 13º- O gesto de puxar ou empurrar, contrariamente de dar um tabefe na cara, (este sim, punitivo) são gestos correntes este os interlocutores; 14º- Puxar ou empurrar uns aos outros, sem qualquer intenção de provocar dores ou desconforto físico; 15º- O que afirmavam duas testemunhas (não ofendidas) foi que o arguido foi agarrado, por uma das Guardas, e só tentou soltar-se; 16º O DD, afirmou que “houve uma ligeira troca de empurrões nada que fosse agressivo” (transcrição de 6:07 ao minuto 6.13); “Quando disse que houve troca de empurrões entre a guarda e o AA estava a tentar ir ao alcance do amigo. Não houve qualquer tipo de gesto, a situação escalou mesmo foi a partir de a agente que o estava a segurar (transcrição do minuto 11:52 ao minuto 11:62); “Houve aquela troca de empurrões, inicialmente, este a guarda e o AA (transcrição do minuto 11:48 a 11:52); “Foi neste momento que houve a troca de empurrões para se tentar libertar da guarda (transcrição do minuto 24:06 ao minuto 27:03) e que “Ele tentou chegar ao EE e a Guarda interviu, pôs-se à frente do agente e agarrou o AA nos colarinhos” (transcrição desde o minuto 24:09 até ao 24:13); 17º- Por sua vez, o FF disse “Ele veio na direção do EE e foi agarrado por uma das Militares (transcrição do minuto 3:07 ao 3:09); “Não é agressão viu o AA soltar-se para tentar chegar ao EE (transcrição desde minuto 6:00 até ao minuto 6:03)“A- Quem é que agarrou o AA e como é que foi agredido? T- Eu, penso que fui uma das policias que o agarrou. E ele estava a tentar ir na direção do EE (transcrição desde o minuto 9:44 ao minuto 10:05) “Acho que o agarrou normalmente. Não foi pelo braço ou pela cintura e o AA tentou soltar-se”. (transcrição do minuto 9:57 ao minuto 10:05); “Não me lembro onde foi agarrado mas foi agarrado por uma das policias (transcrição desde o minuto 10:13 ao minuto 10:15) e; ainda, “Todo o movimento foi a tentar soltar-se” (transcrição do minuto 13:06 ao minuto 13:12); 18º- Ambas as testemunhas (que não ofendida) relataram que o arguido foi agarrado, por uma das guardas, e limitou-se a soltar-se e a dar um ligeiro empurrão; 19º- O instinto primário de qualquer pessoa que é agarrada é o de soltar-se, sem qualquer outro movimento que não fosse o necessário a lograr soltar-se; 20º- A guarda que o agarrou o arguido é que cometeu um crime à integridade física simples do arguido e não este um do coação agravado; 21º- Não se pode olvidar que, as militares das forças policiais são sobrecapacitadas e preparadas para terem de agir de outra forma que não agarrar um civil; 22º- O arguido não visou atingir a integridade física das militares mas tão só libertar-se de ter sido agarrado; 23º- Da prova produzida e da aplicação do princípio, “in dúbio pro reo”, versões antagónicas e contraditórias terão de levar a Tribunal a “non liquet” de prova – o que foi o que o Tribunal recorrido fez; 24º- A pretendida alteração da matéria de facto deve ser votada ao insucesso; 25º- O preenchimento do crime em causa não se verifica; 26º- Um empurrão em militar, sem qualquer dor ou desconforto físico não é susceptível de Preencher o tipo objectivo do ilícito, em causa nos presentes; 27º- Não ultrapassando o grau de significância necessária à integridade física; 28º- Não podendo, assim, fundar o preenchimento do tipo de crime em causa; 29º- O arguido, ora recorrido, foi agarrado e libertou-se. Termos em que, deve o recurso ser rejeitado e, quando, assim, se não entenda ser julgado improcedente, fazendo-se, assim, J U S T I Ç A.
*
Remetidos os autos a este tribunal o Ministério Público emitiu parecer que concluiu assim (transcrição): 1. Comete o crime de resistência e coação de funcionário o arguido que com vista a obstar a que as duas agentes de autoridade (militares da GNR) concretizassem a sua missão de revista a colega fundadamente suspeito de posse de canábis, suspeita essa decorrente de o cidadão se encontrar no interior de veículo de onde provinha um odor a tal estupefaciente, seguido de saída do veículo pelo referido colega, transportando uma bolsa, que se recusou a exibir, começou a injuriar as militares e a gritar, chegando ao ponto de as empurrar com as mãos na zona superior do tronco, na zona das clavículas, para que estas não revistassem o referido colega, assim visando impedir a revista do mesmo e sua detenção por posse de droga. 2. Neste tipo legal de crime protege-se reflexamente/funcionalmente a pessoa do “funcionário” incumbido de desempenhar determinada tarefa, a sua liberdade individual, mas a consumação ocorre em função da violência, incluída a ameaça grave ou ofensa à integridade física, e da oposição ou constrangimento, sendo inequivocamente apta para o efeito de preenchimento do tipo legal de crime em causa a violência descrita. 3. Os empurrões deliberados e agressivos, ainda que não graves, contra as duas militares em causa, membro de força militar (GNR), no exercício das suas funções, integra o conceito penal de violência, com idoneidade para concretizar a oposição do autor à prática do ato devido, que no caso se tratava de uma revista. 4. Estamos no polo oposto do direito constitucional de resistência do art.º 21.º da Lei Fundamental, pois o arguido visou evitar e impedir a atuação legítima da GNR. Termos em que, sem prejuízo do suprimento de V.ªs Ex.ªs, se deve julgar o recurso procedente, assim se fazendo a tão costumada justiça!
*
Foi cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2 do Código de Processo Penal (doravante CPP).
*
Após os vistos, foram os autos à conferência.
* II.
Cumpre apreciar e decidir, tendo em conta que é pelas conclusões do recurso que se afere o respetivo âmbito - sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso -, e que analisando a síntese conclusiva temos como questões a apreciar:
- alteração da factualidade provada (facto 5) e não provada (factos g) e h)) com a consequente condenação do arguido pela prática do crime de resistência e coação sobre funcionário.
- subsidiariamente, convolação do referido crime para dois crimes de ofensa à integridade física qualificados p.p. artigo 131º nº 2 l), 143º e 145º, nº 1, a) e 2 do Código Penal.
*
É a seguinte a matéria de facto fixada em 1ª instância e respetiva fundamentação (transcrição):
1. No dia 29-10-2022, cerca das 23H00, quando se encontrava no interior do ... Bar, sito na Avenida ..., nesta cidade, e após ter ingerido bebidas alcoólicas, o arguido foi alertado por GG que amigos seus se encontravam a ser fiscalizados pela Guarda Nacional Republicana.
2. Acto contínuo, o arguido saiu daquele estabelecimento e aproximou-se da patrulha da Guarda Nacional Republicana composta pelas militares BB e CC, que se encontravam devidamente uniformizadas no exercício das suas funções.
3. Nesse momento, o arguido interveio dizendo àquelas militares: «revistem-me a mim que eu também tenho estupefacientes; e vocês não lhe podem revistar a mala sem um mandado; vocês não valem nada, suas putas, sois o sexo fraco».
4. Enquanto proferia estas expressões, o arguido tentava impedir fisicamente as militares de procederem à revista colocando-se na frente das mesmas, apesar de lhe ter sido pedido para se afastar, o que o arguido não fez.
5. Após, o arguido aproximou-se quer da Guarda BB, quer da Guarda CC e, com as mãos abertas, empurrou cada uma delas uma vez na zona da clavícula.
6. Em face da conduta do arguido, as militares solicitaram a presença de reforços no local, mantendo o arguido a conduta referida no facto 4.
7. Já na presença do Cabo HH, do Guarda II e do Guarda JJ, que se encontravam devidamente uniformizados, o arguido disse: «vocês não sabem quem eu sou; vocês vão ficar a conhecer o meu pai; vocês não sabem quem é o meu pai».
8. Nesse momento e após a chegada de mais uma patrulha da Guarda Nacional Republicana foi dada voz de detenção ao arguido e o mesmo foi algemado.
9. Ao actuar da forma acima descrita, o arguido pretendia evitar que aqueles continuassem com a fiscalização de EE, bem como manter a paz e tranquilidade publicas, desta forma impedindo aqueles de exercer as suas funções, o que quis e conseguiu, bem sabendo o arguido que aqueles militares da Guarda Nacional Republicana eram agentes de autoridade, no legítimo exercício das funções que por lei estão cometidas à Guarda Nacional Republicana e a actuar no e por causa do legítimo exercício daquelas funções, enquanto elemento de uma força de segurança.
10. Com a conduta atrás descrita, agiu o arguido com o intuito concretizado de injuriar as ofendidas, dirigindo-lhe palavras que atentavam contra a sua honra e consideração, sabendo também que as mesmas eram militares da Guarda Nacional Republicana e que estavam no exercício das suas funções, o que representou.
11. O arguido agiu ainda de forma livre deliberada e consciente, bem sabendo que estes eram militares da Guarda Nacional Republicana e se encontravam no exercício das suas funções.
12. O arguido sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei.
*
Mais se provou que o arguido:
13. Nas circunstâncias de tempo e lugar aludidas nos factos acima referidos, encontrava-se sob o efeito do álcool.
14. É tido por amigo dos amigos e da família, voluntarioso, extrovertido, impulsivo, respeitador, brincalhão, bem-disposto, pacífico e bom profissional.
15. É gestor comercial e aufere 2.000,00 EUR (dois mil euros) mensais de vencimento.
16. Reside em habitação arrendada, despendendo 600,00 EUR (seiscentos euros) mensais para pagamento da renda.
17. É solteiro e tem um filho com 02 (dois) anos de idade.
18. Despende cerca de 250,00 EUR (duzentos e cinquenta euros) mensais com as necessidades básicas do seu filho.
19. Tem a cargo dois créditos pessoais, despendendo 110,00 EUR (cento e dez euros) mensais para pagamento dos mesmos.
20. Possui licenciatura em Marketing e Publicidade.
21. Não possui qualquer registo no seu certificado criminal.
*
Factos não provados Com interesse para a decisão a proferir, são os seguintes os factos não provados constantes da acusação: a) No momento seguinte ao facto 2, as militares informaram EE que iriam revistá-lo devido ao facto de aquele cheirar a estupefacientes. b) Nas circunstâncias de tempo e lugar a que se refere o facto 3, o arguido disse ainda: «deixem o meu amigo em paz, que eu sei bem quais são os nossos direitos caralho». c) O arguido empurrou as militares BB e CC mais do que uma vez. d) Os empurrões a que se refere o facto 5 foram desferidos na zona do peito das militares BB e CC. e) Nas circunstâncias referidas no facto 7, o arguido continuou a tentar, fisicamente, impedir os militares de procederem à revista a EE. f) Como os militares referidos no facto 7 se colocaram entre o arguido e as Guardas BB e CC e EE, o arguido aproximou-se do Cabo HH e empurrou-o em zona do corpo não concretamente apurada. g) O arguido não hesitou em constranger fisicamente os referidos militares da Guarda Nacional Republicana, agredindo-os da forma descrita. h) O arguido agiu com o propósito de ofender o corpo das Guardas BB, CC e do Cabo HH, o que logrou conseguir.
*
Não foram considerados os demais factos constantes da acusação, quer por consubstanciarem matéria sem relevância para a decisão da causa, quer por se tratar de matéria conclusiva, ou de Direito.
*
Motivação da matéria de facto O Tribunal analisou a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento de forma livre, conjugada e com espírito crítico, atendendo, ainda, ao disposto no artigo 127.ᵒ do Código de Processo Penal, formando positivamente a sua convicção nos seguintes termos quanto aos factos provados: A propósito dos factos 1 a 8 e 13 coube ao Tribunal a tarefa de analisar as declarações do arguido, os depoimentos de CC (militar da Guarda Nacional Republicana), BB (militar da Guarda Nacional Republicana), HH (militar da Guarda Nacional Republicana), KK (militar da Guarda Nacional Republicana), LL (militar da Guarda Nacional Republicana), JJ (militar da Guarda Nacional Republicana), MM (amigo do arguido), FF (amigo do arguido) e EE (amigo do arguido), bem como o auto de notícia, o auto de ocorrência e o teste rápido (estes juntos aos autos a 31-10-2022, referência 3038733). Assim, o arguido começou por assumir os factos 1 (reforçado, quanto ao motivo da fiscalização, pelo auto de ocorrência e pelo teste rápido), 2, 4, 6, 8 e 13 (este também asseverado por HH, LL, JJ e BB), embora afirmasse não se recordar dos factos 3, 5 e 7. Não deixando de reconhecer não ter agido com a razão no momento em que as militares referidas no facto 2 se preparavam para revistar a testemunha EE, admitindo pretender evitar tal acontecimento, foi cauteloso quanto aos factos susceptíveis de lhe causarem desassossegos penais, circunstância que, se percebeu evidente, vinha amplamente experimentada, pois que não se mostra minimamente verosímil que alguém se recorde do encadear lógico e cronológico de um conjunto de acontecimentos, mas apresente falhas de memória precisamente, e apenas, quanto aos factos capazes de o comprometerem penalmente. Também assim, e na senda do auto de notícia, CC, BB, HH, JJ, MM, FF e EE, foram unânimes quanto ao relato que fizeram dos factos 2, 4, 6 em parte («as militares solicitaram a presença de reforços no local»), 8 e 13, todos os descrevendo de modo objectivo e circunstanciado sem incoerências relevantes entre si, todavia, os seus depoimentos haveriam de se mostrar diametralmente opostos quanto aos factos 3, 5 e 7. E a respeito destes, cabe dizer que foi através dos depoimentos de CC, BB, HH e JJ, que o Tribunal se convenceu da veracidade do sucedido, embora se não possa deixar de reconhecer que, a espaços, BB se mostrou tentada a exacerbar a realidade, o que teve, como veremos, reflexos ao nível da factualidade não provada. Concretizando: BB e CC descreveram os factos 3 e 5 (sendo certo CC, quanto a este concreto, apenas no que diz respeito à sua pessoa) de modo absolutamente objectivo, assertivo e coerente entre si, circunstanciando tal factualidade de modo lógico e cronológico, não deixando ao Tribunal a mais ínfima dúvida acerca do sucedido. Ademais, CC mostrou-se de tal forma sincera que não se coibiu de negar o que lhe era extraordinariamente simples afirmar, sem que forma houvesse de lhe imputar falsidade no discurso. Falamos, especificamente, da circunstância de ter assumido não ter visto BB ser empurrada, do mesmo modo que deixou claro tampouco ter sentido qualquer tipo de dor ou incómodo com o empurrão que sofreu do arguido, o qual sequer foi de modo a fazê-la mover-se fisicamente, o que só reforçou a ideia já clara do Tribunal de que o seu único comprometimento único era com a verdade. Neste ponto, contudo, importa deixar uma nota quanto ao depoimento de BB: esta testemunha mencionou ter sofrido um empurrão na zona das omoplatas, sendo certo, no entanto, que tal referência mais não foi do que mero lapso. E dizemos que foi mero lapso, na medida em que a testemunha, descrevendo o facto 5, e após afirmar que o empurrão não foi na zona do peito, apontou com ambas as mãos para o local do corpo onde o mesmo ocorreu, como sendo na zona das clavículas, embora as tenha, equivocada, apelidado de omoplatas, assim se justificando o desenho do facto 5. Já o facto 7 emana da conjugação dos depoimentos de HH e JJ, os quais, colocados quer mutuamente, quer por CC e BB no local dos acontecimentos, o descreveram de modo espontâneo, coerente e circunstanciado. Para findar, deixar claro por que motivo o Tribunal não atribuiu credibilidade aos depoimentos de MM, FF e EE. Estas testemunhas, além de apresentarem versões visivelmente tendenciosas (em benefício do arguido), revelando desde o primeiro momento ter noção da amplitude conveniente do seu discurso, acabaram quer por se contradizer entre si, quer por contrariar o próprio arguido. Assim, e sendo certo que todos negaram a ocorrência dos factos 3 e 7, a verdade é que, quanto ao facto 5, EE negou qualquer contacto físico entre o arguido e as militares, assegurando até que, a ter acontecido, não teve na base um propósito com esse sentido; por seu turno, FF mencionou que o arguido foi agarrado por uma das militares da Guarda Nacional Republicana, tendo-se apenas tentado libertar; já MM afiançou ter existido, de parte a parte, uma ligeira troca de empurrões. Mas mais do que isso. Não obstante ser o próprio arguido quem assume não ter agido com a razão, reconhecendo-se exaltado (o que também KK afirmou de modo assertivo) e com intenção de evitar a revista a EE, aquelas três testemunhas tentaram passar a imagem de que o arguido, afinal, mais não tentou do que fazer ver às militares da Guarda Nacional Republicana, ainda que de forma segura e categórica, que a sua actuação estava longe da legalidade. Donde, contrariando esta versão aqueloutra que o Tribunal valorou, não logrando abalar a convicção de que a verdade é aquela que se motiva e resulta dos factos provados, mais sendo certo que se contradiz entre si, apresentando quatro variações (arguido, MM, FF e EE), não podia ser a mesma levada em conta. Os factos 9 a 12 têm a sua base na conjugação de toda a prova dos autos aliada às regras de experiência da vida, sendo que nada nos autos permite concluir que o arguido se furte ao padrão do conhecimento geral de um cidadão médio (o qual não ignora aqueles factos) ou que tenha sido outro o modo de acção daquele. O facto 14 foi tido em consideração em face da conjugação dos depoimentos de NN (pai do arguido), OO (mãe do arguido) e PP (amigo do arguido) que, a respeito, se revelaram credíveis, demonstrando a forma como vêem o arguido. Os factos 15 a 20 emanam das declarações do arguido, o qual se mostrou credível, sendo ainda certo não ter sido produzida qualquer prova que infirmasse tal factualidade. O facto 21 tem a sua base no certificado do registo criminal junto aos autos a 24-10-2024 (referência 3758585).
*
Quanto aos factos não provados: Relativamente aos factos a), b) e e), nenhuma prova se fez. Os factos c), d) e f), foram negados pelos próprios intervenientes de cada um deles, como seja pelas militares BB e CC e pelo militar HH. A respeito dos factos g) e h) impõe-se dizer o seguinte: conforme já referimos acima, não pode deixar de se reconhecer que, a espaços, BB se mostrou tentada a exacerbar a realidade. E tanto que tentou que, ao descrever os empurrões do arguido, quer em si, quer em CC, quis transmitir que ambos foram desferidos com força, provocando não apenas dor, como se mostraram impactantes ao ponto de fazer ambos os corpos moverem-se fisicamente (ainda que, obviamente, em momentos distintos). Ora isso, e como já vimos, é desmentido por CC, a qual assumiu não ter sentido qualquer tipo de dor ou incómodo com o empurrão do arguido, não tendo o mesmo empurrão força suficiente para, sequer, a fazer mover-se (o que ademais se compreende pelo facto de o arguido se encontrar embriagado e, por isso, longe das suas plenas capacidades físicas, mais sendo certo que está longe de ter, conforme pôde ser observado pelo Tribunal, uma compleição física marcadamente superior ao de qualquer uma das militares). Donde, tendo a própria visada do empurrão (CC) negado o que BB pretendeu fazer parecer verdade, sob o Tribunal abateu-se a dúvida de saber se o empurrão naquela segunda foi efectivamente como a mesma o descreveu ou se, pelo contrário, almejou a testemunha dar ao empurrão por si experimentado a amplitude que só pelo depoimento de CC não conseguiu dar ao empurrão sofrido por esta. E se é assim, tem vez o princípio do in dubio pro reo, ordenando a inserção dos factos ora motivados no elenco dos não provados.
*
Fundamentação de Direito Convocados os factos, importa aplicar-lhes o Direito, tendo como certo que para o agente poder ser considerado responsável criminalmente, tem de praticar um facto típico, ilícito e culposo, sendo que o facto será típico quando a conduta fáctica e humana preencher todos os elementos objectivos e subjectivos de um tipo legal de crime. Como deixámos dito, o arguido vem acusado pela prática, em autoria imediata, na forma consumada e em concurso efectivo, de: - dois crimes de injúria agravada, previstos e punidos pelo artigos 181.ᵒ, n.ᵒ 1, 184.ᵒ e 132.ᵒ, n.ᵒ 2, alínea l), do Código Penal; e - um crime de resistência e coacção sobre funcionário, previsto e punido pelo artigo 347.ᵒ, n.ᵒ 1, do Código penal, este em concurso aparente com três crimes de ofensa à integridade física qualificada, previstos e punidos pelo artigo 143.ᵒ, n.ᵒ 1, 145.ᵒ, n.ᵒˢ 1 e 2, e 132.ᵒ, n.ᵒ 2, alínea l), do Código Penal.
*
Pela prática do crime de injúria (…)
*
Por seu turno, é punido pelo crime de resistência e coacção sobre funcionário «quem empregar violência, incluindo ameaça grave ou ofensa à integridade física, contra funcionário ou membro das Forças Armadas, militarizadas ou de segurança, para se opor a que ele pratique ato relativo ao exercício das suas funções, ou para o constranger a que pratique ato relativo ao exercício das suas funções, mas contrário aos seus deveres». O bem jurídico que se protege com a incriminação é a autonomia intencional de funcionário, tratando-se de um crime de dano quanto ao grau de lesão do bem jurídico e de resultado quanto à forma de lesão desse bem. É ainda um crime de resultado cortado, ou seja, prevê-se, para além do dolo do tipo, a intenção de produção de um resultado que não faz parte do tipo de ilícito, motivo pelo qual se não exige um resultado, mas a simples intenção do agente. Já no que respeita ao tipo subjectivo, o mesmo crime pode apenas ser cometido por dolo, uma vez que a negligência não se encontra especialmente prevista (cf. o artigo 13.ᵒ do Código Penal). Ora, atentos os factos provados, é seguro afirmar que o arguido tentou impedir fisicamente as militares de procederem à revista de um dos seus amigos, colocando-se na frente das mesmas, apesar de lhe ter sido pedido para se afastar, sendo certo que se aproximou quer da Guarda BB, quer da Guarda CC e, com as mãos abertas, empurrou cada uma delas uma vez na zona da clavícula. A questão que se coloca é, pois, a de saber se tal comportamento do arguido se pode subsumir à previsão normativa que demos a conhecer («quem empregar violência, incluindo ameaça grave ou ofensa à integridade física, contra funcionário ou membro das Forças Armadas, militarizadas ou de segurança, para se opor a que ele pratique ato relativo ao exercício das suas funções, ou para o constranger a que pratique ato relativo ao exercício das suas funções, mas contrário aos seus deveres»), embora desde já aceitando que o arguido teve, efectivamente, como propósito, impedir a acção de fiscalização das militares. Em primeiro plano, importa não ignorar que quer a ameaça grave, quer a ofensa à integridade física a que se refere o artigo 347.ᵒ, n.ᵒ 1, do Código Penal, mais não são do que apenas duas modalidades das inúmeras formas de violência que podem perfectibilizar o crime em causa, podendo aquela violência traduzir, ou ficar distanciado, da utilização da força física. Dito de outra forma: para se considerar preenchido o crime de resistência e coacção sobre funcionário importa avaliar, por um lado, se foi empregue violência (verbal ou física) e, por outra banda, se o grau de violência empregue se apresenta idóneo a perturbar a liberdade de acção do funcionário. Não obstante, tal não é suficiente: «Há-de considerar-se, em todo o caso, que os destinatários da coacção possuem, nalgumas das hipóteses deste tipo legal, especiais qualidades no que diz respeito à capacidade de suportar pressões e estão munidos de instrumentos de defesa que vulgarmente não assistem ao cidadão comum. Membros das Forças Armadas, militarizadas ou de segurança não são, para efeitos de atemorização, homens médios. O grau de violência ou de ameaça necessários para que se possa considerar preenchido o tipo não há-de medir-se, por conseguinte, pela capacidade de afectar a liberdade física ou moral de acção de um homem comum. A utilização do critério objectivo-individual (…) há-de assentar na idoneidade dessa violência ou ameaça para perturbar a liberdade de acção do funcionário. Assim, será natural que uma mesma acção integre o conceito de violência relevante nos casos em que o sujeito passivo for mero funcionário e seja desvalorizada quando utilizada para defrontar, por exemplo, um militar. Ou seja: nalgumas hipóteses desta concreta coacção que se considera, hão-de ter-se em conta não apenas as eventuais sub-capacidades do coagido ou ameaçado, mas talvez sobretudo as suas "sobre-capacidades"» (Cf. Comentário Conimbricense do Código Penal. Parte Especial. Tomo III (Artigos 308.ᵒ a 386.ᵒ). Coimbra: Coimbra Editora. 2021. (Cristina Líbano Monteiro em anotação ao artigo 347.ᵒ). ISBN 972-32-0856-3, p. 341, § 9). Ainda assim, e «se é correcta esta distinção tendo em conta a sensibilidade do coagido, não pode, no entanto, tratando-se de agentes da autoridade policial exigir-se para o preenchimento do tipo legal formas extremas de violência ou de ameaça contando com a especial preparação dos agentes, o que seria contraproducente tendo em conta os fins em vista» (cf. o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 09-03-2016, Processo n.ᵒ 27/07.1PACSC.L1-3 (Conceição Gonçalves), disponível em dgsi.pt). Em considerável suma: podendo concluir-se por um comportamento enquadrável na definição de violência, importa, a jusante, não ignorar as características do agente (tendo em conta as suas capacidades e preparação) e as especiais qualidades do destinatário, embora sem esvaziar a norma com exigências de comportamentos excessivamente intensos ou exacerbados. Revertendo para o caso concreto, cabe acrescentar ao que já dissemos do comportamento do arguido que o mesmo, no momento em que age, não só o faz sozinho como se encontrava alcoolizado, tendo a sua acção se dirigido a duas militares da Guarda Nacional Republicana que, dizem-nos as regras de experiência, se fazem acompanhar de arma de fogo, bastão extensível e aerossol de defesa com gás. Ainda a respeito, dos factos provados não resulta que os empurrões levados a efeito em ambas as militares tivessem sido efectuados de forma a ferir qualquer uma delas, antes se mostra, isso sim, não provado que o arguido agiu com o propósito de ofender o corpo daquelas (em face do que ficou dito em sede de motivação da matéria de facto), pelo que cuidamos poder concluir, tendo em consideração todo o contexto factual, que o comportamento do arguido, embora desrespeitoso, pouco reflectido, imprudente e precipitado, não se mostrou idóneo a impedir a acção de fiscalização pretendida, tampouco é suficiente para atingir a dignidade penal que se espera da definição de violência, na vertente de ofensa à integridade física: «I – O crime de ofensa à integridade física supõe a produção de um resultado que é a ofensa do corpo ou da saúde de outra pessoa e que tem de ser imputado à conduta ou à omissão do agente, de acordo com as regras gerais de apuramento da causalidade. II – Conforme entendimento da doutrina e da jurisprudência das Relações, as lesões insignificantes estarão excluídas do referido tipo legal, tendo em conta que os tipos penais não são neutros mas antes exprimem já, e de uma forma global, um sentido social de desvalor. III – Se alguém coloca as mãos nos ombros de outrem, empurrando essa pessoa para trás, mas não lhe provocando quaisquer dores, tal empurrão não pode deixar de considerar-se insignificante do ponto de vista da afetação da integridade física, enquanto bem jurídico aqui tutelado» (cf. o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 28-04-2021, Processo n.ᵒ 1132/18.4PBMTS.P1 (Eduarda Lobo), disponível em dgsi.pt). Por conseguinte, e se, como parece ser pacífico (não vendo nós razão para que não seja), os «membros das forças de segurança não são, para efeitos de atemorização, homens médios» (cf. o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 18-05-2022, Processo n.ᵒ 10/20.1PACVL.C1 (João Navais), disponível em dgsi.pt), então cremos que entender, no caso concreto, que a atemorização se verifica apenas pelo facto de as militares serem do sexo feminino, ignorando quer a sua preparação militar para lidar com situações de oposição, quer o facto de se encontrarem em maior número do que o opositor (ademais embriagado e, por isso, longe das suas plenas capacidades físicas, mais sendo certo que está longe de ter, conforme pôde ser observado pelo Tribunal, uma compleição física marcadamente superior ao de qualquer uma das militares), seria assumir, e com isso concordar, que aquelas não só se mostram despreparadas para o exercício das funções, como igualmente não devem levar por diante qualquer tipo de patrulha ou fiscalização sem a presença de um elemento masculino, o que, quanto a nós, está longe de ter as mãos dadas com a razão ou com a lógica. Isto dito, não se vislumbram preenchidos os elementos de que depende a conclusão de estarmos perante a prática de qualquer crime, pelo que se impõe decisão absolutória.
*
Apreciação do recurso. Questão Prévia.
Já depois de remetidos os autos a este tribunal foi dirigido à primeira instância um requerimento com a afirmação feita por uma testemunha de que no processo “foi cometida uma falha que deve ser reparada”, deixando expresso o entendimento de que “os depoimentos prestados acabaram por prejudicar o arguido em parte importante” tendo sido requerida “a repetição da prova da acusação por forma a restabelecer a verdade”.
O Mmo Juiz da primeira instância mandou dar conhecimento a este Tribunal.
Trata-se de um requerimento anómalo que não pode ser apreciado no âmbito do presente recurso, pelo que sobre ele nada há a decidir.
*
Insurge-se o recorrente contra a matéria fixada em primeira instância pelo entendimento de que ficaram provados factos que o tribunal recorrido não considerou. E assim propõe como redação para o facto 5º: «Após, o arguido aproximou-se quer da Guarda BB, quer da Guarda CC e, com as mãos abertas, empurrou cada uma delas uma vez na zona da clavícula, tendo o torso da militar CC se deslocado em sentido oposto à força exercida pelo arguido e outrossim a militar BB dado alguns passos atrás, sentido, ainda, esta última dores nas zonas atingidas»;
Mais requer a eliminação dos factos não provados g) e h) com aditamento de um facto provado do seguinte teor: O arguido, ao atuar como atuou, agiu com o propósito concretizado de molestar o corpo e a saúde das militares BB e CC, desferindo-lhes empurrões no corpo, assim como de lhes produzir as lesões verificadas e dores, o que representou e quis.
Discorda, portanto, o recorrente da interpretação do tribunal a quo do depoimento das militares BB e CC. Recorde-se que, quanto à primeira, o tribunal considerou ter exacerbado a realidade e a segunda ter feito um depoimento revelador de compromisso com a verdade, apreciação da qual o recorrente discorda. E, assim, o recorrente depois de explicar por que razão não concorda com a interpretação do tribunal conclui que “de acordo com as regras da experiência e da lógica, o arguido ao atuar como atuou, agiu com o propósito concretizado de molestar o corpo e a saúde das militares BB e CC, desferiu-lhes empurrões no corpo, assim como de lhes produzir as lesões verificados e dores o que representou e quis”.
Portanto, em suma, o recorrente entende que o tribunal a quo errou no julgamento da matéria de facto. Para tanto indicou os pontos que considerou incorretamente julgados e as provas que, na sua opinião, levariam a decisão diferente.
Isto é, o recorrente pretende trazer a este tribunal a demonstração de que a sua apreciação da prova é preferível à do tribunal recorrido. E, diga-se, pode, efetivamente, fazê-lo (porque ao contrário do que tantas vezes se vê escrito, nada impede o recorrente de discutir e tentar alterar a convicção formada em primeira instância para que seja substituída por aquela que resulta da sua visão e convicção probatória), isto é, pode pedir a este tribunal que corrija a apreciação feita em 1ª instância, até porque se a primeira instância beneficia do princípio da livre apreciação da prova, também a segunda instância dele beneficia.
O que distingue verdadeiramente a apreciação de uma e de outra instâncias é a imediação e oralidade que a segunda instância não tem. A primeira instância vê e ouve, presencialmente, o arguido e as testemunhas, aprecia o comportamento não verbal, formula as perguntas que entende adequadas, tudo circunstâncias de que o tribunal de segunda instância não beneficia.
E só por essa razão o tribunal de segunda instância não tem quanto ao recurso da matéria de facto os mesmos poderes que teve a primeira instância, apesar de ambos disporem de possibilidade de apreciar livremente a prova. Ora, assim sendo, a segunda instância só pode alterar o decidido se as provas indicadas pelo recorrente impuserem decisão diferente (artigo 412º, nº 3, b) do CPP).
No caso, embora a prova produzida e examinada em audiência permitisse, eventualmente, uma decisão diferente, ela não impõe uma decisão diferente, o que basta para que o recurso da matéria de facto não possa obter provimento.
Efetivamente, lendo a sentença recorrida, cuja fundamentação está muito cuidada e clara, percebe-se por que razão o tribunal a quo decidiu como decidiu, porquê qualificou o comportamento do arguido em audiência cauteloso quanto aos factos suscetíveis de lhe causarem desassossegos penais; porquê afirmou não se poder deixar de reconhecer que, a espaços, BB se mostra tentada a exacerbar a realidade; porquê entendeu que CC se mostrou de tal forma sincera que não se coibiu de negar o que lhe era extraordinariamente simples afirmar, sem que forma houvesse de lhe imputar falsidade no discurso (…) o que só reforçou a ideia já clara do Tribunal de que o seu único comprometimento era com a verdade; e porquê considerou que as testemunhas MM, FF e EE apresentaram versões visivelmente tendenciosas. Isto é, o tribunal a quo não se limitou a ouvir o que foi dito, analisou a forma como foi dito para atribuir credibilidade a uns depoimentos mais do que a outros. Fez uma análise crítica da prova, ponderou-a e deu a conhecer o raciocínio, transmitindo aos destinatários da decisão a razão pela qual foi aquela – e não outra - a conclusão a que chegou. E, de facto, ouvindo as militares, não há dúvida de que nenhuma sentiu dores ou sofreu lesões (a militar CC negou dores; a militar BB falou de impacto, mas não de dor), o empurrão não chegou para que a militar CC sequer se movimentasse do local onde estava, tudo como bem explica o juiz a quo. Assim a redação proposta pelo recorrente para a factualidade que pretende ver alterada não traduz rigorosamente a realidade apurada. Portanto, não há dúvida de que a visão que o recorrente traz da prova não impõe decisão diversa. Mas mesmo que, em tese, a pudesse admitir, seguramente não imporia uma nova redação dos factos, o que basta para se poder concluir que não pode este tribunal ad quem alterar a matéria de facto.
Entende, ainda, o Ministério Público nesta Relação que, mesmo sem alteração da matéria de facto, o arguido não poderia deixar de ser condenado como autor material de um crime de resistência e coação sobre funcionário p.p. artigo 347º do CP.
Vejamos se assim é.
Dispõe o artigo 347º do CP que: 1 - Quem empregar violência, incluindo ameaça grave ou ofensa à integridade física, contra funcionário ou membro das Forças Armadas, militarizadas ou de segurança, agente das forças ou dos serviços de segurança, guarda prisional, ou bombeiro e demais agentes de proteção civil, para se opor a que ele pratique ato relativo ao exercício das suas funções, ou para o constranger a que pratique ato relativo ao exercício das suas funções, mas contrário aos seus deveres, é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos.
2 - A mesma pena é aplicável a quem desobedecer ao sinal de paragem e dirigir contra funcionário ou membro das Forças Armadas, militarizadas ou de segurança, agente das forças ou dos serviços de segurança, guarda prisional, ou bombeiro e demais agentes de proteção civil, veículo, com ou sem motor que conduza em via pública ou equiparada, ou embarcação, que pilote em águas interiores fluviais ou marítimas, para se opor a que ele pratique ato relativo ao exercício das suas funções, ou para o constranger a que pratique ato relativo ao exercício das suas funções, mas contrário aos seus deveres, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.
O recorrente entende que o gesto levado a cabo pelo arguido de colocar as mãos nas clavículas das agentes da GNR, empurrando-as, basta para que se possa considerar preenchido o conceito de violência a que alude o normativo em causa.
Considerou o tribunal a quo que “para se considerar preenchido o crime de resistência e coação sobre funcionário importa avaliar, por um lado, se foi empregue violência (verbal ou física) e, por outro lado, se o grau de violência empregue se apresenta idóneo a perturbar a liberdade de ação do funcionário”.
Depois de citar o que a este propósito consta do Comentário Conimbricense e ao reverter as considerações para o caso concreto, concluiu o tribunal a quo que, tendo o arguido agido sozinho, alcoolizado, dirigindo a ação a duas militares que, pelas regras de experiência, se fazem acompanhar de arma de fogo, bastão extensível e aerossol de defesa com gás, sem o propósito de ofender o corpo das agentes, o comportamento do arguido foi desrespeitoso, pouco refletido, imprudente e precipitado, mas inidóneo a impedir a ação de fiscalização e insuficiente “para atingir a dignidade penal que se espera da definição de violência, na vertente da ofensa à integridade física”.
Efetivamente a violência pressuposta pelo artigo 347, nº 1 do CP há-de ser capaz de contrariar o poder de quem está munido de jus imperium. Como é dito por Cristina Líbano Monteiro in Comentário Conimbricense, III, Coimbra Editora, 2001, 341, e consta do excerto plasmado na sentença recorrida o grau de violência ou ameaça necessários para que se possa considerar preenchido o tipo não há-de medir-se, por conseguinte, pela capacidade de afetar a liberdade física ou moral da ação de um homem comum. A utilização do critério objetivo-individual (…) há-de assentar na idoneidade dessa violência ou ameaça para perturbar a liberdade da ação do funcionário.
Ora, se num depoimento totalmente merecedor de credibilidade para o tribunal a quo a agente CC disse que não sofreu qualquer tipo de dor ou incómodo com o empurrão, que nem sequer a fez mover-se, é evidente que se trata de uma ação criminalmente irrelevante.
É certo que tanto a resistência eficaz, como a ineficaz estão compreendidas na ofensa típica, mas tal não afasta a necessidade de se perceber no gesto do arguido um mínimo da aptidão e idoneidade para pôr em causa o poder público das militares, porque só assim ficaria integrado o conceito de violência exigida pelo tipo legal.
O recorrente faz outra leitura dos acontecimentos porque onde o tribunal afirma que o arguido agiu sozinho, entende o recorrente que o não estava por estar acompanhado de amigos; onde o tribunal afirma estar o arguido embriagado, o recorrente entende que não o estava ao ponto de se encontrar impedido de exercer oposição física; onde o tribunal afirma que o arguido ao empurrar as militares não as quis ferir, contrapõe o recorrente que pela experiência comum se chegava a conclusão contrária, tanto mais quanto as militares chamaram reforços.
Só que da prova produzida e apreciada também por este tribunal, resulta que o arguido agiu efetivamente sozinho, porque nenhum dos seus amigos (“se é que eram amigos”, como disse a militar BB) o secundou nas atitudes, até porque estavam afastados; agiu manifestando sinais notórios de embriaguez, o que minimizava a aptidão física como as agentes perceberam imediatamente ( ambas referiram que se notava que o arguido estava alcoolizado) e agiu sem querer ferir - e sem ferir - quem quer que fosse, porque mais do que molestar as agentes, queria evitar a fiscalização de um amigo. Quanto à chamada de reforços bem se percebe por questões de segurança, tanto mais quanto a atuação das militares se dirigia a várias pessoas.
Ora se perante a prova produzida se concluísse que uma atuação como a do arguido, que é objetivamente incorreta (basta pensar nas injúrias por que foi condenado) era suficiente para se estar perante o crime de resistência e coação sobre funcionário, então, estaria a degradar-se o conceito de violência exigido pelo tipo legal para que se possa falar de um comportamento adequado a deduzir oposição ao comportamento das autoridades (resistência), ou a constranger as autoridades (coação) a adotar um determinado comportamento.
É certo que, como faz notar o recorrente transcrevendo diversos acórdãos, a jurisprudência não é unânime na qualificação do que deve entender-se por atuação violenta para efeito do artigo 347º do CP. (Acórdãos que podiam ser contrapostos com outros como, por exemplo, da Relação de Guimarães de 11.11.2019 proferido no processo 36/15.7GEGMR ou da mesma Relação de 9.1.2017, proferido no processo 622/14.2GBBCL.G1, ou da Relação do Porto de 17.4.2013, proferido no processo 597/12.2GCOVR.P1, ou da Relação de Lisboa de 9.05.2017, todos eles retratando situações de maior gravidade do que a que nos ocupa. Vejamos, a título de exemplo, o que é dito em dois desses acórdãos:
Ac. RG de 9.01.2017 proferido no processo 622/14.2GBBCL.G1: I) O esbracejar de um detido que está prestes a ser algemado e a exaltação da sua companheira, acompanhada de empurrões e puxões, na tentativa de obstar a tal detenção, não são idóneos a atingir a liberdade de acção dos militares da GNR, nem constituem acções suficientemente constrangedoras susceptíveis de levar aqueles agentes de autoridade a deixarem de cumprirem o seu dever de agir. II) O comportamento dos arguidos não constitui elemento objectivo integrador do ilícito do artº 347, nº 1, do CP, ou seja, não integra o conceito de violência a que se reporta o preceito incriminador por não ser idóneo a intimidar, dificultar ou impedir de forma significativa a capacidade de actuação daqueles militares na situação em causa.(…);
Acórdão da Relação do Porto de 17.04.2013 proferido no processo 597/12.2GCOVR.P1 (referido também por Paulo Pinto de Albuquerque in Comentário do Código Penal à luz da CRP e da CEDH, 3ªedição, 1100): I - Elemento objetivo do crime de resistência e coação sobre funcionário, p. e p. pelo artigo 347º, n.º 1 do Código Penal, é o emprego de violência. II - A violência inclui as formas de violência psíquica e de ofensa à integridade física, uma vez que, como flui do normativo, a ameaça grave (vis compulsiva) e a ofensa à integridade física (vis phisica) são mencionadas como modalidades da violência.
III - Para a consumação do crime necessário se torna que a acção violenta ou ameaçadora seja idónea a atingir de facto o seu destinatário ou destinatários, isto é, que essa acção possa impedir o funcionário de concretizar a actividade por este prosseguida.
IV - Não comete o crime de resistência e coação sobre funcionário o agente que, ao ser-lhe dada voz de detenção, empurra dois agentes da GNR, começando a debater-se, a empurrar e a esbracejar para evitar a detenção, ao mesmo tempo que grita: “seus filhos da puta, eu vou-vos foder, eu mato-vos, vocês vão pagar por isto, estão fodidos” já que tal conduta não é dotada de idoneidade suficiente para inviabilizar os actos funcionais dos agentes da GNR).
Portanto, partindo das circunstâncias de cada caso, o tipo legal exige que a violência usada seja objetivamente adequada a anular, ou a dificultar de forma significativa, a capacidade de atuação do funcionário, sempre tendo em conta que os militares possuem especiais qualidades no que diz respeito à capacidade de suportar pressões e estão munidos de instrumentos de defesa que o comum dos cidadãos não tem.
Mas mesmo que se adotasse um critério mais restritivo, sempre se teria de concluir que o respeito pelos princípios da adequação e da proporcionalidade exigíveis a qualquer decisão determinaria que um comportamento inócuo sob o ponto de vista da oposição ou do constrangimento à atuação de militares, não basta para integrar o conceito de violência do artigo 347º do CP e, como tal, também não basta para que se convole a atuação por forma a subsumir-se ao crime de ofensa à integridade física qualificada, sob pena de se criminalizarem condutas que embora incorretas, não têm, como na situação em apreço, dignidade penal.
Terá, assim, o recurso de ser julgado improcedente.
*
III. DECISÃO.
Em face do exposto julga-se improcedente o recurso interposto pelo Ministério Público e confirma-se a sentença de primeira instância.
Sem custas (artigo 522º do CPP).
Notifique.
Coimbra, 11 de junho de 2025
Maria Teresa Coimbra
Rosa Pinto
Cândida Martinho