1 - Se a R. é contratada para prestação de serviços de levantamento topográfico, de arquitetura, peças desenhadas e escritas, isenções das especialidades, e telas finais, a fim de a A. obter licença de utilização de um imóvel na Autarquia, e emite declaração errónea/falsa de não apresentação de projecto das redes de abastecimento de águas, águas pluviais e águas domésticas, por a obra já se encontrar executada, quando tal não era verdade, cumpriu defeituosamente o contrato;
2- Além do acto ilícito, agiu com negligência/mera culpa (leve) se fez tal afirmação com base em simples observação visual, quando podia ter observado a caixa de saneamento localizada a curtos 50 m do imóvel e podia ter efectuado consulta confirmatória ou não na Autarquia;
3- Uma vez que a casa foi vendida pela A. a terceiros, com a crença que tal ligação ao saneamento público existia, o que não acontecia, o que levou esses terceiros a desencadear acção judicial contra a A., que só terminou com o pagamento pela A. dos custos de tal obra de saneamento, há nexo de causalidade adequado entre o facto da R. e o prejuízo da A.;
4- O prejuízo da A. abrange o valor desse particular serviço errado, e as custas do processo que teve de pagar, caso o erro e afirmação da R. não tivessem sido produzidos, mas não o valor da obra de saneamento, pois o valor de venda do imóvel abrangia tal saneamento, que não existia e que a A. teve de suportar, pois o valor da casa vendida teria de ser diminuído do valor da obra a fazer para instalar o dito saneamento;
5- Inexiste abuso de direito, na modalidade de desequilíbrio/desproporcionalidade no exercício jurídico, se ele não é manifesto, como acontece se o valor da prestação de serviço, no referido âmbito foi de 300 € e a indemnização a arbitrar a pagar pela R. à A. importa em 1.626 €
(Sumário elaborado pelo Relator)
I – Relatório
1. AA, residente em ..., instaurou acção declarativa contra A..., Lda., com sede em ..., peticionando a condenação da ré a:
a) pagar-lhe, a título de danos patrimoniais, a quantia global de 9.138,86 €, acrescida de juros vencidos e vincendos, contabilizados desde a citação até integral pagamento;
b) pagar-lhe, a título de danos não patrimoniais, a quantia global de 1.500 €, acrescida de juros de mora à taxa legal em vigor.
Alegou, em suma, ser dona de determinado imóvel que não tinha licença de habitabilidade nem certificado energético. A fim de o vender contratou a ré para a sua obtenção, tendo o Município emitido a licença de habitualidade. A ré declarou que a rede de ligação de águas à rede pública aparentava estar em bom estado de funcionamento. Vendeu o imóvel a terceiros, que a vieram a demandar judicialmente por falta de saneamento público do mesmo. Acabou por transacionar mediante o pagamento de determinada quantia. A responsabilidade pela errada informação foi a ré. Quantificou os transtornos por si sofridos em virtude da situação narrada. Reclamou o pagamento do serviço contratado à ré, o valor pelo qual efectuou a dita transacção e taxas de justiça dessa acção e ainda danos não patrimoniais.
A ré contestou, descrevendo os serviços contratados com a autora, designadamente isenções de especialidades, tendo-se deslocado ao local a fim verificar da (in) de emissão das declarações de isenção de especialidades e tudo aparentava estar bem, pelo exame visual que efectivou, certo que previamente a autora lhe transmitiu que o prédio tinha as ligações às redes de abastecimento de águas e de águas domésticas, o que declarou e era suficiente para obter a legalização do imóvel na autarquia. Ademais a infra-estrutura de saneamento no local simulava uma ligação à rede pública, dissimulando a descarga de saneamento para um ribeiro localizado nas imediações. A autora sabia da inexistência de ligação à rede pública ligação que não foi contratada coma ré. Inexiste qualquer nexo entre a sua atuação e as consequências para a autora da acção que contra si foi movida, sendo alheia à postura aí adotada pela autora. No que concerne aos danos não patrimoniais, alegou que não merecem a tutela do direito. Por fim, abuso de direito, nas modalidades de venire contra factum proprium e desproporcionalidade no seu exercício.
A autora respondeu, defendendo não existir qualquer abuso de direito.
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A final foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente, e, em consequência, absolveu a R. dos pedidos.
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2. A A. recorreu, tendo formulado as seguintes conclusões:
I- Em finais de 2020, por intermédio da agência imobiliária B..., sita na ..., entre a recorrente a e recorrida foi celebrado um contrato de prestação de serviços, mediante o qual esta se obrigou, junto da Câmara Municipal ..., a instruir procedimento destinado à obtenção de licença de habitabilidade, para um imóvel da pertença da aqui recorrente, sito em ..., concelho ..., e cuja pretensão era a alienação.
II- No âmbito procedimento conducente à obtenção da licença de habitabilidade, faz parte fundamental e integrante, a entrega pelo prestador de serviços no Município territorialmente competente, do levantamento topográfico, declarações de especialidades e arquitetura.
III- Nesta decorrência, a recorrida, na pessoa do seu legal representante, elaborou a declaração de isenção de especialidades da parte integrante a declaração de ligação à rede pública de esgotos do imóvel o que por si atestou, cfr. facto nº 16 dado como provado.
IV- Tendo, nesse seguimento, a licença de habitabilidade sido emitida em 01.02.2021, sob o nº ...21, pelo Município ....
V- Em 19.03.2021 o imóvel da pertença da recorrente foi vendido a BB e CC, cfr. doc. nº 13 junto com a p.i.
VI- Para grande surpresa recorrente, em 24.05.2021, foi citada a mesma citada no âmbito do processo 97/22...., movida pelos atuais proprietários do imóvel alienado, por falta de ligação do imóvel à rede púbica de esgotos.
VII- No âmbito das diligencias efectuadas no referido processo judicial, nomeadamente através da informação prestada pelo Município ..., chegou-se à conclusão de que, contrariamente ao atestado pela recorrida, o imóvel não se encontrava, efectivamente, ligado à rede pública de esgotos.
VIII- O que implicou que a ali ré e aqui recorrente, provesse ao pagamento da quantia global de 6.275,36 €, por conta da efectiva obtenção do saneamento público ao imóvel e bem assim, por conta das despesas com o trabalho e materiais de canalização para efectivar a ligação à rede pública de esgotos.
IX- Instaurada que foi a ação ora recorrida, por conta do contrato de prestação de serviços para efeitos de ligação à rede pública de esgotos pela ora recorrida e do seu cumprimento defeituoso, em 17.02.2025 foi proferida sentença que julgou totalmente improcedente o peticiona pela recorrente.
X- Na verdade, a sentença de que ora se recorre, não obstante dar como provados todos os factos com a relevância ao preenchimento do objecto do litígio, e bem assim, à aplicação ao caso concreto das normas jurídicas atinentes ao regime da responsabilidade civil contratual por cumprimento defeituoso, contrariamente ao que seria expectável, o Tribunal “a quo”, absolveu totalmente a recorrente do pedido sob o uso fundamentação legal, não subsumível à factualidade da como provada.
XI- Derrogando, assim, as mais elementares regras da boa-fé, senso comum e, do processo lógico-racional da convicção do Tribunal recorrido, de modo que sentença recorrida possa ser entendida pelas partes; pois que;
XII- O processo de fundamentação da sentença, envolve a implicação, ponderação e aplicação de critérios de natureza prudencial que permitam avaliara e decidir se as razões de uma decisão sobre os factos e o processo cognitivo de que se socorreu o julgador são compatíveis com as regras de experiência de vida e das coisas, e com a razoabilidade das congruências dos factos e comportamentos.
XIII- No concreto caso tendo sido dado como provado que a recorrida não procedeu de acordo com as mais elementares regras da sua legis artis, mormente do que diz respeito à consulta do estado do processo de saneamento do imóvel junto do Município, nem participou à ora recorrente da possibilidade, de face à incerteza (que na realidade não manifestou) a possibilidade de, a fim de apurar com a certeza que se lhe impunha, a realização de ensaios destrutivo, tendo atestado, erradamente, por visualização no local a sobredita existência de ligação do imóvel à rede pública de esgotos, quando na realidade tal não se verificava.
XIV- E tanto é que a aqui recorrente teve de, duplamente, proceder ao pagamento a expensas próprias, os custos com a efectiva ligação da habitação à rede pública de esgotos, o que poderia ter sido evitado se a recorrida tivesse levado a cabo um trabalho sério e diligente, de efectiva comprovação, para o qual foi contratada e paga.
XV- Nesta senda, o ponto 32 dos factos dados como provados, mais uma vez demonstra que o Tribunal Recorrido, retirou das decolações da recorrente ilações incongruentes com a demais matéria de facto dada como assente, mormente a dos pontos 1 a 4 e 7 a 9 dos factos dados como provado.
XVI- Pelo que, reapreciada que seja a prova por Vs. Exas., devem o ponto nº 32 dos factos provados ser dado como não provado.
XVII- Face ao todo o exposto entende a recorrente existir no âmbito do contrato de prestação de serviços celebrado, cumprimento defeituoso do contrato por banda da recorrida, uma vez que o mesmo se trata de uma obrigação de resultado que não atingida como, ainda, gerou avultados prejuízos na esfera patrimonial da recorrente.
XVIII- A sentença recorrida violou as normas previstas nos artigos 562.º, 563.º, 762.º, 798.º, 799.º, 802.º, 1223.º, todos do CC e ainda os artigos 607.º nº4 e 640 ambos do CPC.
Pelo que deve o recurso ser julgado procedente nos termos expostos, com a consequente revogação da sentença recorrida, com a consequente condenação da recorrida nos termos peticionados.
3. A R. contra-alegou, concluindo que:
I – Analisadas que foram as conclusões do, aliás, douto recurso apresentado pela Recorrente verifica-se que nenhuma, absolutamente nenhuma referência, é efectuada a qualquer outro ponto da matéria de facto julgada provada pelo Tribunal a quo que não o ponto 32.
II – Salvo o devido respeito, quando falte nas conclusões a menção aos concretos pontos de facto que se considerem incorrectamente julgados, atento o preceituado nos artigos 635.º, n.ºs 2 a 4, 639.º, n.º 1, 641.º, n.º 2, alínea b), e 640.º, n.º 1, alínea a), todos do Código de Processo Civil, deverá haver lugar à rejeição da sua impugnação.
III – A diligência processual mínima do recorrente, resultante da relação intersistemática do artigo 640.º com os artigos 635.º, n.ºs 2 a 4, e 639.º, n.ºs 1 e 2, foi absolutamente desrespeitada pela Apelante, devendo, sem mais, ser determinada a sanção cominada, em coordenação, pelo corpo do aludido artigo 640.º, n.º 1, e pelo artigo 641º, n.º 2, alínea b), todos do C.P.C., ou seja, a limitação da impugnação da matéria de facto ao ponto 32 da factualidade provada.
IV – Analisada a impugnação dos pontos 16, 17, 18 e 19 da factualidade provada, constata-se que não foi indicada pela Recorrente qual a decisão que no seu entendimento deveria ter sido proferida pelo Tribunal a quo, em flagrante incumprimento do preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 640.º do C.P.C., pelo que deverá ser liminarmente rejeitada a sua impugnação.
V – Ademais, a Recorrente chega a afirmar em sede da aludida “impugnação”, “Entendeu, e bem, o Tribunal “a quo” julgar como provado o seguinte facto, relevante para a decisão de mérito da causa…” (sic) – vide aparente impugnação do ponto 16 da factualidade provada em sede de alegações.
VI – A aparente pretensão da Recorrente de que seja também dado por provado que a Recorrida “sem ter a certeza da existência de saneamento público no imóvel, atestou a sua existência” não só não configura uma “impugnação da matéria de facto provada pelo Tribunal a quo” como é totalmente inviável porquanto, salvo o devido respeito, se pretende que seja carreada para a “factualidade” uma verdadeira “conclusão” e não um facto, a qual nem sequer foi invocada em momento processual anterior, nomeadamente em sede de Petição Inicial.
VII – Cabe ao Tribunal concluir, face à declaração constante do ponto 16 dos factos provados, qual a sua extensão e efeitos, não configurando tal “conclusão” matéria de facto.
VIII – A declaração emitida pela Ré, na pessoa do seu legal representante, é aquela reproduzida no ponto 16 dos factos provados, conforme prova documental junta aos autos e factualidade invocada por ambas as partes, o que é reconhecido pela própria Recorrente ao afirmar que o Tribunal, e bem, deu tal facto por provado.
IX – Salvo o devido respeito, sendo pacífico que foi o gerente da Ré a assinar os documentos referidos no ponto 16 da matéria de facto provada, instruindo a testemunha DD, enquanto administrativa, quanto ao mero teor do documento a assinar, quem o “elaborou” foi o primeiro e não a segunda, sendo totalmente irrelevante a actuação desta última.
X – Os serviços contratados entre Recorrente e Recorrida são aqueles constantes do ponto 22 da factualidade provada o qual não foi impugnado.
XI – Não só não foi invocado pela Recorrente, em momento algum processual, que solicitou à Recorrida que se deslocasse ao Município para aferir da existência de uma ligação ao saneamento como tal corresponde a uma falácia na medida em que conforme expressamente assumido pelo legal representante da Recorrida em sede de audiência de discussão e julgamento, o mesmo não se deslocou ao Município para
recolher elementos quanto ao fornecimento de água e saneamento porquanto se tratava de uma habitação antiga, a qual no momento não tinha abastecimento de água, não lhe havendo sido facultados quaisquer documentos que o permitissem fazer, nomeadamente uma factura da água referente ao mesmo - vide depoimento do legal representante da Ré, EE, gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal a quo - “Legal Representante: EE – 15/01/2025 – 10:31 – 11:15, no momento 04m45s a 05m30 deste depoimento.
XII – Não se trata de efectuar uma deslocação a um único edifício para recolher informação quer quanto ao abastecimento de água quer quanto ao saneamento, como sustenta a Recorrente, mas sim de verificar in loco que inexiste abastecimento de água, não tendo elementos que permitam solicitar informações ao Município quanto ao mesmo porquanto não facultados pela Recorrente, tornando, consequentemente necessária a realização de ensaios que efectivamente foram realizados – vide depoimento do legal representante da Ré, EE, gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal a quo - “Legal Representante: EE – 15/01/2025 – 10:31 –11:15, no momento 04m45s a 05m30 deste depoimento.
XIII – É totalmente irrelevante a afirmação prestada pela testemunha FF indicada pela Recorrente, da qual resulta a sua disponibilidade para receber interessados no seu gabinete prestando informações referentes ao saneamento, na medida em que tal pressupõe que teriam sido facultados à Recorrida documentos e/ou informações bastantes para as solicitar, o que não aconteceu, pois apenas se sucedesse seria possível consultar a facturação referente ao abastecimento de água da qual poderia ou não resultar a cobrança de valores respeitantes ao saneamento, daí se podendo inferir pela sua (in)existência - vide depoimento do legal representante da Ré, EE, gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal a quo - “Legal Representante: EE – 15/01/2025 – 10:31 – 11:15, no momento 04m45s a 05m30 deste depoimento.
XIV – A Recorrida não foi contratada pela Recorrente para “atestar” da ligação do imóvel propriedade da segunda ao saneamento público mas sim para prestar os serviços constantes do ponto 22 da factualidade provada, o qual não foi impugnado, necessários à emissão de licença de utilização.
XV – A afirmação gratuita de que a Recorrente não solicitou os projectos da casa como deveria ter feito, é, com todo o respeito, totalmente absurda, pois se o imóvel carecia de licenciamento não haviam, obviamente, sido realizados quaisquer projectos concernentes ao mesmo.
XVI – As declarações prestadas pela testemunha FF, transcritas em sede das alegações da Recorrente, em nada, rigorosamente nada, conflituam com as declarações do legal representante da Recorrida, pelo que não se alcança o raciocínio da Recorrente no que concerne à impugnação do ponto 20 da matéria de facto provada.
XVII – A Recorrente entende, erroneamente, que o Tribunal a quo extraiu das declarações por si prestadas que a mesma tinha conhecimento efectivo de que o imóvel sub judice tinha ligação ao saneamento público, interpretando incorrectamente a extensão do ponto 32 da matéria de facto provada.
XVIII – A Recorrente, afirmou que os pais residiam no imóvel em apreço, o qual não apresentava nada de estranho, tendo a casa água, luz e gás, estando tudo normal, bem como que respondeu a um questionário da imobiliária em sede do qual declarou, no que concerne ao abastecimento de água, que tudo estaria a trabalhar, referindo, ainda, quando questionada, que foi uma novidade para si a inexistência de fossa ou saneamento pois tudo funcionava quando frequentava o imóvel em questão, no qual, aliás, por várias vezes pernoitou por dias consecutivos, dois ou três, nunca se apercebendo de qualquer problema com o saneamento - vide depoimento da Autora, gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal a quo - “Autor: AA – 15/01/2025 – 11:16 – 11:59, nos momentos 10m45 a 11m10, 8m00s a 18m30; 23m20 a 24m55; e 33m05 a 33m40 deste depoimento.
XIX – Foi devidamente esclarecido pelo Tribunal a quo, em sede da respectiva motivação da decisão de facto, que se alicerçou, no que concerne ao ponto 32 da factualidade provada, no depoimento de parte da Recorrente, a qual de forma espontânea e com naturalidade referiu assumir que o imóvel reunia todas as condições e que, por isso, teria ligação ao saneamento, o que se afigura correcto.
XX – Não merece qualquer provimento a pretensão da Recorrente no que concerne à impugnação da matéria de facto.
XXI – Optou a Recorrente por não apresentar efectivamente recurso da matéria de Direito mas, ao invés, expor os motivos pelos quais entende que lhe assiste razão, como se as suas alegações de uma nova Petição Inicial se tratassem, confundindo diversos conceitos alcançando, consequentemente, uma conclusão manifestamente contrária ao Direito aplicável.
XXII – Contrariamente ao sustentado pela Recorrente a Ré não “atestou” o que quer que seja, emitindo, isso sim a(s) declaração(ões) especificadas no ponto 16 da factualidade provada com essa mesma extensão e não outra.
XXIII – Contrariamente ao invocado, os únicos serviços contratados entre a Recorrente e a Recorrida consistiam na realização de um levantamento topográfico, serviços de arquitectura, peças desenhadas e escritas e emissão de declarações das especialidades, a fim de instruir processo de licenciamento camarário, e nunca o de garantir ou comprovar a (in)existência de ligação ao saneamento público – vide pontos 12, 13, 14, 15 e 22 da factualidade provada e não impugnada.
XXIV – Conforme melhor consta dos pontos 17, 18 e 19 da factualidade provada, a emissão das declarações constantes do ponto 16 pela Recorrida, apenas sucedeu após visita ao local do gerente da mesma no decurso da qual analisou o canhão de saída da sanita e o sifão existentes na casa de banho, tendo visualizado que os
mesmos se encontravam ligados à canalização, havendo simulado uma descarga de água na sanita e na bacia do lavatório com o fito de perceber se a mesma escorria pela canalização, não visualizando qualquer fuga no interior ou exterior da habitação.
XXV – Tal como resulta dos pontos 15, 21 e 32 da factualidade provada, a própria Recorrente representava que o imóvel em apreço tinha ligação ao saneamento público, havendo contratado a Recorrida por intermédio de uma agência imobiliária que comunicou à A..., Lda., na pessoa do seu gerente, que aquele dispunha de ligação ao saneamento.
XXVI – Face à factualidade provada, com o Tribunal a quo, entendemos não ser exigível à Recorrida comportamento diverso daquele por si adoptado, não configurando, em caso algum, o mesmo incumprimento ou sequer cumprimento defeituoso das obrigações contratualmente assumidas com a Recorrente, nem esta última se alicerçou no recurso sob apreciação em qualquer factualidade demonstrada ou fundamento jurídico para entender diversamente.
XXVII – Mesmo a entender que teria ocorrido qualquer incumprimento ou cumprimento defeituoso por parte da Recorrida, temos como pacífico que inexiste qualquer nexo de causalidade entre a conduta desta e os “danos” invocados pela Recorrente.
XXVIII – Nos termos do preceituado no artigo 563.º do Código Civil, a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão, ou seja, foi consagrada no nosso ordenamento jurídico a doutrina da causalidade adequada.
XXIX – A falta de ligação à rede pública de saneamento já ocorria em momento anterior à intervenção da Recorrida e não foi contratado entre esta última e a Recorrente a realização de tal ligação.
XXX – A ocorrer um comportamento ilícito da Recorrida no que concerne à emissão de uma declaração susceptível de criar a errónea convicção a terceiros de que a ligação do imóvel à rede pública de saneamento existiria – o que se admite por mera hipótese de índole processual – tal não significa que a inexistência per se de tal infra-estrutura se fique a dever à sua conduta e muito menos que esta deva ser construída a expensas suas, sob pena, aliás, de tal configurar uma evidente situação de enriquecimento sem causa da AA em prejuízo indevido e totalmente injustificado da A..., LDA..
XXXI – O “prejuízo” que é invocado pela Recorrente no valor de € 6276,36 (seis mil duzentos e setenta e seis eutos e trinta e seis cêntimos) é inexistente na sua esfera jurídica, porquanto, conforme resulta dos pontos 24, 26 e 33 da factualidade provada, a mesma recebeu € 42 000,00 (quarenta e dois mil euros) como contrapartida pela venda do imóvel sub judice com ligação ao saneamento, o que não sucedia.
XXXII – A situação em apreço não foi determinada pela conduta da Recorrida mas sim pelo estado do imóvel que a Recorrente herdou, e, enquanto tal, insusceptível de ser indemnizada pela primeira, sendo, aliás, a A..., Lda. totalmente alheia à transacção judicial alcançada pela AA em distinto processo judicial no qual não interveio.
XXXIII – Os serviços contratados pela Recorrente à Recorrida foram todos efectivamente prestados pelo que nada lhe deverá ser restituído, não configurando um “prejuízo” mas sim a contrapartida por um serviço, aliás muito mais abrangente do que a mera declaração referente à aparência de (in)existência de uma boa ligação do imóvel à rede pública de saneamento – vide ponto 22 da factualidade provada e não impugnada.
XXXIV – A Recorrida não é responsável por custas judiciais da Recorrente num processo em que não interveio, sendo a responsabilidade desta última decorrente do legalmente estabelecido no Regulamento das Custas Processuais e a primeira totalmente alheia à sua actividade processual e inerentes taxas de justiça pagas.
XXXV – Considerando que a contratação da Recorrida para emissão de declaração de isenção das especialidades referente à ligação de saneamento implicou uma retribuição de € 100,00 (cem euros), acrescidos de I.V.A., à taxa legal em vigor, e que a Recorrente pretende ser indemnizada pelo valor de € 10 638,86 (dez mil seiscentos e trinta e oito euros e oitenta e seis cêntimos) sempre seria a sua pretensão abusiva por desequilíbrio/desproporcionalidade no exercício jurídico.
XXXVI – Salvo o devido respeito a presente apelação terá, inevitavelmente, de sucumbir em toda a sua extensão, não havendo sido violadas quaisquer normas jurídicas muito menos as indicadas pela Recorrente.
Termos em que deve ser negado provimento ao recurso sob juízo, mantendo-se ipsis verbis a douta sentença
recorrida.
Assim se fazendo sã e inteira JUSTIÇA
II - Factos Provados
1) A A. AA é natural de ..., local onde viveu até ao ano de 1974;
2) Após, a A. fixou residência em ..., tendo aí constituído família e onde atualmente reside;
3) Desde que fixou residência em ..., a A. vinha esporadicamente a ..., não mais do que uma a duas vezes por ano, por curtos períodos, para visitar os pais;
4) A ../../2007 faleceu o pai da A., tendo a sua mãe fixado residência junto da irmã da A.;
5) A R. é uma sociedade por quotas com o NIPC ...87, com sede na Rua ..., ..., ..., ... e que tem por objeto social, entre o mais, a prestação de serviços de engenharia e arquitetura;
6) A gerência da R. é exercida por EE;
7) Por escritura pública outorgada a 25 de setembro de 2010 no Cartório Notarial ... foi adjudicada à A. a nua propriedade do prédio urbano sito em ..., ..., inscrito na matriz predial urbana da União de Freguesias ..., ... e ... sob o artigo matricial n.º ...45 e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...97;
8) O imóvel referido em 7) ficou onerado com usufruto a favor da mãe da A.;
9) A ../../2020 faleceu a mãe da A.;
10) Em virtude do descrito em 9), a A. adquiriu a propriedade plena sobre o imóvel descrito em 7);
11) Em data não concretamente apurada do ano de 2021, a A. decidiu vender o imóvel descrito em 7), tendo contratado para o efeito os serviços da agência imobiliária B..., sita na ...;
12) Nessa sequência, a A. foi informada que o imóvel não poderia ser transacionado por não possuir licença de habitabilidade e certificado energético;
13) Em virtude disso, e pela agência imobiliária referia em 11), foi indicada a R. para instruir o pedido de licenciamento do imóvel referido em 7) junto da Câmara Municipal ...;
14) A A. aceitou a indicação da agência imobiliária;
15) Na sequência do descrito em 14) e 15), a agência imobiliária referida em 11) contactou a R.;
16) A R., na pessoa do seu gerente EE; elaborou e submeteu o projeto de licenciamento de habitação junto do Município ..., instruindo o mesmo com as seguintes declarações: a. Declaração da não apresentação do projeto da rede de abastecimento de águas: «EE, Engenheiro Técnico Civil, residente no Lugar ..., ... ..., concelho ..., contribuinte fiscal n.º ...25, inscrito na Ordem dos Engenheiros Técnicos, com o n.º ...40, declara para efeitos do disposto no n.° 1 do art.° 10°, do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro, alterado e republicado pelo D.L. n.º 136/2014, de 9 de setembro, e alterado pelo D.L. n.° 121/2018,de 28 de dezembro, que não se apresenta o projeto da rede abastecimento de águas, relativo à obra "Legalização de um edifício de habitação" sita Rua ..., ... ..., U.F ..., ... e ..., concelho ..., cujo licenciamento foi requerido por AA, residente em Rua ..., Bairro ..., ... ..., portadora do número de identificação Fiscal ...06, uma vez que a obra já se encontra executada há mais de 30 anos e após inspeção visual verifica-se que a rede com ligação à rede pública existente aparenta encontrar-se em bom estado de funcionamento e sem existência de qualquer anomalia.»;
b. Declaração da não apresentação do projeto de rede de águas pluviais: «EE, Engenheiro Técnico Civil, residente no Lugar ..., ... ..., concelho ..., contribuinte fiscal n.º ...25, inscrito na Ordem dos Engenheiros Técnicos, com o n.º ...40, declara para efeitos do disposto no n.° 1 do art. 10°, do Decreto-Lei n.° 555/99, de 16 de dezembro, alterado e republicado pelo D.L. n.° 136/2014, de 9 de setembro, e alterado pelo D.L. n.° 121/2018,de 28 de dezembro, que não se apresenta o projeto de rede de águas pluviais, relativo à obra de "Legalização de um edifício de habitação" sita Rua ..., ... ..., U.F ..., ... e ..., concelho ..., cujo licenciamento foi requerido por AA, residente em Rua ..., Bairro ..., ... ..., portadora do número de identificação Fiscal ...06, uma vez que a obra já se encontra executada há mais de 30 anos e à data da construção do imóvel não era aplicável da mesma. Mais se informa que se trata de um edifício constituído por uma cobertura em terraço acessível e outra ordinária com duas águas, ambas com pendentes adequadas ao necessário e correto escoamento das águas incidentes nas mesmas.»;
c. Declaração da não apresentação do projeto da rede de águas domésticas: «EE, Engenheiro Técnico Civil, residente no Lugar ..., ... ..., concelho ..., contribuinte fiscal n.º ...25, inscrito na Ordem dos Engenheiros Técnicos, com o n.º ...40, declara para efeitos do disposto no n.° 1 do art.° 10°, do Decreto-Lei n.° 555/99, de 16 de dezembro, alterado e republicado pelo D.L. n.º136/2014, de 9 de setembro, e alterado pelo D.L. n.°121/2018,de 28 de dezembro, que o projeto da rede de águas domésticas de que é autora, relativo à obra "Legalização de um edifício de habitação" sita Rua ..., ... ..., U.F ..., ... e ..., concelho ..., cujo licenciamento foi requerido por AA, residente em Rua ..., Bairro ..., ... ..., portadora do número de identificação Fiscal ...06, não é apresentado, uma vez que a obra já se encontra executada há mais de 30 anos e após inspeção visual verifica-se que a rede com ligação à rede pública existente aparenta encontrar-se em bom estado de funcionamento e sem existência de qualquer anomalia.»;
17) Os documentos referidos em 16) foram elaborados pelo gerente da R. na sequência de uma visita ao local, no decurso da qual o mesmo analisou o canhão de saída da sanita e o sifão existentes na casa de banho, tendo visualizado que os mesmos se encontravam ligados a canalização;
18) Na ocasião referida em 17), o gerente da A. simulou uma descarga de água na sanita e na bacia do lavatório com o fito de perceber se a mesma escorria pela canalização;
19) Após a realização da simulação referida em 18), o gerente da A. não visualizou qualquer fuga de água, quer no interior, quer no exterior da habitação;
20) Na ocasião referida em 17), o gerente da R. constatou a existência de uma caixa de saneamento localizada a cerca de 50 metros do imóvel referido em 7), já na via pública;
21) Previamente à visita descrita em 17), a agência imobiliária referida em 11) comunicou ao gerente da R. que o imóvel referido em 7) dispunha de ligação a saneamento;
22) Por conta dos serviços prestados, a R. liquidou à A. a quantia global de € 1.537,50, dos quais € 300,00 por conta do levantamento topográfico, € 500,00 pelos serviços de arquitetura, peças desenhadas e escritas, € 300,00 por conta das isenções das especialidades, € 150,00 pelas telas finais e termo de direitos de fiscalização, e o remanescente a título de IVA;
23) A 1 de março de 2021, o Município ... emitiu alvará de licença de utilização com o n.º ...21;
24) A 19 de março de 2021, a A. declarou vender o imóvel referido em 7) a BB e a CC, que o declararam comprar, pelo preço de € 42.000,00;
25) A 10 de março de 2022, a A. recebeu uma carta registada com aviso de receção remetida por BB e a CC, com o seguinte teor: a. «Assunto: denúncia de defeitos – inexistência de sistema de saneamento de ligação à rede pública. Exma. Senhora, Na sequência da compra e venda do prédio urbano, sito em ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...45, em Março de 2021, o qual se destinava à nossa habitação própria e permanente, iniciámos obras de melhoramentos no imóvel. Concluídas as obras no interior do imóvel, aquando da execução dos trabalhos de canalização, fomos alertados pelo canalizador da possível inexistência de saneamento público. Pelo que, solicitámos um orçamento para ligação de saneamento à rede pública, bem como dos trabalhos adicionais necessários, os quais se estimam em €4.974,31 (conforme cópias em anexo). Por outro lado, no decurso do mês de fevereiro de 2022, já se deslocaram ao imóvel os serviços camarários, bem como a o SEPNA da GNR, o que evidencia a gravidade e a necessidade de resolver rapidamente a situação, a fim de evitar prejuízos maiores. Ora, considerando que o imóvel adquirido possuía licença de habitabilidade, mas, dada a inexistência de sistema de saneamento público, resulta evidente a falta de condições necessárias do imóvel à realização do fim a que se destina – habitação. Face ao supra exposto, deverá V. Exa. proceder à reparação do imóvel, mediante a ligação do saneamento à rede pública, até ao final do mês de Março de 2022,uma vez que, dado o sucedido, nos encontramos impossibilitados de habitar o mesmo, com todos os inconvenientes e prejuízos que daí advêm, após o que, seremos obrigados a recorrer aos meios judiciais.»
26) A 24 de maio de 2022, a A. foi citada, como ré, no âmbito dos autos de processo comum declarativo n.º 97/22.... do Juízo Central Cível e Criminal da Guarda (J2) para contestar o pedido contra si formulado por BB e a CC, no sentido de ser condenada, além do mais, a pagar-lhes a quantia global de € 49.888,23, com fundamento na circunstância de o imóvel referido em 7) não dispor de sistema de águas residuais (saneamento público);
27) A A. contestou a ação judicial referida em 20) e deduziu reconvenção, pugnando pela improcedência da ação, argumentando que não correspondia à verdade o alegado pelos aí autores, porquanto através dos serviços da aqui R., tinha sido por esta atestado que o imóvel possuía o sistema de águas residuais (saneamento público) e, consequentemente sido emitido, pelo Município ..., a correspondente licença da habitabilidade;
28) A A. arrolou o gerente da R. como testemunha no âmbito da ação referida em 26), tendo previamente comunicado telefonicamente que o iria fazer e dando-lhe conhecimento da instauração do referido processo;
29) A 20 de novembro de 2023 a A. e BB e a CC alcançaram transação no âmbito do processo judicial referido em 20), ficando a A. obrigada a pagar a BB e a CC o valor global de € 6.275,36;
30) A 7 de agosto de 2024, a A. remeteu à R., que a recebeu, uma carta registada com o seguinte teor: a. «Assunto: Prestação de serviço de engenharia e arquitetura, destinado à obtenção do licenciamento do imóvel habitacional em sito na Rua ..., ..., concelho .... Exmos. Senhores, Incumbe-me a M/Constituinte, Sra. Da. AA, de expor e interpelar V. Exas. para o seguinte: 1- No início do ano de 2021, a M/Constituinte, à época proprietária do imóvel supra identificado, por intermédio da Agência Imobiliária B..., sita no Largo ..., ..., contratou os v/serviços de arquitetura e engenharia a fim de submeter, junto do Município ..., um pedido de licenciamento do prédio urbano em epígrafe melhor identificado. 2- Como sempre foi do v/conhecimento, o intento da M/Constituinte era de proceder à venda do imóvel. 3- O serviço contratado, foi efectuado pelo Sr. Eng. EE que, nas peças escritas que submeteu ao Município ... declarou, no que tange ao sistema de águas domésticas, mormente em sede de "Declaração da não apresentação do projecto da rede de águas domésticas", o seguinte: "após inspeção visual verifica-se que a rede com ligação à rede pública existente aparenta encontrar-se em bom estado de funcionamento e sem existência de qualquer anomalia" (itálico e negrito nossos). 4- Ora, o imóvel após a concessão da licença de habitabilidade, por parte do Município ..., veio a ser vendido. 5- Porém, surpreendentemente, em 24.05.2022, foi a M/Constituinte citada para uma ação judicial, onde os atuais proprietários do imóvel, alegavam que o mesmo, contrariamente, ao atestado por V. Exias., não possuía sistema de saneamento com ligação à rede pública de esgotos. 6- Facto que foi levado ao conhecimento de V. Exas., bem como, a deslocação ao local onde se apurou que, efectivamente, o imóvel não possuía saneamento público, 7- Tendo, nessa decorrência, no referido processo judicial, sido efectuada uma transação, onde a M/Constituinte ficou com a obrigação de custear a quantia de 2.728,04 € (dois mil setecentos e vinte e oito euros e quatro cêntimos), por conta da taxa de execução de ligação à rede pública e abastecimento de água a liquidar ao Município ... e, ainda, a quantia de 3.547,32 € (três mil quinhentos e quarenta e sete euros e trinta e dois cêntimos), por conta dos trabalhos e materiais de canalização necessário à execução do saneamento público, fr. documento nº1 e 2, que se juntam). 8- Tudo no valor global de 6.275,36 € (seis mil duzentos e setenta e cinco euros e trinta e seis cêntimos). 9- Facto que, não só foi dado conhecimento a V. Exas. como, foram V. Exas., igualmente, V. interpelados para o pagamento de tal valor. 10- Pese embora, as diversas interpelações efectuadas, o certo é que, até à presente data, à M/Constituinte não foi ressarcida qualquer quantia. Pelo que, ante o exposto, mormente a desconformidade das declarações prestadas por V. Exas., na pessoa do Sr. Eng. EE, quanto a existência de saneamento público no imóvel (que instruíram o pedido de licenciamento do mesmo junto do Município ...) com a realidade existente, coloca V. Exas. no
dever de ressarcir à M/Constituinte no valor das despesas (melhor descritas em 7 da presente) que esta teve que suportar. Nesta decorrência, dispõem V. Exas. do prazo de 10 (dez) dias, para procederam ao pagamento da quantia de 6.275,36 € (seis mil duzentos e setenta e cinco euros e trinta e seis cêntimos), por transferência bancária, para a conta titulada pela M/Constituinte com o IBAN ...55, sob pena de não o fazendo, não restar outra alternativa à M/Constituinte senão a de recorrer aos meios judiciais.»
31) A R. não respondeu à missiva referia em 24).
32) A A. representava que o imóvel referido em 7) tinha ligação a saneamento público;
33) O imóvel referido em 7), à data da sua alienação a BB e a CC não dispunha de ligação à rede pública de saneamento;
34) Em virtude da ação referida em 26), a A. liquidou € 1.326,00 a título de taxas de justiça;
35) Em virtude de lhe ter sido movida a ação descrita em 26) e ao constatar o descrito em 33), a A. sentiu-se nervosa, revoltada e enganada, tendo dificuldades em dormir e mau estar geral.
III - Do Direito
1. Uma vez que o âmbito objectivo dos recursos é delimitado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes (arts. 639º, nº 1, e 635º, nº 4, do NCPC), apreciaremos, apenas, as questões que ali foram enunciadas.
Nesta conformidade, as questões a resolver são as seguintes.
- Alteração da matéria de facto.
- Condenação da R. na quantia de 9.138,86 € e juros, por danos patrimoniais, com fundamento em responsabilidade civil contratual.
- Abuso de direito da A.
2. A A. impugnou a decisão da matéria de facto, relativamente ao facto provado 32., que defende deve passar para provado, com base no depoimento de parte da A. (cfr. as conclusões de recurso XV e XVI). A recorrida opõe-se (cfr. conclusões de recurso I, XVII a XX).
Na motivação da decisão de facto exarou-se que:
“A convicção do Tribunal assentou na análise crítica e conjugada dos elementos de prova que instruem este processo, que assim se motiva:
(…)
Relativamente ao descrito em 32) foi tido em consideração o depoimento de parte prestado pela A., que de forma espontânea e escorreita, numa linguagem mais coloquial, referiu que o imóvel descrito em 7) tinha «água, luz e gás», que o mesmo sempre foi habitado pelos seus pais e que reunia todas as condições, assumindo com naturalidade que, por isso, teria ligação a saneamento, pese embora sem referir se a saneamento público ou através de fossa séptica, tendo merecido credibilidade precisamente pela naturalidade do seu discurso e até pela sua neutralidade, avançando as respostas dadas sem denotar uma qualquer intenção de interferir no desfecho da causa através da manipulação da matéria de facto.”.
2.1. No corpo das alegações a recorrente declarou impugnar os factos provados 16. a 20., mas acabou por nenhuma menção fazer a eles nas conclusões de recurso.
E os requisitos de tal impugnação vêm estatuídos no art. 640º do NCPC, nomeadamente os previstos no nº 1 do preceito, suas 3 alíneas, sob pena de rejeição. A saber, no caso que ora nos interessa:
i) Que o recorrente obrigatoriamente especifique os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
Ora, a recorrente não observou o apontado requisito. E este 1º requisito, constante da alínea a), o mais essencial de todos, não figura nas conclusões de recurso o que devia ter acontecido, pois, como se sabe, e foi referido atrás, o âmbito objectivo dos recursos é delimitado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes (arts. 635º, nº 4, e 639º, do NCPC), apenas cabendo à Relação apreciar as questões, os pontos, que ali foram enunciadas.
Falhando logo quanto ao mais importante e decisivo de tais requisitos, o 1º (independentemente de os recorrentes terem ou não terem respeitado os 2º e 3º requisitos legais de impugnação atrás mencionados), a consequência é, como comanda o apontado art. 640º, nº 1, a impugnação da decisão sobre a matéria de facto ter de ser rejeitada, quanto a esses pontos (veja-se pacificamente, e a título de exemplo, o Ac. do STJ, de 9.6.2021, Proc.10300/18.8T8SNT.L1.S1, em www.dgsi.pt, citado pela recorrida).
2.2. Relativamente ao facto 32. ouvimos a prova gravada, invocada pela recorrente e recorridos.
A A., em declarações de parte e depoimento de parte (que a 1ª instância não teve o cuidado de separar na audição desta e na acta, o que devia ter ocorrido), disse que a casa tinha água, luz, gás. Estava tudo normal para mim. Eu nunca vi nada de estranho. Não sabe se os pais na casa eles tinham algum tipo de fossa ou se escorria para a rede pública. Desconhecia que até nem tinha licença de habitação. A imobiliária perguntou-lhe se a casa tinha água, luz, gás, e ela respondeu que sim, a casa estava habitável para ela, estava tudo a trabalhar. Quando surge então a questão de não haver fossa, não haver saneamento o que quer que seja, ela não sabia de nada. Tudo funcionava na casa quando eu lá ia. Quando foi citada para a dita acção ficou admirada porque na minha ideia estava tudo legal porque recebeu os documentos da imobiliária a dizer que estava tudo legal para vender um imóvel. Pagou aos autores na dita acção porque os documentos que foram apresentados vieram contrariar todo o trabalho desenvolvido pela ré, porque eles tinham o direito a ter a fossa.
O teor deste depoimento/declarações vai integralmente ao encontro do teor da motivação apresentada pelo tribunal a quo. Nenhuma censura lhe pode ser assacada. E até a palavra “representava” foi bem escolhida relativamente aos factos transmitidos pela A. e apurados no julgamento de facto. Nenhuma censura havendo a fazer a tal motivação, que merece a nossa concordância.
Assim, indefere-se a impugnação da decisão de facto, apresentada pela recorrente ao facto provado 32.
3. Na fundamentação de direito o tribunal a quo disse que:
“Assim, estamos perante um contrato de prestação de serviços nos termos do art. 1154.º do Código Civil, segundo o qual «contrato de prestação de serviço é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição».
No âmbito de tal esquema contratual obrigou-se a R. a elaborar os seguintes elementos:
- levantamento topográfico;
- arquitetura – peças desenhadas e escritas;
- isenções das especialidades; e
- telas finais e termo de fiscalização.
Por sua vez, a contraprestação devida pela A. é o pagamento do preço.
2. Ilicitude contratual
(…)
Ora, dúvidas inexistem que a R. realizou as prestações típicas do concreto esquema contratual desenvolvido com a A..
A questão prende-se, na ótica da A., com a divergência entre o resultado dos serviços levados a cabo pela R. e a sua desconformidade com a realidade. Ou seja, a A. não põe em causa que a R. tenha, efetivamente, prestado os serviços para os quais foi contratada e que lhe foram pagos. Assevera é que o resultado desses serviços não corresponde, quando deveriam, à situação de facto existente no imóvel descrito em 7), tendo a R. declarado como verdadeira uma realidade inexistente.
Como referido, a A. limita-se a invocar a responsabilidade contratual da R. sem qualquer descrição compartimentalizada dos pressupostos da responsabilidade civil contratual e dos factos que se subsumem a tais pressupostos no caso em apreço.
Assim, quanto a nós, tendo sido cumprida a obrigação assumida pela R., resta indagar se o cumprimento foi cabal ou, se está em causa um cumprimento defeituoso.
Com efeito, a apreciação do pressuposto da ilicitude não se limita à ponderação do incumprimento da obrigação principal. A relação contratual é complexa e, embora seja aquela obrigação determinante do seu conteúdo, não se esgota nela. Em torno dela gravitam deveres acessórios, que encontram o seu fundamento no princípio da boa-fé erigido no art. 762.º do Código Civil e cujo incumprimento é suscetível de espoletar a obrigação de indemnização com fundamento em responsabilidade contratual cf. o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 25-06-2009, processo n.º 4117/08, quando refere: «A responsabilidade civil contratual resulta do não cumprimento, lato sensu, dos deveres relativos próprios das obrigações contratuais, incluindo os deveres acessórios de conduta, ainda que impostos por lei, no seio da complexa relação obrigacional» 2Disponível em www.dgsi.pt
É o programa contratual que delimita a latitude dos deveres acessórios abrangidos, o que pressupõe uma ponderação em concreto, tal como dita o Ac. do STJ de 29/05/2014, proferido no processo n.º 600/11.3, afirmando «só se justificando inserir no perímetro de certa relação contratual complexa – sujeitando-a, consequentemente, à disciplina da responsabilidade contratual – a tutela dos direitos absolutos de uma das partes quando tal for imposto pelo próprio fim do contrato e pela natureza específica das prestações acordadas ou quando a relação contratual tenha originado um risco particular e acrescido para uma das partes».
No caso dos autos temos que, tal como resulta provado, os serviços da R. foram contratados para suprir a falta de licença de utilização, tendo sido comunicado à R., previamente ao estabelecimento do vínculo contratual, que o imóvel objeto do contrato dispunha de ligação a saneamento (sendo aqui indiferente se público ou através de fossa séptica).
Nessa sequência e com base em tal informação, que a R. tomou como certa – sem que exista fundamento para censurar tal confiança uma vez que, também a própria A. tinha tal convicção – elencou os trabalhos que seriam necessários para a obtenção de tal licença, com enfoque nas isenções das especialidades, os quais foram aceites pela A..
Ademais temos que a R. executou todas as diligências necessárias ao cabal cumprimento das obrigações por si assumidas no âmbito de tal esquema contratual, tendo desenvolvido uma análise visual bastante, alicerçada em testes cuja própria metodologia, conjugadamente, permitia, como permitiu, formular uma conclusão fundamentada.
Tal conclusão foi, então, vertida nas três declarações que compõem as referidas «isenções das especialidades», com especial destaque para o facto de a R. ter concluído pela aparência de existência de ligação da rede à rede pública de águas domésticas, de águas pluviais e de saneamento, e pela aparência do seu bom funcionamento.
Veja-se que a A. não contratou a R. para garantir ou comprovar tal existência.
É certo que a R. não informou a A. da existência de tal possibilidade mas, atentos os contornos concretos do caso, julgamos que não teria de o fazer.
Isto porque toda a atuação da R. teve como pressuposto base a existência de tal ligação às redes de águas domésticas, de águas pluviais e de saneamento e as próprias diligências realizadas pela R. não só eram aptas a confirmar tal pressuposto como, pelo seu resultado, não implicavam que a R. alcançasse conclusão diversa, ou seja, não implicavam que lhe surgissem dúvidas quanto a tal pressuposto (ou aparência) e que comunicasse tais dúvidas à A. para que fosse ajustado o esquema contratual.
Destarte, inexiste qualquer ilicitude contratual e soçobram, integralmente, as pretensões indemnizatórias da A.
(…)
Diga-se, por fim, que mesmo que se concluísse pela conduta ilícita da R., sempre estaria a presente ação condenada à improcedência por inexistir qualquer nexo de causalidade entre a sua conduta e a transação alcançada pela A. naquela ação judicial que contra si foi movida, por manifesta desadequação e imprevisibilidade de tal dano emergir da conduta da R..”.
A A. discorda, pelos motivos constantes das suas conclusões de recurso (as I a XIV, XVII e XVIII). A A. pugna pelo bem fundado dessa fundamentação jurídica (cfr. conclusões de recurso XXI a XXXVI).
Analisando, diremos que, em parte, concordamos com a recorrente. Vejamos então.
Dispõe o art. 762º, nº 1, do CC, que o devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado. Mas diferente da falta de cumprimento é o cumprimento defeituoso da obrigação, que reveste autonomia dogmática quando o acto de cumprimento causa danos ao credor (ex. pedreiro que conserta mal o telhado e, por virtude disso, dá lugar a estragos na casa na 1ª chuvada que cai sobre ela).
Diferente do cumprimento defeituoso é a venda de coisas defeituosas ou a prestação defeituosa da coisa em geral, cuja problemática se limita ao direito à substituição ou reparação da coisa, à recusa legítima da prestação ou à anulação do contrato. O cumprimento defeituoso reveste verdadeira autonomia dogmática em face da mora e do não cumprimento, quando a prestação efectuada não coincide, por falta das qualidades que a coisa devia possuir, com a prestação efectivamente devida (vide A. Varela, CC Anotado, Vol. II, 3ª Ed., nota 1. ao artigo 762º, pág. 2, e nota 1. ao artigo 799º, pág. 54).
Ora, a R. comprometeu-se - a fim de a A. obter a licença de habitabilidade e certificado energético do imóvel para posterior venda (factos 11. a 13.) – a, entre outros serviços, como obrigação de resultado, a apresentar projecto de isenções das especialidades (facto 22.). E apresentou justificações de não apresentação dos projectos das redes de abastecimento de águas, águas pluviais e águas domésticas, com o fundamento de as obras já estarem executadas há mais de 30 anos, com ligação à rede pública, o que assegurou após inspecção meramente visual (factos 16. a 19.), logrando-se, assim, a obtenção, a emissão pela autarquia da licença de utilização (facto 23.).
Porém, tal asserção era falsa, pois sabemos que isso não é verdade, o imóvel não dispunha de ligação à rede pública de saneamento (facto 33.). Verifica-se, por conseguinte, que das 4 componentes do contrato de prestação de serviço celebrado entre a A. e a R., uma estava errada. Daí que estejamos perante cumprimento contratual defeituoso da R.
O devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor (art. 798º do CC).
A lei reprova o comportamento contrário ao cumprimento da obrigação, quando ele é devido à falta de diligência ou a dolo do devedor. Embora, diga-se, o Código não reconheça, à semelhança do que faz no domínio da responsabilidade extracontratual, diversos graus de culpa (lata, leve e levíssima) nem tão-pouco distinga a mera culpa do dolo, como faz, embora só em casos especiais, quanto àquela responsabilidade (vide A. Varela, ob. cit., 2ª Ed., notas 2. e 3. ao artigo 798º, págs. 47/48).
Como explica I. Galvão Telles (em D. Obrigações, 2ª Ed., págs. 322/340) a culpa num sentido amplo, abrange o dolo e a mera culpa/negligência. No dolo o agente prevê um resultado ilícito e age para o atingir (dolo directo), ou prossegue outro fim, mas sabe que forçosamente produzirá o resultado (dolo necessário), ou não tem intenção de produzir o resultado, apenas prevê o resultado ilícito como possível, mas aceita-o (dolo eventual). Se confiar que o resultado ilícito não se verificará age com culpa/negligência consciente ou não o prevendo age com negligência consciente.
Por outro lado, a culpa aprecia-se objectivamente (em abstracto) – arts. 799º, nº 2, e 487º, nº 2, do CC.
E em termos de graduação da culpa, a mesma pode ser grave, leve ou levíssima, sendo que as duas primeiras correspondem a condutas que uma pessoa normalmente se absteria, diferenciando-se a primeira da segunda, por ser praticada por uma pessoa particularmente negligente. Já culpa levíssima só se produzirá se estivermos perante o padrão de conduta de uma pessoa excepcionalmente diligente. Isto é, aqui, para a lei, não há verdadeiramente culpa, salvo caso contado.
No nosso caso, não há factualidade a apontar para qualquer dolo, mas inequivocamente para mera negligência, no grau de culpa leve.
Isto porque, não obstante, a agência imobiliária ter comunicado ao gerente da R. que o imóvel dispunha de ligação a saneamento (facto 21.), o mesmo, engenheiro civil contratado por conta das isenções de especialidades, se tivesse sido diligente e profissional, podia e devia certificar-se, previamente à declaração errónea que emitiu, que afinal tais ligações não existiam, bastava ter ido examinar a caixa de saneamento localizada a cerca de 50 m do imóvel (facto 28.) – como fez um simples canalizador (facto 25.) – ou ir junto da autarquia obter tal informação se dúvidas tivesse. Sibi imputet.
Em conclusão, temos culpa contratual assacável ao engenheiro da R. Culpa contratual que, aliás se presumia (art. 799º, nº 1, do CC), e que a R. não logrou ilidir.
Desta sorte, temos um facto da R., temos ilícito contratual, meramente culposo ou negligente. E temos também um dano da A. Na verdade, por causa do erro da R. vendeu uma casa sem saneamento a terceiros – a A. até representava, esse facto, isto é, achava que o imóvel tinha esse saneamento (facto 32.), antes de obter a licença de utilização do imóvel para venda (facto 12.) -, e por causa disso viu-se envolvida num processo judicial litigioso que só terminou, com transacção, porque a A. suportou o pagamento do saneamento, no valor de 6.275,36 € (factos 25., 26., 29. e 30.). E suportou as taxas de justiça de 1.326 €. Mais 1.537,50 € da prestação de serviços da R. (facto 22.)
Importa agora verificar se existe nexo de causalidade entre o dano e o facto, nos termos do preceituado no art. 563º do CC, que dispõe que a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão.
Ou seja, foi consagrada no nosso ordenamento jurídico a doutrina da causalidade adequada, como é pacificamente reconhecido (vide A. Varela, ob. cit, Vol. I, 3ª Ed., nota 1. ao artigo 563º, pág. 547, e Almeida Costa, D. Obrigações, 6ª Ed., págs. 654/658).
Ora, foi a emissão de uma declaração errónea por parte da R. que levou à convicção segura pela A. e por terceiros – os compradores da casa e a autarquia que a licenciou perante a afirmação da R. - de que a ligação do imóvel à rede pública de saneamento existiria, que levou, posteriormente, ao desencadear da acção judicial contra a A., pelos terceiros compradores. E que só terminou com uma transacção entre as partes, com pagamento pela A. do valor da respectiva instalação do saneamento. Existe, por isso, e nitidamente o referido nexo de causalidade.
Contudo, não pode ser estendido a todos os valores totais reclamados pela A. Vejamos um por um.
O prejuízo que é invocado pela recorrente no valor de 6.275,36 €, acaba por não se verificar efectivamente: porquanto, a A. vendeu a casa por 42.000 € (facto 24.), com suposta ligação ao saneamento, o que não sucedia. Naturalmente, se os compradores conhecessem tal facto, não comprariam a casa ou comprariam a mesma, diminuída do valor necessário a estabelecer a ligação, valor que, afinal a A. suportou e bem para restabelecer o equilíbrio entre o preço da casa recebido e o que não devia ter sido recebido sem tal obra.
O valor de 1.537,50 € que a A. pretende receber não pode ser concedido, porque é o valor global de 4 parcelas (facto 22). Ora, o levantamento topográfico, os serviços de arquitectura, peças desenhadas e escritas, e telas finais e termo de direitos de fiscalização e remanescente foram prestados e não está comprovado que o fosse incorrectamente. O serviço das isenções de especialidades é que era errado e os 300 € pagos pela A. não deviam ser custeados por ela.
O valor de 1.326 € de custas, que a A. reclama, também não deviiam ter sido suportados pela mesma. Não fora a firmação falsa da R., sobre a ligação do imóvel á rede publica de saneamento e águas, que afinal não existia, os terceiros compradores da casa não teriam demandado judicialmente a A. e esta não teria de suportar o pagamento de quaisquer custas judiciais.
Desta sorte e pelo explicitado, há nexo de ligação entre o facto ilícito praticado pela R. e o prejuízo da A. no montante de 1.626 €. Que a R. deverá indemnizar, acrescido de juros civis (4%), contabilizados desde a citação – ocorrida em 11.9.2024 - até integral pagamento.
4. Em relação ao abuso de direito, a R. defende que ele existe, dado que a sua contratação para emissão de declaração de isenção das especialidades referente à ligação de saneamento implicou uma retribuição de 100 €, acrescidos de IVA, à taxa legal em vigor, e a recorrente pretende ser indemnizada pelo valor de 10.638,86 €, o que significa desequilíbrio/desproporcionalidade no exercício jurídico (cfr. conclusão XXXV.).
O serviço prestado pela R. no âmbito referido importou em 300 € (facto 22.) e a indemnização que acabámos de apurar atinge 1.626 €, o que revela logo que passámos de uma desproporção de cerca de 35 vezes mais para apenas cerca de 5 vezes mais. O que afasta logo a ideia de manifesta desproporção, pois o abuso de direito tem de ser manifesto de acordo com o trecho legal (art. 334º do CC). O que no nosso caso não se verifica.
Na verdade, não se divisa desproporção entre a vantagem do titular – a A. – e o sacrifício por ele imposto a outrem – a R. -, em termos de valores financeiros (vide Menezes Cordeiro, Tratado de D. Civil, Parte Geral, T. IV, 2007, págs. 341, 346, 348).
Não se verifica, pois, qualquer abuso de direito.
5. Sumariando (art. 663º, nº 7, do NCPC): (…).
IV – Decisão
Pelo exposto, julga-se o recurso parcialmente procedente, e, em consequência, condena-se a R. a pagar à A. a quantia de 1.626 €, acrescida de juros civis (4%), contabilizados desde a citação – ocorrida em 11.9.2024 - até integral pagamento.
*
Custas pela A. e R. na proporção do vencimento/decaimento.
*
Moreira do Carmo
Vítor Amaral
Fonte Ramos