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DANO BIOLÓGICO
DANO NÃO PATRIMONIAL
Sumário
Sumário (a que se refere o artigo 663º nº 7 do CPC e elaborado pelo relator): A uma sinistrada de 20 anos que ficou afectada de défice funcional permanente de seis pontos percentuais, resultante de fractura de vértebra dorsal D12, que sofreu afectação temporária por mais de um ano, e que padeceu de quantum doloris em grau 4 em 7, mostra-se adequado fixar a indemnização por dano biológico em trinta mil euros e a indemnização por danos não patrimoniais em vinte e cinco mil euros.
Texto Integral
Acordam os juízes que compõem este colectivo da 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:
I. Relatório1
AA e BB, ambas nos autos m.id., vieram instaurar a presente acção declarativa com processo comum contra Fidelidade, Companhia de Seguros, S.A., pedindo a condenação desta no pagamento à Autora AA de: a) 30.000,00 € acrescidos de juros à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento, a título de danos patrimoniais; b) 20.000,00 € acrescidos de juros à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento a título de danos não patrimoniais; à Autora BB: c) 45.812,35 € acrescidos de juros à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento a título de danos patrimoniais; d) 50.000,00 € acrescidos de juros à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento a título de danos não patrimoniais.
Mais pediram que, não sendo ainda possível calcular o valor total das indemnizações decorrentes dos danos morais e patrimoniais, causados ao corpo, à saúde, à mente e ao património das Autoras, se relegue a determinação das respetivas importâncias, para liquidação de sentença.
Alegaram as AA. terem sido vítimas de acidente de viação.
Contestou a Ré, aceitando que o veículo por si seguro seja o responsável pela produção do acidente, mas impugnando os danos invocados pelas Autoras como tendo sido decorrentes do acidente e considerando manifestamente excessivas as quantias peticionadas.
Foi dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador em 20.04.2021, no âmbito do qual foi fixado o valor da causa em €145.812,35, foi julgada improcedente a excepção da litispendência, foi identificado o objeto do litígio e foram enunciados os temas da prova. Foi determinada a realização de Perícia às Autoras, cujos relatórios foram juntos em 26.08.2022 e os aditamentos, na sequência do envio de novos documentos, em 30.01.2023.
Realizou-se a audiência final sendo seguidamente proferida sentença de cuja parte dispositiva consta:
“Pelo exposto, ao abrigo das citadas disposições legais:
Julgo parcialmente procedente, por parcialmente provada, a presente ação e, em consequência, condeno a Ré FIDELIDADE COMPANHIA DE SEGUROS, S. A. a pagar:
a) à Autora AA, a quantia total de €15.000,00 – quinze mil euros (sendo a quantia de €10.000,00, a título de danos não patrimoniais, e a quantia de €5.000,00, a título de dano biológico);
b) à Autora BB, a quantia total de €25.378,00 – vinte e cinco mil trezentos e setenta e oito euros (sendo a quantia de €378,00, a título de danos patrimoniais, a quantia de €15.000,00, a título de danos não patrimoniais, e a quantia de €10.000,00, a título de dano biológico);
e absolvo a Ré FIDELIDADE COMPANHIA DE SEGUROS, S. A. do demais peticionado.
Valor da causa (fixado no despacho saneador de 20/04/2021 - fls. 121): (…)
Custas pelas Autoras e pela Ré na proporção do respetivo decaimento (art.º 527.º, nºs 1 e 2, do C.P.C.)”.
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Inconformadas, as Autoras interpuseram o presente recurso, formulando, a final, as seguintes conclusões:
1.O Tribunal recorrido decidiu, tão só, com fundamento nos documentos juntos aos autos, tendo abstraído, por completo, do facto de ter sido produzida, pelas Autoras, prova por declarações e prova testemunhal (cfr. Ponto V da Sentença, com o título: Fundamentação da Matéria de Facto.), em violação grosseira do disposto nos artigos 495 a 526, Arts 599 a 606 e 607 a 612, todos do CPC, preceito que foram interpretados em violação dos artigos 1, 2, 13 e 20 da Constituição da Republica Portuguêsa2.
2. A Sentença recorrida abstraiu, por completo, da matéria respeitante a outros factos essenciais e a outros factos instrumentais, resultante da prova testemunhal e da prova por declarações produzida, em violação dos princípios da descoberta da verdade material, da aquisição processual e do acesso à justiça e aos Tribunais, em violação do disposto no art 5 nº 2 (de onde resulta que, para Além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz: a) Os factos instrumentais que resultem da instrução da causa, no art 574 nº 2 e 607 nº 4 todos do CPC, preceitos que foram interpretados em violação dos artigos 1, 2, 13 e 20 da Constituição da Republica Portuguêsa.
3. O caracter genérico da parte da sentença, de onde resulta (numa autentica lei do menor esforço) que “As declarações de parte das Autoras revelaram um teor genérico e pouco objetivo, o mesmo sucedendo com os depoimentos das testemunhas inquiridas em julgamento, consubstancia nulidade por falta de fundamentação, já que, a sentença Recorrida não demonstrou, em concreto, em que medida é que cada depoimento de cada testemunha e, em que medida é que cada parte das declarações de cada uma das AA, não permitiu que o Tribunal recorrido deles retirasse qualquer conclusão, opção que consubstancia nulidade por falta de fundamentação (arts 154, 607 e 615 do CPC), invalidade que vai aqui expressamente arguida e deverá determinar a anulação, também nesta parte, da sentença recorrida.
4. Da conjugação da prova documental, testemunhal e por declarações das Autoras (cfr. transcrições da prova gravada supra Pontos 3.4, 3.5, 3.6 e 3.7 do Capítulo III da Motivação supra), o Tribunal recorrido deveria ter dado como provada a matéria (dada, na sentença, como não provada): alíneas a) a h) do capítulo IV da Motivação do Presente recurso.
5. Da conjugação da prova documental, testemunhal e por declarações das Autoras (cfr. (cfr. transcrições da prova gravada supra Pontos 3.4, 3.5, 3.6 e 3.7 do Capítulo III da Motivação supra), o Tribunal recorrido deveria ter dado, ainda, como provada, toda a matéria descrita nas alíneas a) a X) do Capítulo V) da Motivação do Presente recurso.
6. Ao ter fixado, como fixou, indemnizações miseráveis, face aos danos comprovadamente resultantes, para as Autoras, do acidente de viação dos autos, a Sentença recorrida violou o disposto no art 483 do Código Civil, preceito que foi interpretado em violação dos artigos 1, 2, 13 e 20 da Constituição da República Portuguêsa e dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da igualdade e da proporcionalidade.
7. Dando ou não dando, a nova matéria acima descrita como provada, o Tribunal recorrido deveria ter interpretado o disposto no art 483 do Código Civil, em conformidade com o disposto nos artigos 1, 2, 13 e 20 da Constituição da República Portuguêsa e nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da igualdade e da proporcionalidade, condenando a Ré a pagar à Autora, AA: 30.000,00 € (trinta mil euros) acrescidos de juros à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento, a título de danos patrimoniais + 20.000,00 € (vinte mil euros) acrescidos de juros à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento a título de danos não patrimoniais.
8. Dando ou não dando, a nova matéria acima descrita como provada, o Tribunal recorrido deveria ter interpretado o disposto no art 483 do Código Civil, em conformidade com o disposto nos artigos 1, 2, 13 e 20 da Constituição da República Portuguêsa e nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da igualdade e da proporcionalidade, condenando a Ré a pagar à Autora, Autora BB 45.812,35 € (quarenta e cinco mil, oitocentos e doze euros e trinta e cinco cêntimos) acrescidos de juros à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento a título de danos patrimoniais + 50.000,00 € (cinquenta mil euros) acrescidos de juros à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento a título de danos não patrimoniais.
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Contra-alegou a Ré, pugnando pela manutenção da sentença recorrida.
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir:
II. Direito
Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação - artigo 635.º, n.º 3, 639.º, nº 1 e 3, com as excepções do artigo 608.º, n.º 2, in fine, ambos do Código de Processo Civil - as questões a decidir são a nulidade da sentença por falta de fundamentação, a impugnação da decisão sobre a matéria de facto e, independentemente desta, o aumento do valor das indemnizações arbitradas e o pagamento de juros de mora sobre tais indemnizações.
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III. Matéria de facto
A decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal de primeira instância é a seguinte:
“III - Factos Provados.
Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos com relevância para a decisão da causa, com exclusão da matéria irrelevante ou com teor conclusivo ou de direito:
1. Em 02 de Novembro de 2013, pelas 8:00 horas, a Autora AA conduzia o veículo de marca Renault, modelo Clio, matrícula ..-..-CT, na companhia de sua filha, a Autora BB, que seguia no banco de passageiros, ao lado da condutora.
2. Deslocavam-se da Azoia em direção a Sintra, para o local de trabalho da Autora AA.
3. Quando se encontravam na Estrada de Galamares, ao lado da Quinta do Cosmo, no sentido Azoia-Sintra, que se caracteriza por ser uma recta com duas vias de sentido de trânsito, opostas, separadas por uma linha descontínua, ocorreu um acidente de viação.
4. O veículo de Marca Mitsubishi modelo Lancer, matrícula ..-..-OV, propriedade de CC, circulava na hemi-faixa do sentido contrário, na direcção Sintra-Colares.
5. Este circulava, no circunstancialismo de tempo e lugar referidos no facto 4 quando saiu da respetiva faixa de rodagem invadindo a faixa de rodagem em que seguiam as Autoras, tendo embatido primeiro na lateral esquerda do carro que seguia à frente do das Autoras, que era conduzido por DD, a qual antes do referido embate conseguiu, desviar-se um pouco para a sua direita evitando assim a colisão frontal entre eles, e de seguida embateu, também, na parte dianteira do veículo conduzido pela primeira Autora.
6. Tal veículo, por força do embate no veículo conduzido pela Autora AA, retornou para a sua faixa de rodagem, acabando por ficar imobilizado após embater num plátano.
7. Na altura do acidente ambas as Autoras usavam os respetivos cintos de segurança, na respetiva viatura, que não possuía airbag.
8. As Autoras ficaram encarceradas no carro, sendo que a Autora AA, ficou presa entre o banco do carro e o volante, perdeu os sentidos até que começou a sentir escorrer sangue na testa, altura em que recuperou os sentidos, contudo não conseguia ver por estar com um volumoso edema facial com envolvimento dos olhos e sentia fortes dores na perna direita.
9. A Autora BB ficou encarcerada entre o tablier do Carro e banco sentindo fortes dores ao nível da coluna e perdeu sensibilidade nas pernas, não as sentindo.
10. Foram para aquele local acionados os Bombeiros Voluntários de Colares e os de Almoçageme.
11. Os Bombeiros Voluntários procederam ao desencarceramento das autoras, procedendo, para o efeito, ao corte do veiculo, no que demoraram cerca de uma hora e meia ou duas horas.
12. Reunidas as condições para retirar do veículo as Autoras, primeiramente foi retirada da viatura a Autora BB, à data com 20 anos de idade, e posteriormente a Autora AA, com 40 anos de idade à data do acidente.
13. Foram ambas assistidas no local por médico que integrava os elementos da viatura de Emergência médica do INEM, tendo a Autora AA sido avaliada e tratada no local.
14. Para transporte ao Hospital, a Autora BB foi imobilizada, com colocação de colete de extração e colar cervical, tendo-lhe sido administrado soro.
15. Também a Autora AA foi imobilizada com colar cervical e transportada para o Hospital … em maca.
16. Ambas as Autoras foram transportadas para o Hospital ….
17. À Autora AA foi realizado TAC – CE, o mesmo revelou traumatismo toracoabdominal, resultante do embate com o volante.
18. Apresentava hematoma peri-orbitário significativo que impossibilitava a Autora AA de abrir a pálpebra esquerda e parcialmente a direita, apresentando ferida frontal extensa, quase em linha recta que começava no lado direito da testa, perto do cabelo, até à sobrancelha, com hematoma epicraniano frontoparietal esquerdo.
19. Foi efetuada drenagem de hematoma frontal e encerramento da ferida, tendo sido colocado dreno passivo e penso compressivo.
20. Apresentava hematoma no antebraço esquerdo e ferida no joelho direito, tendo esta última sido suturada, com indicação para serem retirados os pontos em 12/11/2013.
21. Foi medicada com antibiótico.
22. Foi transferida para o Hospital …, na Amadora, onde ficou um dia em observação tendo alta hospitalar na manhã do dia seguinte ao do acidente, ou seja, em 03.11.2013.
23. Em 04/11/2013, foi observada no Hospital …, onde passou a ser seguida em consulta de Cirurgia Plástica.
24. Foi a consulta de cirurgia plástica no Hospital … em Cascais, com a Dra. EE, que sugeriu realização de cirurgia reconstrutiva das cicatrizes da face e do joelho, as quais não foram efetuadas porquanto não havia garantias de um bom resultado.
25. As lesões sofridas pela Autora AA, em consequência do acidente de 02/11/2013, determinaram um período de Défice Funcional Temporário Total de 2 dias (entre 02/11/2013 e 03/11/2013), de Défice Funcional Temporário Parcial de 58 dias (entre 04/11/2013 e 31/12/2013) e de Repercussão Temporária na Atividade Profissional Total de 60 dias (entre 02/11/2013 e 31/12/2013), sendo que à data do acidente a mesma trabalhava como florista, auferindo mensalmente valor correspondente ao salário mínimo nacional.
26. O Quantum Doloris (correspondente à valoração do sofrimento físico e psíquico vivenciado pela vítima durante o período de danos temporários, isto é, entre a data do evento e a cura ou consolidação das lesões) é fixável no grau 3 numa escala de 7 graus de gravidade crescente, tendo em conta o tipo de traumatismo, as lesões resultantes, o período de recuperação funcional, os tratamentos efetuados e o facto de a filha ter estado envolvida no mesmo acidente, com necessidade de cuidados por parte da Autora.
27. O dano estético permanente é fixável no grau 2 numa escala de 7 graus de gravidade crescente, atendendo às cicatrizes frontal esquerda e no joelho direito.
28. A Autora BB, no Hospital … foi submetida a diversos exames radiográficos que revelaram fratura da vértebra dorsal D 12.
29. Em 03/11/2013, a Autora BB foi transferida para o Hospital da sua área de residência, Hospital …, onde permaneceu internada, no serviço de ortopedia, com diagnóstico clínico de fratura da coluna dorsal, fechada, sem lesão medular que foi estabilizada, tendo-lhe sido atribuída alta para o domicílio em 13/11/2013 com uso de colete Jewett, tendo sido, desde logo referenciada para consulta externa de Ortopedia para dia 16/12/2013.
30. Por prescrição do seu médico de Medicina Geral e Familiar, em 29.05.2014, realizou exames complementares de diagnóstico.
31. No TAC crânio encefálico realizado não se observaram “alterações intraparenquimatosas focais”.
32. No TAC efetuado à coluna dorsal, foi evidenciada deformação cuneiforme da base posterior do corpo de D12 por afundamento da plataforma vertebral superior, observando-se alguns fenómenos de esclerose óssea e reparadora e hérnia intraesponjosa, que traduzem fratura do corpo de D12.
33. Face aos resultados dos exames, a Autora BB foi aconselhada a ser seguida em consulta da especialidade, pelo que em 17.07.2014, teve consulta médica no Hospital … Cascais, com a Dra. FF, sendo que a mesma, face à fratura do Corpo D12, com arco posterior mantido sem evidência de compressão medular, com deformação da vértebra a este nível, com fulcro da inversão da curvatura a nível dorso lombar, referiu não haver indicação para intervenção neurocirúrgica.
34. A Autora BB foi encaminhada para Fisiatria, efetuando várias sessões entre 23.07.2014 e Maio de 2015 e iniciado a prática de natação nos Bombeiros Voluntários de Colares.
35. À data do acidente era estudante e frequentava o 12º ano da Escola Secundária de ….
36. As lesões sofridas pela Autora BB, em consequência do acidente de 02/11/2013, determinaram um período de Défice Funcional Temporário Total de 12 dias (entre 02/11/2013 e 13/11/2013), de Défice Funcional Temporário Parcial de 408 dias (entre 14/11/2013 e 26/12/2014) e de Repercussão Temporária na Atividade Escolar Total de 65 dias (entre 02/11/2013 e 05/01/2014).
37. O Quantum Doloris (correspondente à valoração do sofrimento físico e psíquico vivenciado pela vítima durante o período de danos temporários, isto é, entre a data do evento e a cura ou consolidação das lesões) é fixável no grau 4 numa escala de 7 graus de gravidade crescente, tendo em conta o tipo de traumatismo, as lesões resultantes, o período de recuperação funcional e os tratamentos efetuados.
38. O défice funcional permanente da integridade físico-psíquica é fixável em 6 pontos, não sendo de perspetivar a existência de Dano Futuro.
39. A Autora BB concluiu o 12º ano, tirando curso de multimédia web design, contudo, porque sempre pretendeu ingressar no serviço militar (exército), em 09/04/2014 foi sugerida observação em consulta de Coluna para avaliação da possibilidade de ingressar no exército, conforme documento junto com a p.i. como Doc. 9, a fls. 44, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido.
40. Decorrente da lesão da vertebra D12, a Autora BB desde a data do acidente apresenta desvio e encurtamento do membro inferior direito relativamente ao esquerdo que é compensado e corrigido pela utilização de palmilha de 5-7mm, que é prescrita pelo s/ médico, sendo que, em 12/08/2022, não fazia uso de palmilha de compensação.
41. A culpa do acidente foi exclusiva de GG, que à data do acidente em apreço nos presentes autos, conduzia o veículo de Marca Mitsubishi modelo Lancer, matrícula ..-..-OV, que se mostrava inscrito a favor de CC, mas cuja responsabilidade civil perante terceiros por acidente de viação em que este veículo fosse interveniente, se encontrava transferida, por meio do seguro obrigatório automóvel, para a Ré, seguradora “Fidelidade – Companhia de Seguros S.A”, aqui ré, pela subscrição da apólice n.º ....
42. A Autora AA trabalhava, à data do acidente, como florista.
43. A Autora AA já foi ressarcida pela terceira Ré relativamente ao período de incapacidade temporária absoluta.
44. Quanto à Autora BB, apesar de ter sido efetuado o pagamento, por parte da ré de algumas das despesas com transporte, fisiatria e natação, continuam ainda por liquidar as seguintes faturas:
i. As Faturas emitidas pelo complexo de piscinas dos Bombeiros Voluntários de Colares referente frequência na Natação dos meses de Janeiro, Março, Abril e Junho de 2015, que se cifram em €167,50 (juntas com a p.i. a fls. 37, 37v, 38, 38v e 39v, cujos teores dão-se aqui por integralmente reproduzidos);
ii. As Faturas emitidas, nos meses de Fevereiro e Março de 2015, pela Associação Humanitária de Bombeiros Voluntários de referentes a tratamento fisiátrico que se cifram, no total, em €160,00 (juntas com a p.i. a fls. 40 e 40 verso, cujos teores dão-se aqui por integralmente reproduzidos);
iii. A Fatura de farmácia datada de 05.02.2015 no valor de €12,50 (junta com a p.i. a fls. 41, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido);
iv. A Fatura referente a tratamento de medicina física e reabilitação emitida pela clínica … Cascais, em Fevereiro de 2015, no valor de 38,00 € (junta com a p.i. a fls. 41 verso, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido).
IV – Factos Não Provados.
Não resultou provado, com relevância para a decisão da causa:
a) Que a transferência de hospital referida no facto provado nº 22 se devesse ao facto de a Autora AA apresentar queixas de cefaleias intensas.
b) Que, nos dois meses seguintes, a Autora AA necessitasse de ser apoiada por familiares nas suas tarefas básicas diárias, nomeadamente para se alimentar, nas deslocações à casa de banho para fazer a sua higiene pessoal e para realizar as atividades domésticas.
c) Que a Autora AA tivesse sofrido um período de incapacidade temporária absoluta de 95 dias.
d) Que as cicatrizes na região frontal e no joelho direito causassem embaraço e desconforto à Autora AA, de tal modo que raramente vestisse saias e, desde aquela data, sempre usasse franja de modo a esconder as cicatrizes.
e) Que se tivesse tornado difícil para a Autora AA esquecer os momentos de pânico que vivenciou durante o período em que esteve, cerca de duas horas, encarcerada dentro do veículo automóvel, o que lhe tivesse provocado perturbações.
f) Que a Autora, quando necessita de deslocar-se em veículo automóvel, fique ansiosa e continue com medo de conduzir e por isso com falta de concentração.
g) Que, sempre que se coloca a perspetiva de ter de conduzir, a Autora AA fique bastante ansiosa, o que interfere com a sua vida interpessoal.
h) Que, até Março de 2018, altura em que casou e passou a residir na Suíça, a Autora AA todos os dias se deslocava de automóvel para o seu local de trabalho passando, por isso, pelo local onde ocorreu o acidente, recordasse diariamente o acidente e ficasse sistematicamente ansiosa e temerosa.
i) Que a Autora AA padecendo regularmente de fortes cefaleias, enxaquecas e quando há alterações climatéricas os seus olhos se ressintam de imediato e fiquem inchados e avermelhados.
j) Que a Autora BB estivesse acamada cerca de 2 meses após o acidente, sem que durante esse período conseguisse movimentar-se sozinha, e que necessitasse permanentemente do apoio de uma terceira pessoa.
k) Que, após os referidos dois meses, a Autora BB, com extrema dificuldade logrou fazer levante do colete, conseguindo deambular sozinha, contudo ainda assim necessitasse do apoio de terceira pessoa para colocar colete, que usou por mais de dois anos.
l) Que a Autora BB continuasse ainda a necessitar do auxílio de terceiro para realizar atividades básicas da sua vida diária, como vestir-se e calçar-se, e não tolerasse, mesmo com o colete, a posição de pé.
m) Que a Autora BB tivesse sofrido um período de incapacidade temporária Absoluta de 95 dias.
n) Que o período de baixa médica, que decorreu entre o dia 02.11.2013 a 05.01.2014, tivesse naturalmente repercussões na vida escolar da Autora BB, já que esteve impossibilitada de frequentar as aulas até ao dia 05.01.2014, altura em que já conseguia deambular com o colete e ter mais autonomia, contudo, ainda assim sentisse dores e desconforto permanente e passasse a maior parte das aulas de pé (que tinham duração de 90 minutos) não podendo realizar as atividades da disciplina de educação física.
o) Que a Autora BB tivesse muitas dificuldades motoras, nomeadamente descer escadas, o que no período de aulas determinasse que não fosse para os espaços do recreio.
p) Que a situação física da Autora BB a impedisse de realizar as obrigatórias provas físicas para ingresso no exército.
q) Que, além de toda a dor e sofrimento que a Autora BB padeceu desde a data do acidente de viação até à data de consolidação da lesão na vértebra D12, com todas as limitações supra referidas, ainda hoje, continue a ver afetado o seu dia-a-dia.
r) Que as dores que diariamente tem na coluna, que ainda hoje tenha e que desconheça se algum dia deixará de as ter, limitam-na a nível motor, impossibilitando-a fisicamente de estar sentada por muito tempo, estar de pé por muito tempo, não pode andar muito a pé, correr.
s) Que ainda hoje não são totalmente conhecidas as sequelas, assim como os reais danos e consequentes limitações e repercussões resultantes das lesões sofridas pela Autora BB no acidente de viação.
t) Que as limitações físicas da Autora BB estendem-se e verificam-se não só a nível funcional no tocante à postura, movimentação de cargas, levantamento/sustação de pesos, como também a nível situacional em atos da vida diária como o vestir-se, calçar-se, tomar banho e realizar algumas tarefas da lide doméstica (aspirar, passar a ferro, lavar a loiça) que são por esta realizadas com dificuldade acrescida.
u) Que ultimamente tenha acontecido que a Autora BB repentinamente começa a sentir-se mal, deixe de ver e tenha que se deitar para se recompor.
v) Que a Autora BB desconheça se algum dia poderá vir a ter filhos e caso os tenha como poderá a lesão da vértebra afetar o seu organismo, de tal modo que a venha a impossibilitar de levar uma vida minimamente autónoma e condigna.
w) Que, à data do acidente, ambas as Autores fossem saudáveis, não lhes fossem conhecidas quaisquer doenças, sendo que, em virtude do acidente, ambas ficaram com danos permanentes que as acompanharão para o resto das respetivas vidas. (facto conclusivo)
x) Que a Autora BB tivesse realizado despesas referentes a Transporte para realização de tratamentos por lesões provenientes do acidente respeitantes aos meses de Setembro 2014, Janeiro, Março, Maio e Junto de 2015 no total de €434,35.
A restante matéria alegada não foi considerada por se tratar de matéria irrelevante, conclusiva ou de direito”.
O tribunal fundamentou a matéria de facto nos seguintes termos:
“O tribunal fundou a sua convicção, quanto aos factos provados:
- Quanto aos factos provados nºs 1 a 24, 28 a 35, 39 a 43, no acordo das partes em sede de articulados e no teor dos Relatórios Periciais juntos em 26/08/2022, a fls. 291 a 295 e 296 a 299.
- Quanto aos factos provados nºs 25, 26 e 27, no teor do Relatório Pericial junto em 26/08/2022, a fls. 296 a 299.
- Quanto aos factos provados nºs 36, 37 e 38, no teor do Relatório Pericial junto em 26/08/2022, a fls. 291 a 295.
- Quanto ao facto provado nº 44, no teor dos documentos consistentes em faturas juntas a fls. 37, 37v, 38, 38v e 39v, 40 e 40v, 41 e 41v.
Em suma, a convicção do tribunal, quanto aos factos provados, fundou-se na análise conjugada dos meios de prova supra enunciados, conforme supra exposto.
A convicção do tribunal quanto aos factos não provados assentou na ausência ou na insuficiência de meios de prova produzidos sobre os mesmos. As declarações de parte das Autoras revelaram um teor genérico e pouco objetivo, o mesmo sucedendo com os depoimentos das testemunhas inquiridas em julgamento. Quanto ao facto não provado constante na alínea x) atinente a transporte, não foram juntas faturas em nome da Autora BB que os demonstrassem.
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IV. Apreciação
1ª questão: da nulidade da sentença por falta de fundamentação.
É jurisprudência firme a de que a nulidade por falta de fundamentação a que se refere o artigo 615º nº 1 al. b) do Código de Processo Civil só se verifica no caso de falta absoluta de fundamentação. De resto, para a eventualmente deficiente fundamentação da convicção do tribunal relativamente à decisão sobre a matéria de facto o legislador previu remédio específico, outro que a nulidade de sentença, a saber, quanto é disposto no artigo 662º nº 2 alínea d) do Código de Processo Civil.
Improcede assim a nulidade invocada.
2ª questão: da impugnação da decisão sobre a matéria de facto:
Pretendem as recorrentes que seja dado como provado que:
a) Que, nos dois meses seguintes, a Autora AA necessitasse de ser apoiada por familiares nas suas tarefas básicas diárias, nomeadamente para se alimentar, nas deslocações à casa de banho para fazer a sua higiene pessoal e para realizar as atividades domésticas.
b) Que a Autora AA tivesse sofrido um período de incapacidade temporária absoluta de 95 dias.
c) Que as cicatrizes na região frontal e no joelho direito causassem embaraço e desconforto à Autora AA, de tal modo que raramente vestisse saias e, desde aquela data, sempre usasse franja de modo a esconder as cicatrizes.
d) Que se tivesse tornado difícil para a Autora AA esquecer os momentos de pânico que vivenciou durante o período em que esteve, cerca de duas horas, encarcerada dentro do veículo automóvel, o que lhe tivesse provocado perturbações.
e) Que a Autora, quando necessita de deslocar-se em veículo automóvel, fique ansiosa e continue com medo de conduzir e por isso com falta de concentração.
f) Que, sempre que se coloca a perspetiva de ter de conduzir, a Autora AA fique bastante ansiosa, o que interfere com a sua vida interpessoal.
g) Que a Autora AA padecendo regularmente de fortes cefaleias, enxaquecas e quando há alterações climatéricas os seus olhos se ressintam de imediato e fiquem inchados e avermelhados.
h) Que a Autora BB estivesse acamada cerca de 2 meses após o acidente, sem que durante esse período conseguisse movimentar-se sozinha, e que necessitasse permanentemente do apoio de uma terceira pessoa.
Mais pretendem que sejam aditados aos provados os invocados “factos essenciais e instrumentais seguintes”:
a) Em consequência do embate, a Autora AA bateu com a cabeça no votante, esteve um momento sem responder, ao ponto de a Autora BB tivesse pensado que a mãe estaria morta
b) Logo a seguir ao embate, a Autora BB começou a entrar a pânico, começou a deixar de sentir as pernas e deixou de sentir da cintura para baixo.
c) Os Bombeiros que vieram serrar o carro disseram que se tirassem a Agora AA do carro ela morria.
d) A Autora AA começou a gritar quando a tiraram do carro, por não aguentar com as fortes dores na cabeça, tendo começado a escorrer sangue
e) A Autora BB, que permaneceu internada de 02.11.2013 a 13.11.2023 só começo a sentir as pernas passado uma semana de sair do hospital, não conseguindo mexer os pés.
f) A Autora BB sentiu dores no hospital, na zona da lombar.
g) A Autora BB sofreu muitas dores na coluna, tendo passado todo o internamento em posição horizontal, totalmente imobilizada.
h) A Autora BB saiu do hospital com cadeira de rodas, tendo ido para casa, com dores lombares,
i) Ainda hoje, quando lhe começa a doer a coluna, a Autora BB fica com a perna dormente, começa a subir à cabeça e desmaia.
j) Depois do acidente, a vida da Autora AA nunca mais foi o que era, já que quando lhe começa a doer a cabeça e começa a ficar com os olhos muito inchados, desmaiando.
k) A Autora AA deixou de conduzir viaturas automóveis durante muito tempo, já que começa com dores na cabeça, tem que encostar, não aguentando conduzir da da Azóia até Lisboa, sem parar a meio do caminho.
l) Em consequência directa e necessária do acidente, a Autora BB deixou de poder cumprir o senho de ingressar no exercito, deixou de conseguir saltar um muro, não consigo carregar a minha filha de um ano ao colo, teve gravidez de risco, obrigada a permanecer 9 meses deitada repouso absoluto, não consegue pegar nem levar as compras para casa, não consegue abaixar-se, tem que usar uma palmilha para toda a vida prescrita pelo Dr HH da CUF, para o que dispense de 25 euros por cada, de seis em seis 6 meses, ainda hoje sinto dores, não consegue dormir para o lado esquerdo, porque a costela começa a estalar e fica com a perna dormente, ao fim se alguns minutos sentada, tenho que se deitar, conduz deitada com o banco quase totalmente deitado.
m) A Autora BB deixou de conseguir correr (e de participar em cortamatos) e praticar Padle, não consegue dar banho à filha, para conseguir levantar-se da cama tem que se agarrar à cabeceira da cama, não consegue aspirar debaixo das camas, não consegue limpar coisas abaixo da cintura, já não é capaz de limpar a arca, deixou de conseguir tirar coisas da arca.
n) Desde o acidente, teve que começar a tomar laxantes, tem que fazer muita força para evacuar
o) Na satisfação de necessidade intimas e sexuais, a Autora BB já não consegue por-se em certas e determinadas posições na sua intimidade, está limitada a certos actos sexuais, a sua vida intima não é igual à de uma pessoa dita normal, tendo a Autora BB tido necessidade de fazer terapia de casal com o seu marido, sofreu alterações que não lhe permitem satisfazer-se sexualmente como mulher, sua vida sexual não funciona da mesma maneira.
p) Antes do acidente a Autora BB atingia o orgasmo mais facilmente, antes fazia uma série de posições enquanto mantinha relações sexuais, que hoje não consegue.
q) Logo a seguir ao acidente, a autora AA: ouviu a minha filha a gritar dizendo que já não sentida apercebeu-se que tinha um buraco na testa e atras também, os bombeiros tiverem 2 horas a serrar para a desencarcerarem, começou a gritar quando a meteram na ambulância, com dores horríveis, sentiu que a cabeça era um balão a encher, que ia explodir, em consequência das dores intensas, sentiu que não sabia o que havia de fazer da sua vida, já que lhe doíam as pernas, os braços, doía-me tudo.
r) Em consequência do acidente, a Autora AA queixa-se que lhe custa ler e a escrever, já não vê tão bem, continua com fortes dores de cabeça, não tinha cicatriz nenhuma, quando muda o tempo fica cheia de dores.
s) Depois do acidente, a Autora AA esteve 2 meses deitada no sofá, sem se conseguir levantar, sem se conseguir virar nem para a direita nem para a esquerda, tal era a intensidade das dores.
t) Sempre que tem dores de cabeça, a Autora AA sente-se como se a cabeça fosse rebentar, como nunca teve antes do acidente, com as dores, deixo de ver, deixo de sentir as penas e os braços.
u) A Autora BB, queixa-se, ainda, de frequentes dores na bacia, deixou se conseguir pegar em pesos, deixou de conseguir fazer esforços, não consegue, sequer, pegar
V) Antes do acidente a Autora AA não sabia o que era uma dor de cabeça.
X) Sempre que tem dores de cabeça, a Autora AA sente vontade de por a cabeça debaixo do comboio”.3
Invocam as recorrentes a prova documental, testemunhal e por declarações. Não concretizam minimamente qual é a prova documental. E quanto à testemunhal e por declarações, transcreve-se aqui exactamente o corpo do recurso:
3.4: Transcrição de Depoimento Gravado (35min01seg) Dia: 06.11.2024 das 11h08 às 11h43 - Autora: BB
Minuto 2,50 a minuto 9,45 Advogado: Alguma vez foi interveniente num acidente de viação?
Autora BB: Acidente dia dos finados de 2013, tinha eu 20 anos, na recta de Galamares, por volta das 8 da manhã. A minha mãe bateu com a cabeça no votante. A minha mãe esteve um momento sem responder, eu pensei que a minha mãe estava morta, comecei a entrar a pânico, comecei a deixar de sentir as pernas e deixei de sentir da cintura para baixo. Bombeiros que vieram serrar o carro disseram que se a tirassem do carro ela morria. A minha mãe começou a gritar quando a tiraram do carro, que não aguentava a s dores na cabeça, começou só a escorrer sangue
Eu fiquei internada no hospital durante 3 semanas ou mais, parti a coluna dorsal D12, só comecei a sentir as pernas passado uma semana de sair do hospital, eu não conseguia mexer os pés. Senti dores no hospital, na zona da lombar. À minha mãe doi-lhe muito a cabeça e o joelho esquerdo. Tinha muitas dores na coluna, o Dr disse que ia levar muito tempo a sarar e disse-me que eu estivesse deitada como uma múmia. Saí do hospital com cadeira de rodas, fui para casa, com dores lombares, ainda hoje. Quando me começa a doer a coluna, fico com a perna dormente, começa a subir à cabeça e desmaio.
Minuto 18:02 a minuto 23:35 Advogado: Este acidente teve impacto na sua mãe? Autora BB: A vida nunca mais foi o que era. A minha mãe desmaia e começa a doer-lhe muito na cabeça, e começa a ficar com os olhos muito inchados
Advogado: A sua mãe já tinha a cicatriz?
Autora BB: A minha mãe não tinha a cicatriz, para uma mulher ficar ali com uma cicatriz não é bonito para ninguém, a mulher viva da imagem.
Advogado: O que é que a sua mãe deixou de fazer em consequente do acidente? Autora BB: Guiar para muito longe, começa com dores na cabeça, tem que encostar, não aguenta, da Azóia até Lisboa, tem que parar a meio, A minha mãe era uma pessoa que ia para todo o lado, distribuir flores.
Minuto 18:26 a 23:05 Advogado: Que impacto é que o acidente teve em si?
Autora BB: Eu queria para o exército e já não pude ir, saltar um muro são dá, a minha colona não deixa, não consigo carregar a minha filha de um ano, tive gravidez de risco, para que as costelas não estalassem, estive 9 meses deitada repouso absoluto, não consigo levar as compras para casa e pegar as compras, não me consigo abaixar com os dois para baixo, tenho que usar uma palmilha para toda a vida prescrita pelo Dr HH da CUF, pago 25 euros por cada e dá para 6 meses, ainda hoje sinto dores, não consigo dormir para o lado esquerdo, porque a costela começa a estalar e fico com a perna dormente,
Advogado: Que outras consequências teve o acidente para si?
Autora BB: Eu dantes fazia tudo e mais alguma coisa, ao fim se alguns minutos sentada, tenho que me deitar, conduzo deitada com o banco quase totalmente deitado.
Minuto 23:58 a minuto 25:36 Advogado: Mexeu com o seu bem estar?
Autora BB: Eu era uma pessoa livre e fiquei inibida de fazer uma série de coisas. Já não consigo correr tanto, tenho 1,73m e peso 50km, participava em corta matos e “padle” e já não consigo fazer nada, não consigo fazer nada com a minha filha, não consigo dar-lhe banho, se me baixar para dar-lhe não me levanto, não consigo pegar a minha filha ao colo, para me levantar da cama tenho que me agarrar à cabeceira da cama, não consigo aspirar debaixo das camas, não consigo limpar coisas abaixo da cintura, já não sou capaz de limpar a arca, deixei de conseguir tirar coisas da arca,
Minuto 26:46 a minuto 28:05 Advogado: Na satisfação de necessidades fisiológicas, intimidade, que alteração ocorreu?
Autora BB: Desde o acidente, tive que começar a tomar laxantes, tenho que fazer muita força. Na satisfação de necessidade intimas e sexuais, Já não dá para fazer certas e determinadas posições na minha intimidade, estou limitada a certas coisas, a nossa vida intima não é igual à de uma pessoa dita normal, casou-e impacto emocional, tive que ir fazer terapia de casal com o meu marido, sofri alterações e já não me posso satisfazer como mulher, a minha vida sexual não funciona da mesma maneira. Antes do acidente atingia o orgasmo mais facilmente, antes fazia uma série de posições que hoje não consigo.
3.5 Transcrição de Depoimento Gravado (20min37seg) Dia: 06.11.2024 das 10h47 às 11h08 - Autora: AA
Minuto 3:05 a minuto 7:03 Advogado: O que é que se lembra do acidente?
Autora AA: Ia no carro, o vidro partiu-se, ouvi a minha filha a gritar que já não sentida as pernas eu tinha um buraco na testa e atras também, o volante estava em cima de mim, os bombeiros tiverem 2 horas a serrar para me tirarem de lá, puseram-me uma coisa na cabeça, comecei a gritar quando me meteram na ambulância, com dores horríveis, sentia que a minha cabeça era um balão a encher, que ia explodir, eram tão intensas que eu não sabia o que havia de fazer da minha vida, doíam-me as pernas, os braços, doía-me tudo.
Minuto 10:03 a minuto 14:58 Advogado: Dê-me um exemplo de tarefas que antes do acidente conseguia fazer e hoje já não consegue fazer?
Autora AA: Agora custa-me a ler e a escrever, já não vejo tão bem, mas o que eu tenho mais problemas é a cabeça, tenho dores muito fortes, eu não tinha cicatriz nenhuma, quando muda o tempo fico cheia de dores, ainda em abril fui outra vez para o hospital cheia de dores. Depois do acidente estive 2 meses deitada no sofá, não me conseguia levantar, não podia virar nem para a direita nem para a esquerda, tinha dores horríveis.
Minuto 15:03 a minuto 19:58 Advogado: Para além desses ferimentos na cabeça, teve mais algum ferimento da barriga para baixo?
Autora AA: Tive no joelho e a cicatriz mas as dores na cabeça é que é para rebentar, que eu nunca tive isto antes do acidente, com as dores, deixo de ver, deixo de sentir as penas e os braços. A minha filha é que se está sempre a queixar de dores na bacia, ela não pode pegar em pesos, ela não pode fazer esforços, ela não pode pegar sequer numa cadeira ela tá arrumada com aquele problema na coluna, ante do acidente não tinha enxaquecas, não sabia o que é isso, quando estou com dores de cabeça, apetece-me por a cabeça debaixo do comboio.
3.6 Transcrição de Depoimento Gravado (09min35seg) Dia: 06.11.2024 das 10h33 às 10h43 - Testemunha: II
Minuto 4:12 a minuto 7:49 Advogado: Viu alguma ou as duas depois do acidente?
Testemunha II: Fui ao Hospital … e vi a AA nos Cuidados Intensivos, ela nem sequer falava, estava com os olhos fechados. Ela na cabeça tinha um grande golpe. A AA ainda hoje se queixa de dores na cabeça, ela queixa-se que não tem as mesmas forças que tinha antes do acidente, ela queixa-se que não tem força nos braços.
3.7 Minuto 1:59 a minuto 7:49 Transcrição de Depoimento Gravado (09min29seg) Dia: 06.11.2024 das 09h58 às 10h07 - Testemunha: GG
Advogado: Alguma vez assistiu a algum acidente na sua vida?
Testemunha GG: Foi no dia 02 novembro de 2013, em Colares, tive um acidente em que houve feridos, eu ia dentro de uma das viaturas, foi uma situação bastante traumática. As pessoas do outro carro, não sairam pelo próprio pé”.
Podemos começar exactamente pela testemunha GG. Já resulta dos factos provados que as recorrentes não saíram da viatura pelo seu próprio pé. Donde, a reavaliação do depoimento não serve para modificar qualquer segmento da decisão de facto.
Passemos a II, ex-companheiro da Autora AA, que não assistiu ao acidente, foi ver a Autora ao Hospital …, estando ela nos cuidados intensivos, não falando e com os olhos fechados, e que depois chegou a ir com a Autora ao hospital para fisioterapia. Não soube a testemunha dizer que tarefas a Autora AA conseguia fazer antes do acidente e que tenha deixado de fazer em consequência dele, e perguntado sobre queixas de dor, respondeu que a Autora AA ainda hoje se queixa, de dores de cabeça e de falta de força nos braços, mas que raras vezes, agora, fala com ela. Não viu a Autora BB.
Donde, para tudo o que respeita à Autora BB, a testemunha nada adianta. Para o que toca à Autora AA corrobora o estado em que a Autora estaria imediatamente após o acidente, já no Hospital em cuidados intensivos, o que nada adiante quanto ao tipo de lesões e sintomas que já constam provados dos autos. Quanto às dores de cabeça e falta de força nos braços, falta a prova, que a testemunha não fornece até porque já raramente fala (isto é, também, priva) com a Autora AA, de que elas são consequência do acidente.
Em suma, a testemunha não se mostra credível e de nada adianta.
Ouvimos, todavia, também o depoimento do ex-marido da Autora AA e pai da Autora BB, que ainda compareceu no local do acidente, que as recorrentes nem sequer indicam como relevante para a prova, e no qual ouvimos que a Autora BB saiu do hospital pelo seu próprio pé, não em cadeira de rodas.
Quedamo-nos então pelos depoimentos das Autoras, sendo o da Autora AA mais vivo e particularmente insistente na resposta “não me lembro”, e o da Autora BB mais calmo.
É verdade que não há um obstáculo essencial à valoração das declarações das partes, sendo, todavia, particularmente mais interessante que tais depoimentos possam ser acompanhados por outros meios de prova, o que, diga-se, não é o caso. Assim, temos sempre de ter a devida cautela relativamente ao natural interesse de quem depõe. Ora, temos de dar descontos ao empolamento, por exemplo, a Autora BB não esteve internada três semanas, isso é facto documentalmente provado, só esteve internada doze dias. A Autora AA com grande probabilidade não esteve dois meses deitada a olhar para cima, sem mexer a cabeça, porque vivendo então com BB, quando BB voltou para casa com colete de ferro, pouco mais de uma semana depois, onde é que está a evidência de que alguém esteve a ajudar simultaneamente AA e BB? Onde está a evidência de que a Autora BB já era casada? E que a sua vida sexual com o (mesmo) marido mudou, a ponto de terem de fazer terapia familiar? Nem foi junta certidão de casamento nem o marido ou companheiro sequer depôs.
Apreciando directamente cada ponto pretendido alterar temos:
a) Que, nos dois meses seguintes, a Autora AA necessitasse de ser apoiada por familiares nas suas tarefas básicas diárias, nomeadamente para se alimentar, nas deslocações à casa de banho para fazer a sua higiene pessoal e para realizar as atividades domésticas. Como já referimos, não temos nenhuma prova consistente disto.
b) Que a Autora AA tivesse sofrido um período de incapacidade temporária absoluta de 95 dias. O período mostra-se fixado no relatório de perícia, que não foi impugnado, e não se vê qualquer razão para valorar o depoimento da própria Autora em detrimento daquela prova.
c) Que as cicatrizes na região frontal e no joelho direito causassem embaraço e desconforto à Autora AA, de tal modo que raramente vestisse saias e, desde aquela data, sempre usasse franja de modo a esconder as cicatrizes. Não ouvimos uma única palavra sobre saias, nem verdadeiramente sobre franja, e a própria Autora AA desvalorizou as cicatrizes, insistindo na questão das dores de cabeça. O dano estético é inegável e está contemplado no relatório pericial e nos factos provados. Não se adita como provado mais nada.
d) Que se tivesse tornado difícil para a Autora AA esquecer os momentos de pânico que vivenciou durante o período em que esteve, cerca de duas horas, encarcerada dentro do veículo automóvel, o que lhe tivesse provocado perturbações. Não temos dúvida do pânico, mas a própria Autora AA não referiu a dificuldade de esquecimento e as perturbações. E isto sem embargo de um acidente ser algo que de vez em quando volta à memória. Nada se altera.
e) Que a Autora, quando necessita de deslocar-se em veículo automóvel, fique ansiosa e continue com medo de conduzir e por isso com falta de concentração. Não mereceu prova credível por parte das próprias Autoras. Nada se altera.
f) Que, sempre que se coloca a perspetiva de ter de conduzir, a Autora AA fique bastante ansiosa, o que interfere com a sua vida interpessoal. Não mereceu prova credível por parte das próprias Autoras. Nada se altera.
g) Que a Autora AA padecendo regularmente de fortes cefaleias, enxaquecas e quando há alterações climatéricas os seus olhos se ressintam de imediato e fiquem inchados e avermelhados. O relacionamento com as alterações climatéricas não teve prova consistente. É certo que a Autora AA se queixou de, de vez em quando, ter dores de cabeça fortes, mas o problema é que, relativamente a ela, cujo relatório pericial não lhe atribuiu qualquer défice funcional, nem lhe atribuiu qualquer dano futuro, nem lhe indicou qualquer problema de que viesse a padecer, provavelmente. De modo que, falhando outra prova sobre nexo causal, isto é, que as dores de cabeça sejam consequência do acidente, não se passa o facto a provado.
h) Que a Autora BB estivesse acamada cerca de 2 meses após o acidente, sem que durante esse período conseguisse movimentar-se sozinha, e que necessitasse permanentemente do apoio de uma terceira pessoa. Não houve prova consistente. Não se altera.
Quanto aos demais factos, vejamos:
a) Em consequência do embate, a Autora AA bateu com a cabeça no votante, esteve um momento sem responder, ao ponto de a Autora BB tivesse pensado que a mãe estaria morta. O embate no volante acaba a resultar provado do facto provado 8, não sendo necessário aditar. Quanto à emoção da Autora BB por ter pensado que a mãe teria morrido, não deixa essa situação de ser atendível com os factos que já estão provados relativamente ao acidente, pois que temos um acidente em que são envolvidas mãe e filha, que ficaram encarceradas, a mãe perdendo a consciência e só a recuperando quando lhe escorria sangue, e a filha não perdendo a consciência, sendo claro que a hipótese de morte da mãe, para a filha, se prefigura possível em tal caso. Não precisamos assim de aditar mais nada ao que cenário factual provado que já temos.
b) Logo a seguir ao embate, a Autora BB começou a entrar a pânico, começou a deixar de sentir as pernas e deixou de sentir da cintura para baixo. Já resulta do facto 9, sendo normal que a Autora tenha entrado em pânico, não sendo, porém, concretizado tal pânico nem a duração de tal pânico, e sendo certo que a A. AA perdeu a consciência e como repetiu inúmeras vezes, não se lembra de nada. Não temos prova credível dum facto concreto relacionado com o pânico, sendo que a normalidade aponta para que a emoção duma vítima, que não perdeu a consciência, em acidente de viação violento. seja sempre contemplada na fixação dos danos não patrimoniais, sem necessidade de fixação concreta. Nada se adita, portanto.
c) Os Bombeiros que vieram serrar o carro disseram que se tirassem a Agora AA do carro ela morria. Com o devido respeito, o facto é em si irrelevante. Interessaria a medida em que tal afirmação contribuíra para o sofrimento das Autoras. Não se adita o facto.
d) A Autora AA começou a gritar quando a tiraram do carro, por não aguentar com as fortes dores na cabeça, tendo começado a escorrer sangue. Esta última parte não é verdadeira, pois o sangue já escorria antes, conforme facto provado 8, não impugnado. Aliás, o ex-marido da Autora AA disse precisamente que chegou ao local antes do desencarceramento e que se via muito sangue. Quanto às dores e aos gritos, assim foi afirmada pelas Autoras, com credibilidade, podendo, pois, aditar-se aos factos provados que “A Autora AA começou a gritar quando a tiraram do carro, por não aguentar com as fortes dores na cabeça”.
e) A Autora BB, que permaneceu internada de 02.11.2013 a 13.11.2023 só começo a sentir as pernas passado uma semana de sair do hospital, não conseguindo mexer os pés. Assim o disse a Autora BB, mas não está corroborado por mais nenhum meio de prova, e é contraditório com a afirmação do pai em como saiu do hospital pelo seu pé.
f) A Autora BB sentiu dores no hospital, na zona da lombar.
g) A Autora BB sofreu muitas dores na coluna, tendo passado todo o internamento em posição horizontal, totalmente imobilizada.
Quanto a estes dois factos, estamos nas declarações da Autora, e devíamos estar com as recorrentes a indicarem os relatórios de internamento hospitalar dos quais resultavam estes factos, e dos quais resultava que não houvessem sido administrados analgésicos, e não estando, não aditamos os factos aos provados.
h) A Autora BB saiu do hospital com cadeira de rodas, tendo ido para casa, com dores lombares, Dada o depoimento da testemunha JJ, pai de BB, não se pode dar a primeira parte do facto como provado. Quanto à segunda parte, repetimos o que acabamos de dizer, isto é, que precisamos de mais elementos clínicos, quer quanto à prescrição de analgésicos, quer quanto aos efeitos da imobilização por colete na dor. E de resto, estaremos no domínio da evidência normal das dores, que já estão dadas como provadas no facto que se refere ao quantum doloris, não se justificando particularizar cada situação em que tais dores se verificaram.
i) Ainda hoje, quando lhe começa a doer a coluna, a Autora BB fica com a perna dormente, começa a subir à cabeça e desmaia. As declarações da Autora BB não concretizaram desmaios, e nem concretizaram a ocorrência e frequência da situação referida, de modo consistente. De resto, em questões clínicas, sempre teria interesse algum tipo de prova emitida por um médico. Não se adita o facto aos provados.
j) Depois do acidente, a vida da Autora AA nunca mais foi o que era, já que quando lhe começa a doer a cabeça e começa a ficar com os olhos muito inchados, desmaiando. Os episódios de dor não foram concretizados, na frequência da sua ocorrência, e não há prova alguma sobre o nexo causal, até porque, como resulta do que a Autora AA disse, não tem elementos médicos de averiguação, não fez mais exames clínicos especificamente relacionados ao apuramento da causa das dores e perturbações visuais e desmaios. De resto, diga-se, se a Autora entende que estes episódios estão relacionados com o acidente – o que é certo, porque o facto foi alegado em 43 da petição inicial – “Padecendo regularmente de fortes cefaleias, enxaquecas e quando há alterações climatéricas os seus olhos ressentem-se de imediato ficando inchados e avermelhados” – então tinha de se ter rebelado contra o relatório pericial que não lhe definiu tal sequência. Em suma, não há uma prova consistente.
k) A Autora AA deixou de conduzir viaturas automóveis durante muito tempo, já que começa com dores na cabeça, tem que encostar, não aguentando conduzir da da Azóia até Lisboa, sem parar a meio do caminho. O depoimento da filha da Autora não foi empenhado nem consistente neste aspecto. Não se adita o facto aos provados.
l) Em consequência directa e necessária do acidente, a Autora BB deixou de poder cumprir o senho de ingressar no exercito, deixou de conseguir saltar um muro, não consigo carregar a minha filha de um ano ao colo, teve gravidez de risco, obrigada a permanecer 9 meses deitada repouso absoluto, não consegue pegar nem levar as compras para casa, não consegue abaixar-se, tem que usar uma palmilha para toda a vida prescrita pelo Dr HH da CUF, para o que dispense de 25 euros por cada, de seis em seis meses, ainda hoje sinto dores, não consegue dormir para o lado esquerdo, porque a costela começa a estalar e fica com a perna dormente, ao fim se alguns minutos sentada, tenho que se deitar, conduz deitada com o banco quase totalmente deitado. Dizer então que factos e transcrições de julgamento não são exactamente a mesma coisa. Não está provado que tenha sido a lesão da coluna da Autora BB a causa de não poder ingressar na carreira militar, até porque houve seguimento clínico para se sopesar essa possibilidade, cujo resultado não está nos autos. Quanto às palmilhas, à data do exame para relatório pericial a Autora não as usava nem claudicava. Quanto a saltar muros, carregar a filha, levar compras, abaixar-se, dormir para um dos lados, e mesmo quanto a conduzir quase deitada, tudo isto não precisa de ser concretizado, na medida em que a Autora ficou a padecer de um défice funcional de seis pontos percentuais no qual tudo isto se inclui, a menos que a recorrente quisesse que algum destes factos fosse avaliado de modo a aumentar tal défice, o que não expressou. Ou a menos que a Autora entendesse que se tratava, qualquer um destes factos, de um dano não patrimonial, cuja gravidade teria de ser alegada e não o foi. É assim indiferente aditar estes factos. Quanto à gravidez de risco e à imobilização durante nove meses, precisávamos de um relatório médico compatível. Nada se adita assim aos factos provados.
m) A Autora BB deixou de conseguir correr (e de participar em cortamatos) e praticar Padle, não consegue dar banho à filha, para conseguir levantar-se da cama tem que se agarrar à cabeceira da cama, não consegue aspirar debaixo das camas, não consegue limpar coisas abaixo da cintura, já não é capaz de limpar a arca, deixou de conseguir tirar coisas da arca. A solução é a mesma da alínea anterior, não é necessário aditar, está incluído no défice funcional provado.
n) Desde o acidente, teve que começar a tomar laxantes, tem que fazer muita força para evacuar. Admitimos que lesão em D-13 comprometa a força abdominal, mas daí à necessidade dos laxantes já precisaríamos de um auxiliar probatório de natureza médica, que não temos. Não se adita.
o) Na satisfação de necessidade intimas e sexuais, a Autora BB já não consegue por-se em certas e determinadas posições na sua intimidade, está limitada a certos actos sexuais, a sua vida intima não é igual à de uma pessoa dita normal, tendo a Autora BB tido necessidade de fazer terapia de casal com o seu marido, sofreu alterações que não lhe permitem satisfazer-se sexualmente como mulher, sua vida sexual não funciona da mesma maneira. p) Antes do acidente a Autora BB atingia o orgasmo mais facilmente, antes fazia uma série de posições enquanto mantinha relações sexuais, que hoje não consegue.
Factos sub o) e p) – estes factos não foram alegados na petição inicial, constituem dano relevante que não é mencionado pela Autora no exame pericial, sendo bastante claro que o único problema então referido era a possibilidade da gravidez. Não há prova de que a Autora já fosse casada ou vivesse em união de facto ou sequer que tivesse como namorado o actual marido e que, portanto, no contexto desta mesma relação amorosa tenha havido mudança. Por outro lado, e com o maior respeito, o depoimento foi bastante genérico. Aceita-se a afirmação de se querer ser uma pessoa activa, mas a relação disso com a lesão que a Autora apresenta na coluna não é evidente. Sendo um campo específico, o mesmo deveria ter sido objecto de perícia médica, sem a qual não temos base suficiente para aditar a matéria aos factos provados.
q) Logo a seguir ao acidente, a autora AA: ouviu a minha filha a gritar dizendo que já não sentida apercebeu-se que tinha um buraco na testa e atras também, os bombeiros tiverem 2 horas a serrar para a desencarcerarem, começou a gritar quando a meteram na ambulância, com dores horríveis, sentiu que a cabeça era um balão a encher, que ia explodir, em consequência das dores intensas, sentiu que não sabia o que havia de fazer da sua vida, já que lhe doíam as pernas, os braços, doía-me tudo. Tudo isto já resulta, em termos gerais, dos factos provados, não sendo pertinente nem necessário aditar.
r) Em consequência do acidente, a Autora AA queixa-se que lhe custa ler e a escrever, já não vê tão bem, continua com fortes dores de cabeça, não tinha cicatriz nenhuma, quando muda o tempo fica cheia de dores. Já está provado que as cicatrizes sobrevieram ao acidente. A Autora AA tinha 40 anos à data do acidente, agora já terá mais de 50, é particularmente provável que já lhe custe ler e escrever (sem óculos) que já não veja tão bem (sem óculos). Não há prova de nexo causal entre a deficiência visual e o acidente. Quanto às dores e à mudança de tempo, repete-se o que já se disse a propósito de g) e j) – o relatório pericial não lhe atribuiu qualquer défice funcional, nem lhe atribuiu qualquer dano futuro, nem lhe indicou qualquer problema de que viesse a padecer, provavelmente. De modo que, falhando outra prova sobre nexo causal, isto é, que as dores de cabeça sejam consequência do acidente, não se passa o facto a provado. E quanto a alterações climatéricas, nenhuma outra prova ajuda. Nada se adita.
s) Depois do acidente, a Autora AA esteve 2 meses deitada no sofá, sem se conseguir levantar, sem se conseguir virar nem para a direita nem para a esquerda, tal era a intensidade das dores. Não há prova convincente, até porque contrariamente à lembrança que tinha, que a filha tinha ficado internada muito tempo no hospital, esse internamento foi de apenas 12 dias, donde alguém teve de ajudar a filha, não sendo crível que a mãe estivesse dois meses deitada num sofá.
t) Sempre que tem dores de cabeça, a Autora AA sente-se como se a cabeça fosse rebentar, como nunca teve antes do acidente, com as dores, deixo de ver, deixo de sentir as penas e os braços. Repete-se o que já disse quanto às dores de cabeça, não se aditando o facto aos provados.
u) A Autora BB, queixa-se, ainda, de frequentes dores na bacia, deixou se conseguir pegar em pesos, deixou de conseguir fazer esforços, não consegue, sequer, pegar. O facto é uma repetição, para a qual repetimos a integração destes aspectos no défice funcional já provado, sem necessidade de aditamento.
V) Antes do acidente a Autora AA não sabia o que era uma dor de cabeça. O facto é indiferente, com o devido respeito, porque o que interessa é se as dores que diz sentir resultam do acidente. Nada se adita.
X) Sempre que tem dores de cabeça, a Autora AA sente vontade de por a cabeça debaixo do comboio”. Com o devido respeito, trata-se de uma expressão para caracterizar a intensidade das dores, que tinha de ter o patamar prévia da prova que tais dores fossem consequência das lesões sofridas no acidente. Nada se adita.
Conclui-se assim a reapreciação das provas e a análise da impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
*
3ª questão: - do valor das indemnizações arbitradas.
Referem as recorrentes que haja ou não haja alteração da decisão sobre a matéria de facto, as indemnizações são desproporcionais à dignidade da pessoa humana.
Assentemos primeiro que não houve alteração da decisão sobre a matéria de facto em termos de relevar para uma diferente caracterização da gravidade dos danos sofridos.
Lê-se na sentença recorrida:
“Quanto aos danos não patrimoniais, prevê o art.º 496.º, nº 1, do Código Civil que «na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito».
Embora a lei não defina quais são os danos não patrimoniais merecedores de tutela jurídica, tem sido entendido unanimemente pela doutrina e jurisprudência que integram tal conceito as dores e padecimentos físicos e morais, angústia e ansiedade sentidas por quem sofreu um acidente e as lesões decorrentes, os danos resultantes de desvalorização, deformidades, além do sofrimento atual e sofrido durante o tempo de incapacidade, a angústia acerca da incerteza e futuro da situação e a existência e grau de incapacidade sofridos.
Será de valorar, também, a circunstância da vítima ter sofrido períodos de doença significativos, com prolongados internamentos hospitalares, períodos de imobilização e intervenções cirúrgicas, dificuldades de locomoção e de condução, além das restrições pessoais e sociais daí decorrentes (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 11/06/2015, relatora Cristina Cerdeira, disponível em www.dgsi.pt).
O dano não patrimonial não se reconduz a uma única figura, tendo vários componentes e assumindo variados modos de expressão, abrangendo o chamado quantum doloris, que sintetiza as dores físicas e morais sofridas, o dano estético, que simboliza, nos casos de ofensa à integridade física, o prejuízo anátomo-funcional associado às deformidades e aleijões, o “prejuízo de afirmação social”, dano indiferenciado, no que respeita à inserção social do lesado, nas suas variadas vertentes (familiar, profissional, sexual, afetiva, recreativa, cultural, cívica), o prejuízo da “saúde geral e da longevidade” em que avultam o dano da dor e o défice de bem-estar e que valoriza os danos irreversíveis na saúde e bem-estar da vítima; o pretim juventutis, que realça a especificidade da frustração do viver em pleno a chamada primavera da vida (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18/06/2009, relator Raul Borges, disponível em www.dgsi.pt). A gravidade do dano deve aferir-se por um padrão objetivo e não por um padrão subjetivo derivado de uma sensibilidade requintada.
A indemnização dos danos não patrimoniais visa, por um lado, compensar o lesado pelo dano sofrido, em termos de lhe proporcionar uma quantia pecuniária que permita satisfazer interesses que apaguem ou atenuem o sofrimento causado pela lesão; e, por outro lado, servir de sancionamento à conduta do agente. Todavia, no critério a adotar, não se devem perder de vista os padrões indemnizatórios decorrentes da prática jurisprudencial, procurando, até por uma questão de justiça relativa, uma aplicação tendencialmente uniformizadora ainda que evolutiva do direito, como impõe o nº 3 do art.º 8.º do Código Civil.
O montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso- cfr. art.ºs. 496.º, nº 4, e 494.º do Código Civil.
Na fixação dos montantes relativos às compensações por danos não patrimoniais emergentes de acidentes com veículos abrangidos pelo seguro obrigatório, há que atender fundamentalmente à gravidade das lesões e respetivas sequelas, em conjugação com os valores que vêm sendo fixados pelos tribunais- (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07/05/2014, relator João Bernardo, disponível em www.dgsi.pt).
Só assim se contribui, não só para a certeza e segurança do direito, como também para a prossecução da justiça material, quer na sua vertente absoluta, quer na vertente relativa ou comparativa (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 26/01/2016, relator Carlos Moreira, disponível em www.dgsi.pt)”.
Secundamos genericamente esta fundamentação.
Em função da fixação equitativa das indemnizações, duas observações se nos oferecem: - primeiro, a procura das balizas, do pano de fundo de decisões jurisprudenciais em casos semelhantes, melhor se faz pela positiva do que pela negativa, isto é, do que apelando a decisões sobre casos mais graves. Em segundo lugar, e posto que pensemos indemnizar dano não patrimonial, a natureza sucedânea da reparação obriga a que os valores sejam actualizados, o que do mesmo modo nos indica que a procura de decisões se deve fazer relativamente a decisões actuais e não às contemporâneas da data do acidente.
Como terceira observação, referir que está firme, na jurisprudência, a ideia de que os montantes arbitrados só devem ser corrigidos pelos tribunais superiores se for claro que o decisor se afastou manifestamente dos casos semelhantes.
Verificamos então que para a A. AA pediu “a) 30.000,00 € acrescidos de juros à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento, a título de danos patrimoniais; b) 20.000,00 € acrescidos de juros à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento a título de danos não patrimoniais;”, que lhe foram atribuídos €15.000,00, sendo zero de danos patrimoniais, dez mil de danos não patrimoniais e cinco mil de dano biológico. Pretende a recorrente AA que no recurso lhe seja atribuído “a)- 30.000,00 € (trinta mil euros) acrescidos de juros à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento, a título de danos patrimoniais; b)- 20.000,00 € (vinte mil euros) acrescidos de juros à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento a título de danos não patrimoniais”.
Digamos de imediato que não se apuraram despesas sofridas pela A. AA em consequência do acidente, não tendo a decisão de facto, neste aspecto, sido alvo de recurso. Por outro lado, a mesma A. não ficou a padecer de nenhum grau de deficiência funcional permanente. O tribunal entendeu que não se tinham apurado danos patrimoniais. Este segmento não foi atacado no recurso, precisamente porque, apesar da recorrente insistir pela condenação da Ré em vinte mil euros de danos patrimoniais, não concretiza quais tenham sido esses danos e qual, por isso, o erro em que a sentença tombou. Teremos assim de considerar que, bem ou mal – não nos compete afirmar, em face da falta de argumentação do recurso – a repercussão temporária na actividade profissional de 60 dias, sofrida pela Autora AA, que à data era florista e ganhava a remuneração mínima mensal garantida, (485 euros, à data), foi considerada pelo tribunal de primeira instância no conjunto dano não patrimonial e dano biológico, ou mais provavelmente, como vertente patrimonial do dano biológico.
Em todo o caso, sempre nos sobrariam, digamos, 14.030 euros (15.000 menos 485 x 2) para indemnizar a pura afectação da integridade física da Autora AA – traumatismo toráxico, adbominal e craneano, com hematoma peri-orbitário e ferida frontal extensa, e com hematoma epicraniano frontoparietal esquerdo, e ainda hematoma no antebraço esquerdo e ferida no joelho direito – e para indemnizar ainda a violência do embate, o encarceramento, a condução a hospital e o internamento, a submissão a tratamentos exames, as dores, o seguimento clínico em cirurgia plástica, e a frustração do mesmo, o défice funcional temporário total e parcial, o quantum doloris de grau 3 em 7 e o dano estético de grau 2 em 7.
Deve-se notar que a A. AA não ficou com nenhum défice funcional permanente, isto é, que teve um acidente violento, um traumatismo forte, foi internada de um dia para o outro, ficou curada das lesões em dois meses, e apresenta uma cicatriz na testa e outra no joelho.
Justifica-se atribuir-lhe mais cinco mil euros? Isto é, a diferença de quinze para vinte mil em termos de danos não patrimoniais que pediu?
Com o devido respeito, apesar de sermos sensíveis às afirmações de não miserabilismo, e até de notarmos como os recentes anos de inflação acelerada e de manifesta degradação do poder de compra aconselham a um aumento dos valores de indemnização, cremos que os danos sofridos pela Autora AA não justificam o arbitramento de mais cinco mil euros.
A jurisprudência diz-nos:
No acórdão da Relação de Guimarães, proferido no processo 2272/15.7T8CHV.G1, de 01.18.2018:
“A compensação de 14.000,00 euros é adequada, necessária, proporcional mas suficiente para compensar os danos não patrimoniais sofridos por lesada de acidente de viação, para cuja eclosão não contribuiu, que à data daquele contava 29 anos e que, por via do acidente, sofreu lesão lacero contusa na testa, que necessitou de 16 pontos exteriores e 8 interiores, com dores por todo o corpo, designadamente na cabeça, com um dia de internamento hospitalar e um dia de incapacidade total para o trabalho e 92 dias de incapacidade parcial, sendo o quantum doloris fixável no grau 3 de 7, e que ficou, como sequelas, a padecer de síndrome pós traumático ligeiro e alterações de memória e cicatriz quelóide na testa, com uma extensão de 3 x 2 cms., com traço cicatricial na sua continuidade de 7 cms, o que lhe determina um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 2 pontos e um dano estético de grau 4 de 7, sendo desaconselhada a correção, por cirurgia estética, dessa cicatriz, por risco de propensão para a cicatrização patológica, e que faz com que a Autora sinta vergonha dessa cicatriz, tentando-a esconder com o cabelo quando sai à rua.”
Quer dizer, num caso parecido, acidente de viação, contusão na testa, mas mais grave, ainda que decidido há mais anos, fixaram-se 14 mil euros. Compensando a evolução de preços com a menor gravidade das lesões da Autora AA, logo se vê que o valor fixado pelo tribunal recorrido é adequado e proporcional.
No sumário do acórdão desta Relação proferido em 11 de maio de 2021 no processo 1777/19.5T8LRS.L1-7, (Diogo Ravara), lemos: “(…) III- Considerando que em consequência do acidente dos autos e das lesões e sequelas dele emergentes, o autor: a.sofreu ferida incisa na mão esquerda, que foi suturado, e sujeito a imobilização; b.sofreu um período de incapacidade temporária parcial de 226 dias, c. sentiu dores por causa das mencionadas lesões, dores essas que se prolongaram durante o período de incapacidade temporária; d. ficou com uma cicatriz no dedo mínimo da mão esquerda, e limitações de mobilidade do mesmo dedo; e. sofreu dano estético de grau 2, e quantum doloris de grau 3, ambos numa escala até 7; f. ficou afetado de défice funcional permanente de integridade físico-psíquica de 1% g. deixou de praticar musculação e ciclismo, circunstâncias que consubstanciam um dano decorrente da repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer de grau 1, numa escala até 7. … afigura-se adequada a quantia de €15.000,00 arbitrada a título de indemnização, abrangendo quer os danos não patrimoniais, quer o dano biológico stricto senso”.
Quer dizer, num caso de idêntica gravidade em termos de dano estético e quantum doloris, apesar da lesão no corpo ser menor (ferida num dedo), mas acarretando consequências definitivas a nível funcional, o que não se verifica no caso da A. AA, o tribunal atribuiu, e a atribuição foi confirmada pela Relação, 15 mil euros.
Novamente, pois, valores em sintonia.
E no processo desta Relação de Lisboa, proferido em 11.1.2024, no processo 19995/19.4T8SNT.L2-6, do ora relator, consignou-se, para uma sinistrada de acidente de viação que sofreu traumatismo craniano 4, que “II - Para os danos não patrimoniais consistentes em quantum doloris de 4 em 7, dano estético de 1 em 7, perda de consciência, o internamento hospital de urgência, ainda que por dois dias, tratamentos e exames e consultas feitas, períodos de incapacidade na sua repercussão não patrimonial, necessidade da assistência da mãe por duas semanas, falhas de memória e nervosismo e ansiedade nas relações profissionais, familiares e de amizade, é adequada a indemnização de €15.000,00”.
Cremos serem suficientes estes exemplos para se perceber que os valores fixados pela decisão recorrida não se mostram manifestamente distantes do contexto jurisprudencial similar, nada havendo, pois, a censurar à indemnização arbitrada.
Relativamente à Autora BB, recordemos que foi pedida, na petição inicial e no recurso, a condenação da Ré a pagar 45.812,35 € acrescidos de juros à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento a título de danos patrimoniais e 50.000,00 € acrescidos de juros à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento a título de danos não patrimoniais, e que a sentença apenas concedeu €25.378,00 (sendo a quantia de €378,00, a título de danos patrimoniais, a quantia de €15.000,00, a título de danos não patrimoniais, e a quantia de €10.000,00, a título de dano biológico)”.
A recorrente BB põe em causa os valores arbitrados, por, em resumo, serem insuficientes e desproporcionais em atenção à dignidade da pessoa humana.
No acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido em 6.2.2024 no processo 2012/19.1T8PNF.P1.S1 (Rel. Conselheiro Lima Gonçalves) atribuiu-se a indemnização de €39.810,00 a título de dano biológico para uma estudante de quinze anos, que ficou a padecer de défice funcional permanente de seis pontos percentuais, ainda que se tenha considerado a necessidade de esforços suplementares e portanto ponderado a repercussão profissional do referido dano.
No acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido no processo 234/21.4T8STR.E1.S1 (Rel. Conselheira Isabel Salgado), confirmou-se o acórdão da Relação que havia atribuído “ao A. uma indemnização no valor de 25.000,00 € e à A. uma indemnização no valor de 37.500,00 €, a título de danos não patrimoniais por eles sofridos, aí se incluindo já o dano biológico (o qual se fixa em 7.500,00 € para o A. e em 12.500,00 € para a A.)”, considerando no ponto II do respectivo sumário que “II. Decorrendo que, o lesado jovem enfrentará previsível e por mais tempo e de forma incisiva, as dificuldades funcionais, pelo que, também, nessa perspetiva, a compensação monetária deverá repercutir valor compensatório superior ao lesado mais velho, portador de igual grau de incapacidade funcional”. No caso, e à data do acidente, as vítimas tinham 74 e 72 anos de idade respectivamente, e no caso da ali autora, de 72 anos de idade, o défice funcional permanente era de 6,88 pontos percentuais. Serve este exemplo para indicar que num caso de repercussão funcional de gravidade aproximada (ligeiramente maior), a uma vítima de 72 anos foi atribuída uma indemnização de dano biológico no valor de €12.500,00, superior à que nestes autos foi fixada para a A. BB, e sendo manifesto que atenta a idade desta Autora, por comparação com a Autora do processo analisado pelo STJ, o valor de indemnização por dano biológico seria naturalmente – isto é, porque a pessoa mais nova vai sofrer mais tempo o facto de estar privada da sua anterior capacidade – notavelmente maior.
No acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no processo 1974/21.3T8PNF.P1.S1 em 14.9.2023 (Rel. Conselheiro Oliveira Abreu), confirmou-se a atribuição de €30.000,00 de indemnização pelo défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 5 pontos percentuais, considerando “factos apurados no que interessa à fixação do quantum indemnizatório pela perda da capacidade aquisitiva futura, quais sejam: que a Autora/AA tinha 22 anos à data do acidente; que o défice funcional permanente de integridade físico-psíquica é fixável em 5 pontos; que as sequelas descritas, em termos de Repercussão Permanente na Atividade Profissional, são compatíveis com o exercício da atividade habitual, mas implicam esforços suplementares, sendo que a data da consolidação médico-legal das lesões da Autora é fixável em ... de março de 2021, a par de que à data do acidente a Autora/AA trabalhava num supermercado com o salário base mensal de 635,00€ x 14 meses + abono para falhas x 11 meses + 78,30€ x 11 meses de subsídio de alimentação”.
Donde, para uma sinistrada com idade aproximada e um défice de grau menor, e ainda considerando esforços suplementares, que no caso não estão provados, considerou-se adequada uma indemnização vinte mil euros superior à que foi fixada nestes autos.
Julgamos assim ter demonstrado que o valor de indemnização por dano biológico fixado à Autora BB é manifestamente abaixo dos valores da jurisprudência, pelo que, em função de tais exemplos comparativos, entendemos adequado fixar a indemnização por dano biológico em €30.000,00 (trinta mil euros).
Já quanto a danos não patrimoniais, considerando os períodos de afectação funcional temporária, 408 dias, o quantum doloris de 4/7, o internamento hospitalar e a necessidade de utilização de colete, os quinze mil euros atribuídos, parecem-nos também desajustados, por deficiência. Em primeiro lugar, note-se, que o mesmo montante é atribuído à Autora AA, mãe da Autora BB. Sendo absolutamente claro que o quantum doloris da A. AA é menor e que o período de incapacidade é muitíssimo menor.
No acórdão que acabamos de referir - processo 1974/21.3T8PNF.P1.S1 - “sopesando que a Autora tinha apenas 22 anos à data do acidente, que sofreu dores que ainda hoje se mantêm, usou canadianas, claudica, deixou de praticar actividades que antes praticava, reflectido na repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer no grau 2/7, tendo ainda um dano estético de 4/7, um quantum doloris de 4/7 e repercussão na actividade sexual de 1/7 e que sofre de danos psicológicos que se reflectem no seu dia-a-dia, e atendendo por último à sua situação sócio-económica, julga-se equitativo justo e equilibrado fixar em 35.000,00”.
No acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido no processo 1364/06.8TBBCL.G1.S2 em 16.6.2016 (Rel. Conselheiro Tomé Gomes), atribuíram-se vinte mil euros de indemnização por danos não patrimoniais a sinistrada costureira com então quase 40 anos de idade, considerando-se “foi atropelada, quando atravessava uma passadeira para peões, já a meio da mesma, por um veículo que circulava a 60-80 km/hora, em local cujo limite máximo de velocidade era de 50 km/hora; iii) - Em consequência do embate a que se alude, a A. foi projetada e derrubada no solo, sofrendo contusão dorsal compatível com fratura cuneiforme da vértebra D7, sem lesões neurológicas, tendo sido conduzida ao hospital, onde ficou internada no Serviço de Ortopedia e onde permaneceu no hospital em repouso e algaliada durante 5 dias; iv) – Regressada ao seu domicílio, a A. teve de usar um colete dorso-lombar e manter-se em repouso no leito, mas em 13/02/2005 teve de ser internada novamente, por apresentar toracalgia intensa, na região dorsal esquerda, com dispneia, colocando-se a hipótese de se tratar de trombo-embolismo pulmonar, não confirmada pelo posterior exame, tendo a TAC torácico revelado pequeno derrame pleural à esquerda, com alterações de contusão hemorrágica do parênquima adjacente, sendo submetida a broncofibroscopia para despiste de lesão pulmonar visível sangrante, que foi normal; v) - Em 28/02/2005, a A. teve alta do internamento hospitalar, regressando ao seu domicílio, passando ao regime de tratamento em consulta externa; vi) - Em 28/03/2005, a A. foi submetida a eletromiograma dos membros inferiores, que evidenciou sinais compatíveis com disfunção radicular L4-L5 à direita e L5 à esquerda, com desenervação ativa à esquerda; vii) - A data da consolidação médico-legal das lesões sofridas pela A. é fixável em 01/01/2006; o período de incapacidade temporária geral total ocorreu desde 26/01/2005 até 28/02/2005, fixável num período de 34 dias; o período de incapacidade temporária geral parcial ocorreu desde 01.02.2005 até 01/01/2006, fixável num período de 335 dias; o período de incapacidade temporária profissional total ocorreu desde 26/01/2005 até 01/01/2006, fixável num período de 341 dias; o “quantum doloris” é fixável no grau 4, numa escala de 7 graus de gravidade crescente; a incapacidade permanente geral da autora é fixável em 6%; as sequelas sofridas em consequência do acidente são, em termos de rebate profissional, compatíveis com o exercício da atividade habitual, mas implicam esforços suplementares; a A. não sofreu sequelas psiquiátricas permanentes decorrentes do acidente; viii) - Após o acidente, a A. sofreu um agravamento do seu estado depressivo, melhorando posteriormente com um ajuste terapêutico e passou a sentir um estado de fadiga constante; ix) - Antes do embate, a A. era uma pessoa sem qualquer deformidade ou incapacidade física e executava tarefas que exigiam esforço físico com normalidade e sem a dificuldade que passou a sentir após o acidente; x) - A A. exercia a atividade de costureira e as tarefas domésticas, confecionando as refeições para a família, fazendo a limpeza da casa e tratamento das roupas; xi) - Apesar de clinicamente curada, a A. em consequência do traumatismo da coluna dorso-lombar, ficou a sofrer de dorsalgias residuais ao nível D6-D7 com irradiação intercostal, embora com predomínio à esquerda, sofrendo dorsalgias residuais, que a obrigam a medicação irregular com analgésicos e anti-inflamatórios, e de lombalgias residuais ao nível da charneira lombo sagrada; xii) - Atualmente, a A. não consegue realizar ou só executa com grande dificuldade tarefas que exigem maior esforço físico ou que requerem a sua posição de sentada por períodos mais ou menos prolongados; xiii) - Em consequência do embate, das lesões sofridas e dos tratamentos a que teve de se sujeitar, a A. sofreu dores, mal-estar e incómodos que se prolongaram no tempo, sendo que as lombalgias e dorsalgias de que a A. ficou a padecer causam sofrimento e mal-estar à A.; xiv) - A A. sente desgosto de ter ficado marcada e afetada negativamente na sua capacidade de trabalho; xv) - Durante cerca de 4 meses, a A. teve de recorrer à assistência de outra pessoa, sua cunhada, para tratar da casa e a ajudar a lavar e a vestir”.
Donde, em 2016, e são corridos já praticamente dez anos, o Supremo Tribunal de Justiça, para uma sinistrada com o dobro da idade da A. BB, com o mesmo grau de défice funcional permanente, com períodos de afectação temporária ligeiramente menores, mas essencialmente de um ano, com o mesmo tipo de lesão – deformação cuneiforme de uma vértebra dorsal – e com o mesmo quantum doloris, apesar de estarem provados mais factos relacionados com danos não patrimoniais (até porque a A. nesse caso era mais velha e já tinha marido e três filhos e vida de casa para atender), o Supremo, dizíamos, ainda assim atribuiu vinte mil euros. Se o caso se passasse hoje, haveria de contar-se com a inflação dos últimos anos, e porventura atribuir trinta mil euros.
No acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido em 29.2.2024 no processo 2859/17.3T8VNG.P1.S1 (Rel. Conselheiro Afonso Henrique), foram atribuídos trinta mil euros de indemnização por danos não patrimoniais para uma sinistrada de 70 anos de idade à data do acidente, que ficou afectada de um défice funcional permanente de 16 pontos, e que sofreu quantum doloris de 4 em 7, considerando, além do mais, os seguintes factos: “p) Imediatamente após o embate a autora estava politraumatizada e queixava-se de fortes dores na cervical, ao nível torácico e, bem assim, na sua cabeça. (…) r) Após a sua chegada, os bombeiros prestaram os primeiros cuidados médicos à autora, tendo a mesma sido imobilizada em plano duro e com colar cervical. (…) t) No serviço de urgência desse hospital realizou diversos exames radiográficos, tendo-lhe sido diagnosticadas cervicalgia e dorsalgia. u) Como as queixas da coluna vertebral e dorsal se mantinham e como apresentava síndrome vertiginoso consecutivo à contusão cervical, foram realizados diversos exames imagiológicos no serviço de urgência daquela unidade hospitalar, os quais não foram conclusivos em relação a qualquer fratura. v) Como as dores não atenuavam a autora veio a ser internada na (…) para tratamento antiálgico tendo ficado internada entre os dias 18 a 24 de dezembro de 2015. w) À data da alta a autora apresentava ainda queixas de dores dorsais, mantendo síndrome vertiginoso. x) Em ambulatório e dada a permanência de queixas referidas ao nível de D7, foi solicitada a realização de uma Tomografia Axial Computorizada, a qual foi realizada no dia 7.1.2016 e que revelou fratura de D7. y) Em face da constatação dessa lesão a autora realizou tratamento conservador. z) A autora teve necessidade de se sujeitar a tratamentos fisiátricos. aa) A autora esteve totalmente incapacitada de trabalhar até ao dia 28 de março de 2016. bb) A autora manteve, após alta, dor residual na coluna dorsal e restrição esquerda das mobilidades cervicais. cc) A autora mantém indicação para tratamento fisiátrico de forma descontinuada. (…). Foi ainda considerado que a A. temeu a morte, que tem recorrentemente dores cervicais que a limitam na sua autonomia e que apresenta humor depressivo e ansiedade, medicadas.
Se compensarmos a maior idade (70 face a 20) com a maior gravidade do défice e ponderarmos outrossim um tipo de lesão e tratamento similar e o mesmo grau de dor, embora com a maior facilidade com que a juventude permite enfrentar a situação, em todo o caso, estamos a falar do dobro (15 mil para 30 mil).
Considerando as balizas que estes acórdãos nos permitem estabelecer, julgamos mais adequado fixar o valor da indemnização por danos não patrimoniais em vinte e cinco mil euros.
Procede assim parcialmente – no que toca à indemnização do dano biológico e à indemnização do dano não patrimonial – o recurso relativamente à A. BB.
A sentença recorrida, quanto a qualquer das Autoras, não condenou a responsável em juros de mora sobre as quantias que fixou a título de danos não patrimoniais, no caso da Autora AA, e a título de danos patrimoniais, dano biológico e danos não patrimoniais, no caso da Autora BB.
No recurso, embora sem argumentação própria para tanto, vem peticionado que seja a Ré condenada em juros de mora.
Ora, a partir do trânsito em julgado deste acórdão, fica firme o bem fundado da fixação indemnizatória por danos não patrimoniais à Autora AA, sendo que tal indemnização correspondeu a uma decisão actualizadora, devendo por isso os juros de mora à taxa legal de 4% contar-se desde a data da sentença. A indemnização a pagar à Autora BB, por danos não patrimoniais e dano biológico, tendo sido fixada por decisão actualizadora desta Relação, no presente acórdão, comporta juros de mora à taxa legal de 4% desde a data do presente acórdão e até ao integral pagamento. Quanto à indemnização por danos patrimoniais sofridos pela Autora BB, que a sentença fixou, os juros de mora que a seguradora deve pagar, à mesma taxa, contam-se desde a data da citação e até integral pagamento – cfr. artigos 562º, 805º nº 3 e 559º, todos do Código Civil, Portaria n.º 291/03, de 8 de Abril e Acórdão de Uniformização de Jurisprudência de 9 de Maio de 2002, D.R. I Série A, n.º 146 de 27 de Junho de 2002, págs. 5057 e ss.
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Tendo, ambas as partes, decaído, são ambas responsáveis pelas custas – artigo 527º nº 1 e 2 do Código de Processo Civil, que se fixam na proporção de 60% para as recorrentes e 40% para a recorrida.
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V. Decisão
Nos termos supra expostos, acordam os juízes que compõem este colectivo da 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa em conceder provimento parcial ao recurso interposto e em consequência revogam a sentença recorrida na parte em que absolveu a Ré Fidelidade Companhia de Seguros, S.A., do pagamento de juros de mora às Autoras e na parte em que condenou a Ré Fidelidade Companhia de Seguros, S.A., a pagar à Autora BB a quantia total de €25.378,00 – vinte e cinco mil trezentos e setenta e oito euros (sendo a quantia de €378,00, a título de danos patrimoniais, a quantia de €15.000,00, a título de danos não patrimoniais, e a quantia de €10.000,00, a título de dano biológico), a qual, nesta parte, se substitui pelo presente acórdão que condena a Ré Fidelidade Companhia de Seguros S.A. a pagar à Autora AA juros de mora à taxa legal sobre o montante de indemnização por danos não patrimoniais que lhe foi fixado pela sentença recorrida, contados da data da mesma sentença e até integral pagamento, e que condena a Ré Fidelidade Companhia de Seguros S.A. a pagar à Autora BB a quantia total de €55.378,00 (cinquenta e cinco mil e trezentos e setenta e oito euros), (sendo a quantia de €378,00, a título de danos patrimoniais, a quantia de €30.000,00 (trinta mil euros), a título de danos não patrimoniais, e a quantia de €25.000,00 (vinte e cinco mil euros), a título de dano biológico), acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação e até integral pagamento sobre a quantia de €378,00 (trezentos e setenta e oito euros) que foi fixada a título de indemnização por danos patrimoniais, e acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data do presente acórdão e até integral pagamento, sobre a quantia de €55.000,00 (cinquenta e cinco mil euros) fixada como indemnização por danos não patrimoniais e dano biológico. No mais, mantêm a sentença recorrida.
Custas por recorrentes e recorrida, na proporção de 60% para as recorrentes e 40% para a recorrida.
Registe e notifique.
Lisboa, 26 de Junho de 2025
Eduardo Petersen Silva
Maria Teresa F. Mascarenhas Garcia
Jorge Almeida Esteves
Processado por meios informáticos e revisto pelo relator
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1. Beneficia do relatório da sentença recorrida.
2. Mantemos a redacção original.
3. Optámos por manter a redacção no seu original.
4. Facto provado nº 8) Em consequência do acidente, a Autora foi transportada para o Hospital de Santa Maria, em cuja urgência foi admitida às 6h e 26 min do dia 17/03/2018, com trauma crânio-encefálico, história de perda de consciência e ferida incisa parietal direita.