PRISÃO SUBSIDIÁRIA
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
IRREGULARIDADE
Sumário


I – A pena de prisão subsidiária prevista no artigo 41º do CP constitui uma verdadeira pena de constrangimento conducente à realização do efeito preferido de pagamento da multa na medida em que o condenado pode a todo o tempo evitar a execução da pena de prisão subsidiária, pagando, no todo ou em parte, a multa a que foi condenado.
II – O arguido não tem de ser ouvido oral e presencialmente antes que seja proferido despacho a converter a pena de multa em prisão subsidiária.
III – Tendo o juiz procedido à notificação do arguido para que este esclarecesse nos autos as razões determinantes do não pagamento da pena de multa e tendo este apresentado requerimento, aduzindo essas suas razões e requerendo a suspensão da execução da pena de prisão, enferma de irregularidade o despacho que procedeu à conversão da pena de multa em pena de prisão subsidiária e não se pronunciou relativamente a essa pretensão do arguido.
IV – Trata-se de uma irregularidade de conhecimento oficioso e que afeta o valor do acto praticado.

Texto Integral


Acordam, em conferência, os Juízes que integram a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães.

I - Relatório

Decisão recorrida

No âmbito do Processo Comum (Tribunal Singular) nº 250/15.5IDBRG, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga – Juízo Local Criminal de Guimarães, foi proferido no dia 7 de janeiro de 2025, o seguinte despacho que se transcreve:
“Por sentença proferida nos presentes autos em 10.10.2019, transitada em julgado em 20.04.2023, foi o(a) arguido(a) AA condenado pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelo art.º 105.º n.ºs 1, 4 e 7 do RGIT, na pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa à taxa diária de € 6,00 (seis euros).
O(a) arguido(a) não efectuou o pagamento da referida multa criminal, nem requereu a sua substituição por prestação de trabalho a favor da comunidade. ---
Além disso, não se mostrou realizável a penhora de quaisquer bens ou rendimentos que possibilitassem a cobrança coerciva da referida multa. ---
Assim sendo, haverá que nos termos do preceituado no art.º 49.º do Cód. Penal, converter a pena de multa na subsequente pena de prisão subsidiária, correspondente a 2/3 (dois terços) do período de tempo fixado para a pena de multa. ---
Nessa conformidade, converto a pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa aplicada ao arguido na pena de 100 (cem) dias de prisão subsidiária, e determino o seu cumprimento pelo(a) arguido(a) AA. ---
Notifique, igualmente o(a) arguido(a) que pode a todo o tempo evitar a execução da prisão subsidiária pagando a multa a que foi condenado(a) e, por outro lado, que qualquer detenção ou pena que haja sofrido, poderá ser comunicada para efeitos do disposto no art.º 80.º do CP. ---
Após trânsito, conclua para emissão dos respectivos de mandados para cumprimento (dos quais deverá constar, ao abrigo do n.º 3 do artigo 491.º-A do CPP, a indicação do montante da multa em dívida (€360,00) e ainda a quantia a descontar por cada dia ou fração em que o condenado estiver detido (€9,00)”.

*
Recurso apresentado

Inconformado com tal decisão, o arguido AA veio interpor o presente recurso e após o motivar, apresentou as seguintes conclusões e petitório, que se reproduzem:

“1.ª – A decisão recorrida determinou, de forma automática, a conversão da multa em prisão subsidiária, sem se pronunciar sobre a questão da suspensão da execução da pena de prisão subsidiária, nos termos do n.º 3, do artigo 49.º do Código Penal que, aliás, foi suscitada, expressamente, pelo Arguido.
2.ª – A falta de pronúncia sobre a questão da suspensão da execução da pena de prisão subsidiária, nas respetivas dimensões fáctica e jurídica, inquinou a decisão recorrida de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos das alíneas a) e c), do n.º 1, do artigo 379.º, do CPP. Nulidade que expressamente se Argui.
3.ª – Se o Tribunal a quo tivesse analisado a referida questão, ponderando as circunstâncias específicas do caso concreto, deveria ter decidido no sentido da suspensão da execução da pena de prisão subsidiária, subordinada ao cumprimento de deveres ou regras de conduta de conteúdo não económico ou financeiro, conforme previsto no n.º 3, do artigo 49.º do Código Penal.
4.ª – Ao não ter decidido desta forma e ao ter determinado a conversão da pena, sem justificar a inaplicabilidade da suspensão, o Tribunal violou o disposto no n.º 3, do artigo 49.º, do Código Penal, bem como os princípios da proporcionalidade e da necessidade da pena, consagrados no ordenamento jurídico português.
5.ª – Devendo a decisão de que ora se recorre ser revogada e substituída por Acórdão que declare a existência de nulidade da sentença nos termos das alíneas a) e c), do n.º 1, do artigo 379.º, do CPP, bem como a sua ilegalidade, por violação do n.º 3, do artigo 49.º, do Código Penal, pois, deveria ter-se decidido pela suspensão da execução da pena de prisão subsidiária, com as inerentes consequências legais.
Nestes termos e nos que V. Exas. Doutamente suprirá deve o presente recurso ser considerado procedente e em consequência a decisão de que ora se recorre ser revogada e substituída por Acórdão que declare a existência de nulidade da sentença nos termos das alíneas a) e c), do n.º 1, do artigo 379.º, do CPP, bem como a sua ilegalidade, por violação do n.º 3, do artigo 49.º, do Código Penal, pois, deveria ter-se decidido pela suspensão da execução da pena de prisão subsidiária, com as inerentes consequências legais”.
*
Resposta ao recurso por parte do Ministério Público.
Na primeira instância, o Ministério Público, apresentou resposta ao recurso pugnando pela improcedência do mesmo.
***
Tramitação subsequente

Neste Tribunal da Relação de Guimarães, o processo foi com vista ao Ministério Público, tendo a Exmª. Senhora Procuradora-Geral Adjunto, emitido douto e esclarecido parecer no qual pugna pela procedência do recurso, considerando que a decisão recorrida enferma de falta de fundamentação no que concerne à apreciação da suspensão da prisão subsidiária requerida pelo arguido.  
*
Foi cumprido o disposto no artigo 417º nº2 do Código de Processo Penal (em diante também referido por CPP), não tendo sido apresentada resposta.
*
Após ter sido efetuado exame preliminar, foram colhidos os vistos legais e realizou-se a conferência.
*
II – Fundamentação.

Cumpre apreciar o objeto do recurso.
O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação, sendo apenas essas questões, as que o tribunal de recurso tem de apreciar, sem prejuízo das que sejam de conhecimento oficioso.

As questões que se colocam à apreciação deste tribunal são as seguintes:
- Apurar da ilicitude da decisão recorrida por omissão de pronuncia.
- Saber se deve ser suspensa a execução da pena de prisão subsidiária.
*
Para apreciar o presente recurso. há que ter em consideração as seguintes incidências processuais resultantes dos autos:

Ø Por sentença datada de 10 de outubro de 2019, já transitada em julgado, o arguido AA, foi condenado pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal p.p. artigo 105º, nºs 1, 4 e 7 do RGIT na pena de 150 dias de multa à taxa diária de € 6,00 (seis euros).
Ø Liquidada a pena de multa em 7 de junho de 2023, o arguido foi notificado para proceder ao seu pagamento, não o tendo feito, total ou parcialmente.
Ø Foi instaurada execução para cobrança coerciva dessa quantia, a qual veio a ser extinta em 24 de setembro de 2024, face à inexistência de bens do executado.
Ø No dia 4 de outubro de 2024, o Ministério Público promoveu que se determinasse a conversão da pena de 150 dias de multa em 100 (cem) dias de prisão subsidiária.
Ø No dia 9 de outubro de 2024, a Mmª Juiz “a quo” proferiu o seguinte despacho: “Perspectivando-se como possível a aplicação do que vai disposto no art.º 49.º n.º 1 do CP – ou seja, a conversão da pena de multa em pena de prisão subsidiária, já que o(a) arguido(a) não procedeu ao pagamento da pena de multa em que foi condenado(a), não requereu a substituição da multa por trabalho, tendo-se por frustrada a possibilidade execução patrimonial – notifique-se, antes do mais, o(a) arguido(a) e o respectivo defensor, para, no prazo de 10 [dez] dias, esclarecer nos autos das razões determinantes do não pagamento da pena de multa – cfr. art.º 49.º n.º 3 do CP”.
Ø Em resposta, o arguido através do seu defensor, apresentou requerimento no dia 29 de outubro de 2024, alegando que a razão do não pagamento da multa não lhe é imputável, porquanto não teve dinheiro, ou qualquer outro meio económico que lhe permitisse pagar a multa em que foi condenado, considerando ainda que a execução da prisão subsidiária ser suspensa, por um período de 1 a 3 anos, sendo a suspensão subordinada ao cumprimento de deveres ou regras de conduta de conteúdo não económico ou financeiro, conforme previsto no n.º 3, do artigo 49.º do Código Penal, requerendo que fosse ouvido em declarações presenciais e que fosse inquirida como testemunha a apresentar, BB.
Ø Aberta vista ao Ministério Público, o mesmo pronunciou-se no sentido de nada ter a opor à audição do arguido.
Ø A Mmª Juiza “a quo” proferiu no dia 26 de novembro de 2024, o seguinte despacho: “Fls. 572: Apesar da audição presencial do arguido não ser obrigatória, tendo em conta o alegado, para a audição do condenado, para os efeitos previstos no art.º 49.º n.º 1 e 3 do CP, designo o próximo dia 16.12.2024 pelas 14h30”.
Ø No dia 16 de dezembro de 2024 e face à ausência do arguido a essa diligência, a Magistrada do Ministério Público promoveu o seguinte: “Atendendo a que a notificação remetida ao arguido foi devolvida, e tendo em conta que segundo informação prestada pelo seu Ilustre Defensor o mesmo já não reside na referida morada, tudo aponta para que o arguido não tenha tomado conhecimento da presente diligência, motivo pelo qual não se promove a sua condenação em multa pela falta injustificada. No entanto e face aos elementos já constantes dos autos também se entende desnecessário a marcação de qualquer outra diligência com vista à sua audição, motivo pelo qual nada mais temos a promover neste momento”.
Ø  Dada a palavra ao defensor do arguido por este foi dito nada ter a opor e nada ter a requerer ao ora promovido.
Ø De seguida, a Mmª Juiza proferiu o seguinte despacho: “Apesar da notificação da data desta diligência ter sido dirigida ao arguido, através de via postal simples, com prova de depósito, na morada do respectivo Termo de Identidade e Residência prestado, atendendo a que a mesma foi devolvida e com destaque ainda para a informação prestada pelo seu Ilustre Defensor, conforme supra se mencionou, e atendendo ainda ao propósito desta diligência, não se condena então o mesmo em multa.
Quanto ao demais e conforme já havia sido referido no despacho de 26/11/2024, não sendo a audição presencial do arguido obrigatória, nesta fase, determino que os autos sejam apresentados com termo de conclusão, juntamente com o Certificado de Registo Criminal actualizado, que se determina que seja junto.
Notifique”.
Ø No dia 7 de janeiro de 2025, a Mmª Juíza “a quo” proferiu o despacho recorrido.
*
Da omissão de pronuncia.

Considera o arguido que a decisão recorrida determinou, de forma automática, a conversão da multa em prisão subsidiária, sem se pronunciar sobre a questão da suspensão da execução da pena de prisão subsidiária, nos termos do n.º 3, do artigo 49.º do Código Penal que refere ter sido expressamente suscitada, considerando que tal inquina a decisão de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos das alíneas a) e c), do n.º 1, do artigo 379.º, do CPP.
Antes de mais e ainda que brevemente há que fazer um enquadramento jurídico da situação em apreço.

Dispõe o artigo 49.º do Código Penal, sob a epígrafe “Conversão da multa não paga em prisão subsidiária”:

“1 - Se a multa, que não tenha sido substituída por trabalho, não for paga voluntária ou coercivamente, é cumprida prisão subsidiária pelo tempo correspondente reduzido a dois terços, ainda que o crime não fosse punível com prisão, não se aplicando, para o efeito, o limite mínimo dos dias de prisão constante do nº 1 do artigo 41º.
2 - O condenado pode a todo o tempo evitar, total ou parcialmente, a execução da prisão subsidiária, pagando, no todo ou em parte, a multa a que foi condenado.
3 - Se o condenado provar que a razão do não pagamento da multa lhe não é imputável, pode a execução da prisão subsidiária ser suspensa, por um período de 1 a 3 anos, desde que a suspensão seja subordinada ao cumprimento de deveres ou regras de conduta de conteúdo não económico ou financeiro. Se os deveres ou as regras de conduta não forem cumpridos, executa-se a prisão subsidiária; se o forem, a pena é declarada extinta.
4 - O disposto nos nºs 1 e 2 é correspondentemente aplicável ao caso em que o condenado culposamente não cumpra os dias de trabalho pelos quais, a seu pedido, a multa foi substituída. Se o incumprimento lhe não for imputável, é correspondentemente aplicável o disposto no número anterior.”

No caso em apreço a pena de multa não foi paga sequer parcialmente e apesar de ter sido instaurada execução para cobrança coerciva da mesma.
A pena de prisão subsidiária prevista neste artigo 41º, constitui uma verdadeira pena de constrangimento conducente à realização do efeito preferido de pagamento da multa na medida em que o condenado pode a todo o tempo evitar a execução da pena de prisão subsidiária, pagando, no todo ou em parte, a multa a que foi condenado.
Nada na lei penal adjetiva obriga a que o arguido tenha de ser ouvido oral e presencialmente, relativamente à razão do não pagamento da pena de multa e à promoção de conversão dessa pena de multa em prisão subsidiária.
Porém, a Mmª Juíza “a quo” e muito bem, antes de decidir da conversão da pena de multa em prisão subsidiária, procedeu à notificação do arguido para que este se pudesse pronunciar, o que este fez.
A Constituição da República Portuguesa no artigo 32º nº 5 consagra o princípio do contraditório.
Ensinam Gomes Canotilho e Vital Moreira[1] que tal significa o dever e direito de o juiz ouvir as razões das partes (da acusação e da defesa) em relação  a assuntos sobre os quais tenha de proferir uma decisão, bem como no direito do arguido de intervir no processo e de se pronunciar e contraditar todos os todos os testemunhos, depoimentos ou outros elementos de prova ou argumentos jurídicos trazidos ao processo. Esclarecem ainda quanto à extensão processual, que esse princípio abrange todos os actos susceptíveis de afectar a sua posição.
Foi assim salvaguardado o direito ao contraditório.
Contudo a Mmª Juiz na decisão recorrida não se pronunciou relativamente à almejada suspensão da execução da prisão subsidiária pretendida pelo arguido no requerimento por este apresentado.
Essa omissão não se reconduz, como defende o arguido, a uma situação de nulidade prevista no artigo 379º do CPP, porquanto este normativo só é aplicável às situações de nulidade da sentença, o que não é o caso pois que se trata de uma decisão traduzida num despacho.
Em consonância com o princípio da legalidade que vigora no regime geral das nulidades em processo penal, só são nulos os actos que, sendo praticados com violação ou inobservância da lei, esta expressamente comine essa consequência (Artº 118º, nº 1 do CPP), sendo que, nos casos em que a lei não cominar a nulidade, o acto ilegal é irregular (nº 2 do mesmo preceito legal).
Como menciona João Conde Correia [2] “O princípio da taxatividade das nulidades abrange apenas os vícios que o legislador submete a esse tratamento; excluindo aqueles que, embora substancialmente sejam causa de nulidade, são, por ele, rotulados irregularidades” adiantando também que pelo menos algumas “irregularidades” determinam a invalidade do acto a que se referem e dos termos subsequentes que aquele possa afetar, produzindo os mesmos efeitos das nulidades”.
Salienta o Ac. desta Relação de Guimarães de 9 de janeiro de 2023, procº 1239/18.8T9BRG.G1 [3], em que o ora Relator foi aí Adjunto: “A cognoscibilidade por iniciativa do Tribunal mostra-se adstrita aos casos em que a irregularidade contende com a violação de uma norma que não se destina, ou não se destina em primeira linha, a proteger um direito de um sujeito ou participante processual, antes exterioriza a concretização de valores e princípios estruturantes do direito penal ou processual penal e/ou constitucional, tendo então o legislador entendido que nestas situações o conhecimento sobre a sua violação, suscetível de afetar a própria realização da justiça no caso concreto, não podia ficar condicionada à eventual invocação da mesma por banda de um sujeito ou interveniente processual, permitindo ainda que esse conhecimento, se atempado, seja operado ex oficcio pelo tribunal para que seja reposta a imprescindível legalidade do ato ou atos processuais afetados.
Salienta Maia Gonçalves [4] apesar de as irregularidades serem consideradas em geral vícios de menor gravidade do que as nulidades, a grande variedade de casos que na prática se podem deparar impõe que se não exclua a priori a possibilidade de ao julgador se apresentarem irregularidades de muita gravidade, mesmo suscetíveis de afetar direitos fundamentais dos sujeitos processuais.
Daí a grande margem de apreciação que se dá ao julgador, nos n.ºs 1 e 2 do art. 123º, que vai desde considerar a irregularidade inócua e inoperante, até à invalidade do ato inquinado pela irregularidade e dos atos subsequentes que possa afetar, passando pela reparação oficiosa da irregularidade. Trata-se de questões a decidir pontualmente pelo julgador, com muita ponderação pelos interesses em equação, máxime as premências de celeridade e de economia processual e os direitos dos interessados.
No caso em apreço, em que a decisão recorrida não se pronuncia relativamente a uma questão expressamente suscitada pelo arguido e com o respaldo legal que é dado pelo nº 3 do artigo 49º do Código Penal.
Face ao disposto no artigo 97º, nºs 1, alínea b) e nº 5, do CPP, os despachos judiciais decisórios que não sendo despachos de mero expediente, devem ser sempre fundamentados, devendo para tanto ser especificado os motivos de facto e de direito da decisão. 
Trata-se do corolário do disposto no artigo 205º, nº1, da Constituição da República Portuguesa, que consagra expressamente o dever de fundamentação dos atos decisórios dos tribunais.
Esse dever de fundamentação impõe que se explicite, ainda que não de uma forma exaustiva, os motivos factuais e jurídicos que levaram à tomada dessa decisão.
Tal dever de fundamentação é naturalmente preterido quando o tribunal nesse despacho nem sequer conhece de uma questão que lhe foi suscitada e de que tem de conhecer.
A ausência de pronuncia relativa ao pedido de suspensão da execução da pena de prisão substitutiva, consubstancia  uma irregularidade que afeta o valor do acto praticado e, consequentemente determina a invalidade do despacho recorrido, sendo  de conhecimento oficioso, nos termos do preceituado no artigo 123.º do CPP, o qual dispõe no seu nº2 que “Pode ordenar-se oficiosamente a reparação de qualquer irregularidade, no momento em que da mesma se tomar conhecimento, quando ela puder afetar o valor do ato praticado”, não carecendo assim sequer de ter sido invocada pelo interessado.
Deverá assim o tribunal recorrido suprir essa irregularidade conhecendo a questão suscitada, podendo antes de proceder a tal decisão: proceder à audição do arguido, tanto mais que pelo facto de estar a residir noutra morada considerou justificada a sua ausência à diligência designada para a sua audição como ele tinha requerido, proceder à inquirição da testemunha arrolada BB ou solicitar a elaboração de um inquérito às condições económicas do condenado.
Face ao conhecimento desta irregularidade, fica assim prejudicado o conhecimento da outra questão suscitada pelo recorrente.
*
III – Decisão.

Face ao exposto, acordam os Juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães em declarar a irregularidade do despacho recorrido e ordenar a remessa dos autos à primeira instância a fim de o tribunal a quo proferir novo despacho, sanando tal irregularidade, sem prejuízo de previamente proceder à realização de diligências probatórias que considere pertinentes.
Sem tributação.
Notifique.
Guimarães, 11 de junho de 2025.
(Decisão elaborada pelo relator com recurso a meios informáticos e integralmente revista pelos subscritores, que assinam digitalmente).

Os Juízes Desembargadores,
Pedro Freitas Pinto (Relator)
Luisa Oliveira Alvoeiro (1ª Adjunta)
Pedro Cunha Lopes (2º Adjunto)


[1] Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2005, página 523.
[2] In “Contributo para a análise da inexistência e das nulidades processuais penais”, Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, STVDIA IVRIDICA 44, Coimbra Editora, pág. 146.
[3] Relator: Desembargador Paulo Correia Serafim.
[4] Código de Processo Penal Anotado, 9ª Edição Revista e Atualizada, Almedina, Coimbra, 1998, pág. 312.