I – Um crédito para consolidação, em termos de noção operacional, pode ser definido como aquele que agrupa (ou "consolida") outros pré-existentes, que ficam cumpridos mediante a substituição por um único, com uma única prestação mensal, em substituição das anteriores respeitante aos créditos consolidados, que permite a diminuição do encargo global em percentagem significativa e que depende dos termos contratuais de cada instituição de crédito, podendo atingir até 60% de poupança relativamente à situação anterior.
II – Na medida em que a consolidação de débitos num único, em melhores condições para o devedor, se traduz num benefício, não deverá considerar-se que o mesmo implica encargos, pelo que deve considerar-se abrangido pela exceção de aplicação, por causa do âmbito material, do previsto na al. l) do n.º 1, do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 133/2009, de 02/06, ex vi do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 15/10, estando assim excluído do âmbito do P.E.R.S.I..
Sumário (art.º 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil, C.P.C.:
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1.ª Adjunta: Carla Fraga Torres e
2.º Adjunto: Manuel Fernandes.
ACÓRDÃO
I – RELATÓRIO
Nos presentes autos de embargos de executado, por apenso a processo de execução para pagamento de quantia certa, é embargante AA, titular do N.I.F. ..., residente na Rua..., ..., ..., ... ..., e é embargada “Banco 1..., S.A.”, titular do N.I.P.C. ..., com sede na Av. ... (...), ..., ... ....
1) Aos 13/12/2024 foi proferido o despacho saneador-sentença objeto deste recurso.
1.1) O objeto do processo foi resumido pelo seguinte modo:
“A executada AA veio, por apenso à execução para pagamento de quantia certa com o n.º 4266/14.0TBMTS, que lhe move, a si e a BB, o Banco 1..., S.A., requerendo a extinção da execução.
Para o efeito, a embargante, partindo da alegação de que não foi notificada do requerimento de injunção e de que a falta de oposição à injunção não a impede de exercer agora a sua defesa, invoca, em síntese:
1º - A exceção dilatória por falta de integração do cliente bancário no regime PERSI, sendo que a exequente não alega ter observado tal regime e/ou a sua não aplicação à embargante.
2º - A prescrição do crédito exequendo, por ter decorrido mais de 5 anos desde o vencimento do contrato, datado de 25.01.2013, sendo de 5 anos o prazo de prescrição do capital e juros do mútuo.
3º - A impugnação dos valores reclamados pela exequente, tendo em conta o seguinte:
a) A insuscetibilidade de a embargante figurar como mutuária e fiadora;
b) A embargante foi casada com o alegado devedor BB, tendo este, aquando do divórcio de dezembro de 2012, se comprometido a pagar o que estivesse em dívida, desconhecendo a embargante o que foi pago e o que está em dívida;
c) A embargante não foi interpelada para fazer cessar a mora e obviar ao vencimento das prestações.
A exequente não contestou, o que, em todo o caso, não implica a confissão dos factos que estão em oposição ao alegado no requerimento executivo/injuntivo (art. 732.º, n.º 3, do NCPC).
1.2) O dispositivo da decisão é do seguinte teor:
“Nestes termos, vistos os princípios expostos e as indicadas normas jurídicas, julgo totalmente improcedentes os embargos de executado deduzidos pela executada AA.
Custas pela embargante.
Notifique e registe”.
(…)
Também está vedado a este Tribunal conhecer de questões novas (que não tenham sido objeto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que os recursos são meros meios de impugnação de questões prévias judiciais, destinando-se, por natureza, à sua reapreciação e consequente confirmação, revogação ou anulação.
O presente recurso tem como objeto apenas matéria de Direito.
As questões (e não meras razões ou argumentos) a decidir são as seguintes:
1) Da invocada falta de notificação no processo de injunção.
2) Da não integração da embargante no procedimento PERSI.
3) Da prescrição da quantia exequenda, de capital e de juros.
4) Do desconhecimento dos valores exequendos.
II – FUNDAMENTAÇÃO
Os factos
Na decisão recorrida([2]) foi decidida a seguinte matéria de facto.
Factos provados.
Para apreciação do mérito dos embargos, importa ter presente os seguintes factos relevantes assentes por acordo (não impugnados) ou por documento com força probatória plena:
1. A exequente deduziu execução em 25.08.2014, nos termos constantes do requerimento executivo, que aqui se dá por reproduzido.
2. A exequente apresentou à execução, como título executivo, um requerimento de injunção contra a embargante e BB, datado de 27.12.2013, no qual vem peticionada a quantia global de € 9.035,63 (sendo € 7.722,90, de capital; € 1.159,73, a título de juros de mora, à taxa de 12,34%, desde 27.12.2013; e € 153,00, a título de taxa de justiça), alegadamente devida em função do que consta do requerimento junto com o requerimento executivo, cujo teor aqui se dá por reproduzido, incluindo o seguinte teor:
“Por contrato nº ..., celebrado em 2012/10/25, o Banco mutuou à Requerida BB B.I. ... Contribuinte nº: ..., a quantia de 8920.95. O empréstimo deveria ser amortizado em 18 prestações mensais e sucessivas correspondentes a capital e juros, nos termos constantes do contrato. A taxa de juro aplicável é de 12.34%. A Requerida não efectuou o pagamento da prestação que se venceu em 2013/01/25. O não pagamento da prestação na data estipulada provocou o vencimento total da dívida, nos termos dos art. 781º e 817º do Cód. Civil. À data do incumprimento, o capital em dívida ascendia a 7722.90. A este montante acrescem uros de mora, sobre o capital em dívida, contados à taxa de 12.34% ao ano, acrescida da sobre taxa legal de mora de 3%, nos termos estipulados no contrato, até efetivo e integral pagamento. É ainda devido o respectivo imposto de selo, calculado à taxa de 4% sobre os juros devidos, nos termos do nº17 da Tabela Geral do Imposto de Selo. Os requeridos BB B.I. ... Contribuinte nº: ...AA B.I. ... Contribuinte nº: ... (Referência do requerente nº ... – Telefone do Requerente nº ...), são igualmente responsáveis pelo pagamento da quantia mutuada, na qualidade de fiadores e principais pagadores, com renúncia ao benefício da excussão prévia.”.
3. A tal requerimento foi, por falta de oposição, aposta força executiva pelo Secretário de Justiça, em 19.03.2014.
4. No procedimento injuntivo, foram observados, por ordem cronológica, os seguintes atos/diligências tendentes à notificação da aí requerida e ora executada (conforme elementos do processo injuntivo acessíveis eletronicamente e também juntos nos embargos):
a. Apresentação do requerimento de injunção, com data de 27.12.2013, identificando a requerente como morada da requerida, ora executada, a Rua..., ..., ... ... ...;
b. Envio de ofício de notificação, por carta registada com aviso de receção datada de 14.01.2014, para a morada referida em a.;
c. Devolução do expediente de notificação, com a informação “não reclamado”;
d. Pesquisa da morada da executada nas bases de dados, onde consta em todas elas, como morada da executada, a referida em a.;
e. Envio de ofício de notificação, por carta registada com prova de depósito, datada de 19.02.2014, para a morada referida em a. e d.;
f. Estando o depósito da carta de notificação no recetáculo postal da morada referida em a. e d., certificado pelo distribuidor postal como tendo sido realizado em 20.02.2014, conforme documento de depósito.
5. A execução iniciou-se pela penhora, sendo a executada citada após penhora, em 23.09.2024, conforme AR junto na execução, recebido na morada da executada referida no processo de injunção.
6. A executada juntou procuração na execução em 03.11.2023, identificando a sua morada como sendo a referida no processo de injunção.
7. A embargante, enquanto mutuária, e a exequente, enquanto mutuante, apuseram as suas assinaturas no acordo escrito datado de 25.10.2012 junto com o requerimento de 22.11.2024, com o teor que se dá por reproduzido, constando do mesmo, além do mais, o seguinte:
- 1ª Mutuário: BB; Morada: Rua..., ..., ... ... ...; Profissão: Empresário(a);
- 2ª Mutuário: AA; Morada: Rua..., ..., ... ... ...; Profissão: Trabalhador p/conta própria;
- Finalidade: Consolidação;
- Montante total do empréstimo: 8.920,95 EUR;
- Prazo do Empréstimo: 18 meses;
- Prestações de capital e juros no valor unitário de (estimativa): 548,10 EUR/cada;
- Data de vencimento da 1ª Prestação: 25-11-2012,
8. Sendo tal contrato o referido no requerimento de injunção.
9. A prestação que se venceu em 2013/01/25 não foi paga.
10. A embargante e o co-executado divorciaram-se por decisão de 19.12.2012 – certidão junta com os embargos.
O Direito
1) Da invocada falta de notificação no processo de injunção.
Considerando-se a factualidade provada na decisão recorrida, mormente o iter processual descrito nas alíneas do facto n.º 4 (e, também, a data constante do n.º 5), torna-se patente não assistir qualquer razão à recorrente, tendo em conta o disposto nos artigos (e cujo teor damos por reproduzido) 230.º, n.º 2, 228.º, n.º 5, 236.º, n.º 1, e 229.º, n.º 5 do mesmo Diploma, ou seja, considera-se a notificação efetuada na data aposta no comprovativo de depósito de entrega da carta para notificação, ex vi, também, do art.º 219.º, n.º 5, do C.P.C.
No sentido do que vimos dizendo, e a título exemplificativo, passamos a citar parte da motivação de Direito no acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça no processo n.º 88/16.2PASTS-A.S1, aos 30/11/2017: “[n]o caso de notificação postal simples, o funcionário toma cota no processo com indicação da data da expedição e do domicílio para a qual foi enviada e o distribuidor do serviço postal depositará o expediente na caixa de correio do notificando, lavrará uma declaração indicando a data e confirmando o local exacto desse depósito, e envia-la-á de imediato ao serviço ou ao tribunal remetente, considerando-se a notificação [efectuada]”([3]).
Como observado na fundamentação do acórdão proferido pelo Tribunal Constitucional no processo n.º 85/2019, aos 16/10/2019, “no domínio do direito privado, em particular no direito das obrigações, onde impera o princípio da autonomia da vontade e da igualdade das partes e se discutem créditos de natureza essencialmente patrimonial – valores substantivos que se projetam na própria estruturação do processo civil (artigos 3.º e 4.º do CPC) – não se afigura em abstrato censurável a adoção de um sistema de citação ou notificação assente na presunção de conhecimento ou, mesmo, na presunção de cognoscibilidade do ato de citação ou notificação. Ponto é que o sistema concretamente instituído ofereça, desde logo, garantias de fiabilidade e segurança e não torne impossível ou excessivamente difícil a ilisão da presunção de conhecimento em que assenta. [Não] se prefigurando outros parâmetros constitucionais relevantes, impõe-se, pois, um juízo de não inconstitucionalidade da norma contida nos n.os 1 e 3 do artigo 12.º-A do regime constante do anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de setembro (na redação resultante do artigo 8.º do Decreto-lei n.º 32/2003, de 17 de fevereiro), interpretados, no âmbito de um procedimento de injunção destinado a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias de valor não superior a €15.000,00, no sentido em que, nos casos em que exista domicílio contratualmente convencionado para efeitos de notificações, a citação do Requerido se efetua apenas e de imediato através de carta enviada por via postal simples com prova de depósito, sem qualquer prévia tentativa de notificação por contacto pessoal, e que assim se presume a notificação do Requerido na data do depósito e dessa data se conta o prazo para deduzir [oposição]”([4]).
Ora, a recorrente não tentou sequer provar, ou ilidir, a presunção em causa (sem prejuízo de sempre ter tido como única morada apurada nas bases de dados a mesma constante do processo...), pois como sumariado no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido aos 11/07/2024 no processo n.º 12612/22.7T8LSB-C.L1-2, “[q]uanto à nota e à declaração elaboradas pelo distribuidor do serviço postal, sendo documentos particulares provam apenas que eles foram elaborados por quem as fez e assinou (art.º 376/1 do CCiv), não sendo abrangidos pela força probatória do documento os factos que delas são objecto, a sua valoração é livremente feita pelo juiz, podendo ser-lhes aposta qualquer contraprova por forma torná-los duvidosos nos termos do art.º 346 do CCiv”([5]).
Pelo exposto, improcedem as conclusões A a G.
2) Da não integração da embargante no procedimento PERSI.
A recorrente invoca a exceção dilatória inominada (insuprível e de conhecimento oficioso([6])) de não ter sido observado pela exequente o procedimento extrajudicial de regularização de situações de incumprimento (P.E.R.S.I.), previsto no capítulo III, secção I (artigos 12.º a 21.º) do Decreto-Lei n.º 227/12([7]), de 15/10, respeitante ao Plano de Ação Para o Risco de Incumprimento, (P.A.R.I.).
A argumentação expendida pela recorrente apela às hipóteses normativas constantes do art.º 729.º al. a), ou al. c), consoante a perspetiva que se acolha, respetivamente “[inexequibilidade] do título”, “falta de qualquer pressuposto processual de que dependa a regularidade da instância [executiva]”([8]) ou o previsto na parte final do art.º 731.º, “quaisquer outros [factos] que possam ser invocados como defesa no processo de declaração”([9]).
Porém, sem considerandos desnecessários, e como decidido pelo tribunal a quo, a situação do incumprimento do contrato de mútuo em questão (para consolidação) não se insere no âmbito material de aplicabilidade do P.E.R.S.I., pois que aquele está definido no art.º 2.º do referido Decreto-Lei na redação em vigor à data:
“1 - O disposto neste diploma aplica-se aos seguintes contratos de crédito celebrados com clientes bancários:
a) Contratos de crédito para a aquisição, construção e realização de obras em habitação própria permanente, secundária ou para arrendamento, bem como para a aquisição de terrenos para construção de habitação própria;
b) Contratos de crédito garantidos por hipoteca sobre bem imóvel;
c) Contratos de crédito a consumidores abrangidos pelo disposto no Decreto-Lei n.º 133/2009, de 2 de junho, alterado pelo Decreto-Lei n.º 72-A/2010, de 18 de junho, com exceção dos contratos de locação de bens móveis de consumo duradouro que prevejam o direito ou a obrigação de compra da coisa locada, seja no próprio contrato, seja em documento autónomo;
d) Contratos de crédito ao consumo celebrados ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 359/91, de 21 de setembro, alterado pelos Decretos-Leis n.os 101/2000, de 2 de junho, e 82/2006, de 3 de maio, com exceção dos contratos em que uma das partes se obriga, contra retribuição, a conceder à outra o gozo temporário de uma coisa móvel de consumo duradouro e em que se preveja o direito do locatário a adquirir a coisa locada, num prazo convencionado, eventualmente mediante o pagamento de um preço determinado ou determinável nos termos do próprio contrato;
e) Contratos de crédito sob a forma de facilidades de descoberto que estabeleçam a obrigação de reembolso do crédito no prazo de um mês.
2 - O disposto no presente diploma não prejudica o regime aplicável aos sistemas de apoio ao sobre-endividamento, instituído pela Portaria n.º 312/2009, de 30 de março”([10]).
Nos autos está em causa um crédito para "consolidação", pelo que para efeito do disposto no art.º 2.º (âmbito de aplicação material) do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 15/10, no atinente à sua inclusão no P.E.R.S.I. enquanto mecanismo do P.A.R.I. (Plano de Ação para o Risco de incumprimento), e atendendo às hipóteses previstas, poderia estar apenas em causa a mencionada na al. c) do mencionado Diploma, "c) Contratos de crédito aos consumidores abrangidos pelo disposto no Decreto-Lei n.º 133/2009, de 2 de junho, na sua redação atual".
No art.º 2.º deste Decreto-Lei temos a enunciação dos contratos a que não se aplica, constando do n.º 1, al. l), “l) Contratos de crédito que se limitem a estabelecer o pagamento diferido de uma dívida preexistente, sem quaisquer encargos”
Um crédito para consolidação, em termos de noção operacional, pode ser definido como aquele que agrupa (ou "consolida") outros pré-existentes, que ficam cumpridos mediante a substituição por um único, com uma única prestação mensal, em substituição das anteriores respeitante aos créditos consolidados, que permite a diminuição do encargo global em percentagem significativa e que depende dos termos contratuais de cada instituição de crédito, podendo atingir até 60% de poupança relativamente à situação anterior([11]) ([12]).
Ora, se a pré-existência dos créditos (consolidados) é patente, a dúvida só poderia colocar-se relativamente à parte final da norma, respeitante a “sem quaisquer encargos”. A partir da altura em que o devedor fica beneficiado relativamente à situação em que se encontrava, com menos débito, consideramos que, para o efeito, não se pode considerar que haja encargos (aliás, é um facto notório que ninguém troca para pior…).
Assim, tratando-se de um crédito de consolidação, como descrito no contrato, não integra a factie species do âmbito material de aplicação do mencionado art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 15/10.
Improcedem assim as conclusões H a M.
3) Da prescrição da quantia exequenda, de capital e de juros.
A prescrição é uma exceção perentória por extinguir o direito que se pretende fazer valer, nos termos dos artigos 576.º, n.º 3, e 579.º do C.P.C., sem prejuízo de ter de ser invocada (como foi) por o tribunal não poder declará-la oficiosamente, como disposto no art.º 303.º do C.C.
A data de incumprimento do contrato de mútuo está assente, estando em causa, inquestionavelmente, um contrato de crédito em que foi convencionado pelas partes o reembolso em prestações da quantia mutuada e dos juros calculados desde a celebração do mesmo até pagamento integral, de acordo com o plano de pagamento estipulado (18 meses).
A pretensão recursória convoca nesta parte o objeto decisório do acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 6/2022, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça([13]) aos de 30/06/2022, e publicado no D.R. n.º 184/2022, de 22/09/2022([14]).
Como consta do relatório desse acórdão, “[o] entendimento do acórdão recorrido, de considerar aplicável no caso o prazo prescricional de cinco anos nos termos do artigo 310.º, alínea e), do Código Civil, se mostrar consentâneo com o posicionamento que este tribunal tem vindo reiteradamente a defender em situações similares às dos presentes autos, dado estarem em causa contratos de mútuo onerosos em que a obrigação de restituição do capital mutuado foi fraccionada (prestações) o que consubstancia um acordo de amortização em que cada uma das prestações mensais devidas é uma quota de amortização do capital (ainda que integrada por duas fracções: uma de capital e outra de juros), não relevando para o enquadramento em termos de prescrição a circunstância do direito de crédito se vencer na sua totalidade, em resultado do incumprimento. Mais se entendeu que, nesse sentido, o que releva para efeitos de enquadramento do regime prescricional não é a forma por que a obrigação exequenda se mostra titulada, mas a estrutura do direito de crédito da Embargada decorrente do facto de estar em causa uma obrigação de reembolso de dívida que foi objecto de um plano de amortização, composto por diversas quotas, que compreendem uma parcela de capital e outra de juros e que traduzem a existência de várias prestações periódicas, com prazos de vencimento autónomos. Esta prescrição destina-se a evitar a ruína do devedor, pela acumulação da dívida, derivada designadamente de quotas de amortização de capital pagável com juros. Numa situação destas, a exigência do pagamento de uma só vez, decorridos demasiados anos, poderia provocar a insolvência do devedor a viver dos rendimentos, nomeadamente do trabalho, e que o legislador, conhecedor das opções possíveis, quis prudentemente prevenir, colocando no credor maior diligência temporal na recuperação do seu crédito”.
No entanto, nada há a acrescentar à fundamentação de Direito do tribunal a quo, no sentido de não se verificar a prescrição da dívida de capital e de juros (pelo invocado decurso do prazo de prescrição curto, de 5 anos) – aliás, é evidente que não, pois o incumprimento da obrigação exequenda verificou-se em janeiro de 2013 e a ação executiva de que estes embargos são apenso foi intentada no dia 25/08/2014.
A falta de razão resulta liminarmente – sem esforço hermenêutico, portanto – do regime previsto nos artigos 323.º, n.º 1 e n.º 2, e 327.º, n.º 1, do C.C., bem como do constante do art.º 716.º, n.º 2, e que, por facilidade de exposição passamos, respetivamente, a transcrever:
“1. A prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente.
2. Se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias”;
“1. Se a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo” e, por fim,
“2 - Quando a execução compreenda juros que continuem a vencer-se, a sua liquidação é feita a final, pelo agente de execução, em face do título executivo e dos documentos que o exequente ofereça em conformidade com ele ou, sendo caso disso, em função das taxas legais de juros de mora aplicáveis”([15]).
De todo o modo, cumpre referir que após a atribuição, aposição, de força executiva ao requerimento injuntivo, a obrigação causal ficou sujeita ao prazo ordinário de 20 anos, previsto no art.º 311.º, n.º 1, in fine, do C.C., “[o]” direito para cuja prescrição([16]), bem que só presuntiva, a lei estabelecer um prazo mais curto do que o prazo ordinário fica sujeito a este último, se sobrevier sentença passada em julgado que o reconheça, ou outro título executivo”([17]).
Nestes termos, improcedem as conclusões N a R.
4) Do desconhecimento dos valores exequendos.
Por fim, não deixa de ser algo peculiar a parte final da pretensão recursória, subdividida em segmentos de argumentação como: constar simultaneamente como fiadora e mutuária (sendo patente o lapso de escrita, dado que, como realçada pelo tribunal a quo, a recorrente sabe ser a mutuária do contrato incumprido por si e pelo ex-marido), o facto de aquando do divórcio ter (alegadamente) acordado com o agora ex-marido que as obrigações emergentes do contrato em causa seriam assumidas por aquele – cuja irrelevância, na situação destes autos é autoexplicativa – e o não ter sido interpelada, isto por causa de os juros continuarem a vencer-se – o que, também, nos remete para o que já expusemos quanto à falta de notificação.
Novamente a lei é clara, estando em causa um contrato de mútuo com prestações de cumprimento fixadas (18 meses) é aplicável o disposto nos artigos 805.º, n.º 2, al. a), e 806.º, n.º 2, ambos do C.C.: “1. O devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir. 2. Há, porém, mora do devedor, independentemente de interpelação: a) Se a obrigação tiver prazo [certo]; 2. Os juros devidos são os juros legais, salvo se antes da mora for devido um juro mais elevado ou as partes houverem estipulado um juro moratório diferente do legal”([18]).
Assim sendo, improcedem as conclusões S a V.
III – DECISÃO
Pelos motivos expostos, e nos termos das normas invocadas, acordam os juízes destes autos no Tribunal da Relação do Porto em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pela embargante e, consequentemente, confirmamos a decisão proferida.
Custas da apelação pela embargante, nos termos do art.º 527.º, n.º 1, e n.º 2, do C.P.C.