RECUSA DE JUÍZ
INTERVENÇÃO NOUTRO PROCESSO
Sumário


I. O fundamento da escusa/recusa deve ser objetivado numa razão séria e grave da qual resulte inequivocamente um estado de forte desconfiança sobre a imparcialidade do julgador.
II. A seriedade e gravidade do motivo ou motivos causadores do sentimento de desconfiança sobre a imparcialidade do juiz, só pode conduzir à sua recusa ou escusa quando objetivamente consideradas, perante um juízo casuístico, concreto e ponderado, de saber se o motivo adiantado preenche ou não aquela cláusula geral, determinante da desconfiança pública de imparcialidade.
III. O facto de dois processos de natureza criminal terem a sua origem numa certidão extraída do mesmo processo crime, em que a factualidade e os meios de prova são idênticos, só por si, não constitui motivo de recusa do juiz, tanto mais quando em nenhum desses processos sequer se iniciou a produção de prova.
IV. Na verdade, quando o juiz visado não praticou qualquer ato, nem emitiu qualquer juízo ou valoração sobre o mérito da causa, a sua imparcialidade, ao contrário de poder gerar desconfiança, deve ser presumida, a não ser que existam, no caso concreto, quaisquer factos objetivos evidentes que devam afastar essa presunção.

Texto Integral


Acordam, em conferência, na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães:

I-RELATÓRIO

I.1 No âmbito do Processo Comum Coletivo nº 9560/14.8TDPRT do Tribunal Judicial da Comarca de Bragança – Juízo Central Cível e Criminal de Bragança - Juiz 3, mediante requerimento entrado nos autos, via eletrónica, a 02-05-2025, o arguido AA deduziu incidente de recusa visando a Exma. Sra. Juíza BB.
Alega, para tanto, em síntese, que tomou agora conhecimento que, para além de ser titular dos presentes autos de processo comum-coletivo nº 9560/14.8TDPRT, a Exma. Sra. Juíza visada BB. é também titular dos autos de processo comum-coletivo n.º 5422/18.8T9PRT, ambos a correr termos no mesmo Tribunal Judicial da Comarca de Bragança – Juízo Central Cível e Criminal de Bragança - Juiz 3; cuja origem remonta ao processo 1420/11.OT3AVR, que por sua vez deu origem ao processo comum-coletivo nº 9560/14.8TDPRT e este, por via de certidão, deu origem ao  processo comum-coletivo n.º 5422/18.8T9PRT; em todos eles se discutindo o mesmo objeto, o mesmo «pedaço de vida», tendo já sido  decidido, por diversas vezes, nos presentes autos, designadamente noutros incidentes de recusa, mediante acórdãos transitados em julgado dentro deste processo, e que aqui têm inteira aplicação, que os juízes que tivessem intervenção nos processos derivados do 1420/11.0T3AVR, não podiam estar num lado a julgar os candidatos e no outro a julgar os examinadores nem os Juízes que já tenham julgado os mesmos arguidos no 1420/11 os podem julgar no 9560/14, tudo porque o pedaço de vida é o mesmo.
Acresce que, prossegue o requerente, pese embora tenha já sido dado início ao julgamento nos presentes autos, agendado para outubro de 2024, apenas foram decididas questões prévias, sem que, até ao presente, tenha sido produzida qualquer prova documental, testemunha, pericial ou de qualquer outra natureza, ao passo que, no processo n.º 5422/18.8T9PRT, entretanto baixado deste Tribunal da Relação de Guimarães à primeira instância para repetição do julgamento, cuja presidência do coletivo compete também à Exma. Sra. Juíza visada BB esta já praticou atos processuais, nomeadamente proferindo decisão datada de 2025 a  declarar especial complexidade do processo.
Assim, conclui o requerente, neste momento há dois julgamentos para se realizarem, o do presente Processo n.º 9560/14 e o do Processo n.º 5422/18, sendo este último uma certidão com origem naqueles autos - 9560/14.8TDPRT -, não podendo, por respeito e obediência às anteriores decisões proferidas nestes autos 9560/14.8TDPRT, a Exma. Sra. Juíza visada BB permanecer nestes autos por ter “em mãos” o processo 5422/18 e nele já ter proferido despachos/decisões, já se ter inteirado de todo aquele processo e objetivamente, já tem o julgamento preparado.
Deve, portanto, no seu entender ser deferida a presente recusa, não podendo a Exma. Sra. Juíza visada BB permanecer neste processo atendendo a que está a realizar o julgamento do processo 5422/18.8TDPRT que desceu do TRG por acórdão de 03.12.2024.
Mais requer que sejam desmarcadas as sessões de audiência de julgamento agendadas por ser princípio que norteia a atividade judiciária evitar-se a prática de atos inúteis.

Sobre tal requerimento pronunciou-se a Exma. Sra. Juíza visada BB, ao abrigo do artigo 45.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, argumentando, em suma, inexistir, no seu entender, qualquer motivo sério e grave adequado a gerar desconfiança sobre imparcialidade, nestes autos, porquanto efetivamente nem sequer iniciou a produção de prova, nem nos presentes nem naqueloutros autos. De todo o modo, prossegue a Exma. Sra. Juíza visada BB, em face dos documentos juntos pelo Requerente correspondentes a decisões proferidas nos apensos F e J, que se mostram findos, reconhece-se que em face do entendimento do Venerando Tribunal da Relação de Guimarães ali plasmado, poderá ser de ponderar a dedução de pedido escusa pela Signatária, naqueloutro processo 5422/18.8T9PRT, caso o presente Incidente venha a ser julgado improcedente e a Signatária aqui inicie a produção de prova.

Neste Tribunal da Relação, foi aberta vista nos autos à Exma. Sra. Procuradora-Geral Adjunta, que se pronunciou no sentido do indeferimento do pedido de recusa.

I.2 Colhidos os vistos legais e não havendo necessidade de proceder a quaisquer diligências de prova, foram os autos submetidos à presente conferência.
Cumpre, agora, apreciar e decidir.

II- FUNDAMENTAÇÃO

Pretende o requerente que a Exma. Sra. Juíza de Direito BB, seja recusada de intervir nos presentes autos, ao abrigo do artigo 43.º, n.ºs 1, 2 e 3, do Código de Processo Penal, porquanto, em suma, tem em mãos o processo n.º5422/18.8T9PRT, que teve origem em certidão extraída dos presentes autos.
Cumpre, portanto, com vista a averiguar da existência, ou não, de fundamentos que justifiquem a pretendida recusa, atentar no circunstancialismo processual respeitante a cada um dos referidos processos.
E o que, com pertinência para a decisão a proferir nestes autos, resulta da documentação junta ao presente incidente de recusa, completada com a análise eletrónica de cada um dos referidos autos, é o seguinte circunstancialismo processual:

® A Exma. Sr.a  Juíza de Direito BB encontra-se a exercer funções como Juíza de Direito, no Juízo Central Cível e Criminal de Bragança – Juiz 3, do Tribunal Judicial da comarca de Bragança, desde setembro do ano transato – 2024 - e, nessa qualidade, incumbe-lhe presidir ao tribunal coletivo que procederá à audiência de julgamento do processo comum coletivo nº 9560/14.8TDPRT, no qual foi deduzido o presente incidente de recusa.
® No presente processo comum coletivo nº 9560/14.8TDPRT a Exma. Sr.a  Juíza de Direito BB deu início à audiência de julgamento, realizando duas sessões: uma no passado dia 04 de novembro de 2024 e outra no passado dia 11 de novembro de 2024.
® Em nenhuma dessas sessões foi produzida qualquer prova, sendo que naquela primeira apenas se identificaram os arguidos presentes e nesta última proferiu-se despacho a adiar a audiência de julgamento, para oportuna decisão de todas as questões suscitadas em requerimentos apresentados em momento anterior ao início da audiência de julgamento, fosse no sentido de deferimento, de indeferimento ou relegar-se o seu conhecimento em sede de mérito, despacho esse que veio a ser proferido a 21-12-2024, do qual foi interposto recurso.
® Uma vez que os autos aguardavam a estabilização do processo, no que tange aos meios de prova, mediante despacho proferido a 18-03-2025, foi dada sem efeito a data que havia sido agendada para dar início à produção de prova, início esse que, nos termos do despacho proferido a 08-04-2025 se encontra reagendado para o próximo dia 06-10-2025.   

Por sua vez:
® No processo comum coletivo n.º 5422/18.8T9PRT, pendente no mesmo Juízo Central Cível e Criminal de Bragança – Juiz 3, do Tribunal Judicial da comarca de Bragança, mediante acórdão proferido por este Tribunal da Relação de Guimarães datado de 03-12-2024, foi ordenado o reenvio do processo para novo julgamento, a efetuar por coletivo diverso.
® Esses autos baixaram à primeira instância a 14-01-2025 e, tal como os presentes autos, são da titularidade da Exma. Sr.a  Juíza de Direito BB. 
® Nesses autos, a 17-02-2025, a Exma. Sr.a  Juíza de Direito BB proferiu despacho a precisar o objeto do processo que seria sujeito a novo julgamento [tendo em conta o reenvio parcial] e a 26-03-2025 proferiu despacho a declarar a especial complexidade do processo.
® Os aludidos processos comuns coletivos n.ºs 5422/18.8T9PRT e 9560/14.8TDPRT acabam por ter uma origem comum, concretamente no processo comum coletivo nº 1420/11.0T3AVR.
® Nos apensos A, D, F e J, mediante acórdãos proferidos, respetivamente, a 31 de agosto de 2020, a 17 de dezembro de 2020, a 5 de julho de 2021 e a 9 de maio de 2022, foram deferidos os pedidos de recusa ali suscitados, atendendo, em suma, à conexão subjacente aos respetivos processos, com origem comum e reportados ao mesmo “pedaço de vida”.

Vejamos o caso concreto:
Como é sabido, o princípio fundamental da independência dos Tribunais, consagrado no artigo 203.º da Constituição da República Portuguesa, estabelece que os tribunais são independentes e apenas estão sujeitos à lei, tendo como corolário o princípio da imparcialidade, definido, pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, no seu artigo 10.º, como uma garantia fundamental de cada ser humano: “ Toda a pessoa tem direito, em plena igualdade, a que a sua causa seja equitativa e publicamente julgada por um tribunal independente e imparcial que decida dos seus direitos e obrigações ou das razões de qualquer acusação em matéria penal que contra ela seja deduzida”.
A garantia de independência dos tribunais é complementada pela independência dos juízes e pela obrigação de imparcialidade que sobre estes recai.
Por outro lado, o artigo 4.º, n.º 1, da Lei da Organização do Sistema Judiciário [Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto], determina que “os juízes julgam apenas segundo a Constituição e a lei”, prosseguindo tal preceito legal, dessa forma assegurando a sua independência, que “não estão sujeitos a quaisquer ordens ou instruções, salvo o dever de acatamento das decisões proferidas em via de recurso por tribunais superiores”.
Assim sendo, o princípio do juiz natural, segundo o qual intervirá na causa o juiz determinado de acordo com as regras da competência legal estabelecidas, consagrado como garantia do processo criminal, pode ser derrogado para dar satisfação a outros princípios constitucionais, como o é o da imparcialidade do juiz. Com efeito, a imparcialidade do juiz, imanente ao ato de julgar e pressuposto de uma decisão justa, é essencial à confiança pública na administração da justiça e "um direito fundamental dos destinatários das decisões judiciais, um dos elementos integrantes e de densificação da garantia do processo equitativo, com a dignidade de direito” [artigo 6.º, &1 da CEDH e artigo 14.º, n.º 1, do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos].

Com vista à preservação da garantia constitucional de imparcialidade do juiz penal e da confiança dos sujeitos processuais e do público em geral nessa imparcialidade, o legislador estabeleceu diversos mecanismos, como é o caso dos impedimentos, das escusas e das recusas, esta última, que no caso interessa, prevista no artigo 43.º do Código de Processo Penal que rege nos seguintes termos: 
 “1 - A intervenção de um juiz no processo pode ser recusada quando correr o risco de ser considerada suspeita, por existir motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade.
2 - Pode constituir fundamento de recusa, nos termos do n.º 1, a intervenção do juiz noutro processo ou em fases anteriores do mesmo processo fora dos casos do artigo 40.º
3 - A recusa pode ser requerida pelo Ministério Público, pelo arguido, pelo assistente ou pelas partes civis.
4 - O juiz não pode declarar-se voluntariamente suspeito, mas pode pedir ao tribunal competente que o escuse de intervir quando se verificarem as condições dos n.ºs 1 e 2.
5 - Os actos processuais praticados por juiz recusado ou escusado até ao momento em que a recusa ou a escusa forem solicitadas só são anulados quando se verificar que deles resulta prejuízo para a justiça da decisão do processo; os praticados posteriormente só são válidos se não puderem ser repetidos utilmente e se se verificar que deles não resulta prejuízo para a justiça da decisão do processo.”.

Decorre da mencionada disposição legal que pode ser requerida a recusa do juiz quando se verifiquem uma das seguintes situações:
® correr o risco de ser considerado suspeito, por existir motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade; ou
® tiver havido a sua intervenção noutro processo ou em fases anteriores do mesmo processo fora dos casos do artigo 40.º.
Ora, a lei não define o que se deve entender por “motivo sério e grave adequado a gerar desconfiança sobre a imparcialidade” do juiz, cuja escusa/recusa é requerida.
Para tanto, deverão ser alegados pelo requerente factos objetivos suscetíveis de preencher tais conceitos jurídicos.
A seriedade e a gravidade do motivo ou motivos causadores do sentimento de desconfiança sobre a imparcialidade do juiz só são suscetíveis de conduzir à escusa/recusa do juiz quando objetivamente consideradas, não bastando um puro convencimento subjetivo por parte de um dos sujeitos processuais para que tenhamos por verificada a suspeição.
E também não basta a constatação de qualquer motivo gerador de desconfiança sobre a imparcialidade do juiz, sendo necessário que o motivo seja grave e sério.[1]
“O motivo apresentado tem de ser sério e grave, objetivamente considerado, isto é, do ponto de vista do cidadão médio, que olha a justiça como uma instituição que tem de merecer confiança”. [2]
Sobre o que se deve entender por motivo suficiente para o afastamento de um juiz, decidiu-se no Acórdão do STJ de 12-11-2020[3] que: “ Para afastar o juiz natural não basta um qualquer motivo que alguém possa ter como susceptível de afectar a sua imparcialidade, antes importa que o mesmo seja sério e grave no contexto de uma determinada situação concreta.
Conforme assinalado no cit. Ac. do STJ de 09.11.2011 “os motivos sérios e graves adequados a gerar desconfiança sobre a imparcialidade do julgador hão-se, pois, resultar de objectiva justificação, avaliando-se as circunstâncias invocadas pelo requerente, não pelo convencimento subjectivo deste, mas pela valoração objectiva das mesmas circunstâncias a partir do senso e experiência comuns, conforme juízo do cidadão de formação média da comunidade em que se insere o julgador”.
O fundamento da escusa/recusa deve, pois, ser objetivado numa razão séria e grave da qual resulte inequivocamente um estado de forte desconfiança sobre a imparcialidade do julgador.
No caso vertente, o enfoque não se direciona tanto sobre o plano de imparcialidade subjetiva, que sempre se teria de presumir, direciona-se, sim, essencialmente, na sua vertente objetiva, de respeito pelas aparências e da garantia externa, para com os concidadãos, de uma justiça isenta, pretendendo-se que seja publicamente reconhecida como imparcial.
In casu, atentando-se nos argumentos invocados pelo requerente para fundamentar o presente incidente, somos conduzidos a apreciar a denominada imparcialidade objetiva, por intervenção processual em outros processos, o que, como acabamos de expor, embora não integre motivo de impedimento nos termos do artigo 40.º do Código de Processo Penal, pode constituir fundamento de recusa do juiz, em conformidade com o disposto no n.º 2, do artigo 43.º, deste citado diploma legal.
E, de facto, não podemos deixar de atentar que do circunstancialismo processual supra descrito, o que decorre é que os processos comuns coletivos n.ºs 9560/14.8TDPRT e 5422/18.8T9PRT acabam por entroncar numa mesma origem, no processo comum-coletivo n.º1420/11.0T3AVR, reportam-se, portanto, a factualidade e prova idênticas.
Igualmente se constata ser uma realidade que por este Tribunal da Relação de Guimarães foram proferidas, no âmbito deste processo, diversas decisões de deferimento de pedidos de recusa, tendo por base o circunstancialismo acabado de expor, o que ocorreu nos apensos supra indicados [apensos A, D, F e J]. 
Porém, tal circunstancialismo, só por si, não é suficiente para conduzir ao deferimento do pedido de recusa nos presentes autos.
Com efeito, conforme decorre dos considerandos supra expostos, a seriedade e gravidade do motivo ou motivos causadores do sentimento de desconfiança sobre a imparcialidade do juiz, só pode conduzir à sua recusa ou escusa quando objetivamente consideradas, perante um juízo casuístico, concreto e ponderado, de saber se o motivo adiantado preenche ou não aquela cláusula geral, determinante da desconfiança pública de imparcialidade.
Quando é formulado um pedido de recusa/escusa o que está em causa é a possibilidade do não reconhecimento público da imparcialidade do juiz recusado/escusado, sendo certo que a seriedade e a gravidade do motivo ou motivos causadores do sentimento de desconfiança sobre a imparcialidade do juiz só são suscetíveis de conduzir à sua recusa/escusa quando objetivamente consideradas, de acordo com as regras da experiência comum, com equilíbrio e adequação ao circunstancialismo do caso concreto.
E, no caso concreto, ainda não se iniciou a produção de prova em nenhum dos invocados processos pelo que não se descortina de que forma a intervenção da visada no julgamento destes autos possa ser capaz de levantar suspeita da sua imparcialidade aos olhos do homem médio.
Aliás, nem sequer se iniciou ou sequer se agendou a audiência de discussão e julgamento no processo n.º 5422/18.8T9PRT [processo que o requerente aqui traz à colação como fundamento do pedido de recusa da Exma. Sr.a  Juíza de Direito BB], ao contrário do que sucede nos presentes autos n.º 9560/14.8TDPRT, no qual já se deu início à audiência de julgamento [pese embora ainda não se tenha produzido qualquer prova], e o início de produção de prova, pese embora diversos adiamentos, nunca deixou de estar agendado.
E se é verdade que a Exma. Sr.a  Juíza de Direito BB já proferiu despachos naquele processo n.º 5422/18.8T9PRT [a precisar o objeto de julgamento na sequência do reenvio parcial para novo julgamento e a determinar a especial complexidade do processo], o que, de alguma forma, a levou a inteirar-se do mesmo, não é menos verdade que também já o fez nestes autos n.º 9560/14.8TDPRT, apreciando, designadamente, requerimentos respeitantes a alegada existência de provas proibidas e até dando início ao julgamento [ainda que não tenha sido produzida qualquer prova], o que, necessariamente, pressupõe o seu estudo.
Além disso, o que decorre do circunstancialismo processual supra descrito é que a Exma. Sr.a  Juíza de Direito BB já tinha “em mãos” estes autos n.º 9560/14.8TDPRT quando os autos n.º 5422/18.8T9PRT baixaram à primeira instância para novo julgamento, e não o contrário.
Constitui, de facto, uma realidade patente que no âmbito destes autos n.º 9560/14.8TDPRT já foram proferidas decisões de deferimento de pedido de recusa nos apensos A, D, F e J, perante a conexão processual ante exposta decorrente da existência de uma origem comum, mas não é menos verdade que decisões de indeferimento de recusa e de escusa foram também já proferidas no âmbito deste mesmo processo n.º 9560/14.8TDPRT, como disso são exemplos a decisão proferida a 15 de junho de 2021, no Apenso E e a decisão proferida a 24 de setembro de 2024 no Apenso V.   
Em suma, perante o circunstancialismo processual concreto e os argumentos aventados pelo requerente no requerimento de recusa aqui em apreciação, avaliado à luz da legislação aplicável, não se descortina qualquer motivo sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a imparcialidade e independência para intervir nestes autos da Exma. Sr.a  Juíza de Direito cuja recusa ora se pretende, nos termos do artigo 43.º do Código de Processo Penal, sendo que o seu deferimento constituiria um grave atropelo às regras da competência e ao princípio do juiz natural, constitucionalmente consagrado no artigo 32.º, n.º9, da Constituição da República Portuguesa.
A Exma. Sr.a  Juíza de Direito visada não praticou qualquer ato, nem emitiu qualquer juízo ou valoração sobre o mérito da causa, pelo que a sua imparcialidade, ao contrário de poder gerar desconfiança, deve ser presumida, até por inexistirem, in casu, quaisquer factos objetivos evidentes que devam afastar essa presunção. 
Impõe-se, portanto, julgar manifestamente infundado o presente pedido de recusa, bem como o consequente pedido de desmarcação das sessões de audiência de julgamento neste processo agendadas.

III- DISPOSITIVO

Pelo exposto, nos termos do artigo 45.º, n.º 4, do Código de Processo Penal, acordam os juízes da Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães em:

I. Recusar, por manifestamente infundado, o pedido de recusa da Exma. Sr.a  Juíza de Direito BB relativamente à sua intervenção nos presentes autos de Processo Comum-Coletivo n.º 9560/14.8TDPRT.

E, consequentemente:
II. Julgar improcedente o pedido de desmarcação das sessões de audiência de julgamento neste processo agendadas.

Nos termos do n.º 7, do artigo 45.º, do Código de Processo Penal, condena-se o requerente em 7 [sete] UCs.

Notifique.

Guimarães, 27 de maio de 2025
[Elaborado e revisto pela relatora - artigo 94.º, n.º 2, do Código de Processo Penal]

Os Juízes Desembargadores

Isilda Pinho [Relatora]
Carlos da Cunha Coutinho [1.º Adjunto]
Anabela Varizo Martins [2.ª Adjunta]


[1] Acórdão do TRL, de 04-11-2004, Processo nº 873/2004 e Acórdão do TRC, de 10-07-1996, in CJ, Ano 1996, Tomo IV, pág. 62.
[2] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 26-02-2004, Processo n.º 4429/03-5, in www.dgsi.pt
[3] In inhttps://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2020:9560.14.8TDPRT.C.G1.A..9F.