CONTRATO-PROMESSA DE COMPRA E VENDA
IMÓVEL
NULIDADE POR FALTA DE FORMA
ACTUALIZAÇÃO
Sumário

Sumário (da responsabilidade do relator - art. 663º n.º7 do CPC):
- o contrato-promessa de compra e venda relativo a imóveis celebrado sem redução a escrito é nulo por vício de forma.

- tal nulidade impõe ao promitente-vendedor a devolução dos valores que recebeu do promitente-comprador (a título de sinal), devolução esta que não fica sujeita a actualização.

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Évora

I. A Herança de AA, representada por BB, CC e DD, intentou a presente acção contra a Herança aberta por óbito de EE, FF e GG, pedindo que seja:


a) Declarado que os Réus por facto voluntário seu, que lhes é exclusivamente imputável, não cumpriram com as obrigações que haviam assumido para com os Autores em contrato promessa datado de 03/09/1983;


b) Reconhecido que aos Réus incumbiam tais obrigações e, para os fins prescritos no artigo 830.º, n.º 1 do Código Civil seja proferida sentença que produza os efeitos da declaração negocial dos Réus faltosos e que, por via disso, seja decretada a transferência para os Autores da propriedade e da posse dos prédios identificados no artigo 2.º, com observância de todas as cláusulas e condições constantes do aludido contrato;


c) Ordenado o cancelamento de todos os ónus e/ou encargos relativamente aos ditos prédios;


Ou, subsidiariamente serem os Réus:


Condenados a indemnizar os Autores pelos danos emergentes e pelos lucros cessantes motivados pela frustração da possibilidade dos Autores exercerem o seu direito à execução específica, pelo valor correspondente ao preço atual das duas parcelas de terreno, identificadas em 2.º, acrescido dos juros à taxa legal, vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento, ou, à transmissão do direito de propriedade de outros dois lotes de terreno, em tudo semelhantes aos prometidos, ou seja, com a mesma área, em local próximo, com a mesma finalidade urbanística e com o mesmo valor.


Ou, subsidiariamente serem os Réus:


Condenados a pagar aos Autores uma indemnização no valor de EUR3.491,60 (três mil quatrocentos e noventa e um euros e sessenta e um cêntimos), com a devida correcção monetária à data atual, acrescida de juros à taxa legal, vencidos e vincendos, desde a citação até pagamento efetivo e integral pagamento, quantia correspondente ao locupletamento dos Réus, a título de enriquecimento sem causa.


Alegaram para tanto, no essencial, que:


- AA (falecido, de que os AA. são herdeiros) comprou [contrato que, no decurso da PI, passou a ser depois configurado como contrato-promessa] em 03.09.1983 duas parcelas de terreno a EE - a Parcela 415 e a Parcela 416, correspondentes a 795 Avos Indivisos do Casal do S..., actualmente Urbanização Casal do S... e Local 1 por 700.000$00 (3.491,60 euros), preço que pagou em prestações.


- não foi feita a escritura de compra e venda, apesar de os RR. terem sido para tal interpelados.


- AA deslocou-se por diversas vezes ao escritório de EE tendo sido sempre informado que a documentação necessária ainda não se encontrava agendada (sic) por não estarem reunidas as condições por parte dos RR..


- explicações que AA aceitou por se tratar de área urbana de génese ilegal, de legalização complexa e demorada.


- em 27.11.2002 AA interpelou os RR. para procederem à marcação da escritura de compra e venda, tendo falecido em ........2015 sem receber resposta.


- não conseguindo obter esclarecimento por parte dos RR., os AA. solicitaram à Câmara Municipal de Sesimbra informação, tendo obtido Parecer do qual resulta que a Parcela 415 é parte do prédio 4681/Local 1, com a matriz predial Art.º 194 da Secção AB – Espaço Industrial e que a Parcela 416 é parte do prédio 4682/Local 1, Matriz predial Art.º 193 da Secção AB – Espaço Industrial e Zona Verde, não existindo qualquer processo de loteamento


- aqueles prédios estão inscritos na matriz e no registo predial a favor de GG e FF como herdeiros de EE, sobre eles incidindo hipoteca.


- a herança e os herdeiros de EE foram novamente interpelados para marcarem a escritura, sem resposta, e foram depois notificados judicialmente, sem resposta.


Os RR. contestaram, começando por invocar a excepção da incompetência em razão do território. Invocaram de seguida a excepção da extinção do direito dos AA., porquanto, no essencial, perante a falta de pagamento da totalidade do preço pelo falecido, EE resolveu o contrato-promessa. Impugnaram depois a versão dos AA., tendo ainda alegado, em particular, que:


- admitem a promessa da venda dos 795 avos indivisos mencionados na PI, embora o contrato-promessa não tenha sido formalizado, pelo preço alegado, a ser pago de forma faseada.


- os avos indivisos correspondiam às parcelas de terreno identificadas numa planta particular de EE sob os números 415 e 416, da propriedade designada “Casal do S...”.


- não se previa data para a escritura, a qual EE só realizava em regra após o pagamento integral.


- por vicissitudes que descrevem, não foi realizado o pagamento de uma das prestações acordadas.


Formularam ainda, além do pedido de improcedência da acção, um pedido de declaração do contrato-promessa como resolvido.


Os AA. apresentaram resposta na qual se pronunciaram sobre a invocada incompetência territorial, aceitaram uma confissão do pagamento (parcial) e pronunciaram-se sobre os documentos juntos, e, a pretexto de os RR. se referirem à má fé dos AA. (quando alegaram que os RR. não responderam a notificação judicial avulsa efectivada), pronunciaram-se também sobre a litigância de má fé.


Os RR. apresentaram articulado no qual requeriam que fosse desentranhada a resposta apresentada por inadmissível mas, simultaneamente, pronunciaram-se eles também sobre o teor daquela resposta.


Julgada admissível a resposta, foi julgada verificada a excepção de «incompetência territorial».


Recebido o processo no tribunal territorialmente competente, foi proferido o seguinte despacho:


«Considerando que não será realizada audiência prévia e perante a defesa por exceção, notifique os AA. para exercer o contraditório – art. 3º, nº 3 do CPC.


Prazo:10 dias.


Notifique.»


Os AA. responderam, sustentando o integral cumprimento do acordado pelo AA e o incumprimento do contrato-promessa pelos RR..


Os RR. apresentaram articulado no qual invocaram que a resposta excedia o âmbito da alegação mas, simultaneamente, passaram também eles a pronunciar-se sobre os termos da resposta.


Seguiram-se várias diligências tendentes a obter acordo entre as partes, acordo que não foi possível alcançar.


Foi depois proferido despacho a fixar o valor da acção (em 30.000,01 euros [1]), e de seguida também os seguintes despachos:


«II. Saneamento.


O Tribunal é competente em razão na nacionalidade, da hierarquia e da matéria.


Não existem nulidades principais que invalidem todo o processado.


As partes têm personalidade e capacidade judiciária, e são legítimas.


Não existem nulidades secundárias, exceções dilatórias ou questões prévias que cumpra conhecer e obstem ao conhecimento do mérito da causa.


*


III. Despacho nos termos do art. 593º, n.º 1 e n.º 2 al. d-) do Código de Processo Civil (CPC).


Admito os meios de prova indicados nos articulados, nos seus precisos termos, ou seja, admite-se:


- A inquirição das testemunhas arroladas (artigo 487.º do CPC);


- A documentação já junta aos autos (artigo 423.º, n.º 1 do CPC);


- As declarações de parte dos AA., CC e DD (artigo 466.º, n.º 1 do CPC)


e


- A perícia, nos termos dos artigos 467.º e 475.º do CPC, a fim de se apurar o valor atual de mercado dos prédios rústicos identificados na p.i., cujos os encargos são a suportar pela Autora porquanto é requerente deste meio probatório. Nomeio Perita HH, já conhecida em juízo por ter efetuado perícias avaliativas noutras ações, com o domicílio profissional, em Local 2, melhor indicado na Lista Oficial de Peritos para o Distrito de Évora, da qual faz parte, fixando-se o prazo de 45 (quarenta e cinco) dias para a apresentação do relatório pericial devendo anexar ao mesmo o compromisso de honra.


Para realização do julgamento proponho o dia 03.04.2024., pelas 14h00, neste Tribunal.


Diligencie nos termos do disposto no art. 151º, nº 1 do CPC.


Não ocorrendo impedimento dos Mandatários, considero designado o julgamento.


*


Notifique.»


Após diligências probatórias e a realização da audiência de julgamento, foi proferida sentença que absolveu os RR. dos pedidos formulados.


Desta decisão interpuseram os AA. recurso, formulando as seguintes conclusões:


1. Vem o presente recurso interposto da douta Sentença proferida pelo Juízo de Competência Genérica de Sesimbra – Juiz 1 que julgou a ação totalmente improcedente por não provada, absolvendo de todos os pedidos a Herança Aberta por óbito de EE, a herdeira FF e o herdeiro GG.


2. No entender dos Apelantes a decisão sindicada é totalmente desajustada ao direito aplicável aos factos e aos documentos juntos aos Autos.


3. Versando o presente Recurso, exclusivamente, sobre matéria de direito.


4. Considerando os Apelantes, salvo melhor opinião, que as questões essenciais a decidir as seguintes:


a) – Se EE podia resolver o contrato promessa de compra e venda com base em incumprimento definitivo do promitente comprador por falta de uma prestação do preço.


b) – Se se extinguiu o direito dos Autores de exigirem a celebração do contrato prometido.


c) – Se os Autores podiam recorrer à figura do enriquecimento sem causa;


d) – Ou se a lei lhes facultava outro meio de reação em ação judicial autónoma e própria para solicitar a restituição integral do preço que pagaram.


5. Não foi realizada audiência prévia conforme Despacho proferido a 29/11/2021, Ref.ª 93636120: “Considerando que não será realizada audiência prévia e perante a defesa por exceção, notifique os AA. para exercer o contraditório – art. 3.º, n.º 3 do CPC.”


6. O Despacho Saneador proferido em 20/11/2023, Ref.ª: 98347636 é omisso quanto ao conteúdo do objeto do litígio e dos temas da prova.


7. A audiência prévia é em princípio obrigatória ou tendencialmente obrigatória embora seja facultado ao juiz dispensar a sua realização nos processos que devam prosseguir para julgamento.


8. Dispõe o artigo 593.º do CC que nas ações que hajam de prosseguir o juiz pode dispensar a audiência prévia quando esta se destine apenas aos fins indicados nas alíneas d), e) e f) do artigo 591.º.


9. A não realização deste ato processual só será consentida no âmbito do exercício do dever de gestão processual, a título de adequação formal, se o juiz entender que a matéria a decidir foi objeto de suficiente debate nos articulados, justificando a dispensa dessa diligência.


10. Sobre o propósito de dispensar a audiência prévia deverá o juiz, porém, ouvir as partes, de acordo com o disposto nos artigos 6.º, n.º 1 e 3.º, n.º 3 do CPC


11. Ou seja, embora a dispensa da audiência prévia possa ter lugar no âmbito da gestão processual que incumbe ao juiz fazer do processo, impõe-se, no entanto, a consulta prévia das partes, a fim de garantir, por essa via o exercício do contraditório, neste caso sobre a gestão processual.


12. A preterição da aludida formalidade processual que se reputa de essencial, gera para além da nulidade processual a nulidade do saneador e implica a anulação do processado a fim de a tramitação processual regressar ao momento anterior ao despacho de 29/11/2021 que, sem ouvir as partes, considerou que não iria ser realizada audiência prévia.


13. Pelo que ocorrendo o vício de nulidade da decisão que dispensou a realização da audiência prévia, tal determina a nulidade dos atos praticados subsequentemente a tal 31 decisão e que da mesma dependam em absoluto, devendo ser proferida decisão a convocar as partes (Autores e Réus) para a audiência prévia omitida nos termos e para os efeitos do artigo 591º, nº. 1, do Cód. de Processo Civil, ou, em alternativa, ser proferido o despacho previsto nos artºs 547º e 6º, do Cód. de Processo Civil, convidando as partes a pronunciar-se sobre a possibilidade de dispensa desta diligência.


14. Sendo um poder-dever do juiz, não se tratando pois de um poder discricionário que aquele cumpre ou deixe de cumprir, em função da sua vontade


15. Ora, o Saneador proferido a 20/11/2023, Ref.ª: 98347636 é omisso quanto ao conteúdo do objeto do litígio.


16. Sobre o juiz impende, em exclusivo, nas ações que devam prosseguir, a obrigação de fixar o objeto do litígio em face dos pedidos deduzidos (o objeto do litígio corresponde ao thema decidendum) e fixar os temas da prova, as grandes questões fáticas que permanecem controvertidas, balizadas somente pelos limites que decorrem da causa de pedir e das exceções invocadas.


17. Esta operação permite que a instrução, dentro dos limites definidos pela causa de pedir e pelas exceções deduzidas, decorra sem constrangimentos, assegurando-se assim a livre investigação e consideração de toda a matéria com relevância para a decisão da causa.


18. Permitindo-se ainda a subsequente possibilidade de reclamação que assiste ao autor por força do artigo 596.º, n.º 2 do CPC.


19. A ausência deste despacho traduz-se no cometimento de uma nulidade processual por força dos artigos 195.º, 197.º, 200.º, n.º 3 do CPC.


20. Podendo esta questão ser fundadamente ponderada e decidida em sede de Recurso.


Sendo assim de anular a decisão recorrida.


Sem conceder,


21. Sobretudo no que diz respeito ao vertido no Ponto 20 dos factos considerados como provados, não poderia o Tribunal a quo, perante a existência da dívida de 15.000$00 quanto ao preço acordado, considerar o contrato promessa resolvido por via das duas cartas alegadamente remetidas por EE em 10.01.1990 e 24.09.1992, que aqui se dão por integralmente reproduzidas para todos os efeitos legais.


22. Primeiro porque tais cartas não podem fazer a prova pretendida pelos Réus por nem sequer se encontrarem assinadas por EE, delas constando apenas uma rubrica não se podendo concluir pertencer ao mesmo, razão por que tal documentação foi expressamente impugnada pelos Autores.


23. Depois, porque tais cartas, juntas à Contestação sob os docs. n.ºs 3 e 4 não podem ser consideradas como interpelação admonitória.


24. Consistindo a interpelação admonitória no ato pelo qual o credor reclama do devedor em mora o cumprimento da obrigação a que está vinculado, sob pena de entra em incumprimento definitivo.


25. Pois que quer EE quer os seus herdeiros, aqui Réus, não concederam a AA ou aos seus herdeiros um prazo suplementar com a cominação de considerarem resolvido o contrato promessa, por incumprimento definitivo.


26. A interpelação admonitória para que possa produzir o efeito previsto no artigo 808.º, n.º 1 do CC, ou seja, a conversão da mora em incumprimento definitivo tem de se traduzir numa intimação para o cumprimento, dentro de um prazo razoável com vista a essa finalidade e em termos de diretamente deixar transparecer a intenção do credor de ter a obrigação como definitivamente não cumprida se não se verificar o cumprimento dentro daquele prazo.


27. Nem mesmo foi transmitida por EE ou pelos seus herdeiros aos Autores, a intenção dos mesmos de fazer equivaler o incumprimento de tal prestação à impossibilidade de cumprimento.


28. Assim pelo alegado facto de os AA não terem cumprido atempadamente a obrigação a que estavam adstritos, de pagamento daquela prestação, tão só se constituíram (e mantiveram) em mora.


29. Sendo que a mora, só por si, não confere aos credores o direito de resolver o contrato, mas apenas o de ser ressarcido pelos danos que lhes tenha causado o retardamento da prestação – 804.º CC.


30. Pois que a mora do promitente vendedor só se converte em incumprimento definitivo se a prestação não for por ele realizada dentro do prazo que razoavelmente lhe for fixado pelo promitente comprador ou, em alternativa, se este perder o interesse que tinha na prestação (transmissão da propriedade), perda esta que deve ser apreciada objetivamente.


31. Não pode, desta forma, considerar-se que as cartas alegadamente dirigidas a AA constituíram qualquer interpelação admonitória, pelo que aquele, mesmo que se considere não ter cumprido atempadamente a obrigação de pagar uma prestação do preço a que estava adstrito só se constituiu (e manteve) em mora.


32. Esta como declaração recetícia que é, torna-se definitiva logo que é comunicada ao devedor destinatário – 224.º do CC


33. A lei confere ao credor fixar ao devedor, que haja ocorrido em mora, um prazo para além do qual torna eficaz a sua resolução.


34. Prazo razoável esse destinado a conceder ao devedor uma derradeira possibilidade de manter o contrato.


35. Tendo esse prazo de ser fixado, pela mesma razão, em termos de diretamente deixar transparecer a intenção do credor.


36. Ora não foi fixado qualquer prazo suplementar para pagamento da dita prestação, nem por EE nem pelos seus herdeiros.


37. Assim pelo alegado facto de os AA não terem cumprido atempadamente a obrigação a que estavam adstritos, de pagamento daquela prestação, tão só se constituíram (e mantiveram) em mora.


38. Sendo que a mora, só por si, não confere aos credores o direito de resolver o contrato, mas apenas o de ser ressarcido pelos danos que lhes tenha causado o retardamento da prestação – 804.º CC.


39. Pois que a mora do promitente vendedor só se converte em incumprimento definitivo se a prestação não for por ele realizada dentro do prazo que razoavelmente lhe for fixado pelo promitente comprador ou, em alternativa, se este perder o interesse que tinha na prestação (transmissão da propriedade), perda esta que deve ser apreciada objetivamente.


40. Não existe fundamento jurídico para a resolução do contrato promessa em causa, com fundamento no incumprimento definitivo, por se considerar que não foi efetuada a 35 interpelação admonitória que a lei exige.


41. Estando-se ainda em condições de celebrar o contrato prometido.


Sem conceder,


42. Também os RR não demonstraram ter perdido o interesse na prestação pecuniária e na celebração do contrato definitivo.


41. Pois para que se tenha por demonstrada a falta de interesse do credor na prestação – 808.º do CC – não basta o juízo valorativo arbitrário do próprio credor, antes aquela há de ser apreciada objetivamente, com base em elementos suscetiveis de serem valorados por qualquer pessoa (designadamente pelo devedor ou pelo próprio juiz).


43. Em todo o caso revestindo a perda de interesse do credor na prestação a natureza de facto constitutivo do direito que se arroga – a resolução do contrato – é ao promitente vendedor que incumbe alegar e provar os factos com base nos quais há de ser objetivamente apreciada a situação concreta de falta daquele interesse


44. Perante o quadro factual apurado nos autos resulta clara a ausência de demonstração da perda objetiva de interesse por parte dos RR na celebração do contrato definitivo


45. Pelo exposto o contrato promessa mantem a sua eficácia e pode ainda ser cumprido.


46. Inexistindo o fundamento resolutivo invocado pelos RR.


47. O contrato promessa de compra e venda tem como objeto e obrigação principal a celebração da escritura pública de compra e venda, sendo esse o sinalagma específico do contrato.


48. Embora clausuladas no contrato promessa as prestações do preço da venda a pagar antes da celebração do contrato prometido, não deixam de ser prestações próprias e típicas desde último contrato que relativamente ao contrato promessa assumem a natureza de obrigações secundárias ou acessórias.


49. Quando deixam de ser cumpridas obrigações ou deveres dessa natureza não se segue necessariamente o direito de resolução do contrato promessa, mesmo que o incumprimento tivesse sido precedido de interpelação admonitória, que não foi!


50. Não estando em causa uma obrigação principal, há que averiguar, em concreto, qual a relevância e a respetiva repercussão da prestação incumprida na economia do contrato (no todo contratual).


51. Pois que se trata de uma obrigação autónoma ou desvinculada da obrigação principal, por se tratar de uma prestação que encerra efeitos antecipados do contrato prometido.


52. Neste sentido aponta a doutrina do n.º 2 do artigo 802.º, o qual acolhe os princípios da proporcionalidade e da adequação proibindo condutas contrárias ao razoável e proporcional ante as circunstâncias do caso.


53. Pois que no caso sub judice, no contrato promessa foi fixado para o negócio prometido o preço de 700.000$00 PTE e o promitente comprador deixou de pagar uma única prestação, no valor de 15.000$00 PTE, representativa de pouco mais de 2% do


preço convencionado para o contrato prometido.


54. A prestação alegadamente incumprida respeitaria a uma parte do preço do prometido contrato de compra e venda sem qualquer repercussão no conjunto das obrigações estipuladas naquele em função do seu normal desenvolvimento e cumprimento da obrigação principal, relativamente à qual se apresenta com autonomia


55. Sendo assim uma daquelas obrigações em relação à quais, ante a mora do devedor, tem o credor recurso a todos os instrumentos de tutela do respetivo crédito, mas não foi constituído no direito de resolver o contrato bilateral.


56. Pois que tendo o alegado incumprimento de AA escassa importância à luz do disposto no artigo 802.º, n.º 2 do CC, é de concluir que atuação dos Réus, nessas circunstâncias excede manifestamente os ditames da boa fé, sendo abusiva e consequentemente ilegítima.


57. Sendo a resolução contratual levada a cabo por EE ilegítima e ineficaz para produzir os efeitos extintivos do contrato que, assim, se mantém na ordem jurídica, constituindo-se agora os Autores no direito à peticionada execução específica do contrato promessa.


Sem conceder,


58. Pois que também no caso sub judice estão preenchidos todos os requisitos do Instituto do enriquecimento sem causa


59. Pois que como decorre do princípio geral ínsito no citado artigo 473.º, n.º 1 do CC e na esteira de Pires de Lima e Antunes Varela a obrigação de restituição fundada no enriquecimento sem causa ou locupletamento à coisa alheia pressupõe a verificação cumulativa dos seguintes três requisitos: a verificação do enriquecimento de alguém, a carência de causa justificativa desse enriquecimento e ainda que o mesmo tenha sido obtido à custa de quem requer a restituição.


60. Dado que a lei não define tal conceito, e dada a natureza diversa da fonte de que pode emergir, tal significa que o enriquecimento injusto terá sempre que ser apreciado e aferido casuisticamente, interpretando e integrando a lei à luz dos factos apurados.


61. A obrigação de restituir pressupõe que o enriquecimento, contra o qual se reage, careça de causa justificativa, reconduzindo-se a ausência de causa justificativa do enriquecimento à constatação de que o enriquecimento nunca teve uma causa ou porque, tendo tido uma causa num momento inicial, a mesma deixou de existir.


62. Ou seja, e por outras palavras, o enriquecimento carecerá de causa sempre que o direito não o aprove ou consente, dado não existir uma relação ou um facto que, de acordo com as regras ou os princípios do nosso sistema jurídico, justifique a deslocação patrimonial ocorrida (a favor do enriquecido e à custa do empobrecimento de alguém), isto é, que legitime o enriquecimento.


63. A vantagem patrimonial obtida por alguém tem como contrapartida, em regra, uma perda ou empobrecimento efetivo de outrem, ou seja, ao enriquecimento de um corresponde o empobrecimento de outro, existindo entre esses dois efeitos uma “correlação, no sentido de que o facto ou factos que geram um geram também o outro.


64. Numa palavra, enquanto o património de um valoriza, aumenta ou deixa de diminuir, com o outro dá-se o inverso: desvaloriza, diminui ou deixa de aumentar.


65. Essa deslocação patrimonial, quando realizada, sem causa justificativa, obriga à restituição que tem por objecto o que for, indevidamente, recebido, ou o que for recebido, por virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou (art.º 473.º, n.º 2, do Cod. Civil)


66. Por sua vez, dispõe o art.º 474.º do Cod. Civil que “não há lugar à restituição por enriquecimento, quando a lei facultar ao empobrecido outro meio de ser indemnizado ou restituído, negar o direito à restituição ou atribuir outros efeitos ao enriquecimento”.


67. Será, pois, à luz de tais factos que terá de se apurar se estão ou não verificados os requisitos/e ou pressupostos legais do instituto do enriquecimento sem causa.


68. Aqui chegados, analisemos então o caso em apreço à luz de tais considerações e dos factos apurados.


69. De acordo com o MEMORIAL DO CLIENTE, junto à P.I., sob o número 2. o sinal foi de 100,000$00 (cem mil escudos).


70. De tal documento consta “Sendo o restante”, ou seja, a quantia restante entregue para pagamento do preço “a ser pago nas seguintes condições:


Sinal – 100.000$00


24 x 15.000$00= - 360.000$00


1 reforço a 3/Setembro/84 – 120.000$00


1 reforço a 3/Novembro/85 – 120.000$00.


Total = 700.000$00.”


71. Pelo que todos os outros pagamentos foram por conta do preço, conforme recibos comprovativos juntos aos Autos sob os documentos 3 a 15, dos quais consta riscado a expressão sinal e princípio de pagamento sendo acrescentado “prestação ou reforço”.


72. O que indicia que as partes consideraram tais valores, pagos a título de prestações do preço ou reforço do preço.


73. Deste modo e reclamando os Autores a restituição integral do preço e não apenas a restituição do sinal em singelo conforme equaciona a Sentença proferida.


74. pelo que bem andaram os Autores ao peticionar, aqui, a título subsidiário aquela quantia.


75. Por não ser de aplicar a ação judicial autónoma de restituição do sinal em singelo,


76. A qual entendem, ao contrário do Tribunal a quo, não ser a própria.


77. Este é o meio facultado pela lei aos empobrecidos.


78. Pois que choca com o comum sentimento de justiça que os Autores fiquem sem as parcelas e sem o preço que pagaram por elas.


79. E os Réus, ao invés, fiquem com a propriedade das parcelas e se locupletem ainda com o dinheiro pago por conta daquelas!


80. Tanto mais que podem aqueles, promitentes vendedores, revender o imóvel e, desta feita, obter lucro com essa superveniente negociação.


81. Pelo que, sem conceder, mesmo que decaíssem todos os outros pedidos formulados pelos Autores na P.I. sempre deveriam Réus, subsidiariamente, ser condenados a pagar aos Autores uma indemnização no valor de EUR 3.491,60 (três mil, quatrocentos e noventa e um euros e sessenta cêntimos) com a devida correção monetária á data atual, acrescida de juros à taxa legal, vencidos e vincendos, desde a citação até integral e efetivo pagamento, quantia correspondente ao locupletamento dos Réus, a título de enriquecimento sem causa.


Não foi apresentada resposta.


No tribunal recorrido foi proferido despacho que, depois de afirmar não estar em causa nulidade de sentença mas nulidade comum, indeferiu a nulidade invocada pelos recorrentes.


Nesta sede foi proferido despacho a colocar a possibilidade de a decisão ser condicionada pelos regimes relativos à divisão ou fraccionamento de prédios, possibilidade sobre a qual as partes se pronunciaram


Foi depois proferido novo despacho a colocar a possibilidade de existir um vício de forma no contrato-promessa celebrado, possibilidade que os recorrentes recusaram, apelando ao documento 2 que juntaram à PI.


II. Os recorrentes afirmam expressamente que o recurso versa apenas matéria de direito (afirmando, nas alegações e depois na conclusão, o seguinte: «Versando o presente Recurso, exclusivamente, sobre matéria de direito»).


Não obstante, em dois momentos parecem querer discutir a matéria de facto.


Assim, em primeiro lugar, quando discutem as cartas referidas em 20 dos factos provados, mormente quanto à sua assinatura, e à luz da circunstância de os recorrentes terem impugnado tais cartas, concluindo que as cartas «não podiam fazer a prova pretendida pelos Réus» (art. 22 das conclusões). Estas afirmações tendem a contrariar o teor do facto 20 (onde tais cartas são imputadas ao promitente-vendedor e tidas por recebidas pelo promitente-comprador). Ora, tendo os recorrentes restringido expressamente o recurso à matéria de direito, não estaria em causa verdadeira impugnação da decisão sobre a matéria de facto. De qualquer modo, e ainda que assim não fosse, tal impugnação teria que ser rejeitada por não cumprir integralmente os requisitos da impugnação, mormente por não se indicar em concreto a decisão que devia ser, proferida sobre a questão (art. 640º n.º1 al. c) do CPC).


Em segundo lugar, parecem também querer discutir a decisão sobre a matéria de facto quando afirmam que «devem ainda ser eliminados do elenco factual não provado os factos constantes dos artigos 2.º, 3.º, 4.º, 5.º e 6.º», reportando-se depois a meios de prova (documentos juntos aos autos). A afirmação é, em si, algo críptica, já que não faz sentido eliminar, sem mais, factos do elenco de factos não provados pois não têm para onde ir: ou estão não provados ou estão provados, e os recorrentes não afirmam que os pretendem ver tidos como provados, apenas os pretendem ver eliminados (o que não tem qualquer efeito útil: constarem do elenco de factos não provados ou serem pura e simplesmente eliminados nada altera). De qualquer modo, a referida restrição do recurso à matéria de direito contraria também esta aparente impugnação da decisão factual. Sem embargo, também aqui, a tratar-se de verdadeira impugnação factual, deveria ser rejeitada por incumprimento, designadamente, do aludido requisito (ónus) contante do art. 640º n.º1 al. c) do CPC. Para além de estarem em causa factos muito díspares, sem conexão entre si, o que exigiria também a menção de meios de prova concretos para cada um, o que os recorrentes também não fazem.


Deste modo, são estas questões que não relevam na avaliação a realizar.


III. O objecto do recurso determina-se pelas conclusões da alegação do recorrente (art. 635º n.º4 e 639º n.º1 do CPC), «só se devendo tomar conhecimento das questões que tenham sido suscitadas nas alegações e levadas às conclusões, a não ser que ocorra questão de apreciação oficiosa».


Assim, importa, aparentemente, avaliar:


- se ocorrem as nulidades processuais invocadas (por dispensa da audiência preparatória com preterição da prévia audição das partes sobre essa dispensa; e por omissão de fixação do objecto do litígio e dos temas da prova).


- se a resolução operada pelo falecido EE seria infundada.


- se os recorrentes têm direito a ver produzida a declaração negocial do promitente vendedor em falta, ou, subsidiariamente, a receber a prestação que indicam (mormente através do instituto do enriquecimento sem causa) - pretensão esta a avaliar à luz das questões oficiosamente suscitadas.


IV.1. De entre os factos provados consta que:


2. Em 03.09.1983, AA celebrou um contrato de promessa de compra e venda com EE, em que este foi o promitente vendedor e aquele o promitente comprador, e que teve como objeto a parcela 415 e a parcela 416, correspondentes a 795 avos indivisos do Casal do S..., atualmente Urbanização Casal do S... e Local 1;


2. O facto padece de uma irrecusável ambiguidade porquanto, em si, não contempla o esclarecimento sobre a circunstância de o contrato-promessa estar reduzido a escrito ou ser meramente verbal. Ao invés, o sentido literal do facto descrito contém em si as duas possibilidades. A descrição factual mostra-se, neste sentido, obscura por admitir duas possibilidades ou sentidos distintos, com relevo para o art. 662º n.º2 al. c) do CPC. Asserção que se manifesta a partir de outras circunstâncias. Assim: i. inexiste no processo qualquer documento que contenha, de forma imediata e segura, as declarações de vontade das partes no contrato, juntamente com as suas assinaturas - documento que deveria constituir a única forma de demonstrar a existência de um contrato-promessa formalizado (art. 364º do CC); ii. na própria sentença, em sede de fundamentação, o julgador afirma que não existia contrato escrito («Embora não haja contrato escrito», afirma-se ali); iii. na mesma sentença e fundamentação, vem também afirmado que aquele contrato está «espelhado na documentação junta aos autos equivalente ao memorial do cliente e aos recibos dos pagamentos efetuados por AA a EE, junta com a petição inicial; e das cartas datadas de 10.01.1990 e de 24.09.1922, juntas com a contestação». Esta segunda afirmação ajusta-se à anterior pois afirmar que o contrato-promessa se espelha nos aludidos documentos significa apenas que os documentos se justificam por existir aquele contrato, que assim o espelhavam (dando dele uma imagem), mas não o consubstanciavam ou constituíam (antes o pressupunham).


Assim, persiste a ambiguidade assinalada à descrição factual. Esta obscuridade permite que este tribunal aprecie oficiosamente a decisão sobre a matéria de facto, devendo anular a decisão, salvo se o processo contiver os elementos probatórios que permitam a sua reavaliação (citado art. 662º n.º2 al. c) do CPC). É esta segunda a hipótese que se julga ocorrer.


Com efeito, os recorrentes alegaram a existência de um contrato-promessa de compra e venda (art. 2º da PI [2]), sustentando-o especificamente no documento 2 junto com a PI. Esta posição foi depois reafirmado quando, nesta sede, foram notificados para se pronunciarem sobre a questão da forma do contrato-promessa. Os recorridos, impugnando aquele art. 2º, afirmaram que existia um contrato-promessa mas que este não foi formalizado (logo, seria verbal). A existência do contrato-promessa é assim admitida pelas partes, divergindo estas contudo quanto à sua formalização. Nesta parte, os recorrentes fazem, como se disse, radicar a documentação formal da promessa apenas naquele documento 2 junto com a PI, o que significa que, a não ser o contrato-promessa suportado por tal documento, teria sido meramente verbal. Ora, aquele documento não constitui um contrato-promessa. Trata-se de um mero documento administrativo, identificando o cliente e o objecto da transacção com o cliente, e não um documento depositário das vontades negociais relevantes (notando-se que não se vê por que interviria no documento, a constituir ele o contrato-promessa, um II, e por que do documento não constaria a assinatura do promitente vendedor, como se constata a partir da comparação das assinaturas nele constante com as assinaturas dos recibos juntos a seguir àquele documento). Trata-se apenas de um documento narrativo ou descritivo, e não de um documento dispositivo. Tanto assim que o seu teor nem permite estabelecer quem intervém como suposto vendedor na transacção (só refere o nome do cliente, adquirente) e, no caso de configurar um contrato, de que modo estavam as partes a vincular-se (nomeadamente se estavam a vincular-se a uma transacção ou estavam a prometer essa transacção [3]). Não constituindo aquele documento um contrato-promessa, segue-se então que o contrato-promessa, em cuja existência as partes acordam, teria natureza verbal. Sendo também seguro que, no que à forma concerne, nem as cartas, nem os recibos servem para superar a falta de forma [4].


Assim, deve alterar-se a redacção daquele facto para que passe a constar que o acordo foi apenas verbal.


V. Deste modo, os factos relevantes, atendendo aos que foram considerados provados [5], com a alteração agora determinada, são os seguintes:


1. AA, faleceu no dia ........2015, tendo-lhe sucedido a sua mulher BB e os seus dois filhos DD e CC, ora Autores;


2. Em 03.09.1983, foi celebrado verbalmente um contrato de promessa de compra e venda entre AA e EE, em que este foi o promitente vendedor e aquele o promitente comprador, e que teve como objeto a parcela 415 e a parcela 416, correspondentes a 795 avos indivisos do Casal do S..., atualmente Urbanização Casal do S... e Local 1;


3. Foi acordado que o preço das referidas parcelas era de PTE 700.000$00, correspondente a 3.491,60 euros;


4. O falecido liquidou as seguintes quantias:

- Sinal e princípio de pagamento, em 03.09.1983 PTE 100.000$00,

- 23 prestações de PTE 15.000$00, com início em 25.10.1983, com início em 25.10.1983, totalizando PTE 345.000$00,

- 1.º Reforço de PTE 120.000$00, em 03.09.1984,

- 2.º Reforço de PTE 120.000$00, em 03.11.1985;

5. AA interpelou EE para a marcação da escritura de compra e venda das mencionadas parcelas de terreno em avos rústicas;


6. Os Réus [6] solicitaram à Câmara Municipal de Sesimbra, um pedido de informação a fim de recolher elementos sobre os aludidos imóveis;


7. Em resposta veio Município de Sesimbra remeter o Parecer n.º 16164 de 04.11.2016, segundo o qual a Parcela 415 é parte do prédio 4681/Local 1, com a matriz predial artigo 194 da Secção AB – Espaço Industrial;


8. E segundo o qual a parcela 416 é parte do prédio 4682/Local 1, matriz predial artigo 193 da secção AB – Espaço Industrial;


9. Não existe qualquer processo de loteamento;


10. Continuam a ser titulares das referidas parcelas em avos rústicas “EE – Cabeça de casal da Herança de”;


11. Tais parcelas dos prédios rústicos encontram-se inscritos a favor de GG e FF na qualidade de herdeiros de EE;


12. Em 10 de abril de 2019 sobre tais imóveis foi constituída hipoteca voluntária do acordo global de reestruturação da dívida a favor do Banco Santander Totta, S.A., NIPC ..., por FF e GG, os quais entreviram por si e na qualidade de herdeiros de EE e as sociedades descritas na certidão permanente do registo predial, para segurança do montante máximo de 138.611.221,38 €;


13.Tratando-se de um reforço da garantia hipotecária titulada por escritura de 28/12/2012 no cartório de Lisboa do Notário JJ, para segurança das obrigações de correntes de contrato de financiamento seus aditamentos e acordos posteriores;


14. Mediante notificação judicial avulsa da herança de EE e de todos os herdeiros foram os Réus notificados para procederem a marcação da escritura publica de compra e venda no prazo de 45 dias a contar da respetiva notificação, da parcela 415 e da parcela 416 correspondentes a 795 avos indivisos da urbanização Local 1, onde se escreveu, ainda, que deviam os Notificados notificar os Requerentes e as suas Mandatárias, por carta registada com aviso de receção, com uma antecedência mínima de 15 dias, informando-os do cartório notarial, do dia e da hora da escritura de compra e venda;


15. As notificações referidas foram efetuadas nas pessoas de KK e FF e GG, em 19.07.2019;


16. Até à presente data ficou por marcar a escritura pública de compra e venda das parcelas prometidas vender;


17. O preço acordado de 700.000$00 PTE deveria ser pago até 03.11.1985;


18. AA não liquidou uma das referidas prestações no valor de PTE 15.000$00;


19. Havia entregue cheque a EE para efetuar o pagamento desse valor de PTE 15.000$00, com data de 25.08.1985, o qual veio devolvido por falta de provisão;


20. Perante a existência da dívida de 15.000$00 quanto ao preço acordado, que deveria ter sido paga antes da outorga da escritura pública de compra e venda, EE remeteu a AA, duas cartas, em 10.01.1990 e 24.09.1992., a resolver o referido contrato de promessa de compra e venda.


[As cartas tinham o seguinte teor:


Carta de 10.01.90:


Exmo. Senhor Dr.,


Reporto-me à prezada carta de V. Exa. datada de 24.11.89, respeitante ao assunto em epígrafe, a qual mereceu a m/ melhor atenção.


Em resposta, renovo o teor da m/ de 7.11.89, reafirmando que o cliente de V. Exa. não cumpriu o que se obrigou, designadamente quanto ao pagamento dos lotes, pelo que considero resolvido o contrato, o que lhe comunico para todos os efeitos legais.


Todavia, ainda que a tal não me sinta obrigado, estou na disposição de restituir em singelo todas as importâncias entregues se para tanto o cliente de V. Exa. as vier receber nos m/ escritórios no prazo de 30 dias.


Carta de 24.09.92:


Exº. Senhor (a)


É V. xª. Titular de um contrato promessa de compra e venda referente ao lote em epigrafe referenciado.


Tal contrato não foi cumprido por V. Exª. Por falta de pagamento do preço devido nas condições contratuais acordadas.


Deverá assim a partir desta data considerar o referido contrato rescindido.] [7]


E foram considerados não provados os seguintes factos:


1. AA comprou a EE as referidas parcelas de terreno;


2. Os Réus iam informando de que a documentação necessária à outorga das escrituras de compra e venda ainda não se encontrava agendada porquanto ainda não se encontravam reunidas as condições por parte dos réus;


3. AA foi aceitando as explicações por parte dos Réus e a demora na marcação;


4. Em data não determinada, vieram os Réus solicitar comprovativos dos pagamentos efetuados pelo falecido, tendo este solicitado ao Banco Português do Atlântico, S.A. extratos comprovativos dos mesmos, tendo depois o Autor remetido aos Réus os comprovativos daqueles pagamentos;


5. Os Autores após deslocação ao escritório dos Réus, em 7.11.2002, a fim de saber notícias sobre o assunto, foi-lhe solicitada nova prova dos pagamentos realizados, o que o Autor fez;


6. Em 27.11.2002, o Autor interpelou novamente os Réus, por carta registada com aviso de receção, para procederem à marcação da escritura de compra e venda das duas parcelas de terreno prometidas vender.


VI.1. Os recorrentes começam por invocar nulidade assente na circunstância de ter sido dispensada a realização da audiência prévia sem que as partes tivessem sido previamente ouvidas sobre essa dispensa. A questão, embora nem sempre com estes contornos, tem sido associada a um vício da decisão final (em termos análogos à decisão-surpresa). Poderia, nessa linha, ser invocada em recurso e conhecida nesta sede.


De acordo com o art. 593º n.º1 (e 591º n.º1 al. d), e) e f), para que remete) do CPC, a audiência pode ser dispensada quando se verifiquem dois pressupostos:


i. a acção deva prosseguir, e


ii. a audiência prévia se destine à prolação de despacho saneador, de despacho relativo ao objecto do litígio e aos temas da prova ou de despacho de simplificação ou agilização do processo.


Ao contrário, a sua realização será obrigatória se a acção dever terminar naquela fase [8] ou se visar a realização de alguma das finalidades previstas nas al. a) a c) do n.º1 do art. 591º do CPC. O art. 593º n.º1 al. d) do CPC deixa claro que o agendamento da audiência de julgamento é compatível com a dispensa da audiência prévia (ou seja, não torna obrigatória esta audiência).


Os recorrentes não discutem o carácter dispensável da audiência prévia, no caso, entendendo antes que essa dispensa, constituindo um acto de gestão processual, exigia a prévia audição das partes, omitida, omissão esta que por sua vez viciava a decisão de dispensa.


Esta decisão de dispensa da audiência prévia (em si não discutida) constitui, na verdade, «um acto de adequação formal, já que deve ter em conta as especificidades da causa» [9], sendo aquela adequação aspecto instrumental da gestão processual (T. de Sousa). Mas trata-se de acto de adequação legalmente previsto, onde a cláusula geral é concretizada pelo próprio regime processual, em termos que tornam a intervenção adequadora antecipável e previsível. A adequação formal é, neste caso, uma faculdade discricionária atribuída ao juiz. Além disso, a dispensa só pode ocorrer em situações legalmente balizadas, e com menor potencial intrusivo na esfera das partes, dado o âmbito restrito da previsão legal. O que desvaloriza a necessidade da audição prévia. Assim, a dispensa insere-se de modo racional na tramitação da acção, sem necessidade de suscitar a discussão prévia da sua dispensa. Donde que o legislador não tenha previsto essa prévia discussão sobre a oportunidade da dispensa da audiência prévia, por essa dispensa, limitada, ser mera expressão do regime legal criado.


Acresce que este regime (de dispensa facultativa da audiência prévia) assenta em razões de celeridade e simplificação (flexibilização e eficiência, com potencial economia), pelo que a imposição da audição prévia iria contrariar ou neutralizar a celeridade e simplificação pressuposta.


Por fim, mas de modo determinante, a audição prévia mostra-se desnecessária porque o legislador acautelou a posição das partes atribuindo-lhes a faculdade potestativa de provocarem a realização da audiência prévia para deduzirem reclamações, nos termos do art. 593º n.º3 do CPC (admitindo-se que possam também exercer a faculdade prevista no art. 598º do CPC [10]). Assim, a decisão de dispensa fica sujeita a ratificação ou oposição (conforme as partes usem ou não a faculdade em causa), assim se manifestando a tutela da sua posição. E como se trata de faculdade potestativa, que o juiz não pode avaliar ou contrariar, tal constitui uma forma de autotutela muito mais forte e eficaz que a audição prévia, por atribuir às partes o poder de provocar uma realização da audiência que a audição prévia apenas podia influenciar. Impor uma audição prévia invertia a ordem legal criada (pois alterava o momento próprio para a parte formular um juízo sobre a necessidade ou não de realizar a audiência prévia), contrariava a celeridade e flexibilização visadas (pois impunha um acto adicional que, por não ser a pronúncia vinculativa para o tribunal, podia nada alcançar [11], e cuja finalidade é melhor garantida pela faculdade potestativa concedida), e seria redundante face à faculdade potestativa pois esta alcança necessariamente um efeito que aquela audição não garantia (a realização da audiência prévia, se isso for do interesse da parte). É, assim, também por esta via que a parte exerce o controlo sobre a dispensa da audiência prévia e sobre o concreto exercício da forma de adequação formal exercida.


Asserção que a eventual necessidade de exercício prévio do contraditório não prejudica quer porque esse exercício, não sendo a questão necessitada de contraditório decidida no despacho saneador (como é o caso), pode ser relegado para a audiência final (art. 3º n.º4, in fine, do CPC), quer porque, a ser ali conhecida tal questão, ainda assim «não há nenhuma incompatibilidade entre a dispensa da audiência prévia e a necessidade de audição prévia das partes. O tribunal dispensa a audiência prévia, mas, como só pode conhecer no despacho saneador de uma excepção não debatida pelas partes depois de lhes dar a possibilidade de se pronunciarem (cf. art. 3.º, n.º 3, nCPC), manda ouvir previamente as partes.» (T. de Sousa). Ou seja, o exercício do contraditório nada acrescenta à discussão (e a sua eventual violação constitui, obviamente, questão autónoma).


A questão apresenta contornos diferentes no âmbito da realização obrigatória (i. é, legalmente imposta) da audiência prévia, quando se admita a sua dispensa ao abrigo da adequação formal (art. 547º do CPC) [12]. Neste caso, a audição prévia das partes radica, de um lado, no carácter inovatório da dispensa face ao regime legal (que não a previa), e por isso assenta na necessidade de evitar que a alteração da forma legal possa surgir como uma decisão-surpresa [13]. E, de outro lado e como consequência do carácter autónomo da alteração dos trâmites legais (não directamente prevista na lei processual), por aquela dispensa não ser, em rigor, acompanhada de qualquer mecanismo de (auto)tutela da posição das partes (embora, em regra, mesmo aqui se tenda a reconhecer relevo ao vício apenas quando a omissão da audiência prévia se reflicta em decisão proferida). O que não vale na situação vertente, tendendo a revelar a falta de fundamento para impor a audição prévia neste caso.


Nota-se também que é esta questão que fica a montante do modo como é depois cumprido, ou não, o disposto no art. 593º n.º2 do CPC, e é examinada autonomamente face ao cumprimento, ou não, dessa previsão legal, por depender de requisitos e razões próprias. O eventual incumprimento do regime daquele art. 593º n.º2 do CPC é questão posterior e independente.


Donde não ser exigível aquela audição prévia, inexistindo o vício imputado.


2. Os recorrentes invocam ainda a existência de nulidade por o despacho saneador ser omisso quanto ao conteúdo do objecto do litígio e dos temas da prova.


Verifica-se, com efeito, que não foi proferido despacho a definir o objecto do litigio e a enunciar os temas da prova, como previsto pelos art. 593º n.º2 al. c) e 596º n.º1 do CPC.


Cabe, preliminarmente, esclarecer que o despacho saneador tem autonomia face ao despacho que fixa aquele objecto do litígio e enuncia os temas da prova. Constituem ambos figuras autónomas, com objectos diversos e sujeitos a regras próprias (que definem a sua estrutura e finalidades distintas). Tal deriva claramente da lei processual, em particular dos art. 595º n.º1 e 596º n.º1 do CPC quando definem o objecto e alcance de cada um daqueles despachos, distinção já patente nos art. 591º n.º1 al. d) e f) e 593º n.º2 al. a) e c) do CPC - resultando ainda daquele art. 596º n.º1 do CPC que o despacho que identifica o objecto do litígio e enuncia os temas da prova só é proferido depois de proferido o despacho saneador, estabelecendo uma relação sequencial que também revela a autonomia recíproca daqueles despachos. Isto significa que a omissão diagnosticada não corresponde a uma falha do despacho saneador (a um vício intrínseco deste, a uma falha cometida por esta decisão judicial) mas à falta de um acto processual autónomo, um acto processual que seria legalmente imposto (referidos art. 593º n.º2 al. c) e 596º n.º1 do CPC) e que não foi praticado.


Este enquadramento da situação permite dar por verificada a primeira parte do disposto no art. 195º n.º1 do CPC, quanto à omissão de acto que a lei prescreva, assim se indiciando a existência de nulidade processual (indiciar porquanto à existência da nulidade importaria ainda que, na falta de outra regra legal expressa, a omissão pudesse influir no exame ou na decisão da causa).


A sua invocação, não pode, porém, ser acolhida nesta sede.


Com efeito, estando em causa uma nulidade processual, nos termos do art. 195º n.º1 do CPC, por o tribunal ter omitido um acto devido, cabia à parte invocar a nulidade perante o tribunal (reclamar), e fazê-lo no prazo de 10 dias após a notificação que lhe foi feita do despacho saneador e do despacho a agendar e programar a audiência final, por ao menos nessa altura passar a ter conhecimento da omissão cometida (art. 197º n.º1, 199º n.º1 e 149º n.º1 do CPC)


Já não poderia invocar a nulidade nesta sede pois as nulidades processuais não podem ser, em princípio [14], invocadas no recurso da decisão final. Com efeito, como a avaliação do tribunal de recurso incide sobre decisões, que são impugnadas, e não sobre actos processuais, aquele tribunal só pode apreciar a decisão que o tribunal inferior haja proferido sobre a arguição da nulidade; não pode ocupar-se directamente, e em primeira via, da nulidade cometida (A. dos Reis). Assim, «o tribunal de recurso não tem competência (funcional) para apreciar, em primeira instância, esse vício, porque o meio de impugnação adequado de qualquer nulidade processual é, sempre e apenas, a reclamação para o próprio tribunal do processo» (T. de Sousa). E não importa que o acto omitido seja uma decisão judicial (um despacho) pois o que continua a faltar é um acto processual devido (o despacho é, neste caso, encarado como elemento da tramitação e não como acto decisório) e o acto em falta nem pode ser objecto de impugnação/recurso (enquanto acto decisório) por justamente não existir. Só poderá não ser assim quando a nulidade seja incorporada ou coberta por uma decisão judicial (caso em que não se reclama da nulidade mas se impugna, através do recurso, a decisão viciada). Mas não é esse o caso, dada a autonomia da omissão verificada, não coberta por nenhuma decisão judicial. Haveria, assim, que invocar a nulidade (reclamação) e impugnar, em recurso, a decisão que a desatendesse (se tal fosse admissível, nos termos do art. 630º n.º2 do CPC). A invocação do vício perante o tribunal recorrido seria, aliás, a única forma de respeitar o referido prazo legal de invocação da nulidade. Donde não se poder conhecer nesta sede aquela nulidade.


Donde não poder proceder a invocação.


3. Estando aceites as heranças invocadas, como deriva da posição dos herdeiros (que aceitam essa qualidade), partes na acção são os herdeiros e não as heranças, ainda que se integrem nas heranças as posições contratuais discutidas (art. 12º al. a) do CPC, a contrario), assim se entendendo a identificação das partes. De modo análogo, partes nos contratos são, por força das regras sucessórias, os herdeiros (na medida em que ingressam na titularidade da posição jurídica do de cujus, passam a ser eles partes nos contratos), podendo as vicissitudes do incumprimento ser discutidas quer face à conduta das partes originais, quer dos seus sucessores [15]. Anotando-se ainda que, por facilidade de exposição, se tenderão a reportar direitos, deveres e factos aos recorrentes e recorridos, atendendo à sua posição global e sem diferenciar os actos dos de cujus e dos seus sucessores, embora levando em conta a diferenciação prática subjacente.


4. Os recorrentes alegaram a existência de um contrato-promessa de compra e venda (art. 2º [16]), sustentando-o especificamente no documento 2 junto com a PI. Os recorridos, impugnando aquele art. 2º, afirmaram que existia um contrato-promessa mas que este não foi formalizado.


A sentença recorrida afirma, em 2 dos factos provados, que «Em 03.09.1983, AA celebrou um contrato de promessa de compra e venda com EE [..].». Da singela descrição factual não deriva de forma clara que tal acordo de vontades seria verbal ou que estaria formalizado. Da fundamentação da sentença decorre, contudo, de forma expressa e manifesta, que o tribunal considerou que não existia um contrato escrito («Embora não haja contrato escrito», afirma-se). Tal asserção encontra coerência no facto de não ter sido junto ao processo qualquer documento que correspondesse ao contrato-promessa (única forma de demonstrar, em regra, a sua existência: art. 364º do CC). É certo que a sentença, na sua fundamentação, também afirma que aquele contrato está «espelhado na documentação junta aos autos equivalente ao memorial do cliente e aos recibos dos pagamentos efetuados por AA a EE, junta com a petição inicial; e das cartas datadas de 10.01.1990 e de 24.09.1922, juntas com a contestação». Mas tal não significa que a sentença tivesse considerado tais documentos como corporizando o contrato-promessa mas, ao invés, que tal contrato, prévio aos documentos e autónomo face a eles, neles se reflectia: sendo os documentos justificados por aquele contrato, espelhavam-no (dando dele uma imagem), mas não o consubstanciavam ou constituíam. O espelho apenas fornece uma imagem do original. O que mais se acentua pela natureza dos documentos, sendo seguro que nem as cartas, nem os recibos servem para superar a falta de forma [17]. E o mesmo vale para o documento 2, que constitui um mero documento identificativo do cliente e do objecto da transacção com o cliente, e não um documento depositário das vontades negociais relevantes (sendo, aliás, ignorada a autoria das três assinaturas que dele constam, notando-se ainda que não se vê porque interviria no documento, a constituir ele o contrato-promessa, um II, e porque do documento não constaria a assinatura do promitente vendedor, como se constata a partir da comparação com as assinaturas dos recibos juntos a seguir àquele documento). Trata-se apenas de um documento narrativo ou descritivo, e não de um documento dispositivo. Tanto assim que o seu teor nem permite estabelecer quem intervém na transacção (só refere o nome do cliente) e se, no caso de configurar um contrato, de que modo estavam as partes a vincular-se (nomeadamente se estavam a vincular-se a uma transacção ou estavam a prometer essa transacção [18]). Aliás, o facto de a sentença agregar todos os documentos, tratando-os a todos por igual, também concorre para revelar de um lado, que nenhum dos documentos foi tido, por si, como corporizando o contrato-promessa, e, de outro lado, que em conjunto eram apenas expressão do contrato-promessa, que eram documentos derivados de um contrato-promessa não formalizado, e que assim o espelhavam (dele davam uma imagem), e não a sua formalização.


Donde se dever considerar que a sentença recorrida considerou que o contrato-promessa não foi formalizado, ou seja, reduzido a escrito, assim se entendendo o correspondente facto dado como provado.


5. Nota-se, embora em assumido obiter dictum, que a solução final seria a mesma caso houvesse que avaliar a descrição factual por outra via. Com efeito, do teor do referido facto dado como provado em 2 nunca poderia ser possível concluir pela existência, só por si, de um contrato formalizado pois a descrição factual omite essa circunstância, sendo que se não encontra no processo documento que, de forma directa e clara, corporize um contrato-promessa. E, em rigor e como se admitiu, tal facto também omite igualmente a menção à falta de forma (à natureza oral do contrato). Como se viu, a fundamentação usada na sentença é claramente hostil à afirmação de que tal facto sustenta a existência de documento que corporize o contrato-promessa. Ao invés, revela o contrário. Mas ainda que assim se não entendesse, o que existiria seria, no máximo, uma situação de dúvida sobre o alcance daquele facto, no que à forma respeita. Dúvida que se traduzia em deficiência da decisão sobre a matéria de facto, conducente à sua alteração nesta sede por apelo à prova produzida, a qual permitia tal alteração e já que estaria em causa exclusivamente a avaliação da prova documental (art. 662º n.º2 al. c) do CPC e o referido art. 364º do CC). O que levaria a alterar a decisão sobre a matéria de facto no sentido da afirmação da natureza verbal do contrato-promessa (não reduzido a escrito), já que, como exposto, os documentos juntos ao processo não o sustentam.


6. Assim, parte-se da constatação de um contrato-promessa de compra e venda relativo a imóvel não formalizado.


À data, o contrato-promessa em causa devia ser reduzido a escrito, por força do disposto nos art. 410º n.º2, 875º e 220º do CC, e art. 89º al. a) do Cód. do Notariado (aprovado pelo DL 47619, de 31.03.1967, em vigor à data do acordo, e assim a ele aplicável - art. 12º n.º2, 1ª parte, do CC).


O que conduz à constatação da nulidade do contrato-promessa, por vício de forma (art. 220º do CC), vício este de conhecimento oficioso (art. 286º do CC).


7. Admite-se, de forma dominante (embora ainda não pacífica), que este vício formal pode ser superado em situações particulares, conduzindo à inalegabilidade da nulidade para proteger uma das partes do negócio, com base eminentemente no abuso de direito (como modalidade de exercício inadmissível de posições jurídicas). Sendo que este abuso, justamente porque constitui forma de protecção de uma das partes (a parte confiante), importa que, verificada a existência daquele abuso de direito, apenas esta parte possa invocar o vício (a causa de nulidade) e, assim, também implica que o vício (a nulidade) não possa ser oficiosamente conhecida. No fundo, a inalegabilidade equivale ao bloqueio da invocação da nulidade, bloqueio válido mesmo perante o tribunal, com o inerente efeito do aproveitamento do negócio jurídico.


No caso, nenhuma das partes invocou esta inalegabilidade, ou melhor, o abuso de direito subjacente. Esta falta de invocação constitui logo um indício sério de que as próprias partes não vislumbram no caso uma situação por aquele abuso coberta. Em certo sentido, a invocação do abuso de direito pela parte confiante torna-se crucial, nestes caso, para sinalizar que essa parte se encontra numa posição de extrema indefesa, ponto de partida do abuso de direito nestas situações. Esta afirmação não vale, porém, em termos absolutos, porquanto o abuso de direito (na solução dominante, a que se adere) pode ser conhecido oficiosamente, e por isso sempre poderia o tribunal aferi-lo se as circunstâncias apuradas o sustentassem [19]. Mas não se crê que tal abuso possa ser discernível no caso (e assim oficiosamente o ajuizar).


O abuso de direito nestas situações tende a manifestar-se essencialmente em dois grupos de situações.


De um lado, ocorre nas situações em que uma das partes manipula a outra quanto ao vício (convencendo-a de que a forma não é necessária ou de que não irá invocar o vício), vindo posteriormente a invocar a nulidade correspondente à falta de forma. Aqui, intervém uma conduta dolosa de uma das partes, logo por isso violadora do princípio da boa fé, e subsequentemente uma actuação contraditória (venire contra factum proprio), esta atentatória do princípio da confiança [20]. Os factos apurados não permitem discernir este tipo de situação por parte de alguma das partes.


De outro lado, também surge nas situações em que a nulidade não é invocada por uma das partes, a qual, sem manipular de forma directa a representação da situação pela contra-parte, passa a implementar o programa contratual, como se válido fosse, passando a outra parte, a partir de tal conduta, a confiar em que o vício não será invocado e o contrato será cumprido, sendo depois surpreendida pela invocação extemporânea da nulidade. Aqui, a situação tende a envolver logo um comportamento contraditório, e a inerente tutela da confiança, ainda que a boa fé surja também como intermediária. Mas também esta situação não se mostra suportada pelos factos apurados.


Deve atender-se, com efeito, a que a inalegabilidade formal tem como pano de fundo o desrespeito pelas regras reguladoras da forma, as quais são instituídas também por razões de interesse público (mormente segurança e certeza do comércio jurídico [21]), e regras de que as partes não podem prescindir (aí radica, aliás, a principal objecção à admissão da figura da inalegabilidade). Dado que a exigência de forma escrita para o contrato-promessa é derivada da exigência de forma legal para o contrato prometido, tal significa que as razões determinantes da forma do contrato definitivo são as mesmas que justificam a redução a escrito do contrato-promessa [22]. O que este pano de fundo dita é que tal inalegabilidade, que se admite poder valer, só pode funcionar perante circunstâncias excepcionais ou extremas [23], por o abuso de direito não poder, como regra, servir para subverter regras imperativas (não podendo funcionar como «instrumento de convalidação de negócios inválidos»). Donde, por isso, que só em situações-limite se deve aceitar que a ordem jurídica tolere o desrespeito das regras formais imperativas editadas.


E por isso que se afirme, no que ao caso especialmente respeita, que devem verificar-se os requisitos comuns da tutela da confiança, a saber a situação de confiança, a justificação da confiança, a imputação (dominantemente tida por objectiva [24]) da confiança (ao responsável pela situação) e o investimento da confiança. Mas também que a estes requisitos devem acrescer outros, exigindo-se que ocorra também um investimento da confiança sensível, muito relevante, e investimento dificilmente assegurado por outra via, e que a imputação da situação de confiança ao contraente a responsabilizar se efectue também a título de culpa (assente num juízo de censura) [25].


Ora, no caso, a forma como a acção (a alegação) vem construída torna inviável a verificação cumulativa destes requisitos. Assim, começa por se ignorar em quem radica a falta de forma. Quanto à situação de confiança, em que tende a exigir-se que a parte necessitada de protecção ignorasse a exigência de forma (ou fosse confundida pela sua confiança na outra parte), inexistem elementos relevantes. Do mesmo modo, inexiste parte em relação à qual se possa falar de imputação (objectiva e subjectiva) da confiança. Aliás, inexistem dados caracterizadores da justificação da confiança. E também não existe realmente investimento da confiança com reflexos duradouros e envolvendo situações irreversíveis ou dificilmente recuperáveis, por qualquer das partes. Ao invés, apenas existem os normais pagamentos antecipados (sinal), sem mais, associados a um (muito) longo período de tempo em que a situação se manteve (se manteve a «vigência» [26] do contrato-promessa). Este longo período de tempo impressiona mas releva mais da inércia do que da confiança na validade do contrato-promessa, inércia que se manifesta também no facto de inexistir investimento, pessoal ou material, que tenha um significado relevante e não seja apto a ser removido (ou a ser removido sem prejuízos muito relevantes) se ocorrer a destruição do negócio. Tudo o que existe é uma longa manutenção de uma situação essencialmente estática, em que a única actuação derivada do programa contratual se analisa nos pagamentos do sinal, de pouca expressão e facilmente reversíveis.


A situação não tem, pois, relevo que possa justificar o funcionamento do abuso de direito.


8. Acertada a nulidade formal do contrato-promessa, cabe avaliar os seus efeitos no quadro da acção. Por força do art. 289º n.º1 do CC, a declaração de nulidade tem efeito retroactivo, devendo ser devolvido tudo o que foi prestado. Tal equivale, no caso, a reconhecer que os recorrentes têm direito a receber os valores que pagaram.


Ponto onde relevam os termos do Assento 4/95 (STJ), hoje com valor de AUJ, que decidiu que «quando o tribunal conhecer da nulidade do negócio jurídico invocado no pressuposto da sua validade, e se na acção tiverem sido fixados os necessários factos materiais, devem retirar-se as consequências da invalidade do contrato» (In DR I-A de 17.05.1995).


A solução deste Assento/AUJ continua válida porquanto os princípios gerais e as regras legais específicas (especialmente atinentes ao princípio do pedido, mormente o art. 609º n.º1 do CPC) permanecem idênticas [27].


Pese embora sem afirmação expressa, aquele Assento/AUJ pressupunha que tivesse sido formulado um pedido equivalente à restituição que a declaração de nulidade impunha (assim, por exemplo, quando afirma que «já que, válido ou nulo o negócio, sempre ele seria obrigado ao que lhe é pedido») [28]. Tal ocorre no caso, em que os recorrentes formularam um pedido de restituição dos valores entregues, embora com base em diferente causa de pedir - circunstância indiferente pois o que aquele Assento/AUJ consagra é, justamente, o aproveitamento do pedido apesar da modificação da causa de pedir (o que se autorizava era «decretar o efeito prático-jurídico que foi solicitado, ainda que sob diferente qualificação jurídica») [29].


De outro lado, a solução do Assento/AUJ fica condicionada à existência dos «factos materiais» necessários, menção que, apesar de pouco clara, tem sido reportada aos elementos necessários à fixação da obrigação de restituição. Requisito este que não suscita dificuldades quando, como no caso, estão em causa prestações pecuniárias.


Deve, pois, admitir-se a aplicação do assento/AUJ ao caso, conduzindo à condenação dos recorridos (na qualidade em que intervêm, pois se trata de dívida da herança e não dos próprios demandados) no pagamento restitutivo do valor que receberam a título de sinal.


9. A pretensão dos recorrentes à restituição do valor entregue (embora com base no enriquecimento sem causa) vem acompanhada de duas pretensões adicionais atinentes à actualização monetária do valor em causa e ao pagamento de juros de mora. Pretensões estas que são igualmente associadas à obrigação de restituição derivada da nulidade (art. 289º n.º1 do CC), a propósito da qual também são discutidas, podendo e devendo por isso ser nesta sede consideradas.


Ponto onde se salienta que a questão se deve resolver perante o regime específico da nulidade, derivado do art. 289º do CC, sem apelo às regras do enriquecimento sem causa, por se considerar, no que se tem por posição claramente dominante na doutrina [30] e praticamente unânime na jurisprudência, que o citado art. 289º n.º1 do CC contém um regime específico de liquidação da relação inválida, assente numa regulação própria (a qual impõe a devolução do que foi prestado, sem mais, enquanto o enriquecimento sem causa impõe a restituição do que foi prestado, mas apenas na medida em que constitua um enriquecimento, pressupondo assim uma avaliação dos efeitos da deslocação patrimonial no património do obrigado à restituição, avaliação esta que o dever de restituição assente na invalidade dispensa), o que, conjugadamente com a subsidiariedade do enriquecimento sem causa (art. 474º do CC) e a remissão do regime da invalidade para regime (art. 1269º e ss. do CC) não reconduzível ao enriquecimento sem causa, exclui a operatividade deste instituto (outros argumentos são mobilizáveis, mormente históricos, mas a economia da decisão não justifica discussão adicional).


10. No que à actualização concerne, verifica-se alguma divergência no tratamento da obrigação de restituição fundada na nulidade [em discussão paralela, aliás, à que ocorre no âmbito da resolução, em que também ocorre uma relação de liquidação e o regime da nulidade é invocado pelo art. 433º do CC]. No caso, a questão só se coloca quanto às prestações pecuniárias realizadas, tidas por sinal (art. 441º do CC), ainda que notoriamente vistas como antecipação do preço (já que a soma dos sinais convencionados equivale ao preço acordado).


O art. 289º n.º1 do CC determina que a nulidade tem efeito retroactivo, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente. Visa-se, deste modo, repor a situação que existiria no momento da celebração do negócio inválido se este não tivesse sido celebrado. É neste sentido que se fala numa relação de liquidação, em que se procura apagar a relação negocial (que deixou de valer por força da invalidade e da retroactividade desta), através da imposição de obrigações de restituição, obrigações estas de origem legal e já não convencional. Esta restituição teria, num plano normativo e ideal, o dom de repor tudo no estado original, como se o negócio nunca tivesse existido.


Naturalmente, esta idealidade nem sempre se compagina com a realidade (a qual cria discrepâncias, mormente em períodos de acentuada inflação), tendo começado por se suscitar a questão da determinação do valor da coisa prestada quando a devolução da coisa em si (em espécie) não era possível (se deveria ser devolvido o valor da coisa na data da celebração do negócio, ou na data do cumprimento da obrigação de entrega, ou se esse valor deveria ser actualizado, atendendo-se assim ao valor na data da devolução). A discussão alargou-se, depois, à devolução do preço [31], em termos paralelos (se o preço deveria ser, ou não, objecto de actualização), persistindo acentuada divergência doutrinal, reveladora quer da natureza dúctil e sensível da questão, quer da existência de argumentos válidos mobilizáveis por cada uma das soluções. Cabendo tomar posição, em função das circunstâncias concretas do caso, entende-se que o dever de restituição do valor dos sinais (para os quais a questão se coloca nos mesmos termos em que vale para o preço) não pode ser, em princípio (ou ao menos no caso presente), objecto de actualização, no quadro do art. 289º do CC, atendendo essencialmente às seguintes razões:


- o regime derivado da invalidade é dotado de autonomia e circularidade. É nele, portanto, que se devem buscar as soluções relevantes, e se a sua interpretação deve atender aos interesses subjacentes, esta consideração não deve exceder o quadro normativo criado pois este revela a forma como tais interesses devem ser servidos.


- o regime começa por estabelecer uma regra de devolução em espécie que, por natureza, seria hostil a actualizações. A própria coisa é devolvida, qua tale, sem atender ao facto de se ter valorizado ou desvalorizado. Tal regra também vale para a prestação pecuniária, para a espécie pecuniária. Parece, assim, que seria na restituição por equivalente, e já não na restituição em espécie, que a questão da actualização melhor se centraria (e aí ocorrem, na verdade, razões não transponíveis para a restituição em espécie [32]).


- a qualificação da prestação pecuniária realizada (preço, sinal) como dívida de valor (em que o dinheiro surge como substituto do valor económico de um outro bem que não pode ser prestado, sendo este bem e não aquele dinheiro, que é efectivamente objecto da prestação) não se mostra persuasiva. O que foi convencionado foi a entrega da quantia em si, não de um valor patrimonial de que a espécie pecuniária é mera tradução ou forma de realização substitutiva. Como nota Mafalda Miranda Barbosa, na dívida de valor «o ponto de referência será sempre outra prestação. Ora nada disto ocorre por referência ao preço e à obrigação de restituir o preço» (ou o sinal, adite-se) [33]. Assim, a devolução, por força do art. 289º n.º1 do CC, deveria reportar-se apenas ao que foi prestado, e à sua actualização opunha-se o princípio nominalista (art. 550º do CC) e a própria lógica da obrigação restitutiva. A qualificação desta obrigação de restituição como legal e não convencional não altera a sua natureza (o dinheiro é a própria coisa a prestar).


- a actualização do valor entregue não se ajusta também a outros aspectos do regime da nulidade ou das regras gerais, mormente perante a boa fé, ou ao menos perante a falta de demonstração da má fé, de quem recebeu a coisa a prestar. A actualização que se discute constitui coisa distinta do regime dos frutos (civis) da coisa, regulado nos art. 1269º e ss. do CC (por remissão do n.º3 do art. 289º do CC), sendo sustentada essencialmente por imperativos de justiça e sem rigorosa subordinação ao regime dos frutos civis. Nesta linha, divergem as opiniões quanto à forma como tal actualização se deveria realizar (através de actualização assente nos índices de preços ou antes actualização alcançada pela aplicação de juros compensatórios ou mesmo de juros moratórios). Nenhuma delas soluções se mostra coerente face às regras mobilizáveis. Assim, a cobrança de juros de mora (enquanto forma de actualização) não se quadra com o regime do art. 805º n.º1 e 2 do CC (inexistindo prazo certo nem interpelação constitutiva da mora antes da acção). A afirmação de que o conceito de retroactividade, permitindo ficcionar que a obrigação de restituição era devida desde o momento do efectivo pagamento do preço a título de cumprimento do contrato, e que assim poderia permitir considerar que o devedor se encontrava em mora desde essa data e desse modo sujeito ao pagamento de juros moratórios [34], suscita duas ordens de reservas. De um lado, trata-se, justamente, de uma ficção e não de um dado legal ou natural (e equivale a responsabilizar retroactivamente o devedor por um dever - de restituição - que, embora retroactivo, só surge de forma operante com a invocação da nulidade, e que podia ignorar). E, de outro lado, de ficção que não corresponde ao regime da nulidade em articulação com o regime da mora (que não fixam o momento da constituição em mora em função do momento de entrega do bem). O regime dos art. 1269º e ss. (para que remete o art. 289º n.º3 do CC) revela que o legislador não considerou que o período de latência (entre a celebração e a restituição) corresponda a um período de mora do devedor da restituição (em particular, o regime da perda/deterioração da coisa sem culpa, derivado do art. 1269º para o detentor de boa fé, contradiz o regime da mora, que tornaria o devedor responsável por aquela perda/deterioração [35]). Os juros civis (compensatórios), que correspondem à rentabilidade da coisa, não havendo má fé, pertencem ao obrigado à devolução (art. 1270º do CC) [36], pelo que «a lei exclui como exigência obrigatória da retroatividade que haja actualização do dinheiro através da aplicação de uma taxa de juro correspondente àquela que o comprador [o obrigado à devolução] teria obtido se tivesse a disponibilidade do dinheiro» [37]. A actualização (a partir de índices de preços) é, por sua vez, incongruente com a natureza da obrigação, como já referido, e também com o alcance do regime. Pois se pode dizer-se que está em causa uma reintegração do património, essa reintegração foi desde o início fixada num quantitativo pecuniário, e não numa dívida de valor [38]. Por isso, aliás, que a mera referência ao facto de as prestações visarem uma reintegração patrimonial [39] se mostre curta para sustentar a actualização (a qualificação da obrigação de restituição como dívida de valor).


O referido regime dos art. 1269º e ss. do CC constitui realidade paralela mas autónoma face ao problema da devida, ou não, actualização da prestação a devolver (em espécie). Regula a situação de latência segundo regras próprias, determinando, entre outros aspectos, o destino dos frutos da coisa (onde se incluem os juros enquanto frutos civis). Quanto a este regime, cabe começar por excluir a aplicação do regime do art. 1260º do CC, mormente quanto às presunções que consagra. Com efeito, a remissão do art. 289º n.º3 do CC só vale para os art. 1269º e ss., o que constitui obstáculo formal, dada a letra da lei, à aplicação de outros aspectos do regime da posse. Mas constitui também obstáculo material, pois o carácter limitado da remissão também revela que a relação de liquidação só pretende apelar a este aspecto do regime da posse, e não ao restante, dando assim conta que tal relação não é, em si, um problema de posse, que a questão da devolução não se resolve em função da posse mas a partir do regime da relação de liquidação de que apenas parte do regime da posse faz parte (e por isso esta parte do regime da posse se aplica quer exista quer não exista - analogia - verdadeira posse). Não significa isto que não possa existir verdadeira posse e que esta, em si e não por força do regime da relação de liquidação, não possa intervir. Mas, independentemente de outras questões, tal não se coloca no caso pois se ignora se existe posse (mesmo ab initio, porquanto se ignora a forma de pagamento e se o pagamento não ocorreu em dinheiro, mas através de moeda escritural ou bancária, nenhuma posse é sequer possível).


No caso, a avaliação, do ponto de vista dos frutos, parte da falta de demonstração da má fé do obrigado à restituição no caso pois esta má fé consiste no conhecimento da causa de invalidade, conhecimento este que os factos não revelam (nem se pode presumir, devendo ser alegada e demonstrada [40]). E, sem má fé, inexiste razão para apelar ao regime do art. 1271º do CC.


- do ponto de vista dos interesses, o legislador desconsiderou a posição do credor da devolução quando entregou a rentabilidade da coisa (do dinheiro) ao devedor que não esteja de má fé. Este regime, associado à retroactividade, revela ainda que a desvalorização do dinheiro foi tida como resultado natural da entrega do dinheiro, a suportar por quem o entregou. Pois este, a não ter celebrado o negócio, apenas teria hoje o dinheiro que então entregou, suportando a desvalorização monetária [41]. O que o regime dita, ao menos na falta de apuramento da má fé, é que se for possível a restituição em espécie, o risco corre pelas partes que prestaram as coisas. Seria, aliás, curioso atender à hipótese de deflação [42], também possível e em que a quantia entregue passa a ter valor aquisitivo superior ao nominal: decerto, ninguém sustentaria que o credor da devolução, como teria direito a «um poder patrimonial abstracto, equivalente a “poder de compra”» [43], poderia receber menos do que a quantia entregue. Isto tende a revelar que a questão da actualização não é compreendida no regime da nulidade (art. 289º do CC), ficando reservada para outros mecanismos que sejam aplicáveis (como se refere infra).


- a perturbação do sinalagma (entre preço e coisa) que surge como dado argumentativo na discussão, não surge no caso como argumento relevante por simplesmente inexistir sinalagma relevante. De qualquer modo, não seria decisivo.


- as considerações de (in)justiça não podem servir para superar o regime, quando, como se viu, este contempla um quadro dado para a situação, nas circunstâncias concretas apuradas e relevantes [44]. Aquelas considerações reclamam, além disso, ponderações adicionais, que se não reduzem à mera consideração da posição do titular do dinheiro que o recebe desvalorizado. No caso, impressiona é certo o longo período de tempo em causa mas também impressiona a referida inércia dos recorrentes, os quais, confrontados com a notificação das declarações resolutivas em 1990 e 1992, que, na verdade, seriam ilícitas, como agora sustentam [45], e que justificariam uma actuação célere, pois tais declarações significam ao menos que da parte do promitente-vendedor nenhuma colaboração poderiam já esperar (ou seja, que estariam os AA. a esperar por coisa nenhuma...), deixaram a situação arrastar-se por mais 30 anos [46]. De certo modo, a actualização que agora obtivessem correspondia a uma forma de «investimento» do capital, que deixaram perdurar [47]. E, de qualquer modo, o arrastamento da situação é-lhes imputável. De outro lado, essas considerações de justiça têm ainda espaço próprio em outra sede, mormente no quadro da responsabilidade pré-contratual (assente na eventual responsabilidade da contra-parte na realização do negócio inválido), responsabilidade esta que constitui justamente forma de imputação do dano decorrente da celebração do negócio inválido (onde se incluem as utilidades da coisa prestada que se perderam) [48]. Ou, a ser admissível (por subsistir transferência patrimonial não coberta por outros regimes, mormente pelo regime da nulidade) e ocorrendo os seus pressupostos precisos, ainda e em último termo no âmbito do enriquecimento sem causa [49].


Cabe notar ainda que diferente solução que da má fé do detentor do bem pudesse derivar, por mediação das regras do art. 1271º do CC, não constituiria um reconhecimento da justificabilidade da actualização do valor entregue mas mero efeito legal daquele regime. Daí nenhum argumento se retira a favor daquela actualização, de per si.


Donde se considerar não ser devida qualquer actualização.


Sobre a discussão, podem ver-se, excluindo a actualização, Mafalda Miranda Barbosa, cit.,, P. Romano Martinez, ob. cit., pág. 193 nota 396 e pág. 197, Brandão Proença, ob. cit., pág. 167/8 (excluindo, por excessivas, a aplicação das posições de Clara Sottomayor e Pinto Monteiro) e 383 (concluindo que a restituição deve obedecer, em princípio, ao seu valor nominal) e C. da Silva, anotação em RLJ 145/330 e ss.. Defendendo a actualização, M. Clara Sottomayor, ob. cit. (em posição que retoma no Comentário ao CC, Parte Geral, UCP Editora 2023, pág. 872), A. Pinto Monteiro, oc. cit., Paulo M. Pinto, ob. cit., nota 2793 iniciada na pág. 1000, ou V. Serra, anotação em RLJ 112/15 e ss. (embora este último invocando o regime do enriquecimento sem causa, que defendia ser aplicável à obrigação de restituição, sendo que a aplicação de tal regime alteraria os termos da questão).


Já na jurisprudência, tanto quanto se conseguiu apreender, a solução tem permanecido relativamente constante, no que à restituição do dinheiro («preço») concerne [50], recusando-se qualquer actualização (v. Acs. do STJ de 13.02.1992 proc. 080924 em https://jurisprudencia.pt/acordao/163163/pdf/, ou de 05.02.1998, proc. 98A572, ou de 18.09.2003, proc. 03B2325 ou de 03.06.2003, proc. 03A1284; do TRP de 29.04.2014, proc. 2464/07.2TBGDM.P1, de 23.05.1996, proc. 9530899, de 29.05.2007, proc. 0720968, de 10.11.2009, proc. 3913/06.2TBMAI.P1, ou de 29.04.2014, proc. 2464/07.2TBGDM.P1; do TRL de 19.11.1998, proc. 0059642, ou do TRG de 14.11.2024, proc. 4931/23.1T8BRG.G1). Aparentemente contra, Ac. do STJ de 12.06.2012, proc. 521-A/1999.L1.S1 (o acórdão discutia expressamente uma restituição por equivalente e não em espécie, mas afirma genericamente, sem distinguir o tipo de prestação, que a obrigação de restituição é uma dívida de valor).


11. Quanto aos juros de mora (propriamente ditos), o exposto já revela que estes apenas podem ser discutidos no quadro do art. 805º n.º1 e 2 do CC, dependendo, pois, da existência de efectiva mora, e esta dependendo, por sua vez, da interpelação do devedor para cumprir. Interpelação que não consta que tenha ocorrido extrajudicialmente. Resta considerar o relevo interpelador da citação realizada. Ponto onde, pese embora a obrigação de restituição com base na nulidade não tenha sido invocada, se verifica que foi formulada uma pretensão de restituição do valor em causa (embora com base no enriquecimento sem causa), restituição que agora se impõe, e que apresenta similitude funcional com a obrigação de restituição afirmada e bem assim identidade no seu objecto. Justificando-se afirmar que vale como interpelação para o pagamento, ainda que a base jurídica seja diversa (esta interpelação vale em função da prestação requerida, não dependendo do exacto fundamento da prestação; por isso que a alteração da qualificação jurídica não seja determinante). Naturalmente, estes juros moratórios filiam-se apenas na mora, nada tendo a ver com a discussão realizada sobre a actualização. A dívida de juros a partir da citação é por vezes sustentada a partir da circunstância do devedor incorrer em má fé com aquela citação e, nessa sequência, por força do art. 1271º do CC. Não se adopta a solução (que tem méritos próprios) no caso vertente por se considerar que, em rigor, apenas o conhecimento do vício poderia evidenciar a má fé dos recorridos, não servindo para tanto a citação para a acção (atendendo também ao art. 564º al. a) do CPC) por nesta se não invocar a invalidade e, assim, não se revelar que a partir da citação existiria o conhecimento do vício.


12. As custas da acção e do recurso devem correr por conta de ambas as partes, na proporção do seu decaimento (art. 527º n.º1 e 2 do CPC).


VII. Pelo exposto, revoga-se a sentença recorrida, condenando-se os recorridos (RR., e na qualidade em que intervêm) a pagar aos recorrentes (AA.) 3.416,76 euros (três mil quatrocentos e dezasseis euros e setenta e seis cêntimos), a que acrescem juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da citação dos recorridos.


Custas da acção e do recurso pelos recorrentes e pelos recorridos, na proporção do decaimento.


Notifique-se.

Datado e assinado electronicamente.

Redigido sem apelo ao Acordo Ortográfico (ressalvando-se os elementos reproduzidos a partir de peças processuais, nos quais se manteve a redacção original).


António Marques da Silva - Relator


Maria João Sousa e Faro - Adjunta


Filipe César Osório - Adjunto

___________________________________________

1. Equivalente ao valor indicado na PI mas manifestamente artificial, sem qualquer apoio no objecto da acção e nas regras legais aplicáveis (art. 297º n.º3, 301º n.º1 e 306º n.º1 do CPC).↩︎

2. Embora, em rigor e como já referido, comecem por afirmar, naquele art. 2º, que ocorreu uma compra, o desenrolar da alegação, e os pedidos formulados, revelam que pretendiam referir-se a um contrato-promessa de compra e venda (como foi, aliás, entendido pelos RR., asserção que suportou depois o desenvolvimento da acção).↩︎

3. A menção a sinais é, obviamente, irrelevante neste ponto porquanto o sinal não é exclusivo do contrato-promessa.↩︎

4. V., para os recibos, Ac. do STJ de 11.12.2014, proc. 1370/10.8TBPFR.P1.S1, valendo tal solução, por maioria de razão, para as cartas (Ac. disponível em 3w.dgsi.pt, local onde, salvo menção diversa, se encontram todos os acórdãos doravante citados).↩︎

5. Em reprodução literal.↩︎

6. Trata-se de manifesto lapso; estariam em causa os AA. (art. 15º da PI).↩︎

7. Descrição aditada nesta sede.↩︎

8. Sendo discutido embora o caso do conhecimento de mérito parcial (em que a acção apenas prossegue parcialmente).↩︎

9. João Pedro Pinto-Ferreira, Adequação formal e garantias processuais na acção declarativa, 2020, pág. 160 (disponível online).↩︎

10. A asserção não é pacífica, porém.↩︎

11. Mesmo constituindo tal pronúncia (a ser negativa) um alerta para o juiz sobre a eventual inconveniência da dispensa pois a parte iria, presumivelmente, usar depois o mecanismo do art. 593º n.º3 do CPC, podia ainda o juiz confiar em que, perante os concretos termos dos despachos a proferir, tal não ocorresse por a parte apreender a inutilidade da diligência.↩︎

12. Solução corrente mas não pacífica.↩︎

13. João Pedro Pinto-Ferreira, ob. cit., pág. 163.↩︎

14. Com a ressalva desde logo da situação a que se reporta o n.º3 do art. 199º do CPC, que não vale no caso.↩︎

15. A questão não suscita dificuldades: v. Ana Prata, O Contrato-Promessa e o seu Regime Civil, Almedina 1999, pág. 778 nota 1805.↩︎

16. Embora, em rigor e como já referido, comecem por afirmar, naquele art. 2º, que ocorreu uma compra, o desenrolar da alegação, e os pedidos formulados, revelam que pretendiam referir-se a um contrato-promessa de compra e venda (como foi, aliás, entendido pelos RR., asserção que suportou depois o desenvolvimento da acção).↩︎

17. V., para os recibos, Ac. do STJ de 11.12.2014, proc. 1370/10.8TBPFR.P1.S1, valendo tal solução, por maioria de razão, para as cartas (Ac. disponível em 3w.dgsi.pt, local onde, salvo menção diversa, se encontram todos os acórdãos doravante citados).↩︎

18. A menção a sinais é, obviamente, irrelevante neste ponto porquanto o sinal não é exclusivo do contrato-promessa.↩︎

19. Circunstâncias apuradas depois de alegadas pelas partes: o conhecimento oficioso do abuso de direito vale para a sua aplicação (na linha dos art. 5º n.º3 e 579º do CPC), já não para os factos em que se funda (art. 5º n.º1 do CPC).↩︎

20. A inalegabilidade formal, como manifestação do abuso de direito, tende a ser progressivamente autonomizada, não se contendo estritamente nos limites do comportamento contraditório.↩︎

21. O exacto elenco dos interesses subjacentes à forma não é inteiramente claro. Afirmam-se em regra por referência à posição das partes (publicidade, ponderação, prova, etc.) mas têm sempre uma projecção em razões de ordem pública: a certeza e segurança. Para um elenco extenso, e não exaustivo, de razões justificativas da forma, v. M. Cordeiro, Tratado de Direito Civil, II, Parte Geral, Negócio Jurídico, Almedina 2014, pág. 172 e ss..↩︎

22. Assim, C. da Silva, anotação em RLJ 132/263.↩︎

23. Este carácter excepcional da figura é jurisprudencialmente sublinhado: v., a título exemplificativo, Ac. do STJ de 28.02.2012, proc. 349/06.8TBOAZ.P1.S1, do TRC de 06.02.2018, proc. 1189/16.2T8VIS.C1, ou do TRE de 21.05.2020, proc. 189/14.1TBPTM.E1.↩︎

24. Dispensando-se a imputação subjectiva (juízo de censura).↩︎

25. V. M. Cordeiro, Redução teleológica, normas formais e abuso do direito, Revista de Direito Civil 4 (2019), em conclusão na pág. 631, seguido por Elsa Vaz Sequeira, Comentário ao CC, Parte Geral, UCP Editora 2023, pág. 969.↩︎

26. Sendo nulo, inexiste contrato em vigor; vale aqui a ideia de manutenção da situação subjacente.↩︎

27. Assim, Ac. do STJ de 31.01.2019, proc. 89/16.0T8VGS.P1.S2.↩︎

28. O que se discute hoje é se aquela solução deve valer também para os casos em que não foi formulado tal pedido. Sustentando-o, T. de Sousa, Consequências Legais que Operam Ex Lege e Condenação Oficiosa pelo Tribunal, disponível no Blog do IPCC (em concordância com o Ac do TRC de 10.05.2016, proc. 2008/10.9TBACB.C1) ou Miguel Mesquita, RLJ 143/138 nota 17 in fine, ou o Ac. do STJ de 04.02.2021, proc. 6837/17.4T8LRS.L1.S1.↩︎

29. Nada havendo a restituir aos RR., não importa avaliar se tal poderia ser ordenado nesta sede.↩︎

30. V. P. Mota Pinto, Interesse contratual negativo e interesse contratual positivo, vol. II, Coimbra Editora 2008, pág. 977, ou L. de Campos, A Subsidiariedade da Obrigação de Restituir o Enriquecimento, Almedina 1974, pág. 200, ou Mafalda Miranda Barbosa, Lições de teoria geral do direito civil, Gestlegal 2022, pág. 960 nota 1055.↩︎

31. A discussão gravita em torno do preço porquanto a questão era, em regra, colocada perante contratos de compra e venda.↩︎

32. Por exemplo, o credor da entrega receberia o bem hoje, e assim seria o valor que hoje teria que deveria ser-lhe entregue em substituição do bem (quer tenha valorizado, quer tenha desvalorizado); já se recebe o bem em espécie, recebe-o em si e a questão ficaria por si resolvida.↩︎

33. V. Lições cit., pág. 569/570. Mesmo Pinto Monteiro, sustentando a solução da actualização, admite ser duvidosa a qualificação de um preço como dívida de valor, no quadro em causa (Dívidas de Valor e restituição do preço em caso de invalidade ou de resolução do contrato, RLJ 141/101).↩︎

34. Maria Clara Sottomayor, A obrigação de restituir o preço e o princípio do nominalismo das obrigações pecuniárias, Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Jorge Ribeiro de Faria, Coimbra Editora 2003, pág. 577, tese também adoptada por P. Monteiro, ob. cit., pág. 103.↩︎

35. Seguindo-se Mafalda Miranda Barbosa, ob. cit., pág. 968. Em sentido próximo, também P. Romano Martinez (para a resolução, situação análoga embora não idêntica dado o teor do art. 433º e 434º do CC) salienta que o devedor da restituição não deve pagar o valor do uso porque se não responde pela deterioração da coisa e faz seus frutos, também não tem que pagar o uso (se não estiver de má fé) (Da cessação do contrato, Almedina 2005, pág. pág. 195).↩︎

36. E havendo má fé já não se trata de problema de actualização mas de destinação de frutos.↩︎

37. Mafalda Miranda Barbosa, ob. cit., pág. 968.↩︎

38. Mafalda Miranda Barbosa, ob. cit., pág. 969/970.↩︎

39. Como faz Paulo Mota Pinto, ob. cit., pág. 1000/1001 nota 2793 in fine. Também a comparação com a situação do empobrecido no enriquecimento sem causa se mostra inconcludente por serem diversas as condições de regime e as situações subjacentes.↩︎

40. Assim Maria Clara Sottomayor, ob. cit., pág. 589 (sendo que, em momento anterior, referia que seria a boa fé que se deveria presumir - pág. 588). Não vale, por isso, invocar o conhecimento do homem/mulher médios sobre o carácter conhecido da necessidade de formalização, asserção de qualquer modo de duvidosa valia quanto ao contrato-promessa.↩︎

41. V., em sentido próximo, Mafalda Miranda Barbosa, ob. cit., pág. 970/971.↩︎

42. Como é notório, a desvalorização monetária que se invoca assenta na inflação.↩︎

43. Maria Clara Sottomayor, ob. cit., pág. 591.↩︎

44. Considerações de justiça que, como nota P. Romano Martinez, essencialmente norteiam a construção de M. Clara Sottomayor (ob. cit., pág. 193 nota 396).↩︎

45. Nomeadamente por se tratar de comunicação da resolução e não de verdadeira interpelação, não havendo intimação para cumprir nem se fixar um prazo para se realizar a prestação em falta (afirmando-se logo a resolução); e também por não conter a cominação do incumprimento definitivo (ou da resolução do contrato, que se tende a admitir poder valer em vez daquela outra cominação).↩︎

46. Provavelmente estariam até já prescritos os direitos que invocam (questão não avaliada porque não invocada: art. 303º do CC).↩︎

47. E «investimento» relevante, a ser considerada a actualização com base em índices de preços (inflação).↩︎

48. Sublinhando a função complementar da indemnização, Paulo M. Pinto, ob. cit., pág. 1001, no que é acompanhado por Brandão Proença, Lições de cumprimento e não cumprimento das obrigações, UCP Editora, 2023, pág. 168.↩︎

49. Sobre a situação, v. P. Mota Pinto, ob. cit., pág. 972 nota 2719.↩︎

50. A solução já varia na restituição por equivalente.↩︎