Sumário:
I. No art.º 839ºdo CPC elencam-se situações em que a venda “fica sem efeito”, sendo que uma delas ocorre se for “anulado o acto de venda nos termos do art.º 195º”- cfr. nº1, alínea c)- norma de que se socorre a recorrente para justificar a sua pretensão.
II. A remissão que o art.º 839º faz para o art.º 195º do CPC significa que o acto de venda poderá ser anulado quando se verificar uma das situações previstas nessa norma, i.e. quando, por exemplo, tiver sido omitido um acto que a lei prescreva, o que sucede se ocorrer omissão da notificação da decisão do agente de execução sobre a venda ( art.º 812º, nº4 do CPC).
III. Uma vez que a exequente não invoca não ter sido notificada de tal decisão mas, sim, que uma das executadas não o foi, isto significa que a exequente não é interessada na observância de uma formalidade que não lhe foi destinada, de cuja putativa omissão não sofreu qualquer prejuízo nos seus direitos processuais; pelo que a ter ocorrido efectivamente a falta de notificação da dita executada só a mesma poderia argui-la.
ACÓRDÃO
I. RELATÓRIO
1. LANDSCOPE DEVELOPMENTS, Lda, Exequente nos autos à margem identificados, nos quais figura como Executada Midland Investements Limited em substituição da sociedade executada extinta veio interpor recurso do despacho proferido pelo Tribunal “a quo” em 27.2.2025 que julgou improcedente o pedido de anulação da venda, pela mesma suscitada em 21.3.2024, formulando na sua apelação as seguintes conclusões:
1º- Por meio de requerimento de 21.03.2024, veio a Exequente, ora Apelante, requerer a declaração de anulação da venda por negociação particular constante dos autos, com a consequente repetição dos actos de venda.
2º- Vem o presente Recurso interposto do douto Despacho de fls. prolatado a 27-02-2025, que julgou improcedente a arguição de nulidade.
3º- Entende o Recorrente, com a devida vénia por douto entendimento, verifica-se erro na aplicação do Direito.
4º- Por decisão, da Sra. Agente de Execução datada de 22/03/2022, a venda prosseguiu por negociação particular, ao abrigo disposto na alínea f) do artigo 832º do CPC.
5º- Sucede que, não obstante a Sra. AE ter feito a junção aos autos de uma cópia da mencionada notificação de 22-03-20224, a Executada Mezvale Holdings Limited não foi objeto de qualquer notificação, tal como se alcança, porquanto nenhum comprovativo postal se encontra junto nos autos, sendo que após consulta do portal dos CTT, resultando igualmente evidenciado que tal notificação nunca foi objeto de entrega à Executada.
6º- Na mesma comunicação da Decisão, refere a Sr. AE que caso não haja oposição, seria aquela, designada encarregada de venda.
7º- Pelo que, não foi a Executada Mezvale Holdings Limited notificada para se pronunciar sobre a designação como encarregado de venda, designadamente a Sra. AE., que ainda assim, mesmo sabendo que não havia cumprido tal formalidade, decidiu-se por prosseguir com os actos de venda do imóvel.
8º- De acrescentar que, a Sra. AE ao executar a pretensa notificação da Executada, veio endereçar erradamente a notificação postal para “Parque Empresarial do Algarve, lote 12 B, 1º andar 8400-431 Lagoa”, quando não ignorava e era do seu perfeito conhecimento que a sede da sociedade Executada (à data já dissolvida) era em suite two B, Mansion House 143, Main Street, Gibraltar – Cfr. título executivo.
9º- Consequentemente, a falta de notificação da Executada, nunca foi sanada, pelo que ao abrigo do mencionado nº 2 do artigo 833º do CPC, a Sra. AE só poderia exercer tais funções de encarregado de 4 «Fica V.Exª notificada, na qualidade de Executada, da certidão eletrónica emitida pela O.S.A.E., na sequência o encerramento do leilão eletrónico para venda do bem penhorado noa autos. Como não foram apresentadas propostas, ao abrigo do disposto na alínea f) do artigo 832º do C.P.C., a venda prossegue mediante negociação particular, ficando V.Exª notificada para, no prazo de 10 (dez ) dias, se pronunciar, querendo, sobre a eventual designação como encarregado de venda, a aqui Agente de Execução. Caso não haja oposição, ao abrigo do citado artigo 833º, nº 2, do C.P.C., fica desde já designado Encarregado da Venda a Agente de Execução abaixo assinada.» venda, após Despacho judicial que o assim viesse a determinar, o que como é patente que nunca veio a ocorrer.
10º- Com efeito, todos os actos da encarregada de venda estão inquinados, por omissão de notificação da Executada, até porque por meio de Despacho de 11-11-2024, já se veio a concluir que a referida Executada MEZVALE HOLDINGS LIMITED já havia sido declarada extinta a 07 de Outubro de 2021.
11º- Estando extinta a Executada, necessariamente nunca poderia ter sido notificada da famigerada notificação de 22-03-2022, tal como veio a suceder em todos os actos processuais subsequentes.
12º- Assim, a omissão da notificação à Executado da Decisão de nomeação da Sra. AE para o cargo de encarregada de venda, constitui nulidade processual.
13º- In casu, pelo que se impõe-se concluir que a Sra. Encarregada de venda, não só não cumpriu o dever de notificação da Executada, como inexiste qualquer Decisão judicial que a tenha nomeado aquela para exercer o cargo, o que nos leva a concluir pela inexistência de nomeação da encarregada de venda.
14º- O mesmo é dizer que não tendo sido designado, nos termos da lei, encarregado de venda não seria admissível prosseguir com a venda do imóvel.
15º- Mas mesmo que – hipoteticamente - se aceitasse que a Sra. AE se encontrava nomeada – o que não se concede - nenhumas diligências que aquela levou a cabo para promover a venda do imóvel e para encontrar um proponente comprador que oferecesse o maior valor possível pelo imóvel, conforme lhe é imposto por lei.
16º- Nada consta nos autos, porque nenhumas diligencias foram realizadas, razão pela qual determinou o prosseguimento da execução, com a colocação do imóvel, novamente, no e-leiloes, por negociação particular, pelo prazo de 30 dias.
17º- A 18/05/2023, a encarregada veio requerer autorização ao Tribunal para vender o bem penhorado por valor muito inferior ao valor mínimo estipulado, Que, curiosamente, é – apenas- mil euros superior à – suposta - proposta 2 da - suposta - senhora AA, no valor de €1.1170.000,00, não tendo sido realizadas pelo encarregado da venda, na circunstância a Sr.ª AE, quaisquer diligências tendentes à prospecção de mercado que caracteriza a venda por negociação particular” é omitida prática de actos exigidos por lei.
18º- Devendo nos termos dos artigos 195.º e 839.º, nº 1, alínea c), do CPC, ser declarada nula a venda por negociação particular constante dos autos, ou subsidiariamente determinar-se anulação da venda com a consequente repetição dos actos de venda.
19º- Pelo que, violou o tribunal a quo o disposto n os artigos 195.º e 839.º, nº 1, alínea c), alínea f) do artigo 832º e nº 2 do artigo 833º, todos do CPC.
Termos em que,e nos melhores de direito que Vossas Exªs doutamente suprirão, deve o presente Recurso ser julgado procedente, com todas as consequências legais, fazendo-se, deste modo, a habitual justiça!
2.Não houve contra-alegações.
3. Sendo certo que o objecto do recurso se delimita pelas conclusões das alegações do apelante (cfr. artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º, e 663.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil) a única questão cuja apreciação as mesmas convocam é se há fundamento para anular ou declarar a nulidade da venda.
II- FUNDAMENTAÇÃO
4. É o seguinte o teor do despacho recorrido:
Arguição de nulidade de 21 de Março de 2024:
Nessa data, veio a Exequente arguir a nulidade da venda.
Diz ela que “por não poder ficar indiferente ao requerimento da terceira requerente “Shining Fields, Lda.”, corroborando os seus argumentos.
Ora, os argumentos já foram apreciados e decididos pelo Tribunal por despacho de 08 de Março de 2024, não tendo lugar, por conseguinte, a sucessiva reapreciação da questão.
De resto, anota-se a coincidência de interesses e requerimentos apresentados por ambas – Exequente e terceira – sendo certo que esta terceira, em bom rigor, nem sequer tem legitimidade processual para intervir nestes autos. Vem intervindo na qualidade de sociedade com interesse para vir a apresentar, no futuro, uma proposta de aquisição do imóvel…mas, não é parte, nem sequer proponente pois nunca se dignou apresentar qualquer proposta de aquisição. Pergunta-se, portanto, com que base legal vem a terceira intervindo neste processo e qual o seu verdadeiro papel aqui.
Adiante.
Veio agora dizer que a Sr.ª Agente de Execução desempenhou funções de encarregada da venda sem designação da Juíza para o efeito.
Tardiamente alegou.
A decisão é de 22 de Março de 2022; foi notificada à Exequente nessa data, com transcrição do regime normativo. Então, foi-lhe dito que
“Caso não haja oposição, ao abrigo do citado artigo 833º, nº 2, do C.P.C., fica desde já designado Encarregado da Venda a Agente de Execução abaixo assinada”.
Quedou-se muda e inerte a Exequente mas, dois anos depois, fora de todos os prazos legais, veio ao processo dizer que, afinal, o seu silêncio deveria ser interpretado como oposição àquela nomeação, cabendo à Juíza ter feito a designação da Sr.ª Agente de Execução como encarregada da venda.
Este Tribunal não cauciona este tipo de litigância.
E a seguir, veio ainda dizer que a Sr.ª Agente de Execução não fez diligências para alcançar a melhor proposta.
Mais uma vez, em 14 de Abril de 2023, a Exequente foi notificada das propostas em apreciação e bem assim de que a negociação particular prolongar-se-ia por mais 30 dias à espera de melhor proposta.
E a sua reacção processual qual foi? Foi apresentar, em 10 de Maio de 2023, um requerimento para substituição da Sr.ª Agente de Execução. Mas impugnar a decisão em causa junto do Tribunal nos termos legais e no prazo de 10 dias, não o fez.
“Curiosamente” – para usar a expressão da Exequente – insurge-se quanto ao valor das propostas apresentadas e da que foi aceite. Mas olvida que se apresentou neste Tribunal a pretender a adjudicação do prédio pela módica quantia de € 350.000,00, um valor ridiculamente baixo quando comparado com qualquer outra proposta apresentada pelos proponentes.
Insurge-se pelos anos que demora a ser ressarcida, mas não se coíbe de criar todas as entropias possíveis nos autos, por si e auxiliada por terceiros, para obstruir o andamento da acção, a venda do imóvel e o ressarcimento do seu crédito.
Mais uma vez: este Tribunal não cauciona este tipo de litigância.
A arguição é improcede, por intempestividade e manifesta falta de fundamento legal e factual.”.
5. Da consulta do processo de execução no citius extrai-se, com relevo o seguinte:
5.1. No requerimento executivo, a exequente indicou como “morada” de todas as sociedades executadas a seguinte: Parque Empresarial do Algarve, Bloco 8, Nº 21, Lagoa.
5.2. A Mezvale Holdings Limited foi notificada em 4.3.2019 da renúncia ao mandato por parte do seu advogado na seguinte morada: Parque Empresarial do Algarve, lote 12 B, 1º andar – Lagoa 8400-431 LAGOA na sequência de consulta às Bases de Dados;
5.3. Em 26.5.2021 todas as sociedades executadas foram notificadas da decisão da A.E. da decisão de proceder à venda do bem penhorado “mediante leilão electrónico, através da plataforma www.e-leiloes.pt, aprovada por despacho n º12624/2015-D.R. 219/2015, série II, de 2015-11-09”, consignando-se acerca do valor de venda que : “Serão aceites propostas iguais ou superiores a 85% do valor de base.
Verba única : 2.310.000.00 euros
O valor indicado tem por base o valor de mercado ( artigo 812º, nº3, alínea b) ), conforme consta do Relatório de Avaliação”.
5.4. As sociedades executadas, dentre as quais a Mezvale Holdings Limited , bem como a exequente, foram notificadas pela A.E. em 22.3.2022 do encerramento do leilão eletrónico para venda do bem penhorado nos autos e de que “como não foram apresentadas propostas, ao abrigo do disposto na alínea f) do artigo 832º do C.P.C., a venda prossegue mediante negociação particular, ficando V.Exª notificada para, no prazo de 10 (dez ) dias, se pronunciar, querendo, sobre a eventual designação como encarregado de venda, a aqui Agente de Execução.
Caso não haja oposição, ao abrigo do citado artigo 833º, nº 2, do C.P.C., fica desde já designado Encarregado da Venda a Agente de Execução abaixo assinada”.
5.5. Nenhum dos notificados deduziu oposição à nomeação da A.E, como encarregada da venda.
5.6. Em 5.7.2023 foi proferido o seguinte despacho que condensa o ocorrido até então: “Por decisão de 26 de Maio de 2021, a Sr.ª Agente de Execução tomou a sua decisão de venda.
O bem a vender é que consta do auto de penhora de 19 de Outubro de 2015 e o valor- base foi fixado em € 2.310.000,00.
Em 22 de Março de 2022, face à inexistência de propostas no leilão electrónico, a Sr.ª Agente de Execução notificou as partes de que a venda prosseguiria para a modalidade de negociação particular porque não foram apresentadas propostas, ao abrigo do disposto na alínea f) do artigo 832.º do Código de Processo Civil.
Em 13 de Abril de 2023, a Exequente apresentou nos autos um requerimento requerendo a adjudicação do imóvel por € 350.000,00, ao abrigo do disposto no artigo 799.º n.º 3 do mesmo diploma.
Tal valor não cobre, nem de perto, nem de longe, o valor-base a que se reporta o artigo 816.º n.º 2, por remissão do n.º 3 do artigo 799.º do Código de Processo Civil.
No dia seguinte, a Sr.ª Agente de Execução fez chegar aos autos informação de que havia as seguintes propostas:
Frutas Martinho - Sociedade Agrícola, Lda, no valor de 1.155.000,00;
AA, no valor de 1.170.000,00.
Perante isto, a Exequente entendeu por bem pedir a substituição da Sr.ª Agente de Execução.
Em 17 de Maio de 2023, a Sr.ª Agente de Execução informou que a melhor proposta obtida foi de €1.171.000,00.
Em primeiro lugar, o Tribunal recusa liminarmente o pedido de adjudicação apresentado pela Exequente, por ser verdadeiramente atentatório da realização dos fins desta acção executiva, que é a de obter a satisfação de um crédito não pago à custa do património do devedor, mas mediante o pagamento do preço justo.
A acção executiva não serve para se efectuar um locupletamento do credor à custa do património do devedor.
Ora, perante um imóvel que apresenta um valor-base de € 2.310.000, pretender a sua adjudicação por € 350.000,00 não tem cabimento legal, nem jurisprudencial.
E sobretudo fazê-lo quando tem conhecimento de que existem propostas várias vezes mais valiosas do que a por si apresentada é bem revelador da enorme vantagem que a adjudicação nos sobreditos termos para si significa. E do desfasamento do preço oferecido face ao valor de mercado do bem penhorado.
Portanto, e sem necessidade de maiores considerações, o Tribunal não autoriza a adjudicação do imóvel penhorado à Exequente nos termos propostos.
Em contrapartida, autoriza a venda pela melhor oferta obtida até à data.”.
5.7. Em 21.3.2024 a exequente apresentou nos autos o seguinte requerimento sobre o qual recaiu o despacho recorrido:
“LANDSCOPE DEVELOPMENTS, LDA, Exequente mais bem identificada no processo à margem identificado, vem aos autos, face à movimentação processual, mormente, os requerimentos apresentados pelas Ilustres Sras. Dras. BB e CC, registadas no CITIUS sob as referências 48220713, 48362120, 48362490 e 48251159, respetivamente, e na qualidade de parte a quem mais interessa a venda do bem penhorado pelo melhor preço, e que, actualmente, tudo indica ser - €2.500.000,00 (dois milhões e quinhentos mil euros) – o apresentado pela interveniente acidental Shinning fields Lda., informar e requerer o que se lhe apraz:
1. Não pode a Exequente ficar indiferente ao teor dos requerimentos apresentados em 08/03/2024 e 20/03/2024.
2. Na verdade, a Exequente corrobora e subscreve os argumentos aduzidos pela interveniente acidental Shinning fields Lda, para que seja anulada a venda do bem penhorado nos autos, mais acrescentando,
3. Por decisão, da Sra. Agente de Execução datada de 22/03/2022, a venda prosseguiu por negociação particular, ao abrigo disposto na alínea f) do artigo 832º do CPC.
4. Na mesma comunicação, refere que caso não haja oposição, seria aquela, designada encarregada de venda.
5. Sucede que, com o devido respeito por opinião diversa, manda a lei, nos termos do último parágrafo do nº 2 do artigo 833º do CPC, que o juiz determine que seja o AE a exercer tais funções de encarregado de venda.
6. In casu, tal determinação por parte do Tribunal é inexistente, o que nos leva a concluir pela inexistência de um encarregado de venda.
7. O mesmo é dizer que não tendo sido designado, nos termos da lei, encarregado de venda não é possível prosseguir com a venda do imóvel.
8. Mas mesmo que – hipoteticamente - se aceitasse que a Sra. AE se encontrava mandatada– o que não se admite - questiona-se quais as concretas diligências que aquela levou a cabo para promover a venda do imóvel e para encontrar um proponente comprador que oferecesse o maior valor possível pelo imóvel, conforme lhe é imposto por lei.
9. Nada consta nos autos.
10. Porque nada foi feito, obviamente.
Senão vejamos;
11. Na senda do acórdão do TRE de 9 de Março de 2017 (processo 32/14.1TBAVS.E1, acessível em www.dgsi.pt) “A negociação particular pressupõe a consulta directa do mercado, mediante a procura de propostas que possam corresponder a uma correcta intercepção do binómio económico da lei da oferta e da procura, viabilizando, deste modo, uma decisão adequada a garantir a reparação do direito de crédito em questão no processo executivo, sem a necessária aquiescência do executado”.
12. Volvido que foi mais de um ano, a Sra. AE , vem unicamente e tão só comunicar ao processo que as propostas apresentadas em sede de negociação – cujas circunstâncias se desconhecem integralmente - apresentam valores inferiores ao valor mínimo indicado para a venda do imóvel penhorado, limitando-se a enunciar:
Proposta 1: frutas martinho – sociedade agrícola Lda., no valor de
€1.155.000,00
Proposta 2: AA, no valor de €1.1170.000,00.
13. Razão pela qual determinou o prosseguimento da execução, com a colocação do imóvel, novamente, no e-leiloes, por negociação particular, pelo prazo de 30 dias.
14. Em 18/05/2023, vem requerer autorização ao Tribunal para vender o bem penhorado por valor muito inferior ao valor mínimo estipulado.
15. Que, curiosamente, é – apenas- mil euros superior à – suposta - proposta 2 da - suposta - senhora AA, no valor de €1.1170.000,00.
16. Ora, e tal como ocorre no caso do acórdão do TRE de 25 de janeiro de 2023 (processo 751/17.0T8SLV-B.E1), também, no caso em apreço, a Sr.ª AE “tendo operado a transição automática da frustrada venda por leilão electrónico para a venda por negociação particular, escusou-se a fazer qualquer prospeção de mercado, fazendo valer de imediato a maior proposta obtida no leilão e servindo a conversão operada apenas para permitir a venda por preço inferior ao valor base fixado, o que lhe estava interdito no âmbito da modalidade de venda preferencial. Com efeito, a admitir-se a regularidade deste procedimento, a opção pela venda por negociação particular serviria afinal e apenas para cobrir a aceitação da
proposta mais elevada das apresentadas no leilão electrónico, cuja aceitação estava vedada no âmbito desta modalidade de venda, assim defraudando o propósito legal de tentativa de venda numa outra e diferente modalidade. “
17. Resulta assim que “não tendo sido realizadas pelo encarregado da venda, na circunstância a Sr.ª AE, quaisquer diligências tendentes à prospecção de mercado que caracteriza a venda por negociação particular” é omitida a prática de actos exigidos por lei.
18. Devendo nos termos dos artigos 195.º e 839.º, nº 1, alínea c), do CPC, ser declarada nula a venda por negociação particular constante dos autos, e consequentemente o respetivo imóvel voltar a ser licitado pela proposta mais alta que venha a ser oferecida.
6. Do mérito do recurso
Cuidemos agora de averiguar se há fundamento para anular a execução e dar sem efeito a venda como pretende a exequente.
No art.º 839ºdo CPC elencam-se situações em que a venda “fica sem efeito”, sendo que uma delas ocorre se for “anulado o acto de venda nos termos do art.º 195º”- cfr. nº1, alínea c)- norma de que socorre a recorrente para justificar a sua pretensão.
A remissão que o art.º 839º faz para o art.º 195º do CPC significa que o acto de venda poderá ser anulado quando se verificar uma das situações previstas nessa norma, i.e. quando, por exemplo, tiver sido omitido um acto que a lei prescreva, o que sucede se ocorrer omissão da notificação da decisão do agente de execução sobre a venda ( art.º 812º, nº4 do CPC).
Ora, a exequente não invoca não ter sido notificada de tal decisão; diz, sim, que a executada Mezvale Holdings Limited não o foi.
“Note-se que estas nulidades não são de conhecimento oficioso, devendo ser arguidas pelos interessados ( artigos 196º, 197º, 199ºe 200º, nº3 ) sendo apreciadas após ser facultado o contraditório a quem possa vir a ser afectado pela procedência da arguição1”.
Tratam-se, afinal, de nulidades secundárias, que a lei estabelece que apenas o interessado na observância da formalidade ou na repetição (ou eliminação) do acto pode argui-la (arts. 196.º, n.º 1, in fine, e 197.º) e dentro de um determinado prazo (art. 199.º, n.º 1).
Ora, a exequente não é interessada na observância de uma formalidade que não lhe foi destinada, de cuja putativa omissão não sofreu qualquer prejuízo nos seus direitos processuais; pelo que a ter ocorrido efectivamente a falta de notificação da dita executada só a mesma poderia argui-la.
Ainda que assim não fosse, foi a própria exequente que indicou no requerimento executivo a morada da executada como sendo em Portugal e não em Gibraltar, estando-lhe, também, por esse motivo, vedado argui-la (nº2 do art.º 197º).
Mas a verdade é que não se pode considerar ter ocorrido qualquer irregularidade na notificação da executada já que o foi na morada para a qual se remeteu a notificação da renúncia ao mandato por parte do respectivo mandatário e de que não há notícia de não ter sido eficazmente recebida.
Em suma: Não há fundamento para anular a venda nos termos do art.º 195º do CPC e por, consequência, para a dar sem efeito à luz do disposto na alínea c) do nº1 do art.º 839º do mesmo código.
III.DECISÃO
Por todo o exposto, acorda este colectivo em julgar totalmente improcedente a apelação e em manter a decisão recorrida.
Custas pela recorrente.
Évora,25 de Junho de 2025
Maria João Sousa e Faro (relatora)
Ana Pessoa
Manuel Bargado
1. Assim, A.Geraldes, Paulo Pimenta e Luís F. Sousa in CPC anotado, 2ª ed. pag.265.↩︎