REFORMA DA DECISÃO
Sumário

Reformado o Acórdão de 22-05-2025, publicado em https://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/0d254b2ccd2950e480258c9f00532ad4

Texto Integral

Proc. nº 56/24.0T8MMN.E1

Acordam, em conferência, na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora


AA instaurou ação de despejo, sob a forma de processo comum, contra “BB, Lda.”, pedindo que:


a) Seja ordenado o despejo imediato da ré e a entrega ao autor do locado identificado no artigo 1º da petição inicial, totalmente livre e devoluto de pessoas e bens;


b) A ré seja condenada no pagamento ao autor de uma indemnização por ocupação ilícita do locado, que à data da instauração da ação computa em € 2.589,43, correspondente à renda mensal que vinha sendo paga pela ré no valor de € 635,30 e que, a partir de 12.10.2023, deve corresponder ao dobro (€ 1.270,60) por cada mês de atraso na sua restituição, a calcular até à data em que vier a ser efetivamente restituído o locado, acrescida dos juros legais que se vencerem, em relação a cada uma das referidas quantias, a contar do último dia de cada mês que sobrevier até efetivo e integral pagamento.


Na 1º instância foi proferido saneador-sentença que julgou a ação improcedente e absolveu a ré do pedido.


Inconformado, o autor apelou do assim decidido, tendo este Tribunal da Relação proferido acórdão, em 22.05.2025, com o seguinte dispositivo:


«Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar a apelação parcialmente procedente, alterando, em consequência, a sentença recorrida, nos seguintes termos:


a) Condena-se a ré a despejar as lojas do rés-do-chão com os n.ºs de polícia 9 e 13 do prédio sito na Av..., 9, 11 e 13, em Local 1, descrito na Conservatória do Registo Predial de Local 1 sob o n.º 3717 da freguesia de Local 1 e inscrito na matriz predial urbana com o artigo 210.º da mesma freguesia, restituindo-as ao autor, livre e desocupadas de pessoas e bens.


b) Condena-se a ré no pagamento de uma indemnização ao autor pela ocupação do locado, correspondente à renda mensal no valor de € 635,30, a partir de 12.10.2023 – descontados os montantes referidos no ponto 13 dos factos provados - e por cada mês de atraso na sua restituição, até à data em que esta se venha a efetivar, acrescida dos juros legais vencidos e vincendos, à taxa legal.


c) Absolve-se a ré do restante pedido


Custas aqui e na 1ª instância a cargo do autor e da ré na proporção do respetivo decaimento.»


Notificado do Acórdão, veio o autor pedir a sua reforma, concretamente a alteração da alínea b) do seu dispositivo, «de forma a que a Ré/Apelada seja condenada no pagamento de uma indemnização ao Autor/Apelante pela ocupação ilícita do locado, correspondente ao dobro da renda mensal – ou seja, 1.270,60 € (mil, duzentos e setenta euros e sessenta cêntimos) – a partir de 12 de Outubro de 2023, descontados os montantes referidos no ponto 13 dos factos provados, e por cada mês de atraso na sua restituição, até à data da efectivação da mesma, acrescida dos juros legais vencidos e vincendos, à taxa legal».


Alega, em síntese, que o autor se limitou a pedir a condenação da ré, em face da resolução do contrato operada pela via judicial, numa indemnização pela ocupação ilícita do locado, pelo que tendo o contrato de arrendamento sido resolvido em 12.09.2023, venceu-se, passado um mês, a obrigação de restituir o locado, nos termos do art. 1087.º do CC, o que, não tendo sucedido implica que exista ocupação ilícita do locado, uma vez que a partir da referida data a ré constituiu-se em mora debitoris relativamente à obrigação de restituição do mesmo, sendo a indemnização pela ocupação ilícita do locado fixada ope legis no dobro da renda acordada, nos termos do art.º 1045º, nº 2, do CC.


Mais alega que este preceito foi oportunamente identificado no acórdão, mas o Tribunal, certamente por lapso manifesto, apenas condenou no pagamento de uma indemnização correspondente ao mero valor da renda mensal, o que corresponderia afinal ao mesmo valor de renda aplicável caso o contrato de arrendamento estivesse em vigor, sem qualquer penalização pela ocupação ilícita enquanto a mesma perdurou (e perdurar).


A ré nada disse.


Cumpre apreciar e decidir.


Adianta-se, desde já, assistir inteira razão ao autor/apelante.


Lê-se no Acórdão: «Em suma, o autor recorrente tem apenas direito ao pagamento de uma indemnização por ocupação ilícita, correspondente à renda mensal no valor de € 635,30 por cada mês de atraso na sua restituição (artigo 1045º, nº 2 do CC), a calcular até à data da restituição, acrescida dos juros legais que se vencerem, a contar do último dia de cada mês que sobrevier até efetivo e integral pagamento».


A mora do locatário quanto à obrigação de restituição depende da interpelação que o senhorio faça para a restituição do locado, interpelação que, em princípio, poderá efetuar logo que o contrato cesse, salvo no caso de resolução do contrato, em que a desocupação do locado apenas é, em regra, exigível no final do 1º mês seguinte à resolução [cfr. arts. 1081º, nº 1 e 1087º, ambos do CC].


In casu, tendo o contrato de arrendamento sido resolvido em 12.09.2023, podia o autor exigir à ré a desocupação do locado após o decurso de um mês a contar da resolução [art. 1087º do CC], o que o autor efetivamente fez, através do email de 19.10.2023 a que se alude no ponto 10 dos factos provados, constituindo-se a ré em mora a partir daquela data.


Estamos assim perante um lapso manifesto, pois apesar de se ter invocado no Acórdão a norma do art. 1045º, nº 2, do CC, como sendo aplicável ao caso, condenou-se a ré apenas no pagamento de uma indemnização de valor equivalente a um mês de renda, e não o dobro desse valor, como se impunha.


DECISÃO


Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em deferir o pedido de reforma do Acórdão proferido em 22.05.2025 e, em consequência, alteram a alínea b) do seu dispositivo, que passa a ter a seguinte redação:


«b) Condena-se a ré no pagamento de uma indemnização ao autor pela ocupação do locado, correspondente ao dobro da renda mensal, ou seja, € 1.270,60 [€ 635,30 x 2], a partir de 12.10.2023 – descontados os montantes referidos no ponto 13 dos factos provados - e por cada mês de atraso na sua restituição, até à data em que esta se venha a efetivar, acrescida dos juros legais vencidos e vincendos, à taxa legal.»


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Évora, 25 de junho de 2025


Manuel Bargado (relator)


Ricardo Miranda Peixoto


Susana Cabral


(documento com assinaturas eletrónicas)