CONTRATO A TERMO INCERTO
JUSTIFICAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO A TERMO
FORMALIDADES AD SUBSTANTIAM
Sumário

Sumário:
1. A cláusula de motivação do termo aposto ao contrato de trabalho tem por função permitir a verificação externa da conformidade da situação concreta com uma efectiva necessidade temporária da empresa, bem como a sua adequação face à duração estipulada.
2. A entidade patronal não pode suprir insuficiências na motivação do termo com recurso a outros factos não transcritos no contrato, pois está em causa uma formalidade ad substantiam.
3. A cláusula de motivação deve estabelecer o nexo causal entre a justificação invocada e o termo aposto ao contrato.
4. Não cumpre essa exigência a cláusula que afirma que o contrato é celebrado a termo incerto e terá o seu fim quando regressar a trabalhadora em licença sem retribuição, pois não basta dizer que a trabalhadora é contratada para substituir outra trabalhadora, é necessário justificar o porquê desse facto impor a aposição de um termo incerto ao contrato de trabalho.
5. Não se pode apor um termo incerto ao contrato de trabalho, celebrado para substituição de trabalhadora em licença sem retribuição, se a dita licença foi concedida por prazo certo.
6. A circunstância de, face ao disposto no art. 148.º n.ºs 1 e 5 do Código do Trabalho, na redacção da Lei n.º 93/2019, a duração legal máxima do contrato de trabalho a termo certo – dois anos – ser inferior à duração legal máxima do contrato a termo incerto – quatro anos – não permite invocar necessidades temporárias com prazo de duração previsível como justificação para a aposição de termo incerto ao contrato de trabalho.
7. Se a empregadora pretende contratar a termo uma trabalhadora para substituição indirecta de outra trabalhadora em licença sem retribuição, deve essa justificação constar expressamente do texto do contrato.
8. Cabendo à empregadora o ónus da prova dos factos que justificam a celebração de contrato de trabalho a termo, a falta de prova dos factos essenciais que demonstrariam que a trabalhadora foi efectivamente contratada para substituir outra trabalhadora, deve ser resolvida em desfavor da empregadora.

Texto Integral

Acordam os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:


No Juízo do Trabalho de Portalegre, AA demandou Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano, E.P.E., invocando a insuficiência da motivação do termo incerto aposto ao seu contrato de trabalho, a discriminação relativa à maternidade e falta de comunicação à CITE, a continuação da actividade por mais de 15 dias após a verificação do termo previsto, a falta de comunicação da cessação do contrato pelo meio de comunicação contratualmente previsto, e a ilegalidade de não concessão da preferência na admissão de novos trabalhadores.


Em consequência, pediu o reconhecimento que o seu contrato é sem termo e que o seu despedimento foi ilícito, sendo a Ré condenada a reintegrá-la no seu posto de trabalho e a pagar os salários de tramitação, bem como uma indemnização por danos não patrimoniais no valor de € 17.500,00. Caso assim não se entenda, deveria a Ré ser condenada a reconhecer a violação do direito de preferência na admissão da A., e mesmo que eventualmente se reconheça que se o contrato tem termo incerto, deve a ré ser condenada no pagamento de créditos salariais no valor de € 7.135,28.


Contestando, a Ré alegou a validade do termo incerto aposto ao contrato, e que este caducou pela cessação de funções da trabalhadora substituída. Mais alegou que a A. não se encontrava em igualdade de condições com a trabalhadora admitida posteriormente ao termo do contrato, por estar graduada em lugar posterior, e alega não serem devidos quaisquer créditos salariais, com ressalva dos relativos a formação profissional.


Após julgamento, a sentença decidiu julgar a acção parcialmente procedente, declarando a conversão do contrato de trabalho a termo incerto celebrado entre as partes em contrato de trabalho sem termo, com consequente ilicitude do despedimento, condenando a Ré a reintegrar a A. e a pagar-lhe as remunerações e demais créditos laborais vencidos e vincendos desde o dia 04.11.2023 e até ao trânsito em julgado da decisão ou até reintegração, caso esta ocorra antes do trânsito, acrescidas de juros, com desconto das quantias que a A. auferiu a título de subsídio de desemprego.


Mais condenou a Ré no pagamento da quantia de € 5.000,00 a título de ressarcimento de danos não patrimoniais.


Introduz a Ré a instância recursiva e formula as seguintes conclusões:

A. Sempre com o devido respeito, entende-se que a sentença recorrida, quer na decisão da matéria de facto e de direito encontra-se desconforme com a prova produzida como se verifica uma errada interpretação e aplicação das normas legais atinentes.

B. Impugnam-se assim os factos dados como provados nos pontos 3 e 28 da matéria de facto provada e C da matéria de facto dada como não provada. Passando a Recorrente de seguida a indicar os pontos concretos da sua discordância, e os concretos meios de prova que, no seu entender, importam decisão diversa

C. Entende a recorrente que, pelos elementos de prova produzidos e a seguir evidenciados não resulta que a Autora, tenha sido afecta ao serviço de medicina interna, ao departamento de psiquiatria, saúde mental e à área infanto-juvenil, no Hospital... em ....” Antes que desempenhou funções nesses serviços, nomeadamente do depoimento da testemunha da Autora, Dr.ª CC em 2024-06-19, que se encontram gravadas e disponíveis no sistema “Citius” com início 14:21 e fim 14:44, mais concretamente ao minuto 00:14:11 a 00:15:17, Assim como do depoimento da testemunha da Autora, Enf.ª DD em 2024-06-19, que se encontram gravadas e disponíveis no sistema “Citius” com início 15:04 e fim 15:14, mais concretamente ao minuto 00:05:15 a 00:07:05.

D. Pelos elementos de prova produzidos e supra evidenciados não resulta que a Autora admitida para desempenhar funções de técnica superior de serviço social, tendo sido afecta ao serviço de medicina interna, ao departamento de psiquiatria, saúde mental e à área infanto-juvenil, no Hospital... em ..., antes que desempenhou funções nesses serviços, devendo deverá ser alterada a redacção do ponto 3. Dos factos provados para a seguinte: 3. A Autora foi admitida para desempenhar funções de técnica superior de serviço social, tendo desempenhado funções no serviço de medicina interna, no departamento de psiquiatria, saúde mental e à área infanto-juvenil, no Hospital... em ....”

E. Entende a recorrente que a menção “para o exercício das funções da Autora”, como é feita no ponto 28. Dos factos provados, contraria a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento omitindo por um lado que o contrato com a Autora havia caducado e por outro que as profissionais ali mencionadas se encontravam posicionadas em lugares precedentes ao que a Autora ocupava na lista final homologada dos dois concursos descritos nos pontos 17 e 18 dos factos provados. Tal como resulta do depoimento da testemunha Dr.ª HH em 2024-11-13, que se encontram gravadas e disponíveis no sistema “Citius” com início 11:02 e fim 13:08, mais concretamente ao minuto 00:14:00 a 00:16:30.

F. Entende a recorrente que, pelos elementos de prova produzidos e infra evidenciados e dando como provado que a Que a Autora tenha sido contratada pela Ré para substituir a trabalhadora BB nas funções por esta desempenhadas, pelos fundamentos que a seguir se traçam. A redacção do ponto 28. deve ser alterada para: Em 14 de Dezembro de 2023, foi contratada a Sra. FF para o exercício das funções de assistente social, sendo irrelevante para a matéria de facto, no modesto entendimento da Recorrente, posteriores contratações.

G. Por referência os “Factos não provados “é expresso na decisão impugnada, no âmbito no ponto C, que o tribunal considerou não provado: “Que a Autora tenha sido contratada pela Ré para substituir a trabalhadora BB nas funções por esta desempenhadas.” Contudo, no entender da ora Recorrente, da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, de tais factos não pode o tribunal a quo retirar tal conclusão.

H. Desde logo, porque da prova produzida resulta precisamente o contrário, nomeadamente do depoimento da testemunha da Autora, Dr.ª CC em 2024-06-19, que se encontram gravadas e disponíveis no sistema “Citius” com início 14:21 e fim 14:44, mais concretamente ao minuto 00:04:30 a 00:07:10, a instâncias do ilustre mandatário da Autora, quando foi perguntado à testemunha da Autora Dr.ª CC “Tem conhecimento que a Dr.ª AA iniciou funções com a ULSNA para substituir a Dr.ª BB?” a testemunha foi peremptória em afirmar que sabia que a Autora” estaria a substituir outra Assistente Social. “E quando lhe foi perguntado, pelo Ilustre mandatário da Autora : “se a Dr.ª AA estava efectivamente a substituir a Dr.ª BB?” A testemunha explicou que “Existe uma coordenação do Serviço Social do hospital, que distribui os Assistentes Sociais conforme as necessidades dos serviços (…)”

I. O motivo justificativo para a contratação a termo para substituição de um trabalhador, a que se refere a norma do art.º 140 n.º 2 c) do Código do Trabalho é a própria ausência de um determinado trabalhador, irrelevando se sob essa ausência existe também uma situação de carência de recursos humanos num certo e determinado Serviço dos múltiplos que o empregador tenha.

J. Ora, carência de recursos humanos ou a necessidade permanente de um qualquer serviço da Recorrente não tem nenhuma correlação com a contratação da Recorrida, nem com a afectação desta a este ou àquele serviço, os trabalhadores da Recorrente são colocados em função das especificidades e das competências e formação do profissional, tal é por demais evidente e como resulta do depoimento da testemunha da Autora, Dra. EE em 2024-07-08, que se encontram gravadas e disponíveis no sistema “Citius” com início 10:23 e fim 11:03, mais concretamente ao minuto 00:42:40 a 00:43:28, assim como do depoimento da Dr.ª CC em 2024-06-19, que se encontram gravadas e disponíveis no sistema “Citius” com início 14:21 e fim 14:44, mais concretamente ao minuto 00:05:00 a 00:05:58.

K. A Autora, aqui Recorrida foi contratada para exercer as funções de técnica superior de serviço social no Hospital... ou em qualquer outra unidade de saúde de que a ULSNA, E.P.E. seja titular, isto é, foi contratada para exercer as mesmas funções da trabalhadora que consta do contrato como indo substituir, a técnica superior de serviço social Dra. BB, ou seja a Recorrida foi exercer as funções de técnica superior de serviço social que eram também as funções exercidas pela trabalhadora substituída.

L. Resulta, desde logo, da própria redacção da alínea c) do artº 140º, do CT que a substituição do trabalhador ausente ou temporariamente impedido de trabalhar pode ser estabelecida em cadeia, ao dispor-se que a substituição pode ocorrer directa ou indirectamente, em conformidade com aquele normativo, o trabalhador contratado a termo pode não substituir directamente o trabalhador ausente ou impedido, mas substitui-o indirectamente, substituindo outro trabalhador da empresa que se encontre a substituir o trabalhador ausente ou impedido.

M. Tem sido entendimento dos tribunais superiores que para que a substituição de trabalhador impedido temporariamente de prestar trabalho seja possível e conforme às exigências legais, não é forçoso que o trabalhador substituto contratado a termo vá desempenhar as mesmas funções que eram exercidas pelo trabalhador substituído (Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra de 17.12.2014, proc.63/13.9TVIS.C1, in www.dgsi.pt, acórdão da Relação do Porto de 19.03.2018, proc. N.º 27258/15.8T8PRT.P1 escreveu-se que “ Salvo melhor opinião, o que está em causa é preencher um posto de trabalho de enfermeiro impedido de prestar a sua actividade por ausência temporária, isto é, de menos um elemento no conjunto dos trabalhadores enfermeiros, que tanto podem desempenhar funções num ou noutro serviço, desde que sejam salvaguardados os limites decorrentes do contrato e das normas que o regem).

N. Para justificar a apontada invalidade do termo resolutivo, o tribunal a quo conclui que, sem qualquer fundamento perceptível que: “Compulsados os autos, verifica-se que os motivos que determinam a contratação a termo incerto resolutivo – alegada substituição de técnica superior de serviço social ausente por motivo de licença sem vencimento – não têm correspondência com a realidade. Com efeito, os factos que o justificam e o suportam apontam em sentido diverso da contratação a termo, fazendo-se menção expressa às dificuldades sentidas pela Ré na área social, o que, desde logo aponta no sentido da contratação se dever ao suprimento de necessidades de carácter permanente da Ré. Ora, contrariamente ao pretendido pela Ré aquando da contratação da Autora, esta desempenhou funções que não são coincidentes com as funções anteriormente desempenhadas pela Técnica Superior de Serviço Social ausente, BB.

O. Salvo melhor opinião, do depoimento das testemunhas não se retira que “Autora desempenhou funções que não são coincidentes com as funções anteriormente desempenhadas pela Técnica Superior de Serviço Social ausente” Antes, que a Recorrida desempenhou funções em serviços distintos daqueles em que prestou a trabalhadora substituída.

P. É de resto o que se retira, nomeadamente das declarações prestadas pela testemunha Dra. CC, em 2024-06-19, que se encontram gravadas e disponíveis no sistema “Citius” com início 14:21 e fim 14:44, mais concretamente ao minuto 00:04:30 a 00:07:12 e declarações prestadas pela testemunha Dra. EE, em 2024-07-08, que se encontram gravadas e disponíveis no sistema “Citius” com início 10:23 e fim 11:09, mais concretamente ao minuto 00:05:03 a 00:04:30, e do minuto 00:27:26 ao 00:33:16.

Q. Na perspectiva do julgador de primeira instância, o facto da Recorrida desempenhar funções em serviços distintos daquele em que a BB prestava é, por si só, suficiente para dar como não provado que que a Recorrida tenha sido contratada pela Recorrente para substituir a trabalhadora BB nas funções por esta desempenhadas.

R. Concluiu o tribunal a quo, sem motivo perceptível, que o motivo aposto no contrato de trabalho da Autora foi simulado, e consequentemente decidiu que deve ter-se por não escrita a cláusula relativa à motivação da contratação a termo incerto e o contrato de trabalho celebrado entre Autora e Ré considerar-se sem termo.

S. Entende a Recorrente que os elementos de prova, impõem a alteração da matéria de facto devendo dar-se com provado que a Autora foi contratada pela Ré para substituir a trabalhadora BB nas funções por esta desempenhadas.

T. Concluindo, o contrato de trabalho a termo resolutivo, celebrado entre a Autora e a Ré foi celebrado para satisfação de necessidade temporária da Ré, designadamente a substituição da técnica de serviço social BB, em situação de licença sem retribuição, possível face ao disposto nos n.ºs 1, 2 al. c) e n.º3, do artigo 140.º do CT, devidamente justificada e demonstrados os factos dessa justificação, não obstando à sua possibilidade legal de celebração de contrato a termo incerto, o facto da autora ter sido mantida em serviços distintos daqueles onde a trabalhadora substituída desempenhou as mesmas funções.

U. Em face do acabado de concluir, entende a Recorrente que falece o pressuposto que levou o tribunal a quo a decidir no sentido da conversão do contrato a termo incerto em contrato sem termo, com as legais consequências.

A resposta sustenta a manutenção do decidido.


Já nesta Relação, a Digna Magistrada do Ministério Público emitiu o seu parecer, no sentido da manutenção da sentença recorrida.


Cumpre-nos decidir.

Da impugnação da matéria de facto

Reconhecendo, preliminarmente, que se encontram preenchidos os requisitos previstos no art. 640.º n.º 1 do Código de Processo Civil, começa a Ré por pretender a alteração da decisão quanto ao ponto 3 do elenco fáctico, alegando que a A. não foi “afecta ao serviço de medicina interna, ao departamento de psiquiatria, saúde mental e à área infanto-juvenil, no Hospital... em ...”, mas apenas que “desempenhou funções nesses serviços.”


Pretende, pois, a Ré que no ponto 3, a expressão “tendo sido afecta” seja substituída pela expressão “tendo desempenhado funções”, no que talvez não seja apenas uma mera alteração semântica, parecendo reflectir a posição desta no sentido de a A. não ter desempenhado em simultâneo funções no serviço de medicina interna e nos demais serviços.


Nesta Relação de Évora tem sido afirmado que o art. 662.º n.º 1 do Código de Processo Civil não se basta com a possibilidade de uma alternativa decisória, antes exige que o juízo efectuado pela primeira instância esteja estruturado num lapso relevante no processo de avaliação da prova.1


Na apreciação da impugnação fáctica, a Relação não deve atender, apenas, aos meios de prova indicados pelo recorrente ou pelo recorrido, pois detém poderes de investigação oficiosa – art. 640.º n.º 2 al. b) do Código de Processo Civil –, devendo apreciar a globalidade da prova produzida, analisando criticamente as provas e retirando as ilações que se mostrarem necessárias, como o determina o art. 607.º n.º 4 do mesmo diploma.


No entanto, não se detecta na sentença recorrida qualquer lapso relevante na apreciação da prova quanto a esta matéria, que imponha decisão diversa a esta Relação, devendo afirmar-se que a prova produzida sustenta a decisão de facto proferida pela primeira instância.


Com efeito, após audição da prova gravada, concluímos que a decisão quanto ao ponto 3 tem suficiente respaldo quer nas declarações de parte prestadas pela A., descrevendo de forma pormenorizada a sua acumulação de funções no serviço de medicina interna, com as que desempenhava no departamento de psiquiatria e saúde mental e na área infanto-juvenil, em depoimento corroborado pelas testemunhas CC, médica psiquiatra, DD, enfermeira no serviço de medicina ala esquerda, e EE, médica psiquiatra na área da psiquiatria infanto-juvenil, todas confirmando que a A. desempenhava funções nos respectivos serviços.


Assim, porque nada nos permite afirmar que a prova produzida impõe decisão diversa quanto ao ponto 3, nesta parte improcederá a impugnação.


*


Quanto ao ponto 28, no qual se deu como provado que “(…) em 14 de Dezembro de 2023, foi contratada a Sra. FF para o exercício das funções da Autora, tendo após essa data sido igualmente contratada a Sra. GG para o exercício das funções da Autora”, pretende a Ré que se altere para a seguinte redacção: “Em 14 de Dezembro de 2023, foi contratada a Sra. FF para o exercício das funções de assistente social.”


A Ré entende que é irrelevante a ocorrência de contratações posteriores, e que a pessoa contratada em 14.12.2023 estava graduada em posição anterior no concurso mencionado no ponto 18 do elenco fáctico.


No entanto, quanto à posição da A. no referido concurso, já está provada no ponto 18, e não se mostra totalmente irrelevante a circunstância de ter sido contratada uma segunda pessoa para o exercício das funções de assistente social, nomeadamente para a discussão da questão relativa à efectiva existência de uma necessidade permanente, e não meramente temporária, de trabalhadores para o desempenho das funções atribuídas à A..


E visto que a testemunha EE confirmou que a partir de Janeiro de 2024 o trabalho que era desempenhado pela A. passou a ser desempenhado por outra pessoa admitida após a cessação de funções da trabalhadora, também se entende dever esta parte da impugnação improceder.


*


Na alínea C) do elenco de factos não provados, a sentença declarou não provado o seguinte: “Que a Autora tenha sido contratada pela Ré para substituir a trabalhadora BB nas funções por esta desempenhadas.”


Entende a Ré que se deve dar como provado que a A. foi contratada para substituir a trabalhadora BB nas funções por esta desempenhadas.


Para o efeito, argumenta que a A. foi contratada para exercer as funções de técnica superior de serviço social, que eram as mesmas funções da trabalhadora substituída. Acrescenta que a substituição do trabalhador ausente ou temporariamente impedido de trabalhar pode ser estabelecida em cadeia, pelo que o trabalhador contratado a termo pode não substituir directamente o trabalhador ausente ou impedido, mas substituí-lo indirectamente, substituindo outro trabalhador da empresa que se encontre a substituir o trabalhador ausente ou impedido.


Mas o que importa, quanto a esta alegação fáctica, é demonstrar se foi produzida prova de a A. ter sido efectivamente contratada para substituir a trabalhadora BB nas funções que esta desempenhava.


A Ré não alega a data em que a trabalhadora substituída entrou em licença sem retribuição, de modo a ser possível estabelecer uma relação causal entre esse facto e a admissão da A., e certo é que era seu ónus fazer prova que foi efectivamente para substituição dessa trabalhadora que a A. foi admitida – ou, pelo menos, provar a cadeia de substituições a que procedeu, de modo a ser possível concluir que teria ocorrido, pelo menos, uma substituição indirecta.


Essa prova a Ré não a logrou estabelecer, tanto mais que as testemunhas CC, DD e EE, revelaram que a A. exerceu funções em serviços onde nunca a BB desempenhou funções, que estava afecta à unidade de cuidados paliativos, em posição já ocupada por outra assistente social quando a A. foi admitida – e ninguém testemunhou acerca da cadeia de substituições que teria levado à admissão da A., notando-se, em especial, que a testemunha HH, a actual directora de recursos humanos, não estava no exercício dessas funções quando a A. foi admitida e, consequentemente, ignorava as circunstâncias exactas de contratação desta trabalhadora.


Neste ponto, pois, também a impugnação não procede.


*


Em resumo, a impugnação fáctica improcede na sua totalidade.


Fica assim estabelecida a matéria de facto provada:

1. A Ré dedica-se à actividade de prestação de cuidados de saúde, integrando duas unidades hospitalares e diversas Unidades Funcionais de Cuidados de Saúde Primários.

2. Em 13 de Fevereiro de 2020, a Autora obrigou-se, mediante pagamento da quantia mensal ilíquida de 1.201,48 €, acrescida de subsídio de alimentação no valor de 4,77 €, a desempenhar, sob autoridade, direcção e fiscalização de Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano, E.P.E. as funções de técnica superior de serviço social no Hospital... ou em qualquer outra unidade de saúde de que a ULSNA, E.P.E. seja titular, conforme documento particular junto a fls. 44 e ss. e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

3. A Autora foi admitida para desempenhar funções de técnica superior de serviço social, tendo sido afecta ao serviço de medicina interna, ao departamento de psiquiatria, saúde mental e à área infanto-juvenil, no Hospital... em ....

4. Mercê do supra exposto, a Autora tinha como funções:

1. Acompanhar o doente, a sua família e outros membros da rede pessoal de suporte, com vista a promover a autonomia e o bem-estar da população;

2. Apoiar os serviços de internamento, consultas externas e ambulatório, realizando-se visitas domiciliárias quando necessário;

3. Acompanhar a programação das altas hospitalares, de forma a proporcionar uma adequada reintegração na comunidade;

4. Contribuir para acções de humanização, qualidade e eficiência na prestação de cuidados da ULSNA E.P.E.;

5. Promover o apoio psicossocial do utente, estabelecendo, a articulação com as redes primárias, secundárias e rede social de suporte dos indivíduos/famílias;

6. Avaliar e encaminhar para a RNCCI - Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados sempre que se justifique, em conjunto com a restante equipa multidisciplinar;

7. Realizar reuniões de equipa com vista a discussão dos casos com necessidade de acompanhamento e encaminhamento social;

5. Na cláusula Primeira do contrato mencionado em 2 pode ler-se:

1- O presente contrato é celebrado por período incerto: com início em 10 de Fevereiro de 2020 e fim, aquando do regresso da Técnica Superior de Serviço Social BB que se encontra de licença sem remuneração.

2- De acordo com o disposto no nº 4 do artigo 148º da Lei 7/2009, de 12 de Fevereiro, a duração deste contrato não pode exceder 6 (seis) anos.

3- No final do termo estipulado, a trabalhadora cessa a sua actividade.”

6. Na cláusula segunda do contrato mencionado em 2 pode ler-se o seguinte:

1- O serviço social do Hospital... da ULSNA, E.P.E. encontra-se com dificuldades na área social.

2- A ULSNA, E.P.E. tem necessidade de contratar um trabalhador para exercer funções equivalentes às desenvolvidas por técnico superior de serviço social.

4- O presente contrato de trabalho é celebrado a termo incerto ao abrigo no disposto na alínea a) do Artigo 140º da Lei nº 7/2009 de 12 de Fevereiro uma vez que esta admite em situações de «a) Substituição directa ou indirecta de trabalhador ausente ou que, por motivo, se encontre temporariamente impedido de trabalhar;», aquando do regresso da técnica superior de serviço social BB, que se encontra de licença sem remuneração. (…)”

7. À data da cessação de funções, a Autora auferia o vencimento mensal de € 1.385,99 (mil trezentos e oitenta e cinco euros e noventa e nove cêntimos).

8. A Autora tinha o seguinte horário de trabalho: de segunda a sexta-feira, das 9:00 horas às 16:00 horas.

9. A partir de 21 de Abril 2023 e até 4 de Novembro de 2023, data em que cessou funções, a Autora beneficiava do estatuto de trabalhadora lactante e o seu horário de trabalho era das 10:00 horas às 15:00 horas.

10. Em 3 de Maio de 2022, a Autora ficou de baixa médica (CIT), por gravidez de risco, devido aos serviços em que exercia funções, bem como, devido ao contágio pelo vírus SARS-CoV-2 (COVID-19) no primeiro trimestre de gravidez, até ao nascimento do seu filho, em 19 de Outubro de 2022.

11. Em 19 de Julho de 2022, a Ré comunicou à Autora a cessação do seu contrato por caducidade.

12. Após diligências da Autora, que contactou a Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE), a Directora de Recursos Humanos da Ré contactou a Autora justificando que tinha existido uma pequena confusão, pois tinham pedido parecer à CITE e esta não se teria manifestado e que por esse motivo não haveria alteração do posto de trabalho.

13. Mercê do supra exposto, a Autora manteve-se no seu posto de trabalho.

14. Após o nascimento do filho, em 19 de Outubro de 2022, a Autora esteve de licença de maternidade até 20 de Abril de 2023 e de seguida em regime de trabalhadora lactante.

15. No ano 2021 foram abertos dois concursos com vista à constituição de reserva de recrutamento, um para posterior celebração de contrato de trabalho a termo resolutivo incerto e outro para posterior celebração de contrato de trabalho sem termo, sendo ambos para postos de trabalho cujas funções correspondiam ao conteúdo funcional da carreira de Técnico Superior, na área de Serviço Social, tendo tais reservas de recrutamento uma duração de vinte e quatro meses.

16. A Autora teve conhecimento de tais processos de recrutamento, sendo que, um seria para contratação temporária, ou seja, para substituição de trabalhadores ausentes e outro para vínculo laboral sem termo.

17. O concurso com vista à constituição de reserva de recrutamento para posterior celebração de contrato de trabalho a termo resolutivo incerto, apenas teve Avaliação Curricular, tendo a Autora ficado em 5º lugar na lista final homologada.

18. O concurso com vista à constituição de reserva de recrutamento para posterior celebração de contrato de trabalho sem termo, teve Avaliação Curricular e Entrevista, tendo a Autora ficado colocada em 12º lugar na lista final.

19. Em 7 de Setembro de 2021, a Autora recebeu via email comunicação por parte da Ré com o seguinte teor: “Informa-se que foi autorizado por deliberação de 21/07/2021 do Conselho de Administração, a renovação da licença sem remuneração, pelo período de dois anos, com efeitos a partir de 01 de Setembro de 2021. Pelo exposto, o contrato a termo incerto celebrado com a ULSNA, EPE, foi prorrogado até 31/08/2023.”

20. A Autora continuou assim a prestar o seu serviço à Ré e ainda antes de Agosto de 2023, teve conhecimento, através de colegas de trabalho, que a mencionada BB, tinha entrado através de concurso público como professora, no Instituto Politécnico de ....

21. O despacho de homologação da lista definitiva de ordenação final do referido concurso público no qual BB ficou colocada em primeiro lugar, data de 2 de Agosto de 2023.

22. Em 5 de Setembro de 2023 a Autora é informada pela Ré, via email, de que BB tinha denunciado o contrato de trabalho existente entre eles, com efeitos a partir de dia 01/09/2023 e que por tal motivo o contrato de trabalho da Autora iria cessar com efeitos a partir de 4 de Novembro de 2023.

23. Passados alguns dias após a comunicação via email da caducidade do seu contrato a Autora invocou o direito de preferência, nos termos do disposto no nº1, do artigo 145º do Código do Trabalho.

24. Tendo para tanto entregue em mão à directora do departamento dos Recursos Humanos da Ré, HH, documento a invocar a referida preferência.

25. Passados sensivelmente 30 dias, a Autora recebeu um parecer jurídico, do serviço jurídico da Ré, com a concordância e aprovação do Conselho de Administração da Ré, no sentido do indeferimento do requerido.

26. A Ré não comunicou à CITE a cessação do contrato de trabalho da Autora.

27. EE, médica psiquiatra, estando ao corrente de toda a situação, reuniu com o Presidente do Conselho de Administração da Ré, tendo-lhe transmitido a sua preocupação com a saída da Autora de funções, dada a experiência entretanto adquirida na área da psiquiatria infanto-juvenil, argumentos que não mereceram o acolhimento do Presidente do Conselho de Administração da Ré.

28. E, em 14 de Dezembro de 2023, foi contratada a Sra. FF para o exercício das funções da Autora, tendo após essa data sido igualmente contratada a Sra. GG para o exercício das funções da Autora.

29. A Autora manteve-se no exercício das suas funções até 4 de Novembro de 2023, momento a partir do qual se encontra sem ocupação laboral, passando a receber um subsídio de desemprego de € 836,00 mensais.

30. Em virtude da cessação do vínculo, em Novembro de 2023, a Ré pagou à Autora o montante de 4.193,59 €.

31. Mercê do supra exposto, a Autora sofreu elevados níveis de stress e ansiedade, que determinaram o seu acompanhamento médico e medicamentoso.

32. A situação de desemprego gerou dificuldades financeiras que afectaram as relações familiares e conjugais, tendo a Autora que recorrer ao apoio dos progenitores para manter a estabilidade financeira.

33. Após a Autora entrar em baixa por motivo de gravidez de risco, a Ré solicitou parecer à CITE no dia 1 de Junho de 2022, tendo a CITE apenas emitido parecer no dia 26 de Julho de 2022, que a Ré recebeu em 27 de Julho de 2022.

34. Logo que teve conhecimento do parecer da CITE, desfavorável à cessação do contrato da Autora, a Ré revogou a sua decisão, tendo mantido o posto de trabalho da Autora, dando-lhe conhecimento de tal.

35. No ano 2023, a Autora teve 42 horas de formação.

36. Nos anos 2020, 2021 e 2022, a Autora não teve qualquer formação.

37. A trabalhadora BB não desempenhava funções no serviço de psiquiatria, adultos e crianças, nem no serviço de medicina, ala esquerda.

APLICANDO O DIREITO


Da indicação do motivo justificativo do termo


Impõe o art. 141.º n.º 1 al. e) do Código do Trabalho, na celebração de contrato de trabalho a termo, o dever de indicação do termo estipulado e do respectivo motivo justificativo, esclarecendo o n.º 3 que «a indicação do motivo justificativo do termo deve ser feita com menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado.»


A lei não se basta, assim, com a mera descrição de conceitos de direito, ou fórmulas genéricas, sob pena da exigência legal de justificação da aposição de termo poder ser facilmente iludida e proporcionar a precarização da relação laboral. Exige-se que a motivação do termo aposto ao contrato permita a verificação externa da conformidade da situação concreta com uma efectiva necessidade temporária da empresa, bem como a adequação da justificação invocada face à duração estipulada para o contrato.2


Apenas será considerado motivo justificativo do termo a necessidade do empregador que seja concretizada no texto contratual, através da “menção expressa dos factos” que integram o aludido motivo. As razões determinantes da forma do negócio opõem-se a que a vontade real dos contraentes possa ter relevância na afirmação da validade da estipulação do termo, se essa vontade não estiver expressa no texto do contrato. Por outro lado, ao impor a necessidade de relacionar a justificação invocada e o termo estipulado, a lei pretende que o nexo causal entre o motivo invocado e a duração do contrato resulte da apreciação formal da cláusula contratual de motivação do termo, não bastando, pois, a mera descrição da justificação e a indicação do prazo.


Como já se referiu, a cláusula de motivação do termo tem por função permitir a verificação externa – por parte do trabalhador, dos serviços de inspecção do trabalho e do próprio Tribunal – da conformidade da situação concreta com as tipologias legais e a realidade e a adequação da própria justificação invocada face à duração estipulada para o contrato. Deste modo, a entidade patronal não pode suprir insuficiências na motivação do termo, com recurso a outros factos, não transcritos no contrato mas que pretenda trazer a juízo – a verificação externa da conformidade legal do termo aposto, faz-se através da análise dos fundamentos de facto constantes do próprio texto do contrato, sendo irrelevantes outros motivos determinantes da vontade dos contraentes, se a mesma não estiver expressa no texto contratual.3


Está em causa, pois, uma formalidade ad substantiam, sendo certo, de todo o modo, que cabe sempre ao empregador a prova dos factos que justificam a celebração do contrato a termo – art. 140.º n.º 5 do Código do Trabalho.


Analisando o contrato dos autos, a cláusula de motivação do termo invoca o art. 140.º n.º 2 al. a) do Código do Trabalho, mas visto que estava em causa a substituição de uma trabalhadora que se encontrava na situação de licença sem retribuição, a alínea aplicável seria outra, a c).


Nos arts. 7.º, 8.º, 128.º, 129.º, 130.º e 133.º da sua petição inicial, a A. alega que o clausulado do contrato não fundamenta a sua duração previsível, em violação do exigido pelo art. 141.º n.º 1 al. e) do Código do Trabalho, e que tal implica a transformação do contrato a termo em contrato sem termo, face ao art. 147.º n.º 1 al. c) do mesmo diploma.


É desde logo notório que a cláusula de motivação aposta no contrato não efectua qualquer relação entre a justificação invocada – a substituição da trabalhadora BB, na situação de licença sem retribuição – e o termo incerto aposto ao contrato.


Com efeito, o clausulado limita-se a dizer que o contrato é celebrado a termo incerto, e terá o seu fim quando regressar a aludida trabalhadora. Mas não estabelece o necessário nexo causal entre essa justificação e o termo incerto estipulado, em violação do que a esse respeito se exige no art. 141.º n.º 1 al. e) e n.º 3, in fine, do Código do Trabalho.


Note-se que não bastava dizer que a A. era contratada para substituir outra trabalhadora, era necessário justificar o porquê desse facto impor a aposição de um termo incerto ao contrato de trabalho.


Estaria a trabalhadora substituída na situação de licença sem retribuição por período indefinido, e por esse motivo o termo imposto ao contrato da A. era incerto?


Nada é dito a esse respeito no texto do contrato, e os factos apurados permitem concluir que o termo, na realidade, não era incerto, pois a licença da trabalhadora BB havia sido concedida por prazo certo.


Como resulta do email que a A. recebeu no dia 7 de Setembro de 2021 – descrito no ponto 19 dos factos provados – aquela trabalhadora encontrava-se na situação de licença sem retribuição até 31.08.2021, tendo o conselho de administração da Ré deliberado renovar essa licença, pelo período de dois anos, com efeitos a partir de 01.09.2021.


O texto daquele email termina, dizendo: “Pelo exposto, o contrato a termo incerto celebrado com a ULSNA, EPE, foi prorrogado até 31/08/2023”, o que, para além da contradição dos seus próprios termos (o termo incerto, afinal, tem data certa pré-determinada), também revela a contradição patente no contrato dos autos, ao qual foi aposto um termo incerto com base numa justificação de termo certo (a licença concedida à trabalhadora BB até 31.08.2021, depois prorrogada até 31.08.2023, por decisão da própria Ré).


A circunstância de, face ao disposto no art. 148.º n.ºs 1 e 5 do Código do Trabalho, na redacção da Lei n.º 93/2019, a duração legal máxima do contrato de trabalho a termo certo – dois anos – ser inferior à duração legal máxima do contrato a termo incerto – quatro anos – não permite invocar necessidades temporárias com prazo de duração previsível como justificação para a aposição de termo incerto ao contrato de trabalho.


E esta questão é especialmente relevante no caso dos autos, dado que o contrato de trabalho da A. durou 3 anos, 8 meses e 25 dias, ultrapassando, em muito, a duração máxima admissível para o contrato com termo certo.


Não se argumente que a Ré não podia ter a certeza de a licença sem retribuição concedida à trabalhadora BB, até 31.08.2021, se iria prolongar. O que importa para fundamentar a justificação do termo aposto ao contrato de trabalho é a situação de facto existente à data da sua celebração, Fevereiro de 2020, que no caso era a concessão de uma licença sem retribuição por prazo certo – para além que a decisão de prorrogar essa licença por mais dois anos, que a Ré deliberou em 21.07.2021, era uma faculdade desta, pois podia conceder a prorrogação ou não a conceder, e tal não serve de fundamento para afastar os preceitos legais imperativos relativos à duração máxima dos contratos de trabalho a termo certo.


Deste modo, porque o texto do contrato não estabelece o necessário nexo causal entre a justificação invocada e o termo incerto aposto ao contrato, porque os elementos de factos apurados permitem concluir que a justificação invocada tinha termo certo, e também porque foi largamente excedida a duração máxima admissível para o contrato a termo certo, sempre se deveria considerar o contrato dos autos como sem termo, face ao disposto no art. 147.º n.º 1 als. a) e c) e n.º 2 al. b) do Código do Trabalho.


Argumenta a sentença que o contrato se deve considerar sem termo porque “os motivos que determinam a contratação a termo incerto resolutivo – alegada substituição de técnica superior de serviço social ausente por motivo de licença sem vencimento – não têm correspondência com a realidade. Com efeito, os factos que o justificam e o suportam apontam em sentido diverso da contratação a termo, fazendo-se menção expressa às dificuldades sentidas pela Ré na área social, o que, desde logo aponta no sentido da contratação se dever ao suprimento de necessidades de carácter permanente da Ré. Ora, contrariamente ao pretendido pela Ré aquando da contratação da Autora, esta desempenhou funções que não são coincidentes com as funções anteriormente desempenhadas pela Técnica Superior de Serviço Social ausente, BB.”


Concordamos com este raciocínio, e explicaremos porquê.


No Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26.09.2007 (Proc. 07S1933, publicado no endereço da DGSI), é sumariado o seguinte:

“VI – Não é possível validamente associar a contratação de uma trabalhadora à substituição de uma outra que entrou de baixa, devendo considerar-se inverídico o motivo invocado, se a trabalhadora substituída exercia as suas funções na “Secção de Fabrico e Montagem de Rádios” e a trabalhadora substituta prestou trabalho à empresa durante cerca de quatro anos – inicialmente ao abrigo de contratos de trabalho temporário e, cinco dias após o último destes contratos, no âmbito do questionado contrato de trabalho a termo incerto –, fazendo-o sempre na “Secção de Fabrico de Módulos”, ainda que estas duas secções se integrem no mesmo “Departamento” da empresa e neste os trabalhadores prestem normalmente a sua actividade de forma rotativa.

VII – As funções da trabalhadora substituída atendíveis não podem ser as que esta iria hipoteticamente desempenhar à data em que veio a ser contratada a substituta, na medida em que um juízo hipotético não é passível de prova, o que sempre impediria o seu controlo pelo tribunal, em ostensiva derrogação dos comandos legais que disciplinam a contratação a termo.

VIII – Havendo dúvidas quanto a saber se determinado trabalhador foi contratado para substituir outro, a incerteza probatória daí decorrente reverte contra o empregador (art. 519.º do CPC).”

Comentando este aresto, Joana Nunes Vicente, no Prontuário de Direito do Trabalho, n.º 82, Janeiro-Abril, 2009, págs.171 a 187, escreve o seguinte:

“Bem vistas as coisas, o tribunal ter-se-ia dado conta que o motivo justificativo invocado para a celebração do contrato a termo – embora formalmente válido, numa dupla acepção, quer porque devidamente mencionado no texto contratual, quer porque efectivamente havia uma trabalhadora ausente – teria apenas funcionado como um “pretexto” para a celebração de (mais) um vínculo precário com aquela trabalhadora. Até porque essa circunstância – a de a celebrar contratos a termo (cadeias de sucessivos de contratos a termo) baseados em motivos formalmente válidos – é uma circunstância em relação à qual os próprios empregadores podem ter acesso com relativa facilidade. Para o ilustrar, basta atentar em dois tipos de situações. Em primeiro lugar, um fenómeno frequente no nosso tecido empresarial: uma empresa sub-dimensiona o seu quadro de pessoal efectivo (contratado por tempo indeterminado), porventura sabendo que aquele quadro será insuficiente para prover à satisfação integral das necessidades normais da empresa; uma vez que, para recorrer à contratação a termo tem de invocar uma razão objectiva para o efeito, conta de modo sistemático com as ausências naturais e necessárias que os trabalhadores do quadro efectivo de pessoal suscitam e convoca-as como justificação para celebrar os referidos contratos a termo. O trabalhador a prazo está formalmente a suprir necessidades transitórias – leia-se, a substituir formalmente um trabalhador ausente – mas, funcionalmente, pode muito bem-estar a suprir outro tipo de necessidades, estas sim permanentes, que o quadro do pessoal efectivo sub-dimensionado não consegue satisfazer.”

No caso, consta da cláusula segunda do contrato que o serviço social do hospital explorado pela Ré encontra-se com dificuldades na área social e que tem necessidade de contratar um trabalhador para exercer funções equivalentes às desenvolvidas por técnico superior de serviço social.


Se estes factos apontam para a existência de uma necessidade permanente – a área social de um hospital distrital carece, obviamente, de técnicos superiores de serviço social, e tal é reconhecido no contrato – não está justificado o porquê da Ré ter permitido uma vacatura de quadros nessa área, ao conceder a licença à trabalhadora BB, tanto mais que, face ao art. 317.º n.º 1 do Código do Trabalho, a concessão de licença sem retribuição por mais de 60 dias é uma faculdade do empregador, que este pode ou não conceder, ponderando, entre outros critérios, as suas necessidades de serviço e a disponibilidade de pessoal para substituir o trabalhador que assim deixa de exercer as suas funções.


Ademais, não está provado quando foi concedida essa licença – sabe-se que estava concedida até 31.08.2021, e depois foi prorrogada até 31.08.2023, mas ignora-se quando teve o seu início – e está estabelecida a dúvida acerca da contratação da A. se ter destinado, efectivamente, a substituir a BB.


Não apenas se ignora quando esta entrou em licença sem retribuição, de modo a ser possível estabelecer um nexo causal entre esse facto e a contratação da A., como os factos apurados – nomeadamente, no ponto 37 – revelam que a BB nunca desempenhou funções no serviço de psiquiatria, adultos e crianças, nem no serviço de medicina, aos quais a A. foi afecta, colocando assim a dúvida acerca da efectiva substituição de uma trabalhadora pela outra.


Certo que o art. 140.º n.º 2 al. c) do Código do Trabalho permite a substituição indirecta de trabalhador em situação de licença sem retribuição. Mas também é certo que esse motivo justificativo – a substituição indirecta – deve constar do contrato, porque assim o exige o art. 141.º n.º 1 al. e), e do texto do contrato celebrado pelas partes nada é dito a esse respeito.


Diz-se, tout court, que o contrato foi celebrado para substituição de outra trabalhadora em licença sem retribuição, os factos que justificariam uma substituição indirecta não são sequer mencionados.


Dado que, face ao art. 140.º n.º 5 do Código do Trabalho, cabe ao empregador o ónus da prova dos factos que justificam a celebração de contrato de trabalho a termo, a falta de prova dos factos essenciais que demonstrariam que a A. foi efectivamente contratada para substituir a trabalhadora BB, deve ser resolvida em desfavor da Ré, de acordo com a regra geral do art. 414.º do Código de Processo Civil.


Assim, bem decidiu a sentença ao considerar o contrato sem termo, porque tal é o que prescreve o art. 147.º n.º 1 al. b) do Código do Trabalho.


Visto que outras questões não são lançadas no recurso, resta confirmar a sentença recorrida.


DECISÃO


Destarte, nega-se provimento ao recurso e confirma-se a sentença recorrida.


Custas pela Ré.


Évora, 25 de Junho de 2025


Mário Branco Coelho (relator)


Paula do Paço


Emília Ramos Costa

____________________________________________

1. Vide, por todos, o Acórdão de Relação de Évora de 30.06.2021 (Proc. 2287/15.3T8STR-E.E1), publicado em www.dgsi.pt.↩︎

2. Neste sentido, António Monteiro Fernandes, in Direito do Trabalho, 13.ª ed., 2006, págs. 318/9.↩︎

3. Neste sentido, cfr. os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 18.06.2008 (Proc. 08S936), de 28.04.2010 (Proc. 182/07.0TTMAI.S1), de 09.06.2010 (Proc. 1389/07.6TTPRT.S1), de 02.12.2013 (Proc. 273/12.6T4AVR.C1.S1) e de 17.03.2016 (Proc. 2695/13.6TTLSB.L1.S1), todos disponíveis em www.dgsi.pt.↩︎