PETIÇÃO INICIAL
REJEIÇÃO DO REQUERIMENTO
NÚMERO DE IDENTIFICAÇÃO DE PESSOA COLECTIVA
Sumário

I. Sendo a entidade demandada uma pessoa colectiva abrangida pelo regime jurídico do Registo Nacional de Pessoas Colectivas, considerando o disposto no art. 552º, n.º1, al. a), e 2, do CPC, e tendo o articulado inicial sido remetido electronicamente por mandatário judicial constituído, cabia ao autor, em princípio, identificar a entidade demandada, referindo a sua designação social, sede e número de identificação de pessoa colectiva, sendo esse também o seu número de contribuinte fiscal.
II. A omissão de indicação dos elementos mencionados no articulado inicial legitima a rejeição pela secretaria de tal articulado, ao abrigo do art. 558º, n.º1, al. b), do CPC.
III. Cumpre, porém, atender a que, por força do disposto no número três do art. 558º do Cód. Civil, afigura-se lícito ao autor não indicar, no articulado inicial, o número de identificação de pessoa colectiva da entidade que demanda quando alegue não lhe ter sido possível obter essa informação.
IV. Na situação mencionada, a referência ao número de identificação de pessoa colectiva da entidade demandada não constitui elemento de identificação desta que deva constar obrigatoriamente do articulado inicial, pelo que a sua omissão não constitui fundamento para a secretaria rejeitar tal articulado, atento o disposto no art. 558º, n.º1, al. b), do CPC.

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa

I – RELATÓRIO.
AA intentou a presente acção, com a forma de processo comum, contra:
1ª - Entreposto Lisboa – Comércio de Viaturas S.A., Praça José Queiroz n.º 1, 1800-237 Lisboa;
2º - Carby Motors, S.A., Av. Dr. Gordinho Moreira, n.º 9, 8005-518 Faro;
3ª - Nissan Portugal, S.A., Lagoas Park, Edifício 10, Piso 2, 2740-244 Porto
Salvo;
4º - Nissan Ibéria, S.A.U, Lagoas Park, Edifício 4, 2740-267 Porto Salvo;
5ª - Caetano Power S.A., Rua do Barreiro, n.º 547, 4409-513 Vila Nova da Gaia;
6º - RCI Banque – Sucursal Portugal, Lagoas Park, Edifício 15, piso 2, 2740-262 Porto Salvo.
Formulou o seguinte pedido:
a. Ser judicialmente declarado resolvido o contrato de compra e venda automóvel celebrado entre o A. e as 1ª e 2ª RR.;
b. Ser judicialmente declarado resolvido o contrato de financiamento automóvel celebrado entre o A. e a 6ª R., e aquele desobrigado do pagamento das respetivas prestações;
c. Serem as 1.ª, 2ª, 3ª, 4ª e 5ª RR. condenadas solidariamente a restituir ao A. o preço pago pelo veículo, nos montantes de € 13.000,00, correspondente à entrada entregue para aquisição do veículo e € 5.005,56, que corresponde aos total das prestações do contrato de mútuo vencidas e suportadas pelo A. até à entrada da petição inicial;
d. Serem as mesmas RR. condenadas solidariamente a pagar ao A. Os juros vencidos sobre tais quantias, à taxa legal de 4%, desde o dia 18.11.2024, que perfazem já o montante de € 221,00, acrescido dos que se vencerem até efetivo e integral pagamento;
e. Serem as mesmas RR. condenadas solidariamente a reembolsar o A. das demais prestações do contrato de mútuo que se venham a vencer e sejam pagas pelo A., acrescidas igualmente dos respetivos juros de mora, cujos montantes oportunamente se liquidará;
f. Serem as 1ª, 2ª, 3ª, 4ª e 5ª RR. condenadas solidariamente a pagar ao A. uma indemnização nos montante de € 3.930,00 e de € 1.020,00, a título de privação do uso do veículo automóvel, acrescida da indemnizações à taxa diária de € 30,00 desde a data de entrada da petição inicial até efetivo e integral pagamento, tudo acrescido de juros de mora vencidos desde a data da citação, igualmente até efetivo e integral pagamento;
g. Serem as 1ª, 2ª, 3ª, 4ª e 5ª RR. condenadas solidariamente a pagar ao A. o proporcional do prémio de seguro automóvel de que não beneficiou, no montante de € 551,82 (quinhentos e cinquenta e um euros e oitenta e dois cêntimos), acrescido de juros desde a citação e até efetivo e integral pagamento, a que acrescem ainda eventuais prémios que se venham a vencer na pendência dos autos, a liquidar;
h. Serem as 1ª, 2ª, 3ª, 4ª e 5ª RR. condenadas solidariamente no pagamento de indemnização ao A. pelos danos não patrimoniais sofridos em montante não inferior a 3.000.00€;
i. Ser judicialmente declarado que a título de parqueamento nada haverá a pagar pelo A. a qualquer das RR;
j. Serem as RR., condenadas nas custas do processo, tudo com as devidas consequências legais.
A petição inicial foi remetida a Tribunal, por via electrónica, pela Ilustre Mandatária do autor, no dia 13-03-2025, tendo o processo sido distribuído electronicamente.
Em sede de identificação da ré Nissan Portugal, S.A., no requerimento que deu origem aos presentes autos, o autor, além de fazer constar essa designação, inscreveu o seguinte:
Morada: Lagoas park, Edifício 10, Piso 2,
Código Postal: 2740-244 Porto Salvo,
NIF: Declaro não ser possível obter a informação (art. 552º, n.º3, do CPC).
*
A 14-03-2025, o autor, na pessoa da sua Ilustre Mandatária, foi notificado da pela Secretaria nos seguintes termos:
“Assunto: Artº 17.º da Portaria 280/2013, de 26 de agosto
Nos termos do art.º 17.º da Portaria n.º 280/2013, de 26 de agosto com as alterações introduzidas pela Portaria 170/2017, de 13 de março, fica notificado, na qualidade de Mandatário, e relativamente ao processo supra identificado, da recusa da petição inicial apresentada, em conformidade com o "print" em anexo e pesquisas infrutíferas sem NIF.
Do ato de recusa da petição inicial poderá apresentar reclamação, nos termos do n.º 1 do art.º 559.º do CPC. Decorrido o prazo para a reclamação da recusa, ou, havendo reclamação, após o trânsito em julgado da decisão que confirme o não recebimento, considera-se a peça recusada, dando-se a respetiva baixa na distribuição.
Prazo: 10 dias
O/A Oficial de Justiça,
(…)”
A notificação referida incluiu cópia de uma consulta realizada na aplicação TMenu para pesquisa de dados de identificação da ré Nissan Portugal, SA, da qual resulta a ausência de resultados para tal consulta.
*
A 27-03-2024, o autor, escudando-se no art. 559º, n.º1, do CPC, apresentou reclamação da decisão de recusa da petição inicial pela Secretaria, pedindo a sua revogação e o seguimento da tramitação dos autos, em que alegou, em síntese, que:
- A petição inicial foi rejeitada por falta de indicação do número de identificação de apenas uma das seis rés demandadas;
- O motivo invocado para a recusa da petição pela Secretaria, previsto no art. 552º, n.º1, al. a), do CPC, não se verifica;
- a ré Nissan Portugal, S.A., mostra-se identificada, sendo que, do art. 552º do CPC, não resulta a obrigatoriedade de indicação do NIF da mesma na petição inicial;
- o que o Legislador pretendeu é que haja elementos mínimos que permitem citar o sujeito que se quis demandar e não outro, como de resto resulta literalmente do nº 3 do artº 552º CPC, quando se diz que se necessário a secretaria pratica determinados atos, visando garantir a identificação unívoca da parte;
- o Legislador não pretendeu que um lesado não possa exercer judicialmente o seu direito, por desconhecer sem culpa, um elemento de identificação de um dos vários réus que entende responsáveis pelo ressarcimento do seu dano, muito menos, fazer cair uma petição inicial contra seis réus por desconhecimento do NIF de um deles;
- tal afigurar-se-ia, salvo o devido respeito, injusto, desajustado e inconstitucional, por ofensa ao princípio acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva, previsto no Artº 20º da Constituição da República Portuguesa;
- de resto, o entendimento da Secretaria, para além dar proteção a relapsos que propositadamente omitam os seus elementos de identificação e não ter expressão no elemento literal da lei, é totalmente alheio às demais regras processuais, que inclusivamente permitem a demanda contra incertos e contra ausentes em parte incerta, situações em que, não se procederá à indicação, nem de nome, nem de morada, muito menos de números de identificação fiscal, conforme dispõem os arts. 22º e 236º CPC;
*
A 04-04-2025, foi proferida decisão que julgou a reclamação deduzida pelo autor improcedente, com os seguintes termos:
Nos presentes autos veio a A. apresentar petição inicial contra, entre outros, Nissan Portugal, S.A., indicando quanto a esta uma morada e não o respectivo NIF.
Ao abrigo do disposto no art. 17.º da Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto e nos termos do art. 558.º do C.P.C., foi recusada a petição inicial pela secretaria em virtude de a não apresentação do NIF ter impossibilitado a realização de pesquisas.
Deste acto veio a A. reclamar.
Determina o art. 17.º da Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto que tendo sido efetuada a distribuição eletrónica ou tendo sido os atos processuais praticados e apresentados eletronicamente, deve a unidade de processos verificar a ocorrência dos fundamentos de recusa previstos nas alíneas f) e h) do artigo 558.º do Código de Processo Civil. Ora, compulsado o teor daquelas alíneas, é por demais evidente que existe lapso na subsunção jurídica indicada pela secretaria no acto de recusa.
Não obstante, determina o art. 558.º n.º 1 b) do C.P.C. que cabe à secretaria recusar o recebimento da petição inicial quando seja omitida a identificação das partes e dos elementos a que alude a alínea a) do n. 1 do art. 552.º que dela devam obrigatoriamente constar. Com base na parte final da alínea a) do n.º 1 do art. 552.º do C.P.C. vem o A. arguir não existir obrigatoriedade de indicação do número de contribuinte.
Sucede que está em causa uma pessoa colectiva. Assim, a respectiva citação segue as normas previstas no 246.º do C.P.C.
Ora, o print junto aos autos a 14/03/2025 revela precisamente que sem a indicação do número de contribuinte daquela R. não é possível à secção proceder às diligências legais para citação de pessoa colectiva, não sendo possível obter qualquer informação através de qualquer pesquisa, ou seja, sem tal elemento não se encontra devidamente identificada a parte, verificando-se que não se encontra cumprido o ónus que impõe a alínea a) do n.º 1 do art. 552.º do C.P.C., pelo que actuou a secretaria legitimamente ao abrigo do já referido artigo 558.º n.º 1 b) do C.P.C.
Nos termos e pelos fundamentos expostos, confirma-se o não recebimento da petição inicial.
Notifique.
*
A 06-05-2025, o autor interpôs recurso da decisão referida, apresentando as seguintes conclusões, que se transcrevem:
A. O presente recurso vem colocar em crise o despacho que confirmou o não recebimento da petição inicial pela secretaria com fundamento na falta de indicação do número de identificação fiscal da 4ª Ré porque tal, no entendimento do tribunal a quo, é impeditivo da sua citação.
Porquanto,
B. Da leitura do art. 558º n.º1 alínea b) do C.P.C. não resulta, salvo melhor opinião, a obrigatoriedade de indicação do NIF da contraparte, mas tão só a de Autor indicar o seu próprio NIF.
C. Com efeito, atente-se desde logo às expressões “deve o autor” e “sempre que possível”, quando se refere à indicação dos elementos de terceiros, contraposta à expressão “obrigatoriamente”, quanto respeita aos do próprio Autor.
D. Além do mais, os termos conjugados dos nºs 2, 3, 4 e 5 do Artº 552º C.P.C revelam, sem margem para dúvidas, que a falta de NIF de pessoa coletiva em caso algum fundamenta a rejeição da petição inicial,
E. Em todo o caso, uma interpretação, que coartasse o acesso à justiça por preterição de um elemento formal e a que o A. não tem livre acesso, configuraria na verdade uma flagrante e insustentável denegação de justiça e daria cobertura a devedores relapsos que propositadamente omitissem os seus elementos de identificação,
F. Para além disso, tal interpretação da lei é totalmente alheia às demais regras processuais, que inclusivamente permitem a demanda contra incertos e contra ausentes em parte incerta conforme dispõem os Artº22º e o Artº 236º ambos do Código de Processo Civil.
G. Dito isto, inexiste pois cominação legal para a falta da indicação daquele elemento de identificação fiscal, não tendo por isso a recusa fundamento legal!
H. De todo o modo, no caso dos autos, a 4ª Ré, devidamente identificada na petição inicial, através da sua designação e morada, utilizadas em fase extra judicial, para a troca, com sucesso, de diversa correspondência,
I. Pelo que, os elementos de identificação fornecidos pelo Recorrente são suficientes e seguros para permitir de forma unívoca citar a Ré, satisfazendo assim a ratio da norma do artigo 552º n.º1 alínea b) do C.P.C.
J. Por outro lado, no caso concreto, é flagrante o desequilíbrio do entendimento plasmado no douto despacho a quo, que decidiu rejeitar uma petição inicial contra 6 (seis) Réus por desconhecimento do NIF de um deles!
K. É assim evidente que o douto despacho recorrido, ao confirmar o não recebimento da petição inicial, faz uma errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 552º n.º1 alínea a) e 558º alínea b) ambos do C.P.C, o que por sua vez viola o disposto no artigo 18 n.º2 e 20º da Constituição da República Portuguesa.
L. Termos em que, deverá o despacho recorrido ser revogado e substituído por douto Acórdão revogue a recusa da petição inicial e que mande prosseguir os ulteriores termos da ação, ordenando a citação de todas as RR.
Em todo o caso,
M. Diga-se que não é possível concluir previamente pela impossibilidade de citação, como fez o douto despacho, sem que tenha sido empreendida uma única diligência com vista à citação da Ré em causa!
N. Nos termos do art. 552º n.º4 e 5 do C.P.C, ao invés da recusa infundada e injusta cabia à secretaria consultar o sistema de suporte à atividades dos tribunais e, frustrando-se esta, proceder ao preenchimento do formulário disponibilizado para o efeito, o que no entanto não foi levado a cabo,
O. Bem assim, para além de precipitada, a decisão recorrida é também desproporcional e por esse motivo prejudica gravemente a tutela dos interesses do Recorrente, violando, como se disse, o disposto nos artigos 18º n.º4 e 20º da C.R.P.
Por outro lado,
P. Na vertente da cooperação do tribunal com as partes, uma vez que não está ao alcance do Recorrente, mesmo atuando com a diligência devida, obter a informação do NIF da 4ªR. cabia ao douto tribunal a quo promover pela remoção de tal obstáculo, o que manifestamente não fez,
Q. Pelo que, dado à insuficiência de diligências promovidas pelo douto Tribunal a quo o despacho recorrido violou ainda o disposto no artigo 7º n.º4 do C.P.C.
Sem prescindir,
R. Acresce que, no caso em apreço, o Recorrente intentou a presente ação na qualidade de consumidor com vista à reparação do seu dano, decorrente do defeito de um veículo automóvel adquirido por si, pelo qual responsabiliza as 6 (seis) Rés demandadas, estas na qualidade de comerciantes e produtores respetivamente,
S. Assim, para além de descurar a frágil posição do consumidor a cominação de recusa da petição inicial, por desconhecimento do número de identificação fiscal, decidida pelo douto despacho recorrido, é manifestamente incompatível com os mecanismos de defesa e proteção do consumidor adotados pela ordem jurídica, designadamente com a figura da justiça acessível e pronta,
T. Pelo que, para além de violar o princípio da proporcionalidade previsto no artigo 18º n.º4 da C.R.P., a decisão recorrida viola desde logo viola disposto no artigo 3º alíneas e) f) e g) da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho.
U. Sem prejuízo, mesmo que não fosse possível a citação pessoal, o que não se concede mas por mera cautela se equaciona, em última ratio ao invés de recusar a petição inicial caberia ao Tribunal a quo diligenciar pela citação edital da 4ºRé nos termos do art. 235º n.º1 última parte e n.º6 do mesmo artigo aplicáveis por força do art. 246º n.º 1 todos os C.P.C.
V. Assim sendo, uma vez que não foram esgotados todos os mecanismos legalmente previstos com vista à sua citação, verifica-se pois, que o douto Tribunal a quo salvo o devido respeito negligenciou o disposto no art. 235º n.º6 do C.P.C.
W. Por tudo o exposto, deverão V. Exªs dar provimento ao presente recurso, revogando o despacho que confirmou o não recebimento da petição inicial e fazendo assim seguir a ação ordenando a citação das RR., com as designações e moradas indicadas, que são suficientes para tanto.
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Não foi apresentada resposta ao recurso.
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A 02-06-2025, o recurso foi admitido, com subida nos autos e com efeito devolutivo, o que não foi alterado neste Tribunal.
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II.
1.
As conclusões da alegação do recorrente delimitam o objeto do recurso, sem prejuízo da ampliação deste a requerimento do recorrido (arts. 635º, n.º4, 636º e 639º, n.º1 e 2 do CPC). Não é, assim, possível conhecer de questões nelas não contidas, salvo se forem do conhecimento oficioso (art. 608º, n.º2, parte final, ex vi do art. 663º, n.º2, parte final, ambos do CPC).
Também não é possível conhecer de questões novas – isto é, de questões que não tenham sido objeto de apreciação na decisão recorrida –, uma vez que os recursos são meros meios de impugnação de prévias decisões judiciais, destinando-se, por natureza, à sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação.
Tendo isto presente, no caso, atendendo às conclusões transcritas, a intervenção deste Tribunal de recurso é circunscrita à seguinte questão:
- Saber se a decisão impugnada incorre em erro de direito ao confirmar a recusa da petição inicial decidida pela Secretaria.
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2.
A factualidade a ponderar na presente decisão é a que resulta da marcha do processo, acima descrita, que aqui se dá por reproduzida.
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3.
Na apreciação da questão acima enunciada, importa reter que, por força do disposto no art. 552º, n.º1, al. a), do CPC, na redacção dada pelo DL n.º 87/2024, de 07-11 (que entrou em vigor a 10-11-2024 – art. 18º do diploma referido), na petição inicial, com que propõe a acção, o autor deve, além do mais, identificar as partes, indicando os seus nomes, domicílios ou sedes, número de identificação fiscal ou número de identificação de pessoa colectiva e, obrigatoriamente, no que respeita a si, autor, e sempre que possível, relativamente às demais partes, números de identificação civil, profissões e locais de trabalho.
De acordo com o estatuído no número dois do mesmo artigo, para o efeito da identificação das partes que sejam pessoa colectiva nos termos da alínea a) do número 1, o mandatário judicial constituído pelo autor que apresente a petição inicial por via electrónica indica o respectivo número de identificação de pessoa colectiva ou, relativamente às entidades não abrangidas pelo regime jurídico do Registo Nacional de Pessoas Colectivas, o seu número de identificação fiscal, ficando esta identificação sujeita a confirmação no sistema informático de suporte à actividade dos tribunais, o qual devolve, para validação, os dados constantes das bases de dados do ficheiro central de pessoas colectivas do Registo Nacional de Pessoas Colectivas ou da Autoridade Tributária e Aduaneira, consoante os casos.
Para efeitos no acabado de referir, e visando garantir a identificação unívoca da parte, a secretaria, nos casos em que o autor tenha indicado não lhe ser possível obter essa informação, pode efectuar, através do sistema de informação de suporte à actividade dos tribunais, pesquisas nas bases de dados do ficheiro central de pessoas colectivas do Registo Nacional de Pessoas Colectivas ou da Autoridade Tributária e Aduaneira (cfr. número 3 do mesmo artigo).
Por força do disposto no número 4 do artigo em referência, sendo a identificação da parte efectuada nos ternos dos números dois e três, a informação prevista no n.º1, al. a), é transmitida aos sistema informático de suporte à actividade dos tribunais pelas bases de dados do ficheiro central de pessoas colectivas do Registo Nacional de Pessoas Colectivas ou da Autoridade Tributária e Aduaneira, podendo a mesma ser actualizada, de forma automática, durante o processo, sempre que ocorrer alteração nas referidas bases de dados.
Caso a parte a identificar seja pessoa colectiva cuja informação não conste das bases de dados do ficheiro central de pessoas colectivas do Registo Nacional de Pessoas Colectivas ou da Autoridade Tributária e Aduaneira, ou caso por motivos técnicos não seja possível a identificação nos termos dos números anteriores, a identificação é efectuada através do preenchimento do formulário disponibilizado no sistema informático de suporte à actividade dos tribunais, nos termos a definir na portaria prevista no art. 132º, n.º2, a qual regulamente, igualmente, o disposto nos números anteriores, como decorre do número cinco do art. 552º do CPC.
Para a economia da presente decisão releva, ainda, que, por força do disposto no art. 558º, n.º1, al. b), do CPC, na versão dada pelo DL n.º 97/2019, de 26-07, actualmente vigente, a omissão de identificação das partes e dos elementos a que alude o art. 552º, n.º1, al. a), do CPC, constitui fundamento de rejeição da petição inicial.
Decorre do art. 558º, n.º2, do CPC, que a verificação dos fundamentos de rejeição elencados no número anterior é efectuada pelo sistema de informação de suporte à actividade dos tribunais, ou, quando tal não seja tecnicamente possível, pela Secretaria, nos termos definidos na portaria prevista no art. 132º, n.º2, do CPC.
Na decisão recorrida assume-se o entendimento de que, por força do disposto no art. 552º, n.º1, al. a), do CPC, o autor está obrigado a indicar, na petição inicial, o número de identificação fiscal (NIF) da entidade demandada Nissan Portugal, SA., sendo que o não cumprimento de tal ónus importa a rejeição desse articulado, a operar pela Secretaria.
O recorrente discorda, invocando que as normas convocadas na decisão não importam a rejeição da petição inicial em caso de omissão da indicação do NIF da entidade demandada.
Importa reter que o autor, no requerimento que deu origem aos presentes autos, refere expressamente que não logrou aceder ao número de identificação fiscal da entidade Nissan Portugal, SA, que demanda.
Sendo a entidade demandada uma pessoa colectiva abrangida pelo regime jurídico do Registo Nacional de Pessoas Colectivas, considerando o disposto no art. 552º, n.º1, al. a), e 2, do CPC, na versão acima referida, e tendo o articulado inicial sido remetido electronicamente por mandatário judicial constituído, cabia ao autor, em princípio, identificar a entidade demandada, referindo a sua designação social, sede e número de identificação de pessoa colectiva, sendo esse também o seu número de contribuinte fiscal.
A omissão de indicação dos elementos acabados de referir no articulado inicial legitima, em princípio, a secretaria a rejeitar tal articulado, ao abrigo do art. 558º, n.º1, al. b), do CPC, na versão acima referida.
Cumpre, porém, atender a que, por força do disposto no número três do mesmo artigo, afigura-se lícito ao autor não indicar, no articulado inicial, o número de identificação de pessoa colectiva da entidade que demanda quando alegue não lhe ter sido possível obter essa informação.
Na situação referida no parágrafo anterior, a referência ao número de identificação de pessoa colectiva da entidade demandada não constitui elemento de identificação desta que deva constar obrigatoriamente do articulado inicial.
No circunstancialismo mencionado, não sendo elemento de identificação da parte demandada que deva constar obrigatoriamente da petição inicial, a sua omissão não constitui fundamento para a secretaria rejeitar tal articulado, atento o disposto no art. 558º, n.º1, al. b), do CPC.
Conclui-se, face ao referido, pela ausência do fundamento legal para a recusa da petição inicial pela Secretaria e, consequentemente, para a sua confirmação pela decisão impugnada.
Responde-se, assim, afirmativamente à decisão acima identificada.
A decisão impugnada deve ser revogada e substituída por outra que julgue a reclamação procedente e, em consequência, determine o prosseguimento da respectiva tramitação.
Face ao referido, mostra-se prejudicada a apreciação da demais argumentação expendida no recurso.
*
Conclui-se, assim, pela procedência do recurso.
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6.
O recorrente, porque dele tirou proveito, deverá suportar as custas do recurso (art. 527º, n.º1, do CPC).
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III.
Em face do exposto, acordam os Juízes Desembargadores que compõem o Colectivo desta 2ª Secção em julgar o recurso procedente e, em consequência:
a. Revogam a decisão recorrida;
b. Julgam a reclamação deduzida pelo autor a 27-03-2025 procedente;
c. Determinam o prosseguimento da tramitação dos autos.
Custas do recurso pelo recorrente.
Notifique.
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Lisboa, 26 de Junho de 2025.
Os Juízes Desembargadores,
Fernando Caetano Besteiro
Paulo Fernandes da Silva
João Paulo Raposo