SEGURO DE VIDA
SEGURO DE GRUPO
CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS
NULIDADE
EXCLUSÃO DE CLÁUSULA
Sumário


I - Estando em causa contrato de seguro (ramo vida) ajustado com base em cláusulas contratuais previamente definidas entre a seguradora e o tomador do seguro (o banco), como acontece em geral neste tipo de contratos, incumbe à ré comprovar o cumprimento do ónus legal da devida informação ao autor da cláusula contratual geral em que se concretiza o conceito de Invalidez Absoluta e Definitiva.
II- Resultando da matéria de facto provada que a ré, por intermédio da entidade bancária, cumpriu todos os deveres de informação a que estava obrigada, podendo prevalecer-se da referida cláusula-base de cobertura do risco, incumbe ao segurado o ónus de provar a(s) ocorrência(s) concreta(s) em conformidade com as situações descritas na mesma, como facto(s) constitutivo(s) do seu direito de indemnização.
III - Tal assenta, necessariamente, em pressupostos fácticos que devem ser alegados, de forma a permitir a sua indiciação e integração na cláusula-base de cobertura do risco, pois o sinistro é a ocorrência concreta do risco assim previsto no contrato, devendo reunir as mesmas características com que é ali configurado.
IV - A cobertura de Invalidez Absoluta e Definitiva deve ser interpretada como correspondendo à situação em que o segurado, por doença ou acidente, fique completa e definitivamente impedido de exercer uma qualquer atividade remunerada e, consequentemente, impossibilitado de auferir rendimentos que lhe permitam fazer face à obrigação que assumiu perante a entidade bancária.

Texto Integral


Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

I. Relatório

BB instaurou ação de processo comum contra EMP01..., formulando os seguintes pedidos:
«a) Declarar abusiva e, por isso, nula a cláusula inserta no contrato de seguro de vida celebrado entre as partes sob a apólice supra identificada referente à definição de Invalidez Absoluta e Definitiva da Pessoa Segura, na parte em que estabelece como condição de verificação do risco “o recurso à assistência permanente de uma terceira pessoa para os actos básicos da vida diária, incluindo necessariamente a dependência total de terceiros para a higiene e alimentação”;
b) Declarar verificado o risco por o Autor se encontrar, em virtude das doenças que padece, numa situação de invalidez absoluta e definitiva;
c) Caso assim não se entenda, excluir a dita cláusula, por violação dos deveres de informação na parte onde refere “o recurso à assistência permanente de uma terceira pessoa para os actos básicos da vida diária, incluindo necessariamente a dependência total de terceiros para a higiene e alimentação”.
d) Condenar sempre a Ré Seguradora a pagar ao beneficiário Banco, o remanescente em dívida com respeito ao crédito à habitação concedido ao Autor;
e) Condenar a Ré Seguradora a reembolsar ao Autor as prestações por este pagas ao Banco Beneficiário desde pelo menos a data da Junta Médica ou seja, de 22/11/2021 ou da sua data de invalidez, se a mesma for fixada em data anterior, bem como os prémios de seguro e demais despesas pagas por si.

Subsidiariamente,
Deve a presente ação proceder por provada e por via disso:
a) Declarar-se a ativação do seguro de vida identificado nos presentes autos, com efeitos pelo menos a partir de 22/11/2021, ou sobre a data de fixação de invalidez do Autor, se for anterior a esta, data anterior a esta, por verificação do risco coberto;
b) Condenar-se a Ré EMP01... a pagar ao Banco 1... o valor em dívida do empréstimo identificado nos artigos 2º e 3º da P.I., à data do trânsito em julgado da sentença;
c) Condenar-se a Ré EMP01... a pagar ao Autor o valor correspondente às prestações mensais dos empréstimos (amortizações de capital, juros, spread e despesas, designadamente comissão de processamento e imposto de selo inerente) vencidas após 22.11.2021 (ou sobre a data de fixação da sua invalidez, se for anterior a esta), inclusive, até à presente data, no montante de 1635.50€ (ou no montante preciso que o Banco 1... indique) e todas as demais que o Autor pagar doravante até integral pagamento pela Ré.
d) Deve a Ré ser condenada a restituir ao Autor a quantia relativa aos prémios dos seguros de vida pagos por si e referentes ao mesmo período, no valor de 380,55€ (apenas estão contabilizados desde 22/11/202) e todos os demais que o Autor pagar doravante, até integral pagamento pela Ré.
Para o efeito alega que em 2016 celebrou com a ora ré um contrato de seguro associado a um contrato de mútuo destinado à aquisição de prédio para sua habitação, celebrado com o Banco 1...; o seguro cobria os riscos de morte e invalidez absoluta e definitiva ou outros riscos por acidente e/ou doença, até ao limite do capital mutuado e dentro das condições acordadas, mas quando o contratou foi-lhe dito que garantia o pagamento do empréstimo caso ficasse inválido e incapacitado para o trabalho; quando adquiriu a sua casa tinha 60 anos de idade, tendo-lhe sido concedido o crédito por 15 anos (180 meses), ou seja até aos seus 75 anos de idade; sempre considerou que o seguro cobriria uma situação de invalidez, como a que entretanto passou a padecer, tendo sido sujeito a uma junta médica a 22 de novembro de 2021, onde lhe foi atribuída uma incapacidade permanente global de 75%, com natureza definitiva; porém, tendo acionado o contrato de seguro, a ré declinou a sua responsabilidade no pedido de reembolso, alegando que o seu estado clínico não se enquadra no conceito de invalidez definitiva para a profissão ou atividade compatível definido nas Condições Especiais do seguro que subscreveu. Conclui que a referida cláusula, na parte em que estabelece como condição de verificação do risco “o recurso à assistência permanente de uma terceira pessoa para os atos básicos da vida diária, incluindo necessariamente a dependência total de terceiros para a higiene e alimentação, tem de ser considerada nula, por abusiva e contrária à boa fé, sendo desadequada e desproporcional e por isso abusiva, já que exige que fique praticamente num estado vegetativo, e que ao excluir esta exigência, o risco corrido pela ré seguradora em virtude da celebração do contrato de seguro deve ter-se por verificado. Se assim não se entender, então terá a referida cláusula que ser parcialmente excluída, designadamente na parte onde é exigido que além da incapacidade para o exercício de qualquer atividade, também terá de estar dependente de terceiros, por se verificar uma clara violação dos deveres de informação por parte da ré, na forma como lhe comunicaram as condições do seguro.
A ré contestou. Aceita ter celebrado com o autor um seguro de vida associado ao crédito à habitação, mas sustenta que aquando da contratação deu integral cumprimento aos deveres de informação a que estava obrigada; que a pessoa segura foi devidamente informada das cláusulas contratuais do seguro a que aderia, as quais lhes foram, inclusivamente, entregues; que o autor nunca antes solicitou qualquer esclarecimento e que a assinatura aposta no boletim de adesão, atesta, precisamente, que todos os esclarecimentos e informações relativamente aos contratos subscritos foram prestados de forma clara, integral e pormenorizada, que o autor as compreendeu e entendeu para a tomada de decisão consciente que tomou, de contratar. Por outro lado, não faz sentido declarar esta cláusula como não escrita, porquanto seria uma violação do equilíbrio contratual o qual é conseguido através da estipulação de determinadas condições específicas para cada tipo de contrato, designadamente em contrapartida do prémio de seguro suportado pelo tomador, o que permitiria uma efetiva ameaça ao importantíssimo papel social e económico desempenhado pelas companhias de seguro, e que não se pode penalizar a seguradora por uma escolha que foi do segurado, tendo o mesmo livremente optado por celebrar aquele contrato de seguro, e não outro, consciente da opção pela cobertura mais restritiva.
Realizou-se a audiência final, após o que foi proferida sentença julgando a ação totalmente improcedente, absolvendo a ré de todos os pedidos formulados.

Inconformado, o autor apresentou-se a recorrer, pugnando no sentido da revogação da sentença, terminando as respetivas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem):
«(…)
1-O I. Tribunal aquo julgou a presente ação improcedente, absolvendo a Ré dos pedidos.
2- Não pode concordar com esta decisão e por isso o A. apresenta o presente recurso.
3- Entende que face á prova produzida, se impõem uma alteração á matéria de facto, designadamente o ponto 25 dos factos dados por provados, que deveria ser julgado não provado e reconhecer que a Ré, por intermédio do Banco não cumpriu os deveres de informação a que estava obrigada para com o A., não lhe dando a conhecer as cláusulas contratuais do mesmo.
4- O ponto 26 impõe-se que tenha uma redação diferente face á prova produzida devendo ler-se o seguinte: “É prática do Banco 1... e da Ré proceder à entrega das Condições Gerais e Especiais do produto, desconhecendo-se se tal ocorreu neste caso em concreto”.
5-Também deverá ser dado como não provado a 2ª parte do ponto 28, já que o I. tribunal não pode concluir que o A. subscreveu um seguro e posteriormente aderiu a outro com uma cobertura menor.
6- Ao inverso, os factos considerados não provados inseridos nas alíneas b),c),i), j) e K devem ser dados por provados.
7º Esta alteração á matéria de facto tem como fundamento a prova produzida em Audiência de Julgamento e constante nos autos, designadamente os depoimentos das testemunhas AA e CC que relataram genericamente os procedimentos adoptados aquando da contratação dos seguros de vida, mas em concreto sobre o seguro contratado pelo A. nada concretizaram, não se recordando e tendo duvidas sobre a forma como o mesmo foi efetuado (quando o responsável pelo processo seria, de acordo com a testemunha da Ré, DD, o Sr AA).
8º Não souberam explicar a existência de duas propostas de seguro associadas ao mesmo credito e ambas assinadas pelo A./recorrente no mesmo dia, apenas afirmando que não é normal tal acontecer, sendo subscrita uma proposta e apenas essa é enviada para a C. de Seguros.
9º Não se sabe como foi escolhido o seguro em vigor, já que a Ré, não juntou aos autos a pertinente informação, bem como por quem foi dada e se teve a intervenção do A./Recorrente.
10º O depoimento da testemunha EE, filha do A., que é relevante para fundamentar esta alteração, já que acompanhou a contratação do crédito (conforme consta na douta sentença recorrida) e que foi clara quando declarou que lhe foi dito e ao seu pai que o seguro cobriria caso “ficasse doente, invalido ou desempregado, acamado ou morte”. 
11º O depoimento do A. foi objetivo quando referiu que disse á funcionaria do Banco que queria o seguro mais caro.
12º A prova documental existente nos autos, designadamente os docs 1, 6 e 7 juntos pela Recorrida, onde se afere a existência de duas propostas de seguro com coberturas diferentes associadas ao mesmo credito, subscritas no mesmo dia pelo A..
13º No doc.1 verifica-se que não está definido o conceito do seguro alegadamente subscrito pelo A.
14º Não se pode concluir que o A. foi devidamente informado das condições/cláusulas dos seguros porque tal seria a pratica normal, já que no caso em concreto, ele subscreveu duas propostas diferentes, sem que fosse adiantada qualquer motivação para tal e muito menos que tivesse sido devidamente informado que o seu seguro apenas funcionaria “ Quando na pessoa segura se verifique uma incapacidade total para o exercício de qualquer atividade, necessitando do recurso á assistência permanente de uma terceira pessoa para os atos básicos da vida diária, incluindo necessariamente a dependência total de terceiros para a higiene e alimentação”.
15º Resulta também da comunicação da Ré/recorrida ao A., vertida nos factos 20 e 21 dados por provados, onde se verifica a confusão da própria Ré/recorrida na definição do seguro que alegadamente foi subscrito pelo A./recorrente.
16º Cabia á Ré/recorrente o ónus da prova sobre esses factos, nos termos do 5º3 do RJCCG, o que na nossa opinião não logrou fazer e por isso inversamente terá de ser dados por provados os factos nas alíneas alíneas b),c),i), j) e K.
17º Também os factos inseridos na alínea m) terá de ser dado por provado, já que a falta de pagamento dos valores ai inseridos levaria á resolução por incumprimento dos contratos de mútuo e de seguro, o que não ocorreu, podendo e devendo a liquidação desses valores ser feita posteriormente.
18º Ao assim, o I. Tribunal não ter entendido violou o artigo 5º3 do RJCCG tendo incorrido em erro de julgamento, também com violação dos artigos 607º 5 do CPC, 341º e 344º 1 do C.C.
19º Face á alteração da matéria de facto, deverá ser dado por verificado o sinistro em causa, devendo o conceito de “Invalidez absoluta e definitiva” ser considerado preenchido pelo A..
20º Mesmo em caso de dúvida sobre os factos em causa (designadamente sobre a violação dos deveres de informação), aproveita o A/recorrente, face ao disposto no artigo 414º do CPC e ao assim não ter decidido, o I. Tribunal violou esse preceito legal.
21º Deverá ser considerava nula por abusiva a exigência por parte da seguradora em que a cláusula de Invalidez absoluta e definitiva também comporte a necessidade de dependência de terceira pessoa para os atos básicos de alimentação e higiene, tendo o I. Tribunal ao assim não ter decido, violado os artigos os Art.s 15.º e 16.º do Dec.Lei n.º 446/85 de 25/10.
22º Considerando nula essa clausula, deverá ser dado como verificado o sinistro, por a incapacidade do A./Recorrente preencher o conceito de Invalidez Absoluta e definitiva exigida pelo contrato, com recurso á sua interpretação nos termos do artigo 236º1 do CC.
23º Ao assim o I. Tribunal não ter decidido, violou essa disposição legal.
24º Será sempre responsável a Ré/recorrida perante o Autor, pela violação dos direitos de informação, mesmo que tenham sido cometidos pelo Banco, já que o mesmo atuou como seu mediador e não apenas como Tomador de seguro.
25º Ao assim não ter considerado o I. Tribunal violou os artigos 30º, 31 e 78º, nº 1, do DL nº 72/2008, de 16 de Abril e o artigo 8º do DL nº 446/85, de 25 de Outubro.
Deverão V.Exas. julgar por provado o presente recurso e revogar a Douta Sentença proferida, julgando a ação procedente por provada e por via disso, condenar a Ré no pedido, designadamente no pedido principal, fazendo dessa forma, aliás, como sempre, JUSTIÇA!».
A recorrida apresentou resposta, sustentando a improcedência da apelação e a consequente manutenção do decidido.

Termina as respetivas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem):
«(…)
1. O Autor recorre, desde logo, da decisão da matéria de facto, fazendo referência aos pontos da matéria de facto que entende incorrectamente julgados, nomeadamente os os pontos 25 e 28 segunda parte da matéria de facto julgada provada, alíneas b), c), i), j) e k) dados por não provados e ponto 26 dado por provado.
2. Sucede que, nos termos do disposto no art. 640º do Código do Processo Civil (CPC), quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos de matéria de facto impugnados diversa da recorrida; A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas;
3. Tendo o recurso por objecto a reapreciação da matéria de facto, deve o recorrente, para além de delimitar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar, motivá-lo através da indicação das passagens da gravação que reproduzam os meios de prova que, no seu entendimento, determinam decisão dissemelhante da que foi proferida pelo tribunal a quo.
4. Ora, no presente caso o Autor não concretiza os meios de prova que poderiam conduzir a decisão diferente daquela que foi alcançada ou sequer concretiza aquela que, no seu entender, deveria ter sido a decisão proferida.
5. Nestas situações, não podendo o Tribunal da Relação retirar as consequências que a impugnação da matéria de facto, deve entender-se que essa omissão impõe a rejeição da impugnação do pertinente recurso, por não cumprimento dos ónus estabelecidos no art. 640º do CPC e consequente inviabilização do cumprimento do princípio do contraditório por parte do recorrido, quando a esses pontos da matéria de facto não concretizados.
6. Pelo que, deverá ser rejeitado o recurso genérico da decisão da matéria de facto apresentado pelo Recorrente porquanto, para além de não se delimitar com precisão os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa, não se deixa expressa a decisão que, no entender do mesmo, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
7. Ora, analisadas as alegações da Recorrente constata-se que elas não observaram todos os pressupostos estabelecidos pelo artigo 640, do C.P.C., para a impugnação da decisão da matéria de facto, pois que, pese embora façam referência aos concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados não indica, justificadamente, os elementos probatórios que conduziriam à alteração de cada concreto ponto e a decisão que devia ter sido proferida quanto a cada concreto facto, procedendo a uma análise critica das provas e indicando a decisão que devia ser proferida sobre as concretas questões de facto impugnadas.
8. E assim sendo, incumprindo o Apelante o ónus imposto pelo art. 640º, nºs 1 e 2, do Cód. Processo Civil, ao recorrente que impugna a matéria de facto, está o tribunal impedido de sindicar o julgamento da matéria de facto, não podendo, por decorrência, esta Relação apreciar o recurso, na vertente da impugnação da matéria de facto, nos termos do artigo 662, nº 1, do C.P.C., impondo-se, assim, a rejeição, nessa parte, do recurso interposto.
9. Não obstante o supra exposto, sempre se dirá que a douta decisão proferida pelo Tribunal a quo, e da qual o A. ora recorre, é extensivamente fundamentada no que diz respeito à motivação que levou à prova e não prova de todos os factos, inclusive dos factos agora postos em crise pelo Recorrente.
0. Desta forma, e mantendo-se a matéria de facto inalterada, julgou bem a douta sentença no sentido em que decidiu, pois que, tendo sido comunicadas as cláusulas contratuais aqui em causa, e tendo resultado provado que o A. não preenche os requisitos da cobertura contratada, nunca poderia a presente acção proceder.
11. Alega, no entanto, o Recorrente que deverá ser sempre considerada abusiva a exigência por parte da Seguradora de que para preencher a cláusula de “invalidez absoluta e definitiva”, além da impossibilidade para qualquer tipo de actividade, ainda se exija a dependência de terceiros para a realização de atos tão básicos como a higiene e alimentação.  
12. Sucede, porém, que, no caso em concreto, não estamos somente perante uma situação em que a pessoa segura não preenche o requisito referente à necessidade de ajuda de terceiros para os actos básicos da vida diária, como pretende agora fazer crer o aqui Recorrente…mas, igualmente, o Autor não preenche o requisito da cobertura de invalidez contratada referente à incapacidade total para o exercício de qualquer atividade geradora de rendimentos.
13. Nos termos da apólice em discussão verifica-se uma situação de “Invalidez Absoluta e Definitiva quando na Pessoa Segura se verifique uma incapacidade total para o exercício de qualquer atividade, necessitando do recurso à assistência permanente de uma terceira pessoa para os atos básicos da vida diária, incluindo necessariamente a dependência total de terceiros para a higiene e alimentação.”
14. Ora, resultou provado, por exame médico-legal, que o Autor não está incapaz para toda e qualquer profissão e que poderá exercer profissões em que permaneça sentado, como por exemplo telefonista, rececionista ou porteiro (pontos 37 e 38 da matéria de facto provada), não se encontrando, por isso, numa situação de total incapacidade para o exercício de qualquer actividade para os efeitos da cobertura contratada.
15. Desta forma, ainda que se considerasse abusiva a parte da cláusula que exige a necessidade de apoio de terceiros - o que apenas se admite por mera cautela e dever de patrocínio - sempre o A. não se encontraria numa situação de impossibilidade do exercício de uma profissão que lhe permitisse auferir rendimentos.
16. Sendo que é este o principal escopo da cláusula de invalidez - acautelar situações em que a pessoa segura se vê numa situação de impossibilidade de gerar rendimentos que lhe permitissem garantir o pagamento do capital mutuado associado ao seguro em causa.
17. Resultou, ainda, provado que o Autor inicialmente assinou uma proposta de adesão de contrato de seguro com a cobertura de Invalidez Definitiva para a Profissão ou Atividade Compatível (66%), tendo posteriormente decidido aderir ao contrato de seguro com a cobertura mais exigente - dependência total de terceiros para higiene e alimentação.
18. Motivo pelo qual entendeu o doutro Tribunal a quo que “…o autor tinha alternativas quando decidiu escolher esta apólice, e optou por esta (provavelmente por ser a mais barata), quando poderia ter optado por qualquer outra.”
19. Concluindo, por isso, o Tribunal a quo que a cláusula (no caso é o próprio conceito de invalidez absoluta e definitiva) que estipula que prevê a dependência total de terceira pessoa, no caso, por ter sido “querida” e compreendida, não foi imposta, não é abusiva, e por isso, não é nula.
20. Desta forma, sempre se dirá que a situação clínica do Autor, aqui recorrente, não cumpre qualquer um dos requisitos da cobertura de invalidez contratada, sendo ela considerada na sua totalidade ou não.
21. Na verdade, o Autor não se encontra, sequer, totalmente incapaz do exercício de uma actividade profissional remunerada, pelo que nenhum sentido faria que estivesse a coberto de uma apólice cujo fim é assegurar o pagamento de um capital mutuado àqueles que se vejam numa situação de impossibilidade de prover pelo seu sustento e cumprimento das suas obrigações contratuais. 
22. Por tudo quanto se acabou de expor, resulta, salvo melhor opinião, claro e cristalino que a douta sentença proferida deverá manter-se inalterada.
Nestes termos e nos demais de direito, requer-se a V. Exas. que seja negado provimento ao presente recurso, mantendo-se a douta Sentença recorrida, só assim se fazendo JUSTIÇA».
O recurso foi admitido como sendo de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito devolutivo.
Os autos foram remetidos a este Tribunal da Relação, tendo o recurso sido admitido nos mesmos termos.
II. Delimitação do objeto do recurso
Face às conclusões das alegações da recorrente, e sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso - artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4, 636.º, n.º 1, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC) -, o objeto do presente recurso circunscreve-se às seguintes questões:
A) impugnação da decisão relativa à matéria de facto;
B) aferir se a sentença recorrida incorreu em erro na interpretação e aplicação do direito quanto ao alegado incumprimento dos deveres de informação da cláusula/condição geral da apólice que delimita o risco coberto pelo contrato de seguro, na parte onde refere «o recurso à assistência permanente de uma terceira pessoa para os atos básicos da vida diária, incluindo necessariamente a dependência total de terceiros para a higiene e alimentação»; da alegada (in)validade da mesma cláusula e respetivas consequências; da (in)verificação da condição contratual de acionamento do risco coberto pelo contrato de seguro por “Invalidez Absoluta e Definitiva”.
Corridos os vistos, cumpre decidir.

III. Fundamentação

1. Os factos
1.1. Os factos, as ocorrências e elementos processuais a considerar na decisão deste recurso são os que já constam do relatório enunciado em I. supra, relevando ainda os seguintes factos considerados provados pela 1.ª Instância:
1. A 16 de setembro de 2016, o autor, à data com 59 anos de idade, adquiriu um prédio urbano, destinado à sua habitação, sito no lugar ..., União das Freguesias ... e ..., concelho ..., inscrito na matriz sob o artigo ...83.º e descrito na respetiva Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...1, da extinta freguesia ....
2. Para pagamento parcial do referido imóvel, no mesmo ato contraiu um mútuo com o Banco 1..., no valor de 47.300,00€, pelo prazo de 180 meses, tendo constituído para garantia do pagamento do valor mutuado, hipoteca sobre o mesmo imóvel.
3. Para concessão do empréstimo, o autor tinha de subscrever uma apólice de seguro de vida, tendo o Banco como beneficiário, cobrindo os riscos de morte e invalidez absoluta e definitiva ou outros riscos por acidente e/ou doença, consoante o acordado com o Banco e até ao limite do capital mutuado e dentro das condições contratadas.
4. O processo burocrático que conduziu à celebração do contrato de compra e venda e mútuo com hipoteca foi estruturado e dirigido pela referida instituição bancária, bem como a instrução de todos os documentos necessários, incluindo os impressos relativos ao contrato de seguro.
5. A ré EMP01... elaborou antecipadamente os impressos das propostas de seguro, tendo-lhe sido apresentados pelo Banco, que agiu na qualidade de mediador de seguros.
6. O contrato de seguro aqui causa é o denominado ..., titulado pela apólice n.º ...59, com início em 21 de setembro de 2016, cujo capital seguro ascendia à quantia de 47.300,00€ (quarenta e sete mil e trezentos Euros), celebrado entre o autor, enquanto Tomador de Seguro e Pessoa Segura, e a ré enquanto Seguradora.
7. A apólice n.º ...59 tinha como coberturas contratadas a morte, a invalidez absoluta e definitiva, sendo seus beneficiários irrevogáveis o Banco 1..., S.A, para o capital em dívida no âmbito do empréstimo contraído e, para o remanescente, a existir, os herdeiros legais.
8. A contratualização efetuou-se por meio de preenchimento de questionário e assinatura de boletim de adesão.
9. O autor era serralheiro de profissão.
10. Encontra-se reformado por velhice desde ../../2021.
11. O Requerimento apresentado pelo autor na Segurança Social para obter a Pensão por Invalidez foi indeferido, por, entretanto, reunir as condições para atribuição da Pensão por Velhice.
12. No ano de 2019, a partir do mês de outubro, começou a ter problemas de saúde, relacionados com a sua coluna, anca e joelhos, impeditivos de exercer a sua atividade profissional.
13. Esteve de baixa médica, com incapacidade para o trabalho desde então, até à data em que foi reformado.
14. Foi-lhe diagnosticado “síndrome de coluna com radiação de dor”, “coxartrose” e gonatrose”, concluindo os médicos que sofria de patologia steo articular degenerativa atingindo a coluna vertebral, as ancas e os joelhos, com inicio em outubro de 2019.
15. A 22 de novembro de 2021 foi sujeito a uma Junta Médica, onde lhe foi atribuída uma incapacidade permanente global de 75%, e declarado que o autor apresenta dificuldades no acesso ou na utilização de transportes públicos coletivos convencionais, bem como no exercício da condução.
16. Essa incapacidade foi classificada com natureza definitiva.
17. Em 23 de novembro de 2021, através do email que pertence à sua filha, EE, o autor comunicou à ré EMP01..., a sua situação clínica, de forma a acionar o seguro que havia contratado quando adquiriu a sua habitação.
18. Na sequência da participação recebida, a ré diligenciou pela abertura e enquadramento do sinistro, com o consequente pedido de acesso a documentação clínica, o que fez a 24 de novembro de 2021.
19. O autor facultou os documentos solicitados.
20. A 07 de janeiro de 2022, por email, a ré EMP01... declinou a sua responsabilidade no pedido de reembolso que lhe foi efetuado pelo Autor, dizendo “(…) constatou-se a inexistência de incapacidade para o trabalho, pelo que o presente sinistro se encontra excluído nas Condições Gerais da Apólice, uma vez que o seu estado clínico não se enquadra no conceito de Invalidez Definitiva para a Profissão ou atividade compatível, definido nas Condições que especiais do seguro que subscreveu”.
21. Na mesma comunicação, enviaram um extrato com as condições que definem o conceito de Invalidez Absoluta e Definitiva, informando que é “Quando na pessoa segura se verifique uma incapacidade total para o exercício de qualquer atividade, necessitando do recurso á assistência permanente de uma terceira pessoa para os atos básicos da vida diária, incluindo necessariamente a dependência total de terceiros para a higiene e alimentação”.
22. Não se conformando com a decisão, o autor solicitou à ré, que reavaliasse o seu processo, tendo para o efeito alegado que não podia exercer qualquer atividade e estava a ser ajudado pela filha, juntando o Atestado Multiusos, emitido pela Junta Médica.
23. A ré manteve a sua decisão e inclusive enviou-lhe uma carta datada de 02 de fevereiro, onde anexou as coberturas subscritas pelo autor.
24. Nos termos da apólice aqui em discussão, define-se:
Invalidez Absoluta e Definitiva: Quando na Pessoa Segura se verifique uma incapacidade total para o exercício de qualquer atividade, necessitando do recurso à assistência permanente de uma terceira pessoa para os atos básicos da vida diária, incluindo necessariamente a dependência total de terceiros para a higiene e alimentação.”
25. Aquando da contratação, a Ré, por intermédio do Banco, informou o Autor das cláusulas contratuais do seguro a que aderia, as quais lhes foram entregues.
26. É prática do Banco 1... e da Ré proceder à entrega das Condições Gerais e Especiais do produto.
27. O autor declarou que todos os esclarecimentos e informações lhe haviam sido prestados e nunca solicitou qualquer esclarecimento durante a sua vigência.
28. O autor assinou proposta de adesão a contrato de seguro com a cobertura Invalidez Definitiva para a Profissão ou Atividade Compatível (66%), e, posteriormente, decidiu aderir ao contrato de seguro com a cobertura mais exigente.
29. O problema de saúde do autor acarreta-lhe dores, tendo de tomar medicação para controlo e alivio da dor.
30. Não está acamado, nem precisa que lhe deem de comer.
31. O Autor é destro e apresenta marcha normal, sem apoio nem claudicação.
32. Como sequelas, apresenta:
- no Ráquis: palpação da coluna lombar dolorosa; limitação da mobilidade lombar (distância dedos-solo de vinte centímetros); ROT presentes e simétricos; sinais de Laségue e de Bragard negativos bilateralmente.
- No membro inferior direito: palpação da anca e do joelho referida como dolorosa;limitação da mobilidade da anca (flexão até aos 60%, extensão até 10%, adução até 10% e abdução até 10%); limitação da mobilidade do joelho (flexão até 70%), sem valgismo ou varismo; sem edema do joelho; sem sinais de instabilidade articular do joelho; sem hipotrofia da coxa (perímetro das coxas de cinquenta e três centímetros);
- No membro inferior esquerdo: palpação da anca e do joelho referida como dolorosa; limitação da mobilidade da anca (flexão até aos 60%, extensão até 10%, adução até 10% e abdução até 10%); limitação da mobilidade do joelho (flexão até 70%), sem valgismo ou varismo; sem edema do joelho; sem sinais de instabilidade articular do joelho; sem hipotrofia da coxa (perímetro das coxas de cinquenta e três centímetros);
33. Apresenta quadro de patologia osteoarticular degenerativa, mais intensa ao nível da coluna lombar, das ancas e dos joelhos.
34. É seguido pelo seu médico assistente, estando medicado com AINES.
35. De acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades para acidentes de trabalho e doenças profissionais, a 16 de junho de 2023, foi-lhe atribuída uma incapacidade permanente parcial de 57,053%.
36. Encontra-se incapaz de exercer a sua profissão habitual (que exercia antes de se ter reformado por velhice).
37. Não está incapaz para toda e qualquer profissão.
38. Poderá exercer profissões em que permaneça sentado, como por exemplo, telefonista, rececionista ou porteiro (ex. registando entradas e saídas de pessoas ou veículos).
39. O autor não necessita de apoio de terceira pessoa para as atividades da vida diária.
40. A 12 de novembro de 2019, o capital em dívida do empréstimo bancário contraído pelo autor junto do Banco 1..., ascendia a 39.025,06€, sendo que, até 10.11.2022 foi amortizado € 3.385,26.
1.2. Factos considerados não provados pela 1.ª instância na sentença recorrida:
a) O autor aderiu ao seguro de vida por imposição do Banco.
b) Quando o autor contratou o seguro de vida, foi-lhe dito, que garantia o pagamento do empréstimo, se o mesmo ficasse com invalidez e incapacitado para o trabalho.
c) O autor sempre considerou e entendeu que o seguro cobriria uma situação de invalidez como a que padece.
d) Os problemas de saúde referidos em 12) impediram o autor, naquela data, de exercer qualquer atividade profissional.
e) O autor ainda tentou retomar ao trabalho, mas só o conseguiu fazer um dia e num período desse dia, devido às fortes dores que sentia.
f) O autor não consegue executar qualquer atividade lucrativa, impedido de executar pequenos trabalhos de agricultura para o seu próprio sustento.
g) O autor claudica e não consegue estar na mesma posição.
h) O autor não consegue ficar sentado.
i) A ré (por intermédio do Banco) não comunicou ao autor que para poder ser acionado o seguro, não bastava que ficasse com invalidez absoluta funcional, mas que essa incapacidade teria de ser para toda a atividade e ainda tinha de necessitar da ajuda de terceira pessoa para se alimentar, fazer a sua higiene ou executar qualquer ato que fizesse parte da sua vida diária (apenas o fez agora, quando declinou o reembolso do seguro).
j) O que lhe foi dito pelo Banco, aquando da contratualização do seguro de vida, e foi por ele compreendido, foi que, em caso de morte ou de invalidez, pagaria o capital seguro que se encontrasse em divida.
k) Apenas o informaram, que teria um seguro que cobriria a sua invalidez, e não lhe explicaram que para poder beneficiar do seguro não poderia ter capacidade para fazer nada e além disso ainda teria de depender de terceiro para tudo o que envolvesse a sua vida quotidiana.
l) O autor tem o 8.º ano de escolaridade.
m) O autor tem vindo a pagar mensalmente as prestações devidas (amortização + juros + spread + despesas, designadamente comissão de processamento e imposto de selo inerente) e, bem assim, os prémios dos seguros de vida, no valor de pelo menos 380.55€.
2. Apreciação sobre o objeto do recurso
2.1. Impugnação da decisão relativa à matéria de facto
O apelante/autor impugna a decisão relativa à matéria de facto incluída na decisão recorrida, nos seguintes termos:
A) os factos descritos nos pontos 25., e 28 - 2.ª parte - devem transitar para a matéria não provada; o facto vertido no n.º 26 deve ser alterado, passando a ter a seguinte redação: «É prática do Banco 1... e da ré proceder à entrega das Condições Gerais e Especiais do produto, desconhecendo-se se tal ocorreu neste caso em concreto»; os factos considerados não provados inseridos nas alíneas b), c), i), j) e k) devem ser dados por provados;
B) o Tribunal deveria ter dado como provada a al. m) dos factos não provados.
A recorrida/ré, nas contra-alegações apresentadas pronuncia-se pela rejeição da impugnação da matéria de facto apresentado pelo recorrente, por violação do ónus imposto pelo artigo 640.º, n.º 1 e 2 do CPC porquanto, para além de não delimitar com precisão os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa, não deixa expressa a decisão que, no entender do mesmo, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
Tal como resulta do disposto nos artigos 639.º e 640.º do CPC, os recursos para a Relação tanto podem envolver matéria de direito como de facto, sendo este último o meio adequado e específico legalmente imposto ao recorrente que pretenda manifestar divergências quanto a concretas questões de facto decididas em sede de sentença final pelo Tribunal de 1.ª instância que realizou o julgamento, o que implica o ónus de suscitar a revisão da correspondente decisão.
O artigo 640.º do CPC prevê diversos ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, prescrevendo o seguinte:
Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto
1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; 
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; 
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: 
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. 
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º. 
Efetivamente, a impugnação da decisão de facto feita perante a Relação não se destina a que este tribunal reaprecie global e genericamente a prova valorada em 1.ª instância, razão pela qual se impõe ao recorrente um especial ónus de alegação, no que respeita à delimitação do objeto do recurso e à respetiva fundamentação[1].
Revertendo ao caso em apreciação, observamos que o apelante indica expressamente os concretos pontos que considera incorretamente julgados, mais especificando suficientemente a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre a matéria de facto impugnada.
Por outro lado, o apelante alude às respetivas declarações de parte, aos depoimentos das testemunhas EE, AA, CC e DD, em conjunto com a prova documental existente nos autos, designadamente os docs. 1, 6 e 7 juntos pela recorrida, como meios de prova a atender em sede de impugnação dos factos enunciados em A) supra, com indicação das passagens da gravação que entende relevantes.
Ora, ainda que a rigorosa delimitação do âmbito probatório do recurso não se baste com a mera enunciação dos meios probatórios que sustentem diversa decisão[2], entendemos que o incumprimento de tais exigências não leva à rejeição liminar da impugnação vertida em A), ainda que dificulte a tarefa deste Tribunal de recurso na identificação dos fundamentos em que o recorrente se baseia para concluir de forma diferente daquilo que a 1.ª instância decidiu.
Porém, no que concerne à impugnada al. m) dos factos não provados[3], não se vislumbra que tenha o recorrente cumprido o ónus de alegação constante da alínea b) do n.º 1, conjugada com a alínea a) do n.º 2, do artigo 640.º do CPC, já que da análise da correspondente alegação de recurso não é possível identificar o(s) concreto(s) meios de prova constantes do processo que, segundo o apelante, implica/m decisão diversa sobre a matéria indicada.
No caso, o recorrente nem sequer sustenta que o facto vertido na al. m) dos factos não provados da matéria de facto tenha sido incorretamente julgado, limitando-se a alegar que a falta de pagamento desses valores levaria à resolução do contrato de seguro de vida e do contrato de mútuo por incumprimento, o que não ocorreu.
Trata-se de uma referência de natureza jurídica que não respeita à averiguação dos factos em causa.
Como tal, decide-se rejeitar a impugnação da decisão relativa à al. m) dos factos não provados.
Retomando agora a impugnação dos pontos 25., 26., 28 - 2.ª parte - dos factos provados, e alíneas b), c), i), j) e k) dos factos não provados, observa-se que o recorrente indica, como meios de prova a atender, as respetivas declarações de parte e os depoimentos das testemunhas EE, AA, CC e DD, em conjunto com a prova documental existente nos autos, designadamente os docs. 1, 6 e 7 juntos pela recorrida.
Nos termos do disposto no artigo 662.º, n.º 1 do CPC, com a epígrafe Modificabilidade da decisão de facto, a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
Tal como resulta deste último preceito, a reapreciação da decisão proferida sobre determinados pontos da matéria de facto deve ter a mesma amplitude que o julgamento efetuado em 1.ª Instância, dispondo para tal a Relação de autonomia decisória de forma a assegurar o duplo grau de jurisdição.
A este propósito, refere Abrantes Geraldes[4]: «(…) sendo a decisão do tribunal a quo o resultado da valoração de meios de prova sujeitos à livre apreciação, tais como documentos particulares sem valor confessório, relatórios periciais ou declarações de parte a que não corresponda confissão, desde que a parte interessada cumpra o ónus de impugnação prescrito pelo art. 640.º, a Relação, assumindo-se como verdadeiro tribunal de instância, está em posição de proceder à sua reavaliação, expressando, a partir deles, a sua convicção com total autonomia. Afinal, nestes casos, as circunstâncias em que se inscreve a sua atuação são praticamente idênticas às que existiam quando o tribunal de 1.ª instância proferiu a decisão impugnada, apenas cedendo nos fatores da imediação e da oralidade».
Como tal, a necessária ponderação dos princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova implica que «o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1.ª instância sobre a matéria de facto só deve ser usado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados»[5].
No caso, cumpre aferir se os concretos meios de prova valorados pelo Tribunal a quo, em conjunto com a matéria de facto já definitivamente assente, são suficientes para considerar assentes os factos impugnados, o que importa a prévia determinação do padrão de prova exigível em processo civil, isto é, do standard de prova aplicável, o qual consiste numa regra de decisão que indica o nível mínimo de corroboração de uma hipótese para que esta possa considerar-se provada, ou seja, possa ser aceite como verdadeira[6].
Tal como explica Luís Filipe Pires de Sousa[7], «o standard de prova que opera no processo civil é o da «probabilidade prevalecente ou “mais provável que não”. Este standard consubstancia-se em duas regras fundamentais:
(i) Entre as várias hipóteses de facto deve preferir-se e considerar-se como verdadeira aquela que conte com um grau de confirmação relativamente maior face às demais;
(ii) Deve preferir-se aquela hipótese que seja “mais provável que não”, ou seja, aquela hipótese que é mais provável que seja verdadeira do que seja falsa.
(…) este critério da probabilidade lógica prevalecente - insiste-se - não se reporta à probabilidade como frequência estatística mas sim como grau de confirmação lógica que um enunciado obtém a partir das provas disponíveis.
Em segundo lugar, o que o standard preconiza é que, quando sobre um facto existam provas contraditórias, o julgador deve sopesar as probabilidades das diferentes versões para eleger o enunciado que pareça ser relativamente “mais provável”, tendo em conta os meios de prova disponíveis».
Abrantes Geraldes[8] sublinha a necessidade de o juiz adotar um critério de razoabilidade no que concerne à afirmação da prova ou da falta de prova dos factos controvertidos: «Cientes de que a verdade absoluta é estranha ao Direito e que, por conseguinte, a formulação de juízos judiciários deve assentar, conforme as circunstâncias e a natureza do caso, em critérios que se orientem pela verosimilhança ou pela maior ou menor probabilidade, não devem ser feitas exigências probatórias irrealistas que, na prática, acabem por revelar uma situação de denegação de justiça».
Neste domínio, refere José Lebre de Freitas[9]: «No âmbito do princípio da livre apreciação da prova, não é exigível que a convicção do julgador sobre a realidade dos factos alegados pelas partes equivalha a uma absoluta certeza, raramente atingível pelo conhecimento humano. Basta-lhe assentar num juízo de suficiente probabilidade ou verosimilhança, que o necessário recurso às presunções judiciais (arts. 349 e 351 CC) por natureza implica, mas que não dispensa a máxima investigação para atingir, nesse juízo, o máximo de segurança».
No caso, não estão em causa factos sujeitos a prova vinculada, nem o apelante invoca o desrespeito de norma reguladora do valor legal dos meios de prova concretamente invocados no recurso, vigorando neste domínio o princípio da livre apreciação das provas quanto aos depoimentos das testemunhas, o mesmo sucedendo quanto aos documentos apresentados nos autos e às declarações de parte, tudo em conformidade com o disposto nos artigos 341.º a 396.º do Código Civil (CC).
Feita a reapreciação crítica e concatenação de toda a prova produzida, em conjunto com a matéria de facto já definitivamente assente e partindo da ponderação dos concretos meios de prova indicados pelo recorrente, não se alcança fundamento probatório suficiente para dar como provados os factos constantes das impugnadas als. b), c), i), j) e k) dos factos não provados, justificando-se a prevalência da credibilidade dos meios de prova em que assentou a convicção do Tribunal a quo para dar como provado o enunciado fáctico constante dos pontos 25., 26.,  e 28 dos factos provados.
Com relevo para o apuramento da matéria em análise, o Tribunal a quo relevou essencialmente os depoimentos das testemunhas CC, AA, ambos funcionários bancários do Banco 1..., e de DD, profissional de seguros ao serviço da ré, no que se refere aos esclarecimentos prestados sobre os procedimentos usuais na celebração dos contratos de seguro associados às negociações dos créditos para aquisição de habitação, às opções disponíveis e respetivas condições, em depoimentos que se apresentam como absolutamente credíveis e verosímeis.
É certo que a testemunha CC acabou por não garantir ter estado presente no momento em que o autor assinou a proposta de seguro, visto que a letra aposta no questionário médico e nas restantes inscrições manuscritas constantes da proposta que constitui o documento 6 junto com a contestação não corresponde à sua, conforme também esclareceu. Contudo, esta testemunha afirmou de forma credível a convicção segura de ter tido intervenção direta na negociação que precedeu a subscrição da proposta de seguro escolhida pelo autor, explicando-lhe as opções disponíveis, as respetivas particularidades/condições e providenciando pela entrega da respetiva documentação, de acordo com os procedimentos habituais que descreveu.
De salientar que tanto o autor como a testemunha EE, sua filha, que referiu ter acompanhado sempre o pai em todo o processo referente ao empréstimo e ao seguro de vida, admitiram nos respetivos depoimentos que o seguro foi feito junto do balcão do Banco 1..., em ..., com a intervenção da funcionária CC, aqui testemunha, com quem sempre falaram e tratou dos papéis todos.
Ademais, o autor também admitiu expressamente em julgamento que a funcionária CC, aqui testemunha, lhe explicou na mesma ocasião que havia duas opções de seguro que podia escolher, sendo uma mais barata e a outra mais cara.
É certo que o autor também referiu que, na altura, optou pelo seguro mais caro. Porém, esta versão resulta manifestamente inverosímil em face da ponderação global dos depoimentos prestados à luz das regras da experiência comum. Com efeito, em sede de declarações de parte, o autor esclareceu que sempre auferiu o ordenado mínimo nacional (sendo o seu salário, na altura, de cerca de setecentos euros). Ora, resultou de forma clara do depoimento da testemunha CC que as coberturas das apólices eram distintas e que o preço do prémio a pagar era substancialmente diferente, sendo as diferenças de prémio mensal sempre explicadas ao cliente. No essencial, esclareceu que a proposta mais barata cobria a invalidez absoluta e definitiva, implicando que a pessoa segura fique totalmente dependente de terceiros, enquanto a cobertura mais abrangente (e mais cara) depende da percentagem de incapacidade, devendo atingir os 66%.
Neste domínio, não pode deixar de ter-se em conta que a testemunha DD, profissional de seguros ao serviço da ré, esclareceu de forma credível, entre o mais, que o prémio associado à cobertura mais abrangente (cobertura de IDP-AC Invalidez Definitiva para a Profissão ou Atividade Compatível, a 66%) é mais caro, sendo a diferença de quase 4.000,00€ anuais relativamente ao prémio correspondente à cobertura de Invalidez Absoluta e Definitiva (IAD) que foi subscrita neste caso. Referiu ainda que o prémio associado à cobertura de Invalidez Absoluta e Definitiva (IAD) é irrisório, sendo comparável aos prémios do seguro automóvel ou dos multirriscos.
Note-se ainda que o recorrente não vem impugnar diversos factos que refletem e contextualizam o juízo probatório formulado pelo Tribunal a quo a propósito dos factos agora em causa, conforme resulta dos enunciados fácticos contidos nos pontos 4., 5., 6., 7., 26., e 27., dos factos provados, dos quais consta o seguinte:
- o processo burocrático que conduziu à celebração do contrato de compra e venda e mútuo com hipoteca foi estruturado e dirigido pela referida instituição bancária, bem como a instrução de todos os documentos necessários, incluindo os impressos relativos ao contrato de seguro;
- a ré EMP01... elaborou antecipadamente os impressos das propostas de seguro, tendo-lhe sido apresentados pelo Banco, que agiu na qualidade de mediador de seguros;
- o contrato de seguro aqui causa é o denominado ..., titulado pela apólice n.º ...59, com início em 21 de setembro de 2016, cujo capital seguro ascendia à quantia de € 47.300,00 (quarenta e sete mil e trezentos Euros), celebrado entre o Autor, enquanto Tomador de Seguro e Pessoa Segura, e a Ré enquanto Seguradora;
- a apólice n.º ...59 tinha como coberturas contratadas a morte, a invalidez absoluta e definitiva, sendo seus beneficiários irrevogáveis o Banco 1..., S.A, para o capital em dívida no âmbito do empréstimo contraído e, para o remanescente, a existir, os herdeiros legais;
- é prática do Banco 1... e da Ré proceder à entrega das Condições Gerais e Especiais do produto;
- o autor declarou que todos os esclarecimentos e informações lhe haviam sido prestados e nunca solicitou qualquer esclarecimento durante a sua vigência.
Neste enquadramento, julgamos plenamente justificada a ponderação crítica efetuada pelo Tribunal recorrido dos meios de prova produzidos, nos seguintes termos:
«(…)
A resposta positiva a 25) a 28) adveio da conjugação dos depoimentos prestados pelas testemunhas AA e CC, ambos funcionários bancários e ao serviço do Banco 1... e que depuserem com a credibilidade a que supra se aludiu.
A este respeito importa referir que, de forma coerente, e que se nos afigurou sincera, estas testemunhas explicaram qual é o procedimento que adotam sempre e em qualquer situação de recurso a crédito para aquisição de habitação e que este caso não foi exceção.
Mais informaram que, à data, existem 3 apólices possíveis, cada uma com coberturas e prémios diferentes, as quais descreveram com pormenor.
Esclareceram ainda estas testemunhas que é sempre explicado ao cliente quais as diferenças existentes entre as apólices e que as condições são impressas e entregues ao cliente e que os seguros são tratados em momento anterior à celebração da escritura.
A este respeito importa dizer que é natural, ante o lapso de tempo decorrido desde a data da contratação, no ano de 2016 até à data de hoje, que os funcionários bancários que celebram inúmeros contratos todos os dias, não se recordem em concreto do que foi conversado. Aliás, anormal seria se se recordassem em concreto do teor das conversas mantidas com o cliente, pelo que, o normal é esclarecerem o que é a prática diária, e, por isso, habitual e socorrerem-se dos documentos que consta no sistema informático.
De referir que foi perentório ao afirmar que só submetem uma proposta, porquanto, o cliente só pode subscrever uma apólice, o que, significa, a nosso ver, que o facto de o Autor ter assinado duas propostas, só pode significar que manifestou vontade por uma proposta e, entretanto, pretendeu optar por outra diferente.
Na verdade, considerando que as coberturas das apólices eram diferentes e que o preço do prémio a pagar também era substancialmente diferente, não temos razão para duvidar de que o Banco não tenha esclarecido o Autor acerca das concretas condições contratadas. Aliás, não vislumbramos qualquer interesse nesse sentido, muito pelo contrário, pois, caso o Autor optasse por outra proposta, o valor do premio anual e mensal a pagar seria bem superior.
Note-se que a testemunha CC foi perentória ao referir que “é sempre explicado ao cliente que uma apólice cobre a partir de 66% e a outra (no caso, a contratada), a pessoa tem de estar totalmente dependente, praticamente como um vegetal. Mais referiu ser falso que tenha dito ao cliente aqui Autor, ou à sua filha que se ficasse acamado, o seguro contratado cobria, se não fosse o seguro contratado para este efeito, até porque o Banco não impõe a contratação desta apólice em particular, o que importa é contratar um seguro de vida ativo, seja efetuado por intermédio do Banco ou sem esta intermediação.
Mais referiu que as condições gerais são sempre entregues ao cliente, depois de lhe terem sido explicadas, mas que este não assina qualquer comprovativo.
Atendeu-se também ao depoimento prestado pela testemunha DD, profissional de seguros ao serviço da Ré, que de forma que se nos pareceu verdadeira, confirmou a verificação dos factos referidos em 27) e 28).
Ora, não se olvida o referido pela testemunha EE, filha do Autor e que foi quem acompanhou o Autor neste processo de contratação, ficando o Tribunal convencido de que foi esta filha quem tratou de tudo e que o Autor se terá limitado a assinar os documentos e pouco mais, porquanto este pouco sabia concretizar.
Não se olvida que a testemunha EE referiu que lhe disseram que se o seu pai tivesse problemas de saúde e ficasse inválido ou acamado que o seguro que estavam a contratar, cobria, e que o imóvel era pago pelo seguro. Também não se olvida que esta testemunha referiu que não lhes foram apresentados quaisquer pacotes de seguro, e que não mencionaram quaisquer valores, nem qualquer percentagem. Porém, a verdade é que esta alegação não foi corroborada por mais ninguém, nem sequer pelo próprio Autor.
Veja-se que a testemunha EE referiu que quando contratou este seguro, não lhe foi apresentada qualquer outra alternativa, e, por sua vez, o Autor, que não soube dizer nem sequer o valor mensal que lhe disseram que ia pagar pela mensalidade da casa, referiu que foi a Funcionária CC, aqui testemunha, que lhe recomendou contratar o seguro mais caro e que rondaria os € 70,00 mensais, tendo, entretanto, dito que referiu à D. CC que queria o seguro mais caro. Ora, se assim fosse, então significaria que lhe explicaram que existia mais do que uma apólice, com coberturas e preços diferentes, contrariando o referido pela testemunha EE que referiu que desconhecia que existiam outros pacotes/apólices.
No mais, referiu que o email que o Banco tinha, era o da sua filha e que se alguém recebesse alguma correspondência seria a sua filha, nada conseguindo concretizar.
Nem a testemunha EE nem o Autor conseguiram explicar o motivo pelo qual foram assinadas duas apólices, mas o certo é que o foram, e o único sentido possível para tal ter acontecido é o Autor ter assinado uma e depois ter mudado de ideias e ter assinado outra diferente, tanto que apenas uma foi aceite pela Seguradora, aqui Ré.
Dito isto, tudo conjugado, foram aqueles factos considerados como provados.
(…)
No que se refere à matéria dada como não provada, importa referir que resultou ou da total falta de prova, ou do facto de se ter dado como provado o oposto, ou ainda, do facto de não ter sido feita prova segura no sentido da sua verificação.
Mas, vejamos.
(…)
Quanto a b) e c) adveio do facto de ter sido perentoriamente negado pela testemunha CC, que depôs de forma que se nos afigurou sincera, e cujo depoimento, em parte foi corroborado pelo depoimento da testemunha AA, sendo que ambos referiram que é sempre explicado ao cliente que existem 3 apólices, não só porque têm coberturas diferentes, mas porque também têm preços diferentes. A este respeito, veja-se o referido quanto ao facto provado em 25 supra.
Note-se que o referido pelo Autor e pela testemunha EE, sua filha, são manifestamente insuficientes para se dar tais factos como provados, e desde logo, porque são inconsistentes e até contraditórios, no que se refere a esta parte e como supra se explicou. A verdade é que não basta alegar, é necessário provar e apresentar uma versão que tenha sentido, o que, aqui, não sucede. Reitera-se que não se alcança a razão de o Banco, tendo apólices diferentes, com prémios diferentes, não as apresente aos seus clientes para que estes possam escolher, uma vez que são quem vão suportar as despesas mensais.
(…)
Relativamente a i), j), e k) resultou do facto de se ter dado como provado o referido em 25) e 26) supra, para cuja motivação ora se remete. Adveio ainda do teor dos depoimentos prestados pelas testemunhas AA e CC, que de forma coerente, lógica e que se nos pareceu sincera referiram, tal como se mencionou supra, que explicam sempre ao cliente os diferentes tipos de seguro que têm, e que, no caso, existiam três apólices possíveis, cada uma com coberturas e prémios diferentes, as quais descreveram com pormenor, procedimento este utilizado em qualquer situação de recurso a crédito para aquisição de habitação e que este caso não foi exceção.
Mais informaram que, à data, existem 3 apólices possíveis, cada uma com coberturas e prémios diferentes, as quais descreveram com pormenor.
Tal como também já se referiu, esclareceram que as condições particulares e gerais são sempre impressas e entregues ao cliente, não havendo motivo para o Tribunal concluir que neste caso em concreto, este procedimento habitual não foi adotado.
Aliás, o normal é que quando alguém se dirige a uma entidade bancária para solicitar um credito, lhe seja disponibilizada toda a informação necessária para que se possa escolher o que se pretende.
Não se olvida que, a esta distância, as testemunhas não consigam recordar com clareza a conversa concreta que tiveram com um cliente específico, porém, é o que resulta da normalidade das coisas. Dito isto, considerando que explicaram a prática corrente, e aquilo que elas próprias fazem e que neste caso, foram quem tratou desta contratação e que se recordam do Autor do exercício das suas funções, é de concluir que, também neste caso cumpriram com os deveres de informação a que estavam obrigados. Se assim não fosse, abria-se a porta para qualquer cliente poder vir anos mais tarde invocar o incumprimento do direito à informação, beneficiando do facto de os funcionários que os atenderem já não se recordarem do que falaram em concreto, não só pelo lapso de tempo, entretanto decorrido, mas também devido ao facto de tratarem de situações similares, todos os dias, durante meses e anos».
Por todo o exposto, julga-se improcedente a impugnação da decisão relativa à matéria de facto apresentada pela apelante, mantendo-se a decisão proferida pelo Tribunal a quo sobre os factos vertidos em 1.1. e 1.2. supra.
2.2. Reapreciação do mérito da decisão de direito: do alegado incumprimento dos deveres de informação da cláusula/condição geral da apólice que delimita o risco coberto pelo contrato de seguro, na parte onde prevê «o recurso à assistência permanente de uma terceira pessoa para os atos básicos da vida diária, incluindo necessariamente a dependência total de terceiros para a higiene e alimentação»; da (in)validade da mesma cláusula e respetivas consequências; da (in)verificação da condição contratual de acionamento do risco coberto pelo contrato de seguro por “Invalidez Absoluta e Definitiva”.
A presente ação tem por finalidade tornar efetivo o acionamento das garantias previstas em contrato de seguro de grupo, ramo vida, pelo qual a ré seguradora garantiu a restituição do capital em dívida no âmbito do empréstimo contraído pelo autor junto do Banco 1..., S.A e do remanescente, a existir, consoante o acordado com o banco e até ao limite do capital mutuado e dentro das condições contratadas, tendo como como coberturas contratadas a morte e invalidez absoluta e definitiva.
Conforme resulta da matéria de facto assente, o contrato de seguro aqui causa é o denominado ..., titulado pela apólice n.º ...59, com início em 21 de setembro de 2016, cujo capital seguro ascendia à quantia de 47.300,00 €, celebrado entre o autor, enquanto Tomador de Seguro e Pessoa Segura, e a ré enquanto Seguradora.
O artigo 76.º, n.º 1 do Regime Jurídico do Contrato de Seguro (RJCS), aprovado pelo Dec. Lei n.º 72/2008, de 16-04, enuncia que «[o] contrato de seguro de grupo cobre riscos de um conjunto de pessoas ligadas ao tomador do seguro por um vínculo que não seja o de segurar», explicitando ainda, no respetivo artigo 77.º, que o seguro de grupo pode ser contributivo ou não contributivo, sendo contributivo quando do contrato de seguro resulta que os segurados suportam, no todo ou em parte, o pagamento do montante correspondente ao prémio devido pelo tomador do seguro (artigo 77.º, n.º 2, do RJCS).
A respeito da peculiar natureza e fisionomia do seguro de grupo, refere-se no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11-02-2017[10]: «Um contrato de seguro de grupo (ramo vida) em que são intervenientes uma seguradora, uma instituição financeira (como tomadora e credora beneficiária) e uma pessoa singular (como aderente-segurada) constitui um contrato celebrado no âmbito de um esquema contratual com uma estrutura tripartida complexa, tendo por base um plano de seguro e, na sua execução, várias adesões/celebrações de contratos de seguro concretizados nas declarações de vontade das pessoas seguras de aderirem ou fazerem parte do referido plano de seguro.
(…) Nestas situações, a seguradora e o tomador do seguro (a instituição bancária) celebram entre si um contrato de seguro que vai funcionar como o quadro em que, posteriormente, se estabelecem as situações ou relações de seguro (situações de risco) propriamente ditas».
Decorre da matéria de facto provada que o seguro de grupo em causa nos presentes autos foi ajustado com base em cláusulas contratuais previamente definidas entre a seguradora e o tomador do seguro (o banco), designadamente nas condições gerais, como acontece em geral neste tipo de contratos, sendo-lhe aplicáveis, para além do RJCS antes aludido, o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais, estabelecido no referido Dec. Lei n.º 446/85 de 25-10.
O artigo 5.º do Dec. Lei n.º 446/85 de 25-10, sob a epígrafe «Comunicação» prevê o seguinte: «1 - As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las. 2 - A comunicação deve ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência. 3 - O ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contratante que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais».
Por outro lado, o artigo 6.º do mesmo diploma legal, sob a epígrafe «Dever de informação», preceitua que: «1 - O contratante determinado que recorra a cláusulas contratuais gerais deve informar, de acordo com as circunstâncias, a outra parte dos aspectos nelas compreendidos cuja aclaração se justifique. 2 - Devem ainda ser prestados todos os esclarecimentos razoáveis solicitados».
Relativamente ao citado artigo 5.º, o objetivo da norma é claro: «a lei determina que o predisponente das cláusulas tem de comunicar à outra parte todas e cada uma das cláusulas que pretende ver integradas no contrato, por forma a possibilitar o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência. Isto significa que essa comunicação tem de permitir ao bom pai de família - como paradigma da diligência juridicamente exigível - esse conhecimento completo e efectivo. Da norma retira-se que, se bem que não se explicite qualquer elemento do conteúdo da obrigação de comunicação, os elementos contratuais essenciais e todos os outros são objecto dela, pelo que o desconhecimento, a incerteza ou o engano acerca de disposições contratuais por parte do aderente - que não sejam devidos a culpa deste - significam que aquela obrigação não foi pontualmente cumprida»[11].
Como consequência, estabelece o artigo 8.º do Dec. Lei n.º 446/85 de 25-10: Consideram-se excluídas dos contratos singulares: a) As cláusulas que não tenham sido comunicadas nos termos do artigo 5.º; b) As cláusulas comunicadas com violação do dever de informação, de molde que não seja de esperar o seu conhecimento efectivo; c) As cláusulas que, pelo contexto em que surjam, pela epígrafe que as precede ou pela sua apresentação gráfica, passem despercebidas a um contratante normal, colocado na posição do contratante real; d) As cláusulas inseridas em formulários, depois da assinatura de algum dos contratantes.
Ou seja, tal como decorre da lei, sempre que incumprida a obrigação de comunicação ou a de informação relativamente a cláusulas contratuais gerais aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las, as cláusulas não comunicadas ou aclaradas consideram-se excluídas do contrato:
«Há, pois, uma redução ope legis do contrato, uma amputação deste das cláusulas, que não são consideradas nele integradas, por violação das obrigações pré-contratuais que a lei enuncia»[12].
Ora, mantendo-se inalterada a matéria de facto provada, resta sufragar a conclusão formulada pelo Tribunal a quo a propósito desta matéria, sendo de concluir que a ré, por intermédio do Banco 1..., cumpriu todos os deveres de informação a que estava obrigada, sendo que, aquando da contratação do contrato de seguro aqui em causa, informou o autor das cláusulas contratuais do seguro a que aderia - cf. os pontos 24., 25., 26., e 27., dos factos provados.
Deste modo, a ré seguradora pode prevalecer-se da impugnada cláusula, designadamente no segmento onde prevê “o recurso à assistência permanente de uma terceira pessoa para os atos básicos da vida diária, incluindo necessariamente a dependência total de terceiros para a higiene e alimentação”, uma vez que a mesma não se tem por excluída do contrato de seguro em causa, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 5.º, n. º1, e 8.º, al. a), do Dec. Lei n.º 446/85 de 25-10.
Subsiste, porém, a questão suscitada pelo apelante a propósito da (in)validade da referida cláusula, no segmento em questão.
Como se viu, o autor, ora recorrente, pretende se declare abusiva e, por isso, nula a cláusula referente à definição de Invalidez Absoluta e Definitiva da Pessoa Segura, na parte em que estabelece como condição de verificação do risco “o recurso à assistência permanente de uma terceira pessoa para os atos básicos da vida diária, incluindo necessariamente a dependência total de terceiros para a higiene e alimentação”.
A propósito, alega que a formulação em causa é contrária à boa fé, sendo desadequada e desproporcional e por isso abusiva, já que exige que a pessoa segura fique praticamente num estado vegetativo, e que ao excluir esta exigência, o risco corrido pela ré seguradora em virtude da celebração do contrato de seguro deve ter-se por verificado.
Quanto a esta questão, a sentença recorrida entendeu que a cláusula que prevê a dependência total de terceira pessoa, no caso, por ter sido “querida” e compreendida, e que não foi imposta, não é abusiva, e por isso, não é nula.
O artigo 15.º do Dec. Lei n.º 446/85 de 25-10, estabelece o princípio geral de proibição das cláusulas contratuais gerais contrárias à boa fé.
Neste domínio, o artigo 16.º do mesmo diploma prevê que na aplicação da norma anterior devem ponderar-se os valores fundamentais do direito, relevantes em face da situação considerada, e, especialmente:
a) A confiança suscitada, nas partes, pelo sentido global das cláusulas contratuais em causa, pelo processo de formação do contrato singular celebrado, pelo teor deste e ainda por quaisquer outros elementos atendíveis;
b) O objetivo que as partes visam atingir negocialmente, procurando-se a sua efetivação à luz do tipo de contrato utilizado.
Por seu turno, o artigo 12.º do mesmo diploma, prescreve que as cláusulas contratuais gerais proibidas por disposição deste diploma são nulas nos termos nele previstos.
Tal como refere Almeno de Sá[13], «[n]o que se refere ao critério de avaliação do conteúdo proibido das cláusulas, a utilizar no domínio das proibições relativas, não pode deixar de se ter em conta, ainda aqui, a cláusula geral da boa fé, enquanto princípio reitor do controlo do conteúdo, em íntima articulação com o escopo que com este se intenta alcançar. A consecução de um adequado equilíbrio contratual de interesses aparece como objectivo último desse controlo, objectivo que seguramente não será atingido se o utilizador procura garantir, de antemão, os seus exclusivos propósitos negociais, sem atender, de forma minimamente adequada, aos interesses da parte contrária. O imperativo do respeito pelo interesse do outro flui directamente da própria intencionalidade que atravessa o princípio da boa fé, pelo que somos assim levados à necessidade de uma acabada ponderação de interesses».
Ora, a cláusula que exige, na consideração da situação de invalidade absoluta e definitiva, que a pessoa segura necessite ainda de recorrer de modo contínuo à assistência de terceira pessoa para os atos normais da vida diária, nada tem a ver com a afetação da sua capacidade de trabalho e de obter rendimentos, antes vai além da razão de ser do contrato, determinando um desequilíbrio das prestações contratuais e frustração da confiança do segurado, sendo por isso abusiva por desproporcionada e contrária boa fé[14].
Neste enquadramento, é forçoso concluir que a cláusula contratual em referência é nula no segmento em que exige que a verificação da “Invalidez Absoluta e Definitiva” para efeitos do seguro esteja dependente da necessidade do recurso à assistência permanente de uma terceira pessoa para os atos básicos da vida diária, incluindo necessariamente a dependência total de terceiros para a higiene e alimentação, nos termos do disposto nos artigos 15.º e 16.º do Dec. Lei n.º 446/85 de 25-10.
Como conteúdo típico do contrato de seguro temos que «o segurador cobre um risco determinado do tomador do seguro ou de outrem, obrigando-se a realizar a prestação convencionada em caso de ocorrência do evento aleatório previsto no contrato, e o tomador do seguro obriga-se a pagar o prémio correspondente» (artigo 1.º do RJCS).
Na base de qualquer crédito indemnizatório emergente do contrato de seguro está o sinistro, enquanto realização do risco previsto no contrato de seguro, desencadeador, pela sua própria natureza, da garantia subjacente ao seguro.
Na prática negocial, a delimitação do risco, mormente na vertente causal, é tecnicamente feita através de dois vectores complementares: primeiramente, através de cláusulas definidoras da chamada “cobertura de base”; subsequentemente, pela descrição de hipóteses de exclusão ou de delimitações negativas daquela base[15].
Assim, «a delimitação do risco no contrato consubstancia-se na configuração de uma factispecies contratual, ou seja, num tipo abstrato de sinistro coberto pelo seguro.
Deste modo, o sinistro é a ocorrência concreta do risco assim previsto no contrato, devendo, pois, reunir as mesmas características com que é ali configurado»[16], incumbindo ao segurado o ónus de provar as ocorrências concretas em conformidade com as situações descritas nas cláusulas de cobertura do risco, como factos constitutivos do seu direito de indemnização, em conformidade com o disposto no artigo 342.º, n.º 1 do Código Civil.
Em face da nulidade antes verificada tem-se por excluída do contrato em causa o segmento da cláusula das condições gerais que exige que a verificação da “Invalidez Absoluta e Definitiva” para efeitos do seguro esteja dependente da necessidade do recurso à assistência permanente de uma terceira pessoa para os atos básicos da vida diária, incluindo necessariamente a dependência total de terceiros para a higiene e alimentação.
Contudo, nada tendo sido alegado para o efeito, nem se considerando que o dito contrato de seguro de grupo não possa subsistir sem o dito segmento da cláusula contratual geral assim excluído, designadamente por se ter então tornado indeterminável em aspeto essencial ou implicar agora um desequilíbrio de prestação gravemente atentatório da boa-fé, importa aferir, por ser condição de verificação do sinistro, se o autor padece de Invalidez Absoluta e Definitiva, definida nos termos da apólice em questão como ocorrendo «quando na pessoa segura se verifique uma incapacidade total para o exercício de qualquer atividade» - cf. o ponto 24 dos factos provados.
Nos termos do disposto no artigo 10.º do Dec. Lei n.º 446/85 de 25-10, as cláusulas contratuais gerais são interpretadas e integradas de harmonia com as regras relativas à interpretação e integração dos negócios jurídicos, mas sempre dentro do contexto de cada contrato singular em que se incluam.
Releva, pois, nos termos da regra prevista no artigo 236.º, n.º 1 do Código Civil, o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do declaratário real, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele.
Feito este enquadramento, e atendendo ao que consta do acervo fáctico que permanece inalterado em sede de apelação, entendemos que a adequada ponderação entre o risco do segurado e o compromisso do segurador leva a interpretar a cláusula que define a cobertura de Invalidez Absoluta e Definitiva pelo mínimo de literalidade constante do texto da declaração da cláusula contratual em referência.
Como tal, entendemos que um declaratário normal, ou seja, medianamente instruído e diligente, colocado na posição do autor ao celebrar o contrato de seguro em causa nos presentes autos, interpretaria a cobertura de Invalidez Absoluta e Definitiva como reportada à situação em que o segurado, por doença ou acidente, fique completa e definitivamente impedido de exercer uma qualquer atividade remunerada e, consequentemente, impossibilitado de auferir rendimentos que lhe permitam fazer face à obrigação que assumiu perante a entidade bancária.
Aliás, julgamos ser esta a orientação maioritária na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça em sede de apreciação dos requisitos do acionamento de contratos de seguro em situações de Invalidez Absoluta e Definitiva [17].
No caso em apreciação, o autor/recorrente não provou que tivesse ficado incapacitado para o exercício de qualquer atividade remunerada, antes resultando demonstrado que, de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades para acidentes de trabalho e doenças profissionais, a 16 de junho de 2023, foi atribuída uma incapacidade permanente parcial de 57,053% (ponto 35 dos factos provados), não está incapaz para toda e qualquer profissão (ponto 37 dos factos provados) e poderá exercer profissões em que permaneça sentado, como por exemplo, telefonista, rececionista ou porteiro (ex. registando entradas e saídas de pessoas ou veículos) - ponto 38 dos factos provados - não necessitando de apoio de terceira pessoa para as atividades da vida diária (ponto 39 dos factos provados).
Conclui-se que o autor não fez prova da ocorrência do evento suscetível de desencadear a cobertura do risco de Invalidez Absoluta e Definitiva prevista no contrato de seguro.
Como tal, não se mostram verificados os pressupostos da responsabilidade da ré/seguradora nem o consequente direito do autor a exigir da seguradora o pagamento do valor garantido pelo seguro, o que implica necessariamente a improcedência dos demais pedidos formulados pelo autor (a título principal e subsidiário).
Pelo exposto, confirma-se a sentença recorrida nesta parte, ainda que com fundamentos não totalmente coincidentes.
Síntese conclusiva:

IV. Decisão

Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente a apelação e, em consequência, decide-se:

i)revogar a sentença recorrida na parte em que julgou improcedente o pedido principal formulado em a) e, em consequência, declara-se nulo e excluído do contrato em causa o segmento da cláusula das condições gerais que exige que a verificação da “Invalidez Absoluta e Definitiva” para efeitos do seguro esteja dependente da necessidade do recurso à assistência permanente de uma terceira pessoa para os atos básicos da vida diária, incluindo necessariamente a dependência total de terceiros para a higiene e alimentação;
ii) confirmar, no mais, a sentença recorrida.
Custas da ação e da apelação a cargo do apelante/autor e da apelada/ré, na proporção dos respetivos decaimentos, que se fixam em 4/5 para o apelante e 1/5 para a apelada, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário.

Guimarães, 11 de junho de 2025
(Acórdão assinado digitalmente)

Paulo Reis
(Juiz Desembargador - relator)
Afonso Cabral de Andrade
   (Juiz Desembargador - 1.º adjunto)
Luísa Duarte Ramos
(Juíza Desembargadora - 2.º adjunto)


[1]Cf. o Ac. do STJ de 19-05-2015 (relatora: Maria dos Prazeres Beleza), revista n.º 405/09.1TMCBR.C1. S1 - 7.ª Secção - disponível em www.dgsi.pt.
[2] impondo, ainda, a indicação das concretas razões da impugnação, com referência a concretos meios probatórios e reportadas a determinadas circunstâncias específicas da matéria de facto impugnada ou a cada concreto facto impugnado e não em termos latos, genéricos e em bloco relativamente a todos os factos impugnados, independentemente da sua natureza - cf. por todos, o Ac. TRG, de 10-07-2018 (relatora: Eugénia Cunha), p. 5245/16.9T8GMR-C. G1 disponível em www.dgsi.pt
[3] m) O Autor tem vindo a pagar mensalmente as prestações devidas (amortização + juros + spread + despesas, designadamente comissão de processamento e imposto de selo inerente) e, bem assim, os prémios dos seguros de vida, no valor de pelo menos 380.55€.
[4] Obra citada, p. 290.
[5] Neste sentido, cf. por todos, o Ac. TRG de 30-11-2017 (relator: António Barroca Penha) p. 1426/15.0T8BGC-A. G1, disponível em www.dgsi.pt.
[6]   Cf. Luís Filipe Pires de Sousa, Prova Testemunhal, Coimbra, Almedina, 2016 - Reimpressão -, p. 373.
[7] Obra citada -, p. 373.
[8] Obra citada, p. 598 - nota 10.
[9] Cf. José Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil, 4.ª edição, Coimbra, Gestlegal, 2017, pgs. 734 e 735.
[10] Relatora: Fernanda Isabel Pereira, revista n.º 620/09.8TBCNT.C1. S1, 7.ª Secção, disponível em www.dgsi.pt.
[11] Cf., Ana Prata, Contratos de Adesão e Cláusulas Contratuais Gerais, Anotação ao Decreto-Lei 446/85 de 25-10, Almedina, 2010, pgs. 238-239.
[12] Cf., Ana Prata - obra citada -, p. 266.
[13] Cláusulas Contratuais Gerais e Directiva Sobre Cláusulas Abusivas, 2.ª edição, Almedina, pgs. 261-262.
[14] Neste sentido, cf., por todos, os Acs. TRP de 28-10-2021 (relator: Carlos Querido), p. 747/16.0T8VLG.P1; de 23-02-2017 (relatora: Inês Moura), p. 2377/12.6T2AVR.P1, disponíveis em www.dgsi.pt.
[15] Cf., o Ac. do STJ de 10-03-2016 (relator: Tomé Gomes), p. 4990/12.2TBCSC.L1. S1, disponível em www.dgsi.pt.
[16] Cf., o citado Ac. do STJ de 10-03-2016.
[17] Neste sentido, cf., por todos, os Acs. STJ de 17-09-2024 (relator: António Magalhães), p. 1175/16.2T8VLG.P1. S1; de 17-11-2020 (relator: Acácio das Neves), p. 4093/18.6T8VCT.G1. S1; de 17-10-2029 (relatora: Rosa Ribeiro Coelho), p. 2978/15.0T8FAR.E1. S1; de 19-06-2018 (relator: Paulo Sá), p. 2300/15.6T8PNF.P1. S1; disponíveis em www.dgsi.pt.