I - Continuam a ser inteiramente válidas quer a fundamentação quer a conclusão do Acórdão Uniformizador 6/2022 de 22 de setembro, publicado no Diário da República n.º 184/2022, Série I de 2022-09-22: «No caso de quotas de amortização de capital mutuado pagável com juros, a prescrição opera no prazo de cinco anos, nos termos do artigo 310.º, alínea e) do CC em relação ao vencimento de cada prestação» e «ocorrendo o seu vencimento antecipado, designadamente nos termos do artigo 781.º, daquele mesmo diploma, o prazo de prescrição mantém-se, incidindo o seu termo a quo na data desse vencimento e em relação a todas as quotas vencidas.»
II - A reclamação de crédito em ação executiva movida por terceiro, ainda que o crédito não esteja vencido, constitui um acto que exprime a intenção de exercer o direito de crédito, pelo que a sua notificação ao devedor deve produzir a interrupção da prescrição, nos termos do art.323º, n.1 do Código Civil.
I.
Banco 1..., S.A. deduziu contra AA, BB, CC e DD, todos com os demais sinais dos autos, execução para pagamento de quantia certa.
Nessa acção executiva o banco exequente pede o pagamento de 171.801,26 €, baseando tal pretensão em duas escrituras públicas de Compra e Venda Mútuo com Hipoteca e fiança celebradas no dia 15 de novembro de 2000 com AA, na qualidade de mutuário, e os executados AA, BB, CC e DD, na qualidade de fiadores e principais pagadores.
Mais se alegada que o empréstimo foi feito pelo prazo de 30 anos, a contar da data da celebração do contrato, sendo o mesmo amortizado em prestações mensais, de capital e juros, tendo-se vencido a primeira no correspondente dia do mês seguinte ao da celebração dos referidos contratos e as restantes em igual dia dos meses seguintes, cessando a parte devora o pagamento das prestações que se venceram em 15/07/2008.
Tendo o mutuário deixado de pagar as prestações foram os executados interpelados para pagar a quantia em dívida, o que não fizeram,
Na sequência de pedido decorrente do falecimento de CC, foram habilitados como seus herdeiros[1], contra quem seguiu a execução, o seu cônjuge, a executada DD, as suas duas filhas, EE e FF, igualmente os seus dois netos, filhos do pré-falecido filho GG, HH e II.
FF e EE deduziram embargos de executado, invocando a prescrição do crédito ao abrigo do art.º310.º, al. e) do CC e chamando à colação o AUJ n.º6/2022, publicado no DR 1ª série, n.º184 de 22 de setembro de 2022.
Pugnam pela extinção da execução.
II deduziu igualmente embargo de executado, invocando a sua ilegitimidade por ter repudiado a herança de seu avô, CC por escritura pública celebrada no passado dia 02/02/2024.
Recebidos os embargos, foi deduzida contestação pelo banco exequente, pugnando pela inadmissibilidade e total improcedência daqueles dois primeiros embargos, desistindo da execução em relação a II em face do citado repúdio.
Expressamente notificadas para o efeito, ambas as partes aceitaram a dispensa de audiência prévia, tendo sido proferida a final a seguinte decisão.
«Pelo exposto, julgo extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, quanto à embargante II.
Mais julgo os presentes embargos totalmente procedentes e consequentemente, determino a extinção da execução.
Condeno a embargada/exequente nas custas do processo.
Não se verifica má-fé.
Fixo o valor da causa em 171 801,26 €.
RN. Comunique ao Agente de Execução»
A. O presente recurso vem interposto sobre Sentença no âmbito dos Embargos de Executados apresentados por FF eEE que decidiu “julgo os presentes embargos totalmente procedentes e consequentemente, determino a extinção da execução.”
B. A aqui recorrente não se conformando com os fundamentos que ditaram tal decisão vem, muito respeitosamente, requerer que V. Exas. pugnem pela análise do processo e ditem decisão que vá de encontro aos factos e provas do processo.
C. A7 de março de 2024, a aqui recorrente apresentou requerimento executivo tendo por base dois contratos de mútuo com hipoteca (ref. ª ... e ref. ª ...) celebrados com AA, na qualidade de mutuário e com AA, BB, CC e a aqui Recorrida DD, na qualidade de fiadores.
D. Mediante os referidos contratos foi constituído a favor da Banco 1..., S.A, hipoteca sobre os seguintes imóveis:
- Fração autónoma designada pela letra “I”, destinada a habitação, no 4.º andar, direito, com entrada pelo n.º ..., do prédio urbano sito na Rua ..., da urbanização da ..., freguesia ..., Maia, descrito na Conservatória do Registo Predial da Maia ..., da referida freguesia e inscrito na matriz sob o artigo ...; e
- Fração autónoma designada pela letra “O”, destinada a garagem, com entrada pelo n.º ..., do prédio urbano sito na Rua ..., da urbanização da ..., freguesia ..., Maia, descrito na Conservatória do Registo Predial da Maia sob o n.º ..., da referida freguesia e inscrito na matriz sob o artigo ....
E. Posteriormente, e em virtude do falecimento do executado CC, mediante sentença proferida em 30 de setembro de 2024, foram habilitados como únicos e universais herdeiros desta DD, EE, FF, HH e II como únicos e universais herdeiros do falecido, seguindo contra os mesmos a execução.
F. Sucede que, nas datas de 25 de outubro de 2024 e 28 de outubro de 2024, as recorridas EE, FF e II, respetivamente instauraram Embargos de Executado, apensos C, D e E que mais tarde vieram a ser apensados em conjunto no apenso C.
G. Relativamente ao exposto e provado pela Embargante II, a Recorrente aceitou a renúncia à herança do executado falecido CC, feita por esta, desistindo da execução quanto à Embargante/Executada II.
H. Já as recorridas EE e FF fundamentaram as suas Oposições na alegada prescrição do crédito reclamado, sendo que a Recorrente apresentou a sua contestação na data de 5 de dezembro de 2024.
I. Tendo sido proferida sentença na data de 27 de fevereiro de 2025 que decidiu julgar os embargos totalmente procedentes e consequentemente, determinar a extinção da execução.
J. O Tribunal a quo defende que, relativamente à prescrição de juros, segue a doutrina do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 6/2022, de 22 de setembro, publicado no Diário da República n.º 184/2022, Série I de 2022-09-22, páginas 5 – 15, que fixou a Uniformização de Jurisprudência.
K. E que, tendo as prestações deixado de ser pagas à data de 15/07/2008, considerando a embargada/exequente vencida toda a dívida, reportada à data da última prestação paga e, ainda, considerando que a execução deu entrada em juízo em 04/04/2024, o prazo para a prescrição iniciou-se em 15/07/2008.
L. Sendo o prazo da prescrição de 5 anos, este terminou em julho de 2013, muito antes da propositura da execução, o que logo indicia a verificação da prescrição.
M. Concluindo de imediato, sem necessidade de mais considerações, de que o crédito exequendo já não é exigível, por estar prescrito.
N. Afirmando ainda que a embargada não alega qualquer facto que conduza à suspensão ou interrupção da prescrição.
O. Tal como defendido pela embargada na sua Contestação, o tribunal a quo não se encontra vinculado à decisão tomada naquele AUJ.
P. Isto porque, conforme é sabido, o juiz apenas se encontra vinculado à legislação, sendo livre na interpretação e desenvolvimento do Direito, conforme considerar mais adequado.
Q. De acordo com o artigo 4.º n.º 1 da Lei da Organização do Sistema Judiciário: “Os juízes julgam apenas segundo a Constituição e a lei e não estão sujeitos a quaisquer ordens ou instruções, salvo o dever de acatamento das decisões proferidas em via de recurso por tribunais superiores”.
R. Pelo que, apesar da força orientadora e caráter persuasivo característicos dos AUJ, a verdade é que os mesmos apenas têm efeito vinculativo inter partes.
S. Motivo pelo qual, não tendo o AUJ de que o Embargante se socorreu para fundamentar a sua tese sido proferido no âmbito dos presentes autos, parece evidente à embargada que nenhum impedimento existia a que o tribunal a quo, tendo em consideração os contornos específicos do caso concreto, devidamente concretizados no requerimento executivo, assim como na presente contestação, decidisse em sentido contrário ao defendido no citado AUJ.
T. O que não aconteceu. E mal, na opinião da ora recorrente.
U. Os embargantes fundamentam a alegada prescrição do crédito exequendo por aplicação da alínea e) do artigo 310.º do CC, tanto ao capital, como aos juros remuneratórios e moratórios, considerando ser aplicável, à totalidade do crédito em dívida, o prazo prescricional de 5 anos.
V. Já a aqui recorrente entende que, pese embora seja certo que o incumprimento se iniciou no dia 15/07/2008, sempre será aplicável o prazo prescricional ordinário de 20 anos, consagrado no artigo 309.º do CC, e não o prazo quinquenal, previsto na alínea e) do artigo 310.º do CC.
W. Conforme resulta dos contratos celebrados e dados à execução, foi acordado entre as partes que o capital mutuado seria amortizado, de forma escalonada, em prestações mensais, constantes e sucessivas, de capital e de juros remuneratórios, sendo que, em caso de mora, seria devido ainda o pagamento de juros moratórios, à taxa contratualmente prevista, até efetivo e integral pagamento.
X. Deste modo, apesar de as prestações terem sido escalonadas no tempo, estas não são autónomas entre si, já que a sua existência advém de uma só obrigação.
Y. Tal como ensina GALVÃO TELES,“(…)as prestações periódicas resolvem-se em atos sucessivos, com intervalos regulares ou irregulares, como a obrigação de o inquilino pagar as rendas (…); não se confunde com esta ultima categoria o caso de uma obrigação única dividida ou fraccionada em parcelas. Existe então uma obrigação global que é efectuada por partes, escalonadas no tempo, as quais se dizem “prestações”. Num sentido especial da palavra: pode apontar-se como exemplo um empréstimo de dinheiro em que se convencione o pagamento parcelado” –cfr. “Direito das Obrigações”, 7ª ed., pp. 39 ss.
Z. No caso dos autos, a Embargada procedeu ao vencimento antecipado dos contratos, que ocorreu no dia 09/04/2010, tendo, consequentemente, o crédito em dívida passado a ser composto por todos os montantes vencidos e não pagos, referentes a capital e a juros, bem como os juros vincendos até efetivo e integral pagamento.
AA. Sendo que, verificado o vencimento, ao credor assiste a faculdade de exigir a totalidade do seu crédito, como uma única obrigação pecuniária (sublinhado e negrito nosso).
BB. Assumindo a natureza que assume, de dívida global, o prazo prescricional aplicável à totalidade do crédito exigível é, ao contrário do que é entendido pelo Embargante, o de 20anos, consagrado no artigo 309.º do CC, uma vez que à situação dos autos não é aplicável qualquer das exceções previstas nas alíneas do artigo 310.º do CC.
CC. Aliás, este é o entendimento do douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 10MAI2018, in Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, processo n.º 627/16.9T8ABT-A.E1, que afirma:
“As prestações escalonadas no tempo não são autónomas entre si pois a sua existência radica numa só obrigação; daí que todas se vençam a partir do incumprimento de uma delas.
(…)
Por estas razões, entendemos que ao caso dos autos não se aplica o disposto no art.º 310.º mas sim o disposto no art.º 309.º: o prazo de prescrição é o de 20 anos.”
DD. E ainda dos doutos Acórdãos da Relação de Coimbra de 11ABR2019, in www.dgsi.pt, processos n.ºs 8133/17.8T8CBR-A.C1 e 8133/17.8T8CBR-B.C1, em cujo sumário, de forma esclarecedora, se lê:
“II – Mas se vencida uma quota e não for paga e se vencerem todas as posteriores, este novo montante fica sujeito ao prazo de prescrição ordinário de 20 anos previsto no artigo 309.º do Código Civil.”
EE. Pelo que, procedendo-se ao vencimento antecipado dos empréstimos e à interpelação dos devedores para pagamento, a alínea e) do artigo 310.º do CC não poderá ser aplicável nos autos, pois estamos na presença de uma única obrigação, jamais podendo ser equiparada a uma prestação periódica, renovável e cuja constituição depende do decurso do tempo.
FF. Logo, no presente caso, estando a divida incorporada em títulos executivos (escrituras públicas), fica a mesma sujeita ao prazo ordinário de prescrição, nos termos do artigo 311.º n.º 1 do CC.
GG. Contrariamente ao decidido na sentença proferida, não é aplicável o artigo 310.º do CC, sendo outrossim a obrigação exequenda subsumível aos artigos 309.º e 311.º nº 1, todos do CC.
HH. Por esse motivo, nem o capital, nem os juros estão prescritos, já que, mesmo que se considere que o prazo prescricional começou a contar no dia 15/07/2008, a dívida apenas prescreveria no dia 15/07/2028.
II. Ainda que tal não se concebesse, isto é, que se aceitasse que o prazo prescricional a considerar é o de 5 anos, de acordo com o artigo 310.º do CC, o que apenas só por mera cautela de patrocínio se equaciona, tal também não relevaria.
JJ. Ao contrário do que o Tribunal a quo afirma na sentença proferida, de que a embargada/exequente não alega qualquer facto que conduza à suspensão ou interrupção da prescrição, veja-se o exposto pela embargada nos artigos 13.º a 24.º da sua Contestação.
KK. Em dezembro de 2004, o Executado falecido CC e outros, deram entrada de uma execução contra o mutuário dos empréstimos ora em causa, AA, que, com o número (atualizado) 5761/14.7T8PRT, corre ainda termos no Juízo de Execução do Porto – Juiz 5.
LL. No âmbito dos referidos autos foram penhorados os imóveis dados em garantia à Embargada, já acima identificados, tendo a Embargada, consequentemente, reclamado créditos em 16/05/2006 e em 07/09/2007.
MM. Não tendo, no entanto, sido lograda a venda dos imóveis até à presente data.
NN. Sendo certo que o mutuário AA iniciou o incumprimento das referidas operações em 15/07/2008, já no decorrer da ação executiva supra identificada.
OO. No decorrer da ação, tendo-se mantido o incumprimento e não se tendo procedido à venda dos imóveis penhorados e dados em garantia, a Embargada procedeu ao vencimento antecipado dos empréstimos em dívida em 09/04/2010.
PP. Note-se que, conforme decorre expressamente das cláusulas 16.º e 12.º dos documentos complementares aos contratos dados à execução, à Embargada assiste o direito de considerar o empréstimo vencido se a parte devedora deixar de cumprir alguma das obrigações resultantes desses contratos.
QQ. A Embargada venceu antecipadamente os empréstimos em abril de 2010.
RR. E após alguns anos de inércia por parte dos então Exequentes e de várias tentativas de venda dos imóveis, requereu, em maio de 2017, o prosseguimento da execução, passando a ocupar a posição de Exequente, e a substituição do Agente de Execução, o que foi deferido.
SS. Desde então, a Embargada encontra-se a tentar recuperar o valor que lhe é devido mediante venda dos imóveis penhorados e dados em garantia, sendo que na data de 23/09/2024, foi proferida sentença de declaração de insolvência do mutuário AA.
TT. Pelo que, estes imóveis serão obrigatoriamente vendidos no processo de insolvência que corre termos sob o n.º 2669/24.1T8STSnoTribunal Judicial da Comarca doPorto, Juízo de Comércio de Santo Tirso, Juiz 1.
UU. Importa questionar: a reclamação de créditos em ação executiva de terceiro, mesmo que o crédito ainda não esteja vencido, não constitui um ato que exprime a intenção de exercer o direito de crédito, interrompendo assim a prescrição? Parece-nos que sim.
VV. Veja-se neste sentido o douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15JUN2023, in Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo n.º 4333/21.4T8CBR-C.C1.S1, que afirma que:
“A reclamação de crédito ainda não vencido, em ação executiva movida por terceiro (na qual é penhorado um bem sobre o qual o reclamante tem garantia real), constitui um ato que exprime, antecipadamente, a intenção de exercer o direito de crédito, pelo que a sua notificação ao devedor deve produzir, no momento próprio, a interrupção da prescrição, nos termos do art.323º, n.1 do Código Civil.”
E ainda,
“Assim, vencendo-se a obrigação no decurso da ação executiva onde o crédito foi reclamado, o efeito interruptivo da prescrição produz-se automaticamente (sem necessidade de propositura de uma ação autónoma), e mantém-se até que transite em julgado a decisão que põe termo ao processo, como decorre do art.327º, n.1 do CC.”.
WW. Em situação idêntica veja-se o douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2MAR2023, in Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo n.º 1429/18.3T8STB-A.E1.S1, que afirma que:
“A reclamação do crédito pelo credor em processo de execução fiscal instaurado contra o devedor constitui meio eficaz de interrupção do prazo prescricional.”
XX. Ora, a reclamação de créditos em ação executiva de terceiro, configura um ato que exprime a intenção de exercer o direito de crédito, interrompendo assim a prescrição.
YY. Aliás, a embargada não ficou parada estes anos todos. Tentou vender os imóveis sobre os quais tinha e tem garantia real para assim poder ser ressarcida dos valores em dívida, na medida do possível porquanto assumia a função de credor reclamante.
ZZ.O que se denota pelo facto de após alguns anos de inércia por parte dos Exequentes da ação executiva onde reclamou créditos, ter requerido, em maio de 2017, o prosseguimento da execução, passando a ocupar a posição de Exequente, e a substituição do Agente de Execução.
AAA. Logo, assumindo o credor reclamante a posição de exequente e continuando a diligenciar na cobrança do crédito, tal é considerado um ato que interrompe a prescrição, porquanto tal traduz-se num ato que exprime a intenção de exercer o direito de crédito.
BBB. Pelo que a embargada não compreende, nem pode aceitar a afirmação do tribunal a quo na sentença proferida de que a embargada/exequente não alega qualquer facto que conduza à suspensão ou interrupção da prescrição. Quando alegou!
CCC. Em face de todo o exposto, contrariamente ao decidido na sentença proferida, não é aplicável o artigo 310.º do CC, sendo outrossim a obrigação exequenda subsumível aos artigos 309.º e 311.º nº 1, todos do CC.
DDD. Não estando, nem o capital, nem os juros prescritos, já que, mesmo que se considere que o prazo prescricional começou a contar no dia 15/07/2008, a dívida apenas prescreveria no dia 15/07/2028.
EEE. E mesmo que se entendesse como o Tribunal a quo entendeu, este não poderia ter desconsiderado o ato de interrupção da prescrição alegado pela embargada, isto é, a reclamação de créditos em ação executiva de terceiro efetuada pela embargada.
O tribunal a quo julgou provada a seguinte factualidade:
1. No dia 15 de novembro de 2000 e no exercício da sua atividade creditícia, a Banco 1..., SA celebrou com AA, uma escritura pública denominada Compra e Venda Mútuo com Hipoteca e fiança (ref. ª ...), mediante o qual constituiu a favor da Banco 1..., S.A, que aceitou, hipoteca sobre a fração autónoma designada pela letra “I”, destinada a habitação, no 4.º andar, direito, com entrada pelo n.º ..., do prédio urbano sito na Rua ..., da urbanização da ..., freguesia ..., Maia, descrito na Conservatória do Registo Predial da Maia sob o n.º ..., da referida freguesia e inscrito na matriz sob o artigo ... e fiança prestada pelos Executados AA, BB, CC e DD.
2. A referida hipoteca foi constituída para garantia do mútuo que a Banco 1..., S.A. concedeu ao ora devedor na quantia de € 68.584,71, (à data, ESC 13.750.000,00), importância da qual se confessou, desde logo, devedor, dos respetivos juros até à taxa anual de 9,544%, acrescida, em caso de mora, de uma sobretaxa até 4%, ao ano, a título de cláusula penal e das despesas emergentes do referido contrato.
3. A quantia mutuada foi entregue à parte devedora, na data da outorga do contrato, através de crédito lançado na conta de depósito à ordem número ..., por ele titulada junto da embargada/exequente.
4. O referido empréstimo destinou-se à aquisição do imóvel hipotecado para habitação própria e permanente da parte devedora.
5. Acordaram as partes, na cláusula 4.ª do documento complementar ao contrato a que se vem de fazer referência, que o empréstimo venceria juros à taxa correspondente à média aritmética simples das taxas EURIBOR a seis meses, apurada com referência ao mês imediatamente anterior ao do início de cada período semestral de vigência do contrato (média essa designada por indexante), acrescida de um diferencial de 2,125 pontos percentuais, com arredondamento para o 1/16 avos por cento imediatamente superior.
6. E que, em caso de mora, os respetivos juros seriam calculados à taxa mais elevada de juros remuneratórios que, em cada um dos dias em que se verificasse a mora, estivesse em vigor na Caixa credora para operações ativas da mesma natureza (à data da outorga do contrato, 9,544%, ao ano), acrescida de uma sobretaxa até 4%, ao ano, a título de cláusula penal.
7. O empréstimo foi feito pelo prazo de 30 anos, a contar da data da celebração do contrato, sendo o mesmo amortizado em prestações mensais constantes, de capital e juros, tendo-se vencido a primeira no correspondente dia do mês seguinte ao da celebração do referido contrato e as restantes em igual dia dos meses seguintes.
8. Para efeitos do disposto no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 220/94, de 23/08, consignou-se que a taxa nominal (TN) e a taxa anual efetiva (TAE), uma e outra calculadas nos termos do referido diploma, seriam, respetivamente, de 7,25% e de 7,496%.
9. Mais se acordou, conforme cláusula 12.ª do documento complementar ao referido contrato, que ficariam de conta da parte devedora as despesas resultantes de qualquer avaliação que a credora mandasse efetuar ao imóvel hipotecado, bem como todas as despesas relacionadas com a segurança e cobrança do empréstimo, incluindo, designadamente, honorários de advogados e solicitadores e as derivadas da celebração do referido contrato e seu distrate, do registo da hipoteca e seu cancelamento ou renúncia.
10. Mais se convencionou que o extrato da conta do empréstimo e os documentos de débito emitidos pela Caixa e por ela relacionados com este empréstimo seriam havidos, para todos os efeitos legais, como documentos suficientes para prova e determinação dos montantes em dívida, tendo em vista a exigência, justificação ou reclamação judicial dos créditos que deles resultassem, em qualquer processo.
11. Nos termos da alínea d) da cláusula 16.º do documento complementar ao contrato, ficou reconhecido à Caixa credora o direito de considerar o empréstimo vencido, se a parte devedora deixasse de cumprir alguma das obrigações resultantes do contrato ora em causa.
12. A hipoteca supramencionada encontra-se registada a favor da embargada/exequente Banco 1..., S.A., pela inscrição Ap. ... de 2000/10/09.
13. Igualmente, no dia 15 de novembro de 2000 e no exercício da sua atividade creditícia, a embargada/exequente celebrou com AA, na qualidade de mutuário, uma escritura pública denominada de mútuo com hipoteca e fiança (ref. ª ...), mediante o qual constituiu a favor da Banco 1..., S.A, que aceitou, hipoteca sobre a fração autónoma designada pela letra “O”, destinada a garagem, com entrada pelo n.º ..., do prédio urbano sito na Rua ..., da urbanização da ..., freguesia ..., Maia, descrito na Conservatória do Registo Predial da Maia sob o n.º ..., da referida freguesia e inscrito na matriz sob o artigo ..., e fiança dos Executados AA, BB, CC e DD.
14. A referida hipoteca foi constituída para garantia do mútuo que a Banco 1..., S.A. concedeu ao ora devedor na quantia de € 7.481,97, (à data, ESC 1.500.000,00), importância da qual se confessou, desde logo, devedor, dos respetivos juros até à taxa anual de 9,544%, acrescida, em caso de mora, de uma sobretaxa até 4%, ao ano, a título de cláusula penal e das despesas emergentes do referido contrato.
15. A quantia mutuada foi entregue à parte devedora, de uma só vez, através de crédito lançado na conta de depósito à ordem número ..., por ele titulada junto da embargada/exequente.
16. O referido empréstimo destinou-se a facultar recursos para financiamento de investimentos múltiplos, não especificados, em bens imóveis.
17. Acordaram as partes na cláusula 3.ª do documento complementar contrato a que se vem de fazer referência que o empréstimo venceria juros à taxa correspondente à média aritmética simples das taxas EURIBOR a seis meses, apurada com referência ao mês imediatamente anterior ao do início de cada período semestral de vigência do contrato (média essa designada por indexante), acrescida de um diferencial de 2,125 pontos percentuais, com arredondamento para o 1/16 avos por cento imediatamente superior.
18. E que, em caso de mora, os respetivos juros seriam calculados à taxa mais elevada de juros remuneratórios que, em cada um dos dias em que se verificasse a mora, estivesse em vigor na Caixa credora para operações ativas da mesma natureza (à data da outorga do contrato, 9,544%, ao ano), acrescida de uma sobretaxa até 4%, ao ano, a título de cláusula penal.
19. O empréstimo foi feito pelo prazo de 30 anos, a contar da data da celebração do contrato, sendo o mesmo amortizado em prestações mensais constantes, de capital e juros, tendo-se vencido a primeira no correspondente dia do mês seguinte ao da celebração do referido contrato e as restantes em igual dia dos meses seguintes.
20. Para efeitos do disposto no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 220/94, de 23/08, consignou-se que a taxa nominal (TN) e a taxa anual efetiva (TAE), uma e outra calculadas nos termos do referido diploma, seriam, respetivamente, de 7,25% e de 7,496%.
21. Mais se acordou, conforme cláusula 10.ª do documento complementar ao referido contrato, que ficariam de conta da parte devedora as despesas resultantes de qualquer avaliação que a credora mandasse efetuar ao imóvel hipotecado bem como todas as despesas relacionadas com a segurança e cobrança do empréstimo, incluindo, designadamente, honorários de advogados e solicitadores e as derivadas da celebração do referido contrato e seu distrate, do registo da hipoteca e seu cancelamento ou renúncia.
22. Mais se convencionou que o extrato da conta do empréstimo e os documentos de débito emitidos pela Caixa e por ela relacionados com este empréstimo seriam havidos, para todos os efeitos legais, como documentos suficientes para prova e determinação dos montantes em dívida, tendo em vista a exigência, justificação ou reclamação judicial dos créditos que deles resultassem, em qualquer processo.
23. Nos termos da alínea d) da cláusula 12.º do documento complementar ao contrato a que se vem de fazer referência, ficou reconhecido à Caixa credora o direito de considerar o empréstimo vencido, se a parte devedora deixasse de cumprir alguma das obrigações resultantes do contrato ora em causa.
24. A hipoteca supramencionada encontra-se registada a favor da embargada/exequente Banco 1..., S.A., pela inscrição Ap. ... de 2000/10/09.
25. Para garantia das obrigações decorrentes dos empréstimos, os Executados AA, BB, CC e DD, responsabilizaram-se como fiadores e principais pagadores por tudo quanto viesse a ser devido à Caixa credora em consequência dos empréstimos supra referidos, tendo dado, desde logo, o seu acordo a quaisquer modificações da taxa de juros, alterações de prazo ou moratórias que viessem a ser convencionadas entre a credora e a parte devedora, e aceitaram que a estipulação relativa ao extrato da conta e aos documentos de débito fosse também aplicável à fiança.
26. A parte devedora deixou de cumprir as obrigações emergentes dos supra identificados contratos em 15/07/2008.
27. A Exequente convidou os Executados a requererem a sua integração no Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), a qual não veio a ser solicitada.
28. Na data de 23/09/2024, foi proferida sentença de declaração de insolvência do mutuário AA.
29. A Embargada enviou cartas de interpelação para pagamento aos fiadores, em 23/01/2024.
30. A execução de que estes autos dependem foi proposta em 04/04/2024.
31. Por sentença proferida no processo principal em 30-09-2024 foram as embargantes habilitadas como herdeiras CC.
É consabido que resulta dos art.635.º, n.ºs 3 a 5 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do CPC, que o objeto do recurso está delimitado pelas conclusões das respetivas alegações[2], sem prejuízo das questões cujo conhecimento é oficioso.
Assim, em síntese, do que resulta das conclusões, caberá apreciar unicamente a seguinte questão: Está o crédito, cuja recuperação foi intentada pelo exequente através da execução de que estes autos são apenso, prescrito?
«A propósito da questão da prescrição que foi suscitada nos autos, segue o tribunal a doutrina do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 6/2022, de 22 de setembro, publicado no Diário da República n.º 184/2022, Série I de 2022-09-22, páginas 5 – 15, que fixou a Uniformização de Jurisprudência da forma seguinte:
"I - No caso de quotas de amortização do capital mutuado pagável com juros, a prescrição opera no prazo de cinco anos, nos termos do artigo 310.º alínea e) do Código Civil, em relação ao vencimento de cada prestação."
"II - Ocorrendo o seu vencimento antecipado, designadamente nos termos do artigo 781.º daquele mesmo diploma, o prazo de prescrição mantém-se, incidindo o seu termo 'a quo' na data desse vencimento e em relação a todas as quotas assim vencidas."
Importa apurar se tal prazo decorreu, pois não há dúvidas que estamos perante quotas de amortização do capital mutuado pagável com juros, embora tenha ocorrido vencimento antecipado nos termos do artigo 781.º do Código Civil.
Convocam-se os factos pertinentes para esta questão:
A execução deu entrada em juízo em 04/04/2024.
As prestações deixaram de ser pagas desde 15/07/2008.
A embargada/exequente considerou vencida toda a dívida, reportada à data da última prestação paga.
Visto isto, o prazo para a prescrição iniciou-se em 15/07/2008, data em que a embargada/exequente considerou vencidas todas as prestações, e é de 5 anos, pelo que terminou em Julho de 2013, muito antes da propositura da presente execução, o que logo indicia a verificação da prescrição.
Não há dúvidas que «a prescrição interrompe-se pela citação», de acordo com o n.º 1 do artigo 323.º do mesmo Código Civil. É assim irrelevante que tenham ocorrido interpelações extrajudiciais anteriores.
A embargada/exequente não alega qualquer facto que conduza à suspensão ou interrupção da prescrição.
O que tudo leva, sem necessidade de mais considerações, à conclusão de que o crédito exequendo já não é exigível, por estar prescrito.
Pelos motivos aduzidos, impõe-se declarar a prescrição do crédito em relação ao Embargante, e consequentemente, deve ser extinta a execução.
Entende a decisão em crise que o prazo de prescrição a relevar no caso é o prazo de 5 anos, retirado do artº 310.º, al.e), do CC: «Prescrevem no prazo de cinco anos:
(…)
e) As quotas de amortização do capital pagáveis com os juros.»
A propósito deste preceito debateram-se os tribunais em controvérsia quanto à sua aplicabilidade aos casos como o que se nos depara.
A questão foi definitivamente resolvida por via Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 6/2022, de 22 de setembro, publicado no Diário da República n.º 184/2022, Série I de 2022-09-22, páginas 5 – 15.
«De acordo com o Acórdão (….) «no caso de quotas de amortização de capital mutuado pagável com juros, a prescrição opera no prazo de cinco anos, nos termos do artigo 310.º, alínea e) do CC em relação ao vencimento de cada prestação» e «ocorrendo o seu vencimento antecipado, designadamente nos termos do artigo 781.º, daquele mesmo diploma, o prazo de prescrição mantém-se, incidindo o seu termo a quo na data desse vencimento e em relação a todas as quotas vencidas»[3].
O AUJ que foi suporte da decisão em crise é, também para nós, incontornável e inultrapassável.
Não encontramos qualquer argumentário que, acrescido aos superlativos do citado acórdão uniformizador, o possa contornar.
«(…), não vemos razões, de facto ou de direito, para não aderir inteiramente ao aí decidido, uma vez que continuam a ser inteiramente válidas quer a fundamentação quer a conclusão desse Acórdão Uniformizador[4].
(….)
Efectivamente podemos ler no AUJ em apreço que ««A posição doutrinal que, em II, entendemos a mais adequada, ou seja, a aplicação da prescrição de 5 anos à acumulação das quotas de amortização do capital por perda de benefício do prazo (artigo 781.º CCiv), vem sustentada na quase totalidade da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, designadamente no Ac. S.T.J. 29/9/2016, revista n.º 201/13.1TBMIR-A.C1.S1 (Lopes do Rego) cit. e também nos Acs. S.T.J. 8/4/2021, revista n.º 5329/19.1T8STB-A.E1.S1 (Nuno Pinto Oliveira), S.T.J. 9/2/2021, revista n.º 15273/18.4T8SNT-A.L1.S1 (Fernando Samões), S.T.J. 14/1/2021, revista n.º 6238/16.1T8VNF-A.G1.S1 (Tibério Nunes da Silva), S.T.J. 12/11/2020, revista n.º 7214/18.5T8STB-A.E1.S1 (Maria do Rosário Morgado), S.T.J. 3/11/2020, revista n.º 8563/15.0T8STB-A.E1.S1 (Fátima Gomes), S.T.J. 23/1/2020, revista n.º 4518/17.8T8LOU-A.P1.S1 (Nuno Pinto Oliveira), S.T.J. 27/3/2014, revista n.º 189/12.6TBHRT-A.L1.S1 (Silva Gonçalves), e em numerosas decisões das Relações»»[5].
De resto, este AUJ sufraga o ««(…) que já era dominante nos nossos Tribunais superiores. Cf., por exemplo Ac. STJ de 23 de janeiro de 2020, processo 4518/17.8T8LOU-A.P1.S1»[6]:
« (…)
16. A primeira questão consiste em determinar se a dívida prescreveu, por aplicação do art. 310.º, alínea e), do Código Civil.
(…)
19. O art. 310.º, alínea e), do Código Civil determina que “[p]rescrevem no prazo de cinco anos [a]s quotas de amortização do capital pagáveis com os juros” e o problema está em averiguar se o prazo de cinco anos deve aplicar-se à dívida, considerada no seu conjunto ou na sua globalidade. A Exequente A..., S.A., alega que a obrigação de restituição da quantia mutuada é uma obrigação unitária de prestação fraccionada ou repartida e que deve aplicar-se-lhe o prazo ordinário de prescrição do art. 309.º do Código Civil. A Executada CC contra-alega que, ainda que a obrigação de restituição da quantia mutuada seja uma obrigação unitária de prestação fraccionada ou repartida, deve aplicar-se o prazo curto de prescrição — de cinco anos — do art. 310.º, alínea e) do Código Civil.
20. O Tribunal da Relação do Porto pronunciou-se no sentido de que o acordo entre credor e devedores era um plano de amortização fraccionada em prestações do capital e dos juros correspondentes e de que devia aplicar-se às prestações do capital e dos juros o prazo curto de prescrição do art. 310.º, alínea e), do Código Civil - e a interpretação do art. 310.º, alínea e), contida no acórdão recorrido é conforme à jurisprudência constante do Supremo Tribunal de Justiça.»»[7]
Por conseguinte o prazo de prescrição aplicável no caso é o que emerge do art.º310.º, al.e) do CC.
A decisão em crise considerou que não foi alegada qualquer factualidade que impedisse o decurso do prazo.
Diz a decisão:
«(…)
As prestações deixaram de ser pagas desde 15/07/2008.
A embargada/exequente considerou vencida toda a dívida, reportada à data da última prestação paga.
Visto isto, o prazo para a prescrição iniciou-se em 15/07/2008, data em que a embargada/exequente considerou vencidas todas as prestações, e é de 5 anos, pelo que terminou em Julho de 2013, muito antes da propositura da presente execução, o que logo indicia a verificação da prescrição.
Não há dúvidas que «a prescrição interrompe-se pela citação», de acordo com o n.º 1 do artigo 323.º do mesmo Código Civil. É assim irrelevante que tenham ocorrido interpelações extrajudiciais anteriores.
A embargada/exequente não alega qualquer facto que conduza à suspensão ou interrupção da prescrição[8].
O que tudo leva, sem necessidade de mais considerações, à conclusão de que o crédito exequendo já não é exigível, por estar prescrito.
(…)»
Conclui o exequente que
JJ. Ao contrário do que o Tribunal a quo afirma na sentença proferida, de que a embargada/exequente não alega qualquer facto que conduza à suspensão ou interrupção da prescrição, veja-se o exposto pela embargada nos artigos 13.º a 24.º da sua Contestação.
KK. Em dezembro de 2004, o Executado falecido CC e outros, deram entrada de uma execução contra o mutuário dos empréstimos ora em causa, AA, que, com o número (atualizado) 5761/14.7T8PRT, corre ainda termos no Juízo de Execução do Porto – Juiz 5.
LL. No âmbito dos referidos autos foram penhorados os imóveis dados em garantia à Embargada, já acima identificados, tendo a Embargada, consequentemente, reclamado créditos em 16/05/2006 e em 07/09/2007.
MM. Não tendo, no entanto, sido lograda a venda dos imóveis até à presente data.
NN. Sendo certo que o mutuário AA iniciou o incumprimento das referidas operações em 15/07/2008, já no decorrer da ação executiva supra identificada.
OO. No decorrer da ação, tendo-se mantido o incumprimento e não se tendo procedido à venda dos imóveis penhorados e dados em garantia, a Embargada procedeu ao vencimento antecipado dos empréstimos em dívida em 09/04/2010.
PP. Note-se que, conforme decorre expressamente das cláusulas 16.º e 12.º dos documentos complementares aos contratos dados à execução, à Embargada assiste o direito de considerar o empréstimo vencido se a parte devedora deixar de cumprir alguma das obrigações resultantes desses contratos.
QQ. A Embargada venceu antecipadamente os empréstimos em abril de 2010.
RR. E após alguns anos de inércia por parte dos então Exequentes e de várias tentativas de venda dos imóveis, requereu, em maio de 2017, o prosseguimento da execução, passando a ocupar a posição de Exequente, e a substituição do Agente de Execução, o que foi deferido.
SS. Desde então, a Embargada encontra-se a tentar recuperar o valor que lhe é devido mediante venda dos imóveis penhorados e dados em garantia, sendo que na data de 23/09/2024, foi proferida sentença de declaração de insolvência do mutuário AA.
TT. Pelo que, estes imóveis serão obrigatoriamente vendidos no processo de insolvência que corre termos sob on.º 2669/24.1T8STSnoTribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo de Comércio de Santo Tirso, Juiz 1.
Na verdade os factos constantes das conclusões que antecedente foram desconsiderados pelo tribunal a quo na decisão que proferiu ao afirmar que «A embargada/exequente não alega qualquer facto que conduza à suspensão ou interrupção da prescrição.»
Tais factos estão assim alegados na contestação:
15.º
Preliminarmente, cumpre contextualizar que em dezembro de 2004, o Executado falecido CC e outros, deram entrada de uma execução contra o mutuário dos empréstimos ora em causa, AA, que, com o número (atualizado) 5761/14.7T8PRT, corre ainda termos no Juízo de Execução do Porto – Juiz 5.
16.º
No âmbito dos referidos autos foram penhorados os imóveis dados em garantia à Embargada, melhor identificados em sede de requerimento executivo, tendo a Embargada, consequentemente, reclamado créditos em 16/05/2006 e em 07/09/2007.
17.º
Não tendo, no entanto, sido lograda a venda dos imóveis até à presente data.
18.º
O mutuário AA iniciou o incumprimento das referidas operações em 15/07/2008, já no decorrer da ação executiva supra identificada.
19.º
No decorrer da ação, tendo-se mantido o incumprimento e não se tendo procedido à venda dos imóveis penhorados e dados em garantia, a Embargada procedeu ao vencimento antecipado dos empréstimos em dívida em 09/04/2010, conforme se pode verificar nas notas de débito juntas sob o n.º 6 e 7 do requerimento executivo.
20.º
Note-se que, conforme decorre expressamente das cláusulas 16.º e 12.º dos documentos complementares aos contratos dados à execução, à Embargada assiste o direito de considerar o empréstimo vencido se a parte devedora deixar de cumprir alguma das obrigações resultantes desses contratos.
21.º
Trata-se, pois, de um direito que assiste à credora e não de qualquer imposição contratual, não se impondo à credora o vencimento imediato do empréstimo logo que se verifique incumprimento de obrigações contratuais.
22.º
O que aconteceu, in casu, pois, após várias tentativas de venda dos imóveis, no sentido de recuperar o valor que se encontrava em dívida através da venda dos bens dados em garantia, a Embargada venceu antecipadamente os empréstimos em abril de 2010,
23.º
E após alguns anos de inércia por parte dos então Exequentes e de várias tentativas de venda dos imóveis, requereu, em maio de 2017, o prosseguimento da execução, passando a ocupar a posição de Exequente, e a substituição do Agente de Execução, o que foi deferido.
24.º
Desde então, a Embargada encontra-se a tentar recuperar o valor que lhe é devido mediante venda dos imóveis penhorados e dados em garantia, sendo que na data de 23/09/2024, foi proferida sentença de declaração de insolvência do mutuário AA.
25.º
Pelo que, estes imóveis serão obrigatoriamente vendidos no processo de insolvência que corre termos sob o n.º 2669/24.1T8STS no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo de Comércio de Santo Tirso, Juiz 1.
Estão tais factos alegado nos moldes que antecedem e o tribunal a quo não os relevou em termos de os considerar com a virtualidade de, provados, servirem a pretensão do banco exequente, ou seja, de impedimento do decurso do prazo de prescrição por via da interrupção.
Vejamos, convocando os seguintes normativos do Código Civil:
323.º
1. A prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente
(…)
326.º
1. A interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, sem prejuízo do disposto nos n.os 1 e 3 do artigo seguinte.
2. A nova prescrição está sujeita ao prazo da prescrição primitiva, salvo o disposto no artigo 311.º
Artigo 327.º
1. Se a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo.
(…)»
Resulta, pois, que, considerada a citada factualidade, já em 16.5.2006 e 7.9.2007, datas em que alegadamente se reclamou o crédito que com a execução de que estes autos são apenso se pretende cobrar[9], se fez demonstração da intenção de se exercer o direito cuja prescrição se ajuíza.
«Ora, pensamos não haver dúvida que a reclamação do crédito no âmbito do processo de execução onde foi efectuada a penhora do bem hipotecado é uma diligência judicial que é incompatível pelo desinteresse pelo direito e que, sem dúvida alguma, tem aptidão para levar ao conhecimento do devedor a intenção de o exercer. Na verdade, ainda que se entenda que não está a exercer o direito – o que temos, no mínimo, como discutível –, a verdade é que está a reclamar o pagamento do crédito à custa do bem que garante o seu cumprimento, revelando a clara intenção de não prescindir dessa garantia e de pretender obter a efectiva satisfação do seu direito. Perante essa reclamação, é evidente para todos – incluindo para o devedor – que não está configurada a inércia e desinteresse do credor relativamente ao direito que está subjacente ao instituto da prescrição. (..)»[10]
De facto, «[f]actores interruptivos são, para o efeito do artigo, a citação e a notificação judicial de acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito. Contudo, tal como dispõe a parte final do nº1, não é obrigatório que o processo em que se verifique a citação ou a notificação seja aquele em que se esteja a exercer o direito. Podem aqueles actos ocorrer num processo judicial preparatório (por exemplo, num procedimento cautelar), o que interessa é que, pelo exercício judicial do direito, isto é, por esse processo, seja possível fazer saber ao citado/notificado que o interessado faz tenção de exercer o seu direito noutro. Quer dizer, a previsão normativa cobriria ««todas as hipóteses de relação jurídica litigiosa (neste sentido, por exemplo, Dias Marques, prescrição Extintiva, Coimbra Editora, 1953, pág.167-168).
Quando o artigo (…) fala em actos que exprimam indirectamente a intenção de exercer o direito está, obviamente, a aludir essencialmente aos casos em que, no âmbito de outra pretensão substancialmente diferente, o autor dê conta, revele ou faça saber que pretende exercer num outro processo o direito de reclamar o pagamento de um outro crédito que lhe seja devido mas que ali não seja possível peticionar. Só assim a norma faz pleno sentido.
(…)»[11]
Debalde se dirá que a interrupção seria inviável no caso por as reclamações de crédito supra aludidas (necessariamente seguidas de notificação aos exequentes e executado do processo 5761/14.7T8PRT) terem ocorrido em data anterior (16.5.2006 e 7.9.2007) ao vencimento da totalidade crédito, que, dito pelo banco exequente, ocorreu a 9.4.10[12]/[13].
Como se decidiu no Ac. identificado na nota 10, (I) A reclamação de crédito ainda não vencido, em ação executiva movida por terceiro (na qual é penhorado um bem sobre o qual o reclamante tem garantia real), constitui um ato que exprime, antecipadamente, a intenção de exercer o direito de crédito, pelo que a sua notificação ao devedor deve produzir, no momento próprio, a interrupção da prescrição, nos termos do art.323º, n.1 do Código Civil. (II) vencendo-se a obrigação no decurso da ação executiva onde o crédito foi reclamado, o efeito interruptivo da prescrição produz-se automaticamente (sem necessidade de propositura de uma ação autónoma), e mantém-se até que transite em julgado a decisão que põe termo ao processo, como decorre do art.327º, n.1 do CC.»
É de facto uma leitura com que se concorda, ajustada à ideia da promoção da economia e uso ajustado dos meios.
Como se refere no citado acórdão a «páginas tantas» «[q]uanto ao momento em que o direito é exercido, ou seja, no caso concreto, alguns meses antes de o crédito se ter vencido, nenhum argumento se consegue retirar do teor da lei no sentido de se poder afirmar que o ato destinado a operar a interrupção da prescrição só poderia ocorrer depois de o crédito se ter tornado judicialmente exigível (pelo incumprimento do devedor). Nenhuma razão se identifica que possa impedir a expressão antecipada da intenção de exercer o direito (num contexto em que o devedor é judicialmente notificado dessa intenção), produzindo-se o efeito interruptivo, automaticamente, no momento próprio, ou seja, no momento em que o direito se torna judicialmente exigível.
Trata-se da solução que melhor se compatibiliza com o princípio da economia processual e com a ideia de um uso racional e criterioso dos meios judiciais. Defender solução oposta seria impor ao credor (que já havia reclamado o seu crédito numa execução em curso) que propusesse uma ação autónoma quando o seu crédito se vencesse e, consequentemente, começasse a contar o prazo da prescrição, conduzindo, assim, ao uso desnecessário de um novo processo (que, eventualmente, acabaria sustado, nos termos do art.794º do CPC).
Concluiu-se, pelas razões expostas, que a reclamação de créditos numa execução em curso, quando tais créditos ainda não se encontram vencidos, é ato idóneo, depois de notificado ao devedor, a produzir a interrupção da prescrição, no momento próprio, nos termos do art.323º, n.1 do CC.»
A entender-se assim, como entendemos, teria o tribunal a quo de apreciar a matéria citada (artigos 15-25 da contestação) na medida que dela se alega facto interruptivo da prescrição.
Todavia, não estava ainda em condições de o fazer desde logo, como de resto não estamos nós: carece-se de prova quanto ao alegado na contestação a propósito da interrupção da prescrição e sem prejuízo de eventual convite ao aperfeiçoamento que o tribunal a quo entenda ajustado e com vista a melhor concretização de quem são os demais citados exequentes do processo 5761/14.7T8PRT para além do que se identifica[14], tudo na medida que se entenda isso como essencial para definir o âmbito subjectivo da eficácia do acto interruptivo (temática da eficácia subjectiva da interrupção da prescrição).[15]
Em face do exposto, impõe-se a revogação da decisão e a determinação que se produza prova quanto à factualidade a que se referem os artigos da contestação atrás identificados e, em face disso, se decida em conformidade.
Destarte, acorda este tribunal em revogar a decisão recorrida, determinando que se produza prova quanto à factualidade a que se referem os artigos da contestação atrás identificados e, em face disso, se decida em conformidade quanto a verificação ou não da interrupção da prescrição, tudo tendo por referência ao prazo a que alude o artigo 310 al. e) do Código Civil.
Custas pelas apeladas sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficiem.