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TERMO DE IDENTIDADE E RESIDÊNCIA
RESIDÊNCIA
ALTERAÇÃO
NOTIFICAÇÃO DA ACUSAÇÃO
IRREGULARIDADE
Sumário
I. Vigora no nosso ordenamento processual penal, no que a nulidades se reporta, o princípio da legalidade com consagração no artigo 118º do Código de Processo Penal e nos termos do qual a violação ou inobservância das disposições da lei do processo só determina a nulidade do ato quando for expressamente cominada na lei. II- Os recorrentes invocam que a falta de notificação do despacho de acusação à sociedade arguida é uma nulidade insanável nos termos do artigo 119º al. c) do Código de Processo Penal, porém, a mera leitura do invocado preceito permite excluir tal interpretação, posto, que o que aí se prevê é: «a ausência do arguido ou do seu defensor, nos casos em que a lei exigir a respetiva comparência». III-A notificação do despacho de acusação tendo o arguido sido sujeito a Termo de Identidade e Residência, é feita através de via postal simples como decorre da concatenação dos artigos 283º nº6 e 113º nº1 al. c) ambos do Código de Processo Penal (ato que não pressupõe a presença ou comparência do arguido mas apenas o depósito da carta no recetáculo postal correspondente à morada indicada para notificação no Termo de Identidade e Residência). III-A mera referência a outra morada nos autos não consubstancia uma alteração de morada para efeitos de notificação porquanto tal exige uma comunicação que revele, de modo claro e inequívoco, tal vontade e que seja formulada nos autos ou pessoalmente pelo arguido ou por terceiro, mas munido de procuração para tal na secretaria do Tribunal ou remetida aos autos por via postal registada pelo arguido ou por terceiro, mas munido de procuração para tal, estando em causa uma obrigação do arguido e não do Tribunal, pelo que não cabe a este averiguar de alteração de morada não comunicada formalmente nos termos referidos para efeito de notificação. IV-Com efeito, não se pode olvidar das consequências consagradas no artigo 196º do Código de Processo Penal, mormente, que o incumprimento das obrigações em tal artigo consagradas e onde se inclui a comunicação da outra morada para efeito de notificação legitima a representação do arguido por defensor em todos os atos processuais nos quais tenha o direito ou dever de estar presente bem como a realização da audiência de julgamento na sua ausência nos termos do artigo 333º do Código de Processo Penal. V-Não se constatando a comunicação formal nos termos referidos de outra morada por parte da sociedade arguida até à data em que foi expedida tal notificação que veio a ser depositada na morada indicada no Termo de Identidade e Residência inexiste qualquer vício da sua notificação. V- Não basta a mera junção de um substabelecimento sem reserva por parte do mandatário substabelecente sendo necessário uma aceitação do mandatário substabelecido nesse instrumento processual ou um qualquer comportamento processual concludente deste último nos autos.
Texto Integral
Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da 3ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:
1-RELATÓRIO:
Nos autos de processo comum com intervenção de Tribunal Singular nº1618/15.2IDLSB que correm os seus termos no Juiz 1 do Juízo Local Criminal de Torres Vedras, Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte foi, em ... de ... de 2024, proferida sentença, cujo dispositivo é, ao que nos interessa, do seguinte teor: III- DISPOSITIVO Face ao exposto, julgo a acusação totalmente procedente, por provada, e, em consequência: A) ABSOLVO os arguidos da prática de um crime de fraude qualificada, p. e p. pelos artigos 103.°, n.°1, alínea c), e 104.°, n.°s 1, 2, alínea a), e 3, do Regime Geral das Infrações Tributárias, aprovado pela Lei n.°15/2001, de 05/06. B) CONDENO o arguido AA pela prática, em coautoria material e na forma consumada, de um crime de fraude qualificada, p. e p. pelos artigos 103.°, n.°1, alínea c), e 104.°, n.°s 1 e 2 do Regime Geral das Infrações Tributárias, aprovado pela Lei n.°15/2001, de 05/06, na sua redação originária, na pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período; C) CONDENO a arguida BB pela prática, em coautoria material e na forma consumada, de um crime de fraude qualificada, p. e p. pelos artigos 103.°, n.°1, alínea c), e 104.°, n.°s 1 e 2 do Regime Geral das Infrações Tributárias, aprovado pela Lei n.°15/2001, de 05/06, na sua redação originária, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período; D) CONDENO a sociedade Sociedade arguida pela prática, em coautoria material e na forma consumada, de um crime de fraude qualificada, p. e p. pelos artigos 103.°, n.°1, alínea c), e 104.°, n.°s 1 e 2 e 7.° do Regime Geral das Infrações Tributárias, aprovado pela Lei n.°15/2001, de 05/06, na pena de 250 (duzentos e cinquenta) dias de multa à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), o que perfaz a quantia global de € 1.250,00 (mil duzentos e cinquenta euros);
(…)
*
Inconformados com a decisão proferida dela recorreram os arguidos AA, BB e Sociedade arguida extraindo da motivação as conclusões que a seguir se transcrevem: A.O presente recurso visa, circunscrito às questões enumeradas, por em crise a sentença proferida em 1ª instância depositada em ...-...-2024 no que diz respeito à condenação dos Arguidos AA – 2º Arguido e BB – 3ª Arguida pela prática, em coautoria material e na forma consumada, de um crime de fraude qualificada, previsto e punido pelos Artigos 103º nº 1. alínea c), e 104º, nºs 1 e 2 do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT), aprovado pela Lei nº 15/2001, de 05/06, na sua redação originária, e a Sociedade arguida -1º Arguida; B. Pela prática, em coautoria material e na forma consumada, de um crime de fraude qualificada, previsto e punido pelos Artigos 103º nº l, alínea c), e 104º, nºs 1, 2 e 7 do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT), aprovado pela Lei nº 15/2001, de 05/06, nos termos da qual o 2º Arguido foi condenado na pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período; a 3ª Arguida foi condenada na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período; a 1ª Arguida, a sociedade Sociedade arguida foi condenada na pena de 250 (duzentos e cinquenta) dias de multa à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), o que perfaz a quantia global de € 1.250,00 (mil duzentos e cinquenta euros), condenando ainda os arguidos ao pagamento da taxa de justiça, e nas demais custas do processo, que se fixaram em 2 UC, nos termos do disposto nos Artigos 513º e 514º todos do Código Penal e Artigos 8º, nº 9, do Regulamento das Custas Processuais, com referência à tabela III. C. Os Recorrentes não se conformam, nem se poderiam conformar com a decisão, porque esta enferma de nulidades, irregularidades, deficiências e vícios que ferem de forma insanável a conclusão central em que assenta a condenação de todos os Arguidos na prática do crime em coautoria material de fraude qualificada - pois a prova indicada pelo Tribunal a quo, e o processo lógico racional pelo qual o Tribunal atingiu essa conclusão, são insuficientes para a condenação dos Arguidos, quando pelo contrário, a prova carreada aos autos é suficiente para sustentar a absolvição dos Arguidos da prática do ilícito imputado. D. Tais vícios, que se irão evidenciar de seguida, respeitam quer a irregularidades ocorridas aolongo do processo, quer a matéria de facto, dada a realidade espelhada na sentença não ter integral aderência à realidade processual, porquanto a prova disponível nos autos ser manifestamente suficiente para suportar a conclusão contrária a que chegou o Tribunal espelhadas na matéria provada e não provada a esse respeito, outra existindo que impunha decisão inversa, quer a matéria de direito, posto que o Tribunal a quo errou na interpretação e aplicação do direito, infringindo diversas normas legais, sobretudo abusando dos poderes cognitivos conferidos ao Tribunal no processo decisório, ao arrepio de princípios conformadores do direito processual penal. E.A sentença proferida pelo Tribunal a quo encontra-se ferida de nulidade insanável, por violação do disposto nos Artigos 61º, nº l, alínea a) e 287º, nº 5, ambos do Código de Processo Penal, e por violação do Artigo 32º da Constituição da República Portuguesa, por omissão de notificação do Despacho de Acusação à Sociedade arguida, que oportunamente indicou nos autos a morada de notificação da mesma - ... fls. 277v e 280, morada que o Tribunal ignorou remetendo o indicado Despacho de Acusação em ........2018, por via postal com comprovativo de depósito para a morada - ... - cfr. referencia CITIUS ..., de .../.../2018. A ausência de tal notificação acarreta nulidade insanável nos termos do Artigo 119º, alínea c) do CPP, nulidade que afeta todos os actos subsequentes, incluindo a audiência de julgamento e a sentença proferida, que padece de nulidade. F. Considera-se que o procedimento criminal se encontra prescrito ao abrigo do disposto no artigo 21º, nº 1 do RGIT. Assentando a condenação do Tribunal a quo na prática de ilícito de fraude qualificada por utilização de faturas falsas que, na sua interpretação, não corresponderam a serviços efetivamente prestados, encontrando-se a última das mesmas datada de ... de ... de 2011 - cfr. fls. 205 e tendo sido entregue a última declaração fiscal referente às mesmas em ... de ... de 2012, quer se defenda que o crime se considera praticado na data da emissão das faturas, quer se considere praticado na data da entrega da declaração fiscal, em ambas as hipóteses, o procedimento criminal estaria prescrito, em ... de ... de 2024 ou em ... de ... de 2024, por efeito do disposto no nº2 do Artigo 120º do Código Penal, uma vez que o processo se mostrou suspenso entre ... de ... de 2021 e ... de ... de 2024. Devendo, em consequência de estar operada a prescrição ser declarado extinto o procedimento criminal. G.A sentença proferida encontra-se ferida de nulidade insanável por falta de notificação da data de repetição de audiência de julgamento à Sociedade arguida. Com efeito, como referido, a morada da Sociedade, indicada pelo seu gerente a fls. 280, foi ignorada, tendo as notificações das datas designadas para audiência de julgamento sido remetidas para morada que não era nem a da sede nem a indicada pelo seu gerente, não podendo a Sociedade arguida considerar-se notificada. Tendo a Audiência de julgamento tido lugar na sua ausência como veio a ocorrer em ... de ... de 2024, foram violados os Artigos 61º, nº 1, alínea a) e 3329 ambos do CPP e o Artigo 32º da CRP, encontra-se ferida de nulidade bem como a sentença proferida. H. Em ... de ... de 2024 realizou-se a primeira sessão da repetição da audiência de julgamento que tinha ocorrido nos anos de ... a ..., tendo a mesma ocorrido sem a presença dos três Arguidos, por total desconhecimento destes da realização da mesma e sem a presença do mandatário que haviam constituído - Sr. Dr. CC, que não compareceu à mesma por se encontrar impedido por motivo de doença. Em ... o referido mandatário subscreveu dois requerimentos via CITIUS: um justificando a sua falta e outro juntando documento de substabelecimento sem reserva a favor do seu ilustre Colega, Sr. Dr. DD. O Mandatário dos Arguidos nunca foi notificado de nenhum acto no processo: nem do despacho proferido pelo Tribunal a quo em .../.../2024 com a referência CITIUS ..., nem da data designada para continuação de audiência de julgamento, nem da data designada para leitura de sentença, violando o Artigo 113º, nº 10 do CPP, o que determina nulidade da audiência de julgamento e da sentença proferida na sequência da sua realização, por ofensa frontal dos direitos, liberdades e garantias dos Arguidos. I.O Tribunal a quo cometeu erro de julgamento ao considerar provados os pontos 8, 9, 11 a 16,17, 20, 21 e 30 da matéria de facto dada como provada, afirmando ter formado a sua convicção com base na apreciação crítica e conjugada das declarações dos Arguidos, que não admitiram a prática dos factos, com a prova documental junta aos autos e a prova testemunhal, tudo apreciado à luz das regras da experiência comum. J. Para tanto, refere o Tribunal a quo, ter atentado nos seguintes documentos, para efeitos de matéria de facto dada como provada: -Certidão permanente Sociedade arguida -fls. 4-10; -Informação preliminar - fls. 63 e ss; -Documentação contabilística - fls. 70 e ss. -Mensagem de correio electrónico do CC - fls. 73; -Extrato de conta - fls. 75; -Email de .../.../2015 - fls. 76; -Lançamentos - fls. 77-78; -Faturas-fls. 79-92; -Pesquisa de veículos - fls. 93 e 94; -Informação fiscal e cadastral - fls. 101 e ss., 120 e ss., 220 e ss., 235 e ss., 349 e ss.; -Email do CC com novos elementos de .../.../2016; -Declaração periódica de IVA-fls. 118; -Documentação contabilística - fls. 169 e ss.; -Certidão permanente Sociedade BB- fls. 224 e ss.; -Relato de diligência externa - fls. 243. -Auto de notícia - fis. 274 e ss.; -Excertos do relatório de inspeção (Sociedade arguida) - fls. 276 e ss.; -Relatório de inspeção (Sociedade BB) - fls. 276 e ss.; -Relatório - fls. 357 e ss.; -Certificados de registo criminal - fls. 451-455 e 458, Nas declarações das testemunhas EE e FF, ambos inspetores tributários que instruíram e acompanharam o processo de Inquérito levado a efeito pela Inspeção Tributária. No entanto, caso os elementos de prova documental e testemunhais constantes dos autos tivessem sido devidamente considerados ou desconsiderados, se fosse caso - e como se verá, assim deveria ter sido o caso no que respeita aos depoimentos prestados e à prova documental existente nos autos - impor-se-ia outra decisão que não aquela de que ora se recorre. M. Os Arguidos foram condenados pela prática de um crime de fraude fiscal qualificada, qualificada pelo facto do valor de a alegada vantagem patrimonial relativa ao imposto, se situar acima do valor de € 15.000,00, montante a partir do qual a infração é qualificada e punível. N.A sentença em crise, assenta a alegada prática de crime de fraude qualificada pela Sociedade arguida no exclusivo pressuposto de que a sociedade Sociedade BB não prestou os serviços de transporte que a primeira declarou nas suas declarações de impostos, pelo que as faturas referentes aos transportes realizados, que esta última integrou na sua contabilidade, seriam necessariamente falsas. O.E assenta essa conclusão em duas premissas: 1 - No facto de no ano de ... a sociedade emitente das faturas em análise não ter declarado os seus rendimentos à Autoridade Tributária, classificando-se (pela AT) como sociedade não declarante, por não tendo declarado em sede de IRC os rendimentos correspondentes aos serviços prestados e faturados à Sociedade arguida, ou sequer apresentado declaração periódica de IVA relativamente aosmesmos - ponto 10 da matéria de fato dada como provada; 2 - Pelo facto de considerar que no ano de ... a mesma sociedade Sociedade BB “não tinha capacidade para levar a cabo os serviços alegadamente subjacentes aos valores faturados por falta de estrutura empresarial adequada, nomeadamente de meios humanos, de materiais, de veículos e de e de instalações que permitissem prestar serviços nos montantes faturados" - ponto 9 da matéria de facto dada como provada. P. Ora a conclusão, encontra-se alicerçada em factos incorretos, pois sabe-se, por informação junta aos autos pela Inspeção Tributária, que a Sociedade BB no ano de ..., que é o ano a que reportam as faturas em questão, não cumpriu nenhuma das suas obrigações fiscais junto da Autoridade Tributária, nem relativamente a entrega de declarações periódicas de IVA, nem relativamente a entrega das declarações de rendimentos Modelo 22 de IRC, nem das declarações anuais de informação contabilística e fiscal. Q. Tal como não cumpriu no ano que antecedeu - de ..., e no ano posterior de ... até ..., conforme Relatório da Inspeção Tributária da ação inspetiva iniciada contra a sociedade não declarante, subscrito pela testemunha, Sr. Inspetor Tributário EE, a fls. 335 e 336. R. Com efeito, na sequência da ação inspetiva que foi levada a cabo pela Autoridade Tributária, foi apurado que a sociedade Sociedade BB não detinha qualquer património: “da consulta à aplicação do património da AT, não foram encontrados quaisquer prédios em nome do sujeito passivo. Quanto ao património mobiliário sujeito a registo, atualmente não existem veículos automóveis em nome da sociedade: os 3 veículos que o sujeito passivo detinha foram todos transmitidos em ... (nos meses de ... e ... -cfr. quadro), pelo que nos anos em análise, ... e ..., não foi proprietário de qualquer veiculo" - fls. 337. S. Da leitura do documento a fls. 337 resulta que, de acordo com a informação obtida pela Inspeção Tributária, a sociedade Sociedade BB desde ... que não era proprietária de nenhum veiculo automóvel, tendo-se apurado no âmbito da mesma ação inspetiva, que a indicada sociedade se dedicava ao transporte rodoviário demercadorias por conta de outrem no âmbito nacional e internacional, ao comércio de materiais de construção, e à execução de aterros e desaterros - fls. 333. T.E "através da informação prestada pelos clientes e fornecedores do sujeito passivo nas respetivas declarações fiscais (DA - Anexos 0/P), apesar de não ter cumprido as suas obrigações declarativas, detetou-se que foi declarado um total de serviços prestados pela Sociedade BB aos seus clientes num total de € 1. 350.826,00 no ano de ... e de € 351.102,00 no ano de ... (com IVA incluído) e um total de 0,00 € de aquisições/serviços adquiridos aos seus fornecedores.” U.Com o intuito de verificar a veracidade dos valores inscritos nas Declarações Anuais (Anexo P) pelos clientes, foi realizado cruzamento de informação (...) com os clientes do sujeito passivo que constam do mapa acima apresentado, tendo-lhes sido solicitado, entre outros elementos e relativamente aos exercícios de ... e ..., cópia dos extratos de conta corrente, cópias de todas as faturas, notas de débito, notas de crédito e recibos emitidos pela sociedade Sociedade BB e cópia de todos os pagamentos efetuados àquela sociedade"- fls. 340. V. Resultando da análise dos quadros resumo que elencam as entidades que recorreram aos serviços da sociedade não declarante, apresentados no Relatório em análise - fls.341 - para apurar da efetiva prestação de serviços, ou não, pela Sociedade BB, resulta o seguinte: das declarações de impostos que as sete empresas que a Inspeção Tributária cruzou com a sociedade não declarante, a quem o sujeito passivo prestou serviços, cinco deles foram serviços de transporte e dois foram serviço de abertura de valas e de limpeza de vales de drenagem e de mato. X. Os serviços de abertura de valas e limpeza prestados pela Sociedade BB a: "..., NIF ... - "serviço de abertura de valas de drenagem e tapa-las e caminho de acessos nas propriedades" - foram pagos por cheque, com a menção:" cliente apresenta extrato de conta do fornecedor e cópia da fatura, recibo e cheque". Bem como os prestados a "... Lda., NIF ... - "serviço de limpeza de valas de drenagem, mato de rios e limpeza de acessos, e serviço de transportes de árvores e terras avazador das propriedades agrícolas" - foram pagos por cheque, com a menção: "cliente apresenta extrato da conta do fornecedor e cópia das faturas, recibos e cheques". Z. Os restantes clientes inspecionados - ... NIF ...; ..., NIF ...; ..., NIF ...; ... NIF ...; ..., NIF ..., todos eles contrataram com a Sociedade BB serviços de transporte, serviços de distribuição de jornais Dica, e apresentaram todos eles, extrato de conta, cópias de fatura e recibos ou declaração a confirmar recebimento, tendo todos eles, pago em dinheiro. AA.E quanto ao esclarecimento ao Tribunal a quo, de qual o motivo de os pagamentos reportados ao ano de ..., terem sido efetuados em numerário, em serviços como transportes não institucionais, como era o caso, construção civil, trabalhos agrícolas, não só era, como em muitas situações ainda o é, habitual, o pagamento ser efetuado em dinheiro com a prestação do serviço, serviço a serviço, como também era prática corrente nessas atividades, a respetiva fatura ser entregue à posteriori, muitas vezes por insistência da contabilidade das empresas pagantes que tinham de justificar os movimentos de tesouraria nos prazos estipulados na Lei. BB. E ainda que a Autoridade Tributária refira, relativamente a todas as faturas emitidas pela Sociedade BB às sete sociedades atrás elencadas, refira que nas mesmas não identificam o pessoal ao serviço, o local de carga e descarga e a viatura, a verdade é que no ano de ..., sobretudo em faturas manuais, não era prática corrente descriminar toda essa informação, ao contrário do que sucede atualmente nas faturas eletrónicas. CC. Mas tal não significa, nem poderia significar, que pelo fato de as faturas poderem estar omissas relativamente a alguns elementos secundários, e que cuja inscrição era daresponsabilidade da Sociedade BB, as mesmas não correspondam a serviços efetivamente prestados por esta entidade e pagos pelas sociedades que os contrataram. DD. Pois verifica-se pelos documentos existentes nos Relatórios da Inspeção Tributária que as sete empresas que foram objeto de escrutínio quanto à entrega de faturas emitidas pela Sociedade BB, que foram inspecionadas, que contrataram serviços de transporte e que pagaram em numerário - ... NIF ...; ..., NIF ...; ..., NIF ...; ... NIF ...; ..., NIF ..., apresentaram à Autoridade Tributaria, os documentos por esta solicitados: a conta corrente, faturas dos serviços contratados, recibos de pagamento e/ou declarações do fornecedor a declarar o recebimento do valor indicado nas mesmas. EE. Por sua vez, as sociedades que contrataram abertura ou limpeza de valas de drenagem e de mato - ..., NIF ... e ... , Lda., NIF ..., apresentaram a conta corrente, faturas do fornecedor, recibos do fornecedor e cópias dos cheques entregues para pagamento dos indicados serviços - fls. 341 e 342. Demonstrando a concreta existência dos serviços prestados e descriminados em todas as faturas emitidas pelo fornecedor, por se terem os elementos comprovantes solicitados pelos serviços de Inspeção Tributária: extratos de conta, as faturas dos serviços prestados, os recibos referentes ao pagamento ou declarações de recebimento, e inclusivamente as cópias dos meios de pagamento utilizados pelas empresas pagantes - as cópias dos cheques. FF. Pois uma coisa é a sociedade Sociedade BB, não cumprir as suas obrigações fiscais a partir do ano de ..., não procedendo à entrega obrigatória das declarações trimestrais de IVA, do Modelo 22 do IRC, nem às declarações anuais da sua situação contabilística e fiscal, não liquidar segurança social a trabalhadores que não têm declarados, nem apresentar faturas de despesas, outra coisa distinta é efetivamente prestar os serviços descritos nas faturas, mas não ter contabilidade organizada, cobrar dos clientes ereceber, cobrar o IVA e receber e furtar-se ao pagamento dos seus impostos. GG. Com efeito, uma leitura mais atenta do Relatório apresentado pela Inspeção Tributária, esclareceria ao Tribunal a quo, qual foi o motivo que deu origem a que se iniciasse um procedimento de inspeção ao sujeito passivo Sociedade BB e que originou a ação inspetiva e na sua sequência, o presente processo. HH. O que desencadeou o processo de investigação do sujeito passivo Sociedade BB, por parte da Inspeção Tributária, foi que o próprio Estado, mais concretamente, a Inspeção Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território - IGAMAOT, contratou os serviços da sociedade Sociedade BB, para proceder ao serviço de desmatação, limpeza e abertura de caminhos. II. Na sequência da prestação dos serviços, a sociedade Sociedade BB, apresentou ao Estado - à Inspeção Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, a fatura nº 205, de ........2010, no valor de 24.926,00 C (IVA incluído), que este liquidou e declarou nas respetivas contas anuais. JJ. Vindo a obter informação (o Relatório da Inspeção Tributária não concretiza como) que a mesma, se encontraria, presumivelmente em situação fiscal irregular, como se pode ler a fls. 332, no Relatório de Inspeção Tributária - Departamento B-Divisão III- Equipa 32, subscrito pelo Senhor Inspetor Tributário, EE, em ... e que se transcreve: "II - Objetivos, Âmbito e Extensão da Ação de Inspeção, II.1. Credencial e período em que decorreu a ação de inspeção. No cumprimento das Ordens de Serviço nºs ... e ..., de .../.../2014, com despacho da Chefe de Divisão III do Departamento B da Área da Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa, com data de ........2014, realiza- se uma ação de inspeção externa aos exercícios de ... e ..., ao sujeito passivo Sociedade BB, com sede fiscal na ..., ... Carregado, pertencente à área do .... No dia .../.../2015 foram iniciados os presentes procedimentos externos de inspeção, através da afixação de Certidão de Verificação de Hora Certa, nos termos do Artigo 232º do Código deProcesso Civil (CPC). Os atos inspetivos consideraram-se terminados, nos termos do Artigo 61º do Regime Complementar do Procedimento da Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA), na data da notificação do presente Relatório de Inspeção Tributaria, através das Notas de Diligência, que junto se remetem. (Anexo único). 11.2. Motivo, âmbito e incidência temporal Os procedimentos de inspeção surgiram após receção da informação da IGAMAOT - Inspeção Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, que refere que a empresa TRANSPORTES … foi prestadora do serviço de desmatação, limpeza e abertura de caminhos que originou a fatura nº 205, no valor de 24.926,00 € (IVA incluído), com data de ........2010, tendo sido obtida informação de que a mesma se encontrará, presumivelmente, em situação fiscalmente irregular. O procedimento inspetivo tem natureza externa de âmbito parcial - IVA, nos termos da alínea b) do Artigo 13º e da alínea b) do Artigo 14º, ambos do RCPITA. Quanto à extensão, o procedimento de inspeção incide sobre os exercícios de ... e ... (nº 3 do Artigo 14º do RCPITA)". LL. Concluindo-se que no ano de ..., em 12. 08. ..., a sociedade Sociedade BB, a mesma sociedade que, desde o 3º trimestre de ... não apresentava qualquer declaração de impostos ao Estado, que segundo informação apurada pela Inspeção Tributária, a partir de 24. 02. ... não tinha qualquer veículo automóvel, e que segundo sentença do tribunal a quo, "não tinha capacidade para levar a cabo os serviços alegadamente subjacentes aos valores faturados por falta de estrutura empresarial adequada, nomeadamente de meios humanos, de materiais, de veículos e de instalações que permitissem prestar serviços nos montantes faturados" - (sic) ponto 9 dos factos provados e fls. 333 a 340, prestou ao Estado, à Inspeção Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMAOT,) serviço de desmatação, serviço de limpeza e serviço de abertura de caminhos: sem ter património imobiliário, sem ter veículos automóveis, sem ter trabalhadores e sem ter evidências de ter subcontratado a prestação dos serviços descritos, segundo informado pela Inspeção tributaria. MM. E o Estado não se terá deslocado à sede da sociedade Sociedade BB para a contratar e provavelmente também não conheceria o gerente da mesma, tal como os Arguidos, porque não era, nem é, prática na atividade. NN. Apesar da condenação dos Arguidos, na convicção do Tribunal a quo, se alicerçar na consideração de que às faturas entregues pela Sociedade BB, à Sociedade Arguida não correspondia o serviço nas mesmas descrito, relativamente ao serviço contratado pelo Estado, não existe margem para qualquer dúvida, que os serviços prestados pela sociedade Sociedade BB., foram efetiva, concreta e materialmente prestados por esta sociedade, que procedeu à prestação dos serviços de desmatação, de Limpeza e de abertura de caminhos em propriedade do Estado, que o valor da fatura relativamente aos mesmos serviços foi liquidado e que o valor do respetivo IVA foi igualmente incluído, no pagamento que foi feito. OO. Tendo todos os serviços ao IGAMAOT, descritos nos números que antecedem, sido prestados pelo sujeito passivo, que tendo recebido o pagamento do valor de 24.926,00 € (IVA incluído) referente à fatura nº 205, de ........2010, por si emitida, liquidada pelo Estado, com IVA incluído, se furtou ao cumprimento das suas obrigações fiscais, não entregando nenhuma declaração de imposto referente a esse pagamento ou a qualquer outro referente ao ano de ..., PP. Tal como não entregou posteriormente nos anos de ... em que emitiu e entregou a diversas sociedades, segundo a Inspeção Tributária, faturas no valor de € 1.350.826,00 e no ano de ... em que emitiu e entregou faturas no montante de € 351.102,00, que se apuraram por efeito de cruzamento de dados. QQ. Tudo, segundo a Inspeção Tributária, desde meados do ano de ..., sem, alegadamente, dispor de capacidade para os levar a efeito e sem evidências de subcontratar outras entidades,conforme consta dos motivos que fundamentam a acusação da Inspeção Tributária: "(...) é um sujeito passivo não declarante em sede de IRC e IVA desde o ano de ..., tendo sido declaradas faturas por si emitidas no montante anual de € 1.350.826,00 (com IVA incluído); -Não foi encontrada qualquer estrutura empresarial, a partir da qual o sujeito passivo pudesse prestar os serviços descritos nas faturas que emitiu, dado que nos anos em análise não era proprietário de quaisquer veículos nem lhe era conhecido nenhum estabelecimento ou instalações; -Não há evidências de o emitente ter alugado viaturas a terceiros ou arrendado instalações; -Não são conhecidos quaisquer documentos de transporte referentes às faturas conhecidas; -Não são conhecidos contratos ou orçamentos; -A morada da sede da empresa corresponde ao domicílio fiscal do sócio gerente, tratando-se de um apartamento de habitação; -Não se detetou qualquer trabalhador a declarar ter auferido rendimentos pagos pela sociedade Sociedade BB, nem a contratação de pessoal a empresas externas; -Não entregou o Mod. 10 respeitante a pagamentos a trabalhadores ao seu serviço; -Também não são conhecidas empresas nacionais a declararem terem efetuado vendas ou prestações de serviços à sociedade Sociedade BB. -Não ficou comprovado o efetivo recebimento dos valores faturados dado que o pagamento foi normalmente feito em numerário; Através do cruzamento de informação, verificou-se que a maioria dos clientes não identifica a pessoa da Sociedade BB com quem contactavam e outros identificam o Sr. GG, NIF 109.447.506, que foi sócio e gerente até ...." - fls. 361. RR. Ora, acompanhando o raciocínio transcrito na Motivação da Decisão de facto do Tribunal o quo, face às datas acima indicadas, apuradas pela Inspeção Tributária, em ..., a Inspeção Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, teria, tal como os aqui arguidos, contratado os serviços prestados pela Sociedade BB, com o sr. HH SS. E apesar de ambos os Arguidos terem referido "que não se recordam da sociedade Sociedade BB, não conseguindo concretizar (...) qual a pessoa que foi contactada por parte daquela sociedade (...) o Tribunal não ficou com dúvidas quanto ao essencial: as faturas emitidas pela Sociedade BB à Sociedade arguida no ano de ... não corresponderam a serviços efetivamente prestados, o que os arguidos bem sabiam." TT. Sendo afirmado pelo Tribunal a quo na respetiva Motivação da Decisão de facto, que:" Não existe evidentemente prova direta deste facto, nem os arguidos o confessaram." UU. Pelo que terá de se perguntar então: Perante a factualidade ora descrita, e afirmando o tribunal a quo que não existe prova direta da prática do crime que lhes vem imputada, tendo os arguidos desde o primeiro momento em que prestaram declarações sempre afirmado que as faturas reportam a serviços de transporte de revistas e livros em regime de consignação, de e para o Luxemburgo, existindo documentação nos autos bastante que suporta as suas declarações, com que ligeireza se condena na prática do crime e se aplica pena de prisão aos dois legais representantes de uma sociedade, que em 22 anos de atividade, mensalmente, trimestralmente e anualmente, declararam e pagaram sempre os seus impostos, inclusivamente aqueles pelos quais vêm indevidamente condenados, nos presentes autos? VV. Pois da análise dos documentos constantes dos autos, verifica-se que apesar de todos os elementos tributários, ou melhor dizendo, da ausência deles, relativos à atividade da sociedade Sociedade BB, a mesma continuou a desenvolver a sua atividade, pelo menos nos anos de ... emitindo fatura ao IGAMAOT, em ... e em ..., num mercado paralelo, cobrando e recebendo o valor cos serviços prestados, cobrando e recebendo o valor do IVA correspondente aos mesmos e não liquidando ao Estado os devidos impostos legais. XX. Não se descortinando razão para a total obliteração feita pelo Tribunal a quo, da prova documental existente nos autos, junta pelos Arguidos em sede de exercício do direito de audição perante a Inspeção tributária, e a ausência de raciocínio lógico que tivesse apreciado os factos à luz da experiência comum. ZZ. Na Motivação da decisão de facto, o Tribunal a quo afirma que assentou a sua convicção relativamente à factualidade apurada, "na apreciação critica e conjugada das declarações dos Arguidos, que não admitiram a prática dos factos, com a prova documental junta aos autos e a prova testemunhal produzida em audiência de discussão e julgamento, tudo apreciado à luz das regras da experiência comum, atentando-se nos seguintes documentos" (infra), a cuja análise se procede: AAA. Da leitura da certidão comercial permanente da sociedade arguida, junta aos autos em ...-...-2024, com a Ref: ..., verifica-se que a Sociedade Arguida apresentou pontualmente as suas contas anuais, não só desde a sua constituição até ao ano de ..., como de igual modo, nos anos de ..., ..., ..., ..., ..., ... e ... - último exercício obrigatório antes do final do ano de ... - data a que a emissão da mesma reporta, pelo que, o ponto 30, dos factos provados, pelo Tribunal a quo, terá de se ter por não provado, por contrariar a informação presente na certidão atualizada junta aos autos com a referência indicada. .... No que se refere a "Lançamentos - fls. 77-78", uma análise conjugada de outros documentos que constam dos autos, permite verificar o seguinte: São lançadas a débito as faturas correspondentes aos transportes internacionais efetuados pela Sociedade BB, e correspondente a cada débito de transporte de mercadoria desta entidade, é lançado a crédito o valor correspondente pago pelos clientes do Luxemburgo, (..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ...), clientes descritos a fls. 169. CCC. A fls. 184, no Extrato de Conta referente a ..., em sede de fornecedores, confirmam-se as aquisições de mercadoria ao grupo "... (Expresso), ... e .... - fls. 185 e a Calendário de Letras- fls. 186, e a respetiva faturação a fls. 187 a 196 - ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ..., clientes que o gerente identificou, em audiência de julgamento a ... de ... de 2024 de 00:30:10 a 00:31:57.: DDD. E a justificação das datas dos lançamentos referentes aos transportes realizados para os clientes referidos indicados no balancete da Sociedade Arguida, terem data de ... ou de ..., encontra a sua razão de ciência, esclarecida a fls. 216, no ponto 14 pelo entretanto falecido TOC, da Sociedade Arguida: porque "as mesmas só lhe foram entregues no final do ano de ...." Adiantando que o valor teve a ver com o serviço de venda de livros para o Luxemburgo. Mais afirmou que se tratou de um negócio que ocorreu neste período de imposto. Não existindo qualquer outra prestação de serviços quer nos períodos anteriores quer nos períodos seguintes." EEE. O TOC da Sociedade Arguida, não se referiu aos contornos dos negócios, mas apenas, à leitura literal das datas constantes nas faturas e ao respetivo lançamento: as faturas correspondem às datas apostas nas mesmas, e, o TOC apenas as rececionou no final do ano a que as mesmas respeitavam, tendo procedido, como lhe incumbia, ao seu lançamento, quando lhe foram entregues, ou seja, nos dias ... de ... de 2011. FFF. O Tribunal a quo, fez tábua rasa do princípio do in dúbio pro reo, não verificando que a mesma sociedade já no ano de ... tinha emitido faturas que não declarou, a uma Entidade Publica e a outras sete entidades, GGG. Esclarecendo, por declarações dos gerentes, 2ª e 3º Arguidos, que a comercialização desta mercadoria específica no Luxemburgo - revistas devolvidas quenão foram vendidas nos quiosques e outros pontos de venda, foi feita em regime de consignação em conta corrente, que ocorreu entre o ano de ... e ... - ano em que encerraram essa operação comercial, porque estava a causar prejuízo, tudo conforme documentos que entregaram à Inspeção Tributária (e constantes dos autos). HHH. A Sociedade Arguida, conforme consta da informação apurada pela inspeção tributária, dedica-se ao comércio por grosso de livros, revistas e jornais - fls. 105, comprando grandes quantidades de mercadoria, já em paletes, a preços muito baixos, mercadorias que não tem como ser conferida unidade por unidade quando é adquirida (pelo que muitas das vezes, apenas á posteriori verificam, que parte dos artigos se encontram danificados). III. Encontra-se demonstrado nos autos que no ano de ..., os seus fornecedores com relevância para estes factos, foram entidades idóneas e de todos conhecidas no mercado: ...; ... e ... às quais adquiriu devoluções de milhares de unidades de revistas tais como ..., livros e CDs/DVDs brindes devolvidos - de fls. 315 a 328 que revendeu no Luxemburgo, aos clientes identificados no balanço analítico do ano de .... JJJ. Como é do conhecimento comum, e se pode verificar por pesquisa na internet pelo nome e nº das revistas, todas as unidades de revistas descriminadas nas faturas, nas datas em que foram adquiridas pela Sociedade Arguida, já tinham sido devolvidas pelos postos de venda autorizados, ou seja, não eram edições recentes mas sim devoluções, razão pela qual o preço unitário era um valor muito inferior ao preço de venda ao público, e razão pela qual não podiam ser comercializadas em território português. LLL. Tal como sucede ainda aos dias de hoje, os grupos empresariais que comercializam revistas e jornais e brindes e livros associados, estão vinculados por contratos de exclusividade com empresas distribuidoras que vendem à consignação, como a ..., que por sua vez distribui para os diferentes segmentos de mercado, designadamente quiosques, hipermercados e supermercados, ..., ..., ... e papelarias da especialidade. MMM. A mercadoria não vendida, nesses pontos de venda, é devolvida na totalidade aoarmazém, onde depois é conferida e paletizada. NNN. Tendo um de dois destinos possíveis: vendida a um retalhista que apenas a pode comercializar sob condição de ser fora do mercado nacional, ou é vendida a peso para reciclagem de papel. Todas as unidades descritas nas faturas juntas aos autos, foram adquiridas pela Sociedade Arguida sob essa condição, de ser vendida fora do território nacional, que é uma regra do setor, de todos conhecida, e por todos 'espeitada, conforme é do conhecimento comum, confirmado pelas declarações do gerente da Sociedade Arguida, em audiência de ..., de 00:14:57 a 00:16:28.2. OCX). Os milhares de unidades das revistas enunciadas, sobras recolhidas nos postos de venda a nível nacional, foram adquiridas pela sociedade arguida ás entidades constantes das respetivas faturas, transportadas em regime de transporte dedicado, da sede da ... e da ... para a sede ou armazém da Sociedade Arguida ou para outro local que fosse indicado por esta, para serem transportadas para o Luxemburgo, pela Sociedade BB, em regime de transporte de groupagem, ou seja em transporte intercomunitário que agrupava mercadoria de diversos clientes. PPP. Nos transportes de mercadoria para o Luxemburgo, como foi referido pelo gerente da Sociedade no primeiro julgamento em ..., além das paletes de revistas, ou de livros ou de brindes, no mesmo veículo, viagem e transporte, eram carregadas encomendas de outros clientes, designadamente produtos alimentares típicos portugueses, como presuntos, enchidos, queijos de ... e da serra, bacalhau, vinho, cervejas Sagres, Superbock, cafés Delta, todas e quaisquer encomendas que a comunidade portuguesa no Luxemburgo tivesse efetuado, e que eram distribuídas e entregues nos mesmos locais, em que eram entregues as revistas e a restante mercadoria da Sociedade Arguida - cafés e restaurantes portugueses, associações e núcleos recreativos portugueses. QQQ. Correspondendo a área do território do Luxemburgo a cerca de 50 km quadrados, a Sociedade BB, cobria a quase totalidade dos clientes portugueses que encomendavam os produtos alimentares acima referidos, e simultaneamente recebiam em regime de consignação as revistas ou os livros remetidos pela Sociedade arguida RRR. E atendendo a que o circuito do transporte e da diversa mercadoria a entregar era quase sempre o mesmo, os valores das faturas emitidas pela sociedade Sociedade BB eram sempre de montante semelhante. SSS. Sendo a Sociedade BB, na pessoa dos seus motoristas, a receber em cada viagem, em dinheiro, o produto das vendas das revistas, que eram elas próprias compradas e pagas em dinheiro, pelos clientes portugueses que frequentavam os cafés, as associações ou os núcleos recreativos onde eram entregues à consignação, pois também recebiam os pagamentos das restantes mercadorias que entregavam - e respondendo à questão do tribunal, que perguntava se podiam ficar com parte das revistas ou do dinheiro: - se podiam não entregar um presunto, ou ficar com um bacalhau - podiam. Mas no momento em que tal se soubesse, nunca mais eram contratados pelos portugueses que tinham os seus negócios e viviam no Luxemburgo. TTT. A Sociedade BB, carregava a mercadoria adquirida pela Sociedade Arguida às entidades atrás referidas, e que não podiam ser transacionada no mercado português, fazia o transporte da mesma em sistema de groupagem, entregava nos mesmos locais onde entregava as outras mercadorias como descrito, nesses pontos de entrega carregava as revistas ou livros que os clientes não tivessem vendido e quisessem devolver, e transportava-as de regresso para Portugal. UUU. E, se cada revista fosse vendida nas associações recreativas por 5 € cada, e em cada semana se vendessem 100 revistas, em todos os pontos de venda onde as mesmas eram entregues, que eram cerca de dez como consta do balancete analítico, os motoristas da Sociedade BB receberiam em dinheiro € 10.000, anotando de quem recebiam, desse valor dando contas à Sociedade Arguida, depois de deduzidos os respetivos custos de transporte, que à época era de € 1,00 por quilómetro, ida e regresso, o que correspondia em média a um custo de cerca de € 5.000,00 por viagem, ou seja, pagavam-se com o valor que recebiam dos clientes da Sociedade Arguida entregando o valor excedente se fosse o caso. WV. Apurados os custos de transporte, o pagamento dos mesmos era efetuado por compensação com o valor das receitas por eles recebidas no Luxemburgo. XXX. Como a mercadoria indicada era (re)colocada à consignação e as devoluções de revistas que não fossem vendidas e devolvidas à Sociedade Arguida tinham como destino a reciclagem de papel, não existia o rigor de concretizar mensalmente que revistas cada ponto de venda tinha vendido - apenas o número de artigos vendidos era relevante: a Sociedade arguida comprava sobras em grandes quantidades - "por atacado" despendendo um total de, por hipótese, € 60.000,00. Do ponto de vista das vendas apenas era importante recuperar o investimento e produzir algum lucro - não existia um controlo mensal constante e progressivo levado a efeito pela Sociedade Arguida - o controle era feito a final, através da conferência das guias de consignação (mercadoria entregue- quantas unidades foram entregues) decorridos alguns meses, por confronto com as devoluções recebidas (quantas unidades foram devolvidas). ZZZ. Recorde-se que nos anos de ... a ... ainda não existiam e ainda não era prática corrente, fazer-se a assinatura de revistas e jornais on-line, realidade que determinou que a Sociedade Arguida pusesse termo a este modelo de negócio e a estas vendas no Luxemburgo. AAAA. Com o encerramento da operação existente, a Sociedade Arguida solicitou a emissão das faturas referentes aos valores por si pagos referentes aos serviços prestados pela Sociedade BB, o que justifica a respetiva numeração ser seguida e as respetivas datas se encontrarem compreendidas entre ... - as datas constantes das faturas como sempre foi afirmado pelos 2º e 3º Arguidos, refletem o apuramento dos valores de uma conta corrente existente, desde ... a ..., com os transportes - custos, e os valores resultantes das vendas da mercadoria no Luxemburgo - créditos, e traduzem o prejuízo resultante dessa operação, descrito pelos gerentes, em audiência de julgamento de ... de ... de 2024: 00:16:25.5- 00:19:00.4 “Nós entregámos as facturas quando o senhor nos emitiu e forneceu as facturas. Quando o senhor contabilista nos pediu as facturas para fechar o ano fiscal." .... Além das revistas descriminadas nas faturas atrás mencionadas e constantes dos autos, também foram adquiridos pela Sociedade Arguida, à ... ainda no ano de ..., milhares de livros/DVD História do século XX. Década a Década - cfr. fls. 323 e 324; livros/CD Amália fados, poemas e flores, volume 1 e volume 2, coleções Disney cozinha, livros História do dia a dia. Os cinco, Os sete, - cfr. fls. 326 e 327, que não podiam ser vendidos em..., à semelhança do que sucedia na venda das revistas mencionadas, por impositivo contratual: "Clausula quarta - (...) não é autorizada esta distribuição para qualquer agente ..., nomeadamente e a título de exemplo, Grandes superfícies, Hipermercados, Estações de serviço, Quiosques, Papelarias com venda de revistas" - fls. 323 e 324. CCCC. A fls. 327/v. e 328, encontram-se juntas Faturas/recibo manuais, da Sociedade Arguida, quase ilegíveis (dado o decurso do tempo entretanto decorrido), com indicação de cliente com morada no Luxemburgo, datadas de ... (tanto quanto é possível ler) no valor de € 42.000,00 uma e outra € 23.900,00. DDDD. A fls. 311 encontram-se juntas guias de transporte, das ... para o Luxemburgo, em .../.../2010 emitidas pela Sociedade Arguida: -Guia de Transporte nº 0172 -B de .../.../2010 - 2 Paletes com livros para evento feira do livro) em .... 2 caixas com equipamento desportivo. -Guia de Transporte nº 0245-B de .../.../20 2 Paletes com livros para evento, feira do livro para .... 10 coleções Património ( vol). 10 coleções Heróis Hist. (liv+CD). 10 coleções Fados (liv+CD). 10 coleções animais Mundo (12v). 10 coleções livros.. Hist. EEEE. A fls. 312 encontram-se juntas as guias de consignação, (cuja data nem com muita boa vontade se consegue ler por se encontrar desvanecida pelo decurso do tempo), mas é legível na Guia nº 1075 A, que o nome do cliente é - ..., e na Guia nº 0704 D - ..., ambos com morada no Luxemburgo. FFFF. Sabendo que a cada Palete de livros corresponde a cerca de 1.000 unidades, sabendo que a Sociedade Arguida adquiriu em ..., à ..., 261.860 unidades de livros, conforme resulta da soma das faturas juntas aos autos, livros estes editados em português, sabendo que não podiam, por imperativo contratual, ser comercializados em ..., encontrando-se juntas aos autos, guias de transporte do ano de ..., e guias de consignação, em ambos os casos para o Luxemburgo, pergunta-se, tal como o gerente da Sociedade Arguida perguntou em audiência de julgamento: então eram transportadas para o Luxemburgo como? O Tribunal a quo não conseguiu encontrar provas da compra de mercadoria devolvida, que apenas podia ser vendida no estrangeiro, conforme faturas e contratos, dado oenorme volume, seria comercializada ao longo do tempo, existindo faturas, dessa mercadoria de clientes citados no balancete analítico, guias de transporte e guias de consignação, como é que a mercadoria chegava ao Luxemburgo? GGGG. Em todas as ocasiões em que foram tomadas declarações ou prestadas voluntariamente, os gerentes da Sociedade Arguida, responderam com verdade: Afirmando e comprovando que adquiriram mercadoria nos anos de ... e ..., à ..., à ... e à ..., mercadoria essa constituída por devoluções de revistas e livros e CDs, revendida em regime de consignação no Luxemburgo. HHHH. Tendo a Sociedade Arguida entregue, ainda no ano de ... à Inspeção Tributária, todos os comprovativos de que à data ainda dispunham na sua posse, em sede de direito de audição: guias de transporte e de consignação, explicando que as mercadorias ficavam nos clientes em regime de consignação, sendo vendidas e repostas ao longo de meses e de anos, como resulta da natureza da consignação, e os resultados das vendas apenas apurados a final, entregando os respetivos os comprovativos. IIII. E mesmo após sugestão da própria Autoridade Tributária aos Arguidos, que melhor seria eliminarem as faturas que originaram os presentes autos, estes não o fizeram porque consideraram que tinham pago os serviços constantes das mesmas, tinham pago as mercadorias referentes aos transportes, e as declarações de impostos a cuja entrega procederam, que refletiam isso mesmo, correspondiam a negócios, serviços, aquisições e vendas, custos e lucros, que tiveram expressão real. JJJJ. Por consequência de procederem de forma correta, os valores que a Sociedade Arguida teria a receber por referência ao imposto de IVA e IRC da respetiva declaração de impostos referentes ao ano de ..., foram eliminados pela Autoridade Tributária,que procedeu à retificação de valores, que originou que esta tivesse de liquidar ao Estado, verbas que considera que não eram devidas, liquidando a Sociedade Arguida à AT, em ...-...-2018, através de compensação com créditos de IVA que detinha, o montante de € 36.286,62 referente a € 33.178,30 de IRC, € 42,17 juros de mora, € 6.595,49 de juros compensatórios - cfr. Fls.352, 353 e 354 (juntas pela Autoridade Tributária) e € 25.769,66 referente ao IVA do período correspondente ao último trimestre de ... - fls. 355. .... Para uma sociedade que alegadamente queria defraudar o Estado, não deixa de ser curioso ter capacidade para efetuar um pagamento de quase €65.000,00 com compensação de crédito de IVA. MMMM. Comprovando-se que já na data em que foi proferido Despacho de Acusação (........2018) os valores que a AT considerou indevidamente declarados pela Sociedade Arguida, se encontravam integralmente pagos, desde .... NNNN. Não assistindo razão ao Tribunal a quo ao considerar imparciais, os depoimentos dos Inspetores Tributários que instruíram o processo de Inspeção, pois nenhum fez menção à fatura que deu origem ao procedimento inspetivo em questão - que foi uma fatura emitida pelos TRANPORTES …, entregue e paga por uma Entidade Publica, (a mesma entidade que os arguidos contrataram para transporte em groupagem para o Luxemburgo), e por não fazerem qualquer menção que já à data do primeiro julgamento, no ano de ..., os valores que alegadamente os Arguidos tinham defraudado o Estado, se encontravam integralmente pagos acrescidos de juros de mora, referindo apenas os pontos que sustentavam a acusação que deduziram, defendendo a sua posição numa investigação mal conduzida, pelos próprios. OOOO. Considera-se que existência de elementos de prova bastante, juntos aos autos, como ficou demonstrado, imporiam uma apreciação distinta e conclusão diversa, daquela que foi decidida pelo Tribunal a quo. PPPP. Devendo por consequência, face aos documentos indicados, à factualidade exposta e à experiência comum, ter-se por não provados os pontos oportunamente enumerados considerados na matéria de fato erradamente dada por provada peloTribunal a quo: Ponto 8 - porque as faturas em causa têm por subjacente a prestação de serviços de transporte de e para o Luxemburgo, como demonstrado. Ponto 9 - porque apesar da inexistência de registo, a sociedade tinha capacidade para prestar aos arguidos os serviços que prestou, como demonstrado. Ponto 11- porque não resultou nenhuma vantagem patrimonial para os Arguidos conforme demonstrado. Ponto 13 - porque os custos contabilizados pela sociedade arguida existiram efetivamente, encontrando-se as respetivas declarações de impostos entregues corretas. Ponto 14 - porque a intenção de animus fraudendi, nunca existiu nem fazia sentido uma vez que as faturas entregues refletiam a realidade. Ponto 15 - porque o Estado não foi defraudado, inexistindo a intenção alegada, bem como não foi produzida prova da falsidade das faturas, muito pelo contrário. Ponto 16 - porque os arguidos não praticaram o crime de que vem acusados, como sempre afirmaram, não pretendendo qualquer vantagem patrimonial contrariamente ao alegado. Pontos 20 e 21 - ambas as penas reportam a falta de pagamento pontual de IVA que pelo valor em questão, origina processo crime, ambas se encontram extintas. Ponto 30 - a Sociedade arguida continua a laborar, e apresenta registo de prestação de contas até ao ano de ..., exercício que antecede a emissão da respetiva certidão em .... QQQQ. Devendo, em consequência, ser proferido Acórdão que profira decisão de absolvição dos arguidos. RRRR. No que respeita à impugnação de Direito a mesma reflete-se na análise e impugnação da livre apreciação da prova, da violação do princípio da igualdade de tratamento em processo penal e da frontal violação do princípio do in dúbio pro reu, bem como da falta de fundamentação da sentença proferido pelo Tribunal a quo. SSSS. Mostrando-se que, após a valoração da prova que foi feita pelo Tribunal recorrido, é manifesto que a convicção alcançada por este se mostra insuficientemente objetivada e motivada, incapaz, portanto, de fundamentar a decisão que foi proferida, ao optar por dar prevalência a uns elementos de prova sobre outros, ignorando liminarmente todos os elementos existentes e juntos aos autos que demonstram a razão dos Arguidos e determinaria uma decisão inversa.
Terminam pugnando pela procedência do recurso e consequente revogação da decisão recorrida e sua absolvição *
Admitido o recurso no Tribunal a quo o Ministério Público apresentou a sua resposta extraindo da mesma as conclusões que a seguir se transcrevem: 1.É a presente resposta ao recurso interposto por Sociedade arguida, AA e BB da sentença proferida em ........2024 e que os condenou nos seguintes termos: d)O arguido AA, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de fraude qualificada, p. e p. pelos artigos 103.°, n.° 1, alínea c)e 104.°, n.°s 1 e 2 do RGIT, na sua redacção originária, na pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período; e)A arguida BB, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de fraude qualificada, p. e p. pelos artigos 103.°, n.° 1, alínea c) e 104.°, n.°s 1 e 2 do RGIT, na sua redacção originária, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período; e, f)A arguida Sociedade arguida , pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de fraude qualificada, p. e p. pelos artigos 103.°, n.° 1, alínea c), 104.°, n.°s 1 e 2 e 7.° do RGIT, na pena de 250 (duzentos e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), o que perfaz o montante global de € 1.250,00 (mil duzentos e cinquenta euros). 2.Invocam os Recorrentes que, ao longo do processo de inquérito, indicaram como morada da arguida Sociedade arguida a ...°5, Bombarral, tendo a notificação sido expedida para a morada .... 3.E que, não obstante, a arguida Sociedade arguida não foi regularmente notificada do despacho de acusação proferido nos autos, o que constitui nulidade insanável nos termos do disposto no artigo 119.°, alínea c), do Cód. Proc. Penal. 4.Todavia, não lhes assiste qualquer razão, uma vez que, formalmente, não procederam à comunicação de alteração de morada. 5.Os Recorrentes invocam, ainda, que o procedimento criminal se encontra prescrito, ao abrigo do disposto no artigo 21.°, n.°1, do RGIT. 6.Todavia, não lhes assiste igualmente qualquer razão uma vez que o prazo de prescrição do crime em apreço é de 10 anos, e não 5, pelo que, contando apenas com as causas de interrupção - a constituição como arguidos - tal ocorreria, apenas em ........2026 - quanto ao arguido AA - e em ........2026 - quanto às demais arguidas. 7.Invocam igualmente os Recorrentes que a sentença é nula porquanto não foram notificados da data designada para a audiência de discussão e julgamento. 8.Sucede que, pelos fundamentos dos pontos 2 a 4, não lhes assiste qualquer razão, uma vez que as notificações em causa foram expedidas para as moradas indicadas aquando da prestação do TIR, pelo que são válidas e regulares. 9.Ainda no âmbito das nulidades, referem os Recorrentes que o Mandatário não foi notificado de qualquer despacho, nem das datas designadas para a continuação da audiência de discussão e julgamento e, como tal, verifica-se a nulidade insanável da falta de representação por defensor. 10.Novamente, não lhes assiste qualquer razão uma vez que, em todas as sessões, estiveram representados por defensor e, inclusive, na última sessão “(...) confirmaram pretender continuar a ser representados, no âmbito do apoio judiciário, pela Ilustre Defensora, Dra. II, revogando qualquer relação contratual com outro advogado”. 11.Resultando assim inequívoco que os arguidos estiveram, em todas as sessões de audiência de discussão e julgamento, devidamente representados por defensor, tendo declarado, a final, que assim o desejavam e que revogam qualquer relação contratual pré- existente. 12.Os Recorrentes invocam, em sede de impugnação de facto, que o Tribunal a quo cometeu erro de julgamento ao considerar provados os pontos 8, 9, 11 a 16, 17, 20, 21 e 30 da matéria de facto. 13.Infere-se e do extenso arrazoado recursório, que os Recorrentes discordam, no essencial, na apreciação que foi efectuada pelo Tribunal a quo relativamente à prova documental e à produzida em audiência de discussão e julgamento. 14.No entanto, cotejando a factualidade dada como provada com a desenvolvida fundamentação do juízo sobre ela feito, consignadas no texto da decisão recorrida, não se detecta qualquer erro de julgamento ou violação das regras processuais quanto à apreciação e valoração da prova, de acordo como o princípio da sua livre apreciação, consagrado no artigo 127.° do Cód. Proc. Penal. 15.Em síntese, os arguidos negaram a prática dos factos, mas instados a esclarecer os detalhes da relação contratual estabelecida com a sociedade Sociedade BB, nada foram capazes de referir, não tendo explicitado quem contratou tal sociedade, qual a pessoa com quem contactaram e quais os concretos serviços que foram efectuados por aquela empresa e escudaram-se na existência de facturas que, cotejado o seu conteúdo, nada referem. 16.Resulta evidente que, para além de terem negado a prática dos factos, apresentaram uma justificação para os mesmos que não se mostra compatível com as regras da experiência comum e normalidade neste tipo de negócios. 17.Noutro plano, o Tribunal a quo contou ainda com o depoimento dos inspectores da Autoridade Tributária que, de forma objectiva, clara e assertiva, explicaram a intervenção no processo e as razões pelas quais chegaram às conclusões expendidas. 18.Assim, mediante a imediação, oralidade, concentração e contraditoriedade da prova produzida em julgamento, o Tribunal a quo formou a sua convicção de que os factos ocorreram da forma como os deu como assentes, concluindo assim pela condenação dos arguidos. O Tribunal a quo julgou criteriosa e prudentemente os arguidos, e face à prova produzida em audiência de discussão e julgamento só poderia ter concluído, como concluiu, e sem margem para dúvidas, pela sua condenação. 19.É certo que inexiste prova directa do facto essencial - a falsidade das facturas, no sentido de as mesmas não titularem serviços efectivamente prestados -, todavia, como bem refere o Tribunal a quo, tal resulta provado por via da prova segura de outros factos, os quais se mostram devidamente elencados e fundamentados na sentença recorrida. 20.Assim, dúvidas não temos que a fundamentação contém, de maneira muito clara, o juízo que o Tribunal a quo fez sobre o que considerou relevante do complexo da prova produzida em audiência, sendo certo que quer as premissas quer os dados factuais e jurídicos, quer ainda o discurso decisório correspondente, se encontram inequivocamente enunciados e escritos na sentença recorrida. 21.Em consequência, não se mostra violado o preceituado nos artigos 127.° e 412.°, n.°s 3 e 4, do Cód. Proc. Penal, pois inexistem factos incorrectamente julgados, não colhendo a interpretação dada pelo ora Recorrente à prova produzida. 22.No que concerne à impugnação de direito, impõe-se considerar, em primeiro lugar, que, no entendimento do Ministério Público, o Recorrente não deu cumprimento ao ónus que sobre si impendia e conforme determinado no artigo 412.°, n.°2 do Cód. Proc. Penal uma vez que das conclusões não consta a referência à norma que, no entendimento do recorrente, foi violada, o sentido em que o tribunal a interpretou e/ou aplicou e qual a norma que, no seu entendimento, deve ser aplicada. 23.Todavia, tendo presente as conclusões RRRR. e SSSS. delas resultando que invocam a violação do princípio da livre apreciação da prova, do in dúbio pro reo e a falta de fundamentação da sentença - sempre se dirá que não assiste qualquer razão aos Recorrentes. 24.No caso em apreço, o Tribunal a quo, de forma motivada e devidamente justificada, considerou como provados os factos melhor elencados na sentença, tendo alicerçado a sua convicção na análise conjugada das declarações dos arguidos, do depoimento das testemunhas e da demais prova documental constante dos autos. 25.Salientando-se que o Tribunal a quo recorreu às regras da experiência comum e da lógica e, por via de tal, apreciou a prova de forma objectiva, motivada, seguindo um processo lógico e racional, não se tratando de uma decisão ilógica, arbitrária ou notoriamente violadora das regras da experiência comum. 26.Veja-se que, em sede de recurso os arguidos pretendem que o Tribunal considere e valore apenas e somente os elementos probatórios que lhe são favoráveis, e que em nosso entendimento, inexistem, desvalorizando minimizando toda a prova realizada e coligida nos autos. 27.Todavia, ressalta da sentença recorrida que o Tribunal a quo fez uma correcta apreciação da prova, como transparece do exame crítico da mesma, sendo certo que na avaliação feita pelo Tribunal a quo não se mostram violadas as regras da experiência, nem o juízo feito na decisão recorrida se revela arbitrário, contraditório, ilógico ou desrespeitador das regras sobre o valor da prova ou da arte de julgar. 28.Termos em que, a sentença recorrida não padece de qualquer vício, não merecendo por isso qualquer censura, por não ter ocorrido qualquer violação do mencionado princípio da livre apreciação da prova, bem como por falta de fundamentação da sentença. 29.Inexistindo, também, qualquer violação do princípio in dúbio pro reo, na medida em que apenas a dúvida argumentada, coerente, razoável e insanável, por oposição à dúvida ligeira, meramente possível ou hipotética impõe a aplicação do sobredito princípio, o que não sucedeu no caso em apreço. 30.Com efeito, dando por reproduzido o que acima se referiu, o Tribunal a quo apreciou de forma crítica e conjugada a prova produzida, chegando, por essa via, ao estado de certeza necessário à prolação de uma decisão condenatória, não sendo expressada na motivação qualquer dúvida quanto ao cometimento dos factos pelos arguidos, pelo que não se impunha, sequer, que fosse equacionada a aplicação de tal princípio. 31.Termos em que, não se afigura que a sentença recorrida tenha violado o princípio do in dúbio pro reo, devendo, por isso, ser mantida na sua íntegra.
Termina pugnando pelo não provimento dos recursos e consequente manutenção da decisão recorrida.
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Remetidos os recursos a este Tribunal da Relação, a Exma. Procuradora Geral-Adjunta emitiu parecer acompanhando a fundamentação da resposta apresentada pelo Ministério Público no tribunal a quo e pugnando pela total improcedência dos recursos.
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Observado o disposto no artigo 417º nº2 do Código de Processo Penal nada foi aduzido.
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Efetuado o exame preliminar e colhidos os vistos legais, foram os autos submetidos à conferência.
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Nada obsta ao conhecimento dos recursos cumprindo, assim, apreciar e decidir.
2-FUNDAMENTAÇÃO:
2.1- DO OBJETO DOS RECURSOS:
É consabido, em face do preceituado nos artigos 402º, 403º e 412º nº 1 todos do Código de Processo Penal, que o objeto e o limite de um recurso penal são definidos pelas conclusões que o recorrente extrai da respetiva motivação, devendo, assim, a análise a realizar pelo Tribunal ad quem circunscrever-se às questões aí suscitadas –, sem prejuízo das que importe conhecer, oficiosamente por serem obstativas da apreciação do seu mérito, nomeadamente, nulidades insanáveis que devem ser oficiosamente declaradas em qualquer fase e previstas no Código de Processo Penal, vícios previstos nos artigos 379º e 410º nº2 ambos do referido diploma legal e mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito.1
Destarte e com a ressalva das questões adjetivas referidas são só as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas conclusões, da respetiva motivação, que o tribunal ad quem tem de apreciar2.
A este respeito, e no mesmo sentido, ensina Germano Marques da Silva3, “Daí que, se o recorrente não retoma nas conclusões as questões que desenvolveu no corpo da motivação (porque se esqueceu ou porque pretendeu restringir o objeto do recurso), o Tribunal Superior só conhecerá das que constam das conclusões”.
Assim à luz do que os recorrentes delimitam nas suas conclusões a questões a dirimir são: - se a sociedade arguida Sociedade arguida foi notificada do despacho de acusação e, no caso de resposta negativa, saber se tal omissão constitui uma nulidade insanável. - se a sociedade arguida Sociedade arguida foi notificada da data designada para a repetição de audiência de julgamento e no caso de resposta negativa saber se tal omissão consubstancia uma nulidade insanável. - se o advogado dos arguidos e sociedade arguida foi notificado do despacho que designa a data da audiência de julgamento e, em caso negativo, saber se tal omissão constitui uma nulidade insanável. - se a decisão recorrida é nula por omissão de fundamentação nos termos no artigo 379º nº1 al.a) por via da violação do disposto no artigo 374º nº2 do mesmo diploma legal. - se a decisão recorrida padece de erro de julgamento relativamente aos factos provados 8, 9, 11 a 16, 17, 20, 21 e 30 e se violou os princípios da livre apreciação da prova, da violação do princípio da igualdade de tratamento em processo penal e do in dubio pro reo. - se ocorre a prescrição do procedimento criminal.
2.2- DA APRECIAÇÃO DO MÉRITO DOS RECURSOS:
Exara a sentença recorrida na parte que releva para a apreciação dos recursos interpostos pelos arguidos o que a seguir se transcreve:
(…) Factos provados: Da prova produzida e com interesse para a decisão da causa resultou provado que: 1)A arguida Sociedade arguida, matriculada na ... sob o n.°..., é uma sociedade comercial por quotas, com o capital social de € 70.000,00 (setenta mil euros). 2) Constitui-se em ........2004 e iniciou a sua atividade de edição, distribuição, importação e exportação de livros, revistas, produtos editoriais, nomeadamente CD´s, vídeos e jogos informáticos e bem assim a organização de eventos culturaissem instalações fixas, obrigando-se nos negócios com a assinatura dos dois gerentes até ........2008 e daí em diante com a assinatura de apenas um dos gerentes. 3)Desde a data da sua constituição que os arguidos AA e BB assumiram o cargo de gerentes de facto da sociedade Sociedade arguida 4)A sociedade Sociedade BB, matriculada na ... sob o n.°..., era uma sociedade comercial por quotas, com o capital social de € 50.000,00 (cinquenta mil euros) e com sede na ...° Dto. no Carregado. 5)Constituiu-se em ........2004 e iniciou a sua atividade de transporte rodoviário de mercadorias por conta de outrem no âmbito nacional e internacional, e bem assim o comércio de materiais de construção e a execução de aterros e desaterros, obrigando-se nos negócios com a assinatura de apenas um gerente que era, no ano de ..., JJ. 6) A ........2016 a sociedade Sociedade BB foi dissolvida e procedeu-se ao encerramento da sua liquidação e ao cancelamento da respetiva matrícula. 7) Na qualidade de sujeito passivo de obrigações fiscais, a sociedade Sociedade arguida em ... encontrava-se coletada em sede de IRC e estava enquadrada, em sede de IVA, no regime normal de tributação, com periodicidade trimestral. 8) Os arguidos AA e BB fizeram integrar na contabilidade da sociedade Sociedade arguida e consequente declaração de rendimentos para efeitos de IRC e declaração periódica de IVA várias faturas emitidas pela sociedade Sociedade BB mas que não tinham subjacente qualquer transação ou prestação de serviços, conforme quadro que se segue: Período - .../12T Valor dos serviços - € 112.042,00 Valor de IVA - € 25.769,66 Valor total faturado - € 137.811,66 9) Na verdade, a sociedade Sociedade BB, no referido ano de ... não tinha capacidade para levar a cabo os serviços alegadamente subjacentes aos valores faturados por falta de estrutura empresarial adequada, nomeadamente de meios humanos, de materiais, de veículos e de instalações que permitissem prestar serviços nos montantes faturados. 10) Além disso, a sociedade Sociedade BB não declarou em sede de IRC os rendimentos correspondentes aos serviços prestados e faturados à sociedade Sociedade arguida, ou sequer apresentou qualquer declaração periódica de IVA relativamente aos mesmos. 11) Ao apresentarem a declaração periódica de IVA do último trimestre de ..., na qual inscreveram o valor do IVA liquidado nas faturas emitidas pela sociedade Sociedade BB, os arguidos AA e BB conseguiram obter para a sociedade Sociedade arguida uma vantagem patrimonial indevida no valor de € 25.769,66 (vinte e cinco mil setecentos e sessenta e nove euros e sessenta e seis cêntimos) correspondente ao imposto indevidamente deduzido neste período. 12)Acresce que os arguidos AA e BB, em sede de declarações de IRC da sociedade Sociedade arguida para o ano de ... contabilizaram também como custos a totalidade dos valores mencionados nas faturas emitidas pela sociedade Sociedade BB 13) Ora, como esses custos não existiram realmente, o lucro tributável declarado pela sociedade Sociedade arguida no referido ano de ... foi inferior ao real e implicou a não cobrança de IRC pelo ... no valor correspondente à diferença entre o lucro tributável real e o declarado, conforme quadro que se segue: Período - ... Custos indevidamente declarados - € 112.042,00 Taxa de IRC - 25% IRC por cobrar - € 28.010,50 14) Ao fazerem constar as faturas emitidas pela sociedade Sociedade BB da contabilidade da sociedade Sociedade arguida e consequente declaração de rendimentos (para efeitos de IRC) e declaração periódica de IVA, os arguidos AA e BB atuaram com o propósito concretizado de obterem benefícios patrimoniais indevidos para a sociedade que representavam no valor de € 25.769,66 (vinte e cinco mil setecentos e sessenta e nove euros e sessenta e seis cêntimos) a título de IVA e de € 28.010,50 (vinte e oito mil e dez euros e cinquenta cêntimos) a título de IRC, à custa da defraudação do .... 15) Defraudaram, assim, o Estado nos aludidos montantes ao fazer crer aos respetivos Serviços da Administração Fiscal que a declaração periódica de IVA referente ao último trimestre de ... e a declaração anual de IRC referentes ao ano de ... se baseavam em documentos que titulavam verdadeiras transações, induzindo-o em erro quanto à sua autenticidade, com o que conseguiram que o mesmo visse o seu património prejudicado nos montantes acima indicados e dos quais a sociedade que representavam se apoderou, embora soubessem que não lhe pertenciam. 16) Os arguidos agiram de forma concertada, deliberada, livre e consciente, com o propósito concretizado de obterem para a sociedade Sociedade arguida uma vantagem patrimonial indevida à custa da diminuição das receitas fiscais, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punível por lei. 17) À data de hoje, os impostos com as correções efetuadas após a ação inspetiva encontram-se totalmente pagos. Antecedentes criminais 18) A sociedade arguida não tem antecedentes criminais. 19) A arguida BB não tem antecedentes criminais. 20) O arguido AA foi condenado no âmbito do processo n.°462/18.0... por sentença de .../.../2020, transitada em julgado em .../.../2020, pela prática, em ..., de um crime de abuso de confiança fiscal, na pena de 120 dias de multa à taxa diária de € 4,00, o que perfaz a quantia global de € 480,00. Pena extinta em .../.../2020. 21) Foi ainda condenado no âmbito do processo n.°299/20.6... por sentença de .../.../2022, transitada em julgado em .../.../2022, pela prática, em .../.../2020, de um crime de abuso de confiança fiscal, na pena de 100 dias de multa à taxa diária de € 4,00, o que perfaz a quantia global de € 400,00. Pena extinta em .../.../2023. 22)Os arguidos AA e BB são casados um com o outro desde ....
23. Residem apenas os dois.
24. Continuam a trabalhar na sociedade arguida.
25. O arguido AA aufere mensalmente quantia líquida de cerca de € 1.000,00.
26. A arguida BB aufere mensalmente quantia líquida de € 1.200,00.
27. Com despesas mensais os arguidos suportam: € 980,00 com crédito à habitação, € 23,00 com água, € 100,00 com eletricidade e € 50,00 com telecomunicações.
28. O arguido AA estudou até ao 12.° ano.
29. A arguida BB é licenciada em ciências da comunicação.
30. A sociedade continua a laborar, embora não se encontre registo de prestação de contas desde o ano de .... * Factos não provados: Da prova produzida e com interesse para a boa decisão nada ficou por provar. * Os restantes factos alegados, não especificamente dados como provados ou não provados, ou são a repetição ou negação de outros já dados como provados ou sãoconclusivos (em termos factuais ou por encerrarem questões de Direito), ou são irrelevantes para a decisão, designadamente aqueles que exclusivamente diziam respeito à intervenção, conhecimento e intenção de JJ. * Motivação da decisão de facto: A convicção do tribunal em relação à factualidade apurada resultou da apreciação crítica e conjugada das declarações dos arguidos, que não admitiram a prática dos factos, com a prova documental junta aos autos e a prova testemunhal produzida em audiência de discussão e julgamento, tudo apreciado à luz das regras da experiência comum. Atentou-se nos seguintes documentos:
• Certidão permanente Sociedade arguida - fls. 4-10;
• Informação preliminar - fls. 63 e ss;
• Documentação contabilística - fls. 70 e ss.;
• Mensagem de correio eletrónico do CC - fls. 73;
• Extrato de conta - fls. 75;
• Email de .../.../2015 - fls. 76;
• Lançamentos - fls. 77-78;
• Faturas - fls. 79-92;
• Pesquisa de veículos - fls. 93 e 94;
• Informação fiscal e cadastral - fls. 101 e ss., 120 e ss.; 220 e ss.; 235 e ss., 349 e ss.;
• Email do CC com novos elementos de .../.../2016;
• Declaração periódica de IVA - fls. 118;
• Documentação contabilística - fls. 169 e ss.;
• Certidão permanente Sociedade BB - fls. 224 e ss.;
• Relato de diligência externa - fls. 243.
• Auto de notícia - fls. 274 e ss.;
• Excertos do relatório de inspeção (Sociedade arguida) - fls. 276 e ss.;
• Relatório de inspeção (Sociedade BB) - fls. 276 e ss.;
• Relatório - fls. 357 e ss.;
• Certificados de Registo criminal - fls. 451-455 e 458. Em audiência foram ouvidas as seguintes testemunhas: 1.EE, nascido em ...-...-1974, casado, Inspetor Tributário. 2.FF, nascida em ...-...-1997, casada, Inspetora Tributária. Concretizando. Os factos provados relativamente à constituição, objeto, sede e gerência de direito das sociedades arguidas e encerramento da liquidação da sociedade Sociedade BB colheram- se das respetivas certidões comerciais juntas aos autos. Os arguidos, pessoas singulares, após terem faltado à primeira sessão da audiência de discussão e julgamento, não obstante a sua regular notificação, compareceram à segunda sessão e decidiram prestar declarações, negando, no essencial, a prática dos factos. Em suma ambos referiram que não se recordam da sociedade Sociedade BB, não conseguindo concretizar quem contratou tal sociedade, qual a pessoa que foi contactada por parte daquela sociedade, que concretos serviços foram efetuados por tal sociedade, apenas remeteram para o descritivo das faturas, asseverando, não obstante, que não fizeram incorporar na contabilidade da sociedade arguida quaisquer faturas que não fosse real. Não obstante, o tribunal não ficou com dúvidas quanto ao essencial: as faturas emitidas pela Sociedade BB à Sociedade arguida no ano de ... não corresponderam a serviços efetivamente prestados, o que os arguidos bem sabiam. Não existe evidentemente prova direta deste facto, nem os arguidos o confessaram. A convicção do tribunal formou-se a partir da prova segura de outros factos, de onde se destacam os seguintes: -a sociedade Sociedade BB era à data dos factos uma sociedade não declarante, conforme referido no relatório a fls. 66 e em audiência pelas duas testemunhas ouvidas (não entregava desde ...0.../2009 declarações de IRC, IVA, IES, Modelo 10); As testemunhas ouvidas em audiência, ambos inspetores tributários, prestaram depoimentos objetivos, claros e assertivos, explicando a intervenção que tiveram no processo e as razões pelas quais chegaram às conclusões que expenderam em audiência. São testemunhas imparciais, sem qualquer interesse na causa, a que o tribunal atribuiu plena credibilidade, tanto assim que também confirmaram que as quantias se encontram atualmente todas pagas, o que permitiu dar este facto como provado. -a sociedade Sociedade BB não possuía imóveis registados, não tinha instalações a partir das quais pudesse trabalhar, cf. relatório de diligência externa de fls. 243 e ss e relatório de inspeção a fls. 68, não tinha veículos registados, conforme verificado nas bases de dados da Autoridade Tributária, cf. relatório de inspeção a fls. 66v e referido também pelas duas testemunhas ouvidas, não tinha contabilista certificado, tudo também explicitado em audiência pelas duas testemunhas ouvidas em audiência; -foi detetado que esta sociedade Sociedade BB emitiu faturas relativas a alegados serviços prestados a várias empresas num valor total de € 1.350.826,00 tendo € 0,00 de aquisições a fornecedores, não tendo trabalhadores ao seu serviço, não tendo veículos automóveis, inexistindo qualquer rasto de qualquer contrato com outras empresas; Ora, a circunstância de estarmos perante uma sociedade não declarante, sem viaturas, sem local de trabalho, sem qualquer estrutura comercial, sem qualquer indício de atividade, com um gerente estrangeiro, aparentemente apenas nominal, um claro “testa de ferro”, que não adquire um único bem ou serviço, mas declara prestar serviços/bens no valorde € 1.350.826,00 (!), inculca a clara ideia de que esta sociedade, pelo menos no período em causa nos autos, era utilizada somente para emitir faturas. E se estes serviços tivessem sido prestados por outra sociedade, haveria todo o interesse em declará-los porquanto consubstanciam gastos dedutíveis. -as faturas, embora alegadamente digam respeito a serviços prestados entre ..., foram emitidas todas de forma sequencial (atente-se nos números das faturas juntas a fls. 79 e ss - com exceção da 1.a (n.° 197), as seguintes vão da 201 à 221, da 223 à 227), o que nos diz que foram emitidas todas de forma seguida, pese embora digam respeito a serviços prestados entre ... de ... de 2011; -tais faturas, embora alegadamente digam respeito a serviços prestados entre ..., foram todas contabilizadas na contabilidade da sociedade arguida no último período de tributação de ... - relatório de inspeção e depoimentos das testemunhas ouvidas em audiência; -nas faturas não são identificadas as viaturas que fizeram o transporte, não é indicada guia de remessa ou transporte, horas, local de carga e descarga, embora a fatura tivesse campo para esse efeito e fosse obrigatório por lei; -não foi apresentado qualquer documento de transporte ou qualquer documento que comprovasse o negócio efetuado entre a Sociedade arguida e a Sociedade BB (não existe um email, mensagens escritas, qualquer documento, não é indicado um nome, um contacto telefónico, um absoluto vazio). Veja-se que se seria normal que a sociedade arguida tivesse dificuldades em reunir tais elementos à data de hoje, mal se compreende por que razão não o conseguiu em ... quando foi contactada pela Autoridade Tributária para proceder à junção de documentos no âmbito da ação inspetiva (sendo que ainda se encontrava nesse período obrigada a conservar toda a documentação contabilística e fiscal de suporte às declarações apresentadas [10 anos - por exemplo, por reporte ao IVA, veja-se o artigo 52.°, n.° 1 do CIVA, já em vigor à data dos factos]); - os pagamentos desses serviços foram todos efetuados em numerário, o que é prática estranha e pouco habitual especialmente quando se tratam de valores elevados; Os arguidos apresentaram uma explicação para este facto. Estas faturas diziam respeito a transportes para o Luxemburgo, sendo as mercadorias vendidas à consignação. O transportador recolhia o dinheiro (em notas) junto dos clientes do Luxemburgo e entregava na empresa, sociedade arguida, pagando-se desse valor. A assim ter sido, pergunta-se: é minimamente plausível/verossímil que sendo esse o modus operandi, os arguidos, ambos assumidamente gerentes da sociedade arguida no período em questão, não soubessem indicar com que pessoa da sociedade Sociedade BB encetaram contacto? Não souberam identificar nem o gerente, nem um colaborador/transportador ou qualquer outra pessoa, nem precisar os termos do contrato celebrado. Tais serviços pressuporiam relação de grande confiança, pois que se trata do transporte de quantias de dinheiro avultadas. É, pois, minimamente plausível que os arguidos neste circunstancialismo não consigam nomear uma única pessoa desta sociedade, a quem confiaram o transporte de quantias tão avultadas? Não cremos. Veja-se que a sociedade arguida é, conforme referido pelo arguido AA, uma sociedade familiar, cuja estrutura humana não ultrapassava as 8 pessoas (nem a esta pergunta o arguido AA conseguiu responder objetivamente, oscilando entre 5 a 7, contando já consigo e com a sua esposa). E se até se perceberia que tal sucedesse à data de hoje, posto que já passaram mais de 10 anos da data da prática dos factos, já não se compreende que tal tenha ocorrido quando ainda nem 3 anos tinham decorrido desde a data da prática dos factos (veja-se que aos arguidos foram solicitados elementos logo no início de ..., conforme mensagem de correio eletrónico junta a fls. 71 dos autos). Refere o arguido AA que não conhece nenhuma pessoa de nenhuma transportadora, das várias com que trabalham (sendo que instado a nomear as transportadoras com que trabalham não conseguiu ir além das 3). É certo que não é aos arguidos que cabe provar que a sociedade Sociedade arguida efetivamente beneficiou de serviços subjacentes às faturas que incorporou na sua contabilidade. Porém, é certo que, se acaso tais faturas correspondessem a serviços efetivamente prestados, seria expectável que esta sociedade, através dos seus gerentes, imediatamente soubesse identificar a pessoa com quem contactou e juntasse aos autos prova documental ou testemunhal idónea a demonstrar a real existência do negócio. Veja-se que quando, num primeiro momento, foi solicitado aos arguidos que juntassem elementos relacionados com estas transações, estes limitaram-se a juntar o extrato de conta e as faturas da Sociedade BB E mesmo posteriormente (depois da notificação do projeto do relatório de inspeção) juntaram elementos muito pouco esclarecedores, atente-se nos documentos juntos a fls. 290 e ss, entregues pela arguida em anexo à resposta que também se encontra junta a fls. 308. As faturas juntas a fls. 327v e 328, além de serem faturas manuscritas, encontram-se ilegíveis, sendo certo que mesmo que se tratassem de faturas de bens fornecidos a clientes no Luxemburgo, tal não é idóneo a demonstrara que existiram transportes por parte da sociedade Sociedade BB, em face de todas as demais questões já referidas. Não pode também deixar de se atentar na resposta que o contabilista certificado da sociedade, entretanto já falecido, apresentou à Autoridade Tributária em .../.../2015, a fls. 73, após terem sido pedidos elementos em .../.../2014 (designadamente extratos de conta do fornecedor Sociedade BB, faturas, comprovativos de pagamento, cópias de contratos, identificação da pessoa com quem contactaram - cf. enunciado no relatório fls. 65v) e efetuada insistência em .../.../2015: “As m/desculpas por só agora lhe responder, mas a não ser cópia da conta corrente tudo está difícil pois; Este assunto do transporte de mercadorias de e para o Luxemburgo foi um caso para esquecer porque só nos deu prejuízos pois tratou-se de umas paletes de livros que adquirimos num leilão, mas estavam todos danificados. 1-A pessoa que tratou de todo este assunto (apareceu-nos no leilão) que nos convenceu ser uma pessoa que faria rentabilizar uma compra que certamente ele já sabia do seu mau estado e seria difícil comercializar. Ingenuamente caímos e no fim de tudo não vimos nem livros (nem lixo), nem dinheiro pois se algo foi vendido o transportador e a tal pessoa tudo trataram. 2-A documentação que foi contabilizada foi recebida num envelope que alguém colocou depois na N/Cx correio. A Situação foi por nós “encaixada” como um negócio para esquecer. 3-Em face do V/Ofício tentámos e informamos o melhor que nos é possível. a) Esta situação foi só no ano de .... b) Cópia de documentos, está a ser difícil, pois mudámos de Sede e instalações e foi tudo transportado em Paletes para o n/novo armazém, que aos poucos estamos abrindo, mas até a data não estamos encontrando os documentos. c)Extratos de conta: somos a anexar de ..., pois foi o único. d)Já por varias vezes tentamos encontrar o “intermediário ”, mas sem resultado, pois no local que dizia morar uns não sabem quem é e outros informam que emigrou dizendo uns que para França e outros fala-nos em Alemanha. Continuaremos a tentar contactá-lo pois na realidade é o único que saberá explicar este “negócio”.'1'’ O conteúdo desta mensagem de correio eletrónico, que foi à data enviado com CC para a sociedade arguida [...] encontra-se em contradição direta com o teor das declarações dos arguidos prestadas em audiência e foi, aliás, visível a atrapalhação dos arguidos em audiência quando confrontados com a mesma. Os arguidos não souberam também em audiência esclarecer os nomes dos clientes no Luxemburgo. Por tudo quanto fica dito, não teve este tribunal dúvida que as faturas emitidas pela sociedade Sociedade BB não corresponderam a serviços efetivamente prestados à sociedade Sociedade arguida. Relativamente ao exercício da gerência de facto da sociedade arguida, tal matéria não foi contestada pelos arguidos, pelo contrário, antes assumida. Os valores inscritos na declaração de IVA da sociedade arguida resultam da observação da própria declaração junta a fls. 118 e em sede de IRC das informações constantes da informação fiscal junta aos autos e no depoimento das duas testemunhas ouvidas em audiência. Os valores relativos às liquidações adicionais foram igualmente confirmados pelas testemunhas ouvidas. Os factos relativos ao conhecimento e vontade de ação e consciência da ilicitude colhem-se da análise dos factos objetivos que resultaram provados, apreciados à luz das regras da normalidade social e da experiência comum, sendo evidente em face da forma desenvolta como os arguidos se expressam que estes bem sabem que não podem integrar na sua contabilidade faturas que não correspondam a serviços efetivamente recebidos. A ausência de antecedentes criminais das arguidas e os antecedentes criminais do arguido colheu-se do certificado de registo criminal do arguido e as suas condições socioeconómicas foram apuradas com base nas suas declarações que não afrontaram as regras da experiência comum. * Enquadramento Jurídico-Penal Aos arguidos vem imputada a prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de fraude fiscal qualificada, previsto e punido pelos artigos 103.°, n.°1, alínea c), e 104.°, n.°s 1, 2, alínea a), e 3, do RGIT (Regime Geral das Infrações Tributárias, aprovadopela Lei n.°15/2001, de 05.06), sendo a sociedade arguida responsável por via do artigo 7.° do RGIT Estabelece o artigo 103.° do RGIT, na redação atual e também a vigente à data dos factos, que: “1- Constituem fraude fiscal, punível com pena de prisão até três anos ou multa até 360 dias, as condutas ilegítimas tipificadas no presente artigo que visem a não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária ou a obtenção indevida de benefícios fiscais, reembolsos ou outras vantagens patrimoniais suscetíveis de causarem diminuição das receitas tributárias. A fraude fiscal pode ter lugar por: a) Ocultação ou alteração de factos ou valores que devam constar dos livros de contabilidade ou escrituração, ou das declarações apresentadas ou prestadas a fim de que a administração fiscal especificamente fiscalize, determine, avalie ou controle a matéria coletável; b) Ocultação de factos ou valores não declarados e que devam ser revelados à administração tributária; c) Celebração de negócio simulado, quer quanto ao valor, quer quanto à natureza, quer por interposição, omissão ou substituição de pessoas. 2 - Os factos previstos nos números anteriores não são puníveis se a vantagem patrimonial ilegítima for inferior a (euro) 15000. 3- Para efeitos do disposto nos números anteriores, os valores a considerar são os que, nos termos da legislação aplicável, devam constar de cada declaração a apresentar à administração tributária”. O bem jurídico protegido pela incriminação é, por um lado, o património do Estado, e por outro, os deveres de informação e de verdade dos cidadãos perante o sistema fiscal (Germano Marques da Silva, Direito Penal Tributário, Universidade Católica Editora, p. 230). Daí que no Ac. TRC de 02.10.2013, se afirme que se tutela “a ofensa à Conta do Estado na rubrica que inclui as receitas fiscais destinadas à realização de fins públicos” (proc. 105/11.2IDCBR.C1, disponível em www.dgsi.pt). O tipo objetivo de ilícito preenche-se “com a adoção de condutas que visem a não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária ou outras vantagens patrimoniaissuscetíveis de causarem diminuição das receitas tributárias, tendo o legislador concretizado esses comportamentos nas alíneas a), b) e c) do n.°1 do artigo 103” (Ac. TRC de 12.09.2012, proc. n.° 379/07.3TAILH.C1, disponível em www.dgsi.pt). Exige-se, pois, a verificação de três elementos: - a existência de um mecanismo fraudulento, através da ocultação ou alteração de factos/valores; - uma finalidade específica a enformar a atuação (não liquidação, entrega...); - a idoneidade da conduta para diminuir a receita tributária (Carlos Teixeira e Sofia Gaspar, Comentário das Leis Penais Extravagantes, Universidade Católica Editora, p. 454). Uma das modalidades de conduta, prevista na alínea a), consiste na alteração dos valores que deviam constar das declarações apresentadas perante a Administração a fim de esta fiscalizar, determinar, avaliar ou controlar a matéria coletável. São situações em que a declaração apresentada é enganosa, por não corresponder à realidade dos factos. Nesta alínea, está-se perante uma atuação, não por omissão, mas sim por ação que, consequentemente, podendo a apresentação da declaração que contém elementos não correspondentes com a realidade, ser apresentada na sequência de um plano conjunto entre o sujeito passivo e um terceiro (cf. Isabel Marques da Silva, Regime Geral das Infrações Tributárias, cadernos do IDEFF, n.° 5, 3a edição, p. 205, Germano Marques da Silva, Direito Penal Tributário, Universidade Católica Editora, p. 235 e Ac. TRC de 02.10.2013, proc. 105/11.2IDCBR.C1, disponível em www.dgsi.pt). Já a alínea b) incrimina a falta de apresentação de declarações de factos que devem ser revelados à administração fiscal; visa-se a omissão integral, a falta de apresentação de declaração. Por sua vez, a alínea c) abrange qualquer forma de simulação (por acordo entre declarante e declaratário e no intuito de enganar terceiros, há uma divergência entre a declaração negocial e a vontade real do declarante) que, objetivamente, vise a não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária e seja suscetível de causar diminuição das receitas tributárias (Germano Marques da Silva, Direito Penal Tributário, Universidade Católica Editora, p. 233). Trata-se, pois, de um crime de execução vinculada, na medida em que é cometido através de uma das formas típicas descritas na lei. Para o preenchimento do crime, não se exige a obtenção de vantagem patrimonial, bastando que as condutas visem o não pagamento, liquidação, reembolsos e sejam suscetíveis de causar diminuição das receitas tributárias. Por isso, não é elemento do crime a efetiva diminuição das receitas tributárias; basta que a conduta tenha aptidão concreta para diminuir as receitas fiscais. Daí que o já citado Ac. TRC de 02.10.2013 considere estarmos perante um crime de “resultado cortado, pois a obtenção de vantagem patrimonial ilegítima não é elemento do tipo. Basta apenas que as condutas sejam preordenadas à obtenção de tal vantagem”. A existência dessa vantagem patrimonial ilegítima para o agente pode ter apenas relevância para efeitos de determinação da medida da pena (Ac. STJ 05.07.2001, proc. 4000/00-3). Esta caraterística do crime distingue-o do crime de abuso de confiança fiscal. Como se relata no Ac. STJ de 12.10.2000, “o crime de fraude fiscal consuma-se independentemente de qualquer prejuízo efetivo na esfera patrimonial do Fisco ou de qualquer enriquecimento do agente, enquanto o crime de abuso de confiança fiscal pressupõe precisamente a existência de prejuízo patrimonial para o Fisco, com a apropriação de prestação recebida pelo agente para a entrega ao credor tributário” (CJ, STJ, VII, 3,194). Mas a prestação tributária devida, para que seja punível como fraude fiscal, necessita de ser igual ou superior a 15.000,00€, tratando-se de um limiar mínimo de punição. Relativamente ao elemento subjetivo, exige-se uma atuação dolosa do agente, o conhecimento e a vontade de praticar a conduta especialmente adequada a causar a diminuição das receitas tributárias (artigo 14.° do CP). Na verdade, embora o tipo legal contenha a expressão “condutas ilegítimas tipificadas (...) que visem a não liquidação (...)”, considera-se não ser exigível que o agente tenha a intenção de causar diminuição das receitas tributárias (dolo específico). Basta que as condutas sejam dolosas e adequadas a causar essa diminuição das receitas tributárias, independentemente da intenção do agente. Por isso, sendo a aptidão elemento objetivo do crime, tem também de ser representada pelo agente (Neste sentido, Germano Marques da Silva, Direito Penal Tributário, Universidade Católica Editora, p. 231 e Carlos Teixeira e Sofia Gaspar, Comentário das Leis Penais Extravagantes, Universidade Católica Editora, p. 457). Acresce que o crime de fraude fiscal se consuma com a apresentação da declaração perante a Administração Tributária, pois, com a entrega, ela aceita como verdadeiros os factos aí contidos, perdendo o agente o poder de disposição dos valores a apresentar (Carlos Teixeira e Sofia Gaspar, Comentário das Leis Penais Extravagantes, Universidade Católica Editora, p. 456). Todavia, se o agente substitui a declaração pela correta, ainda durante o prazo fixado na lei, não haverá consumação do crime, pois o poder de disposição dos valores ainda não pertencia à Administração Tributária. E o agente do crime da fraude fiscal, exceto nas condutas omissivas, pode ser qualquer um e não apenas o sujeito passivo da relação tributária (cf. Ac. TRC 21.02.2018, proc. 27/06.9IDLRA.C1, disponível em www.dgsi.pt). De facto, como afirma Nuno Pombo “não se vê que os interesses que a lei pretende ver tutelados possam ser ofendidos apenas pelos sujeitos passivos de relações jurídicas tributárias, razão pela qual entendemos precipitada a intenção de ver reduzido a estes o círculo de eventuais agentes (Fraude Fiscal, Almedina, p. 58 e ss). No que se reporta ao crime de fraude fiscal qualificada, prevê o artigo 104.° do RGIT à data de hoje, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 64-B/2011, de 30/12 (em vigor desde o dia 01/02/2012), que: “1 - Os factos previstos no artigo anterior são puníveis com prisão de um a cinco anos para as pessoas singulares e multa de 240 a 1200 dias para as pessoas coletivas quando se verificar a acumulação de mais de uma das seguintes circunstâncias: a) O agente se tiver conluiado com terceiros que estejam sujeitos a obrigações acessórias para efeitos de fiscalização tributária; b) O agente for funcionário público e tiver abusado gravemente das suas funções; c) O agente se tiver socorrido do auxílio do funcionário público com grave abuso das suas funções; d)O agente falsificar ou viciar, ocultar, destruir, inutilizar ou recusar entregar, exibir ou apresentar livros, programas ou ficheiros informáticos e quaisquer outros documentos ou elementos probatórios exigidos pela lei tributária; e) O agente usar os livros ou quaisquer outros elementos referidos no número anterior sabendo-os falsificados ou viciados por terceiro; f) Tiver sido utilizada a interposição de pessoas singulares ou coletivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável; g) O agente se tiver conluiado com terceiros com os quais esteja em situação de relações especiais. 2- A mesma pena é aplicável quando:
a. A fraude tiver lugar mediante a utilização de faturas ou documentos equivalentes por operações inexistentes ou por valores diferentes ou ainda com a intervenção de pessoas ou entidades diversas das da operação subjacente; ou
b. A vantagem patrimonial for de valor superior a (euro) 50 000. 2 - Se a vantagem patrimonial for de valor superior a (euro) 200 000, a pena é a de prisão de 2 a 8 anos para as pessoas singulares e a de multa de 480 a 1920 dias para as pessoas coletivas. 3- Os factos previstos nas alíneas d) e e) do n.°1 do presente preceito com o fim definido no n.°1 do artigo 103.° não são puníveis autonomamente, salvo se pena mais grave lhes couber". E previa o mesmo artigo à data dos factos: “1 - Os factos previstos no artigo anterior são puníveis com prisão de um a cinco anos para as pessoas singulares e multa de 240 a 1200 dias para as pessoas coletivas quando se verificar a acumulação de mais de uma das seguintes circunstâncias: a) O agente se tiver conluiado com terceiros que estejam sujeitos a obrigações acessórias para efeitos de fiscalização tributária; b) O agente for funcionário público e tiver abusado gravemente das suas funções; c) O agente se tiver socorrido do auxílio do funcionário público com grave abuso das suas funções; d)O agente falsificar ou viciar, ocultar, destruir, inutilizar ou recusar entregar, exibir ou apresentar livros, programas ou ficheiros informáticos e quaisquer outros documentos ou elementos probatórios exigidos pela lei tributária; e) O agente usar os livros ou quaisquer outros elementos referidos no número anterior sabendo-os falsificados ou viciados por terceiro; f) Tiver sido utilizada a interposição de pessoas singulares ou colectivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável;
g. O agente se tiver conluiado com terceiros com os quais esteja em situação de relações especiais. 2- A mesma pena é aplicável quando a fraude tiver lugar mediante a utilização de faturas ou documentos equivalentes por operações inexistentes ou por valores diferentes ou ainda com a intervenção de pessoas ou entidades diversas das da operação subjacente. 3- Os factos previstos nas alíneas d) e e) do n.°1 do presente preceito com o fim definido no n.°1 do artigo 103.° não são puníveis autonomamente, salvo se pena mais grave lhes couber". Como é bom de ver, inexistiu descriminalização da conduta, pelo que importa aplicar ao caso a lei que se encontrava em vigor à data da prática dos factos. Uma das circunstâncias que implica a qualificativa na fraude consiste na utilização de faturas ou documentos equivalentes por operações inexistentes ou por valores diferentes ou ainda com a intervenção de pessoas ou entidades diversas das da operação subjacente. Como refere Germano Marques da Silva, a propósito desta circunstância qualificativa, a “fatura pressupõe um negócio - uma compra e venda ou prestação de serviço - pelo que a emissão da fatura pressupõe um negócio subjacente que pode existir noutros termos (simulação relativa) ou nem sequer existir (simulação absoluta)”. Tal circunstância qualificativa advém da “especial gravosidade do meio, tomando mais difícil a sua descoberta”. E acrescenta que as “faturas (...) podem referir-se a operações inexistentes, a valores diferentes ou com intervenção de pessoas ou entidades diversas das da operação subjacente. A operação pode ser real, existente, mas ser emitida por pessoa diversa da que realizou a operação subjacente” (Direito Penal Tributário, Universidade Católica Editora, pp. 239 e 240). Nos termos dos artigos 1.° e 2.° do CIVA, está sujeito a imposto a transmissão de bens e a prestação de serviços, a título oneroso, sendo sujeitos passivos desse imposto as pessoas singulares que exercem, de modo independente e habitual, atividades de produção, comércio ou prestação de serviços, incluindo profissões liberais. De acordo com os artigos 8.° e 29.°, n° 1, al. b) do CIVA, os sujeitos passivos devem emitir obrigatoriamente uma fatura por cada transmissão de bens ou prestação de serviços, independentemente da qualidade do adquirente dos bens ou destinatário dos serviços, ainda que estes não a solicitem, bem como pelos pagamentos que lhes sejam efetuados antes da data da transmissão de bens ou da prestação de serviços. Tal imposto é devido e exigível com a transmissão de bens ou a prestação de serviços e emissão da fatura, de acordo com o artigo 7.° do CIVA. E sendo as transmissões de bens e prestações de serviços de carácter continuado, dando lugar a pagamentos sucessivos e parcelares, considera-se que o imposto é devido e exigível em função de cada pagamento (artigo 7.°, n.°3 do CIVA). Daí que, como se afirma no Ac. TRL 17.04.2018, o IVA é “devido desde a respetiva venda, faturação, liquidação e declaração aos serviços, e não desde o momento do pagamento da transação que lhe deu origem. Por isso, o pagamento do IVA liquidado e declarado é exigível logo que decorra o respetivo prazo, tenha ou não sido recebido pelo sujeito passivo” (proc. 777/16.11DLSB.L1- 5, disponível em www.dgsi.pt). No caso de o sujeito passivo não vir a receber dos seus clientes os montantes faturados e sobre os quais já entregou ao Estado o montante correspondente ao IVA, poderá recorrer ao mecanismo estabelecido no artigo 78.°-A e seguintes. Por sua vez, o artigo 41.° estabelece os prazos para efeitos de entrega de declaração periódica, devendo o imposto ser entregue nesse mesmo prazo (artigo 27.° do CIVA). E, nessa declaração, pode o sujeito passivo deduzir o imposto devido ou pago pela aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos, em conformidade com o artigo 19.°, n.°1, al. a) do CIVA, só o podendo fazer, porém, quanto ao imposto refletido em faturas passadas na forma legal em seu nome e na sua posse (artigo 19.°, n.°2, al. a) do CIVA). Não pode, porém, deduzir imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da fatura (artigo 19.°, n.°3 do CIVA). Vertendo ao caso concreto, resultou provado que os arguidos AA e BB fizeram integrar na contabilidade da sociedade Sociedade arguida e consequentes declaração de rendimentos para efeitos de IRC e declaração periódica de IVA várias faturas emitidas pela sociedade Sociedade BB, no valor global de € 137.811,66, que não tinham subjacente qualquer transação ou prestação de serviços, conseguindo desse modo uma redução ao nível do IRC e do IVA, nos valores de € 25.769,66 de IVA e € 28.010,50 de IRC. Está, assim, preenchida a alínea c) do n.°1 do artigo 103.° do RGIT. Está igualmente preenchido o n.°2 do artigo 104.° do RGIT. Já não o n.°3, nem na redação em vigor à data da prática dos factos, nem à data de hoje, que dispõe que se a vantagem patrimonial for de valor superior a (euro) 200 000, a pena é a de prisão de 2 a 8 anos para as pessoas singulares e a de multa de 480 a 1920 dias para as pessoas coletivas, pelo que importa absolver os arguidos da prática do crime qualificado pelo n.º 3 do artigo 104.° do RGIT. Está, antes, preenchido o n.º2 do artigo 104.° do RGIT, em vigor à data dos factos. Igualmente preenchido está o elemento subjetivo do tipo posto que se provou o conhecimento e vontade de ação, bem como a consciência da ilicitude, dos arguidos, impondo-se, por isso, a sua condenação, inexistindo qualquer causa de exclusão da culpa ou da ilicitude e tendo todos atuado com dolo direto. Refira-se, ademais, que também em relação à sociedade arguida se verificam os pressupostos da sua responsabilidade pela prática do ilícito. O artigo 7.°, n.°1, do RGIT estipula que as pessoas coletivas, sociedades e outras entidades fiscalmente equiparadas são responsáveis pelas infrações previstas na presente lei quando cometidas pelos seus órgãos ou representantes, em seu nome e no interesse coletivo, sendo certo que, a responsabilidade criminal das pessoas coletivas não exclui a responsabilidade individual dos agentes, nos termos do disposto no artigo 7.°, n.°3 do RGIT. De facto, por detrás da ideia de atribuição da responsabilidade criminal às pessoas coletivas está a intenção de fazer face a situações de impunidade, pois que é o património da sociedade arguida que beneficia da atuação ilícita, gerando, de facto, situações de desigualdade face às restantes empresas que se mantêm em funcionamento sem recurso a montantes que não lhes pertencem (Augusto Silva Dias, Crimes e Contraordenações Fiscais, Direito Penal Económico e Europeu: Textos Doutrinários, Vol. II, Coimbra Editora, 1999, p. 450). Ora, os arguidos AA e BB atuaram em nome e no interesse da sociedade arguida, pelo que esta é também penalmente responsável pela prática do crime imputado. * Determinação da medida da pena Feito o enquadramento jurídico-penal dos factos sob apreciação e concluindo-se pelo preenchimento dos elementos objetivos e subjetivos do crime em apreço, há que determinar a sanção penal a aplicar ao arguido. Nos termos do disposto pelo artigo 40.° do Código Penal, a finalidade primeira das penas reside na tutela dos bens jurídicos, devendo traduzir, a sua aplicação, a tutela das expectativas da comunidade na manutenção da norma violada, sem perder de vista, na medida do possível, a reinserção social do arguido, ou seja, as exigências de prevenção e de repressão geral da criminalidade, por um lado, e, por outro, as exigências específicas, de socialização, de prevenção da prática de novos crimes. A conduta dos arguidos é punida com pena de um a cinco anos para as pessoas singulares e multa de 240 a 1200 dias para as pessoas coletivas. No caso inexiste escolha da pena a efetuar porquanto as condutas dos arguidos pessoas singulares apenas são punidas com pena de prisão e a sociedade apenas é punida com pena de multa. As exigências de prevenção geral são elevadas neste tipo de crimes, visto ser conhecido o grande número de agentes, sujeitos passivos e não só, que não cumprem com as suas obrigações tributárias, procurando diversas manobras para fugir ao fisco ou para enriquecer à sua custa, muitas vezes, na base de um sentimento de impunidade. E tais comportamentos criam também injustiça e desigualdade relativamente a contribuintes cumpridores que sofrem uma agravação da carga fiscal, por força da diminuição das receitas tributárias por aqueles provocadas. São também elevadas as exigências de prevenção geral quanto ao crime de falsificação de documento, atenta a frequência com que nos deparamos com situações da mesma índole e aos perigos que comporta em termos da fiabilidade que merecem os documentos sobretudo os elaborados por autoridades policiais. Já no que concerne às necessidades de prevenção especial, há a ponderar que a arguida BB não tem antecedentes criminais. Já o arguido AA sofreu duas condenações pela prática de crime da mesma natureza (abuso de confiança fiscal), mas praticado em data posterior à prática dos presentes autos, sendo a condenação também naturalmente posterior. Os arguidos encontram-se inseridos profissional e socialmente. A diminuir fortemente as exigências de prevenção especial está o hiato temporal volvido desde a data da prática dos factos (...), mais de 10 anos. Das demais circunstâncias referidas no n.°2 do artigo 71.° do Código Penal, reclama o caso concreto a ponderação das seguintes: -O grau de ilicitude é médio-alto considerando o valor das faturas incorporadas e a vantagem fiscal associada. -O dolo com que atuaram, que foi direto, sendo a modalidade mais intensa; -A ausência de antecedentes criminais das arguidas e do arguido à data dos factos, tendo posteriormente sofrido duas condenações pela prática de crime da mesma natureza; -O facto de os arguidos se encontrarem inseridos social e profissionalmente; -O tempo já decorrido desde a prática dos factos; -A circunstância de ter sido efetuado o pagamento integral das quantias devidas após realização das correções; Tudo ponderado, entende-se adequada a fixação das seguintes penas: 1 ano e 6 meses de prisão para a arguida BB; 1 ano e 8 meses de prisão para o arguido AA; 250 dias de multa para a pessoa coletiva. * Quanto ao quantitativo diário da multa aplicada à pessoa coletiva. Nos termos do disposto no artigo 15.°, n.°1, 2.a parte do RGIT, o quantitativo diário oscilará entre € 5,00 e € 5.000,00. Os critérios para a determinação da medida concreta da taxa diária serão os mesmos a que se atende no caso de pessoas singulares, exceto, obviamente, naquela parte em que não sejam aplicáveis às pessoas coletivas, isto é, as condições socioeconómicas do condenado. Considerando que em relação às condições socioeconómicas da sociedade arguida apenas se apurou que continua a laborar, fixa-se a taxa diária em € 5,00, o que perfaz a quantia global de € 1.250,00. * DA SUBSTITUIÇÃO DA PENA DE PRISÃO Considerando que aos arguidos é aplicada uma pena de prisão inferior a 5 anos há que ponderar a suscetibilidade de a mesma ser substituída por penas menos gravosas, o que constitui um verdadeiro poder-dever do juiz e não um poder discricionário (o que resulta da conjugação do disposto nos artigos 45.°, n.°1, 46.°, n.°1, 50.°, n.°1 e 58.°, n.°1 do Código Penal e foi expressamente referido por exemplo no acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 12/07/2017, proferido no processo n.°372/16.5JALRA.C1, disponível em www.dgsi.pt), pois que os mesmos apenas devem ser privados da liberdade se a execução da pena de prisão se revelar indispensável para prevenir o futuro cometimento de crimes. Diga-se, desde logo, que em face dos factos praticados e das elevadas exigências de prevenção geral não se afigura adequada a substituição por multa, trabalho a favor da comunidade ou proibição de funções (artigos 45.°, n.°1, 46.°, n.°1 e 58.°, n.°1 do Código Penal). Configurada como pena de substituição, a suspensão da execução da pena de prisão prevista no artigo 50.° do Código Penal é aplicável quando a pena de prisão concretamente aplicada ao arguido não exceder 5 anos (pressuposto formal) e desde que se possa concluir, em face da personalidade do agente, das suas condições de vida, da sua conduta anterior e posterior ao crime e das circunstâncias deste, que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (pressuposto material). O requisito formal mostra-se preenchido porquanto aos arguidos é aplicada uma pena inferior a 5 anos. Vejamos os requisitos materiais. No caso vertente, apesar das exigências de prevenção geral elevadas e das duas condenações sofridas pelo arguido AA já após a data da prática dos factos, a verdade é que considerando que: - à data dos factos os arguidos não tinham antecedentes criminais e à data de hoje a arguida BB continua a não ter; - não é conhecido o efeito da mera ameaça da pena de prisão na conduta futura dos arguidos; -os arguidos encontram-se inseridos profissionalmente e familiarmente. Assim, em face do que se deixa exposto, entende-se que é ainda possível efetuar um juízo de prognose favorável à reintegração do arguido na sociedade mediante a simples ameaça da prisão. Relativamente ao período da suspensão, entende o tribunal que tal período deve ser idêntico ao das penas aplicadas, sendo este suficiente para assegurar que o arguido interioriza o desvalor da sua conduta e não volta a praticar crimes, desta ou de outra natureza, nos termos do disposto no artigo 50.°, n.°5 do Código Penal. * Dispõe o n.°2 do artigo 50.° que se o tribunal julgar conveniente e adequado à realização das finalidades da punição, subordina a suspensão da execução da pena à observância de deveres, de regras de conduta ou a regime de prova. Determina o artigo 14.°, n.°1 do RGIT que, nos crimes fiscais, a suspensão da execução da pena de prisão aplicada é sempre condicionada ao pagamento, em prazo a fixar até ao limite de cinco anos subsequentes à condenação, da prestação tributária e acréscimos legais, do montante dos benefícios indevidamente obtidos e, caso o juiz o entenda, ao pagamento de quantia até ao limite máximo estabelecido para a pena de multa. Este preceito consagra um regime especial face ao Código Penal ao impor a obrigatoriedade do pagamento da prestação tributária em falta como condição para a suspensão da pena (Neste sentido, veja-se Germano Marques da Silva, Direito Penal Tributário, Universidade Católica Editora, p. 136; Ac. TRG 03.07.2017, proc. 471/12.2IDBRG.G2; Ac. TRP 20.02.2013, proc. 131/08.9IDPRT.P1; Ac. TRL 05.06.2018, proc. 3912/12.5T3SNT.L1-5, todos disponíveis em www.dgsi.pt). E, conforme jurisprudência fixada no AUJ no 8/2012, a suspensão da execução da pena “obrigatoriamente condicionada, de acordo com o artigo 14.°, n.°1, do RGIT, ao pagamento ao Estado da prestação tributária e legais acréscimos, reclama um juízo de prognose de razoabilidade acerca da satisfação dessa condição legal por parte do condenado, tendo em conta a sua concreta situação económica, presente e futura, pelo que a falta desse juízo implica nulidade da sentença por omissão de pronúncia”. Este Acórdão exige, pois, que o Tribunal, de acordo com os factos relativos à condição social e económica do agente, presente e futura, formule um juízo de prognose de razoabilidade acerca da satisfação da condição de pagamento. Porém, na formulação desse juízo não se pode esquecer que a situação económica do condenado pode sempre ser objeto de alteração para melhor, para além de a decisão de revogação da suspensão da pena, por não pagamento, não ser automática, pressupondo sempre um juízo a respeito do caráter culposo ou não dessa falta de pagamento (Neste sentido, Ac. TRP 20.02.2013, proc. 131/08.9IDPRT.P1; Ac. TRL 23.10.2018, proc. 18/10.5PFLRS.L2-5; Ac. TRP 30.04.2018, proc. 7815/15.3T9PRT.P2, todos disponíveis em www.dgsi.pt). No caso concreto resultou provado que o valor apurado na sequência da inspeção, que originou liquidações oficiosas, se encontra totalmente pago, pelo que inexiste qualquer razão para que a suspensão das penas aplicadas fique condicionada ao pagamento de tal quantia. (…)
Aqui chegados impõe-se proceder à apreciação das questões suscitadas pelos arguidos recorrentes o que se fará pela sua ordem de prevalência processual e de molde a exaurir-se sucessivamente o seu conhecimento e, assim, o objeto dos recursos.
Invocam, desde logo, os recorrentes a verificação de nulidades que qualificam como insanáveis e que se reportam concretamente à alegada falta de notificação da sociedade arguida Sociedade arguida do despacho de acusação e da data designada para a repetição de audiência de julgamento e do advogado dos arguidos e sociedade arguida do despacho que designa a data da audiência de julgamento.
Referem os recorrentes neste particular e quanto a cada uma das referidas nulidades invocadas que a sentença proferida pelo Tribunal a quo encontra-se ferida de nulidade insanável, por violação do disposto nos Artigos 61º, nº l, alínea a) e 287º, nº 5, ambos do Código de Processo Penal, e por violação do Artigo 32º da Constituição da República Portuguesa, por omissão de notificação do Despacho de Acusação à Sociedade Arguida, que oportunamente indicou nos autos a morada de notificação da mesma - ... fls. 277v e 280, morada que o Tribunal ignorou remetendo o indicado Despacho de Acusação em ........2018, por via postal com comprovativo de depósito para a morada - ... - cfr. referencia CITIUS ..., de .../.../2018. A ausência de tal notificação acarreta nulidade insanável nos termos do Artigo 119º, alínea c) do CPP, nulidade que afeta todos os actos subsequentes, incluindo a audiência de julgamento e a sentença proferida, que padece de nulidade que a sentença proferida encontra-se ferida de nulidade insanável por falta de notificação da data de repetição de audiência de julgamento à Sociedade Arguida, Sociedade arguida Com efeito, como referido, a morada da Sociedade, indicada pelo seu gerente a fls. 280, foi ignorada, tendo as notificações das datas designadas para audiência de julgamento sido remetidas para morada que não era nem a da sede nem a indicada pelo seu gerente, não podendo a Sociedade Arguida considerar-se notificada. Tendo a Audiência de julgamento tido lugar na sua ausência como veio a ocorrer em ... de ... de 2024, foram violados os Artigos 61º, nº 1, alínea a) e 332º ambos do CPP e o Artigo 32º da CRP, encontra-se ferida de nulidade bem como a sentença proferida e que em ... de ... de 2024 realizou-se a primeira sessão da repetição da audiência de julgamento que tinha ocorrido nos anos de ... a ..., tendo a mesma ocorrido sem a presença dos três Arguidos, por total desconhecimento destes da realização da mesma e sem a presença do mandatário que haviam constituído - Sr. Dr. CC, que não compareceu à mesma por se encontrar impedido por motivo de doença. Em ... o referido mandatário subscreveu dois requerimentos via CITIUS: um justificando a sua falta e outro juntando documento de substabelecimento sem reserva a favor do seu ilustre Colega, Sr. Dr. DD. O Mandatário dos Arguidos nunca foi notificado de nenhum acto no processo: nem do despacho proferido pelo Tribunal a quo em .../.../2024 com a referência CITIUS ..., nem da data designada para continuação de audiência de julgamento, nem da data designada para leitura de sentença, violando o Artigo 113º, nº 10 do CPP, o que determina nulidade da audiência de julgamento e da sentença proferida na sequência da sua realização, por ofensa frontal dos direitos, liberdades e garantias dos Arguidos.
Vejamos, pois, se lhes assiste razão:
Vigora no nosso ordenamento processual penal, no que a nulidades se reporta, o princípio da legalidade com consagração no artigo 118º do Código de Processo Penal e nos termos do qual a violação ou inobservância das disposições da lei do processo só determina a nulidade do ato quando for expressamente cominada na lei.
Os recorrentes invocam que a falta de notificação do despacho de acusação à sociedade arguida é uma nulidade insanável nos termos do artigo 119º al. c) do Código de Processo Penal, porém, a mera leitura do invocado preceito permite excluir tal interpretação, posto, que o que aí se prevê é: «a ausência do arguido ou do seu defensor, nos casos em que a lei exigir a respetiva comparência».
A notificação do despacho de acusação tendo o arguido sido sujeito a Termo de Identidade e Residência, é feita através de via postal simples como decorre da concatenação dos artigos 283º nº6 e 113º nº1 al. c) ambos do Código de Processo Penal (ato que não pressupõe a presença ou comparência do arguido mas apenas o depósito da carta no recetáculo postal correspondente à morada indicada para notificação no Termo de Identidade e Residência).
Da análise do histórico do processo resulta que a sociedade arguida foi sujeita a Termo de Identidade e Residência tendo indicado como morada ... tendo sido informada das obrigações decorrentes de sua sujeição a tal medida de coação. Mais resulta que todas as provas de depósito referentes a notificação da sociedade arguida as cartas foram sempre depositadas na referida morada.
Os recorrentes não questionam a existência do Termo de Identidade e Residência e da morada aí indicada, mas apenas que terá sido indicada uma morada nos autos que foi ignorada pelo tribunal morada essa, naturalmente, distinta da que consta do referido Termo de Identidade e Residência prestado nos autos.
Como já afirmámos no Acórdão que relatamos neste Tribunal da Relação no processo nº1986/21.7T9FNC.L1 proferido em 5 de dezembro de 2024 «A morada para notificação indicada no Termo de Identidade e Residência é uma morada que pode ser escolhida pelo arguido e que não tem de coincidir com o seu domicílio ou residência habitual» entendimento, também, válido no caso de uma sociedade arguida em que tal morada não tem de coincidir com a da sua sede.
A mera referência a outra morada nos autos não consubstancia uma alteração de morada para efeitos de notificação porquanto tal exige uma comunicação que revele, de modo claro e inequívoco, tal vontade e que seja formulada nos autos ou pessoalmente pelo arguido ou por terceiro, mas munido de procuração para tal na secretaria do Tribunal ou remetida aos autos por via postal registada pelo arguido ou por terceiro, mas munido de procuração para tal, estando em causa uma obrigação do arguido e não do Tribunal, pelo que não cabe a este averiguar de alteração de morada não comunicada formalmente nos termos referidos para efeito de notificação.
Com efeito, não se pode olvidar das consequências consagradas no artigo 196º do Código de Processo Penal, mormente, que o incumprimento das obrigações em tal artigo consagradas e onde se inclui a comunicação da outra morada para efeito de notificação legitima a representação do arguido por defensor em todos os atos processuais nos quais tenha o direito ou dever de estar presente bem como a realização da audiência de julgamento na sua ausência nos termos do artigo 333º do Código de Processo Penal.4
Não se constatando a comunicação formal nos termos referidos de outra morada por parte da sociedade arguida até à data em que foi expedida tal notificação que veio a ser depositada na morada indicada no Termo de Identidade e Residência inexiste qualquer vício da sua notificação.
Refira-se, ainda, que mesmo que a notificação da acusação houvesse sido efetuada para uma morada da sociedade arguida diversa daquela que deveria ser processualmente considerada nos autos, jamais se estaria perante qualquer nulidade insanável, pois, que estaria apenas em causa o vício da irregularidade processual nos termos previstos no artigo 123º do Código de Processo Penal.
De facto, não só nesse sentido se tem vindo a pronunciar-se de um modo quase uniforme a jurisprudência como a única divergência assinalada nessa matéria se reporta ao conhecimento oficioso ou não da mesma, isto é, a integrar-se no nº1 ou no nº2 do artigo 123º do Código de Processo Penal.5
Assim, não só não se verifica qualquer vício de falta de notificação do despacho de acusação à sociedade arguida como o mesmo, ainda, que se verificasse nunca redundaria numa nulidade insanável como invocado pelos recorrentes não lhes assistindo, assim, razão.
No que se reporta à alegada falta de notificação da sociedade arguida da data designada para a repetição de audiência de julgamento e do advogado dos arguidos e sociedade arguida do despacho que designa a data da audiência de julgamento, como já se referiu, o artigo 119º al. c) do Código de Processo Penal consagra como nulidade insanável «a ausência do arguido ou do seu defensor, nos casos em que a lei exigir a respetiva comparência».
As nulidades insanáveis são de conhecimento oficioso e podem ser conhecidas em qualquer fase do processo.
Através da imposição de tal nulidade visa-se assegurar o direito de defesa e o direito ao contraditório do arguido, direitos traduzidos na possibilidade deste, assim, intervir no processo, invocar as suas razões de facto e de direito, oferecer provas, controlar e contraditar todas as provas e argumentos jurídicos trazidos ao processo tal como consagrado nas diferentes alíneas do nº1 do artigo 61º do Código de Processo Penal enquanto emanação do artigo 32º da Constituição da República Portuguesa.
No caso vertente e no que se reporta à notificação da sociedade arguida da data designada para a repetição de audiência de julgamento são válidas as razões já aduzidas relativamente à existência de Termo de Identidade e Residência prestado pela sociedade arguida e da ausência de uma comunicação de alteração de morada nos termos exigidos.
Aliás em ata de audiência realizada em 13 de novembro de 2020 foi reiterada a morada para notificação de ....
Por outro lado, não só uma das consequências do incumprimento das obrigações do Termo de Identidade e Residência é a possibilidade da audiência de julgamento ter lugar na ausência do arguido como a notificação de tal despacho é feito no que se reporta aos arguidos (pessoas singulares ou coletivas) na morada aí indicada.
Com efeito, tal decorre da concatenação dos artigos 313º, 196º e 113º todos do Código de Processo Penal.
Assim, tendo a notificação sido expedida para a morada indicada no Termo de Identidade e Residência da sociedade arguida não se verifica a nulidade invocada. Por outro lado, importa referir que os arguidos por si e enquanto representantes da sociedade arguida compareceram em audiência e aí prestaram declarações como decorre das atas referentes aos dias 6 e 23 de novembro e 2 de dezembro de 2024 sendo que a comunicação de morada distinta da anteriormente escolhida e reiterada apenas foi feita nos autos pelos arguidos (como os próprios referem nos recursos) em 30 de outubro, ou seja, em data posterior à sua notificação nas moradas indicadas nos Termos de Identidade e Residência e realização da audiência de 21 de outubro de 2024.
Assim, não se verifica a nulidade invocada.
No que se reporta à falta de notificação do defensor dos arguidos importa salientar que no que tange ao dia 21 de outubro de 2024 os próprios recorrentes referem que o mandatário juntou em 22 de outubro de 2024 aos autos um requerimento justificando a sua ausência por doença, à audiência, o que consubstancia uma evidência que o mesmo estava notificado para tal audiência e não compareceu tal como se exarou na ata respetiva,
De facto da mesma consta neste particular com relevo que: «Quando eram 11 horas e 26 minutos, pela Mmª Juíza de Direito foi declarada aberta a audiência de discussão e julgamento (e não antes em virtude deste Tribunal se encontrar a aguardar pela chegada de todos os intervenientes processuais e a diligenciar pela nomeação de defensor oficioso aos arguidos), não tendo o Ilustre Mandatário dos arguidos, regularmente notificado, comparecido, nem justificado a sua falta à audiência de julgamento, o Ilustre Advogado que se encontrava de escala foi contactado pelo Tribunal, disse estar indisponível para assegurar a diligência, a Mmª Juíza de Direito, ao abrigo da Portaria nº 235-A/2024, de 26 de Setembro, procedeu à nomeação da Dra. II, Ilustre Advogada, para o processo, a qual aceitou. Encontrando-se os três arguidos regularmente notificados, não compareceram, nada informaram o processo, assim como, o Ilustre Mandatário constituído não está presente, não comunicou a sua ausência, foi encetado contacto telefónico por parte do Tribunal, o mesmo não atende o telefone. Dada a palavra à Digna Procuradora da República, pela mesma foi dito que relativamente aos arguidos, apesar de se encontrarem regularmente notificados da audiência de discussão e julgamento, não compareceram, nem justificaram a sua falta, sem prejuízo de ainda o poderem fazer nos termos e prazos do artigo 117.º, nºs 2 e 3 do C.P.P., assim, por considerar que a presença dos três não é necessária desde o início da audiência do julgamento, promovo que se dê início à mesma e à produção de prova na ausência dos arguidos, devendo estes ser condenados em multa processual nos termos do disposto no artigo 116.º, nº 1 e 333, nº 1, ambos do C.P.P. Relativamente à falta do mandatário, que se mostra regularmente notificado, não comunicou a sua ausência, não apresentou qualquer justificação, e mostrou-se incontactável, promovo que se comunique à Ordem dos Advogados. Dada a palavra à Ilustre Defensora nomeada dos arguidos, quanto à promoção da Digna Procuradora da República, nada houve a opor. Após, a Mm.ª Juíza de Direito proferiu o seguinte Despacho: Considerando que os arguidos se e*ncontram regularmente notificados, não compareceram e não justificaram a sua falta, condenam-se os mesmos em multa, que se fixa em 2 UC´s, nos termos do disposto no artigo 116.º, n.º 1 do C.P.P. Por não se entender absolutamente imprescindível a presença dos arguidos desde o início da audiência, determina-se que a mesma tenha início na sua ausência, nos termos do disposto no artigo 333.º, nºs 1 e 2 do C.P.P. Relativamente à ausência do Ilustre Mandatário dos arguidos, proceda conforme promovido, comunicando à Ordem dos Advogados a ausência do Mandatário, bem com a ausência de qualquer justificação da sua falta de comparência. Notifique. Gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, com início em 11:26 e fim em 11:32 horas. *** Após, não havendo exposições introdutórias, passou-se à inquirição das testemunhas indicadas pelo Ministério Público, que se identificaram da seguinte forma: - EE, nascido em ...-...-1974, casado, Inspetor Tributário, com domicílio profissional na .... Questionada a testemunha nos termos do art.º 348º, n.º 3 do C. P. Penal, disse conhecer os arguidos do âmbito das suas funções profissionais, nada a impedindo de dizer a verdade. Prestou juramento legal e o seu depoimento foi gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, com início em 11:32 e fim em 11:57. A testemunha foi confrontada com fls. 79 a 92 dos autos e fls. 277 e seguintes dos autos. - FF, nascida em ...-...-1997, casada, Inspetora Tributária, com domicílio profissional na .... Questionada a testemunha nos termos do art.º 348º, n.º 3 do C. P. Penal, disse conhecer os arguidos do âmbito das suas funções profissionais, nada a impedindo de dizer a verdade. Prestou juramento legal e o seu depoimento foi gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, com início em 11:57 e fim em 12:24. A testemunha foi confrontada com fls. 79 a 92 dos autos e fls. 354 e 355 dos autos. *** Finda a inquirição da testemunha, pela Ilustre Defensora Oficiosa foi requerido nova data para a continuação da audiência de julgamento, sem emissão de mandados de detenção, sendo os arguidos notificados por OPC para a próxima sessão de julgamento. Nada houve a opor. Após, a Mmª Juíza de Direito proferiu o seguinte Despacho: Uma vez que foi requerido pela defesa, será designada nova data para continuação da audiência, para prestação de declarações por parte dos arguidos, nos termos do disposto no artigo 333.º, n.º 3 do C.P.P., designadamente, o dia ... de ... de 2024, pelas 09:20 horas. Mais se determina a notificação pessoal por OPC dos arguidos, assim como, e à cautela, a sua notificação postal. Notifique. Gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, com início em 12:24 e fim em 12:30 horas. *** De seguida foram todos os presentes devidamente notificados do despacho acabado de proferir, do que disseram ficar cientes. *** A audiência terminou pelas 12:30 horas.
Assim, os autos patenteiam que os arguidos estiveram representados por um defensor oficioso na audiência de ... de ... de 2024 porque o seu mandatário não compareceu nem justificou a sua ausência até à data da audiência sendo que como já afirmou os arguidos se encontravam notificados de tal por notificação por via postal simples com prova de depósito nas moradas indicadas nos respetivos Termos de Identidade e Residência, pelo que a audiência podia validamente iniciar-se na sua ausência como ocorreu.
No que se reporta às sessões de audiência de julgamento subsequente as atas revelam que as mesmas ocorreram na presença dos arguidos e com representação por parte da defensora oficiosa nomeada no dia ... de ... de 2024.
Entendem os recorrentes que ocorre nulidade insanável porque fora junto substabelecimento sem reserva aos autos por parte do mandatário dos arguidos no dia ... de ... de 2024, e o advogado em quem tal mandatário substabeleceu nunca foi notificado.
Ora, a tese dos recorrentes pressupõe uma automaticidade de efeitos do substabelecimento, neste caso sem reserva, que não pode colher.
Com efeito e como se consigna no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora6:
«Mas a notificação – não sendo um direito pessoal do advogado - tem que ser feita ao advogado que, no momento próprio, estava constituído nos autos. E se houver alteração de mandatário constituído – designadamente por substabelecimento com ou sem reservas – o novo mandatário não ganha um direito pessoal a ser notificado, de novo, da acusação. Tudo depende, pois, da data da junção do substabelecimento aos autos e dos efeitos jurídicos daí resultantes que, parece-nos, têm sido vistos, erradamente, com efeitos automáticos resultantes da simples junção do substabelecimento. E não é assim, de há muito! É um dado adquirido que a diferença entre o substabelecimento com reserva e o substabelecimento sem reserva reside na circunstância de, no primeiro caso, o advogado que o outorga manter os seus poderes de representação e, no segundo, o advogado constituído, perder os seus iniciais poderes. Desta forma tudo depende de saber em que momento o advogado substabelecido assume, em pleno, os poderes nos autos. Afirma-se no artigo 44º nsº 3 e 4 do Código de Processo Civil que (3) «o substabelecimento sem reserva implica a exclusão do anterior mandatário» e que (4) «a eficácia do mandato depende de aceitação, que pode ser manifestada no próprio instrumento público ou em documento particular, ou resultar de comportamento concludente do mandatário». Logo, não basta a simples junção do substabelecimento para que se considere existente a exclusão do anterior mandatário e a aceitação do novo enquanto não ocorrer um dos três actos indicados pela norma. E acto concludente será a mera junção do substabelecimento pelo substabelecido, ou a sua junção pelo mandatário substabelecente com aceitação do substabelecido no instrumento apresentado.»
Ora, no caso vertente o que consta do substabelecimento sem reserva junto aos autos a 22 de outubro de 2024 e que os recorrentes se reportam é o seguinte: SUBSTABELECIMENTO SEM RESERVA Atendendo à condição médica em que me encontro, não tendo a garantia de reunir as condições de saúde para assegurar o patrocínio nos presentes autos, substabeleço, sem reserva na sociedade de Advogados “...”, com escritório na ..., representada pelo Exmo. Senhor Dr. DD, titular da cédula 10092P e com domicílio profissional na sede da supra citada sociedade, os poderes forenses gerais e especiais que me foram conferidos por AA, BB e Sociedade arguida em procuração junta aos autos de processo comum perante Juiz singular que, com o Nº 1618/15.2IDLSB, correm no Juízo Local Criminal de Torres Vedras - Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte.
E o que se verifica nos autos é a mera junção de tal substabelecimento por parte do mandatário substabelecente inexistindo nos autos qualquer aceitação do mandatário substabelecido nesse instrumento processual ou sequer qualquer comportamento processual concludente deste último nos autos.
Com efeito, não consta que o mesmo tenha consultado os autos, comparecido nas audiências ou subscrito qualquer requerimento em representação dos arguidos sendo que nem as atas evidenciam de algum modo que estes tivessem conhecimento da junção de tal substabelecimento.
Nas atas de audiência de 6 e 23 de novembro e 2 de dezembro de 2024 os arguidos compareceram e foram sempre representados pela defensora oficiosa nomeada sendo que na última consta com relevo: Reaberta a audiência, quando eram 14:12 horas (e não antes porquanto se aguardou a chegada dos arguidos), questionados os arguidos pela Mmª Juíza, confirmaram pretender continuar a ser representados, no âmbito do apoio judiciário, pela Ilustre Defensora, Dra. II, revogando qualquer relação contratual com outro advogado. Gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, com início em 14:15 e fim 14:16. De seguida, a Mmª Juíza procedeu à leitura da sentença, que foi de imediato notificada a todos os presentes, os quais disseram ficar cientes. A audiência terminou pelas 14:30 horas.
Ademais as atas anteriores evidenciam um comportamento processual por parte dos arguidos e ora recorrentes e da defensora oficiosa de plena intervenção e representação desta relativamente àqueles o que apenas podia ocorrer de acordo com a vontade dos mesmos que veio a ser expressamente confirmada na declaração exarada na ata de 2 de dezembro de 2024.
Do teor de tais atas decorre que os arguidos estiveram sempre representados por defensor e exerceram em audiência o seu direito de defesa e contraditório, pelo que em face de todo o exposto impõe-se concluir pela não verificação da nulidade invocada ou de qualquer outro vício processual arguido ou que se impusesse conhecer.
Destarte, improcede quanto a tais segmentos a pretensão recursiva dos arguidos e sociedade arguida.
Prosseguindo na apreciação do objeto dos recursos invocam, os recorrentes, ainda que de forma singela que a decisão recorrida padece de omissão de fundamentação sendo que se afigura que tal invocação se refere à nulidade prevista no artigo 379º nº1 al.a) por via da violação do disposto no artigo 374º nº2 do mesmo diploma legal.
A fundamentação das decisões judiciais tem consagração no artigo 6º nº1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem7 e o artigo 205º nº1 da Constituição da República Portuguesa estipula o seguinte: As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei.
O artigo 97º nº5 do Código de Processo Penal consagra o dever de fundamentação ao consignar que os actos decisórios são sempre fundamentados devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão e relativamente aos requisitos incluindo de fundamentação da sentença e consequências de tal omissão versam os artigos 374º e 379º ambos do Código de Processo Penal.
De facto, o princípio constitucional supra aludido é observado pela lei processual penal, mormente, no artigo 379º nº1 al. a) do Código de Processo Penal que comina com nulidade a sentença que não contiver as menções referidas no nº2 do artigo 374º e na alínea b) do nº3 do artigo 374º do mesmo diploma legal.
O artigo 374º do Código de Processo Penal que versa sobre os requisitos da sentença prevê no seu nº2: “ao relatório segue-se a fundamentação que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa ainda que concisa dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal”.
Como afirma José Tomé de Carvalho8: O dever de fundamentação é uma garantia integrante do próprio conceito de Estado de Direito Democrático, pois permite o controlo da legalidade do ato e serve para convencer os interessados e os cidadãos em geral acerca da sua correção e justiça.
E, ainda, Oliveira Mendes9 a fundamentação «visa, por um lado, a total transparência da decisão, para que os seus destinatários (aqui se incluindo a própria comunidade) possam apreender e compreender claramente os juízos de valoração e de apreciação da prova, bem como a atividade interpretativa da lei e sua aplicação e, por outro lado, possibilitar ao tribunal superior a fiscalização e o controlo da atividade decisória, fiscalização e controlo que se concretizam através do recurso, o que consubstancia, desde a Revisão de 1997, um direito do arguido constitucionalmente consagrado, expressamente incluído nas garantias de defesa - artigo 32º, nº1, da Constituição da República».
O Supremo Tribunal de Justiça concretizou o dever de fundamentação da sentença ao consignar que: a decisão, para além da indicação dos factos provados e não provados e da indicação dos meios de prova, deve conter os elementos que, em razão das regras da experiência ou de critérios lógicos, constituam o substrato racional que conduziu a que a convicção do tribunal se formasse em determinado sentido ou valorasse de determinada forma os diversos meios de prova apresentados na audiência.10
Por conseguinte é através da fundamentação da sentença, na explicitação e exame crítico aí empreendidos que se poderá aferir da objetividade, rigor, consistência, congruência e legitimidade do processo lógico de formação da convicção do julgador e, assim, exercer a possibilidade de controlo de tal decisão, sendo que tal controlo não é arbitrário, exerce-se na medida do necessário e é, naturalmente, respeitador do consignado no artigo 127º do Código de Processo Penal.
Do exposto, decorre que a fundamentação da decisão deve pautar-se por uma lógica de convencimento que viabilize a sua integral compreensão quer pelos seus destinatários quer pelo tribunal de recurso enquanto entidade que procede ao controlo de tal decisão por via do recurso.
No caso vertente, analisada a decisão recorrida não se constata na mesma qualquer omissão que subjaza ao estatuído no nº2 do artigo 374º do Código de Processo Penal.
Com efeito, da decisão recorrida consta a fundamentação traduzida na enumeração dos factos provados e não provados bem como a exposição de motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.
Assim, não ocorre qualquer falta ou omissão de fundamentação que se subsuma a nulidade da decisão recorrida.
Ademais, importa referir que a discordância dos recorrentes relativamente à valoração da prova e seleção da matéria de facto provada e não provada empreendida pelo tribunal recorrido e vertida na decisão não consubstancia falta ou omissão de fundamentação nos termos sobreditos pelo que não merece provimento, neste particular, a pretensão recursória.
Insurgem-se, ainda, os recorrentes por considerarem que a decisão recorrida enferma de erro de julgamento no que se reporta aos factos provados 8, 9, 11 a 16, 17, 20, 21 e 30 e violou os princípios da livre apreciação da prova, da violação do princípio da igualdade de tratamento em processo penal e do in dubio pro reo.
É pacífico que a decisão da matéria de facto em sede de recurso pode ser sindicada quer através dos vícios previstos no artigo 410º nº2 do Código de Processo Penal, a que se convenciona chamar de revista alargada, quer através da designada impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o artigo 412º nº3, 4 e 6, do mesmo diploma.
Refira-se que os vícios consagrados no artigo 410º nº2 do Código de Processo Penal são de conhecimento oficioso pelo que não está o Tribunal de recurso impedido de os detetar e conhecer ainda que o recorrente opte apenas por uma impugnação ampla de matéria de facto como neste caso se verifica.
Ora, prevê o artigo 412º nº3 do Código de Processo Penal que quando impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto o recorrente deve especificar:
a) os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida;
c) as provas que devem ser renovadas.
Impondo o nº4 do preceito em questão a exigência de que “Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na ata, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 364.º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação”.
Neste caso a apreciação a levar a cabo pelo Tribunal da Relação não se restringe ao texto da decisão (como ocorre no caso dos vícios previstos no artigo 410º nº2 do Código de Processo Penal) incidindo sobre o que se pode extrair da prova produzida em audiência.
No que se reporta à especificação dos concretos pontos de facto, o ónus a que aludimos só é cumprido com a indicação do facto individualizado que consta da decisão recorrida e se considera incorretamente julgado11.
Tal ónus de especificação de factos não se basta, assim, com qualquer indicação genérica dos mesmos.
Ademais e no que respeita à especificação das provas concretas, o ónus previsto no art. 412º do Código de Processo Penal só é cumprido se for feita a indicação do conteúdo específico do meio de prova ou de obtenção de prova que impõe decisão diversa da recorrida.
Destarte é, nomeadamente, insuficiente a indicação genérica de um documento, de uma declaração ou de um depoimento, de uma perícia ou de uma interceção telefónica realizada.
De qualquer modo o recorrente tem o ónus de indicar clara e concretamente o que na matéria de facto quer ver modificado, apresentando a sua versão probatória e factual oposta à decisão de facto vertida na decisão que impugna, quais os motivos exatos para tal modificação, em relação a cada facto alternativo que propõe, o que exige que o recorrente apresente o conteúdo específico de cada meio de prova que impõe decisão diversa da recorrida e o correlacione comparativamente com o facto individualizado que considera erradamente julgado.
Ademais e caso esteja em causa meio de prova oralmente produzido em audiência e gravado exige-se a indicação não só do início de termo da gravação, mas a indicação e especificação das concretas passagens que fundam a impugnação tal como resulta do nº4 do artigo 412º do Código de Processo Penal.
As provas que o recorrente indique nos termos sobreditos e a apreciação das mesmas apresentada no recurso devem não só evidenciar que os factos foram incorretamente julgados pelo Tribunal a quo como fundar a convicção de que se impunha uma decisão diversa da proferida na fixação dos factos provados e não provados.
O recorrente tem o ónus de indicar clara e concretamente o que na matéria de facto quer ver modificado, apresentando a sua versão probatória e factual oposta à decisão de facto vertida na decisão que impugna, quais os motivos exatos para tal modificação, em relação a cada facto alternativo que propõe, o que exige que o recorrente apresente o conteúdo específico de cada meio de prova que impõe decisão diversa da recorrida e o correlacione comparativamente com o facto individualizado que considera erradamente julgado.
As provas que o recorrente indique nos termos sobreditos e a apreciação das mesmas apresentada no recurso devem, não só evidenciar que os factos foram incorretamente julgados pelo Tribunal a quo, como fundar a convicção de que se impunha uma decisão diversa da proferida na fixação dos factos provados e não provados.
Não, é, pois, suficiente a demonstração da possibilidade de existir uma seleção em termos de matéria de facto alternativa à da constante da decisão recorrida sendo necessário que o recorrente demonstre que a prova produzida em julgamento só poderia ter conduzido à matéria de facto provada e não provada por si propugnada e não àquela fixada na decisão recorrida.
O recurso sobre a matéria de facto não está configurado no nosso sistema processual penal como um segundo julgamento, mas sim como um mecanismo de correção.
Com efeito e como se refere no AUJ do STJ nº3/2012 de 18 de abril: A reapreciação por esta via não é global, antes sendo um reexame parcelar, restrito aos concretos pontos de facto que o recorrente entende incorrectamente julgados e às concretas razões de discordância, necessário sendo que se especifiquem as provas que imponham decisão diversa da recorrida e não apenas a permitam, não bastando remeter na íntegra para as declarações e depoimentos de algumas testemunhas. O especial/acrescido ónus de alegação/especificação dos concretos pontos de discórdia do recorrente (seja ele arguido, ou assistente), em relação à fixação da facticidade impugnada, bem como das concretas provas, que, em seu entendimento, imporão (iam) uma outra, diversa, solução ao nível da definição do campo temático factual, proposto a subsequente tratamento subsuntivo, justifica-se plenamente, se tivermos em vista que a reapreciação da matéria de facto não é, não pode ser, um segundo, um novo, um outro integral, julgamento da matéria de facto. Pede-se ao tribunal de recurso uma intromissão no julgamento da matéria de facto, um juízo substitutivo do proclamado na 1.ª instância, mas há que ter em atenção que o duplo grau de jurisdição em matéria de facto não visa a repetição do julgamento em segunda instância, não impõe uma avaliação global, não pressupõe uma reapreciação pelo tribunal de recurso do complexo dos elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida e muito menos um novo julgamento da causa, em toda a sua extensão, tal como ocorreu na 1.ª instância, tratando-se de um reexame necessariamente segmentado, não da totalidade da matéria de facto, envolvendo tal reponderação um julgamento/reexame meramente parcelar, de via reduzida, substitutivo.
E como se exara no Acórdão do Tribunal Constitucional, no processo nº 198/04, publicado in DR II Série, de 2 de Junho de 2004, a impugnação da decisão em matéria de facto terá de assentar na violação dos factos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objectivos que se apontam na convicção ou porque se violaram os princípios para a aquisição desses dados objectivos ou porque não houve liberdade na formação da convicção. Doutra forma seria a inversão dos personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar pela de quem espera a decisão.
A modificação da decisão recorrida pelo Tribunal de recurso só poderá ter lugar se, depois de cumprido o ónus de impugnação previsto no citado art. 412º nºs 3, 4 e 6 do CPP, se vier a apurar que a decisão recorrida sobre os precisos factos impugnados em face da prova concretamente produzida no processo, deveria necessariamente ter sido a oposta.
Traduzindo-se o erro de julgamento na inobservância de ditames em matéria probatória quer na vertente da sua validade quer da sua eficácia especial, na violação de princípios como o da livre apreciação da prova e do in dubio pro reo ou na violação das regras da lógica e da experiência comum.
Destarte o que se exige é um erro e não uma mera divergência de convicção e assim “se a decisão de primeira instância se mostrar devidamente fundamentada e couber dentro de uma das possíveis soluções face às regras de experiência comum, é esta que deve prevalecer, mantendo-se intocável e inatacável, pois tal decisão foi proferida de acordo com as imposições previstas na lei [artigos 127º e 374º, nº 2 do Código de Processo Penal], inexistindo assim violação destes preceitos legais12.
Revertendo ao caso concreto os recorrentes indicaram os factos que pretendem impugnar, ou seja, os factos provados 8,9, 11 a 16, 17, 20, 21 e 30 que têm o seguinte teor: 8) Os arguidos AA e BB fizeram integrar na contabilidade da sociedade Sociedade arguida e consequente declaração de rendimentos para efeitos de IRC e declaração periódica de IVA várias faturas emitidas pela sociedade Sociedade BB mas que não tinham subjacente qualquer transação ou prestação de serviços, conforme quadro que se segue: Período - .../12T Valor dos serviços - € 112.042,00 Valor de IVA - € 25.769,66 Valor total faturado - € 137.811,66 9) Na verdade, a sociedade Sociedade BB, no referido ano de ... não tinha capacidade para levar a cabo os serviços alegadamente subjacentes aos valores faturados por falta de estrutura empresarial adequada, nomeadamente de meios humanos, de materiais, de veículos e de instalações que permitissem prestar serviços nos montantes faturados. 11) Ao apresentarem a declaração periódica de IVA do último trimestre de ..., na qual inscreveram o valor do IVA liquidado nas faturas emitidas pela sociedade Sociedade BB, os arguidos AA e BB conseguiram obter para a sociedade Sociedade arguida uma vantagem patrimonial indevida no valor de € 25.769,66 (vinte e cinco mil setecentos e sessenta e nove euros e sessenta e seis cêntimos) correspondente ao imposto indevidamente deduzido neste período. 12)Acresce que os arguidos AA e BB, em sede de declarações de IRC da sociedade Sociedade arguida para o ano de ... contabilizaram também como custos a totalidade dos valores mencionados nas faturas emitidas pela sociedade Sociedade BB 13) Ora, como esses custos não existiram realmente, o lucro tributável declarado pela sociedade Sociedade arguida no referido ano de ... foi inferior ao real e implicou a não cobrança de IRC pelo Estado - Administração Fiscal no valor correspondente à diferença entre o lucro tributável real e o declarado, conforme quadro que se segue: Período - ... Custos indevidamente declarados - € 112.042,00 Taxa de IRC - 25% IRC por cobrar - € 28.010,50 14) Ao fazerem constar as faturas emitidas pela sociedade Sociedade BB da contabilidade da sociedade Sociedade arguida e consequente declaração de rendimentos (para efeitos de IRC) e declaração periódica de IVA, os arguidos AA e BB atuaram com o propósito concretizado de obterem benefícios patrimoniais indevidos para a sociedade que representavam no valor de € 25.769,66 (vinte e cinco mil setecentos e sessenta e nove euros e sessenta e seis cêntimos) a título de IVA e de € 28.010,50 (vinte e oito mil e dez euros e cinquenta cêntimos) a título de IRC, à custa da defraudação do .... 15) Defraudaram, assim, o Estado nos aludidos montantes ao fazer crer aos respetivos Serviços da Administração Fiscal que a declaração periódica de IVA referente ao último trimestre de ... e a declaração anual de IRC referentes ao ano de ... se baseavam em documentos que titulavam verdadeiras transações, induzindo-o em erro quanto à sua autenticidade, com o que conseguiram que o mesmo visse o seu património prejudicado nos montantes acima indicados e dos quais a sociedade que representavam se apoderou, embora soubessem que não lhe pertenciam. 16) Os arguidos agiram de forma concertada, deliberada, livre e consciente, com o propósito concretizado de obterem para a sociedade Sociedade arguida uma vantagem patrimonial indevida à custa da diminuição das receitas fiscais, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punível por lei. 17) À data de hoje, os impostos com as correções efetuadas após a ação inspetiva encontram-se totalmente pagos. 20) O arguido AA foi condenado no âmbito do processo n.°462/18.0... por sentença de .../.../2020, transitada em julgado em .../.../2020, pela prática, em ..., de um crime de abuso de confiança fiscal, na pena de 120 dias de multa à taxa diária de € 4,00, o que perfaz a quantia global de € 480,00. Pena extinta em .../.../2020. 21) Foi ainda condenado no âmbito do processo n.°299/20.6... por sentença de .../.../2022, transitada em julgado em .../.../2022, pela prática, em .../.../2020, de um crime de abuso de confiança fiscal, na pena de 100 dias de multa à taxa diária de € 4,00, o que perfaz a quantia global de € 400,00. Pena extinta em .../.../2023. 30)A sociedade continua a laborar, embora não se encontre registo de prestação de contas desde o ano de ....
Analisadas as conclusões do seu recurso conclui-se que os recorrentes se baseiam na prova documental recolhida com particular ênfase na respeitante à ação inspetiva à Sociedade BB e não compreendem que o ónus que sobre os mesmos impende em sede de impugnação da matéria de facto não se preenche com interpretação localizada e valorativa de determinados meios de prova sendo que também não é suficiente a indicação do início e termo de declarações, ou mesmo de um excerto isolado das mesmas.
Por outro lado, também, não é sequer lícito o apelo a prova não produzida em audiência como no caso da certidão permanente junta aos autos por funcionário judicial (sem qualquer despacho prévio nesse sentido do juiz) em ... de ... de 2024 e já após o termo da produção de prova sendo certo que tal certidão não foi considerada pelo tribunal como se constata da fundamentação da decisão que se refere a certidão permanente de fls. 4 a 10 dos autos.
Destarte o facto provado 30 foi selecionado tendo por base a prova produzida em audiência não se verificando erro ao contrário do invocado.
Para além disso, exige-se que o recorrente correlacione as provas com os factos e fundamente a existência de erro, demonstre que o raciocínio empreendido pelo tribunal recorrido foi erradamente formado, que se impunha decisão diversa da do tribunal recorrido relativamente a tais factos.
Ora, nada disso se verifica, sendo até incompreensível a impugnação dos factos provados 17, 20 e 21, porquanto o primeiro se refere ao pagamento dos impostos, facto que os recorrentes não contestam e os demais ao teor do Certificado de Registo Criminal do recorrente AA, factos cujo alegado erro não é esclarecido pelos recorrentes e manifestamente improcedente em face do teor do Certificado de Registo Criminal respetivo.
Os demais factos provados impugnados pelos recorrentes resultam da prova produzida em audiência e a credibilidade atribuída a declarações e depoimentos é uma questão de convicção e o que releva é o que exercício plasmado na decisão recorrida de tal convicção fundado na imediação e oralidade dos que prestam declarações e depoimentos perante o julgador da 1ª instância não ofenda patentemente as regras da experiência comum, que seja racional tendo por base tais declarações e depoimentos na congruência ou no confronto entre si e conjugados com os demais elementos probatórios recolhidos e produzidos sejam eles prova direta ou indireta.
Como se exara no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra 13 :
“I- O único limite que o princípio da livre apreciação da prova impõe à discricionariedade de apreciação da prova oral por parte do julgador resulta das regras da experiência comum e da lógica supostas pela ordem jurídica. II - A livre apreciação da prova oral é indissociável da oralidade com que decorre o julgamento em primeira instância, porque é a 1ª instância que vê e ouve a arguida e testemunhas, que aprecia os seus gestos, hesitações, espontaneidade ou a falta dela, em suma, os seus comportamentos não verbais, é a 1ª instância que formula as perguntas que entende pertinentes, que encaminha o interrogatório e/ou a inquirição da forma que considera ser a mais conveniente, tudo faculdades de que o tribunal da relação não pode lançar mão e que impõem severas limitações à reapreciação da prova.
Ora, o exercício a que supra se aludiu foi levado a cabo pelo tribunal a quo como evidencia a decisão recorrida na parte referente à motivação da decisão de facto.
Com efeito, o tribunal a quo explicou por referência às razões de ciência, ao grau de verosimilhança, ao conteúdo e consistência intrínseca das declarações e depoimentos, explicando porque atribuiu mais credibilidade a determinadas versões em detrimento de outras.
Resulta, também, claro da análise da motivação da decisão da matéria de facto que para o tribunal a quo a imagem global dos factos resultou da correlação e conjugação entre vários elementos de prova e não numa análise fragmentada e descontextualizada dos mesmos.
O que ocorre não é um erro de julgamento, mas uma divergência dos recorrentes relativamente à apreciação da prova empreendida pelo tribunal recorrido sendo que distinta valoração não é sinónimo que se impunha decisão diversa relativamente à matéria de facto.
Os recorrentes entendem que as faturas se referem a serviços prestados e centram a sua análise na ação inspetiva realizada à Sociedade BB e numa argumentação sobre omissões nas faturas de elementos que não eram exigidos e sobre uma alegação e que as mesmas se reportam a serviços de transporte de revistas e livros em regime de consignação, de e para o Luxemburgo, existindo documentação nos autos bastante que as suporta mas olvidando que em audiência os arguidos que optaram por prestar declarações não lograram esclarecer detalhes elementares da relação contratual estabelecida com a referida sociedade cuja efetiva atividade comercial (existência de uma estrutura empresarial idónea a suportar a prestação de serviços declarada nas faturas) não se provou como é evidenciado na motivação da decisão recorrida e assim conferir credibilidade à sua alegação de veracidade de tais faturas.
Ademais para além da argumentação expendida na decisão recorrida que aqui se acolhe importa salientar que as faturas constantes dos autos são todas preenchidas à mão contendo menções genéricas como “transporte de livros com entregas e recolhas de paletes com vários locais” ou “carga de Luxemburgo para Portugal” sempre pagas em numerário e com valores muito similares de €4070,00 ou €3980,00.
Como se exara no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 16 de março de 200514: “O “exame crítico” das provas constitui uma noção com dimensão normativa, com saliente projeção no campo que pretende regular – a fundamentação em matéria de facto –, mas cuja densificação e integração faz apelo a uma complexidade de elementos que se retiram, não da interpretação de princípios jurídicos ou de normas legais, mas da realidade das coisas, da mundividência dos homens e das regras da experiência; a noção de “exame crítico” apresenta-se, nesta perspetiva fundamental, como categoria complexa, em que são salientes espaços prudenciais fora do âmbito de apreciação próprio das questões de direito. (…) O exame crítico consiste na enunciação das razões de ciência reveladas ou extraídas das provas administradas, a razão de determinada opção relevante por um ou outro dos meios de prova, os motivos de credibilidade dos depoimentos, o valor de documentos e exames, que o tribunal privilegiou na formação da convicção, em ordem a que os destinatários (e um homem médio suposto pela ordem jurídica, exterior ao processo, com a experiência razoável da vida e das coisas) fiquem cientes da lógica do raciocínio seguido pelo tribunal e das razões da sua convicção».
O exercício crítico e explicativo da convicção do tribunal a quo é lógico, assenta em critérios de senso comum e funda-se nos princípios da imediação, da oralidade e do contraditório que são característicos da audiência, revelando absoluto respeito do princípio de livre apreciação da prova previsto no artigo 127º do Código de Processo Penal, ao contrário do invocado pelos recorrentes.
Acresce que a presunção judicial é admissível em processo penal. Com efeito e como se refere no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 9 de maio de 201215:
“1.- A presunção judicial é admissível em processo penal e traduz-se em o tribunal, partindo de um facto certo, inferir, por dedução lógica, um facto desconhecido. 2.- As presunções de facto - judiciais, naturais ou hominis – fundam-se nas regras da experiência comum. 3.- Para a valoração de tal meio de prova devem exigir-se, os seguintes requisitos: - pluralidade de factos-base ou indícios; - precisão de tais indícios estejam acreditados por prova de carácter direto; - que sejam periféricos do facto a provar ou interrelacionados com esse facto; - racionalidade da inferência; - expressão, na motivação do tribunal de instância, de como se chegou à inferência.”
Esclarecendo-se, ainda, no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 3 de fevereiro de 201616: “I - O art. 127º CPP admite a prova indireta, ao estabelecer que a prova é apreciada segundo a livre convicção e as regras da experiência, pois são estas que permitem extrair dos factos diretamente percecionados e conhecidos, chegando por essa via ao conhecimento de outros factos com o necessário grau de certeza. II - Para a valoração da prova indireta importa que ocorram uma pluralidade de elementos, que esses elementos sejam concordantes e esses indícios afastem para além de toda a dúvida razoável a possibilidade dos factos se terem passado de modo diverso daquele para que apontam aqueles indícios probatórios.”
No caso vertente não se deteta a existência de prova que imponha decisão diversa da contida na matéria de facto.
A argumentação expendida não é idónea a produzir qualquer alteração dos impugnados pontos da matéria de facto provada.
O exercício explicativo da convicção do tribunal a quo assenta em critérios de senso comum, assenta nos princípios da imediação, da oralidade e do contraditório que são característicos da audiência e terá assim de prevalecer tal convicção em detrimento da divergente convicção dos recorrentes.
Ademais também não se deteta qualquer violação do princípio do in dubio pro reo que os recorrentes invocam sem concretização cabal.
No que a este princípio respeita importa salientar que o mesmo tem aplicação em todas as fases do processo e, assim, quer no âmbito da apreciação da prova na 1ª Instância quer no momento da sua reapreciação pelo Tribunal de Recurso.
Mas, no caso vertente não se vislumbra motivo para apelar a tal princípio nem para que o tribunal recorrido o fizesse.
Desde logo na explanação empreendida na sobredita motivação da decisão de facto não se deteta qualquer estado de dúvida idónea a convocar aplicação do aludido princípio, mas sim uma convicção segura assente na prova aí indicada e criticamente examinada e sopesada.
Ademais nesta sede também não se considera existir justificação para o aplicar sendo certo que o mesmo não ocorre apenas porque os recorrentes negam a prática do crime.
Com efeito, o princípio in dubio pro reo é, antes, uma imposição dirigida ao juiz, no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao arguido, quando não houver certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa, o que manifestamente não se verifica neste caso.
Alegam, ainda, os recorrentes sem qualquer concretização a violação do princípio da igualdade de tratamento em processo penal.
Tal princípio comumente apelidado de princípio de igualdade de armas pressupõe que todos os sujeitos processuais se encontrem em paridade de condições, que tenham direitos processuais idênticos e estejam sujeitos também a deveres, ónus e cominações idênticas sempre que a sua posição no processo seja equiparável.
Ora, os recorrentes não concretizam em que se traduziu a violação de tal princípio, mas importa salientar que a igualdade de armas só pode ser entendida “quando lançada no contexto mais amplo da estrutura lógico-material global da acusação e da defesa e da sua dialéctica. O que quer dizer que uma concreta conformação processual só poderá ser recusada, como violadora daquele princípio da igualdade, quando dever considerar-se infundamentada, desrazoável ou arbitrária, como ainda quando possa reputar-se substancialmente discriminatória à luz das finalidades do processo penal, do programa político-criminal que aquele está assinado ou dos referentes axiológicos que o comandam”17 e no caso concreto nada disso se constata.
O duplo grau de jurisdição em recurso de matéria de facto não tem a virtualidade de abalar o princípio da livre apreciação da prova que está conferido ao julgador de 1ª instância e que aqui não foi infringido podendo o tribunal ad quem, na reapreciação das provas produzidas em audiência de julgamento modificar tal matéria de facto apenas nos casos em que a decisão recorrida não colhe manifestamente apoio nos elementos de prova que o processo comporta e revela erro o que não se verifica neste caso.
Inexiste fundamento para qualquer alteração à matéria de facto provada nos termos propugnados pelo recorrente nem se verifica qualquer infração dos invocados princípios pelo que não merece censura nesse particular a decisão recorrida.
Estabilizada a matéria de facto mercê da improcedência da sua impugnação impõe proceder à apreciação da última questão suscitada pelos recorrentes que se refere à invocação de prescrição do procedimento criminal.
E para tanto referem: considera-se que o procedimento criminal se encontra prescrito ao abrigo do disposto no artigo 21º, nº 1 do RGIT. Assentando a condenação do Tribunal a quo na prática de ilícito de fraude qualificada por utilização de faturas falsas que, na sua interpretação, não corresponderam a serviços efetivamente prestados, encontrando-se a última das mesmas datada de ... de ... de 2011 - cfr. fls. 205 e tendo sido entregue a última declaração fiscal referente às mesmas em ... de ... de 2012, quer se defenda que o crime se considera praticado na data da emissão das faturas, quer se considere praticado na data da entrega da declaração fiscal, em ambas as hipóteses, o procedimento criminal estaria prescrito, em ... de ... de 2024 ou em ... de ... de 2024, por efeito do disposto no nº2 do Artigo 120º do Código Penal, uma vez que o processo se mostrou suspenso entre ... de ... de 2021 e ... de ... de 2024.
No que se reporta a esta questão é relevante esclarecer que o dissenso mencionado pelos recorrentes foi recentemente resolvido pelo Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça nº5/2025 de 12 de maio ao esclarecer que: O prazo de prescrição do procedimento pelo crime de fraude fiscal qualificada previsto e punido no artigo 104º nº2 al.a) do RGIT com utilização de facturas fraudulentas (as designadas “facturas falsas”) inicia-se no momento da entrega da correspondente declaração à administração fiscal.
Como resulta da argumentação dos recorrentes supratranscrita os mesmos alegam que o procedimento criminal se encontra prescrito ao abrigo do disposto no artigo 21º nº1 do RGIT.
Refere o citado preceito que o procedimento criminal por crime tributário extingue-se por efeito de prescrição logo que sobre a sua prática sejam decorridos cinco anos.
Todavia, os recorrentes olvidam que o nº2 do indicado preceito prevê que o disposto no número anterior não prejudica os prazos de prescrição estabelecidos no Código penal quando o limite máximo da pena de prisão for igual ou superior a cinco anos.
E, ainda, que o nº4 do indicado normativo estabelece que o prazo de prescrição interrompe-se e suspende-se nos termos estabelecidos no Código Penal mas a suspensão da prescrição verifica-se também por efeito da suspensão do processo nos termos previstos no nº2 do artigo 42º e no artigo 47º.
O crime em causa é um crime de fraude qualificada, previsto e punido pelos artigos 103.°, n.°1, alínea c), e 104.°, n.°s 1 e 2 do Regime Geral das Infrações Tributárias, aprovado pela Lei n.°15/2001, de 05/06, na sua redação originária punido com pena de prisão de 1 a 5 anos para as pessoas singulares e multa de 240 a 1200 dias para as pessoas colectivas.
Por força do disposto no artigo 118 nº1 al.b) do Código Penal aplicável ex vi do artigo 21º nº2 e nº4 do Regime Geral das Infrações Tributárias o prazo de prescrição é de 10 anos. No entanto há que ponderar que tal prazo se interrompe e suspende nos termos previstos nos artigos 120º e 121º ambos do Código Penal.
A contagem de tal prazo iniciou-se no momento da entrega da declaração à administração fiscal que ocorreu em ... de ... de 2012. E, desde então, verificaram-se nos autos causas de interrupção (constituição de arguidos) e suspensão de tal prazo (notificação da acusação e ainda a notificação da sentença condenatória aos arguidos que mercê da interposição dos recursos sob apreciação ainda não transitou) sendo que também não decorreu o prazo máximo previsto no artigo 121º nº3 do Código Penal que prevê o prazo normal da prescrição (dez anos) acrescido de metade (cinco anos) mas com ressalva do tempo de suspensão, pelo que o procedimento criminal não se encontra prescrito.
Destarte improcede na íntegra a pretensão recursória dos recorrentes.
3- DECISÓRIO:
Nestes termos e, em face do exposto, acordam os Juízes Desembargadores desta 3ª Secção em não conceder provimento aos recursos interpostos por AA, BB e Sociedade arguida
Custas da responsabilidade de cada um dos arguidos e sociedade arguida recorrentes, fixando-se em 4 UC a taxa de justiça (art. 513º do Cód. de Processo Penal e 8º nº9 do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III anexa a este último).
Notifique.
*
Nos termos do disposto no artigo 94º, nº 2, do Código do Processo Penal exara-se que o presente Acórdão foi pela 1ª signatária elaborado em processador de texto informático, tendo sido integralmente revisto pelos signatários e sendo as suas assinaturas bem como a data certificadas supra.
*
Tribunal da Relação de Lisboa, 18 de junho de 2025
Ana Rita Loja
João Bártolo
Hermengarda do Valle-Frias
_______________________________________________________
1. vide Acórdão do Plenário das Secções do Supremo Tribunal de Justiça de 19/10/1995, D.R. I–A Série, de 28/12/1995.
2. – Artigos 403º, 412º e 417º do Código de Processo Penal e, entre outros, Acórdãos do S.T.J. de 29/01/2015 proferido no processo 91/14.7YFLSB.S1 e de 30/06/2016 proferido no processo 370/13.0PEVFX.L1. S1
3. Curso de Processo Penal, Vol. III, 2ª edição, 2000, fls. 335
4. Vide artigo 196º nº3 al.c) e nº5 al.c) do Código de Processo Penal e ainda no mesmo sentido do afirmado os Acórdãos citados pelo Ministério Público na sua resposta : Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 11.10.2022, proc. n.º 80/19.5PAABT.E1, relatora Beatriz Marques Borges; Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 19.06.2024, proc. n.º 562/22.1GAVGS-A.P1, relator Paulo Costa e Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 08.06.2022, proc. n.º 383/16.0GBOAZ.P1, relator Pedro Vaz Pato, disponíveis em www.dgsi.pt.
5. Vide entre outros os Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa proferidos respetivamente em 26 de fevereiro de 2013 e 23 de fevereiro de 2023 nos processos 406/10.7 GALNH.A.L1.5 e 1837/11.0GACSC.L2.9, do Tribunal da Relação de Évora de 5 de abril de 2022 proferido no processo nº304/20.6JAFAR.IE.2 e do Tribunal da Relação do Porto de 11 de abril de 2018 proferido no processo 96/17.6SGPRT.P1 todos acessíveis em www.dgsi.pt
6. De 5 de abril de 2022, proferido no processo 304/20.6JAFAR.I E 2 e já anteriormente citado na nota de rodapé anterior.
7. Onde se exara nomeadamente que «Qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei, o qual decidirá, quer sobre a determinação dos seus direitos e obrigações de carácter civil, quer sobre o fundamento de qualquer acusação em matéria penal dirigida contra ela.».
8. Breves Palavras sobre a Fundamentação da Matéria de Facto no âmbito da Decisão Final Penal no Ordenamento Jurídico Português- JULGAR nº21-2013
9. Código de Processo Penal Comentado”, 5ª edição, pág. 1168
10. Ac. Supremo Tribunal de justiça de 13/10/1992- Coletânea de Jurisprudência XVII. Página 13
11. Vide Paulo Pinto de Albuquerque in Comentário do Código de Processo Penal, 4ª. ed., 2009, nota 7 ao art. 412º., pág. 1144.
12. Vide Ac. da Relação de Lisboa de 02.11.2021, proc. 477/20.8PDAMD.L1-5.
13. De 22 de fevereiro de 2023 proferido no processo 446/19.0T9CTB e acedido em www.dgsi.pt
14. Proferido no processo 05P662 e acedido em www.dgsi.pt
15. Proferido no processo nº347/10.8PATNV.C1 e acedido em www.dgsi.pt
16. Proferido no processo 482/10.2SJPRT.P1 e acedido em www.dgsi.pt
17. Vide Figueiredo Dias, "Sobre os sujeitos processuais no Novo Código de Processo Penal", Jornadas de Processo Penal, 1988, pág. 30.