EMBARGOS DE EXECUTADO
MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA
FACTO EXTINTIVO OU MODIFICATIVO DA OBRIGAÇÃO EXEQUENDA
PROVA POR DOCUMENTO
Sumário

SUMÁRIO ( da responsabilidade da Relatora )
I - No âmbito dos presentes embargos de executado a embargante não visa operar a compensação do seu crédito de 122 854,00 euros com o crédito da exequente obter a entrega do imóvel identificado nos autos , que aliás nunca seria legalmente admissível porquanto as obrigações em causa não têm por objecto coisas fungíveis da mesma espécie e qualidade , conforme exigido pelo artigo 847º , nº 1 , b) , do C. Civil.
II - Uma vez que a Recorrente não fundou a sua oposição na invocação do direito a benfeitorias mas antes na titularidade de um direito de crédito sobre a Exequente , emergente de enriquecimento sem causa e garantido por direito de retenção , mostra-se pertinente a previsão da alínea g) do artigo 729º do C.P.C..
III - A alínea g) do artigo 729º do C.P.C. exige cumulativamente que o facto extintivo ou modificativo da obrigação exequenda seja posterior ao encerramento da discussão no processo declarativo e que se prove por documento, excepto no caso de prescrição.
IV - A Recorrente olvida por completo o segundo requisito previsto na alínea g) do artigo 729º do C.P.C. , a prova por documento do crédito decorrente do enriquecimento sem causa que invoca deter sobre a Exequente , e deste modo não se mostra preenchida a previsão da referida norma.
V - O crédito em que a Recorrente funda o direito de retenção que invoca não resulta de despesas feitas por causa da coisa , nem decorre de danos por esta causados , e como tal esse crédito não goza do invocado direito de retenção.

Texto Integral

Acordam  os Juízes da 8ª Secção Cível  do Tribunal da Relação de Lisboa:

I – RELATÓRIO
           
Investimentos Turísticos da Praia da Formosa, S.A. , identificada nos autos , instaurou execução para entrega de coisa certa contra Festim de Sugestões, Unipessoal, Lda. e O. , também identificadas nos autos , dando à execução a sentença proferida no âmbito do processo nº 1899/17.7T8FNC ( Juízo Central Cível do Funchal, Juíz 2 ) ,com o seguinte dispositivo :
- “ condena-se as rés a reconhecerem o direito de propriedade da autora sobre o prédio rústico, situado na Praia Formosa, com 52.450m2 (cinquenta e quatro mil quatrocentos e cinquenta metros quadrados) descrito na Conservatória do Registo Predial do Funchal sob o n.º **** da freguesia de S. Martinho e inscrito na respectiva matriz predial rústica sob o artigo …, secção …, desocupando as parcelas daquele terreno onde exploram os respetivos estabelecimentos comerciais, restituindo-as à autora, livres de pessoas e bens.”
A executada O.  deduziu oposição à execução, mediante embargos, requerendo :
- “ Devem os presentes Embargos ser admitidos para todos os efeitos, e, a final, serem os mesmos julgados procedentes por provados, reconhecendo-se o direito de retenção da ora Oponente sobre o respectivo estabelecimento, denominado “B. A.”, sito na P. F. , Funchal, para garantia do crédito correspondente ao respectivo valor, constituído sobre a Exequente, a título de enriquecimento sem causa, em consequência da Sentença exequenda, no montante de € 122.845,00. “
Para tanto alegou, em síntese, que não sendo a Exequente proprietária do estabelecimento da Oponente mas tão só do solo sobre o qual o mesmo foi edificado por via da entrega do solo a seu favor a mesma vê-se beneficiada com tal estabelecimento , a que corresponde o valor de 122 854,00 euros, e como tal a Executada detém sobre a Exequente um direito de crédito nesse valor , a título de enriquecimento sem causa , direito de crédito esse que goza do direito de retenção que aqui invoca expressamente .
Foi proferida decisão de indeferimento liminar dos embargos de executado , na qual se lê :
“ Este preceito é aplicável à execução para entrega de coisa certa, por força do disposto no artigo 860.º do CPC.
Os embargos de executado ancoram na alínea h do artigo 729.º, ou seja, na compensação de créditos.
O artigo 847.º n. º1 do CC dispõe: «Quando duas pessoas sejam reciprocamente credor e devedor, qualquer delas pode livrar-se da sua obrigação por meio de compensação com a obrigação do seu credor, verificados os seguintes requisitos: a) Ser o seu crédito exigível judicialmente e não proceder contra ele excepção, peremptória ou dilatória, de direito material; b) Terem as duas obrigações por objecto coisas fungíveis da mesma espécie e quantidade.»
Ao fazer depender a compensação da existência de contra-crédito judicialmente exigível, o legislador quis afastar os casos de mera probabilidade do direito invocado.
A este propósito, Virgínio Ribeiro e Sérgio Rebelo1 sustentam: «Se tivermos em atenção o regime substantivo da compensação de créditos previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 847.º do CC, impondo, desde logo, que o contra crédito seja exigível judicialmente, somos levados à conclusão de que o contra crédito para ser reclamado em oposição à execução deverá constar de documento com força executiva própria (vide n.º 5 do artigo 10.º), não sendo admissível a utilização dos embargos de executado para a sua verificação [sic].»
Os embargos de executado visam permitir ao executado/devedor contestar o direito exercido pelo exequente/credor, estando afastada a possibilidade de serem exercidos direitos que extravasem tal finalidade.
A reconvenção é igualmente incompatível com a função processual dos embargos de executado.
O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14/03/20132 é bastante claro quanto a esta matéria: «A declaração de compensação é um negócio jurídico unilateral que reveste a natureza de um direito potestativo extintivo, tem lugar quando o devedor que seja credor do seu próprio credor se libere da dívida à custa do seu crédito. No âmbito da oposição à execução (i) só pode ser invocada a título de excepção peremptória – e não de reconvenção, por esta ser inadmissível em processo executivo – e (ii) só pode ser compensado por outro que também já tenha força executiva, ou seja, que seja judicialmente exigível, pois o processo executivo não comporta a definição do contra crédito.»
No mesmo sentido, veja-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 02/06/20153: «I - Para efeitos de compensação, um crédito só se torna exigível quando está reconhecido judicialmente, admitindo-se que este reconhecimento possa ocorrer em simultâneo, mas apenas na fase declarativa do litígio, contrapondo o R. o seu crédito, como forma de operar a compensação. II - Pressuposta a não aceitação da existência do crédito compensante pelo credor principal, a admissibilidade da compensação visada pelo titular do crédito compensante encontra-se condicionada, no processo executivo, ao prévio reconhecimento judicial da existência deste último crédito. III - Entendimento contrário ao acolhido em II pode, mesmo, consubstanciar concessão de privilégio ao executado (e inerente violação do princípio da igualdade das partes), estimulando-o ao uso de meros expedientes dilatórios, em cotejo com o exequente a quem é exigido o “salvo-conduto” dum título executivo corporizador e meio de prova da existência, titularidade e objecto da obrigação para poder ingressar nas portas da acção executiva, na sugestiva imagem usada pelo Prof. Antunes Varela (RLJ - 121º/148).»
Pela pertinência da argumentação expendida, refira-se ainda o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04/07/20194: «A significância da expressão judicialmente admissível não passa por uma mera eventualidade e/ou possibilidade de o titular do pretenso crédito poder ou não suscitar a intervenção do Tribunal para efectivar a sua pretensão, implicando, antes, que tal pretensão já se mostre devidamente efectivada e o crédito efectivamente reconhecido.»
No caso vertente, não estando reconhecido o crédito invocado nem podendo ser analisado o direito de retenção, que daquele depende, impõe-se indeferir liminarmente os embargos de executado.
Ainda que assim não se entendesse, e não olvidamos existir tese distinta na jurisprudência, espelhada no acórdão do TRL de 20/06/20235, a nossa decisão não se alteraria, dado que a embargante podia ter invocado o crédito em sede de contestação/reconvenção na acção declarativa [artigo 266.º n.º 2 c) do CPC], mas não o fez (cf. sentença exequenda) – o que, à luz do referido acórdão, sempre impediria a dedução dos embargos de executado com base na compensação.
O artigo 266.º n.º 2 c) do CPC é cristalino: «A reconvenção é admissível […] quando o réu pretende o reconhecimento de um crédito, seja para obter a compensação seja para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado excede o do autor.»
Na acção declarativa, a embargante invocou a acessão imobiliária industrial, mas nada a impedia deduzir, subsidiariamente, pedido reconvencional ancorado no enriquecimento sem causa, até porque a situação de facto não se alterou.
A nosso ver, não colhe a ideia de que o crédito (indemnização/restituição fundada no enriquecimento sem causa, nos termos do artigo 473.º do CC) só nasceu com a sentença.
O que releva é a factualidade subjacente ao direito e não a data da sentença proferida na acção declarativa.
Por outras palavras, o reconhecimento do direito da autora/exequente na sentença exequenda não constitui facto superveniente para este fim, porque a embargante já sabia dessa possibilidade quando contestou.
Em síntese, seja qual for a tese seguida, os embargos de executado devem ser liminarmente indeferidos: porque o crédito invocado não consta de documento com força executiva ou, seguindo-se outra tese, porque a embargante podia ter invocar a compensação na acção declarativa e não o fez
Quanto ao incidente de caução, deduzido nos termos do artigo 704.º n.º 5 do CPC, por a sentença exequenda ainda não ter transitado em julgado, a executada foi convidada, nos autos principais, a apresentar o mesmo autonomamente e por apenso (artigos 906.º e 915.º do CPC), pelo que deverá aguardar-se em conformidade.
*
Pelo exposto, indefiro liminarmente os embargos de executado deduzidos por O. . “
            Inconformada com esta decisão a Embargante veio interpor recurso , apresentando as seguintes conclusões , que se transcrevem:
A manifesta improcedência dos embargos de executado, justificativa do seu indeferimento liminar, nos termos do disposto no art.° 7282 alínea c) do CPC, apenas tem cabimento nos casos de evidente inutilidade de qualquer instrução ou discussão posterior (cfr. Ac. do TRG, de 23/11/2023, proc. n° 133/22.2T8VNF-B.G1).

Assim não acontece quando, como é o caso, o entendimento que fundamenta o indeferimento liminar resulta de jurisprudência que não é pacífica nem se mostra uniformizada, bem pelo contrário.

Ao arrepio da douta Sentença recorrida, a exigibilidade judicial referida na al. h) do art. 7292 não significa a necessidade de um prévio reconhecimento judicial, mas apenas que esse crédito esteja em condições de ser judicialmente reconhecido nos termos do art. 8172, do Cód. Civil, isto é, por acção de cumprimento e execução (cfr. douto Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 12/12/2023, proferido no processo n2. 3255/18.0T8VNG-B.P1.S1).

Por outro lado, o direito de crédito invocado, por enriquecimento sem causa, só se constituiu precisamente em função do decidido pela Sentença exequenda, ordenando a entrega de um imóvel rústico a favor da Exequente, sobre o qual se encontra o estabelecimento da Embargante — estabelecimento cuja propriedade daquela foi aí afastada, tal como o foi a acessão industrial invocada por esta.

Efectivamente, "o enriquecimento sem causa pressupõe a verificação cumulativa dos quatro seguintes requisitos: a) a existência de um enriquecimento; b) que ele careça de causa justificativa; c) que o mesmo tenha sido obtido à custa do empobrecimento daquele que pede a restituição; d) que a lei não faculte ao empobrecido outro meio de ser restituído/indemnizado" (cfr. Ac. do TRC de 02/11/2010, proferido no processo 1867/08.0TBVIS.C1).

Tais requisitos apenas se verificam, no caso vertente, em consequência do douta Sentença proferida na acção declarativa: apenas afastada a propriedade da Exequente em relação ao estabelecimento da ora Oponente, afastado o regime da acessão, e não estando em causa uma mera benfeitoria, com a ordenada entrega do solo, que fisicamente acompanha o estabelecimento sobre o mesmo edificado, passa a existir, quanto ao valor deste, um benefício injustificado da primeira, em detrimento da segunda.

Assim, na senda do referido douto Acórdão do STJ, de 12/12/2023, "caso o contracrédito apenas se constituir ou poder ser invocado após o oferecimento da contestação da ação que produz o título executivo, então, conforme resulta da alínea h) do art.2 729, pode constituir fundamento de embargos, nos termos em que poderia ter sido invocado na ação declarativa".

E, na senda do decidido no douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no proc. n2. 5480/18.5T8ALM-A.L1.S1, de 21/06/2022, não existe efeito preclusivo da defesa em causa, quando, "no momento em que a ora Embargante apresentou a sua contestação na ação declarativa não se encontravam reunidos os pressupostos para invocação do enriquecimento sem causa (desde logo, a falta de causa jurídica para o enriquecimento) que constitui a fonte do crédito que se pretende compensar nesta sede" — que é precisamente o que aqui sucede.

Finalmente, o direito de crédito da Embargante goza de direito de retenção, cujos requisitos também se encontram preenchidos e que constitui um direito real de garantia directamente decorrente da Lei, sem necessidade de prévia declaração judicial e com eficácia erga omnes (cfr. douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido no proc. 61/11.7TBAVV-B.G1.S1 de 16/05/2019).
10º
Deve, em suma, ser julgado procedente o presente recurso, e, nessa sequência, ordenada a efectiva admissão dos Embargos de Executado deduzidos e a prossecução dos respectivos termos até final.
A Recorrida respondeu ao recurso , pronunciando-se pela improcedência do mesmo.
Colhidos os vistos legais cumpre  decidir.

II – OBJECTO DO RECURSO
O âmbito do recurso delimita-se pelas conclusões formuladas pelo Recorrente na motivação do recurso em apreciação , estando vedado a este Tribunal conhecer de questões aí não contempladas, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se impõe ( artigos  635º , nº 2 , 639º , nº1 e nº 2 , 663º , nº2 e 608º , nº 2 , do  C.P.C. )
Deste modo , e considerando as conclusões do recurso interposto  , a questão   que  cumpre apreciar é de saber se o tribunal a quo errou ao indeferir liminarmente os presentes embargos de executado.

III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Revestem relevância para a apreciação da reclamação  os factos que constam do relatório.

IV - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
A Recorrente insurgiu-se contra a decisão do tribunal a quo de julgar manifestamente improcedentes os presentes embargos de executado , discordando do juízo nesse sentido formulado pelo tribunal a quo.
Para tanto alega que a jurisprudência não é unânime quanto à necessidade do prévio reconhecimento judicial do contra-crédito para se operar a compensação em sede de embargos de executado , sustentando ser titular de um crédito sobre a Exequente decorrente do enriquecimento sem causa desta e que esse  crédito goza de direito de retenção, que constitui um direito real de garantia directamente decorrente da Lei, sem necessidade de prévia declaração judicial e com eficácia erga omnes .
Sucede que no âmbito dos presentes embargos de executado a embargante não visa operar a compensação do seu crédito de 122 854,00 euros com o crédito da exequente obter a entrega do imóvel identificado nos autos , que aliás nunca seria legalmente admissível porquanto as obrigações em causa não têm por objecto coisas fungíveis da mesma espécie e qualidade , conforme exigido pelo artigo 847º , nº 1 , b) , do C. Civil.
Afastada a admissibilidade da invocação do instituto da compensação como forma de extinção da obrigação exequenda – a da entrega do imóvel -  , e por conseguinte da previsão da alínea h) do artigo 729º do C.P.C. , não reveste qualquer relevância para o caso em análise a consideração das divergências jurisprudênciais relativas à interpretação da referida norma.
Tratando-se de execução para entrega de coisa certa o que releva é o disposto no artigo 860º do C.P.C. , que define quais os fundamentos da oposição à execução para entrega de coisa certa.
Dispõe o  artigo 860º , nº 1 , do C.P.C. , que o  executado pode deduzir oposição à execução pelos motivos especificados nos artigos 729.º a 731.º, na parte aplicável, e com fundamento em benfeitorias a que tenha direito.
Decorre da norma acima citada que a oposição à execução para entrega de coisa certa em que o título executivo é uma  sentença   pode fundar-se nos fundamentos previstos no artigo 729º do C.P.C.  , e ainda em benfeitorias a que o executado tenha direito.
Uma vez que a Recorrente não fundou a sua oposição na invocação do direito a benfeitorias mas antes na titularidade de um direito de crédito sobre a Exequente , emergente de enriquecimento sem causa e garantido por direito de retenção , mostra-se pertinente a previsão da alínea g) do artigo 729º do C.P.C..
Estatui a alínea g) do artigo 729º do C.P.C. , que fundando-se a execução em sentença a oposição pode ter por fundamento qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento; a prescrição do direito ou da obrigação pode ser provada por qualquer meio.
Exige -se assim cumulativamente que o facto extintivo ou modificativo da obrigação exequenda seja posterior ao encerramento da discussão no processo declarativo e que se prove por documento, excepto no caso de prescrição.
Conforme escreveu Rui Pinto , “ a ratio desta restrição está na autonomia que é dada à sentença enquanto documento com forma executiva : a certificação do direito feita num documento judicial apenas pode ser impugnada pela prova documental de facto contrário “ , e é “ coerente com o sistema de impugnação de sentença transitada em julgado : neste apenas se admite a prova documental a suportar o pedido de revisão de sentença “. ( Manual da Execução e Despejo , 2013 , pág. 440 ; no mesmo sentido ver Abrantes Geraldes , Paulo Pimenta e Luís Filipe Sousa , Código de Processo Civil Anotado , volume II , 2020 , pág.  85 )
Ora a Recorrente olvida por completo o segundo requisito previsto na alínea g) do artigo 729º do C.P.C. , a prova por documento do crédito decorrente do enriquecimento sem causa que invoca deter sobre a Exequente , e deste modo não se mostra preenchida a previsão da referida norma.
Por outro lado o direito de retenção que a Recorrente pretende fazer valer em sede de embargos , que é um direito real de garantia que decorre directamente da lei, impõe  que, na ausência de prévio reconhecimento judicial desse direito , o tribunal onde correm termos esses embargos aprecie  se, a comprovar-se a existência do direito de crédito invocado, esse crédito goza da garantia do direito de retenção que a Recorrente se arroga.
Dispõe o artigo 754º do C. Civil   que o devedor que disponha de um crédito contra o seu credor goza do direito de retenção se, estando obrigado a entregar certa coisa, o seu crédito resultar de despesas feitas por causa dela ou de danos por ela causados.
Fazendo-se apelo ao decidido pelo Acórdão da Relação de Guimarães de 2.5.2024 , “ para que exista direito de retenção ( art. 754º do C. Civil ) devem estar preenchidos três requisitos: 1) que o devedor detenha licitamente a coisa que deve entregar a outrem ( cfr. art. 756º/a do C. Civil ); 2) que o devedor seja simultaneamente credor daquele a quem deve restituir a coisa; e 3) que entre os dois créditos haja uma relação de conexão ( debitum cum re junctum ) nas condições definidas no citado art. 754º ( despesas feitas por causa da coisa ou danos por ela causados) “. ( rel. Pedro Maurício, disponível em www.dgsi.pt )
Ora o crédito em que a Recorrente  funda o direito de retenção que invoca não   resulta de despesas feitas por causa da coisa, nem decorre de danos por esta causados, e como tal esse crédito não goza do invocado direito de retenção.
Por tudo o exposto é manifesta a improcedência dos presentes embargos, impondo-se assim, face ao disposto no artigo 732º, c), do C.P.C., o seu indeferimento liminar, como o fez o tribunal a quo.

V – DECISÃO
Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes da 8ª Secção Cível  do Tribunal da Relação de Lisboa  em negar provimento ao recurso interposto e , em consequência , confirmam a sentença  recorrida,
Custas pela Recorrente ( artigo 527º , do C.P.C. ) .

Lisboa, 26-06-2025,
Maria Carlos Duarte do Vale Calheiros
Marília dos Reis Leal Fontes
Maria do Céu Silva