PROCESSO ESPECIAL DE APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS
LEVANTAMENTO DO SIGILO BANCÁRIO
REQUISITOS
Sumário

São requisitos do levantamento do sigilo bancário: a recusa da prestação de informação, a legitimidade da recusa, a prevalência do interesse em causa no processo que se opõe ao dever de sigilo.
Está fora do âmbito do processo especial de apresentação de coisas ou documentos, regulado nos artºs 1045º a 1047º do CPC, a prestação de informações bancárias que não se traduzam na apresentação de documentos.
No conflito entre a proteção dos interesses de terceiro, titular da conta bancária a cujos elementos se pretende aceder, à reserva da vida privada (sobretudo na vertente patrimonial) bem como a proteção de informações internas da atividade bancária da instituição requerida e, em geral, do interesse da confiança depositada nas instituições bancárias, concretizado na não apresentação dos documentos discriminados, e o da realização da justiça e à tutela efetiva, in casu, que a requerente possa instaurar ação cível de responsabilidade contra a instituição bancária, sendo para tal efeito (delimitação, concretização do direito da requerente) necessário aceder a tais elementos, impõe-se considerar o interesse no acesso e à realização da justiça o prevalecente.
(sumário elaborado ao abrigo do disposto no art.º 663º, nº 7, do CPC)

Texto Integral

Acordam os Juízes da 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa

MIDYSTEN S.L. intentou ação especial de jurisdição voluntária de apresentação de documentos contra NOVO BANCO, S.A., pedindo a condenação do requerido a apresentar os documentos elencados no artº. 2.º da petição inicial em local, dia e hora a determinar por este Tribunal como convenientes e a permitir que a Requerente faça a reprodução daqueles documentos, através de fotografia, fotocópia ou outro meio adequado. No caso de o Tribunal entender que os documentos cuja apresentação é pedida pela Requerente se encontram ao abrigo do segredo bancário seja promovido o incidente de levantamento do sigilo profissional, com a intervenção do Tribunal da Relação, no sentido de ser decidida a prestação da informação com quebra de segredo profissional.
Para tanto, alegou, em síntese:
- É uma sociedade comercial de direito espanhol que se dedica essencialmente à promoção imobiliária, à compra e venda de bens imóveis e ao seu arrendamento;
- Tem como sua acionista única a sociedade MIDAS GROUP, AS, sociedade comercial de direito norueguês (que doravante se designará por MIDAS GROUP);
- A prossecução da atividade comercial da requerente é habitualmente financiada pela referida MIDAS GROUP, AS, acionista única daquela, através da prestação de suprimentos;
- O legal representante da requerente é a mesma pessoa que exerce a representação legal da MIDAS GROUP, AS, FF (que doravante se designará por “FF”);
- A requerente é titular de uma conta bancária aberta junto do BANKINTER, com o n.º 0044 (IBAN ES 0044);
- Por meio de instrumento de representação voluntária conferido para o efeito, a requerente constituiu em 2021.02.25, como seu procurador em Espanha, AA (que doravante se designará por “AA”), consultor fiscal e contabilista da requerente, conferindo-lhe, entre outros, amplos poderes de administração civil e também poderes especiais de movimentação da referida conta bancária por si titulada no BANKINTER;
- No exercício da sua normal atividade comercial, a requerente alienou um imóvel de que era proprietária em Marbella (Málaga), Espanha, pelo montante de €10.100.000,00;
- A requerente decidiu que uma parte do preço recebido pelo referido negócio seria entregue à MIDAS GROUP, a título de devolução antecipada de suprimentos que esta havia prestado àquela;
- Assim, em 2022.08.02, às 8h24, o identificado FF, legal representante da requerente e da sua acionista única (MIDAS GROUP), enviou um mail a MM, informando-o sobre os dados de uma conta bancária na Noruega titulada pela MIDAS GROUP para onde deveria ser transferida a quantia de € 2.600.000,00;
- Sucede que, nesse mesmo dia - 02.08.2022 -, às 9h47, aparentemente através da conta de email do referido FF, foi enviado um outro mail ao identificado MM, transmitindo-lhe o seguinte: “Pensando melhor, por favor envie o dinheiro para a conta do Grupo Midas em Portugal
Midas Group AS
IBAN: PT 0023
SWIFT CODE: BESCPTPLXXX
NOVO BANCO SA
CAMPO GRANDE N 28 7 C, 1700-093 LISBOA PORTUGAL”;
- O referido e-mail não foi, contudo, enviado por FF, nem o seu envio foi do seu conhecimento, não se encontrando o mesmo arquivado na sua caixa de correio;
- No entanto, nem o referido MM, nem as restantes pessoas que estavam em cópia nesse email, estranharam ou suspeitaram da autenticidade da alteração das instruções bancárias fornecidas, uma vez que (i) o endereço de correio eletrónico de onde foi enviado o mail a que corresponde o doc.º n.º 7 correspondia ao habitualmente utilizado por FF (ff @midasgroup.no) e (ii) era do conhecimento de MM  e AA, respetivamente advogado e contabilista (além de consultor fiscal) da requerente em Espanha, que a MIDAS GROUP SA prosseguia a sua atividade comercial em diferentes geografias no mundo, tendo, por conseguinte, sido assumido que Portugal seria um desses locais, e confiado que a conta indicada pertencia efetivamente à MIDAS GROUP SA;
- Nesta sequência, em 2022.08.05, o referido AA deslocou-se à agência bancária do BANKINTER, sita na Calle Jesus Puente, 17, Puerto Banus, Marbella (Málaga), e, em nome e representação da requerente, deu ordem de transferência bancária internacional, no montante de €2.600.000,00, para a conta bancária do NOVO BANCO que consta do e-mail por último referido, indicando como beneficiário de tal transferência a MIDAS GROUP AS;
- Em 2022.08.12, AA contactou o referido MM, através de mensagem enviada por whatsapp, a perguntar o motivo pelo qual o montante de €2.600.000,00 ainda não havia sido recebido pela MIDAS GROUP, tendo este informado aquele que tal montante havia sido transferido em 2022.08.05 para a conta bancária do NOVO BANCO em Portugal, ao que FF retorquiu que a MIDAS GROUP não era titular de nenhuma conta bancária no NOVO BANCO, em Portugal;
- Foi nesse momento que a requerente constatou ter sido vítima de falsidade informática no âmbito da correspondência eletrónica que precedeu a transferência e de uma burla informática qualificada que ascende ao montante de €2.600.000,00 (dois milhões e seiscentos mil euros);
- Em consequência, no mesmo dia 2022.08.12, o referido MM, em nome e em representação da requerente, comunicou ao BANKINTER o sucedido para que o referido banco interpelasse a requerida com vista à sustação da conta bancária ali domiciliada para onde foi transferida a quantia em causa e;
- Em 2022.08.13 (e não no próprio dia 12.08.2022, por indicação do órgão policial espanhol), apresentou uma queixa-crime em Espanha tendo por objeto os factos acima descritos;
- Por outro lado, em 2022.08.19, a requerente apresentou também em Portugal queixa-crime contra JJ, POWERCOPRO e Incertos pela prática dos crimes de burla informática e nas comunicações e falsidade informática, a qual deu origem aos autos de inquérito que correm termos na Secção única do Departamento Central de Investigação Criminal de Lisboa, sob o n.º 00/22.4TELSB;
- A requerente tem conhecimento de que a conta bancária para onde foi indevidamente transferido o montante de €2.600.000,00, domiciliada no banco Requerido com o IBAN PT 0023, pertence, não à MIDAS GROUP que havia sido indicada como titular da conta beneficiária na ordem de transferência, mas à sociedade “POWERCOPRO, UNIPESSOAL, LIMITADA”, sociedade de direito português, com o número de identificação de pessoa coletiva 516 849 549, com sede no Campo Grande, n.º 28, 7.º C, 1700-093 Lisboa, da qual é seu único sócio-gerente JJ, de nacionalidade checa, portador do número de contribuinte português 00000000, residente em …, Républica Checa;
- Sabe também a requerente que o montante de €2.600.000,00 entrou na referida conta titulada pela POWERCOPRO, em 2022.08.08, na sequência da referida ordem de transferência, tendo saído, nesse mesmo dia, através de transferência bancária realizada via homebanking, daquela conta para uma outra conta bancária;
- A POWERCOPRO é uma sociedade de direito português constituída em 2022.05.23, com um capital social de €250,00;
- No Registo de Beneficiário Efetivo da sociedade, no campo destinado ao “endereço eletrónico institucional” não é indicado um e-mail institucional, mas sim o e-mail ...@....com, correspondente ao endereço eletrónico de II, advogada de nacionalidade russa, com inscrição na Ordem dos Advogados em Portugal desde 2009.12.17, portadora da cédula profissional n.º 000P;
- A sede da POWERCOPRO situa-se exatamente na mesma morada em que aquela Advogada tem escritório: …, Lisboa;
- A requerente tem um interesse jurídico atendível no exame dos documentos cuja apresentação pela requerida aqui requer;
- Tanto mais que é evidente que a requerida incorreu em diversas violações de normas de diligência que sobre si impendiam, com culpa, a saber: não cuidou – como se lhe impunha – de se abster de concretizar o depósito na já identificada conta bancária da POWERCOPRO, junto daquela instituição bancária, no montante de €2.600.000,00; nem tão pouco a requerida se absteve de concretizar a ordem de transferência que recebeu do mesmo montante de €2.600.000,00 para uma outra conta bancária, no próprio dia em que esse valor havia entrado na conta bancária titulada pela POWERCOPRO, junto dela, sendo certo que esta situação corresponde a um dos exemplos-escola a que as entidades bancárias devem estar especialmente atentas e alertas, em face da sinalização de um elevado risco de branqueamento de capitais, como, aliás, há muito vinha referenciado nos Princípios Anti-Branqueamento de Capitais do Grupo Wolfsberg para a Banca Privada (2012); encontram-se expressamente sinalizadas como situações de risco potencialmente mais elevado pelo Banco de Portugal as de transações de passagem (pass-through) e de entrada e saída (in-an-out), “clientes que sejam pessoas coletivas recém-criadas e sem um perfil de negócio conhecido ou adequado à atividade declarada”, bem como “operações pontuais de elevado valor, tendo em conta o que é expectável para o produto, serviço, operação ou canal de distribuição utilizado”;
- A requerida está na posse de todos os documentos cuja obtenção a requerente visa com a presente ação;
- A requerente interpelou a requerida em várias ocasiões, inclusive por interpelação judicial avulsa, sem que a requerida tenha sequer invocado qualquer motivo para a recusa na apresentação dos documentos, designadamente o segredo bancário;
- O interesse da Requerente na obtenção dos documentos solicitados prende-se com a necessidade de se esclarecer sobre o conteúdo do seu direito [indemnizatório] contra a Requerida, a exercer em futura ação de responsabilidade civil contra esta.
- Entre os elementos acima indicados, a Requerente solicitou documentação referente às medidas de Compliance aplicadas pela Requerida na situação que esteve na origem da presente ação, informação que requer especial atenção e detida análise, uma vez que tem por objetivo a verificação do cumprimento pela Requerida do conjunto de normas de Compliance a que esta se encontra adstrita.
- O direito da Requerente de tomar efetivo conhecimento do conteúdo dos seus direitos contra a Requerida, através da análise cuidada dos documentos objeto da presente ação, o direito de efetivo acesso à justiça, na expressão concreta do direito à prova e a um processo equitativo, valores igualmente protegidos por via dos artº.s20.º, n.ºs 1 e 4, e 202.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, afiguram-se manifestamente superiores a quaisquer motivos que possam vir hipoteticamente alegados pela Requerida com vista a obstar a essa reprodução.
- Caso se entenda que os documentos cuja apresentação é pedida pela requerente se encontram ao abrigo do segredo bancário, estão reunidos os requisitos para que o respetivo incidente de levantamento do sigilo profissional seja promovido e deferido.
Os documentos cuja apresentação vem requerida constam do artº 2º da p.i., do seguinte teor:
i. Os dados de identificação dos titulares da conta bancária com o IBAN n.º PT 0082, incluindo as respetivas fichas de assinaturas, com indicação do balcão onde terá sido aberta, os documentos de identificação do requerente da abertura da conta e eventual instrumento de representação dos titulares da conta e todos os demais documentos que instruíram o processo de abertura de conta.
ii. Os documentos internos da Requerida referentes às diligências de compliance realizadas no âmbito dos procedimentos “KNOW YOUR CLIENT” (KYC), “KNOW YOUR TRANSACTION” (KYT) e “KNOW YOUR PROCESS” (KYP) da POWERCOPRO.
iii. Os documentos relativos à avaliação do risco da POWERCOPRO realizada pela Requerida e o perfil de risco da POWERCOPRO atribuído por aquela instituição bancária.
iv. Os eventuais procedimentos realizados pela Requerida com vista à atualização da informação inicial recolhida sobre a POWERCOPRO.
v. Os documentos comprovativos das diligências de monitorização e controlo da POWERCOPRO e das operações por esta realizadas desde a data de abertura de conta até à presente oportunidade, incluindo os referentes à transferência bancária de € 2.600.000,00 realizada pela Requerente em 2022.08.05 e à transferência bancária do mesmo montante realizada pela POWERCOPRO para uma outra conta bancária no dia 2022.08.08.
vi. Informação sobre as concretas medidas de compliance aplicadas pela Requerida (i) no âmbito da transferência bancária de € 2.600.000,00 realizada pela Requerente em 2022.08.05 para a conta bancária titulada pela POWERCOPRO e (ii) no âmbito da transferência bancária do mesmo montante realizada pela POWERCOPRO para uma outra conta bancária em 2022.08.08.
vii. Os extratos bancários comprovativos de que o montante de € 2.600.000,00 entrou na conta bancária com o IBAN n.º PT 0082 titulada pela POWERCOPRO e também extratos bancários comprovativos de que dela saiu, mediante indicação completa da(s) conta(s) bancária(s) destino e da(s) instituição(es) de crédito em que essa(s) conta(s) destino se encontra(em) domiciliada(s).
viii. Os extratos bancários da identificada conta bancária da POWERCOPRO desde a data da sua constituição/abertura até esta oportunidade.
O R. apresentou contestação, concluindo nos seguintes termos:
“a) Julgar provada e procedente a exceção de erro na forma do processo, declarando nulo todo o processado e absolvendo o Réu da instância;
Subsidiariamente,
b) Julgar improcedente a ação, por não se encontrarem verificados os pressupostos dos quais depende a obrigação de apresentação de documentos e informações, absolvendo o Requerido do pedido;
Subsidiariamente ainda,
c) Julgar legítima a escusa do Novo Banco quanto à apresentação dos elementos pedidos, por os mesmos estarem cobertos pelo sigilo bancário e pelo dever de não divulgação, tudo nos termos melhor expostos supra.”
Após convite do Tribunal a A. pronunciou-se quanto à exceção de erro na forma do processo, pugnando pela sua improcedência, pela ilegitimidade da recusa do R. na apresentação dos documentos objeto da presente ação com fundamento no dever de sigilo bancário; e, caso se entenda ser a recusa legítima seja promovido o incidente de levantamento do sigilo profissional.
Foi proferido despacho saneador que julgou procedente a exceção de erro na forma de processo e declarou a nulidade de todo o processo, absolvendo o requerido da instância.
Interposto recurso foi proferido acórdão por esta Relação, em 04/07/2024, que revogou o despacho recorrido e determinou o prosseguimento dos ulteriores termos do processo.
Volvidos os autos à 1ª instância foi proferido o seguinte despacho, em 13/03/2025:
“(…) Através da presente acção, pretende a autora a apresentação pelo réu dos seguintes documentos:
i. Os dados de identificação dos titulares da conta bancária com o IBAN n.º PT 0082, incluindo as respectivas fichas de assinaturas, com indicação do balcão onde terá sido aberta, os documentos de identificação do requerente da abertura da conta e eventual instrumento de representação dos titulares da conta e todos os demais documentos que instruíram o processo de abertura de conta;
ii. Os documentos internos da Requerida referentes às diligências de compliance realizadas no âmbito dos procedimentos “KNOW YOUR CLIENT” (KYC), “KNOW YOUR TRANSACTION” (KYT) e “KNOW YOUR PROCESS” (KYP) da POWERCOPRO;
iii. Os documentos relativos à avaliação do risco da POWERCOPRO realizada pela Requerida e o perfil de risco da POWERCOPRO atribuído por aquela instituição bancária;
iv. Os eventuais procedimentos realizados pela Requerida com vista à atualização da informação inicial recolhida sobre a POWERCOPRO;
v. Os documentos comprovativos das diligências de monitorização e controlo POWERCOPRO e das operações por esta realizadas desde a data de abertura de conta até à presente oportunidade, incluindo os referentes à transferência bancária de € 2.600.000,00 realizada pela Requerente em 2022.08.05 e à transferência bancária do mesmo montante realizada pela POWERCOPRO para uma outra conta bancária no dia 2022.08.08;
vi. Informação sobre as concretas medidas de compliance aplicadas pela Requerida (i) no âmbito da transferência bancária de € 2.600.000,00 realizada pela Requerente em 2022.08.05 para a conta bancária titulada pela POWERCOPRO e (ii) no âmbito da transferência bancária do mesmo montante realizada pela POWERCOPRO para uma outra conta bancária em 2022.08.08;
vii. Os extractos bancários comprovativos de que o montante de € 2.600.000,00 entrou na conta bancária com o IBAN n.º PT 0082 titulada pela POWERCOPRO e também extractos bancários comprovativos de que dela saiu, mediante indicação completa da(s) conta(s) bancária(s) destino e da(s) instituição(es) de crédito em que essa(s) conta(s) destino se encontra(em) domiciliada(s);
viii. Os extractos bancários da identificada conta bancária da POWERCOPRO desde a data da sua constituição/abertura até esta oportunidade.
Atendendo à decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa que concluiu que a autora tem um interesse manifesto na apresentação dos mencionados documentos para, através deles, reunir elementos para poder organizar uma acção de responsabilidade civil contra a entidade bancária de forma consistente e bem fundamentada, cumpriria determinar o prosseguimento dos presentes autos com a notificação do réu para proceder à sua apresentação.
Contudo, na contestação apresentada, o réu invocou expressamente [em concreto, nos seus artigos 69.º e 70.º] a escusa a proceder a tal apresentação de documentos, pelo que, se impõe apreciar, desde já, se é legítima a sua escusa.
Estatui o artigo 78.º, n.º 1, do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras que “[o]s membros dos órgãos de administração ou fiscalização das instituições de crédito, os seus colaboradores, mandatários, comissários e outras pessoas que lhes prestem serviços a título permanente ou ocasional não podem revelar ou utilizar informações sobre factos ou elementos respeitantes à vida da instituição ou às relações desta com os seus clientes cujo conhecimento lhes advenha exclusivamente do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços” (sublinhado nosso). Por sua vez, o n.º 2 do mesmo preceito legal especifica as informações sujeitas a segredo, designadamente, os nomes dos clientes, as contas de depósito e seus movimentos e outras operações bancárias.
Ademais, fixou-se jurisprudência pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 2/2008, de 13.02.2008, nos seguintes termos: “Requisitada a instituição bancária, no âmbito de inquérito criminal, informação referente a conta de depósito, a instituição interpelada só poderá legitimamente escusar-se a prestá-la com fundamento em segredo bancário. Sendo ilegítima a escusa, por a informação não estar abrangida pelo segredo, ou por existir consentimento do titular da conta, o próprio tribunal em que a escusa for invocada, depois de ultrapassadas eventuais dúvidas sobre a ilegitimidade da escusa, ordena a prestação da informação, nos termos do n.º 2 do artigo 135.º do Código de Processo Penal. Caso a escusa seja legítima, cabe ao tribunal imediatamente superior àquele em que o incidente se tiver suscitado ou, no caso de o incidente se suscitar perante o Supremo Tribunal de Justiça, ao pleno das secções criminais, decidir sobre a quebra do segredo, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo”.
No quadro em apreço, os documentos cuja apresentação é requerida pela autora enquadram-se, inequivocamente, no elenco dos elementos protegidos pelo sigilo bancário porquanto os documentos indicados no artigo 2.º da petição inicial ou dizem respeito a um concreto cliente da instituição bancária [pontos i, vii e viii] e/ou dizem respeito a elementos respeitantes à própria vida da instituição, sendo referentes a procedimentos internos do Novo Banco respeitantes a esse mesmo cliente, que implicam, naturalmente, o tratamento de dados e informações do mesmo, para além de serem referentes à vida e desenvolvimento da actividade da instituição e da sua relação com tal cliente [pontos ii a vi]. Ademais, não se verifica qualquer uma das excepções previstas no artigo 79.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras.
Tendo o réu contestado e aí invocado expressamente a escusa a proceder a tal apresentação de documentos [em concreto, nos seus artigos 69.º e 70.º], entende-se, por todo o exposto, estarem reunidos os pressupostos previstos nos artigos 135.º do Código de Processo Penal ex vi artigo 417.º, n.º 4 do Código de Processo Civil, para o levantamento do sigilo bancário.
Assim, suscita-se, perante o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, o incidente a que alude o n.º 3 do artigo 135.º do Código de Processo Penal ex vi artigo 417.º, n.º 4 do Código de Processo Civil, a fim de ser ponderado o levantamento do sigilo bancário junto do Novo Banco, S.A., no tocante aos seguintes documentos:
i. Os dados de identificação dos titulares da conta bancária com o IBAN n.º PT 0082, incluindo as respectivas fichas de assinaturas, com indicação do balcão onde terá sido aberta, os documentos de identificação do requerente da abertura da conta e eventual instrumento de representação dos titulares da conta e todos os demais documentos que instruíram o processo de abertura de conta;
ii. Os documentos internos da Requerida referentes às diligências de compliance realizadas no âmbito dos procedimentos “KNOW YOUR CLIENT” (KYC), “KNOW YOUR TRANSACTION” (KYT) e “KNOW YOUR PROCESS” (KYP) da POWERCOPRO;
iii. Os documentos relativos à avaliação do risco da POWERCOPRO realizada pela Requerida e o perfil de risco da POWERCOPRO atribuído por aquela instituição bancária;
iv. Os eventuais procedimentos realizados pela Requerida com vista à atualização da informação inicial recolhida sobre a POWERCOPRO;
v. Os documentos comprovativos das diligências de monitorização e controlo POWERCOPRO e das operações por esta realizadas desde a data de abertura de conta até à presente oportunidade, incluindo os referentes à transferência bancária de € 2.600.000,00 realizada pela Requerente em 2022.08.05 e à transferência bancária do mesmo montante realizada pela POWERCOPRO para uma outra conta bancária no dia 2022.08.08;
vi. Informação sobre as concretas medidas de compliance aplicadas pela Requerida (i) no âmbito da transferência bancária de € 2.600.000,00 realizada pela Requerente em 2022.08.05 para a conta bancária titulada pela POWERCOPRO e (ii) no âmbito da transferência bancária do mesmo montante realizada pela POWERCOPRO para uma outra conta bancária em 2022.08.08;
vii. Os extractos bancários comprovativos de que o montante de € 2.600.000,00 entrou na conta bancária com o IBAN n.º PT 0082 titulada pela POWERCOPRO e também extractos bancários comprovativos de que dela saiu, mediante indicação completa da(s) conta(s) bancária(s) destino e da(s) instituição(es) de crédito em que essa(s) conta(s) destino se encontra(em) domiciliada(s);
viii. Os extractos bancários da identificada conta bancária da POWERCOPRO desde a data da sua constituição/abertura até esta oportunidade.
Em face do exposto, deverá ser instruído apenso de incidente de quebra do dever de sigilo bancário com certidão da petição inicial, contestação, sentença, acórdãos e do presente despacho.
Oportunamente, remeta ao Venerando Tribunal da Relação de Lisboa.”
                                                             *
A factualidade com relevo para o conhecimento do incidente suscitado pelo tribunal de 1ª instância é a que consta do relatório que antecede.
A questão a decidir consiste em saber se deve (ou não) ser levantado o sigilo bancário.

O Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de dezembro, prevê no art.º 78º o dever de segredo, nos seguintes termos:
“1 - Os membros dos órgãos de administração ou fiscalização das instituições de crédito, os seus colaboradores, mandatários, comissários e outras pessoas que lhes prestem serviços a título permanente ou ocasional não podem revelar ou utilizar informações sobre factos ou elementos respeitantes à vida da instituição ou às relações desta com os seus clientes cujo conhecimento lhes advenha exclusivamente do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços.
2 - Estão, designadamente, sujeitos a segredo os nomes dos clientes, as contas de depósito e seus movimentos e outras operações bancárias.
3 - O dever de segredo não cessa com o termo das funções ou serviços.”
E o art.º 79.º deste diploma (na redação vigente à data do despacho proferido em 1ª instância, sendo que a alteração introduzida pelo DL 14/2025, de 17 de março, que se limitou a introduzir uma alínea no nº 2, não releva para o caso) dispõe que:
1 - Os factos ou elementos das relações do cliente com a instituição podem ser revelados mediante autorização do cliente, transmitida à instituição.
2 - Fora do caso previsto no número anterior, os factos e elementos cobertos pelo dever de segredo só podem ser revelados:
a) Ao Banco de Portugal, no âmbito das suas atribuições;
b) À Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, no âmbito das suas atribuições;
c) À Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões, no âmbito das suas atribuições;
d) Ao Fundo de Garantia de Depósitos, ao Sistema de Indemnização aos Investidores e ao Fundo de Resolução, no âmbito das respetivas atribuições;
e) Às autoridades judiciárias, no âmbito de um processo penal;
f) Às comissões parlamentares de inquérito da Assembleia da República, no estritamente necessário ao cumprimento do respetivo objeto, o qual inclua especificamente a investigação ou exame das ações das autoridades responsáveis pela supervisão das instituições de crédito ou pela legislação relativa a essa supervisão;
g) À administração tributária, no âmbito das suas atribuições;
h) Quando exista outra disposição legal que expressamente limite o dever de segredo.
O artº 417º do CPC estabelece que:
1 - Todas as pessoas, sejam ou não partes na causa, têm o dever de prestar a sua colaboração para a descoberta da verdade, respondendo ao que lhes for perguntado, submetendo-se às inspeções necessárias, facultando o que for requisitado e praticando os atos que forem determinados.
2 - Aqueles que recusem a colaboração devida são condenados em multa, sem prejuízo dos meios coercitivos que forem possíveis; se o recusante for parte, o tribunal aprecia livremente o valor da recusa para efeitos probatórios, sem prejuízo da inversão do ónus da prova decorrente do preceituado no n.º 2 do artigo 344.º do Código Civil.
3 - A recusa é, porém, legítima se a obediência importar:
a) Violação da integridade física ou moral das pessoas;
b) Intromissão na vida privada ou familiar, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações;
c) Violação do sigilo profissional ou de funcionários públicos, ou do segredo de Estado, sem prejuízo do disposto no n.º 4.
4 - Deduzida escusa com fundamento na alínea c) do número anterior, é aplicável, com as adaptações impostas pela natureza dos interesses em causa, o disposto no processo penal acerca da verificação da legitimidade da escusa e da dispensa do dever de sigilo invocado.
O artº 135º do Código de Processo Penal consigna que:
1 - Os ministros de religião ou confissão religiosa e os advogados, médicos, jornalistas, membros de instituições de crédito e as demais pessoas a quem a lei permitir ou impuser que guardem segredo podem escusar-se a depor sobre os factos por ele abrangidos.
2 - Havendo dúvidas fundadas sobre a legitimidade da escusa, a autoridade judiciária perante a qual o incidente se tiver suscitado procede às averiguações necessárias. Se, após estas, concluir pela ilegitimidade da escusa, ordena, ou requer ao tribunal que ordene, a prestação do depoimento.
3 - O tribunal superior àquele onde o incidente tiver sido suscitado, ou, no caso de o incidente ter sido suscitado perante o Supremo Tribunal de Justiça, o pleno das secções criminais, pode decidir da prestação de testemunho com quebra do segredo profissional sempre que esta se mostre justificada, segundo o princípio da prevalência do interesse preponderante, nomeadamente tendo em conta a imprescindibilidade do depoimento para a descoberta da verdade, a gravidade do crime e a necessidade de proteção de bens jurídicos. A intervenção é suscitada pelo juiz, oficiosamente ou a requerimento.
4 - Nos casos previstos nos nºs 2 e 3, a decisão da autoridade judiciária ou do tribunal é tomada ouvido o organismo representativo da profissão relacionada com o segredo profissional em causa, nos termos e com os efeitos previstos na legislação que a esse organismo seja aplicável.
5 - O disposto nos nºs 3 e 4 não se aplica ao segredo religioso.
E o artº 182º do Código Processo Penal dispõe que:
1 - As pessoas indicadas nos artigos 135.º a 137.º apresentam à autoridade judiciária, quando esta o ordenar, os documentos ou quaisquer objetos que tiverem na sua posse e devam ser apreendidos, salvo se invocarem, por escrito, segredo profissional ou de funcionário ou segredo de Estado.
2 - Se a recusa se fundar em segredo profissional ou de funcionário, é correspondentemente aplicável o disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 135.º e no n.º 2 do artigo 136.º
3 - Se a recusa se fundar em segredo de Estado, é correspondentemente aplicável o disposto no n.º 3 do artigo 137.º
Nesta matéria importa atentar no acórdão do STJ nº 2/2008, de 13/02/2008, que fixou jurisprudência no seguinte sentido: “1. Requisitada a instituição bancária, no âmbito de inquérito criminal, informação referente a conta de depósito, a instituição interpelada só poderá legitimamente escusar-se a prestá-la com fundamento em segredo bancário.
2. Sendo ilegítima a escusa, por a informação não estar abrangida pelo segredo, ou por existir consentimento do titular da conta, o próprio tribunal em que a escusa for invocada, depois de ultrapassadas eventuais dúvidas sobre a ilegitimidade da escusa, ordena a prestação da informação, nos termos do nº 2 do art. 135º do Código de Processo Penal.
3. Caso a escusa seja legítima, cabe ao tribunal imediatamente superior àquele em que o incidente se tiver suscitado ou, no caso de o incidente se suscitar perante o Supremo Tribunal de Justiça, ao pleno das secções criminais, decidir sobre a quebra do segredo, nos termos do nº 3 do mesmo artigo.”
 “O segredo bancário insere-se no âmbito do direito da reserva da intimidade da vida privada consagrado nos art.ºs 26º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP) e 80º, do Código Civil (CC)[3], desempenhando igualmente um papel de relevo na confiança do público no sistema bancário e financeiro, tão importante para a captação das poupanças (art.º 101º, da CRP), indispensável ao desenvolvimento económico e social do país - estão em causa, principalmente, os interesses individuais dos clientes dos bancos e o interesse colectivo da confiança no sistema bancário.
O bem jurídico tutelado pela protecção do segredo bancário, como segredo profissional, é, em primeira linha, o da confiança dos clientes, na discrição dos seus interlocutores nas informações familiares, pessoais e patrimoniais, em vertente de defesa privada simples relativa, porque concernente ao apuramento de dados envolventes de situações patrimoniais.
A possibilidade do seu levantamento por simples autorização do cliente revela estarmos perante um segredo fundamentalmente estabelecido para protecção de interesses particulares e como tal disponível, daí decorrendo que a confiança a manter radica, em última análise, no cliente do banco.
Tal direito ao sigilo, embora com cobertura constitucional, não é um direito absoluto, até porque, pela sua referência à esfera patrimonial, não se inclui no círculo mais íntimo da vida privada das pessoas, embora com ele possa manter relação estreita. Pode, pois, ter que ceder perante outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, cuja tutela imponha o acesso a informações cobertas pelo segredo bancário.” - Ac. da RC de 17/12/2014, proc. nº 464/12.0TBTND-C.C1, in www.dgsi.pt
“I - O dever de sigilo bancário não é um dever absoluto, pelo que pode ceder perante a necessidade de salvaguardar outros direitos constitucionalmente protegidos, tal como o direito de acesso à justiça e à tutela efectiva, previstos no artigo 20º, nºs 1 e 5 da Constituição da República Portuguesa.
II - Sendo legítima a escusa com base no sigilo bancário, para assegurar a finalidade do processo de inventário em que se desconhece ou questione a extensão do património do inventariado, segundo os princípios da prevalência do interesse preponderante e da necessidade de protecção dos bens jurídicos em causa, deve ser dispensado o invocado sigilo. – Ac. RL de 02/02/2021, proc. nº 2450/20.7T8ALM-A.L1-7, in www.dgsi.pt.
São requisitos do levantamento do sigilo bancário: a recusa da prestação de informação, a legitimidade da recusa, a prevalência do interesse em causa no processo que se opõe ao dever de sigilo.
O presente incidente foi suscitado no âmbito de um processo especial de apresentação de coisas e documentos, visando a requerente a obtenção de elementos que permitam o efetivo conhecimento do conteúdo dos seus direitos contra a requerida com vista a instauração de ação de responsabilidade civil.
O Novo Banco, na contestação à ação, recusou apresentar os documentos solicitados invocando que os mesmos estão abrangidos pelo sigilo bancário.
Nos termos do disposto no artº 78º, nº 2 do DL 298/92, de 31 de dezembro, as informações relativas ao nome do titular de conta bancária, às contas de depósito e seus movimentos e outras operações bancárias, bem como as informações sobre factos ou elementos respeitantes à vida da instituição ou às relações desta com os seus clientes estão sujeitas ao dever de sigilo. Não foi dado consentimento pelo titular da conta (cfr. artº 79º, nº 1). A recusa do Novo Banco em apresentar os documentos/fornecer as informações requeridas pela requerente é legítima (artº 417º, nº 3, al. c) do CPC).
Resta averiguar se o dever de sigilo deve ceder perante o interesse do acesso e realização da justiça, avaliado em concreto e segundo o princípio da prevalência do interesse preponderante, mediante critério de proporcionalidade.
Como se discorreu no acórdão desta Relação proferido no âmbito destes autos, acima referenciado:
“Perante os factos alegados pela requerente, o seu interesse nos documentos é manifesto, pois será através deles que reunirá elementos para poder organizar uma ação de responsabilidade civil contra a entidade bancária de forma consistente e bem fundamentada, sendo certo que, por tudo quanto alega e que em grande parte documenta, há indícios de violação de deveres regulatórios e legais destinados a impedir a utilização do sistema bancário para fins criminosos (designadamente no que se refere à obrigatoriedade de adoção de medidas destinadas ao combate dos fenómenos de branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo, como aquelas que se encontram reguladas na Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto), assim como há indícios do prejuízo da autora em elevadíssimo montante, e do nexo causal entre a omissão de deveres impostos à entidade bancária e a ocorrência danosa. Afinal, de acordo com o alegado e em parte documentado, a requerida permitiu a uma entidade desconhecida (uma sociedade constituída havia menos de 6 meses), sem ativos ou negócio consistente (com um capital social de € 250,00, em início de atividade), recebesse e efetuasse transferências € 2.600.000,00, no mesmo dia, e por homebanking.”
“O fundamento da ação de apresentação de documento é a defesa de direitos do requerente dependente da exibição do documento, servindo para o titular do direito se esclarecer acerca da existência ou do conteúdo do seu direito, ou se habilitar a exercê-lo ou a conservá-lo.” – Ac. RL de 15/12/2020, proc. nº 11451/19.7T8LSB.L1-7, in www.dgsi.pt.
O processo especial de apresentação de coisas ou documentos é regulado nos artºs 1045º a 1047º do CPC.
Dispõe o artº 1045º: “aquele que, nos termos e para os efeitos dos artigos 574.º e 575.º do Código Civil, pretenda a apresentação de coisas ou documentos que o possuidor ou detentor lhe não queira facultar justifica a necessidade da diligência e requer a citação do recusante para os apresentar no dia, hora e local que o juiz designar.”
Visa-se a apresentação de coisas ou documentos. Assim, está fora do âmbito deste processo a prestação de informações, pelo que os elementos elencados no ponto vi do artº 2º da p.i., não podem ser objeto do presente incidente, atento o processo em que o mesmo vem suscitado.
A requerente não consegue obter tais documentos diretamente junto da instituição bancária, requerida no processo, atento o segredo que os abrange, a qual invocou a recusa com esse fundamento, não se perspetivando outro meio de prova que permita esclarecer tal questão.
O conflito entre a proteção dos interesses de terceiro, titular da conta bancária a cujos elementos se pretende aceder, à reserva da vida privada (sobretudo na vertente patrimonial) bem como a proteção de informações internas da atividade bancária da instituição requerida e, em geral, do interesse da confiança depositada nas instituições bancárias, concretizado na não apresentação dos documentos acima discriminados, e o da realização da justiça e à tutela efetiva, in casu, que a requerente possa instaurar ação cível de responsabilidade contra a instituição bancária, sendo para tal efeito (delimitação, concretização do direito da requerente) necessário aceder a tais elementos, impõe-se considerar o interesse no acesso e à realização da justiça o prevalecente.
Acresce que a requerida apresentação dos documentos não colide, de modo insustentável ou desadequado, com os princípios subjacentes ao dever de sigilo bancário acima identificados, em face do interesse prevalecente da realização da justiça e da tutela do direito da requerente.

Pelo exposto, decide-se julgar procedente o incidente, ordena-se o levantamento do sigilo bancário e, consequentemente, determina-se que o requerido Novo Banco SA faculte os elementos  solicitados pela requerente, elencados nos pontos i. a v., vii e viii do artº 2º da petição inicial.
Custas a cargo da requerida.

Lisboa, 26 de junho de 2025
Teresa Sandiães
Ana Paula Nunes Duarte Olivença
Amélia Puna Loupo