REGULAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
DECISÃO PROVISÓRIA
INSTRUÇÃO
Sumário

Sumário: (Elaborado pelo relator e da sua inteira responsabilidade – artº 663º nº 7 do Código de Processo Civil)
I - As decisões provisórias sobre a regulação das responsabilidades parentais ou acerca da resolução de questões conexas são prévias à produção de prova, designadamente a indicada pelos progenitores, conforme se extrai do artº 38º e do artº 28º nº 3 do RGPTC.
II - O artº 38º do RGPTC apresenta-se como uma norma especial que, caso não haja acordo dos pais na conferência em que ambos estejam presentes ou representados, impõe ao juiz a prolação de decisão provisória que se baseia nos elementos já obtidos, que por norma assentam essencialmente nas declarações das partes nessa conferência, sem prejuízo de, por aplicação do princípio geral contido no artº 28º nº 3 do RGPTC, proceder a averiguações sumárias; regime do qual decorre que a fase da produção de prova está reservada para momento posterior: aquele em que há-de ser proferida a decisão definitiva.

Texto Integral

Acordam as Juízes na 8ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I – RELATÓRIO
A, na qualidade de progenitor de X e Z,
veio propor processo tutelar cível para suprimento da falta de acordo entre os responsáveis pelas responsabilidades parentais em questão de particular importância
contra
B, mãe dos menores,
requerendo a prolação de decisão judicial que autorize a alteração de escola, por falta de acordo dos pais, nos termos do artigo 44º do RGPTC.
Para tanto, e em suma, alega que à data da petição as duas crianças frequentavam a escola internacional “M…School”, em Lisboa, que tem um método de ensino alternativo (M..) cuja abordagem se centra na individualidade de cada criança e com o ensino exclusivamente em língua inglesa, e não, como o progenitor acreditava, de ensino biligue, tendo o Requerente descoberto que uma professora dará ocasionalmente aulas de português aos alunos, o que, expondo-os a algum português, não consiste no ensino da língua portuguesa conforme o programa curricular oficial. O que sendo potencialmente prejudicial a ambos os menores no futuro, no momento afecta em particular o menor X que não está a aprender devidamente a ler e a escrever em português, nem lhe é ministrado o demais conteúdo programático do primeiro ciclo estipulado para o ensino em Portugal e não transitou para o ano equivalente ao 1º ano do 1º ciclo no ensino tradicional por a escola entender que o mesmo não demonstrava os necessários e exigíveis níveis de língua inglesa para acompanhar as aulas do 1º ano, pese embora o menor X frequente a escola M desde os 3 anos de idade. Pelo que entende que o menor está a ser prejudicado com esta opção de escola e tal terá repercussões negativas no futuro.
Sem prescindir, aduz ainda argumentos de ordem prática para a alteração da escola dos menores: valor mensal da frequência dos menores na escola, que se apresenta elevado (mensalidade de € 1.000,00 e matrícula de € 1.250, por cada menor) e, apesar de actualmente ter possibilidades financeiras para fazer face ao esforço, a sua situação financeira pode alterar-se por se encontrar no exercício de um cargo de nomeação e pode não ser reconduzido; dificuldade de integração futura noutra escola, sem quase preparação alguma em português; a actual localização da escola; os horários e férias da escola, dificultando muitíssimo a conciliação da vida profissional com a vida familiar.
Mais alega que as tentativas de alcançar um entendimento com a Requerida quanto à mudança programada das crianças para outra escola, igualmente do ensino privado e de qualidade, não foram bem sucedidas.
O Requerente propôs a mudança dos menores para a Escola J…, na Estrela, indicando os méritos e vantagens dessa opção.
Com a petição juntou 8 documentos

Citada a progenitora, nos termos e para os efeitos do artº 44º do RGPTC, a mesma opôs-se à pretensão do Requerente. Afirmou, em suma, que as crianças estão bem adaptadas à escola que frequentam, pretendendo que ali se mantenham no próximo ano escolar.

Foi realizada conferência de pais, com audição de ambos, não tendo, contudo, sido obtido acordo.
No sentido de obter elementos adicionais que habilitassem o Tribunal a tomar uma decisão provisória nos termos do artº 28º RGPTC, foram os progenitores, através dos seus mandatários, convidados a juntar elementos documentais - a que os mesmos corresponderam - e foram oficiosamente determinadas diligências de recolha de informação junto da escola frequentada pelas crianças e da escola proposta pelo pai.

A Exmª Procuradora junto do Juízo de Família e Menores de Lisboa, foi de parecer que as crianças deveriam frequentar a escola J…, na Estrela, pugnando pela prolação de decisão provisória ao abrigo do artº 28º do RGPTC.

Foi então proferida decisão, com o seguinte dispositivo:
«Pelo exposto, decido que as crianças X e Z, no ano letivo de 2024/2025, irão frequentar a Escola J…, confirmando-se a inscrição efectuada pelo pai nesta escola».

Inconformada, veio a Requerida interpor o presente recurso de apelação, extraindo das suas alegações as seguintes
Conclusões
«I. O artigo 411.º do CPC estabelece um "poder-dever" do juiz que não se limita à prova de iniciativa oficiosa, como se conclui do segmento "mesmo oficiosamente", incumbindo-lhe realizar ou ordenar as diligências relativos aos meios de prova propostos pelas partes, na medida em que necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, preservando sempre o necessário equilíbrio de interesses, critérios de objetividade e uma relação de equidistância e de imparcialidade.
II. Quando o interesse do menor exija uma postura mais cuidadosa sobre alguma das matérias ou a articulação da decisão com as demais medidas em curso em processos apensos relativo ao mesmo menor, pode o tribunal sustar na decisão até obter resposta dos serviços que permita alcançar solução que seja benéfica para o menor.
III. A omissão de diligência probatórias cruciais para uma decisão acertada (ainda que seja ou fosse uma decisão provisória) configuraram uma nulidade processual.
IV. A omissão de diligências requeridas influi no exame e decisão da causa e, como tal, configura nulidade secundária.
V. Face à omissão de formalidade imposta por lei e reportando-se a mesma à ausência de produção de meios de prova requeridos por uma das partes no processo, não pode deixar de concluir-se no sentido de que o tribunal recorrido incorreu em nulidade secundária relevante, por poder influir na decisão da causa (cf. art. 195º, nº1 do CPC), nulidade processual esta que se projeta na decisão recorrida e a inquina enquanto tal.
VI. Tendo-se revelado com a decisão da causa, a nulidade pode ser invocada em sede de recurso da mesma.
VII. Sendo conhecida e verificada a nulidade a sentença deve ser anulada e, por conseguinte, também todos os atos subsequentes devem ser anulados.
VIII. Por juízos de razoabilidade e com a bitola de homem médio colocado naquela real situação somos forçados a concluir que nenhum pai permitiria a manutenção do seu filho durante 06 anos numa escola cujo método ou plano educativo não corresponda às suas intenções e escolhas.
IX. Pelo que deve ser dado como provado que a inscrição das crianças numa escola aí permanecendo vários anos, assentou num projeto educativo dos pais para os filhos.
X. Tendo a criança já tido visita à sala do próximo ano letivo/uma sessão de preparação para a transição é muito violento emocionalmente agora impor-lhe nova escola, frustrando-lhe, sem mais, as expectativas e a preparação que lhe já vem sendo feita.
XI. Foi dado como provado que “O X não frequentou no ano lectivo agora findo o 1º ano por ter necessidade de aperfeiçoar a língua inglesa, a fim de poder acompanhar todos os conteúdos lecionados”, mas encontra-se provado documentalmente, pelo Relatório enviado pela Escola acerca do X, junto aos autos, o inverso!
XII. As crianças estão bastante integradas, estáveis e com bom aproveitamento, com amigos e boas relações na escola que integram algo que levará uma rutura enorme ao serem transferidos (injustificadamente, reitere-se) para outra escola totalmente díspar.
XIII. A decisão de mudança de escola para outra cujo método de ensino é totalmente díspar só bem fundamentada e com parecer psicológico sobre o possível impacto da mudança pode ser tomada, não sendo comparável à mera mudança de ano escolar, como relaciona por semelhante, erroneamente a nosso ver, o Tribunal a quo.
XIV. É mais benéfico para os menores um maior contacto escolar com a língua inglesa do que com a língua portuguesa (desde que haja ensino desta língua), porquanto é um facto notório que a língua inglesa é a língua universal e que os menores em apreço não estão a ela predispostos fora da escola, ao contrário do Português que têm contacto ao falar com o pai e com todo o Portugal: se forem com os progenitores a um café, restaurante, supermercado, biblioteca, teatro, etc, em Portugal, a língua que ouvirão e desenvolverão naturalmente é o Português.
XV. Não se justifica optar por outra escola (e induzir toda uma mudança e quebra de relações, hábitos e rotinas) com base no menor custo das prestações quando a conta do ex-casal tem cerca de €150.000,00, podendo ser afetos a essa despesa, ambos os pais vão comparticipar a despesa (porque ambos laboram), sendo que um dos pais auferem €15.500,00 mensais, pois tal não se coaduna com o superior interesse dos menores.
XVI. O facto da residência dos menores (e dos seus pais, naturalmente) terem mudado, mas mantendo-se no mesmo concelho, não é causa bastante para uma mudança de escola dos menores, muito menos quando a escola para onde se pretende inscrever é dotada de um método díspar da que os menores vêm sendo habituados desde sempre.
XVII. Mais 05 ou 10 minutos de deslocação para chegar à escola, sopesadas todas as demais circunstâncias, não é causa justificativa para induzir mudança de escola com nova ambientação dos menores, muito menos para uma escola totalmente díspar no seu método.
XVIII. Não pode ser admissível que se decida alterar a escola porque é mais cómodo para o(s) pai(s), quando isso implica que as crianças sejam confrontadas com todo um processo de adaptação instável, quando a sua vida pessoal, familiar, ainda está instável e a sarar o seu estado emocional do pós-separação dos pais.
XIX. O critério orientador da decisão do Tribunal tem de ser o interesse superior da criança (e não o interesse de qualquer dos pais, que apenas deve ser considerado na justa medida em que se mostre conforme àquele).
XX. Na densificação do conceito indeterminado de “superior interesse da criança” deve adotar-se a solução mais ajustada ao caso concreto, de modo a oferecerem-se melhores garantias do seu desenvolvimento físico e psíquico, do seu bem-estar e segurança e da formação da sua personalidade.
Nestes termos e nos mais de direito, deve o presente recurso ser declarado totalmente procedente, julgando-se verificadas as nulidades apontadas e anulando a decisão recorrida e todos os atos em função dela praticados, ordenado ainda ao Tribunal a quo a prática dos atos omitidos antes de proferir nova decisão, ou, caso V. Ex.ªs assim não entendam, o que por mero dever de patrocínio se equaciona, deve ser revogada a Decisão proferida em sede do Tribunal a quo, por manifesto erro de julgamento, substituindo-a por outra que ordene a manutenção dos menores na instituição M…, escola que os menores frequentaram desde o início do seu percurso académico até à presente data, como é de inteira JUSTIÇA.»

O Recorrido contra-alegou pugnando pela confirmação do julgado, alinhando as seguintes
Conclusões
 «I.Dá o Requerente / Apelado aqui por expressamente reproduzido quanto se disse supra em sede do requerimento de apresentação de contra-alegações e resposta ao convite do Douto Tribunal a quo para pronúncia sobre o pedido de atribuição de efeito suspensivo ao presente recurso formulado pela Requerida / Apelante, propugnando, pelos fundamentos aí expostos, que ao presente recurso não pode, nem deve, ser conferido efeito suspensivo;
II. O Apelado adere integralmente ao teor da, aliás, Mui Douta, decisão provisória proferida nos presentes autos, entendendo que o conteúdo da tal decisão é, por si só, suficiente para se considerar improcedente o presente recurso, mantendo-se a decisão ;
Em todo o caso, tendo em conta a argumentação plasmada nas alegações e conclusões de recurso da Requerida Apelante, sempre se dirá
- Das “alegadas” nulidades
III. Salvo o devido respeito, das alegações a que se responde não ressalta com exactidão que concretas nulidades e irregularidades a Requerida Apelante assaca à decisão recorrida, sendo certo em todo o caso que, como veremos, a decisão provisória aqui recorrida não padece de qualquer nulidade;
IV. A maioria da jurisprudência citada pela Requerida nas suas alegações reporta-se a situações, de facto e de direito, diversas da que nos ocupa, tendo pouca ou nenhuma aplicação ou relevância para os presentes autos;
V. Estamos perante uma decisão proferida ao abrigo do artigo 28.º do RGPTC, conforme o Douto Tribunal a quo, desde o primeiro despacho proferido nos presentes autos, informou as partes que viria (eventualmente) a proferir– Cfr. Despacho de 15/04/2024, com a referência 434498037;
VI. No âmbito de um processo tutelar cível para suprimento da falta de acordo entre os progenitores sobre questão de particular relevância para os menores, processo de jurisdição voluntária, em que os Tribunais gozam de ampla margem de discricionariedade e não estão vinculados a critérios normativos, de legalidade estrita, mas sim a critérios de conveniência e oportunidade – Cfr. artigos 12.º do RGPTC e artigos 987.º do Código de Processo Civil;
VII. Em sede de conferência de pais, o Douto Tribunal a quo confirmou que iria proferir uma decisão provisória ao abrigo do artigo 28.º do RGPTC, deu oportunidade às partes para aos autos juntarem prova documental que entendessem necessária e oficiosamente requereu produção de mais prova, designadamente notificando as escolas para virem apresentar determinados elementos – Cfr. Despacho proferido em conferência de pais no dia 06/06/2024, constante de respectiva Acta;
VIII. De todos estes trâmites e despachos ficaram as partes cientes ao longo do processo, designadamente com a notificação dos despachos de 15/04/2024 e de 06/06/2024 (na conferência de pais), tendo nessa sequência junto aos autos diversos elementos documentais, assim como a Escola J…;
IX. Após o que o processo foi com vista à Digna Magistrada do Ministério Público, que promoveu que os menores frequentem por ora (leia-se, no ano ano lectivo que ora se iniciou) a Escola J… na Estrela, devendo ser proferida decisão provisória, ao abrigo do disposto no artigo 28.º do RGPTC;
X. A Requerida na sua Contestação requereu, ao abrigo do n.º 3 do artigo 44.º do RGPTC, fosse oficiada a psicóloga do X para apresentar parecer/relatório do seu acompanhamento (cfr. petitório da Contestação), tendo ademais arrolado duas testemunhas e pedido a audição do menor X, defendendo agora que o Tribunal a quo deveria ter procedido às ditas diligências probatórias ou, pelo menos, ter proferido despacho quanto às mesmas (admitindo-as ou rejeitando-as) – não pode concordar-se;
XI. Não há qualquer omissão no que respeita aos meios de prova requeridos, uma vez que, conforme ficou muito claro, a decisão sub judice é uma decisão provisória tomada ao abrigo do artigo 28.º do RGPTC e não a decisão final / sentença do processo tutelar cível para suprimento de falta de acordo entre os progenitores proferida nos termos do n.º 3 do artigo 44.º do referido diploma legal;
XII. O que o Requerente veio pedir no presente processo tutelar cível para resolução de diferendo entre os progenitores foi a mudança da escola dos menores a partir de Setembro de 2024, questão esta ainda não definitivamente resolvida – o Tribunal terá que tomar uma decisão definitiva quanto à escola a frequentar pelos menores no futuro e, para esse efeito, os autos prosseguirão, conforme afirmado pelo Douto Tribunal a quo, e serão seguidos os trâmites processuais legalmente previstos designadamente a nível da produção de prova (sua admissão e produção);
XIII. Sucede que, a título provisório, oficiosamente e ao abrigo do artigo 28.º do RGPTC, o Tribunal a quo decidiu que no próximo ano lectivo, ie, apenas no ano lectivo 2024/2025, os menores frequentarão o estabelecimento de ensino J… na Estrela;
XIV. O Tribunal a quo exerceu devidamente o seu poder-dever decorrente do princípio do inquisitório, ao contrário do que defende a Requerida, tendo convidado as partes (que ouviu em conferência de pais) a juntar os elementos documentais quanto aos projectos educativos das escolas (e demais mais-valias que entendessem relevantes) e mais tendo oficiado directamente os estabelecimentos de ensino para que viessem juntar aos autos elementos adicionais que o Tribunal reputava necessários para a decisão provisória;
XV. Muniu-se, assim, o Tribunal a quo dos elementos aptos à elucidação da factualidade controvertida que a decisão provisória em causa implicava, tendo cumprido integralmente o disposto no artigo 28.º do RGPTC;
XVI. Importa salientar que a Escola M… não respondeu ao ofício que lhe foi remetido pelo Tribunal, não tendo apresentado as informações que lhe foram solicitadas;
XVII. E que a própria Requerida, convidada a apresentar ao Tribunal elementos documentais quanto ao projecto educativo da Escola M…. (planos de estudo, projecto educativo, ocupação de tempos livres, outras mais valias que considerem relevantes para a instrução dos seus filhos bem como a indicação do montante monetário a despender no âmbito dessa frequência) optou por não o fazer (parcialmente) e ainda afirmou que, na verdade, a informação referente às disciplinas ministradas na Escola era irrelevante – Cfr. requerimento de 09/07/2024 (com a as referências 39889650 (no histórico do citius) e 49432482 (na peça processual) – donde resulta que a Requerida não envidou, ao contrário do que afirma, todos os esforços probatórios;
XVIII. Face ao exposto, conclui-se facilmente que não se verifica, ao contrário do que pretende a Requerida Apelante, qualquer nulidade processual secundária que possa influir na decisão de causa decorrente da denegação de produção de prova que requereu ao abrigo do n.º 3 do artigo 44.º; Ainda que assim não se entendesse (o que por mero dever de patrocínio, sem conceder, se admite),
XIX. Ficou patente e claro para todos os presentes e foi devidamente notificado às partes em sede de conferência de pais, que o Tribunal a quo iria proferir uma decisão provisória e para o efeito convidava as partes a prestar determinados esclarecimentos que entendessem relevantes quanto aos estabelecimentos de ensino que preferiam para os seus filhos menores e ordenava que fossem oficiadas as escolas para prestar também determinados esclarecimentos, após o que as partes teriam cinco dias para se pronunciar sobre tais elementos. Depois, o processo deveria ir com vista ao MP e, após, ser aberta conclusão para prolação da dita decisão provisória;
XX. É manifesto que o Tribunal a quo de forma transparente e clara comunicou às partes com que elementos iria basear-se para proferir a decisão provisória e que a Requerida tinha perfeito conhecimento desde a data em que decorreu a conferência de pais (06/06/2024) e foi notificada do despacho acima mencionado, que não iria, nesta fase e para efeitos da decisão provisória que o Tribunal decidira tomar, ser produzida qualquer outra prova, designadamente a prova testemunhal requerida pelas partes no requerimento inicial e na contestação apresentada pela Requerida ao abrigo do artigo 44.º do RGPTC, nem a notificação à psicóloga que acompanha o menor X, nem a audição do mesmo, conforme igualmente peticionado pela Requerida na sua contestação;
XXI. Não pode deixar de considerar-se que, ainda que se entendesse ter-se verificado omissão de acto ou formalidade que a lei prevê (mormente a produção da prova requerida ou, pelo menos, a prolação de despacho de admissão ou rejeição de meios de prova), há muito decorreu o prazo para alegação de tal suposta nulidade – tal suposta omissão não está ao coberto desta sentença, mas sim do despacho proferido em sede de conferência de pais, sendo desprovida de verdade ou qualquer sentido a afirmação da Requerida de que apenas com a decisão recorrida se apercebeu das irregularidades (alegadamente) cometidas;
XXII. Ao contrário do que alude a Requerida Apelante, a decisão provisória sub judice encontra-se fundamentada quer em sede de facto quer em sede de direito – entende-se por falta de fundamentação a ausência absoluta de fundamentação o que in casu manifestamente não sucede. No caso em apreço não sucede sequer que a fundamentação seja deficiente, incompleta ou não convincente;
XXIII. O Douto Tribunal a quo procedeu ao exame crítico das provas, tendo analisado as declarações das partes (sopesando também quanto já haviam dito nos seus requerimentos) e os documentos juntos aos autos, incluindo aqueles que vieram a ser juntos pela Escola J… (uma vez que a Escola M…, como vimos, apesar de devidamente oficiada nesse sentido, não veio esclarecer aos autos os valores das inscrições e mensalidades para o ano lectivo de 2024-2025 nem qual a componente de ensino de língua portuguesa na escola, em que moldes se processa, carga horária, conteúdos, etc.);
XXIV. As provas carreadas para os autos foram analisadas de forma crítica, conjunta e lógica, pelo Tribunal a quo que, de forma clara, espelhou na sua decisão a motivação da decisão de facto que tomou – conhecem-se perfeitamente as premissas em que se baseou o Tribunal a quo para fixar provisoriamente que os menores frequentarão no próximo ano lectivo a Escola J…da Estrela;
XXV. Alvitra, ainda, a Requerida (embora não elabore…) que o Tribunal a quo deveria, na decisão provisória recorrida, ter remetido as partes para mediação ou audição técnica especializada, ao abrigo do artigo 38.º do RGPTC – não só não se concorda com tal entendimento, como não se pode aceitar a alegação de tal matéria em sede deste recurso;
XXVI. Como vimos, o Tribunal a quo, sem prejuízo do prosseguimento dos autos, decidiu oficiosamente proferir uma decisão provisória ao abrigo do artigo 28.º do RGPTC, disso tendo dado conhecimento às partes ab initio, e, em sede de conferência de pais, o Tribunal a quo proferiu despacho nesse sentido, tendo ordenado todas as diligências que, ao abrigo da Lei e em cumprimento do inquisitório, entendeu convenientes para se munir dos elementos necessários a tal tomada de decisão, e tomou declarações às partes;
XXVII. Nesse despacho e para efeitos da decisão provisória, o Tribunal decide de forma clara que, após a recepção dos elementos solicitados e do contraditório das partes, o processo deverá ir com vista ao MP e, após, deverá ser aberta conclusão. Sem mais;
XXVIII. Se a Requerida entende que as partes deveriam ter sido encaminhadas para mediação familiar ou audição técnica especializada ou, caso o Tribunal entendesse ser de dispensar tais diligências, imediatamente notificadas para apresentação de alegações e meios de prova, tendo em conta que é na conferência de pais que tais diligências são, por lei, ordenadas (cfr. artigo 38.º do RGPTC), era na sequência da conferência de pais que teve lugar no dia 06/06/2024 (nos dez dias imediatamente subsequentes) que a Requerida deveria ter alegado uma irregularidade por omissão de acto ou formalidade que a lei prescreve e que seria susceptível de influir na decisão da causa, o que a Requerida não fez;
XXIX. É absolutamente extemporânea a alegação dessa suposta irregularidade, a qual, de resto, se entende não se verificar, porquanto o Tribunal a quo acautelou que os autos prosseguirão, pelo que serão assegurados tempestivamente todos os legais trâmites;
XXX. Improcede totalmente a imputação de alegadas nulidades à decisão provisória objecto do presente recurso;
- Dos alegados erros de julgamento
XXXI. A Requerida Apelante defende que o Tribunal deveria ter dado como provado o facto que fez constar como n.º 1 dos Factos Não Provados, ou seja, que a inscrição das crianças na escola M… assentou num projeto educativo dos pais para os filhos, no entanto, não indica qualquer meio de prova ou fundamento concreto para o seu pedido de que seja alterada a resposta dada à esta matéria;
XXXII. Requerida Apelante limita-se a discorrer por vários parágrafos sobre o método alternativo da Escola M…, para concluir, em suma, que se o Requerente permitiu a inscrição dos menores naquela escola vários anos (afirmando que o X a frequentou por seis anos, o que, de resto, não corresponde à verdade, pois apenas ingressou com três anos e tem agora sete acabados de completar em Agosto de 2024), era porque concordava com o respectivo método de ensino e plano educativo, chegando a imputar malícia ao Requerente por pretender mudar os menores de escola;
Sucede que,
XXXIII. Em primeiro lugar e conforme consta da decisão recorrida, aquando da inscrição do menor X na Escola M…, ainda situada em Campo de Ourique, a mesma não tinha ainda primeiro ciclo, tratando-se apenas de pré-escolar, pelo que tal escolha dos pais era evidentemente apenas para o pré-escolar, sendo que não era sequer possível a essa data para o Requerente Apelado conhecer os métodos de ensino e planos curriculares para o primeiro ciclo de uma escola que apenas tinha pré-escolar…
XXXIV. O Requerente foi claro nas suas declarações no sentido de esclarecer que, aquando da escolha daquela escola, pesou o facto de ser em Campo de Ourique, perto da casa de morada de família, e que a decisão era apenas para o pré-escolar;
XXXV. Conforme resulta do requerimento que deu início ao presente processo, as razões que fundamentam a pretensão do Requerente de alterar os menores de estabelecimento de ensino centram-se efectivamente no bem-estar dos mesmos e no acautelar do seu superior interesse, designadamente a nível da sua educação e da sua estabilidade:
XXXVI. Com a mudança de estabelecimento de ensino nesta fase evita-se uma transição de um método alternativo para um método dito tradicional a meio de um ciclo – o X ingressou agora no primeiro ano do primeiro ciclo já numa nova escola e a Z ingressou no pré-escolar dessa mesma escola, após as férias, numa altura absolutamente normal para milhares de crianças transitarem de ciclo, de escola, de professores, etc.;
XXXVII. A escola anteriormente frequentada pelos menores mudou de instalações, deixando de ser no bairro onde vivem os menores, quer com a mãe quer com o pai, passando para outra zona de Lisboa, implicando trajectos com trânsito por vezes deveras demorado conforme ficou demonstrado (e, ao contrário do que defende a Requerida, não se trata de diferenças de 5 ou 10 minutos) e implicando igualmente que os menores se levantem de madrugada para conseguir chegar a horas à escola;
XXXVIII. O Requerido manifestou preocupação, igualmente, pelo facto de a escola anteriormente frequentada pelos menores ser deveras dispendiosa (quase quatro vezes superior ao valor pago na Escola J…da Estrela) e, sendo o único pagador e tendo um remuneração mensal que poderá em qualquer momento vir a ser significativamente reduzida (por ocupar presentemente um cargo de nomeação), existir o risco sério e real de, inclusivamente a meio de um ciclo, os menores terem que transitar para outro estabelecimento de ensino, eventualmente um estabelecimento de ensino público, onde todo o ensino seria feito em Português como primeira língua, transitando de um método de ensino alternativo e quase exclusivamente em inglês;
XXXIX. Acrescem ainda a estas preocupações questões relacionadas com as férias escolares e o horário da escola que não se compaginam com a vida profissional de alguém que trabalha a tempo inteiro como é o caso do Requerente e, de acordo com o que afirma a Requerida, será também o seu caso em breve;
XL. A escola escolhida pelo requerente tem um horário mais alargado, com diversas actividades extracurriculares para os menores, com valores de mensalidade acessíveis e ensino em inglês, quer no plano curricular quer como actividade extracurricular e situa-se a poucos minutos da casa de cada um dos progenitores
XLI. A questão da mudança de escola dos menores há muito era controversa entre os pais (Vd. Relatório da Audição Técnica Especializada datado de Agosto de 2022 - Apenso C - Regulação das Responsabilidades Parentais em que se refere expressamente que não há acordo em relação à possibilidade de se manter aquela escola no primeiro ciclo) e, não logrando resolvê-la por acordo (ante a recusa em sequer discutir o assunto por parte da Requerida), o Requerente propôs o presente processo;
XLII. Deve, pois, manter-se o ponto 1. dos Factos Não Provados, inexistindo qualquer elemento nos autos que justifique a alteração desta matéria, estando devidamente sustentada a decisão do Tribunal a quo neste conspecto;
XLIII. A Requerida Apelante defende, ainda, que o Tribunal deveria ter dado como provado o facto que fez constar como n.º 2 dos Factos Não Provados, ou seja, que a indicada escola é a que melhor se adapta às caraterísticas das crianças, sendo que similarmente à pretensão de alteração do n.º 1 dos factos não provados, a Requerida Apelante não indica qualquer meio de prova ou fundamento concreto para o seu pedido de que seja alterada a resposta dada à esta matéria;
XLIV. A Requerida Apelante limita-se a discorrer por vários parágrafos, novamente, sobre o método alternativo da Escola M…, sobre os menores aí estarem integrados e insistindo numa série de falsidades já inúmeras vezes repetidas, como seja, o suposto incidente de auto-mutilação da Z – por uma questão de economia processual, remete-se para quanto se disse sobre tal questão no requerimento de 28/06/2024, com a referência 49344541, artigos 59.º a 69.º, e para os documentos então juntos, tudo se dando aqui por integralmente reproduzido;
XLV. Afirma a Requerida que a psicóloga do X lhe teria veiculado recomendações quanto à manutenção do X na Escola M, trazendo novamente à colação o facto de a referida psicóloga não ter sido notificada para apresentar parecer;
XLVI. Em primeiro lugar, o usual em processos desta natureza é os progenitores apresentarem os relatórios que, a seu pedido, sejam emitidos pelos psicólogos que escolheram para acompanhar os menores (constituem actos próprios dos psicólogos a avaliação e a intervenção psicológicas e a elaboração de relatórios vários e, tratando-se de menores, os mesmos são entregues aos seus progenitores);
XLVII. A Requerida não apresentou relatório algum, requerendo simplesmente ao Tribunal que a psicóloga que acompanha o X (apenas o X e não ambos os menores, conforme a Requerida em certos momentos pretende fazer crer) fosse oficiada para apresentar relatório do seu acompanhamento, indicando concretamente o seu estado emocional, se o mesmo está inserido na escola e o impacto que a mudança lhe pode trazer nesta altura (afirmando que a mesma se recusa a emitir um relatório, salvo se tal lhe fosse solicitado pelo Tribunal);
XLVIII. Porém, ninguém pôs em causa que os menores estivessem inseridos na escola que anteriormente frequentavam, pelo que seria irrelevante quanto a esse respeito pudesse vir dizer a psicóloga do X e quanto ao demais, tratar-se-ia de um exercício de mera prognose sobre a forma como o X lidaria com a mudança de escola;
XLIX. Sendo certo que, como sabemos, a mudança de estabelecimento de ensino é algo por que todas as crianças e jovens passam, várias vezes, ao longo da sua vida. E, se pode constituir um desafio (sem dúvida), é também uma oportunidade de crescimento, aprendizagem e aquisição e ferramentas que prepararão os menores para o futuro que, sabemos, é incerto e pleno de mudanças (por vezes, mais abruptas e disruptivas do que uma mudança de escola);
L. Certo é que o Tribunal não é obrigado a ouvir os psicólogos que a nível particular o pai ou a mãe ou ambos os progenitores tenham escolhido para acompanhar os menores. Caso entenda necessária uma avaliação psicológica aos menores pode e deve o tribunal ordenar seja a mesma feita por meios à disposição do Tribunal – perícias médico-legais de psicologia;
LI. Sempre se diga ademais, no que à pretendida audição do X concerne, que, como é consabido, a vontade que possa ser expressa pelos menores (sempre relevante, naturalmente) pode não corresponder ao seu melhor interesse – e é esse superior interesse que deve subjazer à decisão do Tribunal. Neste caso, estamos perante um menor com (à data) seis anos de idade que, pretendia a Requerida, seria ouvido sobre uma mudança para outro estabelecimento de ensino. Não é de todo expectável que a audição do X viesse a revelar-se relevante para a tomada de decisão aqui em causa;
LII. A Requerida, em bom rigor, parece sustentar a necessidade de alteração dos pontos 1 e 2 dos Factos Não Provados, no sentido de que para os menores é imprescindível manterem-se na escola M, no facto de os mesmos sempre a terem frequentado desde os 3 anos de idade e porque, apresentando esta um método alternativo de ensino, os menores teriam grandes dificuldades em adaptar-se a outra escola. Seria, porém, absurdo admitir que, a partir do momento em que uma criança, ainda em idade pré-escolar, ingressasse num estabelecimento de ensino M, nunca mais poderia dele sair e frequentar outra escola privada ou pública com um método de ensino diferente…
LIII. É, pois, por demais evidente, que deve manter-se o ponto 2. dos Factos Não Provados, inexistindo qualquer elemento nos autos que justifique a alteração desta matéria, estando devidamente sustentada a decisão do Tribunal a quo neste conspecto;
LIV. A Requerida Apelante defende, ainda, que o Tribunal deveria ter dado como não provado o facto que fez constar como n.º 7 dos Factos Provados, ou seja, que o X não frequentou no ano letivo agora findo o primeiro ano por ter necessidade de aperfeiçoar a língua inglesa a fim de poder acompanhar todos os conteúdos lecionados;
LV. Resulta, do Relatório da escola M que, efectivamente, o menor X necessitava de, conforme consta da decisão recorrida, “aperfeiçoar a língua inglesa” para poder integrar o “Elementary program” (primeiro ciclo), uma vez que aí se afirma que A principal área de melhoria e foco para o X no final do ano académico de 2023 foi apoiar suas aptidões de leitura (em inglês, evidentemente);
LVI. É manifesto, pois, que a decisão de facto vertida no ponto 7. dos factos provados na decisão recorrida é correcta e está devidamente alicerçada no relatório da própria escola, bem como nas afirmações do Requerente com base nas informações que verbalmente lhe foram transmitidas pela escola (conforme alegado no requerimento inicial). Deve pois manter-se inalterada;
LVII. No mais das suas alegações, veio a Requerida novamente insistir numa série de afirmações falsas ou deturpadas, como sejam que o Requerente aufere um salário milionário, de €15.500,00 mensais, quando está demonstrado nos autos (Cfr. Doc. n.º 3 do requerimento inicial) que o Requerente aufere a remuneração mensal líquida de €6.244,50;
LVIII. Afirma a Requerida que existem €150.000,00 nas poupanças do outrora casal – esclareça-se que ditas poupanças (que nem sequer se aproximam de tal valor!) não chegam para pagar mais de dois anos lectivos, ou seja, com base nesse valor, nem sequer o X conseguiria terminar o ciclo de três anos (muito menos a Z);
LIX. O Requerente não pode concordar com esta postura da Requerida, no sentido de querer gastar todo o “pé-de-meia” que possuem em dois anos de mensalidades de uma Escola, após o que ficariam sem quaisquer poupanças para fazer face uma eventualidade e sem meios económicos para manter os menores na escola, tendo os mesmos de transitar para outro estabelecimento a meio do ciclo de ensino…
LX. Os pais do X e Z não têm meios económicos que lhes permitam prover pelo seu sustento e pelo dos menores (dois arrendamentos, consumos de água, electricidade, telecomunicações, alimentação e higiene…) e ainda pagar cerca de €25.000,00 por ano pelo estabelecimento de ensino;
LXI. Pese embora a Requerida afirme que já encetou vida profissional, certo é que mantém um pedido de alimentos definitivos contra o Requerente, não demonstrou nos autos o efectivo recebimento de qualquer quantia como remuneração da sua carreira de Coaching e apresentou o que aparenta ser uma mera proposta de emprego, sem data de início, com um valor mensal que não chega, sequer, para pagar a renda da sua casa e os respectivos consumos, quanto mais mensalidades de uma escola na ordem dos €2.000,00 (já nem mencionando as despesas com alimentação e higiene…);
LXII. Em face do exposto, resulta de forma cristalina, que o Tribunal a quo julgou bem e fundamentadamente a matéria de facto e tomou a decisão provisória sub judice tendo em conta o superior interesse dos menores X e Z, ponderando todos os factores inerentes às suas idades e fases escolares (o X ingressa no primeiro ano e a Z no pré-escolar, após as “férias grandes”), residência e localização da escola, programa curricular (incluindo as línguas Portuguesa e Inglesa, como segunda língua), actividades extracurriculares, bem como factores complementarmente relevantes (e imprescindíveis) como o custo das mensalidades vs rendimentos dos pais;
LXIII. Não existem decisões “perfeitas” e todas as soluções apresentarão benefícios e inconvenientes. No entanto, o certo é que a decisão proferida e aqui recorrida é, indubitavelmente, a que, neste momento, melhor acautela os interesses dos menores X e Z, pelo que deve ser confirmada, improcedendo a Apelação e mantendo-se a decisão provisória proferida pelo Douto Tribunal a quo, a qual não padece de qualquer nulidade nem de qualquer erro de julgamento;
Nestes termos e nos mais de direito, deve ser considerado totalmente improcedente o recurso apresentado pela Requerida Apelante, mantendo-se a decisão recorrida, só assim sendo possível que, como se impõe, em concreto, se cumpra a lei, produzindo-se DIREITO e fazendo-se triunfar a verdadeira JUSTIÇA!»
*-*
Colhidos os vistos, importa apreciar e decidir.
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O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das partes, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cfr. artºs 635º nº 4, 639º nº 1 e 662º nº 2, todos do Código de Processo Civil), sendo que o Tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes e é livre na interpretação e aplicação do direito (cf. artº 5º nº 3 do mesmo Código).

No caso – tendo sido oportunamente decididas por despacho da Relatora as questões relativas à tempestividade das contra-alegações e ao efeito do recurso – as questões a decidir consistem em saber:
- Se ocorre nulidade processual por omissão de produção de meios de prova, uns requeridos e outros que deveriam ser oficiosamente determinados, reflectindo-se na sentença, sendo sindicável por via do recurso,
- Se deve ser alterada a matéria de facto,
- Se deve ser revogada a decisão de 1ª instância, com manutenção dos menores na escola M, que vinham frequentando.

II – FUNDAMENTAÇÃO
A) DE FACTO
Na sentença sob recurso foi considerada a seguinte a factualidade:
Factos Provados
«1. A e B são pais de X (6 anos) e Z (3 anos).
2. Na sequência da separação dos progenitores as crianças passaram a residir em períodos de tempo alternados e sucessivos junto de cada um dos pais.
3. Os pais residem em Campo de Ourique.
4. As crianças frequentam a Escola M, actualmente situada na Avenida …. em Lisboa.
5. Aquando da entrada[1] das crianças na indicada escola a mesma situava-se em Campo de Ourique e apenas tinha ensino pré-escolar.
6. As crianças estão bem-adaptadas à indicada escola.
7. O X não frequentou no ano lectivo agora findo o 1º ano por ter necessidade de aperfeiçoar a língua inglesa, a fim de poder acompanhar todos os conteúdos lecionados.
8. A indicada escola tem ensino de língua portuguesa.
9. A Escola J situa-se junto do Jardim da Estrela.
10. A referida escola tem também ensino de língua inglesa.
11. A escola M teve em 2023/2024 o custo anual por criança de €12.500,00, incluindo as mensalidades (“Tuition Fees”), matrícula e alimentação.
12. As mensalidades para o ano lectivo 2024/2025 na escola J serão para X de 442,76 euros e para a sua irmã Z de 378,56 euros.»
Factos Não Provados
«1. A inscrição das crianças na escola M assentou num projecto educativo dos pais para os filhos.
2. A indicada escola é a que melhor se adapta às características das crianças.»

B) DE DIREITO
Da nulidade processual
A Recorrente invoca a verificação de nulidade processual, por omissão de produção de meios de prova, projectando-se na sentença e, por isso, entende ser a mesma sindicável por via do presente recurso.
Para tanto alega ter requerido ao Tribunal que notificasse a psicóloga do menor X para emitir parecer/relatório acerca do seu estado emocional, da sua inserção na escola e do impacto que a mudança de estabelecimento de ensino e de método de ensino lhe pode trazer nesta fase da vida, e requereu a inquirição de duas testemunhas: a psicóloga do menor X e a professora das crianças e, ainda, a audição do menor X; requerimentos de meios de prova sobre os quais o Tribunal a quo não se pronunciou e não produziu, acrescendo que previamente à decisão não remeteu as partes para audição técnica especializada.
A Recorrente faz apelo ao disposto no artº 195º nº 1 CPC, concretamente ao seu segmento que estabelece que a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva produzem nulidade quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.
A questão submetida a juízo, relativa à falta de acordo dos progenitores quanto à mudança de escola dos seus filhos, convoca o artº 44º do regime geral do processo tutelar cível (doravante RGPTC), pois é pacífico na doutrina e na jurisprudência que essa matéria constitui questão de particular importância.
Tratando-se de matéria regulada no RGPTC são-lhe, naturalmente, aplicáveis as disposições processuais comuns previstas no capítulo II desse regime, entre as quais se conta o artº 28º, segundo o qual em qualquer estado da causa e sempre que o entenda conveniente, a requerimento ou oficiosamente, o Tribunal pode decidir provisoriamente questões que devam ser apreciadas a final.
É por isso relevante, para aferir se ocorreu a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, bem como da potencial influência da apontada omissão de produção de meios de prova no exame ou decisão da causa, saber se estamos em presença de decisão provisória ou definitiva.
A sentença não o refere expressamente, nem nela há menção ao artº 28º do RGPTC. No entanto, a findar o respectivo relatório refere-se “Cumpre proferir desde já decisão, atenta a proximidade do novo ano lectivo…”, o que induz tratar-se de decisão destinada a acautelar no imediato a situação escolar dos menores, transparecendo a sua natureza provisória. Acresce, o que é especialmente relevante, que na conferencia de pais, realizada em 06/06/2024, foi proferido despacho do qual, entre o mais, consta “(…) Foram tomadas declarações a ambos [os pais] tendo os mesmos explanado as suas razões. Importa agora recolher elementos adicionais que possibilitem ao Tribunal desde já tomar uma decisão a título provisório, nos termos do art.28º do RGPTC, e sem prejuízo de posterior prosseguimento dos autos. Assim sendo, convido os progenitores, através dos seus ilustres mandatários, em 10 dias juntarem aos autos os elementos documentais que considerem pertinentes quanto aos respetivos projetos educativos (planos de estudo, projeto educativo, ocupação de tempos livres, outras mais valias que considerem relevantes para a instrução dos seus filhos bem como a indicação do montante monetário a despender no âmbito dessa frequência). Sem prejuízo do antecedente, oficie a escola onde as crianças estão no sentido de averiguar se, a partir do ingresso do ensino privado, existe a disciplina de língua portuguesa e se as demais aulas são ministradas ainda que parcialmente na nossa língua. Solicite igualmente a ambas escolas indicação de quais mensalidades previstas para o ano letivo 2024/2025 tendo em atenção o momento educacional de cada um dos irmãos. Junto aos autos estes elementos, tem os ilustres advogados prazo de 5 dias para se pronunciarem e após vão os autos com vista e conclusão”. (destaques nossos).
É, portanto, clara a natureza provisória da decisão que foi proferida, diga-se, após contraditório das partes sobre os elementos documentais juntos e após parecer da Exmª Procuradora no sentido de “…que as crianças deverão, por ora, frequentar a escola J, devendo ser proferida decisão provisória, ao abrigo do disposto no artº 28º do RGPTC”.
Ora, as decisões provisórias sobre a regulação das responsabilidades parentais ou acerca da resolução de questões conexas são prévias à produção de prova, designadamente a indicada pelos progenitores, conforme se extrai do artº 38º e do artº 28º nº 3 do RGPTC.
Como se diz no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de
04/06/2024, proc. 791/23.0T8CVL-D.C1, «Com vista à prolacção desta decisão [provisória] o juiz procede às averiguações sumárias que tenha por convenientes, devendo ouvir as partes, mas apenas quando a sua audiência não puser em sério risco o fim ou a eficácia da providência (cfr. art º28º nºs 3 e 4 do RGPTC). (…). Quer isto dizer, que mesmo a audiência dos progenitores dos menores pode ser dispensada quando puser em sério risco o fim ou a eficácia da providência tomada e que a prolacção de uma decisão de regulação provisória do poder parental, que se impõe ao magistrado no momento inicial do processo que visa a regulação definitiva destas responsabilidades parentais, não se compadece, nem exige, a prévia produção de prova.
Intentado processo tutelar civil para regulação das responsabilidades parentais do menor, impõe-se ao juiz que fixe um regime provisório, com consideração pelos interesses desta criança quando, citados para a conferência de pais, nos termos do disposto no artº 38 do RGPTC, não seja possível um acordo entre os progenitores. Regime este que na realidade é prévio a qualquer diligência de prova, conforme decorre expressamente deste preceito legal e do disposto no artº 28, nº 3 do RGPTC, do qual resulta que o Juiz procede “às averiguações sumárias que tiver por convenientes.”». E citando o Acórdão desta Relação de Lisboa de 11/12/2019, proc. 2425/18.6T8CSC-D.L1, naquele outro de Coimbra se diz que «a prolação de decisões provisórias é, nos termos do nº 1 do art. 28º do RGPTC apresentada como uma faculdade inserida no âmbito dos poderes de atuação oficiosa do Tribunal; contudo, do disposto no art. 38º do RGPTC decorre que no contexto do procedimento tutelar cível de regulação do exercício das responsabilidades parentais, tal decisão é obrigatória, devendo ser proferida na conferência de pais quando ambos os progenitores compareçam, e não cheguem a acordo que seja homologado.»
Posição a que aderimos e que é inteiramente válida para a situação em apreço, porquanto o artº 44º, que versa sobre a situação em presença, se insere na secção relativa à “Regulação do exercício das responsabilidades parentais e resolução de questões conexas” e remete para os termos previstos nos artºs 35º a 40º.
Pelo que, como também nesse acórdão se professa, só após a fixação de regime provisório é que se deve suspender a conferência e remeter as partes para (a) mediação, nos termos e com os pressupostos previstos no artigo 24º, por um período máximo de três meses; ou (b) audição técnica especializada, nos termos previstos no artigo 23º, por um período máximo de dois meses.
O artº 38º do RGPTC apresenta-se, pois, como uma norma especial que, não havendo acordo dos pais na conferência em que ambos estejam presentes ou representados, impõe ao juiz a prolação de decisão provisória que se baseia nos elementos já obtidos, que por norma assentam essencialmente nas declarações das partes nessa conferência, sem prejuízo de, por aplicação do princípio geral contido no artº 28º nº 3 do RGPTC, proceder a averiguações sumárias. Regime do qual decorre que a fase da produção de prova está reservada para momento posterior: aquele em que há-de ser proferida a decisão definitiva.
Por conseguinte, não houve omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva e, ainda menos, com influência no exame ou decisão da causa, porque a decisão sob recurso não tem natureza definitiva.
Improcede, assim, este segmento recursório.

Da alteração da matéria de facto
Insurge-se a Recorrente contra a circunstância de o Tribunal a quo ter dado como não provado que “1. A inscrição das crianças na escola M assentou num projecto educativo dos pais para os filhos.” e que “2. A indicada escola é a que melhor se adapta às características das crianças.”, bem como por ter dado por provado que “7. O X não frequentou no ano lectivo agora findo o 1º ano por ter necessidade de aperfeiçoar a língua inglesa, a fim de poder acompanhar todos os conteúdos leccionados”.
Pretendendo que sejam tidos por provados os dois factos que foram dados por não provados, a Recorrente discorre sobre as virtualidades do projecto educativo alternativo do M, o que nada aporta para infirmar os dois factos não provados, e no tocante ao facto não provado 1, em particular, defende que “…não é compaginável admitir que o pai dos menores permitiu a inscrição dos menores nessa escola vários anos (06 anos no caso do X) sem que concordasse com esse plano curricular e método de ensino para os filhos. Por juízos de razoabilidade e com a bitola de homem médio colocado naquela real situação somos forçados a concluir que nenhum pai permitiria a manutenção do seu filho em 06 anos numa escola cujo método ou plano educativo não corresponda às suas intenções e escolhas. Razoável será admitir que foi a decisão do casal enquanto estavam juntos …”.
Não podendo deixar de se destacar a inverosimilhança do mencionado período de 6 anos, apenas compaginável com a ida de X para a escola M recém-nascido, o que os autos revelam não ter ocorrido, o que sobressai da posição da Recorrente é que esta pretende ver dado por provado aquele facto com recurso às suas regras de lógica tendo por padrão o seu conceito de homem médio, mas sem que apresente fundamentos sustentados que revelem por que motivos as suas regras de lógica e o seu conceito sobre o juízo do homem médio devem ser acolhidos em detrimento da convicção formada pelo Tribunal a quo, o qual, aliás, na resposta a este facto não provado se socorreu de um elemento objectivo não refutado pela Recorrente, constando da motivação a este respeito que “O Requerente depôs de forma objectiva. Explicou os motivos pelos quais as crianças foram frequentar a escola M, explicando que tal decorreu em larga medida de se tratar de uma escola que ficava no bairro onde residem, Campo de Ourique. Na altura, a escola apenas tinha ensino pré-escolar”.
Parece claro que a colocação das crianças num estabelecimento de ensino apenas com o pré-escolar não se funda num projecto educativo, que por natureza assenta num plano de fundo, sustentável e duradouro, sendo outrossim cristalino das declarações do pai que a escolha da escola radicou essencialmente na sua localização próxima da residência.
Não existem, pois, motivos justificativos para a pretendida alteração do facto não provado 1.

Além da referida narrativa acerca das virtualidades do projecto educativo alternativo do M, que como dito nada oferece para afastar do elenco dos não provados os mencionados factos, adianta ainda a Recorrente em abono da sua posição quanto ao facto não provado 2 a seguinte argumentação:  (a) ficariam frustradas as expectativas e a preparação que vinha sendo feita ao menor X relativamente à sua ida para a sala do grau de ensino subsequente, pois participou do evento especial de visita à sala de aula do Ensino Fundamental M em preparação para a transição para este programa no ano seguinte – argumentação absolutamente inconsequente, desde logo porque a Escola M expressamente comunicou à Recorrente em 06/05/2024 que não aceitaria a reinscrição dos menores no ano lectivo 2024/2025 (cfr. fls. 5 do Relatório de Progresso, que na sua integralidade foi junto pelo Recorrido como doc. 1 com o seu requerimento de 28/06/2024 refª citius 39794170); (b) a necessidade de manter as crianças estáveis quando o ambiente familiar está hostil, funcionando a escola como elemento neutro – trata-se de argumento que em nada se relaciona com o facto não provado 2, não podendo deixar de se recordar que a haver ambiente familiar hostil devem os progenitores, antes de qualquer outra pessoa ou instituição, debelar as suas hostilidades de modo a garantir aos filhos um ambiente sereno e harmonioso; sendo que, em todo o caso, a escola, qualquer que ela seja, sempre constituirá um elemento neutro relativamente à eventual animosidade entre os pais; (c) no que respeita à menor Z a Recorrente crê que não esteja a saber lidar bem com a separação e com os diferendos dos pais, sendo necessário manter a sua estabilidade com professores e auxiliares que já a conhecem – mais uma vez não deixaremos de reiterar que aos pais cabe superar os seus diferendos para propiciar aos filhos um ambiente salutar e relacionamento de qualidade com ambos – e que estão mais atentos a todos os seus comportamentos para evitar situações como a do suposto incidente de auto-mutilação de Z – que não está de todo demonstrado tenha ocorrido; (d) e, embora sob outras vestes, volta a referir a não notificação da psicóloga do X para juntar o seu parecer, defendendo que apenas com parecer psicológico sobre o possível impacto da mudança poderia ser tomada a decisão – aspecto este que, repescando a questão da omissão de produção de prova requerida pela Recorrente, mostra-se já acima tratado, nada mais havendo a dizer a seu respeito a não ser que no final da conferência de pais estes foram notificados para juntar aos autos os elementos documentais que tivessem por pertinentes quanto aos respectivos projectos educativos, momento processual em que a Recorrida poderia ter apresentado os documentos que tivesse por necessários à demonstração da sua posição quanto a que as crianças se deveriam manter na escola M, nomeadamente juntando os relatórios que tivesse por adequados a esse desiderato, nomeadamente da psicóloga do menor X, pois, salvo o devido respeito, não é credível, face às regras do exercício e da deontologia  da profissão, a alegada recusa daquela em facultar à mãe relatórios sobre o X.
Além do argumentário aduzido não permitir, em si mesmo, dar por provado, como a Recorrente pretende, que “A indicada escola é a que melhor se adapta às características das crianças” porquanto nenhuma relação apresenta com este facto, acresce, como se viu, a ausência de valia de qualquer dos argumentos carreados, sendo os mesmos insusceptíveis de debelar a convicção do Tribunal a quo firmada em que “Os factos não provados assentaram na ausência de prova susceptível de permitir conclusão diversa. Na verdade, no que diz respeito à escolha do projecto educativo, teve-se em conta as declarações dos pais e, sem prejuízo da boa adaptação à escola actual, não resultou provado que a mesma seja especialmente indicada para qualquer das crianças.”
Deve, portanto, manter-se inalterado o facto não provado 2.

Pretende ainda a Recorrente que o facto provado “7. O X não frequentou no ano lectivo agora findo o 1º ano por ter necessidade de aperfeiçoar a língua inglesa, a fim de poder acompanhar todos os conteúdos leccionados”, seja dado por não provado.
Para tanto, invoca o Relatório enviado pela Escola M acerca do menor X, do qual apresenta alguns excertos.
Esse documento, que consiste no denominado Relatório de Progresso emitido pela Escola M, foi junto na sua integralidade como documento nº 1 do requerimento apresentado pelo ora Recorrido em 28/06/2024, do qual, além dos excertos de que a Recorrente se socorre, consta também que “The primary area for improvement and focus for X at the end of the 2023 academic year was to support his reading skills”; trecho que pela sua simplicidade e clareza não carece de tradução oficial (cfr. artº 134º nº 1 CPC a contrario) e que se pode traduzir por “A principal área de melhoria e foco para o X no final do ano lectivo de 2023 foi apoiar as suas capacidades de leitura”, em inglês, naturalmente, como bem se faz notar nas contra-alegações, pois como resulta dos autos os conteúdos são leccionados em inglês.
Por conseguinte, e sendo pacifico nos autos que o menor X à data de prolação da decisão não frequentara o 1º ano, afigura-se correcta a conclusão extraída pelo Tribunal a quo de que o “X não frequentou no ano lectivo agora findo o 1º ano por ter necessidade de aperfeiçoar a língua inglesa, a fim de poder acompanhar todos os conteúdos leccionados”.
É, pois, de manter inalterado o facto provado 7.

Improcede, portanto, totalmente a impugnação da matéria de facto.

Não obstante, o artº 662º nº 1 CPC estabelece que “A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”
O artº 662º CPC tem o seu especial campo de aplicação nos erros de julgamento de facto e dele, juntamente com o nº 6 do artº 663º, decorre que, sem prejuízo da iniciativa das partes nos termos do artº 640º e independentemente do êxito de tal iniciativa, o Tribunal da Relação, dentro dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova e quando encontre motivo para tal, deve introduzir na decisão de facto as modificações que se justificarem.
No caso vertente detecta-se uma insuficiência da matéria de facto fixada, porquanto releva para a decisão um aspecto factual alegado pelo Requerente (ora Recorrido) sustentado em documento por ele junto e que não foi objecto de impugnação, concretamente que “A Escola M expressamente comunicou à Requerida em 06/05/2024 que não aceitaria a reinscrição dos menores para o ano lectivo 2024/2025”.
Encontra-se este facto alegado, nomeadamente, nos artºs 15º e 16º do requerimento apresentado pelo Requerente/Recorrido em 28/06/2024 (refª citius 39794170) e sustentado no Relatório de Progresso emitido pela Escola M junto como doc. 1 com esse requerimento, e que consiste na versão integral do documento, truncado, apresentado pela Requerida como doc. 1 da sua peça de 18/06/2024.
Tal facto será integrado na matéria de facto provada sob o nº 13.

Assim, a matéria de facto a considerar consiste na enunciada na decisão sob recurso, acima transcrita, aditada do seguinte facto:
“13. A Escola M expressamente comunicou à Requerida em 06/05/2024 que não aceitaria a reinscrição dos menores para o ano lectivo 2024/2025”.

Da revogação da decisão de 1ª instância
Nos diversos casos de ruptura da relação entre os progenitores, a lei estabelece a regra do exercício conjunto das responsabilidades parentais quanto às questões de particular importância (cfr. artº 1906º nº 1 do CCivil),
Por seu turno, o artº 44º nº 1 do RGPTC prevê que «Quando o exercício das responsabilidades parentais seja exercido em comum por ambos os pais, mas estes não estejam de acordo em alguma questão de particular importância, pode qualquer deles requerer ao tribunal a resolução do diferendo».
A situação dos autos integra a previsão da apontada norma, porquanto as responsabilidades parentais relativamente aos menores X e Z são exercidas em comum por ambos os progenitores e o diferendo sobre a escola que devem frequentar é uma questão de particular importância, como é pacificamente afirmado na doutrina e na jurisprudência; isto porque é essencialmente através do ensino que se realiza o direito à educação de que a criança é titular.
O direito à educação é um direito fundamental da criança, como resulta do princípio 7º da Declaração dos Direitos da Criança, proclamada pela Resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas nº 1386 (XIV), de 20/11/1959, que é directamente aplicável no nosso ordenamento jurídico; do artº 28º da Convenção sobre os Direitos da Criança, adoptada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 20/11/1989 e ratificada por Portugal em 21/09/1990, com início de vigência em 21/10/1990; e do artº 74º nº 1 da Constituição da República Portuguesa, que consagra o direito de todos ao ensino.

Os menores encontravam-se a frequentar a “Escola M” e o pai, pelas razões que fez constar da sua petição e acima sumariadas no relatório, propôs a mudança dos menores para a Escola J, na Estrela, indicando os méritos e vantagens dessa opção.
A mãe, por sua vez, opôs-se essencialmente com fundamento em que as crianças estão bem adaptadas àquela escola, pretendendo que ali se mantenham. Posição que manteve no presente recurso com o qual pretende a revogação da decisão de 1ª instância, que deu provimento à pretensão do pai, e sua substituição “…por outra que ordene a manutenção dos menores na instituição M…”.
Basta atentar no aditado facto provado 13 para concluir que, já à data de prolação da decisão sob recurso, o objectivo da Requerida/Recorrente era insusceptível de ser alcançado, pois a Escola M expressamente comunicou à Requerida em 06/05/2024 que não aceitaria a reinscrição dos menores para o ano lectivo 2024/2025 (cfr. facto 13).
E sendo este o exclusivo desiderato da sua apelação, logo se alcança verificar-se uma situação de inutilidade da instância recursiva.
De todo o modo, não deixaremos de referir que mantida a decisão de facto firmada em 1ª instância, por improcedência da impugnação apresentada quanto a ela, inexistem motivos para a alteração da decisão jurídica, na qual foram ponderados com razoabilidade e acerto, à luz dos factos apurados, os vários vectores a considerar na aferição do superior interesse dos menores, o qual, sendo um conceito jurídico indeterminado, carece de integração casuística.
E no caso, na decisão de 1ª instância, com cujos fundamentos concordamos, foi assegurada a solução mais adequada para as crianças concretas, pois, como nela se diz, não estando em causa que uma das escolas seja melhor que outra em termos qualitativos, o que de nenhuma forma se mostra evidenciado, devem privilegiar-se outros critérios que ali foram enunciados:
i) a distância entre a residência de um e outro dos progenitores – sitas no mesmo bairro, de Campo de Ourique – e cada uma das escolas – uma no vizinho bairro da Estrela, a outra na ponta oposta da cidade, na Av. Gago Coutinho. Sendo óbvio que a proximidade da escola importa melhor qualidade de vida aos menores, permitindo-lhes levantar-se mais tarde, chegarem a casa mais cedo, não estarem sujeitos à tensão inerente às deslocações de carro com engarrafamentos para atravessarem toda a cidade; a possibilidade de se deslocarem a pé para a escola, por enquanto acompanhados, mas quando mais crescidos sozinhos com o que isso aporta de autonomia, auto-estima e responsabilidade;
ii) do programa curricular, em especial, da língua dominante - o português - no qual o mesmo é ministrado; tendo, no entanto, também ensino de língua inglesa;
iii) o custo mensal; aspecto que – mesmo desvalorizando-se a circunstância que o Tribunal a quo ponderou, isto é, que estão em causa duas crianças e neste momento apenas o pai paga as mensalidades escolares, o que, diversamente do que sugere a Recorrente, os autos não desmentem – não deixa de se reflectir no interesse das crianças. É que um custo menor da escola poderá possibilitar o acesso a mais e diversificadas actividades extracurriculares, não só de enriquecimento pessoal e académico, como de lazer, desporto, socialização.

Não merece, portanto, qualquer crítica a decisão sob recurso.

Aqui chegados há, pois, que concluir pela improcedência do recurso e pela manutenção da sentença recorrida.

III - DECISÃO
Nestes termos e pelos fundamentos supra expostos, acorda-se em julgar a apelação improcedente, mantendo-se a sentença de 1ª instância.
Custas a cargo da Recorrente (sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia).
Notifique.

Lisboa, 26/06/2025
Amélia Puna Loupo
Teresa Sandiães
Fátima Viegas

[1] Por evidente lapso de escrita, que se corrige, constava “…da entrega…”