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CONTRATO PROMESSA DE PARTILHA DE CÔNJUGES
VALIDADE
INVENTÁRIO
Sumário
I - Nos termos do artigo 1789º do Código Civil, os efeitos do divórcio retrotraem-se à data da propositura da acção quanto às relações patrimoniais entre os cônjuges. II - A cessação da comunhão patrimonial derivada do casamento pode ocorrer, após o divórcio, por acordo dos ex-cônjuges, quer por via da venda dos bens comuns a terceiros, mediante celebração do respetivo contrato de compra e venda, quer por via da partilha extrajudicial. III- O contrato-promessa de partilha de bens comuns destina-se a á constituir a promessa de imputação de bens concretos de que o casal seja titular, na meação de cada cônjuge. IV - Nos regimes de comunhão de bens, os contratos promessa de partilha de bens comuns são válidos, desde que respeitada a regra imperativa da metade prevista no art.º 1730º, do CC. II - A celebração de contrato promessa de partilha entre os ex-cônjuges, ainda que válido, não constitui, por si só, obstáculo ao prosseguimento de inventário judicial para partilha dos bens comuns do casal dissolvido, não lhe retirando razão de ser.»
Texto Integral
Processo nº 3838/23.7T8AVR.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Aveiro - Juízo Fam. Menores - Juiz..,
Relatora: Ana Vieira
1º Adjunto: Juiz Desembargador: Dr(a). Francisca Micaela Fonseca da Mota Vieira
2º Adjunto: Juiz Desembargador: Dr(a). Isoleta Almeida Costa
AA,, residente na Rua ..., ... Aveiro,veio intentar, ao abrigo do disposto no Art. 1087.º do Código Processo Civil, INVENTÁRIO PARA PARTILHA DE BENS COMUNS DO CASAL, contra, BB, tendo sido nomeada cabeça de casal.
O requerido BB, interessado e melhor identificado nos autos à margem referenciados, tendo sido citado do inventário intentado por AA, vem deduzir OPOSIÇÃO nos termos e com os seguintes fundamentos, em resumo: «...2 Todavia, parece-nos, salvo melhor opinião que o presente inventário não tem qualquer fundamento legal porquanto foi celebrado um contrato promessa de partilha dos bens comuns do casal – cfr doc. n.º 1 que se junta e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido par aos devidos efeitos legais,
3. Tendo sido, nesse contrato promessa de partilha, relacionados os bens comuns do casal, designadamente os bens que agora a cabeça de casal descrimina na relação de bens,
4. Tendo ficado acordado, designadamente na sua cláusula 3ª, quanto aos bens imóveis o seguinte:
A Primeira (aqui cabeça-de-casal) e segundo (aqui interessado) outorgantes manterão a compropriedade sobre as frações I e II (prédio adquirido antes do casamento mas que consideraram os outorgantes como sendo um bem comum do casal porquanto o adquiriram já estavam em comunhão comum) após o divórcio,
5. Sendo a fração II, o prédio adquirido pelo casal após o divórcio, designadamente a fração designada pela letra B, destinada a habitação sito na Rua ..., Quinta ..., inscrito na matriz urbana sob o artigo ...39 e descrito na conservatória do registo predial de Aveiro sob o nº ...66 da freguesia ... – vide verba Nº 1 do activo da relação de bens
6. Acordaram no referido contrato que a fração I fica afeta á residência exclusiva do segundo outorgante (aqui interessado) …, o qual assume a responsabilidade de a manter em bom estado de conservação e nas condições que atualmente se encontra,
7. Acordaram igualmente que a fração II, fica afeta à residência exclusiva da primeira outorgante (aqui cabeça de casal) a qual assume a responsabilidade de a manter em bom estado de conservação e nas condições que atualmente se encontra
8.
Acordaram que as referidas afetações dos imoveis, quanto ao direito de uso e habitação de cada fração produzem efeitos em termos imediatos, ou seja, desde a data da assinatura do contrato promessa – 2 de Novembro de 2020,
9. Todos os encargos respeitantes aos créditos identificados na cláusula segunda, bem como seguros de vida e impostos respeitantes aos dois identificados imoveis, enquanto subsistirem, serão suportados em partes iguais por ambos nas datas dos vencimentos
10.Tendo ainda ficado acordado que os seguros de recheio do imóvel, o condomínio, a manutenção, e serviços de consumo diária como água, eletricidade, gás, telecomunicações, serão suportadas por cada um dos outorgantes em relação ao imóvel que lhe ficou afeto
11. E acordaram ainda que: desde que devidamente justificado, nomeadamente para fazer face a necessidades financeiras sérias, os outorgantes acordam que se poderá proceder à venda de qualquer dos identificados imoveis, obrigando-se a outorgar e a assinar tudo o que esse mostre necessário a esse fim
12. Acordaram a adjudicação dos demais bens que faziam parte da relação dos bens comuns do casal
13. Tendo ainda ficado previsto que o contrato promessa celebrado ficava sujeito ao regime da execução específica prevista no artigo 830º do C. Civil
14. Ora, duvidas não restam que a vontade declarada pela cabeça-de-casal no referido contrato promessa de partilha era manter a compropriedade dos imoveis e procederem á adjudicação dos restantes bens nos termos acordados no mesmo contrato
15. a requerente ao dar entrada da presente ação pretende que o tribunal confirme o seu incumprimento do contrato de promessa celebrado cuja assinatura da requerente foi notarialmente reconhecida,
16.Pelo que nos parece que a mesma se encontra a fazer uso reprovável do presente processo uma vez que pretende que o tribunal confirme o seu incumprimento, pois a requerente acordou e celebrou um contrato no qual manifestava a sua vontade relativamente à divisão dos bens comuns, seja, aqueles adquiridos antes ou depois do casamento, tendo agora se arrependido e pretende dar sem efeito o acordo celebrado
17. Podendo enquadrar-se tal comportamento na estatuição do artigo 542º do CPC, devendo a requerente ser condenada como litigante de má-fé com as legais consequências….
21. Ora, no caso em apreço o contrato promessa celebrado foi redigido a pedido da cabeça-de-casal, foi a sua assinatura reconhecida notarialmente e o interessado não incumpriu a vontade declarada no contrato celebrado,
22. pelo que não pode, com a presente ação a cabeça-de-casal vir alterar o compromisso assumido no contrato celebrado com a alegação de que não pretende manter em comum os bens do casal,
23. Assim, deve a presente ação ser julgada improcedente por não provada com as legais consequências
24. No entanto e sem prescindir relativamente aos bens relacionados pela cabeça- de-casal cumpre RECLAMAR dos mesmos nos seguintes termos…
NESTES TERMOS MELHORES DE DIREITO, deve:
a) o contrato promessa celebrado entre requerido e requerente ser reconhecido como válido e eficaz e em consequência ser julgado improcedente o pedido formulado pela requerente
b) deve a requerente ser condenada como litigante de má fé, com as legais
consequências
Caso o pedido não seja considerado improcedente, deve ter-se em consideração a reclamação de bens agora apresentada com as legais consequências…».
A cabeça de casal juntou requerimento, em resumo co o seguinte teor: «… AA, cabeça de casal nos autos à margem cotados e aí melhor identificada, notificada da oposição deduzida pelo interessado, vem dizer:
1Como bem refere o interessado, foi celebrado contrato promessa de partilha, onde, como ali se refere, desde que devidamente justificado, nomeadamente para fazer face a necessidades financeiras sérias, os outorgantes acordaram que se poderia proceder à venda de qualquer dos identificados imóveis.
2.º Como bem se sabe, as taxas de juros dos créditos à habitação têm sofrido aumentos significados, o que para a cabeça de casal significou um acréscimo de despesas com as prestações dos empréstimos de cerca de 25% do seu rendimento mensal, a que corresponde atualmente, um encargo mensal suportado pela interessada de cerca de € 875,76 (oitocentos e setenta e cinco euros e setenta e seis cêntimos), o que corresponde a cerca de 50% do seu salário.
3.º Ora, tal situação levou a vários contactos encetados pelas partes para que se fizesse a adjudicação da propriedade dos bens a cada um dos interessados, com a consequente desoneração do interessado nos empréstimos que incidiam sobre o imóvel que seria adjudicado ao outro.
4.º Certo é que o interessado não obteve a necessária declaração de desoneração da cabeça de casal, por parte da instituição bancária titular dos empréstimos que incidem sobre o imóvel que lhe seria adjudicado, recusando-se a proceder à sua alienação e consequente liquidação das obrigações bancárias.
5.º Este cenário é incomportável para a cabeça de casal.
6.º Por outro lado, afigura-se à cabeça de casal que tal limitação ao seu direito de propriedade sobre os imóveis, é atualmente incomportável, porque a alienação dos imóveis não é possível, porque a isso se recusa o interessado.
7.º Por outro lado, veja-se que nenhum dos comproprietários é obrigado a permanecer na indivisão e mesmo quando tal seja convencionado o prazo da indivisão não poderá exceder cinco anos.
8.º Ora, ainda que não tenham decorrido cinco anos sobre o contrato promessa, nada, na ótica da cabeça de casal, obsta a que, quanto aos bens comuns do casal, se termine com a comunhão (compropriedade) daqueles.
9.º A cabeça de casal entende não ter incumprido o referido contrato, porquanto existem dificuldades financeiras sérias opondo-se o interessado à alienação de património ou à desoneração da cabeça de casal dos empréstimos que incidem sobre o imóvel que lhe foi prometido adjudicar.
10.º A cabeça de casal não pretende incumprir as obrigações assumidas no aludido contrato promessa, o que aquela pretende é terminar com a comunhão dos bens do casal e assim diminuir as suas obrigações financeiras (seja pela alienação de património e pagamento dos empréstimos bancários), seja pela adjudicação de bens com desoneração de responsabilidades juntos da instituição de crédito.
11.º Por outro lado, a submissão do contrato ao regime da execução especifica, tal como refere e bem o interessado, abre porta a que a parte não faltosa possa lançar mão de tal instituto, mas não o obriga a recorrer ao mesmo.
12.º E não sendo obrigada a recorrer a tal mecanismo, a cabeça de casal lançou mão do presente inventário, processo que é o competente para terminar a comunhão dos bens do dissolvido casal…
Da Resposta à Reclamação da Relação de Bens…».
O requerido juntou requerimento em resumo com o seguinte teor:«… BB, Interessado e melhor identificado nos autos à margem referenciados, tendo sido notificado da resposta à Oposição ao Inventário deduzida pelo Interessado, vem junto de V. Exa., nos termos do artigo 3º do C.P.C. dizer o seguinte:
1Relativamente ao imóvel que foi prometido adjudicar no Contrato Promessa de Partilha à Cabeça-de-Casal, já foi proferida sentença no âmbito do Processo de Divisão de Coisa Comum, que correu termos no Juiz 2 do Juízo Local Cível de Aveiro com o n.º ... – cfr. doc. n.º 1 que se junta e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
2.Pelo que consideramos já existir caso julgado relativamente a esta matéria.
3. No entanto e sem prescindir sempre se dirá que, aquando da celebração do Contrato Promessa a intenção de ambos os outorgantes era preservar a propriedade dos imóveis para o filho de ambos beneficiar da propriedade dos mesmos quando estivessem libertos das hipotecas.
4. Razão pela qual fizeram constar no Contrato Promessa que os bens apenas seriam vendidos caso existissem necessidades financeiras sérias…
5. Por outro lado, alega a Cabeça-de-Casal que as prestações do empréstimo tiveram um aumento de mais 25% do seu salário.
6. No entanto, não alega nem junta qualquer documento que suporte essa alegação, mormente, recibo de vencimento e extrato bancário referente ás prestações bancárias.
7. Por outro lado, não pode a Cabeça-de-Casal olvidar que se a prestação do imóvel onde reside aumentou, a prestação onde reside o Interessado aumentou muito mais, pois o crédito é de valor muito superior.
8. E porque a intenção de ambos era preservar o património para o filho de ambos, está o Interessado a cumprir com todos os encargos.
9. Acresce que o Interessado não se recusa a proceder à alienação do imóvel, só não pode é assumir o pagamento de mais-valias quando não vai receber qualquer quantia decorrente do produto da venda do imóvel, de acordo com o estipulado no contrato promessa
10Por último, cumpre referir que a própria Cabeça-de-Casal contradiz-se no seu articulado na medida em que alega que tem dificuldades financeiras sérias, sendo esta o seu mote para pretender por termo à comunhão de bens, mas no mesmo articulado afinal pretende ser desonerada dos empréstimos bancários?!?!?!?!..»
*
Nos autos de processo de inventário para partilha dos bens comuns por divórcio em que é requerente Inventário (Competência Facultativa) em que é requerente AA, foi proferido o seguinte despacho recorrido: «…
Em 27/10/2023 AA veio requerer inventário por partilha de bens comuns do casal atento o disposto no artigo 1082º, alínea d) do Código de Processo Civil.
Devidamente notificada para juntar aos autos, entre o mais, a relação de bens junta ao processo de divórcio, através de requerimento, datado de 16-11-2024 (Referência CITIUS 15329704) veio a interessada proceder à respectiva junção e clarificar que quanto à verba 4 do activo da mencionada relação de bens, a mesma já foi partilhada extrajudicialmente entre as partes.
No mesmo requerimento defende que não obstante a relação de bens junta no processo de inventário, nada obstará às partes que adicionem ou excluam bens relacionados no processo de divórcio, porquanto esta será a sede própria para a partilha dos mesmos.
A requerente foi notificada para juntar aos autos:
- a relação de todos os bens sujeitos a inventário, acompanhada Devidamente notificada para juntar aos autos, entre o mais, a relação de bens junta ao processo de divórcio, através de requerimento, datado de 16-11-2024 (Referência CITIUS 15329704) veio a interessada proceder à respectiva junção e clarificar que quanto à verba 4 do activo da mencionada relação de bens, a mesma já foi partilhada extrajudicialmente entre as partes.
No mesmo requerimento defende que não obstante a relação de bens junta no processo de inventário, nada obstará às partes que adicionem ou excluam bens relacionados no processo de divórcio, porquanto esta será a sede própria para a partilha dos mesmos.
A requerente foi notificada para juntar aos autos:
- a relação de todos os bens sujeitos a inventário, acompanhada dos documentos comprovativos da situação no registo e se for caso disso da matriz;
- a relação dos créditos e das dívidas acompanhadas das provas.
Nesse contexto, em 04/12/2023 (referência CITIUS 15410926) foi efectuada a junção daquela relação de bens, a qual veio a ser admitida através de despacho datado de 06/12/2023 (referência CITIUS 130368960). No mesmo despacho foi ordenada a notificação do requerido da relação de bens bem como a citação dos credores nos termos do artigo 1088º, nº 2, do Código de Processo Civil.
A 16/01/2024 (referência CITIUS 15590608) veio a credora “Banco 1...” apresentar reclamação do crédito, no montante global de €282.457,30, detido sobre AA e BB.
A 08/02/2024 o interessado BB veio apresentar oposição ao presente inventário alegando, em síntese, que foi celebrado um contrato promessa de partilha dos bens comuns do casal, no qual foram relacionados todos os bens discriminados na relação de bens apresentada em 04/12/2023. Nessa medida, defende que a Requerente se encontra a fazer uso reprovável do processo uma vez que pretende que o tribunal confirme o seu incumprimento, pois a requerente acordou e celebrou um contrato no qual manifestava a sua vontade relativamente à divisão dos bens comuns, seja, aqueles adquiridos antes ou depois do casamento, tendo agora se arrependido e pretende dar sem efeito o acordo celebrado. Defende, ainda, enquadrar-se o comportamento daquela na estatuição do artigo 542º do Código de Processo Civil, devendo a requerente ser condenada como litigante de má-fé, com as legais consequências. Na mesma oposição, sem prescindir, apresenta reclamação quanto à relação de bens.
Devidamente notificada da referida oposição veio AA a 12-04-2024 (referência CITIUS 16009534), no exercício do contraditório, confirmar que foi celebrado contrato promessa de partilha, no âmbito do qual foi acordado que para fazer face a necessidades financeiras sérias, os outorgantes poderiam proceder à venda de qualquer dos identificados imóveis. Alega, ainda, que as taxas de juros dos créditos à habitação têm sofrido aumentos significados, o que significou para aquela um acréscimo de despesas com as prestações dos empréstimos de cerca de 25% do seu rendimento mensal. Tal situação levou a vários contactos encetados pelas partes para que se fizesse a adjudicação da propriedade dos bens a cada um dos interessados, com a consequente desoneração do interessado nos empréstimos que incidiam sobre o imóvel que seria adjudicado ao outro. Ocorre que BB recusou-se a proceder à alienação dos imóveis e à consequente liquidação das obrigações bancárias. Pretende, assim, AA terminar com a comunhão dos bens do casal e assim diminuir as suas obrigações financeiras (seja pela alienação de património e pagamento dos empréstimos bancários), seja pela adjudicação de bens com desoneração de responsabilidades juntos da instituição de crédito. Refere, ainda, a submissão do contrato ao regime da execução especifica abre porta a que a parte não faltosa possa lançar mão de tal instituto, mas não o obriga a recorrer ao mesmo. No mesmo articulado, apresentou resposta à reclamação da relação de bens.
Veio o interessado BB em 24/04/2024 (referência CITIUS 16065538) no exercício do contraditório referir que relativamente ao imóvel que foi prometido adjudicar no Contrato Promessa de Partilha à Cabeça-de-Casal foi já proferida sentença no âmbito do Processo de Divisão de Coisa Comum, que correu termos no Juiz 2 do Juízo Local Cível de Aveiro com o n.º ..., existindo caso julgado relativamente a essa matéria. Mais alega que aquando da celebração do Contrato Promessa a intenção de ambos os outorgantes era preservar a propriedade dos imóveis para o filho de ambos beneficiar da propriedade dos mesmos quando estivessem libertos das hipotecas, razão pela qual fizeram constar no Contrato Promessa que os bens apenas seriam vendidos em caso de necessidades financeiras sérias. Alega, ainda, que AA não junta qualquer documento que suporte que as prestações do empréstimo tiveram um aumento de mais 25% do seu salário, mormente, recibo de vencimento e extracto bancário referente às prestações bancárias.
Alega, ainda, que a prestação do imóvel onde reside aumentou muito mais, pois o crédito é de valor muito superior mas sendo a intenção de ambos preservar o património para o filho de ambos, está aquele a cumprir com todos os encargos. Alega, finalmente, que não se recusa a proceder à alienação do imóvel, só não pode é assumir o pagamento de mais-valias quando não vai receber qualquer quantia decorrente do produto da venda do imóvel, de acordo com o estipulado no contrato-promessa. No mesmo articulado apresenta defesa quanto à resposta à reclamação da relação de bens.
Em 02-05-2024 (referência CITIUS 16094106) AA apresentou resposta quanto ao alegado na qual, muito em síntese, impugna o por aquele alegado e requer a exclusão dos bens referidos nos docs. 6 a 9 das respectivas verbas da relação de bens.
Foi designado o dia 15/10/2024 para a realização da Audiência Prévia (referência CITIUS 134002740).
Tendo-se frustrado na mesma a possibilidade de acordo, e encontrando-se reunidos os elementos documentais para o efeito, cumpre decidir.
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Conforme resulta do documento intitulado “Contrato-Promessa de Partilha”, junto aos autos a 08/02/2024 (referência CITIUS 15711299), cujo teor ou assinatura não foram impugnados pelas partes, AA (na qualidade de primeira outorgante) e BB (na qualidade de segundo outorgante) declararam, em 02/11/2020, celebrar contrato-promessa de partilha, para vigorar após o pedido de divórcio a apresentar, nos seguintes termos:
a) A primeira e o segundo outorgantes manterão a compropriedade dos seguintes bens após o divórcio:
I. fracção autónoma, designada pela letra “B”, destinada a habitação, correspondente a T3, de rés-do-chão e andar, com entrada pelo número ...04, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito na Rua ..., Quinta ..., cidade de Aveiro, descrito na Conservatória do Registo Predial de Aveiro, sob o nº ...66, da freguesia ..., inscrito na matriz predial urbana da respectiva freguesia sob o artigo ...39, com o valor patrimonial tributário de 143.480,00€;
II. fracção autónoma, designada pelas letras “F FR”, destinada a habitação, correspondente a T2, situada no 2º piso esquerdo trás e piso duplex (recuado), no Bloco ..., com entrada pelo nº ...0, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito na Rua ..., ..., cidade de Aveiro, descrito na Conservatória do Registo Predial de Aveiro, sob o nº ...82, da freguesia ..., inscrito na matriz predial urbana da respectiva freguesia sob o artigo ...50, com o valor patrimonial tributário de 25.976,45€.
Mais acordaram, neste âmbito, que a fracção referida em a) ficaria afecta à propriedade exclusiva do segundo outorgante enquanto a fracção referida na alínea b) ficaria afecta à propriedade exclusiva da primeira outorgante.
III. Recheio das fracções referidas em I. e II.
IV. Veículo automóvel, marca BMW, modelo ..., matrícula ..-CJ-..,
V. Quota de 5.000,00€ que constitui a totalidade do capital social da sociedade “A..., Unipessoal, Lda.”, pessoa colectiva nº ...18, com sede na Rua ..., ..., ... Aveiro
b) Todos os encargos relativos aos créditos que ambos contraíram, concretamente, os provenientes dos contratos de mútuo nºs ...96-8, ...35-7, ...09-2 e ...28-2, celebrados com o Banco 1..., bem como seguros de vida e impostos respeitantes aos sois identificados imóveis, enquanto subsistirem, serão suportados em partes iguais por ambos os Outorgantes, nas datas dos respectivos vencimentos.
c) Os custos das apólices de seguro do recheio de cada um dos imóveis serão exclusivamente suportados pelo Outorgante que ficou com o direito de neles residir.
d) Os custos de condomínio, encargos com a manutenção das fracções, bem como qualquer serviço que as fracções usufruam serão exclusivamente suportadas por cada um dos outorgantes afecto à respectiva fracção.
e) Eventuais benfeitorias que cada outorgante realize na fracção que lhe fica afecta reverterá para o próprio, na hipótese de eventual venda e no caso dessas benfeitorias darem origem a uma mais valia em termos de preço de venda.
f) Cada um dos outorgantes fica com o direito de dar de arrendamento a fracção que lhe fica afecta, obrigando-se o outro a outorgar o contrato de arrendamento, revertendo a renda a favor do outorgante ao qual a fracção fica afecta.
g) Desde que devidamente justificado, nomeadamente, para fazer face a necessidades financeiras sérias, os Outorgantes acordam que se poderá proceder à venda de qualquer dos identificados imóveis, obrigando-se a outorgar e a assinar tudo o que se mostre necessário para esse fim.
h) A primeira outorgante poderá escolher os bens móveis que compõem o recheio da fracção referida em I e ao segundo outorgante serão adjudicados os bens móveis remanescentes que compõem o recheio da referida fracção.
i) O segundo outorgante promete adjudicar, após a decretação do divórcio e a título gratuito, à primeira outorgante a sua meação em todos os bens móveis que compõem o recheio da fracção referida em II.
j) A primeira outorgante promete adjudicar, após a decretação do divórcio e a título gratuito ao segundo outorgante a sua meação no veículo automóvel descrito em IV., obrigando-se a colaborar em todos os actos e a assinar todos os documentos que se afiram necessários ao efeito pretendido.
k) A primeira outorgante promete adjudicar, após a decretação do divórcio e a título gratuito ao segundo outorgante a sua meação na quota descrita em V. obrigando-se a colaborar em todos os actos e a assinar todos os documentos que se afiram necessário ao efeito pretendido e por sua vez, o segundo outorgante, qua aceita a adjudicação, promete alterar, no prazo de 60 dias, a denominação social da empresa de forma a que deixe de conter o nome da primeira outorgante, assumir a responsabilidade pelas obrigações directa ou indirectamente provenientes ou relacionadas com a empresa.
l) Os outorgantes mantêm a vinculação à conta de depósitos à ordem associada aos contratos de mútuos e aos mesmos, garantindo a manutenção das condições originais dos mútuos junto do Banco 1..., até ao termo dos respectivos prazos de vigência; ou até que se afiram condições, junto do Banco, para a desvinculação em simultâneo de um dos outorgantes em cada um dos contratos de mútuo, sem o incremento de encargos e/ou o reforço das garantias prestadas.
Mais declararam que o mencionado contrato promessa de partilha ficaria sujeito aos princípios e normas legais aplicáveis, designadamente ao regime da execução específica, nos termos do disposto no artigo 830º do Código Civil.
Não obstante o teor daquele documento, veio a interessada, em 27/10/2023, requerer inventário na sequência da acção de divórcio, indicando na relação de bens apresentada em 04/12/2023 (referência CITIUS 15410926) bens coincidentes com aquele a que se reporta o aludido contrato-promessa. Concretamente, do lado do activo relacionou os bens mencionados nos pontos I., III. e IV. supra, especificando no que concerne ao ponto III. os concretos bens móveis que compõem o recheio da fracção autónoma mencionada em I. E, do lado do passivo, os bens mencionados na alínea b) supra.
Na referida relação de bens não está relacionado o imóvel descrito em II. sobre o qual foi já proferida sentença no âmbito do Processo de Divisão de Coisa Comum, que correu termos no Juiz 2 do Juízo Local Cível de Aveiro com o n.º ... (Cfr.Documento junto sob o nº 1 com o requerimento datado de 24-04-2024, referência CITIUS 16065538).
Dito isto, nos termos do disposto no artigo 1689º, nº 1 do Código Civil cessadas as relações patrimoniais entre os cônjuges, estes ou os seus herdeiros recebem os seus bens próprios e a sua meação no património comum, conferindo cada um deles o que dever a este património.
A partilha pode ser judicial ou extra-judicial.
A partilha judicial ocorre quando os ex-cônjuges não chegam a acordo sobre a divisão, pelo que a partilha ocorre em processo de inventário.
Quando existe acordo entre eles, a partilha é extra-judicial.
No caso sub iudice, os interessados outorgaram o documento denominado “Contrato-Promessa de Partilha”.
Nos termos do disposto no artigo 410º do Código Civil o contrato-promessa é a convenção pela qual ambas as partes, ou apenas uma delas, se obrigam, dentro de certo prazo ou verificados certos pressupostos, a celebrar determinado contrato (prometido).
Assim, a celebração do contrato promessa cria para o promitente uma obrigação de contratar cujo objecto é uma prestação de um facto (facere jurídico consistente na emissão da declaração negocial prometida), gozando - em princípio - de eficácia meramente obrigacional nos termos do disposto no artigo 412º e no artigo 413º do Código Civil. Trata-se de um contrato bilateral quando ambos os contraentes se comprometem a celebrar futuramente o contrato.
O contrato-promessa de partilha tem “como efeito a promessa de imputar os bens comuns concretos, que o casal tem à data do acordo, na meação de cada cônjuge” (Francisco Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, Curso de Direito da Família, I Vol., 5ª ed., 2016, p. 525).
Conforme resulta do teor do referido documento, os interessados visaram, através da outorga do mesmo, a produção de efeitos jurídicos para depois do divórcio que viria a ser decretado no processo a apresentar. Ora, nos termos do decidido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 22-02-07, no âmbito do processo nº 07B312, disponível em www.dgsi.pt: “O contrato promessa de partilha de bens, celebrado pelos cônjuges, no decurso da ação de divórcio, subordinado à condição suspensiva do decretamento do divórcio, é válido”. Ainda a este propósito resulta do decidido no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 05-11-2020, processo nº 437/17.6T8LRS.L1-2, disponível em www.dgsi.pt que: “O contrato-promessa de partilha de bens, celebrado pelos cônjuges, subordinado à condição suspensiva do decretamento do divórcio, é válido por não ofender o princípio da imutabilidade do regime de bens do casamento imposto pelo art. 1714º do CCivil.”
Ademais, o contrato-promessa prevê quais são os bens que vão integrar cada uma das meações depois da dissolução do casamento.
Por outro lado, ainda, não existem elementos que permitam concluir que a partilha prometida belisque a regra que impõe a divisão paritária do activo e do passivo, nos termos previstos no artigo 1730º e no artigo 1790º do Código Civil. Ao invés, o acordo estabelecido quanto à futura partilha, a operar depois do divórcio, revela uma distribuição paritária do activo e o comprometimento na liquidação dos empréstimos contraídos por ambos em partes iguais.
Assim, os interessados celebraram um contrato-promessa de partilha que é válido.
Tratando-se de o contrato válido e uma vez que no mesmo se prevê a sua execução específica, na senda do decidido Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 18-05-2023, processo nº 2239/22.9T8BRG.G1, disponível em www.dgsi.pt: “não poderá ser requerido inventário para partilha do património comum, antes se cumprindo o acordo firmado pelas partes”.
Conforme se decidiu no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido em 15-12-2011, no âmbito do processo nº 2049/06.0TBVCT.G1.S1, “sendo válido o contrato-promessa de partilha, em tese geral, o mesmo estará sujeito à execução específica, no condicionalismo do art.º 830.º do Código Civil. Só assim não será se for violada a regra da metade prevista no art.º 1730.º, 1 do Código Civil pois, se assim acontecer, ocorrerá a nulidade prevista nessa norma”.
A par do teor do contrato, nada foi alegado por AA, nem resulta provado de qualquer modo pela observação dos elementos que constam dos autos, que aquele contrato-promessa de partilha importe para a mesma prestações desproporcionais (excessivas) relativamente ao que lhe seria devido ou que tenha sido determinado que se tenha revelado prejudicial para a mesma.
Com efeito, o alegado por aquela interessada em 12-04-2024 (referência CITIUS 16009534) é, em síntese, que no âmbito do contrato foi acordado que para fazer face a necessidades financeiras sérias, os outorgantes poderiam proceder à venda de qualquer dos identificados imóveis. As taxas de juros dos créditos à habitação têm sofrido aumentos significados, o que significou para ela um acréscimo de despesas com as prestações dos empréstimos de cerca de 25% do seu rendimento mensal. Tal situação levou a vários contactos encetados pelas partes para que se fizesse a adjudicação da propriedade dos bens a cada um dos interessados, com a consequente desoneração do interessado nos empréstimos que incidiam sobre o imóvel que seria adjudicado ao outro. O interessado BB recusou-se a proceder à alienação dos imóveis e à consequente liquidação das obrigações bancárias.
Salvo o devido respeito por diverso entendimento, a interessada pretende suscitar o incumprimento do previsto no ponto g) acima referido constante do referido contrato-promessa.
Com efeito, mediante a celebração de contrato-promessa de partilha, as partes obrigam-se à celebração de partilha, segundo certas condições previamente definidas.
Visa a interessada AA com a presente acção diminuir as suas obrigações financeiras seja pela alienação de património e pagamento dos empréstimos bancários, seja pela adjudicação de bens com desoneração de responsabilidades juntos da instituição de crédito. Questão essa que a se opõe o interessado BB que alega que aquando da celebração do Contrato Promessa a intenção de ambos os outorgantes era preservar a propriedade dos imóveis para o filho de ambos beneficiar da propriedade dos mesmos quando estivessem libertos das hipotecas razão pela qual fizeram constar no Contrato-Promessa que os bens apenas seriam vendidos em caso de necessidades financeiras sérias.
Ora, a resolução dessa questão é compatível com a execução específica do contrato.
Atento o disposto no artigo 830º, nº 1 do Código Civil se alguém se tiver obrigado a celebrar certo contrato e não cumprir a promessa, pode a outra parte, na falta de convenção em contrário, obter sentença que produza os efeitos da declaração negocial do faltoso, sempre que a isso não se oponha a natureza da obrigação assumida.
A incompatibilidade da execução específica com a natureza da obrigação ocorre, nomeadamente, “nos casos e que o contrato final exija particulares qualidades ou qualificações da vontade contratual que a tornem insubstituível por decisão judicial, como ainda naqueles outros e quem são as obrigações a ser produzidas pelo contrato prometido que são, por sua natureza, insuscetíveis de execução forçada. Serão os casos da promessa de casamento, de doação, de testamento ou de perfilhação” (Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 15-09-2020, processo nº 16642/11.6T2SNT-A.L1-7, disponível em www.dgsi.pt).
Nessa medida, não se verifica qualquer incompatibilidade no caso em apreço.
Por conseguinte, o incumprimento do contrato-promessa pelo interessado BB não obstava à execução específica do contrato, sendo este o meio próprio para a requerente fazer valer a sua pretensão.
Refere, a interessada AA que a submissão do contrato ao regime da execução especifica abre porta a que a parte não faltosa possa lançar mão de tal instituto, mas não o obriga a recorrer ao mesmo.
Quanto a esta alegação importa, desde já, referir que foram os próprios interessados que declararam que o mencionado contrato-promessa de partilha ficaria sujeito ao regime da execução específica.
Por outro lado, importa referir que existe erro na forma de processo quando o autor usa de uma forma processual inadequada para fazer valer a sua pretensão. Nos termos do disposto no artigo 193º, nº 1 do Código de Processo Civil o erro na forma de processo importa unicamente a anulação dos actos que não possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, quanto possível, da forma estabelecida pela lei.
A forma de processo é aferível em função do tipo de pretensão formulada pelo autor e não em referência à pretensão que devia ser por ele deduzida. No caso em apreciação a interessada requereu inventário para partilha dos bens comuns do casal face à indivisão dos bens. Nessa medida, a forma de processo utilizada serve os fins pretendidos pela interessada.
Não obstante, a “inadequação da pretensão deduzida em relação ao fundamento invocado consubstancia uma situação de manifesta improcedência da acção e não de erro na forma do processo” (Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 08-07-2020, processo nº 654/19.T8VCT.G1, disponível em www.dgsi.pt). No caso em apreciação, o fundamento utilizado pela interessada AA para a presente acção é o de diminuir as suas obrigações financeiras seja pela alienação de património e pagamento dos empréstimos bancários, seja pela adjudicação de bens com desoneração de responsabilidades juntos da instituição de crédito.
Assim, apesar de a forma de processo seguida se adequar à pretensão formulada, esta não é conforme aos fundamentos invocados, pelo que estamos perante uma questão de mérito conducente à improcedência da acção (Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 22-02-2007, processo nº 8592/2006-2, disponível em www.dgsi.pt).
O que se decidirá.
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A 08/02/2024 o interessado BB veio defender que a interessada AA faz uso reprovável do processo ao pretender que o tribunal confirme o seu incumprimento. Refere que a requerente acordou e celebrou um contrato no qual manifestava a sua vontade relativamente à divisão dos bens comuns, seja aqueles adquiridos antes ou depois do casamento, tendo agora se arrependido e pretende dar sem efeito o acordo celebrado. Defende, assim, que o comportamento daquela se enquadra na estatuição do artigo 542º do Código de Processo Civil, devendo ser condenada como litigante de má-fé, com as legais consequências.
Sobre esta matéria dispõem, em particular, os artigos 542º e 543º do Código de Processo Civil.
A Lei apenas considera como integrador de litigância de má fé algum dos comportamentos mencionados nas alíneas a) a d) do número 2 do artigo 542º desde que praticado com intenção (dolo) ou com negligência grave (revelando uma falta de cuidado que a generalidade das pessoas não revelaria).
A litigância de má fé visa, assim, sancionar comportamentos que violem os deveres impostos às partes de cooperação, probidade e lisura processual.
A multa a considerar em caso de condenação é fixada entre 2 UC e 100 UC, nos termos do artigo 27º, nº 3, do Regulamento das Custas Processuais, ponderados os critérios constantes do número 4 do mesmo preceito legal.
Por sua vez, a indemnização pode consistir no reembolso das despesas a que a má fé tenha obrigado a parte contrária, incluindo os honorários dos mandatários ou técnicos, ou no reembolso das despesas e na satisfação dos restantes prejuízos sofridos pela parte contrária como consequência directa ou indirecta da má fé (artigo 543º, número 1, do CPC). A indemnização é fixada em quantia certa (artigo 543º, nº 2, do CPC).
Tal como refere António Geraldes “o momento processual adequado a inserir a pronúncia judicial quanto à questão da litigância de má fé oficiosamente apreciada ou sob solicitação de uma das partes será a sentença final ou qualquer outra decisão que ponha termo ao processo (...)” (António Santos Abrantes Geraldes, Temas Judiciários, I Volume, Almedina, Coimbra, 1998, p. 333).
No caso em apreço, o comportamento da interessada AA não divisa qualquer litigância de má fé, tendo apenas feito valer a sua pretensão.
Não se mostra comprovado e evidenciado (com grau de probabilidade muito próximo da certeza) que – com dolo ou com culpa grave – a interessada tenha deduzido pretensão consabidamente infundada, nem que, por esse meio, tenham alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa, nem qualquer outro comportamento susceptível de integrar litigância de má fé.
Na verdade, a interessada utilizou o meio processual do inventário convicta da sua razão, embora não a tendo efectivamente.
Improcede, nestes termos, a pretensão do interessado BB.
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Por todo o exposto, julga-se procedente a oposição ao inventário, por o contrato-promessa de partilha ser válido, não havendo assim lugar a inventário.
Valor da causa: 132.790,00€ (artigo 302º, nº 3 do Código de Processo Civil).
Custas pela interessada AA.
Notifique e registe».
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Inconformada com a predita decisão veio a requerente interpor recurso tendo apresentado as seguintes alegações:« … II – CONCLUSÕES
1 – Na decisão de que se recorre foi decidido que “Por conseguinte, o incumprimento do contrato-promessa pelo interessado BB não obstava à execução específica do contrato, sendo este o meio próprio para a requerente fazer valer a sua pretensão.” – Itálico nosso.
2 – Na sentença de que se recorre encontra-se assente que:
“Conforme resulta do documento intitulado “Contrato-Promessa de Partilha”, junto aos autos a 08/02/2024 (referência CITIUS 157112SS), cujo teor ou assinatura não foram impugnados pelas partes, AA (na qualidade de primeira outorgante) e BB (na qualidade de segundo outorgante) declararam, em 02/11/2020, celebrar contrato-promessa de partilha, para vigorar após o pedido de divórcio a apresentar”, o qual se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
3 – Embora a recorrente não tenha invocado, expressamente, a exceção de nulidade do contrato por violação das regras da imutabilidade do regime de bens e da participação de ambos os cônjuges na proporção de metade no ativo e no passivo dos bens comuns, certo é que o Tribunal de que se recorre, em clara omissão de pronúncia, a qual se invoca para todos os efeitos legais, deveria ter apreciado de forma diferente a sua (in)validade, questão que, aliás, é de conhecimento oficioso, conforme o disposto no artigo 280.º e 286.º do Código Civil.
4 – O Tribunal de que se recorre analisou o contrato promessa de partilha de forma errónea, porquanto o referido contrato promessa de partilha dos bens comuns em causa nos autos não obedece à regra prevista no art.º 1730º, do CC, sendo nulo, nulidade esta que é oficiosamente cognoscível (art.ºs 280º e 286º do CC).
5 – Estando em causa a validade do contrato promessa celebrado entre as partes, importa começar por ter presente o estatuído no art.º 410º, do CC, o qual refere que “À convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo contrato são aplicáveis as disposições legais relativas ao contrato prometido, excetuadas as relativas à forma e as que, por sua razão de ser, não se devam considerar extensivas ao contrato promessa.”
6 – Daqui ressalta que o contrato promessa se rege pelas normas jurídicas atinentes aos contratos em geral e, para além delas, pelas normas relativas ao contrato prometido com as duas exceções mencionadas na parte final do n.º 1 daquele normativo legal.
7 – Prevê o art.º 405.º, n.º 1 do Código Civil que, “Dentro dos limites da lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos neste código ou incluir nestes as cláusulas que lhes aprouver.”.
8 – Nos regimes de comunhão, a partilha dos bens comuns, em consequência da extinção, pelo divórcio ou pela separação judicial de pessoas e bens, da comunhão de bens entre os cônjuges, só pode ocorrer depois de terem cessado, por qualquer daqueles motivos, as relações patrimoniais entre os cônjuges (art.ºs 1688.º e 1689.º, n.º 1 do Código Civil). G – A proibição de partilha do património conjugal antes da cessação das relações patrimoniais entre os cônjuges é diretamente imposta pelas regras da imutabilidade das convenções antenupciais e do regime de bens resultantes da lei e da livre revogabilidade das doações entre casados que, por sua vez, se fundam no princípio da equidade das relações patrimoniais entre os cônjuges (art.ºs 1714.º, nºs 1 e 2 e 1765.º nº 1 do Código Civil).
10 – O único limite colocado à validade do contrato promessa é o representado pelo princípio estruturante da participação dos cônjuges no património comum: a regra da metade, prevista no art.º 1730.º, n.º 1 do Código Civil.
11 – A lei proíbe as estipulações ou cláusulas contrárias à dita “regra da metade” imperativamente imposta pelo art.º 1730.º, proibição extensiva aos casos em que do contrato não constem os elementos necessários que permitam ajuizar sobre a observância dessa regra.
12 – É nulo, por violação do n.º 1 do art.º 1730.º do Código Civil, o contrato promessa de partilha que não contemple a totalidade das situações jurídicas ativas e passivas que compõem o património comum do casal, nem contenha a indicação do valor integral do conjunto dessas situações (cfr. Ac. da RP de 11.04.2019, relator Miguel Baldaia de Morais, disponível in www.dgsi.pt).
13 – Sendo estes acordos nulos, o cônjuge prejudicado tem o direito de invocar a nulidade a todo o tempo e apenas tem o ónus de provar, nos termos gerais, que o contrato promessa de partilha lhe reservou uma quota inferior a metade (vide, Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, Curso de Direito da Família, vol. I, 39 ed., p. 489).
14 – É certo que, como já referido, a recorrente não invocou expressamente tal nulidade no decurso do processo, estando, contudo, em tempo de o fazer, o que corporiza com a interposição do presente recurso.
15 – No entanto, sendo a mesma de conhecimento oficioso, deveria a sentença de que se recorre ter decidido em sentido contrário, porquanto de uma análise perfunctória ao contrato, resulta, por um lado que não foi respeitada a indicação do valor integral do conjunto das situações jurídicas ativas e passivas que compõem o património comum do casal e por outro lado, a promessa de repartição do património comum do casal viola a regra da metade, prevista no art.º 1730.º, n.º 1 do Código Civil.
16 – Quanto à violação da regra da metade, importa ter presente que quando a lei prescreve que os cônjuges participam por metade no ativo e no passivo da comunhão, tem-se especialmente em vista – dada a natureza que deve assinalar-se ao património conjugal comum – não a definição do objeto do direito de cada cônjuge àquela massa patrimonial de afetação especial, mas fixar a quota-parte a que cada um tem direito no momento da dissolução e partilha do património comum.
17 – Dada a natureza imperativa da regra, será nulo o contrato promessa de partilha, através do qual um cônjuge se vincula a partilhar o património comum, recebendo menos de metade do valor dele (art.º 294.º do Código Civil), como sucede no caso dos autos.
18 – O contrato promessa celebrado entre a recorrente e o recorrido não acata a regra da metade.
1G – Como decorre do documento que corporiza as declarações de vontade dos interessados, o respetivo património é constituído por duas frações – uma vivenda [alínea a) da cláusula 1.9 do contrato promessa] e um apartamento [alínea b) da cláusula 1.9 do contrato promessa] – o recheio de cada uma das frações – ao qual não foi determinado ou atribuído o seu valor – um veículo automóvel – alínea e) da cláusula 1.9 do contrato promessa – e uma participação social – alínea f) da cláusula 1.9 do contrato promessa – à qual foi atribuída o valor nominal da quota.
20 – Tendo por base os valores atribuídos ou reconhecidos pelas partes no contrato promessa celebrado, ao requerido são atribuídos bens de valor superior à metade a que tinha direito [verbas das als. e) e f)], levando a mais – atentos os valores atribuídos pelas partes – € 12.000,00 (doze mil euros), sem que tenha sido prevista a compensação da recorrente, designadamente com o recebimento de tornas.
21 – As quotas dos cônjuges têm, imperativamente, que ser iguais e no caso dos autos, é inegável que não o são.
22 – A violar a mencionada regra, o ajuizado contrato padece de vício de nulidade que o inquina no seu todo, nos termos dos art.ºs 280.º, 410.º, n.º 1 e 1730.º, n.º 1 do Código Civil, sujeito ao regime geral do art.º 286.º do mesmo diploma legal.
23 – Por força dessa nulidade – que, como alegado, é de conhecimento oficioso –, aquele contrato nenhuma eficácia produz no tocante à instância pendente do inventário e, portanto, não tem a virtualidade de impedir o seu normal prosseguimento.
24 – Assim, a celebração do contrato promessa de partilha – independentemente da sua validade – não constitui obstáculo ao prosseguimento do inventário judicial, dado que, por si só, não lhe retira razão de ser.
25 – Como lapidarmente se diz no Acórdão da Relação de Guimarães de 14.02.2013, relatado por Amílcar Andrade, disponível in www.dgsi.pt: “É certo que o contrato promessa impõe às partes a celebração do contrato prometido, ou seja, neste caso, a formalização da partilha nos termos acordados. Dele resulta a prestação de facto positivo: a obrigação de, no futuro, proceder à partilha nos termos acordados. Pelo contrato promessa de partilha foi prometido realizar a partilha dos bens comuns do casal, que é o acto adequado a pôr termo à universalidade de direito que constitui a comunhão de bens do casal. Mas, um contrato promessa de partilha não pode titular e legitimar uma partilha - não passa de uma simples promessa que pode ou não ser cumprida (cfr. Acórdão nº SSBS78 do Supremo Tribunal de Justiça, de 20 de Janeiro de 2000, acessível em www.dgsi.pt). Assim sendo, só a escritura prometida realizar poderia pôr termo definitivo à comunhão dos bens do casal. Porém, essa escritura de partilha não foi feita. Daí que o contrato promessa de partilha não constitua obstáculo ao prosseguimento do inventário judicial, não lhe retirando razão de ser.”.
26 – Por outro lado, o contrato promessa em causa nos autos, igualmente padece de nulidade, por violação do Princípio da "imutabilidade das convenções antenupciais e do regime de bens resultante da lei", previsto no art. 1714.º do Código Civil.
27 – Conforme resulta da certidão de casamento junta aos autos, o casamento foi dissolvido por decisão de 4 de dezembro de 2020, transitada na mesma data.
28 – O contrato promessa de partilha data de 2 de novembro de 2020, ou seja, foi celebrado em data anterior à dissolução do casamento.
29 – O "contrato-promessa de partilhas", apesar de não envolver ainda qualquer partilha de bens, tende para ela.
30 – Como bem se decidiu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no âmbito do Proc. n.º 083628 e disponível em https://juris.stj.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:1993:083628.D3?search=Gn80Mln4zHau WV45OAE, “… não sendo válida a partilha dos bens constitutivos do património de um casal enquanto os seus membros se acharem unidos pelo casamento, por violadora do princípio da "imutabilidade das convenções antenupciais e do regime de bens resultante da lei" a que se refere o artigo 1714 do Código Civil, por violadora do mesmo princípio se tem de haver a celebração de um contrato-promessa feito com o mesmo objectivo enquanto os cônjuges se não encontrarem divorciados, visto aos requisitos e efeitos do contrato-promessa (A. Varela in Das Obrigações em Geral, 2 edição, Volume I/248 e 24S) serem de aplicar, sob o aspecto em exame, as mesmas disposições legais.”
31 – Prossegue ainda aquele aresto “Um outro argumento se pode, todavia, invocar no mesmo sentido. (…) Durante os trabalhos preparatórios do actual Código Civil, discutiu-se, conforme nos dão conta P. de Lima e A. Varela (Código Civil Anotado, 4/35S), qual o caminho a seguir no domínio das relações patrimoniais entre os cônjuges: se o perfilhado no Código Civil de Seabra, que consagrava o princípio da imutabilidade das convenções antenupciais (artigo 1105 do Código de 18c7) importado do Código de Napoleão e que se propagou à generalidade das legislações latinas, se o inverso vindo do Código alemão, por este se mostrar conforme ao princípio básico da liberdade negocial dos cônjuges. Seguiu-se, como ninguém ignora, o que vinha sendo seguido pela legislação portuguesa: o da imutabilidade do regime de bens, quer este seja estipulado por convenção antenupcial, quer supletivamente, quer por forma imperativa (artigo 1714, 1717 e 1720 do Código Civil). Prevaleceram, "no juízo global sobre a matéria", as razões justificativas do princípio da inalterabilidade, quais sejam: a) a de afastar o risco de um dos cônjuges se aproveitar do ascendente psicológico eventualmente adquirido sobre o outro para obter uma alteração do regime que lhe fosse favorável; b) e de evitar que as convenções antenupciais, tantas vezes correspondentes e verdadeiros pactos de família, se pudessem alterar, após a celebração do casamento, por simples decisão dos cônjuges; e c) a da necessidade de salvaguardar os interesses de terceiros, cujas expectativas na manutenção do regime convencionado ou fixado por lei também poderiam vir a ser defraudadas, caso o mesmo se pudesse alterar livremente (Pires de Lima e A. Varela in Código Civil Anotado, IV/3c0 e A. Varela in Direito da Família, edição de 1S82, página 357).
32 – Mais se refere ali que “Dentro dos limites da lei - diz-se no artigo 1cS8 do Código Civil - os esposos podem fixar livremente, em convenção antenupcial, o regime de bens do casamento que lhes aprouver, mas, uma vez fixado ele - pouco ou nada importando, se por convenção antenupcial, supletivamente ou de forma imperativa -, impõe-se-lhes o mesmo nos termos do artigo 1714 vindo de citar.”
33 – "O princípio da imutabilidade abrange, não só as cláusulas constantes da convenção ou as normas do regime legalmente fixado, relativas à administração ou disposição de bens - ensina A. Varela no seu Direito da Família, obra cit. -, mas também .... a situação concreta dos bens dos cônjuges que interessa às relações entre estes. Daí - continua o insigne mestre - o não poderem os cônjuges "realizar entre si contratos de compra e venda, ".
34 – “Ora, o contrato-promessa de que nos vimos ocupando, enquanto destinado à outorga de uma partilha já definida em todos os seus pormenores, equivale, se não a um verdadeiro contrato-promessa de compra e venda, visto ambos os cônjuges se apresentarem como titulares de um património comum, pelo menos a um contrato com a potencialidade para com base nele se vir a alterar a situação concreta dos bens do casal, na medida em que, ao especificarem o que era de adjudicar a um e a outro, com a indicação do valor das tornas e pagamento do passivo, se não escusaram os seus titulares de negociar entre si os bens que a ambos pertenciam, o que, a concretizar-se a partilha nos termos estabelecidos ou a ser objecto de execução específica, não deixaria de conduzir à violação do princípio da imutabilidade do regime de bens do casamento fixado entre os dois interessados. E é isso tanto mais de salientar quanto é certo que, no caso "sub júdice", mesmo sem a outorga do contrato prometido, já a autora, ao dar pagamento às tornas acordadas e vir pagando o passivo relativo à casa desde Julho de 1S87, satisfez parte da sua prestação.”
35 – “Ignora-se o que levou os cônjuges a outorgar o contrato-promessa que subscreveram. Mas sendo por demais evidente que, uma vez decretado o divórcio, lhes assistiria sempre o direito de requerer inventário para partilha dos bens (artigo 1404-1 do Código de Processo Civil), através de cujo processo lhes seria fácil obter a divisão do seu património como lhes aprouvesse, custa um pouco a admitir que, ao fazê-lo, o hajam subscrito ambos os cônjuges em plena liberdade e, portanto, sem que um deles se propusesse fazer valer, nas circunstâncias, o seu ascendente sobre o outro. Ǫuer sim, quer não, uma coisa nos parece, todavia, certa: é a de que, sendo esta uma das razões que levaram à adopção do princípio da inalterabilidade do regime de bens a que se refere o citado artigo 1714 do Código Civil, os cônjuges, enquanto no estado de casados, se acham impedidos de partilhar os seus bens e, por isso mesmo, de subscrever qualquer contrato-promessa de partilhas a isso conducente. Fazê-lo, mesmo que um tal procedimento seja levado a cabo a contento de ambos, é subscrever um contrato-promessa que, por contender com o princípio da imutabilidade do seu regime de bens, se não pode deixar de haver como nulo.” – Itálico, negrito e sublinhado nosso.
Nestes termos e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado, revogando-se a sentença proferida, substituindo-se aquela decisão por outra que reconheça a nulidade do contrato promessa de partilha celebrado pelas partes, por violação quer da regra da metade prevista, quer do Princípio da "imutabilidade das convenções antenupciais e do regime de bens resultante da lei", previstas nos arts. 1730.º e 1714.º do Código Civil, ordenando-se o prosseguimento dos autos, para partilha do património comum do casal, …
…, pelo que decidindo desta forma, farão Vs. Exc.serena e acostumada JUSTIÇA…!!!
O requerido juntou contra-alegações formulando as seguintes conclusões: «… CONCLUSÕES
1. Contudo, entende o Recorrido não assistir qualquer razão à Recorrente no recurso pela mesma interposto.
2. Com efeito, conforme resulta da douta sentença recorrida, foi entre as partes, ora Recorrente e Recorrido celebrado em 02/11/2020 Contrato- Promessa de Partilha, para vigorar após o divórcio, tendo no mesmo as partes determinado a forma de partilha do ativo e passivo, dando-se por reproduzido o transcrito supra e assim o teor do indicado contrato.
3. A Recorrente vem em suma invocar a nulidade do contrato promessa de partilha por ter sido celebrado antes do divórcio, a nulidade do contrato promessa de partilha por violação das regras da imutabilidade do regime de bens, violando o mesmo a regra do direito de cada cônjuge a uma meação de metade nos bens comuns e ainda que a existência do contrato promessa de partilha não configurava no entendimento da Recorrente obstáculo ao prosseguimento do processo judicial de inventário, entendendo assim a Recorrente mal ter andado o tribunal a quo ao julgar procedente a oposição ao processo de inventário.
4. No que concerne à questão da validade do contrato promessa de partilha ter sido celebrado antes do divórcio, é hoje em dia unânime a jurisprudência no sentido de que o contrato promessa de partilha celebrado antes ou na pendência do divórcio é válido, desde que condicionado ao efetivo divórcio das partes – neste sentido vide o douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03/23/1999, Proc. n.º 99A121, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Proc. n.º 341/18.0T8ABT.E1.S1, de 07/10/2020, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 22-02-07, no âmbito do processo nº 07B312 e Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 05-11-2020, processo nº 437/17.6T8LRS.L1-2.
5. No caso em apreço, Recorrente e Recorrido celebraram contrato promessa de partilha em 02/11/2020, contrato esse objeto de reconhecimento notarial, constando expressamente do mesmo que se destinava a vigorar após o divórcio a apresentar.
6. Não restando assim dúvidas que o contrato promessa em causa foi celebrado para definir o preenchimento das meações dos cônjuges após divórcio, não tendo antes do divórcio efetivo, sido efetuada qualquer divisão dos bens.
7. Sendo assim o contrato em causa plenamente válido, não ocorrendo a sua nulidade, contrariamente ao alegado pela Recorrente, por ter sido celebrado antes do divórcio.
8. Acresce que, também no que às demais nulidades invocadas concerne, entende o Recorrido nenhuma razão assistir à Recorrente, não estando demonstrado ou sequer alegado nos autos a violação da regra da atribuição de metade a cada um dos cônjuges.
9. De facto, para fundamentar a alegada violação da regra de metade, invoca a Recorrente valores cuja origem ou forma de cálculo o Recorrido desconhece.
10. Não se aceitando nomeadamente o alegado no ponto 23.º das alegações da Recorrida que nenhum fundamento tem nem foi em momento algum anterior ao recurso sequer invocado ou demonstrado nos autos.
11. Acresce que, conforme resulta do contrato promessa de partilha obrigaram- se os outorgantes a adjudicar à Recorrente todo o recheio da FRAÇÃO I que a mesma escolhesse e todos os bens móveis que compunham o recheio da FRAÇÃO II - alíneas l) e m) da cláusula terceira do contrato promessa de partilha.
12. E, no que concerne à viatura automóvel a que foi pelas partes atribuído o valor de € 7.000,00 e a quota a que foi atribuído o valor de € 5.000,00, acordaram adjudicar tais bens ao Recorrido o que foi efetivamente realizado após o divórcio.
13. Sendo a meação da Recorrente em tais bens de € 6.000,00.
14. Não é possível assim concluir, conforme vem alegar a Recorrente que tenha sido violada a regra de metade.
15. Tendo de facto as partes acordado adjudicar à Recorrente todo o recheio que a mesma escolhesse de um dos imóveis e todo o recheio do outro imóvel.
16. Não tendo em momento algum do processo sido pela Recorrente invocado que a prometida partilha violasse a divisão paritária do ativo e do passivo, nem constando dos autos elemento algum que permitisse concluir nesse sentido.
17. O que efetivamente não ocorre nem resulta de forma alguma do contrato promessa de partilha, não violando por conseguinte o contrato promessa de partilha o disposto nos artigos 1730.º e 1790.º do Código Civil, tendo assim de improceder também tal invocada nulidade.
18. Por outro lado, invoca a Recorrente que a existência do contrato promessa de partilha não obstava ao prosseguimento dos presentes autos de inventário.
19. De facto, do teor do contrato promessa de partilha celebrado entre as partes decorre que estas pretenderam fixar os termos em que deveria ser dividido o ativo e passivo dos bens que a ambos pertencia.
20. Tendo previsto expressamente Recorrente e Recorrido no contrato promessa de partilha celebrado em cartório notarial – cláusula 5.ª que o contrato ficava sujeito ao regime da execução especifica, nos termos do disposto no art.º 830.º e ss. do Código Civil.
21. Ora, tendo sido celebrado contrato promessa de partilha e acordada a regra da execução especifica, encontravam-se as partes vinculadas a, em caso de incumprimento recorrer à ação judicial de execução especifica, não podendo prosseguir o processo de inventário.
22. Neste sentido veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, Proc. n.º 2239/22.9T8BRG.G1, de 05/18/2023 e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15/12/2011 proferido no âmbito do processo n.º 2049/06.0TBVCT.G1.S1.
23. Nestes termos, considerando o supra exposto, entende o Recorrido que deverá improceder na totalidade o recurso pela Recorrente interposto, mantendo-se na íntegra a douta sentença recorrida.
TERMOS QUE, deve negar-se provimento ao recurso, por manifesta ausência de fundamento, com as legais consequências, assim fazendo-se inteira JUSTIÇA!!
Foi proferido despacho que admitiu o recurso interposto pela interessada como sendo de apelação, a subir nos autos e com efeito devolutivo.
***
II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Cód. Processo Civil.
Porque assim, atendendo às conclusões das alegações apresentadas pela apelante, resulta que as questões a analisar são as seguintes:
-nulidade do contrato promessa de partilha por ter sido celebrado antes do divórcio;
- nulidade do contrato promessa de partilha por violação das regras da imutabilidade do regime de bens, violando o mesmo a regra do direito de cada cônjuge a uma meação de metade nos bens comuns;
- a existência do contrato promessa de partilha não configurava no entendimento da Recorrente obstáculo ao prosseguimento do processo judicial de inventário, entendendo assim a Recorrente mal ter andado o tribunal a quo ao julgar procedente a oposição ao processo de inventário.
III - FUNDAMENTOS DE FACTO
Os factos a ter em conta são os acima referidos no relatório, para além de constar da decisão recorrida a seguinte matéria de facto, e resultar dos autos o seguinte:
Conforme resulta do documento intitulado “Contrato-Promessa de Partilha”, junto aos autos a 08/02/2024 (referência CITIUS 15711299), cujo teor ou assinatura não foram impugnados pelas partes, AA (na qualidade de primeira outorgante) e BB (na qualidade de segundo outorgante) declararam, em 02/11/2020, celebrar contrato-promessa de partilha, para vigorar após o pedido de divórcio a apresentar, nos seguintes termos:
a) A primeira e o segundo outorgantes manterão a compropriedade dos seguintes bens após o divórcio:
I. fracção autónoma, designada pela letra “B”, destinada a habitação, correspondente a T3, de rés-do-chão e andar, com entrada pelo número ...04, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito na Rua ..., Quinta ..., cidade de Aveiro, descrito na Conservatória do Registo Predial de Aveiro, sob o nº ...66, da freguesia ..., inscrito na matriz predial urbana da respectiva freguesia sob o artigo ...39, com o valor patrimonial tributário de 143.480,00€;
II. fracção autónoma, designada pelas letras “F FR”, destinada a habitação, correspondente a T2, situada no 2º piso esquerdo trás e piso duplex (recuado), no Bloco ..., com entrada pelo nº ...0, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito na Rua ..., ..., cidade de Aveiro, descrito na Conservatória do Registo Predial de Aveiro, sob o nº ...82, da freguesia ..., inscrito na matriz predial urbana da respectiva freguesia sob o artigo ...50, com o valor patrimonial tributário de 25.976,45€.
Mais acordaram, neste âmbito, que a fracção referida em a) ficaria afecta à propriedade exclusiva do segundo outorgante enquanto a fracção referida na alínea b) ficaria afecta à propriedade exclusiva da primeira outorgante.
III. Recheio das fracções referidas em I. e II.
IV. Veículo automóvel, marca BMW, modelo ..., matrícula ..-CJ-..,
V. Quota de 5.000,00€ que constitui a totalidade do capital social da sociedade “A..., Unipessoal, Lda.”, pessoa colectiva nº ...18, com sede na Rua ..., ..., ... Aveiro
b) Todos os encargos relativos aos créditos que ambos contraíram, concretamente, os provenientes dos contratos de mútuo nºs ...96-8, ...35-7, ...09-2 e ...28-2, celebrados com o Banco 1..., bem como seguros de vida e impostos respeitantes aos sois identificados imóveis, enquanto subsistirem, serão suportados em partes iguais por ambos os Outorgantes, nas datas dos respectivos vencimentos.
c) Os custos das apólices de seguro do recheio de cada um dos imóveis serão exclusivamente suportados pelo Outorgante que ficou com o direito de neles residir.
d) Os custos de condomínio, encargos com a manutenção das fracções, bem como qualquer serviço que as fracções usufruam serão exclusivamente suportadas por cada um dos outorgantes afecto à respectiva fracção.
e) Eventuais benfeitorias que cada outorgante realize na fracção que lhe fica afecta reverterá para o próprio, na hipótese de eventual venda e no caso dessas benfeitorias darem origem a uma mais valia em termos de preço de venda.
f) Cada um dos outorgantes fica com o direito de dar de arrendamento a fracção que lhe fica afecta, obrigando-se o outro a outorgar o contrato de arrendamento, revertendo a renda a favor do outorgante ao qual a fracção fica afecta.
g) Desde que devidamente justificado, nomeadamente, para fazer face a necessidades financeiras sérias, os Outorgantes acordam que se poderá proceder à venda de qualquer dos identificados imóveis, obrigando-se a outorgar e a assinar tudo o que se mostre necessário para esse fim.
h) A primeira outorgante poderá escolher os bens móveis que compõem o recheio da fracção referida em I e ao segundo outorgante serão adjudicados os bens móveis remanescentes que compõem o recheio da referida fracção.
i) O segundo outorgante promete adjudicar, após a decretação do divórcio e a título gratuito, à primeira outorgante a sua meação em todos os bens móveis que compõem o recheio da fracção referida em II.
j) A primeira outorgante promete adjudicar, após a decretação do divórcio e a título gratuito ao segundo outorgante a sua meação no veículo automóvel descrito em IV., obrigando-se a colaborar em todos os actos e a assinar todos os documentos que se afiram necessários ao efeito pretendido.
k) A primeira outorgante promete adjudicar, após a decretação do divórcio e a título gratuito ao segundo outorgante a sua meação na quota descrita em V. obrigando-se a colaborar em todos os actos e a assinar todos os documentos que se afiram necessário ao efeito pretendido e por sua vez, o segundo outorgante, qua aceita a adjudicação, promete alterar, no prazo de 60 dias, a denominação social da empresa de forma a que deixe de conter o nome da primeira outorgante, assumir a responsabilidade pelas obrigações directa ou indirectamente provenientes ou relacionadas com a empresa.
l) Os outorgantes mantêm a vinculação à conta de depósitos à ordem associada aos contratos de mútuos e aos mesmos, garantindo a manutenção das condições originais dos mútuos junto do Banco 1..., até ao termo dos respectivos prazos de vigência; ou até que se afiram condições, junto do Banco, para a desvinculação em simultâneo de um dos outorgantes em cada um dos contratos de mútuo, sem o incremento de encargos e/ou o reforço das garantias prestadas.
Mais declararam que o mencionado contrato promessa de partilha ficaria sujeito aos princípios e normas legais aplicáveis, designadamente ao regime da execução específica, nos termos do disposto no artigo 830º do Código Civil.
- Não obstante o teor daquele documento, veio a interessada, em 27/10/2023, requerer inventário na sequência da acção de divórcio, indicando na relação de bens apresentada em 04/12/2023 (referência CITIUS 15410926) bens coincidentes com aquele a que se reporta o aludido contrato-promessa. Concretamente, do lado do activo relacionou os bens mencionados nos pontos I., III. e IV. supra, especificando no que concerne ao ponto III. os concretos bens móveis que compõem o recheio da fracção autónoma mencionada em I. E, do lado do passivo, os bens mencionados na alínea b) supra.
-Na referida relação de bens não está relacionado o imóvel descrito em II. sobre o qual foi já proferida sentença no âmbito do Processo de Divisão de Coisa Comum, que correu termos no Juiz 2 do Juízo Local Cível de Aveiro com o n.º ... (Cfr.Documento junto sob o nº 1 com o requerimento datado de 24-04-2024, referência CITIUS 16065538).
-Em 4 de dezembro de 2020, foi decretado o divórcio por mútuo consentimento, entre a aqui requerente e o requerido, processo que correu termos na Conservatória do Registo Civil de Aveiro, sob o n.º ...50/2020, conforme resulta do doc. 1 que se junta e cujo teor se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.
-Do casamento entre a requerente e o requerido subsistem bens em situação de comunhão.
IV - FUNDAMENTOS DE DIREITO
A composição do património comum é, portanto, aquela que existia na data da proposição da acção de divórcio e não em momento anterior, e só os bens existentes nesse momento devem ser objecto de partilha.
A partilha dos bens comuns decorrente do divorcio ou separação judicial de pessoas e bens, ocorre depois de terem cessado as relações patrimoniais entre os cônjuges (art.ºs 1688º e 1689º, nº 1 do CC).
Dissolvido o casamento (por morte ou divórcio), coloca-se o problema da determinação e especificação dessa meação nos concretos bens que integram o património comum, sendo que esse problema é resolvido (judicial ou extrajudicialmente) pela partilha subsequente ao divórcio.
Nada impede que os cônjuges antecipem a solução extrajudicial e celebrem um contrato-promessa, na perspectiva do decretamento de divórcio, o qual funcionaria como condição suspensiva do cumprimento daquele contrato (o contrato de partilha versado na promessa fica prometido para um tempo após o casamento).
O contrato promessa de partilha origina apenas prestações de facto jurídico - a celebração do contrato definitivo.
Mas existem os contratos acessórios realizados no âmbito dos processos de divorcio que visam a fixação antecipada das regras a que deve obedecer a liquidação do regime matrimonial após a extinção ou a modificação da relação jurídica matrimonial.
Existem duas figuras distintas: de um lado, o contrato promessa de partilha; do outro o contrato de partilha sob condição suspensiva (cfr. Vaz Serra, Contrato-Promessa, BMJ nº 76, p. 35).
O contrato de partilha deve ser interpretado e integrado nos termos do art.º 239.º do CC, que determina: “Na falta de disposição especial, a declaração negocial deve ser integrada de harmonia com a vontade que as partes teriam tido se houvessem previsto o ponto omisso, ou de acordo com os ditames da boa fé, quando outra seja a solução por eles imposta”
Quando estejam em causa negócios formais, estatui o art. 238.º, n.º 1, do CC que o sentido correspondente à impressão do destinatário não pode valer se não tiver um mínimo de correspondência, ainda que imperfeita, no texto do respectivo documento.
O contrato promessa consiste na convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo contrato (artº 410º do CC). E cria a obrigação de contratar, isto é, a obrigação de emitir uma declaração de vontade correspondente ao contrato prometido. Trata-se de uma obrigação de facto positivo.
Com o contrato promessa para partilha dos bens comuns do casal, os ex-cônjuges obrigam-se efectivamente a proceder à partilha duma certa forma.
Deste modo, a simples celebração do contrato promessa não importa qualquer alteração das regras aplicáveis quer á comunhão quer à titularidade dos bens nem a modificação do estatuto de qualquer bem específico: nem a massa dos bens comuns nem a dos bens próprios de qualquer dos cônjuges sofrem a mínima alteração (art.º 1714º nºs 1 e 2 do CC).
A promessa conjugal de partilha deixa, portanto, incólume o princípio da imutabilidade.
O único limite colocado à validade do contrato promessa é o representado pelo princípio estruturante da participação dos cônjuges no património comum: a regra da metade, prevista no art.º 1730º nº 1 do CC.
É, assim, nulo, por violação do nº 1 do art.º 1730º, o contrato promessa de partilha que não contemple a totalidade das situações jurídicas activas e passivas que compõem o património comum do casal, nem contenha a indicação do valor integral do conjunto dessas situações.
Sendo estes acordos nulos, o cônjuge prejudicado tem o direito de invocar a nulidade a todo o tempo e apenas tem o ónus de provar, nos termos gerais, que o contrato promessa de partilha lhe reservou uma quota inferior a metade (vide, Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, Curso de Direito da Família, vol. I, 3ª ed., p. 489).
Invoca a recorrente a nulidade do contrato de promessa por ter sido realizado antes do divórcio.
Improcede este segmento do recurso porque é válido o contrato-promessa de partilha dos bens comuns do casal, celebrado pelos cônjuges na pendência de acção de divórcio por mútuo consentimento e subordinado à condição suspensiva do decretamento desse divórcio (vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Proc. n.º 341/18.0T8ABT.E1.S1, de 07/10/2020).
Por outro lado, improcedem igualmente as restantes invocadas nulidades que a apelante não demonstra ou alega a violação da regra da atribuição de metade a cada um dos cônjuges (não realiza nenhuma concretização objectiva que permita essa conclusão).
De resto, verifica-se que a apelante apenas em sede de recurso veio invocar a nulidade desse contrato, nunca o tendo realizado anteriormente nos autos, nem existem elementos que permitisse concluir nesse sentido.
Portanto improcede este segmento do recuso, sendo que a decisão recorrida não padece de qualquer nulidade dado ter partido do pressuposto da validade desse contrato.
Verifica-se que no caso as partes celebraram um contrato de partilha mas essa circunstância não obsta á possibilidade de instaurar um processo de inventário.
O contrato subscrito pelos ora interessados constitui uma simples promessa e, caso seja válido, produz apenas efeitos obrigacionais, não titulando qualquer partilha.
Consequentemente, existindo bens comuns do casal que ainda se não encontram partilhados, é manifesto que aquando da instauração da instauração dos autos de inventário existia fundamento legal para a sua propositura para efeito de futura partilha.
As obrigações pecuniárias assumidas no contrato-promessa de partilha só passam a ser exigíveis mediante a celebração da escritura de partilha extrajudicial ou mediante a procedência da ação de execução específica de tal contrato-promessa de partilha, na qual se discute e afere sobre o incumprimento do contrato-promessa de partilha.
A celebração do contrato promessa de partilhas não obstante a sua validade, não constitui obstáculo ao prosseguimento do inventário judicial, dado que não lhe retira razão de ser. Porque pelo contrato promessa de partilha foi prometido realizar a partilha dos bens comuns do casal, que é o acto adequado a pôr termo à universalidade de direito que constitui a comunhão de bens do casal. Mas, um contrato promessa de partilha não pode titular e legitimar uma partilha - não passa de uma simples promessa que pode ou não ser cumprida (cfr. Acórdão nº 99B978 de Supremo Tribunal de Justiça, 20 de Janeiro de 2000, acessível em www.dgsi.pt).
Portanto, só a escritura prometida realizar poderia pôr termo definitivo à comunhão dos bens do casal (e a escritura não foi realizada).
Neste sentido, vide o Ac da RL Processo: 1421/20.8T8CSC.L1-8 Relator: CARLA MARIA DA SILVA SOUSA OLIVEIRA, 12-01-2023 Sumário: I - Nos regimes de comunhão de bens, os contratos promessa de partilha de bens comuns são válidos, desde que respeitada a regra imperativa da metade prevista no art.º 1730º, do CC.
II- A celebração de contrato promessa de partilha entre os ex-cônjuges, ainda que válido, não constitui, por si só, obstáculo ao prosseguimento de inventário judicial para partilha dos bens comuns do casal dissolvido, não lhe retirando razão de ser.»
Aliás, somos do entendimento que a celebração do contrato promessa de partilha - independentemente da sua validade - não constitui obstáculo ao prosseguimento do inventário judicial, dado que, por si só, não lhe retira razão de ser.
Para outros desenvolvimentos, vide o Ac da RL 1421/20.8T8CSC.L1-8, Relator: CARLA MARIA OLIVEIRA, 12-01-2023, Sumário: I - Nos regimes de comunhão de bens, os contratos promessa de partilha de bens comuns são válidos, desde que respeitada a regra imperativa da metade prevista no art.º 1730º, do CC.
II- A celebração de contrato promessa de partilha entre os ex-cônjuges, ainda que válido, não constitui, por si só, obstáculo ao prosseguimento de inventário judicial para partilha dos bens comuns do casal dissolvido, não lhe retirando razão de ser.»
Neste sentido, vide o Ac RG 3818/10.2TBGMR-A.G1 Relator: AMÍLCAR ANDRADE Data do Acórdão: 14-02-2013 Sumário: I. A celebração do contrato promessa de partilhas ocorrida na pendência do processo de inventário, não obstante a sua validade, não constitui obstáculo ao prosseguimento do inventário judicial, dado que não lhe retira razão de ser.
II. Pelo contrato promessa de partilha as partes contratantes prometem realizar a partilha dos bens comuns do casal.
III. Assim, só a escritura prometida realizar poderia pôr termo definitivo à comunhão dos bens do casal.
IV. Não tendo essa escritura de partilha sido feita, não poderá o contrato promessa constituir obstáculo ao prosseguimento do inventário, não lhe retirando razão de ser.
E vide o Ac da RE Processo: 1721/07-2 Relator: MANUEL MARQUES, Data do Acórdão: 18-10-2007 Sumário: I - A oposição ao inventário destina-se a atacar o processo na sua estrutura, na sua razão de ser, nomeadamente nos casos em que inexistem bens a partilhar ou em que os bens já se encontram partilhados, e apenas comporta dois articulados onde devem ser expostas as questões relativas à razão de ser do inventário, não sendo por isso lícito ao respondente/agravante deduzir quaisquer pedidos (de tipo reconvencional) como seja a declaração de nulidade de um contrato promessa de partilhas.
II – O contrato promessa de partilha, celebrado na sequência de divórcio, produz apenas efeitos obrigacionais, não titulando qualquer partilha. Consequentemente, existindo bens comuns do casal que ainda se não encontram partilhados, existe fundamento legal para qualquer dos interessados requerer inventário para partilha dos bens.
III – Não é legalmente admissível a oposição parcial ao inventário com fundamento em que parte dos bens já estão partilhados essa questão pode ser suscitada em sede de reclamação contra a relação de bens.
IV - O facto de algum dos bens relacionados no inventário não o ter sido na acção de divórcio não invalida o seu posterior relacionamento naqueles autos, não produzindo a decisão homologatória do divórcio qualquer efeito quanto à relação de bens, nomeadamente em termos de caso julgado sobre os bens comuns do casal.
E vide o Ac da RE Processo: 1660/22.7T8PTM.E1 Relator: MARIA ADELAIDE DOMINGOS 08-02-2024 Sumário:
1. No âmbito do contrato-promessa quando as partes não fixam um prazo concreto para a realização da escritura definitiva, mas um prazo para a obtenção de condições para a sua realização, findo o qual será marcada a escritura pública (prazo esse, prorrogável ou não, conforme os casos), a vontade das partes assim plasmada deve ser interpretada no sentido de terem fixado um prazo relativo, não fixo com limite absoluto, verificando-se tão só uma situação de mora debitoris, cujo início apenas ocorre após haver interpelação da parte em falta para cumprir o prometido.
2. Não tendo sido estabelecido no contrato-promessa a qual das partes incumbia a marcação da escritura, qualquer uma delas o podia fazer, visto que se trata de uma prestação fungível.
3. Nessa situação, se nenhuma das partes marcar a escritura, não existe uma situação de mora, nem de incumprimento definitivo.
4. Nesse contexto, a interposição de processo de inventário por um dos ex-cônjuges outorgantes do contrato-promessa de partilha, não o faz incorrer em mora ou em incumprimento definitivo.
Daí que o contrato promessa de partilha não constitua obstáculo ao prosseguimento do inventário judicial, não lhe retirando razão de ser.
Assim, dado não estarem preenchidos os pressupostos de uma partilha judicial a decisão recorrida terá de ser revogada.
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V- DECISÃO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação integralmente procedente, e nesta conformidade revogando-se integralmente o despacho recorrido e em sua substituição se determina a continuação dos autos de inventário.