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PETIÇÃO INICIAL
EMBARGOS
INDEFERIMENTO LIMINAR
PRESCRIÇÃO
Sumário
A petição de embargos de executado deve ser liminarmente indeferida, por preclusão do meio de defesa, se nela vem invocado como fundamento da oposição a prescrição do crédito exequendo cujo prazo tinha integralmente decorrido em data anterior à apresentação do requerimento de injunção. (Sumário da Relatora)
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Évora
I – As Partes e o Litígio
Recorrente / Embargante: (…)
Recorrida / Embargada: NOS Comunicações, SA
Por apenso ao processo executivo fundado em requerimento de injunção, instaurado a 16/04/2024, a Embargante apresentou-se a deduzir oposição, pugnando pela extinção da execução, invocando:
- a prescrição do crédito exequendo, uma vez que as faturas se referem ao período entre 26/02/2017 e 28/07/2022 e que o prazo de prescrição é de seis meses, prescrição que já se verificava aquando da apresentação do requerimento de injunção;
- tendo sido citada na execução a 22/01/2025, encontra-se prescrito o crédito, inclusivamente o da última fatura;
- o requerimento executivo é inepto, não contém a alegação dos factos concretos que fundamentam a pretensão;
- o contrato da prestação de serviços é nulo, não foi por si assinado nem lhe foi entregue;
- não assiste à Exequente o direito a receber a verba peticionada, impugnando que tenham sido prestados os serviços telefónicos.
II – O Objeto do Recurso Os embargos foram liminarmente indeferidos por manifesta improcedência da nulidade do requerimento decorrente de falta de causa de pedir e por os demais fundamentos invocados não se ajustarem ao disposto no artigo 857.º do CPC, já que eram invocáveis em sede de oposição à pretensão deduzida no requerimento de injunção, o que implica na preclusão de agora os alegar.
Inconformada, a Embargante apresentou-se a recorrer, pugnando pela revogação da sentença recorrida, a substituir por outra que julgue procedentes os embargos e provada a prescrição dos créditos em momento anterior à apresentação da injunção e, em consequência, inválido o título executivo, absolvendo-a do pagamento de todas as quantias peticionadas ou, caso não se entenda, deverá ser considerada verificada a exceção de ineptidão do requerimento injuntivo/petição inicial, absolvendo-a da instância executiva, nos termos dos artigos 186.º, n.º 2, alínea a), 278.º, n.º 1, alínea b), 576.º, n.º 1 e 2 e 577.º, alínea b), do CPC. Concluiu a alegação de recurso nos seguintes termos:
«1. A Exequente instaurou a presente ação executiva, para pagamento de quantia certa, no valor que aduziu de € 6.059,06.
2. A dívida em causa nos autos reporta-se às datas entre 26/02/2017 e 28/07/2022, remetendo para as faturas seguintes:
- Fatura n.º FT 201783/497760, no valor de € 6,15, emitida em 23-10-2017 e vencida em 19-11-2017; - Fatura n.º FT 201783/653461, no valor de € 176,66, emitida em 23-12-2017 e vencida em 19-01-2018; - Fatura n.º FT 201883/77774, no valor de € 111,56, emitida em 23-01-2018 e vencida em 19-02-2018; - Fatura n.º FT 201883/153503, no valor de € 114,03, emitida em 23-02-2018 e vencida em 19-03-2018; - Fatura n.º FT 201883/233130, no valor de € 104,66, emitida em 23-03-2018 e vencida em 19-04-2018;
(…)
3. - Fatura n.º FT 202090/741173, emitida em 05-04-2020 no valor de € 102,07, vencida em 28-04-2020 e de que permanecem em dívida € 8,34; - Fatura n.º FT 202090/957091, no valor de € 96,4, emitida em 05-05-2020 e vencida em 28-05-2020; - Fatura n.º FT 202090/1092730, no valor de € 126,61, emitida em 05-06-2020 e vencida em 28-06-2020;
(…)
4. - Fatura n.º FT 202290/194016, no valor de € 55,33, emitida em 04-01-2022 e vencida em 28-01-2022; - Fatura n.º FT 202290/443465, no valor de € 55,47, emitida em 02-02-2022 e vencida em 26-02-2022; - Fatura n.º FT 202290/685431, no valor de € 71,95, emitida em 03-03-2022 e vencida em 28-03-2022; - Fatura n.º FT 202290/945938, no valor de €83,31, emitida em 05-04-2022 e vencida em 28-04-2022; - Fatura n.º FT 202290/1201440, no valor de € 81,66, emitida em 03-05-2022 e vencida em 28-05-2022; - Fatura n.º FT 202290/1457712, no valor de € 76,22, emitida em 02-06-2022 e vencida em 28-06-2022; - Fatura n.º FT 202290/1709000, no valor de € 44,03, emitida em 04-07-2022 e vencida em 28-07-2022.
5. A injunção deu entrada em 04/11/2022, com o n.º 98281/22.3YIPRT e foi colocada fórmula executória aos 19/12/2022, porquanto, estão prescritos todos os valores e respetivos juros, pelo menos, até 28/05/2022, e, consequentemente, o direito de exigir os pagamentos dos preços dos serviços prestados, prescreveu, no prazo de seis após a sua prestação.
6. Está demonstrado que o direito ao pagamento pretendido pela Exequente se encontrava já prescrito, ainda que se possa conceder a exceção do valor de 44,03 euros da fatura emitida a 04-07-2022 e vencida a 28-07-2022, aquando da apresentação da injunção que serve de título à execução.
7. A Lei n.º 23/96 de 26 de Julho, que cria no ordenamento jurídico alguns mecanismos, destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais e onde se estabelece que os créditos provenientes da prestação de serviços públicos essenciais, como é o serviço de telefone e, designadamente, nos termos do artigo 10.º, n.º 1, “o direito ao recebimento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação”.
8. O crédito reclamado está prescrito, nos termos e para os efeitos do artigo 10.º da Lei n.º 23/96, de 26/07, pelo que, também os juros de mora não são devidos, em virtude da prescrição dos montantes que lhes deram causa.
9. Nos termos do artigo 493, n.º 3, do CPC, a prescrição constitui uma exceção perentória e implica a, no caso em apreço, a absolvição total do pedido.
10. Foram, assim, violadas as normas contidas no n.º 2 do artigo 729.º do Código do Processo Civil.
11. Foi violado o disposto no artigo 10.º, n.º 1, da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, porquanto, o direito de exigir o pagamento do preço do serviço prestado, prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação.
12. Foi igualmente desconsiderado o artigo 304.º do Código Civil, “completada a prescrição, tem o beneficiário a faculdade de recusar o cumprimento da prestação, ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito”.
13. O douto Tribunal a quo, ao entender que com a aposição da fórmula executória à injunção, esta prescrição não poderia ser invocada, consubstanciou a violação da norma do artigo 493.º, n.º 3, do CPC, atento a que a prescrição constitui uma exceção perentória e implica a, no caso em apreço, a absolvição total do pedido.
14. A douta decisão acrescentou que seria necessário que a Embargante tivesse posto em causa a existência ou a validade do procedimento de injunção, o que, diz, não aconteceu.
15. Mas a não oposição ao procedimento de injunção não significa qualquer renúncia tácita à prescrição.
16. Já é vasta a jurisprudência no sentido de considerar que o facto de a prescrição do direito não ter sido logo alegada em oposição à injunção, não preclude o direito a suscitar tal facto posteriormente em oposição à execução quando esta – como é o caso destes autos – se fundamenta em injunção.
17. Tem sido entendimento dos tribunais superiores que é justamente o reconhecimento de que um processo de injunção não oferece os mesmos meios de defesa aos requeridos que outros meios, designadamente, as ações de condenação, que o STJ já veio, expressamente, autorizar que, excecionalmente, em oposição à execução instaurada com base em injunção, o executado possa lançar mão de qualquer fundamento que pudesse ter sido invocado no processo declarativo, sob pena de violação do princípio da indefesa consagrado no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa.
18. Assim, podia – conforme fez – a Embargante só agora, em oposição à execução, arguir a prescrição da dívida à data em que foi apresentada a injunção.
19. Prescrição que, a verificar-se – como claramente se verificou – tem como efeito necessário a invalidade do título executivo o qual, por consequência, não tem a virtualidade de “ressuscitar” um prazo de prescrição, esgotado.
20. Ao limitar a possibilidade de arguir em oposição a esta execução apenas o decurso, está o Tribunal a quo a limitar a Embargante ao meio de defesa disponível em toda e qualquer execução e está, na prática, a negar à Embargante o exercício de defesa, ainda que a título excecional, conferido por lei e pelo STJ em caso de oposição por execução instaurada com base em injunção e a violar o princípio da proibição da indefesa, consagrado no artigo 20.º, n.º 1, da CRP, que esteve na origem do Acórdão do TC 388/2013 e do Acórdão do TC 264/2015.
21. A natureza extrajudicial do título em questão, distinto das sentenças, sempre poderá executado invocar, como fundamento da oposição à execução, qualquer fundamento suscetível de deduzir como defesa, no processo de declaração, com vista à destruição dos efeitos do título executivo e da execução, quer esses fundamentos sejam de natureza processual, quer sejam de natureza substantiva.
22. A circunstância da embargante/apelante não ter deduzido oposição ao requerimento de injunção, na sequência deste, não faz precludir a possibilidade de suscitar, posteriormente, os respetivos meios defesa, ainda que pudesse tê-los usado anteriormente, já que, neste caso, não tem aplicação o preceituado no artigo 573.º, n.º 2, do CPC, não se verificando, em sede de oposição à execução, mediante embargos, o efeito de preclusão de uma ampla defesa, podendo, em consequência invocar, como invocou, a prescrição do direito de que a exequente se arroga no requerimento executivo.
23. E estando em causa uma execução fundada em requerimento de injunção, ao qual foi aposta a fórmula executória, a oposição à execução, mediante embargos deduzida pela embargante/apelante não está limitada aos fundamentos enunciados no 857.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, podendo basear-se em quaisquer outros factos ou circunstâncias que possam ser invocados no processo de declaração.
24. Assim, podia – conforme fez – a Embargante só agora, em oposição à execução, arguir a prescrição da dívida à data em que foi apresentada a injunção.
25. Pede, por isso, a apelante, que a sentença recorrida seja revogada e substituída por outra que julgue procedente os embargos e provada a prescrição dos créditos da Exequente em momento anterior à apresentação da injunção e, em consequência, inválido o título executivo, tudo com as legais consequências.
26. Para além de que, o requerimento executivo padece de ineptidão, não cumprindo os requisitos, o que se invoca para todos os efeitos legais, pois, a Exequente faz uma alegação genérica, desprovida de factos concretos e uma errónea contabilização dos juros, não está caracterizada a situação de incumprimento.
27. Não se extrai da leitura do requerimento, tampouco, a atividade exercida pela Exequente e a que título o mesmo contrato foi celebrado, nem as condições eventualmente subjacentes ao alegado contrato e, em consequência, ao requerimento de injunção e depois da execução, assim como, data de vencimento das referidas prestações, taxa de juro e a interpelação para pagamento e data da mesma.
28. Ao contrário do que o douto tribunal a quo considerou e salvo o melhor respeito, entende-se que, a Exequente não alegou com o rigor que deveria, optando por fazer uma menção genérica dos números de dois contratos, dos quais a Executada não tem conhecimento, desconhecendo a data da celebração dos mesmos e a que respeitam, não reconhecendo os números invocados.
29. A Executada não tem qualquer contrato de prestação de serviços na sua posse.
30. A Executada invocou a nulidade do contrato, porquanto, não leu qualquer documentação, não assinou qualquer documento ou outro, sendo, aliás, as assinaturas vertidas nos documentos juntos, não coincidentes na letra e forma de assinatura, que permita aferir quanto à legitimidade em agir no presente pleito e o fundamento da pretensão.
31. Da observação dos números dos contratos indicados, nenhum tem correspondência com os documentos juntos, designados por comprovativo de intervenção técnica e documento de confirmação da conta, nem existe qualquer correspondência das datas invocadas, em tais documentos.
32. A Exequente não tem direito a receber a quantia global de € 6.059,06 a que se arroga, pelo que, a presente execução deve ser julgada improcedente, devendo a Executada ser absolvida do pedido.
33. A exequente não fornece aos autos a informação detalhada e discriminada do valor requerido e a presente execução deve improceder de facto e de Direito, uma vez que, a quantia apresenta a juízo não se encontra correta e não é legítima.
34. Para além disso, alegou a Embargante ora recorrente, a ineptidão da petição inicial, tendo o douto Tribunal a quo, considerado que não pode acolher a posição plasmada pela executada, quanto à alegada omissão da descrição dos factos constitutivos da sua obrigação e, segundo o douto tribunal, muito menos, dos termos da liquidação da mesma.
35. Entendeu o douto Tribunal a quo que é a executada jamais se poderia colocar na confortável posição de impugnar essa descrição e liquidação sem mais, antes se lhe impondo um ónus de especificar o que, na sua visão, se encontrem corretamente peticionado – artigo 342.º, n.º 2, do Código Civil e que a exequente disse expressamente qual o seu pedido: pagamento de quantia certa e liquidou esse pedido, indicando capital e juros de mora e sua taxa, concluindo pelo não cabimento, quanto ao requerimento executivo ser inepto.
36. Contudo, pese embora o requerimento executivo não se confundir com a petição inicial, a que se reporta o artigo 552.º no Código de Processo Civil, tal, no nosso modesto entender, não desobriga a exequente, de cumprir com o ónus de alegação, de harmonia com o disposto no artigo 186.º, n.º 2, do Código Processo Civil, não acontecendo, é violada esta norma.
37. De facto, ao considerar de forma diversa, quanto à ineptidão do requerimento injuntivo, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 186.º do Código de Processo Civil, foi desconsiderada a norma.
38. Pelo expendido, deveria ter sido considerada verificada a exceção de ineptidão do requerimento injuntivo/petição inicial e em consequência absolver a executada da instância, nos termos dos artigos 186.º, n. º 2, alínea a), 278.º, n.º 1, alínea b), 576.º, n.º 1 e 2 e 577.º, alínea b), todos do Código de Processo Civil.»
Em sede de contra-alegações, a Embargada sustenta que o recurso deve ser julgado improcedente, alinhando os seguintes argumentos:
«1. Inexiste fundamento para proceder o recurso apresentado relativamente à ineptidão do requerimento executivo, atendendo a que a Apelada cumpriu o disposto no artigo 724.º do CPC e no artigo 10.º, n.º 2, do regime anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 01.09, nos termos estabelecidos pelo artigo 1.º, n.º 1, do referido regime.
2. Inexiste fundamento para se aceitar que, depois de pessoalmente notificado do requerimento injuntivo que fundamenta uma execução e não ter deduzido oposição, possa um executado, em sede de embargos à execução, invocar outros argumentos que não os previstos no artigo 729.º do CPC, atento o disposto no artigo 857.º do CPC e no artigo 14.º-A do DL n.º 269/98.»
Cumpre conhecer das seguintes questões:
i) da não preclusão do direito de invocar a prescrição;
ii) da ineptidão do requerimento executivo por falta de causa de pedir;
iii) da nulidade do contrato de prestação de serviços.
III – Fundamentos
A – Dados a considerar
1 – O requerimento de injunção foi apresentado a 04/11/2022.
2 – Nele foi aposta a menção de força executiva com data de 19/12/2022.
3 – Do requerimento executivo consta a menção de que a Exequente “é portadora de um requerimento de injunção, ao qual foi aposta fórmula executória, requerimento esse que constitui título executivo, nos termos do artigo 703.º, n.º 1, alínea d), do CPC e artigo 21.º do DL n.º 269/98, de 1 de setembro.
Não obstante ter sido notificado no âmbito da injunção que serve de base à presente execução, o Executado não procedeu ao pagamento.
É, por isso, o Executado devedor da aludida quantia, acrescida:
(i) de juros de mora, vencidos e vincendos, contabilizados desde a data de entrada da injunção até efetivo e integral pagamento à taxa legal comercial estabelecida no artigo 102.º, § 3.º, do Código Comercial, por decorrência do artigo 99.º do mesmo diploma (ato de comércio unilateral);
(ii) de juros compulsórios, à taxa de 5% ao ano, calculados sobre o título executivo desde data de aposição da fórmula executória/transito em julgado até efetivo e integral pagamento, nos termos dos artigos 21.º e 13.º, alínea d), do Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de setembro e artigo 829.º-A do Código Civil, os quais revertem em partes iguais para a Exequente e para o Cofre Geral dos Tribunais;
(iii) das quantias exigíveis nos termos do artigo 33.º, n.º 4, da Lei n.º 32/2014, de 30.05 [artigo 5.º, alínea c), vi) e vii), do mesmo diploma] e artigo 26.º, n.º 3, alínea c), do RCP.
Total: e 6.059,06
Correspondendo ao valor do título executivo, no montante de € 5.009,19, acrescido de juros de mora, dos juros compulsórios e das quantias exigíveis nos termos do artigo 33.º, n.º 4, da Lei n.º 32/2014, de 30.05 [artigo 5.º, alínea c), vi) e vii), do mesmo diploma] e artigo 26.º, n.º 3, alínea c), do RCP.”
B – O Direito
i) Da não preclusão do direito de invocar a prescrição
Os embargos de executado consistem no instrumento através do qual o Executado deduz oposição à Execução.
“A apresentação de um documento dotado de força executiva justifica a presunção da existência e persistência do direito de crédito nele configurado e da correspetiva obrigação, radicando aí a instauração da ação executiva com vista ao cumprimento coercivo da obrigação. Mas isso não afasta a possibilidade de tal presunção ser rebatida pelo executado, sendo os embargos o mecanismo ajustado a combater execuções injustas ou destituídas dos respetivos pressupostos gerais ou específicos.”[1]
A oposição por embargos de executado constitui, do ponto de vista estrutural, algo de extrínseco à ação executiva e assume o caráter de uma contra-acção tendente a obstar à produção dos efeitos do título executivo. Quando veicula uma oposição de mérito à execução, visa um acertamento negativo da situação substantiva (obrigação exequenda), de sentido contrário ao acertamento positivo consubstanciado no título executivo, cujo escopo é obstar ao prosseguimento da ação executiva mediante a eliminação, por via indireta, da eficácia do título executivo enquanto tal; quando a oposição por embargos tem um fundamento de cariz processual, tem em vista o acertamento negativo da falta de pressuposto processual, que pode ser o próprio título executivo, igualmente obstando ao prosseguimento da ação executiva, mediante o reconhecimento da sua inadmissibilidade.[2] Constituem, na verdade, uma verdadeira ação declarativa enxertada no processo executivo, visando contrariar os efeitos que o exequente procura extrair da apresentação do título executivo.[3]
A petição de embargos é submetida a controlo judicial, devendo ser liminarmente rejeitada se tiver sido apresentada fora do prazo, se assentar em fundamentos diferentes dos legalmente permitidos ou se for manifesta a respetiva improcedência – artigo 732.º, n.º 1, alíneas a) a c), do CPC.
No caso em apreço, a oposição tem em vista destronar a ação executiva com fundamento em não ser devida a quantia exequenda por, em momento anterior ao da apresentação do requerimento de injunção, ter decorrido o prazo de seis meses da prescrição.
Em 1.ª Instância exarou-se que os fundamentos da oposição não se enquadram nos fundamentos previstos no artigo 729.º nem nos meios de defesa que não devam considerar-se precludidos, nos termos do artigo 14.º-A do regime anexo ao DL n.º 269/98, de 01/09.
O que implicou na rejeição liminar dos embargos.
Ora vejamos.
Uma vez que a execução se funda em requerimento de injunção ao qual foi aposta a fórmula executória, para além dos fundamentos previstos no artigo 729.º, aplicados com as devidas adaptações, podem invocar-se nos embargos os meios de defesa que não devam considerar-se precludidos, nos termos do artigo 14.º-A do regime dos procedimentos para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior à alçada do tribunal de 1.ª Instância, aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de setembro, na sua redação atual – artigo 857.º, n.º 1, do CPC.
Os fundamentos elencados no artigo 729.º do CPC são os seguintes:
a) Inexistência ou inexequibilidade do título;
b) Falsidade do processo ou do traslado ou infidelidade deste, quando uma ou outra influa nos termos da execução;
c) Falta de qualquer pressuposto processual de que dependa a regularidade da instância executiva, sem prejuízo do seu suprimento;
d) Falta de intervenção do réu no processo de declaração, verificando-se alguma das situações previstas na alínea e) do artigo 696.º;
e) Incerteza, inexigibilidade ou iliquidez da obrigação exequenda, não supridas na fase introdutória da execução;
f) Caso julgado anterior à sentença que se executa;
g) Qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento; a prescrição do direito ou da obrigação pode ser provada por qualquer meio;
h) Contracrédito sobre o exequente, com vista a obter a compensação de créditos;
i) Tratando-se de sentença homologatória de confissão ou transação, qualquer causa de nulidade ou anulabilidade desses atos.
Já o artigo 14.º-A do regime aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de setembro, sob a epígrafe Efeito cominatório da falta de dedução da oposição, estatui o seguinte: 1 - Se o requerido, pessoalmente notificado por alguma das formas previstas nos n.ºs 2 a 5 do artigo 225.º do Código de Processo Civil e devidamente advertido do efeito cominatório estabelecido no presente artigo, não deduzir oposição, ficam precludidos os meios de defesa que nela poderiam ter sido invocados, sem prejuízo do disposto no número seguinte. 2 - A preclusão prevista no número anterior não abrange: a) A alegação do uso indevido do procedimento de injunção ou da ocorrência de outras exceções dilatórias de conhecimento oficioso; b) A alegação dos fundamentos de embargos de executado enumerados no artigo 729.º do Código de Processo Civil, que sejam compatíveis com o procedimento de injunção; c) A invocação da existência de cláusulas contratuais gerais ilegais ou abusivas; d) Qualquer exceção perentória que teria sido possível invocar na oposição e de que o tribunal possa conhecer oficiosamente.
A prescrição do crédito exequendo que vem invocado na petição de embargos constitui um facto extintivo da obrigação exequenda. Contudo, uma vez que vem alegado ter o prazo de prescrição decorrido em momento anterior à apresentação do requerimento de injunção, o fundamento invocado não se enquadra na alínea g) do artigo 729.º do CPC. Nem sequer em qualquer outra.
Por outro lado, a já verificada prescrição do crédito podia ter sido invocada como meio defesa perante o requerimento de injunção. Não tendo sido aí invocada, tal meio de defesa ficou precludido – artigo 14.º/1, do regime anexo ao DL n.º 269/98, de 01/09.
Não se subsumindo o fundamento invocado, a prescrição, a qualquer uma das alíneas do n.º 2 do citado artigo 14.º-A (a prescrição não é de conhecimento oficioso – artigo 303.º do CC), não resulta afastada a preclusão prevista no n.º 1.
Não assiste razão à Recorrente quando invoca que estando em causa uma execução fundada em requerimento de injunção, ao qual foi aposta a fórmula executória, a oposição à execução não está limitada aos fundamentos enunciados no artigo 857.º/1, do CPC, fazendo apelo aos Acórdãos do TC n.ºs 388/2013 e 264/2015.
É que, em função da referida jurisprudência emanada pelo Tribunal Constitucional, o artigo 857.º do CPC foi objeto de alteração, sendo que a redação atual, decorrente do DL n.º 117/19, de 13/09, tem aplicação ao caso em apreço (cfr. data da apresentação do requerimento de injunção).
Por conseguinte, não pode a Embargante valer-se, em sede de oposição à execução, da prescrição cujo prazo se tinha já completado aquando da notificação para deduzir oposição ao requerimento de injunção.
“Não tendo a embargante apresentado oposição ao requerimento de injunção na qual poderia ter invocado a prescrição dos créditos reclamados, não pode mais invocá-la em sede de embargos à execução, por força da preclusão prevista no artigo 14.º-A, n.º 1, do DL n.º 269/98, de 1.09, conforme determina o artigo 857.º, n.º 1, do CPC.”[4]
No entanto, já pode a Embargante invocar a prescrição dos créditos a que se reportam as faturas cuja data de vencimento é inferior a 6 meses por referência à data da notificação do requerimento de injunção (artigo 323.º do Código Civil).
Embora a Embargante enfatize a prescrição que se tinha já verificado aquando da apresentação do requerimento de injunção, certo é que invoca que o crédito exequendo, na sua totalidade, se encontra prescrito.
Na medida em que não se verifica a preclusão relativamente aos créditos a que se reportam as faturas com datas de vencimento de 28/05/2022, de 28/06/2022 e de 28/07/2022 (o alegado prazo de prescrição, por não ter decorrido ainda, não podia ter sido invocado), resulta a Embargante admitida a esgrimir tal meio de defesa relativamente aos referidos créditos em sede de embargos à execução.
ii) Da ineptidão do requerimento executivo por falta de causa de pedir
A Recorrente sustenta que o requerimento executivo é inepto porquanto dele não consta a atividade exercida pela Exequente e a que título o contrato foi celebrado, as condições subjacentes ao alegado contrato, a data de vencimento das referidas prestações, taxa de juro, a interpelação para pagamento e data da mesma.
O requerimento executivo deve ser formulado conforme determina o artigo 724.º do CPC. Tendo ele sido instruído com o requerimento de injunção ao qual foi aposta a fórmula executiva, e dele constando as menções acima transcritas, resulta manifesto ter sido observado o regime legal aplicável, diverso daquele que regula a petição inicial.
Nenhuma censura suscita, nesta matéria, a decisão recorrida.
iii) Da nulidade do contrato de prestação de serviços
A Recorrente sustenta ser nulo o contrato de prestação de serviços no âmbito do qual foram emitidas as faturas que sustentam o crédito reclamado.
Em 1.ª Instância foi exarado estar precludido tal meio de defesa, uma vez que tal fundamento podia ter sido invocado no âmbito da oposição ao requerimento de injunção.
Assim é, conforme resulta das disposições conjugadas dos artigos 857.º do CPC e 14.º-A do regime anexo ao DL n.º 269/98, de 01/09.
O que a Recorrente, em sede de recurso, não coloca em causa.
Acompanha-se, pois, a decisão recorrida no sentido de que tal fundamento não pode ser suscitado em sede de oposição à execução.
Sumário: (…)
IV – DECISÃO
Nestes termos, decide-se pela parcial procedência do recurso, em consequência do que se revoga a decisão recorrida relativamente à rejeição liminar dos embargos na matéria atinente à invocação da prescrição dos créditos a que se reportam as faturas com datas de vencimento de 28/05/2022, de 28/06/2022 e de 28/07/2022, que devem ser, neste âmbito e caso nenhum outro fundamento obste a isso, recebidos,
Confirmando-se, no mais, a referida decisão.
Custas pela Recorrente e Recorrida na proporção do decaimento.
Évora, 5 de junho de 2025
Isabel de Matos Peixoto Imaginário
Cristina Dá Mesquita
Mário Branco Coelho
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[1] Abrantes Geraldes e outros, CPC Anotado, vol. II, pág. 77.
[2] José Lebre de Freitas, A Ação Executiva, 1993, págs. 162 e 163.
[3] Abrantes Geraldes, ob. cit., pág. 77.
[4] Ac. do TRP de 19/11/2024 (Rui Moreira).