RECURSO PARA FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
PRESSUPOSTOS
PRAZO
INTERPOSIÇÃO DE RECURSO
EXTEMPORANEIDADE
REJEIÇÃO
Sumário


I. Nos termos do art. 438.º, n.º 1, do CPP, o recurso para fixação de jurisprudência é interposto no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão proferido em último lugar.
II. Uma coisa é a certificação pelo Tribunal Constitucional da data do trânsito em julgado do Despacho de homologação da desistência, do pedido de reforma, do Acórdão do Tribunal Constitucional que indeferiu a Reclamação da Decisão do Tribunal da Relação que não admitira o recurso interposto do Acórdão de 20.02.2024. outra coisa bem diversa, é do efeito “ex tunc”, de tal homologação, que é meramente declarativa, no acórdão recorrido, mais concretamente, os eus reflexos no prazo de interposição de recurso extraordinário para fixação de jurisprudência
III- Ao desistir da impugnação junto do TC da reclamação ali apresentada o recorrente expressa uma ideia de conformidade com a decisão DO ACÓRDÃO RECORRIDO, não se mostrando aceitável que se permita a abertura de um novo caminho de impugnação daquela , agora através de um recurso extraordinário.
IV A homologação pelo tribunal Constitucional da desistência da reclamação apresuntada contra a decisão que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional não tem qualquer reflexo no trânsito em julgado do acórdão da Relação, tanto mais que se decidiu pela irrecorribilidade daquele; além de que aquela reclamação constitui uma reclamação da decisão que não admite o recurso, e não uma reclamação do acórdão da Relação do qual se pretendia recorrer.
V. Uma vez que o recurso extraordinário em apreciação foi interposto extemporaneamente (visto o disposto no art. 438.º, n.º 1 do CPP), isto é, foi interposto para além do prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão proferido em último lugar, falece um dos pressupostos formais para a sua admissibilidade, concluindo-se pela sua rejeição (art. 441.º, n.º 1, 1ª parte, do CPP).

Texto Integral


Processo 1691/17.9T9BRG.G1-B.S1.

Recurso extraordinário de Fixação Jurisprudência- Tribunal da Relação de Guimarães

Supremo Tribunal de Justiça//5.ª Secção

Recorrente:

AA

I. Relatório

1. Acórdão recorrido

AA, notificado em 21.02.2024 do Acórdão proferido em 20.02.2024, no Processo 1691/17.9T9BRG.G1, do Tribunal da Relação de Guimarães que julgou o recurso interposto pelo arguido improcedente e manteve a condenação da 1ª instância que o condenou, além do mais, pela prática de um crime de “falsificação de documento”, agravado, p. e p. na disposição do art. 256º/1-a) e e) e 3, do Código Penal, na pena de 02 anos e 06 meses de prisão, vem do mesmo interpor Recurso Extraordinário de Fixação de Jurisprudência, ao abrigo do disposto no artigo 437º do CPP, 437º n.º 2, 3, 4 e 5, 438º n.ºs 1 e 2 do Código Processo Penal, apresentando as seguintes conclusões:

«1- ENTRE OS PRESENTES AUTOS E O ACÓRDÃO PROFERIDO NO PROCESSO 39/08.8... DO MESMO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES OCORRE DIVERGÊNCIA ENTRE A QUALIFICAÇÃO JURIDICA DE DOCUMENTO FALSO PARA EFEITOS DO N.º 3 DO ARTIGO 256º DO C.P

2- AMBOS OS ACÓRDÃOS ESTÃO TRANSITADOS EM JULGADO E NÃO OCORREU MODIFICAÇAO LEGISLATIVA.

3- NO NOSSO ACÓRDÃO ENTENDEU-SE EXISTIR A QUALIFICAÇÃO DO N.º 3 DO ARTIGO 256º DO C.P. PORQUE FORAM EFETUADOS RECONHECIMENTOS COM MENÇÕES ESPECIAIS FALSOS, COM A APOSIÇÃO DE SELO DE SOLICITADORA (FALSO TAMBÉM) E REGISTOS ONLINE QUE NÃO CORRESPONDIAM AO RECONHECIMENTO (FALSOS).

4- NO PROCESSO 39/08.8PBBRG.G1, ONDE TAMBÉM FOI ARGUIDO O AQUI RECORRENTE AA, FALSOS RECONHECIMENTOS COM MENÇÕES ESPECIAIS E A COLOCAÇÃO DE CARIMBO DE ADVOGADO, REGISTO INFORMATICO ONLINE (FALSO) – FOI CONSIDERADO FALSIFICAÇÃO SIMPLES PELO N.º 1 DO ARTIGO 256º DO CÓDIGO PENAL.

5- ENTRE OS ACÓRDÃOS (RECORRIDO E FUNDAMENTO) HÁ DISCREPÂNCIA NO ENTENDIMENTO SOBRE DOCUMENTO AGRAVADO OU SIMPLES, IMPONDO-SE QUE A JURISPRUDÊNCIA RESOLVA O CONFLITO.

6- EXISTE LEGITIMIDADE E INTERESSE EM AGIR, O RECURSO É TEMPESTIVO PORQUE INTERPOSTO 30 DIAS APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO DO ACÓRDÃO RECORRIDO».

2. O Ministério Público respondeu ao presente recurso sustentando o seguinte:

« O recorrente AA alega haver oposição do decidido sobre a mesma questão de direito entre o Acórdão recorrido constante do proc.n1691/17.9T9BRG.G1 do Tribunal da Relação de Guimarães, exarado em 20-2-2024 e o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães proferido no proc. 39/08.8PBBRG.G1, datado de 14-11-2023.

Os Acórdãos em referência apresentam-se como transitados em julgado.

Relativamente aos pressupostos formais importa assinalar o seguinte:

- O recorrente, arguido nos autos identificados em epígrafe, tem legitimidade e o recurso está motivado.

- O Acórdão fundamento e a Acórdão recorrido são insuscetíveis de recurso ordinário.

- O Acórdão fundamento é anterior ao Acórdão recorrido.

- Os acórdãos em causa constam de processos existentes no Tribunal da Relação de Guimarães.

A tempestividade do recurso

Existe uma questão prévia relacionada com a tempestividade do presente recurso a qual me suscita sérias dúvidas quanto à observância do prazo de 30 dias exigido pelo art. 438º nº 1 do CPP.

Com efeito atentemos no histórico da tramitação do processo 1691/17.9T9BRG.G1:

- O acórdão deste Tribunal da Relação foi exarado em 20-2-2024 tendo sido notificado aos sujeitos processuais em 21-2-2024.

- O arguido, em 6-3-2024, interpõe recurso do Acórdão para o Tribunal Constitucional.

- Em 11-3-2024 o Tribunal da Relação não admite este recurso para o TC.

- O arguido, em 18-3-2024, reclama para o TC da não admissão do recurso.

- Em 24-4-2024 o TC indefere a reclamação.

- Em 9-5-2024 o arguido apresenta um pedido de reforma do despacho que indeferiu a reclamação.

- Entretanto o arguido vem desistir da reclamação/reforma apresentada no TC tendo essa declaração sido aceite, pelo TC, e admitida em 24-9-2024.

- O TC vem certificar o trânsito desta decisão de aceitação da desistência, localizando-o em 10-10-2024.

- Posteriormente, em 21-10-2024, o arguido vem apresentar o presente Recurso para fixação de Jurisprudência.

A questão em apreço e no que toca à tempestividade do recurso, prende-se com o seguinte:

- Considerando a postura processual do arguido e a sua desistência da reclamação/reforma apresentada no TC, poder-se-á sustentar que o prazo para a interposição do recurso para fixação de jurisprudência de iniciou após o trânsito da decisão do TC situado em 10-10-2024?

Pessoalmente creio que não.

Em face da postura do arguido no processo 1691/17.9T9BRG.G1, desistindo da impugnação do Acórdão de 20-2-2024 junto do TC, considero que o mencionado Acórdão transitou em julgado após o decurso do prazo normal de recurso de 30 dias, iniciado em 22-2-2024, (dia seguinte ao das notificações efectuadas por via eletrónica aos sujeitos processuais), acrescido dos dias resultantes da aplicação da regra do art. 113º nº 12 do CPP.

Considero que o facto do arguido ter desistido da instância reclamatória suscitada no TC implica que o trânsito em julgado do Acórdão se determine sem que se tenha de ter em conta o trânsito da decisão do TC que se limitou a aceitar a desistência da reclamação e não chegou a apreciar o mérito de qualquer recurso sobre a constitucionalidade que, aliás, nem lhe chegou a ser submetida, antes se levando em conta o lapso de tempo decorrido desde a notificação do Acórdão proferido em 20-2-2024.

Ao desistir da impugnação junto do TC da reclamação ali apresentada o recorrente expressa uma ideia de conformidade com a decisão (Acórdão do TRG), não se mostrando aceitável que se permita a abertura de um novo caminho de impugnação daquela, agora através de um recurso extraordinário.

Neste pressuposto, considero que o recurso de fixação de jurisprudência ora em análise, por extemporâneo, não deve ser admitido.

Caso assim não seja entendido;

O recorrente considera que ambos os acórdãos assentam no mesmo quadro fáctico e foram proferidos no âmbito do mesmo quadro legal, constatando que face ao seu teor há divergência evidente entre ambos, nos seguintes termos e passo a transcrever:

“…

- ENTRE OS PRESENTES AUTOS E O ACÓRDÃO PROFERIDO NO PROCESSO 39/08.8PBBRG.G1 DO MESMO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES OCORRE DIVERGÊNCIA ENTRE A QUALIFICAÇÃO JURIDICA DE DOCUMENTO FALSO PARA EFEITOS DO N.º 3 DO ARTIGO 256º DO C.P

- AMBOS OS ACÓRDÃOS ESTÃO TRANSITADOS EM JULGADO E NÃO OCORREU MODIFICAÇAO LEGISLATIVA.

- NO NOSSO ACÓRDÃO ENTENDEU-SE EXISTIR A QUALIFICAÇÃO DO N.º3 DO ARTIGO 256º DO C.P. PORQUE FORAM EFETUADOS RECONHECIMENTOS COM MENÇÕES ESPECIAIS FALSOS, COM A APOSIÇÃO DE SELO DE SOLICITADORA (FALSO TAMBÉM) E REGISTOS ONLINE QUE NÃO CORRESPONDIAM AO RECONHECIMENTO (FALSOS)

- NO PROCESSO 39/08.8PBBRG.G1, ONDE TAMBÉM FOI ARGUIDO O AQUI RECORRENTE AA, FALSOS RECONHECIMENTOS COM MENÇÕES ESPECIAIS E A COLOCAÇÃO DE CARIMBO DE ADVOGADO, REGISTO INFORMATICO ONLINE (FALSO) – FOI CONSIDERADO FALSIFICAÇÃO SIMPLES PELO N.º 1 DO ARTIGO 256º DO CÓDIGO PENAL.

Conclui, portanto, que existe oposição de julgados entre os mencionados arestos solicitando que seja proferido Acórdão de fixação de jurisprudência, esclarecendo e fixando a solução a dar à questão de direito acima suscitada.

Como nota referencial julgo ser de alguma utilidade a convocação do que foi decidido no Ac. do STJ de 17-12-2020 no proc. 91/18.8GAVNH.G1-A.S1 cujo sumário aqui se transcreve, parcialmente:

“…

I - Estipulam os arts. 437.º, n.ºs 1 a 3, e 438.º, n.º s 1 e 2, do CPP, que o recurso para fixação de jurisprudência é um recurso excepcional, com tramitação especial e autónoma, que tem como objectivo primordial a estabilização e a uniformização da jurisprudência, eliminando, desta forma, o conflito originado por duas decisões a propósito da mesma questão de direito e no domínio da mesma legislação. A lei processual faz depender a admissibilidade do recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, da existência de determinados pressupostos, uns de natureza formal e outros (de natureza) substancial ou material.

Entre os pressupostos de natureza formal, contam-se:

i. a interposição de recurso no prazo de 30 dias posteriores ao trânsito em julgado do acórdão recorrido;

ii. a invocação de acórdão anterior ao recorrido que sirva de fundamento ao recurso;

iii. a identificação do acórdão fundamento, com o qual o recorrido se encontra em oposição;

iv. o trânsito em julgado de ambas as decisões;

v. a legitimidade do recorrente, restrita ao MP, ao arguido, ao assistente e às partes civis.

Constituem pressupostos de natureza substancial:

i. a justificação da oposição entre os acórdãos que motiva o conflito de jurisprudência; e,

ii. a verificação de identidade de legislação à luz da qual foram proferidas as decisões.

A exigência de oposição de julgados deve considerar-se preenchida quando, nos acórdãos em confronto, manifestamente de modo expresso, sobre a mesma questão fundamental de direito, se acolhem soluções opostas, no domínio da mesma legislação.

A estes requisitos legais, o STJ, de forma pacífica, aditou a incontornável necessidade de identidade de factos, não se restringindo à oposição entre as soluções de direito. É jurisprudência deste Supremo Tribunal que as soluções opostas relativas à mesma questão de direito exigem que a mesma integre o objecto concreto e directo das duas decisões, naturalmente fundado em circunstancialismo fáctico essencialmente idêntico do ponto de vista dos seus efeitos jurídicos.

E, na doutrina, como nota Germano Marques da Silva [Direito Processual Penal Português, Do Procedimento (Marcha do Processo), Universidade Católica Editora, vol. 3, 2015, Lisboa, p. 361], a finalidade específica do recurso para uniformização de jurisprudência é “evitar as contradições entre acórdãos dos tribunais superiores, assegurando assim a uniformização da jurisprudência”, ressaltando Maria João Antunes (Direito Processual Penal, Almedina, 2016, p. 214), que o recurso tem a sua “justificação na unidade do direito”. Pretende-se acautelar a previsibilidade e segurança jurídica, sem com isso colidir com a independência dos tribunais, já que, apesar do valor persuasivo do AFJ, poderão continuar a existir no futuro decisões discrepantes, se apresentarem uma argumentação não sopesada na fixação de jurisprudência. Se quisermos, não constitui “jurisprudência obrigatória”, mas, “tendencialmente vinculativa” ou “quase obrigatória”. Uma jurisprudência que deve ser aplicada pelos tribunais, apenas podendo não o fazer, se for fundamentada a divergência (cf. art. 445.º, n.º 3).

Divergência essa, como referimos, que deverá aduzir um discurso argumentativo novo, diverso daquele que foi abrangido na discussão que culminou com o acórdão de fixação de jurisprudência.

Em suma, segundo a jurisprudência seguida por este Supremo Tribunal, a oposição de julgados verifica-se quando:

1. Os 2 acórdãos em conflito do Supremo Tribunal de Justiça e/ou do Tribunal da Relação se refiram à mesma questão de direito;

2. Os 2 acórdãos em conflito do Supremo Tribunal de Justiça e/ou da Relação sejam proferidos no âmbito da mesma legislação;

3. Haja entre os 2 acórdãos em conflito “soluções opostas”;

4. A questão decidida em termos contraditórios tenha sido objecto de decisão expressa em ambos os acórdãos, não bastando que a oposição se deduza de posições implícitas;

5. As situações de facto e o respectivo enquadramento jurídico sejam, em ambas as decisões, idênticos.…”.

Refira-se que, no caso vertente, existem:

- Julgamentos contraditórios da mesma questão;

- Existem soluções de direito opostas e antagónicas perante um mesmo quadro fáctico e

- Há uma identidade de factos em ambos os arestos sobre os quais incidiram soluções opostas.

Ora, para que haja oposição de julgados, para os efeitos do art. 438.º, n.º 2, do CPP, é necessário que a questão decidida em termos contraditórios tenha sido objeto de decisões expressas e haja identidade das situações de facto subjacentes aos dois acórdãos em conflito que, creio, é a situação ora suscitada em recurso.

Inquestionável é a existência de duas decisões antagónicas e contraditórias entre si versando a questão do enquadramento jurídico penal de factos relacionados com falsos reconhecimentos com dizeres especiais, com a colocação de carimbos dos advogados (ou selos de solicitadores), e menção de registos online (falsos, porque não coincidiam) em que num Acórdão se entendeu estarmos perante crime de falsificação agravado ( art. 256º n.º 1, als. a) e e), e n.º 3, do Código Penal) e noutro se enquadrou a situação como crime de falsificação simples.

Considerando que se mostram preenchidos todos os requisitos formais (com a especificidade e ressalva de, em meu entender e como questão prévia acima suscitada, não se mostrar o presente recurso tempestivo) e substanciais requeridos para a prolação de uma decisão uniformizadora entendo que nada obsta (caso se desconsidere a intempestividade do recurso) a que o Supremo Tribunal de Justiça se pronuncie e decida sobre a questão suscitada pelo recorrente».

3. Subiram os autos a este Supremo Tribunal de Justiça e, o Sr. PGA emitiu parecer no sentido da rejeição do recurso interposto para fixação de jurisprudência por extemporâneo; Se assim não se entender, deverá o recurso ser rejeitado por inexistência de oposição de julgados.

Para tanto afirma:

«Acórdão Recorrido.

Acórdão de 20.02.2024, proferido no Processo 1691/17.9T9BRG.G1, do Tribunal da Relação de Guimarães – em recurso interposto, pelo arguido, ora recorrente, da sentença proferida no PCS 1691/17.9..., do Juízo Local Criminal de ..., Juiz-..., do Tribunal Judicial da mesma Comarca, que condenara o arguido, além do mais, pela prática de um crime de “falsificação de documento”, agravado, p. e p. na disposição do art. 256º/1-a) e e) e 3 do Código Penal, na pena de 02 anos e 06 meses de prisão –;

Por cujos termos foi decidido, nomeadamente, improceder o recurso, mantendo-se os termos da decisão recorrida;

Notificado aos sujeitos processuais em 21.02.2024;

Que não admite recurso ordinário e transitou em julgado em 07.03.2024 (28.10.2024, 257598, e 16.12.2024, 223369).

*

Acórdão Fundamento.

Acórdão de 14.11.2023, proferido no Processo 39/08.8PBBRG.G1, do Tribunal da Relação de Guimarães – em recurso interposto do PCC 39/08.8..., em cujo âmbito condenara os arguidos, além do mais, pela prática de crime de “falsificação de documento”, agravado, p. e p. na disposição do art. 256º/1-a), c), d), e) e f) e 3 do Código Penal, nas penas ali fixadas –;

Por cujos termos foi decidido, nomeadamente, absolver os arguidos da prática dos crimes de “falsificação de documento”, agravado, p. e p. na disposição do art. 256º/1-a), c), d), e) e f) e 3, a convolar na prática dos crimes de “falsificação de documento”, p. e p. na disposição do art. 256º/1-a), c), d), e) e f) do mesmo diploma legal, não fora a declaração da prescrição do respectivo procedimento;

Transitado em julgado em 16.09.2024 (Certidão, 21.10.2024, 257317, e 16.12.2024, 223381).

*

Questão-controvertida:

Tipificação da “falsificação de documento” operada pela via de reconhecimento de assinatura com menções especiais elaborado por quem não tem competência.

*

Pedido de Fixação de Jurisprudência.

Não foi ainda tomada posição a respeito do sentido em que a jurisprudência deve ser fixada.

*

Resposta do Ministério Público.

Ao pedido de fixação de jurisprudência deduziu resposta o Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Guimarães, pugnando pela sua rejeição, por ser extemporâneo, ou, caso assim não se entenda, pela decisão de que estão reunidos todos os pressupostos legais para conhecer do recurso.

Questão-prévia.

Intempestividade do recurso.

1

O recurso para fixação de jurisprudência é interposto no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão proferido em último lugar (cfr, o art. 438º/1 do Código de Processo Penal).

2

O Acórdão Recorrido, de 20.02.2024 (que não admitia recurso ordinário), transitou em julgado em 07.03.2024 – e não 10.10.2024, com o trânsito em julgado do Acórdão do Tribunal Constitucional –, conforme oportuna certificação, motivo por que, tendo sido interposto em 21.10.2024, o presente recurso de fixação de jurisprudência é manifestamente extemporâneo, pelo que deve ser rejeitado (cfr, arts. 400º/1-e), 414º/2, 420º/1-b), 438º/1 e 441º/1 do Código de Processo Penal).

3

Efectivamente, concorda-se com o motivado pelo Ministério Público no Tribunal da Relação de Guimarães em resposta ao recurso, termos que aqui não vamos repetir, sob pena de puro exercício do supérfluo.

*

Apenas umas notas.

4

O uso e abuso da Reclamação para o Tribunal Constitucional não pode constituir-se em instrumento enviesado, com todo o respeito, de imposição de barreiras (i)legais à pronta, criteriosa e eficaz realização da Justiça.

5

Se é manifesto que:

A Reclamação da não admissão de recurso (de decisão insuscetível de recurso ordinário) para o Tribunal Constitucional deve improceder;

No âmbito do pedido de Reforma dessa decisão de improcedência é apresentada declaração de desistência, homologada;

Deve entender-se que o recorrente se conformou com a decisão em causa (Acórdão-Recorrido), que, assim, transitou, efectivamente, em julgado em 07.03.2024 (após o decurso do prazo para arguição de nulidades ou dedução do pedido de reforma).

6

Aliás, é patente a similitude entre esta asserção e o decidido pelo Ac. do STJ de 12.01.2023, P- 159/18.0GCPBL.C2-B.S1 (também em sede de recurso de fixação de jurisprudência, embora na sequência de reclamação deduzida ao abrigo do disposto no art. 405º do Código de Processo Penal):

I- Perante o decidido pela Relação em 20.04.2022 (vista igualmente a decisão condenatória da 1ª instância) e respetivas penas aplicadas a cada um dos arguidos, é manifesto que não era admissível recurso ordinário para o STJ, perante o disposto no art. 400.º, n.º 1, al. e) (cf. art. 432.º, n.º 1, al. b), a contrario) do CPP.

II- Por isso, cada arguido apenas podia no prazo de 10 dias (e não 30 dias) da notificação do acórdão (que no caso ocorreu em 21.04.2022, em relação a todos os sujeitos processuais) invocar eventual nulidade, pedir qualquer correção ou interpor recurso para o Tribunal Constitucional (art. 105.º, n.º 1 do CPP e art. 75.º, n.º 1 da Lei do Tribunal Constitucional), o que não fizeram.

III- A decisão de reclamação, proferida no âmbito do incidente instaurado ao abrigo do art. 405.º do CPP, não interfere no prazo do trânsito do acórdão da Relação. Também não se podia aceitar que, como sucede neste caso, através de expedientes artificiais inadmissíveis, se tentasse artificialmente prolongar, de forma ilegal, um prazo que não pode ser alargado. Aliás, este entendimento tem sido seguido de forma praticamente uniforme pelo STJ, pois, se assim não fosse, estaria encontrado um expediente artificial de alargar prazos previstos legalmente.

IV- Assim sendo, é manifesto que quando apresentaram, em separado, o recurso extraordinário de fixação de jurisprudência em 29.09.2022, que deu origem aos presentes autos, o mesmo era manifestamente extemporâneo (art. 438.º, n.º 1, do CPP).

7

No mesmo sentido, o Ac. do STJ de 26.11.2020, P-775/18.0T9LRA.C1-B.S1:

… …

III - A decisão do STJ sobre a reclamação (apresentado ao abrigo do disposto no art. 405.º, do CPP) do despacho que não admitiu o recurso não tem qualquer reflexo no trânsito em julgado do acórdão da Relação, tanto mais que se decidiu pela irrecorribilidade daquele; além de que aquela reclamação constitui uma reclamação da decisão que não admite o recurso, e não uma reclamação do acórdão da Relação do qual se pretendia recorrer.

IV - Perante a posterior arguição de nulidade do acórdão, que não admitiu o recurso para fixação de jurisprudência, com base no disposto no art. 379.º, n.º 1, al. a), do CPP, ou seja, por falta de fundamentação, apenas cabia a este Tribunal verificar se havia ou não falta de fundamentação; já não podia o Tribunal decidir qualquer outra questão que importasse modificação essencial; apenas cabia analisar se havia alguma falta de fundamentação (tal como alegado pelo recorrente) relativamente ao que era suscitado nas conclusões (que delimitam o objeto do recurso) do recurso para fixação de jurisprudência.

8

Se assim não fosse entendido, sempre importaria ponderar a questão à luz de outra discursividade lógico-jurídica:

A do regime e feitos da desistência do recurso ou da reclamação.

*

Vejamos.

9

Como refere o Ministério Público no Tribunal da Relação de Guimarães, o ora recorrente foi desistir da instância declamatória deduzida no Tribunal Constitucional, que homologou tal desistência por Despacho de 24.09.2024.

10

Ora, deve entender-se, salvo o devido respeito por opinião contrária, que a homologação judicial da desistência do recurso ou da reclamação tem natureza meramente declarativa, pois que o acto da parte ou do sujeito processual, de natureza unilateral, produz efeitos imediatos, não requerendo aquela homologação ou a aceitação da parte contrária para garantir a sua eficácia.

11

Ou seja:

A decisão que homologou o pedido de desistência da Reclamação e da Reforma deduzidas no Tribunal Constitucional tem efeito ex tunc, embora limitado à data do requerimento respectivo.

12

Sendo a homologação de 24.09.2024, é expectável que o requerimento da desistência (facto jurídico extintivo) seja anterior, até de data que, pela imediata produção de efeitos, se constituiria em causa de imediato trânsito em julgado da decisão recorrida, porventura anterior em mais de 30 dias à data da interposição do presente recurso, em 21.10.2024

13

Sempre importaria averiguar nesse sentido.

14

Mas, como já se disse, cremos que o presente recurso de fixação de jurisprudência é manifestamente extemporâneo, pelo que deve ser rejeitado.

*

Se assim não se entender.

II

Oposição de julgados.

15

Vem o arguido, AA, ao abrigo da disposição do art. 437º/1 e 2 do Código de Processo Penal, interpor recurso extraordinário de fixação de jurisprudência, alegando, em síntese:

… …

No acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, nos presentes autos, considerou-se que a falsificação do reconhecimento de assinatura com menções especiais (ainda que falso - porque não elaborado por quem tinha competência) integra um crime de falsificação de documento agravado nos termos do artigo 256° n.°s 1 e 3do Código Penal.

" 15) Assim, o arguido ou alguém a seu pedido e com o seu consentimento, elaborou um escrito que intitulou de "Reconhecimento de Assinatura com menções Especiais", datado de 25 de janeiro de 2017, figurando no cabeçalho a identificação BB, Solicitadora, com os seguintes dizeres: "Eu, BB, solicitadora, titular da cédula n°..64, com escritório na cidade do Porto, Rua ...., Escritório e NIF.........08, reconheço a assinatura no documento anexo, de;

… …

SUCEDE QUE, NO ACÓRDÃO DO PROCESSO 39/08.8PBBRG.G1, do mesmo TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES, acórdão transitado em julgado em Setembro de 2024, numa mesma situação de falsos reconhecimentos com dizeres especiais, com a colocação de carimbos dos advogados (ou selos de solicitadores), e menção de registos online (falsos, porque não coincidiam) a qualificação jurídica foi pelo n.° 1 do artigo 256° do Código Penal.

E não pelo n.° 3 do artigo 256° do C.P., sendo da máxima importância não ser do n.° 3 do artigo 256° porque os prazos de prescrição do procedimento criminal são mais reduzidos e a pena máxima aplicável reduz-se para 3 anos máximos.

… …

16

Crê, porém, o Ministério Público neste Alto Tribunal que, com todo o respeito, dos próprios termos do recurso interposto, não resulta incisiva e manifestamente (antes pelo contrário) a oposição de julgados, que, como vício lógico de contraditoriedade – afirmação, a um tempo, do Ser e do Não Ser –, há-de ser expressão de uma contradição, antinomia ou incompatibilidade entre duas ideias, proposições ou princípios lógico-racionais.

17

Não tem, pois, razão, o recorrente quando alega que no Acórdão-Recorrido …considerou-se que a falsificação do reconhecimento de assinatura com menções especiais (ainda que falso - porque não elaborado por quem tinha competência) integra um crime de falsificação de documento, agravado…, ou seja, p. e p. na disposição do art. 256º/1 e 3 do Código Penal.

18

Na verdade, se no Acórdão-Fundamento foi conhecida expressamente essa questão – que conduziu, aliás, à alteração da qualificação jurídica e à declaração da prescrição do procedimento criminal –;

No Acórdão-Recorrido não o foi, pois que o recurso teve por objecto:

-Vícios da sentença, contradição entre os factos, a fundamentação e a decisão;

-impugnação ampla da matéria de facto;

-violação dos princípios in dubio pro reo e da presunção de inocência;

-Da escolha e medida das penas;

-suspensão da execução da pena de prisão;

-pedido de indemnização civil.

19

Isto é:

A própria alegação demonstra – e a leitura da decisão, ainda mais –, claramente, a inexistência de qualquer relação de oposição entre o julgado em ambos os Acórdãos, pois que o decidido no Acórdão-Recorrido não assenta – salvo implicitamente – na questão da tipicidade do facto-crime de “falsificação de documento”, agravado.

20

O recorrente limita-se a transcrever já de si uma transcrição de um excerto da decisão da 1ª Instância (que tratou essa matéria) realizada no relatório do Acórdão-Recorrido.

21

Donde:

Embora as decisões tenham sido proferidas sob a vigência da mesma legislação;

Conquanto tenham apreciado, no essencial, situações fáctico-normativas similares;

O certo é que não apreciaram, ponderaram e decidiram uma mesma questão de direito à luz de critérios diferentes, consagrando por isso duas soluções jurídicas em oposição.

22

Não cremos, pois, ser viável afirmar no caso a oposição de julgados, numa lógica similar à da excepção de caso-julgado, embora assente, tão-somente, em duas identidades (a causa de pedir e o pedido), isto é, que num mesmo silogismo judiciário (sempre na dialéctica do Facto/Direito), foram seguidas duas vias divergentes de raciocínio, viabilizando que de duas séries de premissas iguais se tivessem alcançado conclusões diversas.

23

Essa contraditoriedade ao nível da juridicidade (veículo da oposição de julgados) há-de poder afirmar-se de um ponto-de-vista material-funcional-normativo, e não apenas à luz da sua vertente puramente expositiva ou de questões prévias que implicitamente hajam de ser tidas como decididas em certo sentido:

Relevantes são as soluções jurídicas fixadas, expressas nos estritos comandos ditados no conteúdo decisório, que assentam numa consequente e estrita motivação (sendo dispensável nesta sede o conjunto mais ou menos longo de argumentos e considerandos).

24

A pressuposta “oposição de julgados” – pela via das questões-de-facto e/ou de direito presentes – há-de ser tal que não imponha ao julgador a necessidade de realização de uma ponderação abrangente, elaborada, sobre se duas questões juridicamente diversas se equivalem normativamente, pois que tal oposição há-de também manifestar-se de forma explícita e não apenas depois de formulado um juízo de implicitude.

25

Ou, dito de outro modo:

A pressuposta identidade fático-normativa e jurídica haveria de ter sido, de todo o modo, apreendida de forma analítica, e não apenas intuída.

26

Veja-se, nesta matéria, o Acórdão do STJ de 08.07.2020, P- 490/19.8GAVNF.G1-A.S1:

… …

X – Sendo basicamente necessário o confronto de dois acórdãos que relativamente à mesma questão de direito assentem em soluções opostas, o artigo 437.º do Código de Processo Penal faz depender a admissibilidade do recurso extraordinário para fixação de jurisprudência da existência de determinados pressupostos e o artigo 438.º identifica o tempo, o modo e o efeito da interposição do recurso.

XI – Como se extrai do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Outubro de 1989, in AJ, n.º 2, «É indispensável para se verificar a oposição de julgados:

a) – que as asserções antagónicas dos acórdãos invocados como opostos tenham tido como efeito fixar ou consagrar soluções diferentes (e não apenas contraposição de fundamentos ou de afirmações) para a mesma questão fundamental de direito;

b) – que as decisões em oposição sejam expressas (e não implícitas);

c) – que as situações de facto e o respectivo enquadramento jurídico sejam, em ambas as decisões, idênticos.

XII – A expressão “soluções opostas” pressupõe que nos dois acórdãos é idêntica a situação de facto, em ambos havendo expressa resolução de direito e que a oposição respeita às decisões e não aos fundamentos.

… …

27

O Acórdão-Recorrido limitou-se, pois, a aceitar, tacitamente, a qualificação jurídica operada pela decisão ali recorrida, sem que sobre tal questão incidisse um concreto, pensado, discutido, ponderado e decidido juízo lógico-jurídico (julgamento) à luz das normas-penais pertinentes.

28

Do que se reafirma que não há oposição de julgados, como pressuposto essencial (material) da previsão do recurso de fixação de jurisprudência, o que implicará a sua rejeição (cfr, os arts. 437º/1 e 441º do Código de Processo Penal).

III

Em síntese:

É extemporânea a interposição do presente recurso para fixação de jurisprudência, motivo por que deve ser rejeitado;

De todo o modo, não é viável extrair qualquer relação de oposição de julgados nas duas decisões identificadas nos autos, reportando-se:

-A Decisão-Recorrida, a deliberar e decidir, em sede de recurso, sobre os vícios da sentença ali recorrida, a impugnação alargada da matéria-de-facto, a violação dos princípios in dubio pro reo e da presunção de inocência, a medida da pena, a suspensão da execução da pena de prisão e o pedido cível;

-A Decisão-Fundamento, a deliberar e decidir, além do mais, sobre a qualificação jurídica dos factos-crime em jogo (comuns a ambos os processos), questão que o ora recorrente pretende eleger como suporte lógico-dialéctico de uma pretensa oposição de julgados.

IV

Em conclusão:

Motivo por que o Ministério Público dá Parecer que:

Deve ser rejeitado o presente recurso extraordinário de fixação de jurisprudência, por extemporâneo;

Se assim não se entender, deverá o recurso ser rejeitado por inexistência de oposição de julgados».

4 . Em resposta ao parecer do Sr. PGA o recorrente pronunciou-se manifestando, em primeiro lugar, a sua discordância quanto à alegada extemporaneidade do recurso de fixação de jurisprudência, porquanto, em seu entender, o acórdão recorrido transitou em julgado não em, 07.03.2024, mas em o 10.10.2024, com o trânsito em julgado do Acórdão do Tribunal Constitucional que homologou a desistência do recurso para o TC., conforme oportuna certificação, motivo por que, tendo sido interposto o presente recurso de Fixação de jurispriudência em 21.10.2024, o mesmo é tempestivo, devendo, por isso, ser admitido (cfr, arts. 400º/1-e), 414º/2, 420º/1-b), 438º/1 e 441º/1 do Código de Processo Penal).

Em defesa da sua posição afirma que é impossível considerar-se transitado em julgado o acórdão recorrido no dia 07.03.2024 quando no dia anterior, 06.03.2024 foi apresentada Reclamação ao T.C. e a mesma foi instruída ao T.C. por despacho do Desembargador Relator do TRG no dia 11.03.2024 .

Uma desistência de um recurso ou de um acto processual sobre uma decisão, só se considera transitada em julgado quando transitar em julgado o despacho de homologação dessa mesma desistência. Só desta forma se consegue respeitar o princípio da segurança e certezas jurídicas, caso contrário as defesas dos arguidos ficam sem saber, na ausência de uma notificação a comunicar o trânsito em julgado, em que data é que o trânsito em julgado ocorreu.

Conclui que a data do trânsito em Julgado é uma questão do conhecimento oficioso, não podendo, em caso algum, o arguido ficar prejudicado sobre a mesma, devendo o STJ considerar que o acórdão recorrido transitou em julgado na data do trânsito em julgado do Acórdão do Tribunal Constitucional que homologou a desistência do recurso por parte do recorrente para o Tribunal Constitucional.

Quanto ao parecer do MP junto do STJ no que diz respeito ao entendimento de que não existe exacta coincidência entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento, o parecer do TRG nesta matéria é cristalino, mostrando coincidência sobre a oposição de julgados, na parte tocante à qualificação jurídica de falsificação do reconhecimento de assinatura com menções especiais, onde num acórdão se considerou ser condenável pelo artigo 256º n.º 3 do C.P «agravado» e no acórdão fundamento pelo n.º 1 do artigo 256º do C.P.

O tema em uniformização de jurisprudência é tão simples quanto esse «como qualificar um falso reconhecimento de assinatura com menções especiais, elaborado por quem não tinha competência para tal?.

Pelo n.º 3 do artigo 256º como se entendeu manter no acórdão recorrido ou, pelo n.º 1 do artigo 256º do C.P. como no acórdão fundamento». A moldura penal entre os diferentes números é relevante, pois que enquanto no n.º3 a pena pode ir até aos cinco anos, já o n.º1 tem o texto máximo de 3 anos, impondo-se ao STJ a fixação de jurisprudência quanto esta questão, face à oposição de julgados.

5. Foi solicitado à 1ª instância, ao tribunal da Relação e Guimarães e ao Tribunal Constitucional informação sobre o concreto procedimento de definição da data do trânsito em julgado cujas respostas se encontram juntas aos autos .

6 .Obtidas as informações solicitadas, o Sr. PGA manteve nos seus precisos termos o seu parecer, mormente, no que concerne à questão-prévia da extemporaneidade do presente recurso de fixação de jurisprudência pelos fundamentos já anteriormente indicados no seu parecer.

7. Nos termos do disposto no art. 440.º, n.º 1 do CPP, foi realizado o exame preliminar.

8. Colhidos os vistos, foram os autos presentes à conferência, nos termos do disposto no art. 440.º, n.º 4, do CPP.

*

II- Fundamentação

1. O recurso extraordinário para fixação de jurisprudência tem por finalidade a obtenção de uma decisão do Supremo Tribunal de Justiça que fixe jurisprudência, “no interesse da unidade do direito”, resolvendo o conflito suscitado (art. 445.º, n.º 3, do CPP), relativamente à mesma questão de direito, quando existem dois acórdãos com soluções opostas, no domínio da mesma legislação, assim favorecendo os princípios da segurança e previsibilidade das decisões judiciais e, ao mesmo tempo, promovendo a igualdade dos cidadãos.

Como se afirma no ac. do STJ n.º 5/2006, publicado no DR I-A Série de 6.06.2006, que «A uniformização de jurisprudência tem subjacente o interesse público de obstar à flutuação da jurisprudência e, bem assim, contribuir para a certeza e estabilidade do direito.»

A admissibilidade do recurso extraordinário para fixação de jurisprudência depende do preenchimento de requisitos formais e de requisitos materiais, que se extraem dos arts. 437.º e 438.º do CPP.

Tem entendido a jurisprudência deste Tribunal, como doutamente clarificado e resumido no Ac. do STJ de 21.10.2021, proferido no proc. n.º 613/95.0TBFUN-A.L1-C.S1 (relatado por António Gama) - que são requisitos formais do recurso extraordinário para fixação de jurisprudência:

“1. Legitimidade do recorrente;

2. Interposição do recurso no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão recorrido;

3. Identificação do acórdão com o qual o acórdão recorrido se encontra em oposição (acórdão fundamento), com menção do lugar da publicação, se publicação houver;

4. Trânsito em julgado do acórdão fundamento.”

E, por sua vez, são requisitos materiais:

“1. Que os acórdãos respeitem à mesma questão de direito;

2. Sejam proferidos no domínio da mesma legislação;

3. Assentem em soluções opostas a partir de idêntica situação de facto;

4. Que as decisões em oposição sejam expressas.”

E, quanto aos últimos dois requisitos (a saber, que sejam proferidas “soluções opostas a partir de idêntica situação de facto e que as decisões em oposição sejam expressas”), assinala-se no mesmo acórdão, que “constitui jurisprudência assente deste Supremo Tribunal que só havendo identidade de situações de facto nos dois acórdãos é possível estabelecer uma comparação que permita concluir, quanto à mesma questão de direito, que existem soluções jurídicas opostas, bem como é necessário que a questão decidida em termos contraditórios seja objeto de decisão expressa, isto é, as soluções em oposição têm de ser expressamente proferidas (ac. STJ 30.01.2020, proc. n.º 1288/18.6T8CTB.C1-A.S1, 5.ª, ac. STJ 11.12.2014, proc. 356/11.0IDBRG.G1-A.S1, 5.ª) acrescendo que, de há muito, constitui também jurisprudência pacífica no STJ que a oposição de soluções entre um e outro acórdão tem de referir-se à própria decisão, que não aos seus fundamentos (ac. STJ 30.01.2020, proc. n.º 1288/18.6T8CTB.C1-A.S1, 5.ª, ac. de 13.02.2013, Proc. 561/08.6PCOER-A.L1.S1).”

Posto isto, vejamos se, neste caso concreto, estão ou não preenchidos todos os requisitos acima apontados.

Começando pela legitimidade do recorrente, vistos os autos, designadamente, os acórdãos proferidos, ambos pelo mesmo tribunal a Relação de Guimarães impõe-se concluir que o recorrente, na sua qualidade de arguido, tem legitimidade para interpor o presente recurso extraordinário para fixação de jurisprudência (art. 437.º, n.º 2 e n.º 5, do CPP), tendo, também, claramente interesse em agir.

Vejamos, de seguida, se está ou não verificado o pressuposto formal da tempestividade da interposição do recurso, questão que é suscitada expressamente pelo MºPº na resposta ao recurso e no parecer junto deste STJ.

Nos termos do art. 438.º, n.º 1, do CPP, o recurso para fixação de jurisprudência é interposto no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão proferido em último lugar.

No caso dos conforme consta da certidão junta o acórdão proferido em último lugar foi o exarado em 20.02.2024, no Processo 1691/17.9T9BRG.G1, do Tribunal da Relação de Guimarães tendo sido notificado aos sujeitos processuais em 21-2-2024.

Neste acórdão foi julgado recurso interposto pelo arguido improcedente e mantida a decisão da 1ª instância recorrida que condenou o arguido pela prática, além do mais, de um crime de “falsificação de documento”, agravado, p. e p. na disposição do art. 256º/1-a) e e) e 3 do Código Penal, na pena de 02 anos e 06 meses de prisão

No caso do presente Acórdão, o mesmo não é passível de recurso ordinário, nos termos do disposto no art. 400º nº 1 al. f) do CPP, pelo que, salvo todo o respeito por entendimento diverso, o trânsito em julgado não depende do decurso do prazo de 30 dias de recurso, mas apenas do prazo geral de 10 dias para reclamação.

Porém, consta dos autos a seguinte tramitação após a notificação aos sujeitos processuais do acórdão recorrido:

- Em 6-3-2024, o arguido interpõe recurso do Acórdão do TRG para o Tribunal Constitucional.

- Em 11-3-2024 o Tribunal da Relação de Guimarães não admite este recurso para o Tribunal Constitucional.

-Em 18-3-2024, o arguido reclama para o Tribunal constitucional do despacho de não admissão do recurso.

- Em 24-4-2024 o Tribunal constitucional indefere a reclamação.

- Em 9-5-2024 o arguido apresenta um pedido de reforma do despacho que indeferiu a reclamação.

- Entretanto o arguido vem desistir da reclamação/reforma apresentada no TC tendo essa declaração sido homologado pelo TC, em 24-9-2024.

- O TC vem certificar o trânsito desta decisão de aceitação da desistência da reclamação localizando-a em 10-10-2024, tudo conforme se encontra certificado nos autos.

- Em 21-10-2024, o arguido vem apresentar o presente Recurso para fixação de Jurisprudência.

Ora. em face da postura do arguido no processo 1691/17.9T9BRG.G1, desistindo da impugnação do Acórdão de 20-2-2024 junto do TC, considera-se que o acórdão recorrido, de 20.02.2024 (que não admitia recurso ordinário), transitou em julgado após o decurso do prazo normal de recurso de 10 dias da reclamação, iniciado em 22-2-2024, (dia seguinte ao das notificações efectuadas por via eletrónica aos sujeitos processuais), acrescido dos dias resultantes da aplicação da regra do art. 113º nº 12 do CPP. em 07.03.2024, isto é, transitou em julgado, em 07.03.2024, conforme oportuna certificação determinada pelo Juiz desembargador titular do processo- referência 9890650.

Deste modo, tendo sido interposto, apenas, em 21.10.2024, o recurso de fixação de jurisprudência é manifestamente extemporâneo-

É certo que o ofício de 07.05.2025 (236440) do Tribunal Constitucional certificou com a data de 10.10.2024 o trânsito em julgado do Despacho de homologação da desistência, de 04.09.2024, do pedido de reforma, de 09.05.2024, do Acórdão (352/2024, de 24.04.2024) do Tribunal Constitucional que indeferiu a Reclamação da Decisão do Tribunal da Relação que não admitira o recurso interposto do Acórdão de 20.02.2024.

Contudo, o que foi certificado foi tão só a data do trânsito em julgado do referido despacho homologatório de Tribunal Constitucional, situação bem diversa, é a do seu efeito “ex tunc”, da homologação da declaração de desistência do pedido de reforma em causa que é meramente declarativa do Acórdão do Tribunal Constitucional no acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães.

Na verdade, o que incumbe à unidade de processos do tribunal constitucional (à secção) fazer é «passar certidões relativas a processos pendentes» (art. 37.º, n.º 2, al. c), do Dec.-Lei n.º 49/2014, de 27-03), ou seja, certificar actos praticados, com menção das suas datas, e não certificar efeitos processuais a partir de tais dados e muito menos lhe incumbe retirar as consequências processuais que tal homologação da desistência da reforma tem no trânsito em julgado do acórdão da Relação, tanto mais que se decidiu pela irrecorribilidade daquele.

Acresce que é ao sujeito processual interessado que se impõe fazer o devido cômputo do prazo, legal, de 30 dias para a interposição do recurso de fixação de jurisprudência, com a correta aferição do seu início e termo .

Deste modo, tendo o arguido desistido da instância reclamatória suscitada no TC tal facto implica que o trânsito em julgado do Acórdão se determine sem que se tenha de ter em conta o trânsito da decisão do TC que se limitou a aceitar a desistência da reclamação e não chegou a apreciar o mérito de qualquer recurso sobre a constitucionalidade que, aliás, nem lhe chegou a ser submetida, antes se levando em conta o lapso de tempo decorrido desde a notificação do Acórdão proferido em 20-2-2024.

Ao desistir da impugnação junto do TC da reclamação ali apresentada o recorrente expressa uma ideia de conformidade com a decisão (Acórdão do TRG), não se mostrando aceitável que se permita a abertura de um novo caminho de impugnação daquela , agora através de um recurso extraordinário.

Deste modo, o Acórdão Recorrido, de 20.02.2024 (que não admitia recurso ordinário), transitou em julgado em 07.03.2024 – e não 10.10.2024, com o trânsito em julgado do Acórdão do Tribunal Constitucional –, conforme oportuna certificação, motivo por que, tendo sido interposto em 21.10.2024, o presente recurso de fixação de jurisprudência é, manifestamente, extemporâneo, pelo que deve ser rejeitado (cfr, arts. 400º/1-e), 414º/2, 420º/1-b), 438º/1 e 441º/1 do Código de Processo Penal).

Nestes termos, uma vez que o recurso extraordinário em apreciação foi interposto extemporaneamente (visto o disposto no art. 438.º, n.º 1 do CPP), isto é, foi interposto para além do prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão proferido em último lugar, falece um dos pressupostos formais para a sua admissibilidade, concluindo-se pela sua rejeição (art. 441.º, n.º 1, 1ª parte, do CPP).

III - Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes desta Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em rejeitar este recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, por inadmissibilidade legal (face ao disposto nos arts. 438.º, n.º 1 e 441.º, n.º 1, 1ª parte, do CPP).

Condena-se o recorrente numa importância de 6 (seis) UC, nos termos dos artigos 420.º, n.º 3 e 448.º, do CPP, e nas custas devidas, fixando-se a taxa de justiça em 5 (cinco) UC [artigos 513.º, n.º 1, 514.º, n.º 1 e 2, e 524.º do CPP, e, 1.º, 2.º, 3.º, 6.º e 8.º, n.º 9, e tabela III anexa, do RCP, aprovado pelo Dec.-Lei n.º 34/2008, de 26-02].

*

Lisboa, data e assinaturas supra certificadas

(Texto elaborado e informaticamente editado, integralmente revisto pela relatora, sendo eletronicamente assinado pela própria e pelos Senhores Juízes Conselheiros Adjuntos - art. 94.º, n.ºs 2 e 3, do CPP)

Os juízes Conselheiros

Ana Paramés (relatora)

Ernesto Nascimento (1.º adjunto)

Jorge Jacob (2.º adjunto)