I - A Relação deve exercer os seus poderes de controlo de correcção da decisão da matéria de facto da 1.ª instância sempre que conclua pelo erro de julgamento, por erro sobre provas, alegado pelo impugnante, e não apenas nos casos de erro grosseiro, evidente ou palmar, na avaliação dessas mesmas provas.
II - À Relação, no exercício dos seus poderes de correcção da decisão da matéria de facto da 1.ª instância, é lícito, através de presunções judiciais, baseadas nos factos apurados, deduzir outros factos.
III - As restrições do Supremo quanto à modificação da matéria de facto não são aplicáveis no tocante ao controlo das presunções judiciais utilizadas pelas instâncias, embora, de harmonia com jurisprudência consistente, o erro sobre a substância do juízo presuntivo, formado com apelo às regras de experiência, só seja sindicável, pelo tribunal de revista, em casos de manifesta ilogicidade.
IV - Embora o Supremo possa controlar, ainda que de harmonia com um standard mínimo, as presunções judiciais utilizadas pelas instâncias, esse controlo fica prejudicado se, para além da prova por presunção, as instâncias tiverem formado, concorrentemente, a sua convicção sobre a realidade do facto relevante por recurso a outra prova submetida à sua liberdade de apreciação, portanto, subtraída ao controlo do tribunal de revista.
Acordam no Supremo Tribunal33 de Justiça:
1. Relatório.
TFreitas Energias, SA, pediu ao Sr. Juiz de Direito do Juízo Central Cível de Aveiro, do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, contra Alves Bandeira & CA, SA, Banco Invest, SA, e Magnetipluma, Lda., que;
a) Declarasse ineficaz em relação à autora o documento particular de cessão de posição contratual celebrado em 15 de Março de 2017 entre as sociedades comerciais “G..., Unipessoal, Lda.”; “Alves Bandeira & Ca, SA” e “Banco Invest, SA”, tendo por objeto as frações autónomas, designadas pelas letras “a”, “b” e “c” do prédio urbano sito no Lugar de ..., da freguesia e concelho de ..., e do prédio urbano, sito naquele lugar, descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº ...02, da freguesia de ..., e inscrito na matriz predial urbana sob artigo ...29, nele implantado o posto de combustível (estação de serviço), incluindo loja de apoio (conveniência), estabelecimento de restauração e bebidas (comércio/serviços) e oficina de reparação e manutenção de automóveis, com posto de venda de gás de garrafa e lavagem auto;
b) Declarasse, consequentemente, nulo e ineficaz em relação à autora o documento particular intitulado “contrato de prestação de serviços” celebrado em 28 de Abril de 2017 entre as sociedades comerciais; “Alves Bandeira & Ca, SA” e “Magnetipluma, Lda.”;
c) Reconhecesse o direito da autora à restituição dos bens e direitos da sociedade comercial “G..., Lda.”, nomeadamente, o posto de combustível (estação de serviço), com loja de apoio, estabelecimento de restauração e bebidas e oficina de reparação e manutenção de imóveis, melhor descritos nos artigos 12º e 13º do presente articulado;
d) Ordenasse consequentemente, o cancelamento de todas inscrições e registos que hajam sido feitos decorrentes de tais atos, ou que venham a fazer-se, sobre os bens e direitos em apreço.
Fundamentou estas pretensões no facto de ser credora de G..., Unipessoal, Lda. - que tinha por sócio único AA e explorava um posto de combustível, com loja de apoio, estabelecimento de restauração e bebidas, oficina de reparação e manutenção de automóveis - pela quantia de € 595 960,38, proveniente de fornecimentos de combustível, crédito que foi reconhecido no processo de insolvência, declarada por sentença de 10 de Julho de 2017, da última, que cedeu a Alves Bandeira & CA, SA, a sua posição contratual no contrato de locação financeira imobiliária sobre os imóveis nos quais está instalado a estação de serviço, seu único activo, ficando impossibilitada de satisfazer os seus credores, de logo após aquela cessão, Alves Bandeira & CA, ter celebrado com Magnetipluma, Lda., gerida pelo mesmo sócia e gerente de G..., Lda., um contrato de prestação de serviços, tendo por objecto o posto de combustível, a loja e a oficina de reparação e manutenção de automóveis, serviços que se traduzem, na realidade, em garantir o funcionamento daquele estabelecimento comercial, e de as demandadas, agindo de modo intencional, conhecerem o seu crédito sobre G.... Lda., e terem consciência do prejuízo que para si resultaria da celebração dos negócios jurídicos que promoveram.
Oferecidos pelas demandadas, Alves Bandeira SA e Magnetipluma, Lda., os articulados de contestação, e concluída a instrução e julgamento da causa, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente, decisão que, porém, foi anulada pelo Tribunal da Relação do Porto, que julgou indispensável a ampliação da matéria de facto para se aferir da onerosidade ou gratuitidade do negócio objecto da impugnação.
Reaberta a audiência de discussão e julgamento, e produzida prova, proferiu-se nova sentença que concluiu pelo dispositivo seguinte:
Declara-se a acção procedente por provada e, em consequência:
a) Declara-se ineficaz em relação à autora o documento particular de cessão de posição contratual celebrado em 15 de Março de 2017 entre as sociedades comerciais “G..., Unipessoal, Lda.”; “Alves Bandeira & Ca, SA” e “Banco Invest, SA”, tendo por objeto as frações autónomas, designadas pelas letras “a”, “b” e “c” do prédio urbano sito no Lugar de ..., da freguesia e concelho de ..., e do prédio urbano, sito naquele lugar, descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº ...02, da freguesia de ..., e inscrito na matriz predial urbana sob artigo ...29, nele implantado o posto de combustível (estação de serviço), incluindo loja de apoio (conveniência), estabelecimento de restauração e bebidas (comércio/serviços) e oficina de reparação e manutenção de automóveis, com posto de venda de gás de garrafa e lavagem auto;
b) Declara-se, consequentemente, nulo e ineficaz em relação à autora o documento particular intitulado “contrato de prestação de serviços” celebrado em 28 de Abril de 2017 entre as sociedades comerciais; “Alves Bandeira & Ca, SA” e “Magnetipluma, Lda”;
c) Reconhece-se o direito da autora à restituição dos bens e direitos da sociedade comercial “G..., Lda.”, nomeadamente, o posto de combustível (estação de serviço), com loja de apoio, estabelecimento de restauração e bebidas e oficina de reparação e manutenção de imóveis, melhor descritos no pontos 6 e 7 dos factos provados
d) Ordenar-se, consequentemente, o cancelamento de todas inscrições e registos que hajam sido feitos decorrentes de tais atos, ou que venham a fazer-se, sobre os bens e direitos em apreço.
As demandadas, Alves Bandeira, SA e Banco Invest SA, interpuseram desta sentença, para o Tribunal da Relação do Porto, recursos autónomos ordinários de apelação, no quais impugnaram, com fundamento no erro na apreciação das provas, designadamente das provas pessoais produzidas oralmente na audiência, objecto de registo sonoro, a decisão da matéria de facto nela contida. Na resposta, a autora, depois de concluir pela sua rejeição ou pela improcedência dos recursos, requereu, subsidiariamente, a ampliação do seu objecto, na qual impugnou alguns pontos da decisão da matéria de facto.
O Tribunal da Relaçáo do Porto, por acórdão de 11 de Fevereiro de 2025, considerou prejudicado o conhecimento da impugnação da decisão da matéria de facto deduzida pela apelante, Banco Invest, SA, e depois de julgar procedente a apelação da recorrente Alves Bandeira, SA – uma vez que no art.º 32 dos factos provados e alínea b) dos não provados, mostra-se afastado o conhecimento pela Ré Alves Bandeira, SA. do prejuízo causado – por entender que se mostra feita prova com o recurso a presunções judiciais do facto impugnado pela apelada por via da ampliação do objecto do recurso, alterou o facto n.º 32 e eliminou a alínea b) dos factos não provados e concluiu pela improcedência de ambos os recursos,
Alves Bandeira, SA, interpôs deste acórdão recurso ordinário de revista – a que a co-demandada, Banco Invest, SA, aderiu - no qual pede, porque não se verificam os requisitos de que depende a procedência da impugnação pauliana, no caso a má fé dos intervenientes no negócio oneroso, a sua anulação e substituição por outro que absolva todos os RR. dos pedidos formulados na ação.
Os fundamentos da revista, expostos nas conclusões, são os seguintes:
1ª – O presente Recurso de Revista vai interposto de uma decisão do Tribunal da Relação do Porto, que decidiu julgar procedente a ação de impugnação pauliana intentada pela A. TFREITAS ENERGIA, S.A. contra os RR. ALVES BANDEIRA E CIA, S.A.; BANCO INVEST, S.A. e MAGNETIPLUMA, LDA, tendo por objeto o Contrato de Cessão da Posição Contratual Imobiliária celebrado em 15 de março de 2017, entre as sociedades comerciais G..., Unipessoal, Lda.; ALVES BANDEIRA E CIA, S.A. e BANCO INVEST, S.A.;
2ª – Essa decisão da Relação confirmou a sentença da 1ª Instância que tinha decidido igual procedência, não se verificando, contudo, uma situação de “dupla conforme” uma vez que as fundamentações da Sentença e do Acórdão são diversas, tendo essa diversidade natureza essencial, uma vez que ambas as decisões são compostas por segmentos dispositivos distintos, independentes e autónomos, num caso fundamentando a procedência na gratuidade do negócio e no outro, na má fé dos intervenientes;
3ª – Na base da pronuncia da 1ª Instância pela gratuidade do negócio estava a consideração, por parte dessa sentença, da unicidade integrativa dos dois negócios em causa no processo: A Locação financeira e o mutuo bancário e a sua não consideração autónoma;
4ª – A evidência das provas aduzidas pela Apelante, secundadas, curiosamente, - nos termos do próprio Acórdão -, pela Apelada levaram a decisão da Relação, com alguma profundidade de análise, a alcançar a manifestação da verdade das coisas: O mútuo, cuja assunção de pagamento foi exigida à Alves Bandeira pelo Banco Invest, representou uma Atribuição Autónoma da cessionária à cedente da locação financeira, ou seja, o correspetivo sinalagmático da própria cessão e como tal o negócio da cedência só podia ser qualificado como ONEROSO;
5ª – O Acórdão recorrido parece “forçado” a concluir por essa inelutável qualificação ao fazê-la acompanhar de algumas considerações intempestivas, fora deste contexto e de difícil entendimento:
- “a assunção da divida não constitui uma contrapartida com repercussão no património da Gasex pois implicou apenas uma diminuição do seu passivo”;
- “A correspectividade entre as prestações parece não existir”;
- “o devedor (G..., Lda.) diminuiu o seu património e o terceiro beneficiado por essa diminuição (ALVES BANDEIRA) prestou uma contrapartida que lhe foi exigida pelo BANCO”;
6ª – A singela questão que se coloca a este propósito é a de saber se o pagamento de uma divida de uma sociedade com a diminuição do seu passivo não tem repercussão no património dessa sociedade?;
7ª – Essas considerações parecem só servir para aplanar o caminho do Acórdão para a discussão interessada sobre a MÁ-FÉ com que os intervenientes nos negócios agiram, no fundo o objeto primeiro do presente Recurso de Revista;
8ª – Importa começar por dizer que, neste capitulo de análise e ponderação deste pressuposto da MÁ-FÉ, esmorece a sageza e profundidade que o Acórdão da Relação utilizou para ajuizar da onerosidade ou gratuidade do negócio, parecendo deixar-se enlear em meios de prova falíveis e pantanosos, sem esteios fixos;
9ª – O conhecimento da divida do credor e a consciência do prejuízo eventualmente a ele causado, são conclusões que só se alcançam com um tipo de raciocínio que se há-de basear em factos concretos alegado e provados;
10ª – A este propósito e para o que aqui interessa, a 1ª Instância tinha dado como não provado que “a Ré Alves Bandeira tivesse conhecimento do crédito da Autora sobre a G..., Lda.” (alínea B) dos factos dados por não provados;
11ª – Este facto negativo, à mingua de provas concretas e diretas desse conhecimento, foi obtido por esse Tribunal no domínio da sua livre apreciação e da sua prudente convicção decorrente da ponderação de vários depoimentos que foram joeirados pelos princípios da Imediação; da Oralidade e da Concentração que presidiram à Audiência de Julgamento.
12ª – O Acórdão de que se recorre pretende reverter aquele facto e dar como provado o conhecimento da divida da G..., Lda. para com os Transportes Freitas por parte da Alves Bandeira, reanalisando os mesmos depoimentos e fazendo recurso à aplicação das Presunções Judiciais previstas nos artºs 349º e 351º do Código Civil;
13ª – Há que dizer, em primeiro lugar, que a possibilidade que o legislador conferiu ao Tribunal da Relação de alterar a Matéria de Facto não é Absoluta e Incontrolável pois só é admissível quando os meios de prova reanalisados não deixam outra alternativa e impõem decisão diversa;
14ª – A relação penas poderá alterar a matéria de facto dada por provada na 1ª Instância se for manifesta e evidente uma grosseira apreciação e valoração da prova testemunhal obtida pela livre apreciação e prudente convicção deste Tribunal;
15ª – No que respeita àquela Prova Testemunhal, o Tribunal de Recurso está impedido de apreender e dispor de todo o circunstancialismo que envolveu a produção deste tipo de prova, sendo certo que a gravação da audiência não pode, de todo, colmatar e substitui-se aos princípios enunciados na conclusão 11ª supra;
16ª – Apesar de a aqui Apelada não ter apontado qualquer erro grosseiro e notório em que tenha incorrido o Tribunal da 1ª Instância ao apreciar tais provas, a Relação apressou-se a dar como provado o conhecimento da divida do credor por parte da cessionária da locação, facto presumido que obtém através do funcionamento da estrutura jurídica que flui do artº 349º do Código Civil;
17ª – A sentença agora recorrida entende que existe um conjunto diversificado de factos conhecidos e provados (factos base) cuja apreciação global e conjunta conduz, com certeza e segurança absoluta, à prova daquele facto presumido;
18ª – Só que a base da presunção (ainda que polibásica) tem, contudo, de ser provada, possuindo o julgador, acerca dela, o grau de ciência que as provas podem propiciar, uma exigência garantística exemplar contra o risco do arbítrio no exercício da atividade judicativa;
19ª – Ora é a prova dos factos-base e da sua conjugação que não se alcança de forma inquestionável no Acórdão da Relação, razão pela qual a Apelante vem colocar a sua apreciação à consideração deste Supremo Tribunal;
20ª – Embora ao Supremo esteja vedado o uso de presunções judiciais e, conhecendo, por regra, tão só de matéria de direito, pode sindicar o juízo presuntivo feito pela Relação se ele ofende qualquer norma legal, se padece de alguma ilogicidade, se parte de factos não provados ou se resultar de factos não diretamente estabelecidos no processo de forma inquestionável;
21ª – Analisando o acervo dos pretendidos factos-base adiantados pela Relação, os quais foram absorvidos acriticamente das alegações da aqui Apelada é facilmente questionável a sua estabilidade e firmeza probatória para alcançar o pretendido facto presumido;
22ª – Da reanálise de parte dos depoimentos gravados nas audiências de julgamento, não se vê qual o seu conteúdo vinculante para conduzir ao tal conhecimento da divida, seja o conhecimento das dificuldades financeiras da G..., Lda. e do risco do seu despejo por parte do Banco Invest; seja a dimensão da divida; seja a outorga de um Contrato de prestação de serviços posteriormente à cessão; seja o fornecimento de combustíveis em regime de consignação; seja o (des)conhecimento, na data, da ação judicial de cobrança intentada pela Apelada;
23ª – A desvalorização feita pela 1ª Instância, do conjunto do depoimento, do gerente da G..., Lda., Sr. AA, não só inquina a veracidade da sua afirmação de ter mostrado à Alves Bandeira a carta de rescisão do contrato de fornecimento de combustíveis por parte da TFREITAS, como, principalmente, não pode dar sustentação ao facto do ponto 32 no que se refere a ter dado conhecimento ao Banco Invest da divida da G..., Lda. para com os Transportes Freitas;
24ª – É por demais ILÓGICO à luz de todos os princípios de experiência e das relações da vida económica das empresas que quem tem uma situação de 17 rendas não pagas de um contrato de locação financeira, à beira da hipótese de resolução desse contrato, vá confessar ao locador uma divida milionária de um outro credor!!!;
25ª – Ao não ter dado provimento à impugnação da Apelante e não ter alterado o ponto 32 no que diz respeito ao conhecimento por parte do Banco daquela divida, o Acórdão recorrido deixa-se encerrar numa ILOGICIDADE que se requer seja saneada por este TRIBUNAL SUPERIOR;
26ª – No que respeita ao conhecimento da divida por parte da ALVES BANDEIRA, mostram-se intocáveis as conclusões do Juiz da 1ª Instância, as quais têm de se manter:
“Ora sopesando os depoimentos ouvidos, entende-se que não se pode concluir, com um forte grau de certeza, que a Alves Bandeira tivesse conhecimento da divida”;
27ª – Nenhum facto concreto foi invocado, no sentido de a Alves Bandeira ter efetivo conhecimento da divida, nem foi apontado qualquer erro grosseiro e notório em que tenha incorrido o Tribunal da 1ª Instância, ao apreciar as provas segundo o principio da livre apreciação das mesmas e decidir segundo a sua prudente convicção acerca daquele especifico facto;
28ª – Deve assim ser mantida a redação da alínea B) dos factos não provados: “Não se provou que a Ré Alves Bandeira tivesse conhecimento do crédito da Autora sobre a G..., Lda.”;
29ª – Ainda que fosse dado por provado o conhecimento por parte da Apelante da divida da G..., Lda. para com a Apelada o que, de todo se não concede e só se toma por hipótese académica, tal não era imediatamente significativo da consciência do prejuízo para a credora que ela (e o Banco Invest, por arrasto) pudesse ter ao outorgar a cessão da posição contratual e ao assumir a divida da G..., Lda. no mutuo bancário, a qual é uma conclusão como o próprio Acórdão refere, que há-de basear-se em factos concretos alegados e provados;
30ª – Não sendo em regra suscetível de prova direta, o Acórdão recorrido entende que, no particular contexto da ação da impugnação pauliana, a consciência do prejuízo pode ser determinada pela prova indireta, mediante o recurso às presunções judiciais previstas nos artºs. 349º e 351º do Código Civil nos mesmo termos do exercício que fez para obter o outro facto presumido do conhecimento da divida;
31ª – Quais, neste caso, são os factos-base conhecidos donde se pode extrair o facto presumido da consciência do prejuízo, fazendo uso da panóplia das regras da experiência de vida, da lógica e da racionalidade dos padrões habituais e da normalidade do comércio, das obrigações e dos aspetos gerais da vida?;
32ª – Não será decerto o conhecimento do Banco Invest, quer desse prejuízo, quer da própria divida, nos termos em que já se deixou atrás impugnado;
33ª – Muito menos os factos dados por provados nos pontos 34 – dificuldades da G..., Lda. e as 17 rendas mensais em mora no contrato de locação financeira; 35 – 17 rendas mensais em mora no contrato de empréstimo bancário; 38 – A importante comunicação do gerente da Ré G..., Lda. aos responsáveis da Ré Alves Bandeira das suas dificuldades económicas e da situação de risco de despejo em que a sociedade se encontrava em virtude do incumprimento da locação financeira, o qual iria ser promovido através da denuncia do contrato de locação financeira que já lhe tinha sido anunciada pelo Banco Invest; 40 -A imposição do Banco Invest à Alves Bandeira de assumir todas as responsabilidades das rendas da locação financeira, vencidas e vincendas e concomitantemente a obrigação de lhe liquidar a totalidade do empréstimo concedido à Ré G..., Lda..
34ª – Destes factos não emerge o facto presumido pretendido, mas tão só uma evidência: a de que a posição contratual concreta da G..., Lda. no contrato de locação financeira imobiliária, face à iminência da resolução contratual já notificada por parte do proprietário dos bens, o Banco Invest, tinha um valor despiciendo, para não dizer nulo;
35ª – Desde logo ficaria esvaziado, pela resolução, o mecanismo da opção da compra dos imóveis no fim do contrato, o tal direito à Expetativa que, noutro caso, lhe seria reconhecido;
36ª – A inanidade do ativo da G..., Lda., centrado na titularidade da sua posição locatária – “fogo fátuo” face à notificação do despejo por parte do locador – como garantia patrimonial dos credores, foi reconhecida pelo Administrador da Insolvência da G..., Lda. ao pronunciar-se pela inutilidade, para a massa, da resolução do contrato de cessão da posição contratual em causa.
37ª – Igual Inanidade foi reconhecida pela própria Apelada, Transportes Freitas, quando lhe foi oferecida, nos mesmos termos, - antes da Apelante – a hipótese de assumir aquela cessão contratual, como foi revelado e confessado em plena Audiência de Julgamento.
38ª – Não ganha assim sentido adquirir, como facto presumido, a consciência do prejuízo causado à Apelada por parte da Alves Bandeira (e por parte do próprio Banco Invest) ao outorgar o contrato de cessão de posição contratual naquele especifico contrato de locação financeira pelo que se impõe a alteração do ponto 32 dos factos provados em conformidade.
A recorrida, na resposta ao recurso, depois de concluir pela sua improcedência, requereu, para a eventualidade de decisão contrária, a ampliação do seu objecto, de modo que a cessão da posição contratual em causa seja considerada gratuita, com a consequente dispensa do requisito da má fé.
2. Determinação do âmbito objectivo do recurso e individualização das questões concretas controversas a solucionar.
A causa tem por objecto um instrumento de conservação da garantia patrimonial: a acção ou impugnação pauliana. Impugnação que o acórdão recorrido julgou procedente por considerar verificados os respectivos pressupostos, maxime, por se tratar de um acto oneroso, o da má fé. Requisito, de prova objectivamente difícil, que fez assentar em facto que julgou adquirido para o processo através de um meio peculiar de prova: a prova por presunções judiciais, também, por vezes, designadas por presunções naturais, hominis ou facti.
Os recorrentes, evidentemente, discordam, discordância que assentam no fundamento seguinte: a ilogicidade da aquisição pela Relaçáo do facto probando essencial – o relativo à má fé – por falta de coerência desse facto, extraído por presunção judicial, com os factos probatórios apurados.
Como o âmbito objetivo da revista é delimitado, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, pelo objecto da acção, pelos casos julgados formados nas instâncias, pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, e pelo recorrente, ele mesmo, designadamente nas conclusões da sua alegação, são duas as questões colocadas à atenção deste Tribunal Supremo: o erro da Relação sobre presunções judiciais e, subsidiariamente, i.e. para eventualidade de procedência da revista por esse fundamento, a do carácter gratuito do acto impugnado (art.ºs 635.º n.º 4, 639.º, n.º 1, e 608.º, n.º 2, ex-vi art.º 663.º, n.º 2, do CPC).
A resolução do primeiro daqueles problemas vincula, naturalmente, ao exame dos pressupostos da impugnação pauliana, dos poderes de controlo do Tribunal da Relaçáo no que concerne à decisão da matéria de facto da 1.ª instância e dos poderes de controlo do Supremo relativamente à decisão da matéria de facto das instâncias, maxime, das presunções judiciais utilizadas por estas; a resolução – meramente eventual – do segundo daqueles problemas vincula, evidentemente, à ponderação do distinguo entre acto oneroso e acto gratuito.
3. Fundamentos.
3.1. Fundamentos de facto.
O Tribunal da Relaçáo, ao julgar os recursos de apelação – um dos quais julgou procedente – começou por estabilizar os factos materiais da causa nos termos seguintes:
3.1.1. Factos provados.
1 - A autora, anteriormente designada “Transportes Freitas, SA”, é uma sociedade comercial que se dedica à comercialização, transporte, e venda de combustíveis e lubrificantes, sendo revendedora oficial dos produtos GALP/PETROGAL.
2 - Por contrato tripartido denominado “Contrato de Distribuição Tripartido Retalho Co-Branded”, datado de 01/04/2009, a sociedade comercial denominada “G..., Unipessoal, Lda.” obrigou-se a comprar à autora os produtos petrolíferos da Petrogal (GALP), nos termos, modos e condições nele melhor previstos.
3 - No exercício da sua atividade comercial e no cumprimento do contrato celebrado, a autora forneceu àquela sociedade comercial “G..., Unipessoal, Lda.”, a pedido desta, produtos (combustíveis) do seu comércio.
4 - A sociedade comercial “G..., Unipessoal, Lda.” dedicava-se, enquanto objeto comercial, à revenda ou comércio de combustíveis líquidos e gasosos, lubrificantes, lavagens de viaturas, mudanças de óleos, manutenção e reparação de veículos automóveis.
5 - O seu capital social era do valor de 40.000,00€, cuja única quota social, de igual valor nominal, era titulada por AA, seu sócio e gerente.
6 - A sua atividade comercial, de escopo lucrativo, desenvolvia-se através da exploração do posto de combustível (estação de serviço), com loja de apoio, estabelecimento de restauração e bebidas e oficina de reparação e manutenção de automóveis.
7 - Situado no Lugar de ..., da freguesia e concelho de ..., e implementado nas frações autónomas designadas pelas letras “a”, “b” e “c” do prédio urbano, sito naquele lugar, descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº ...02, da freguesia de ..., e inscrito na matriz predial urbana sob artigo ...29.
8 – Esse prédio era objeto de um contrato de locação financeira imobiliária celebrado entre o Banco Invest e a sociedade comercial “P..., Lda.", em 26/04/2006.
9 - Por contrato de cessão de posição contratual datado de 12 de Março de 2009, a referida P..., Lda. cedeu à G..., Unipessoal, Lda. a posição contratual de locatária que detinha nesse contrato.
10 - A sociedade comercial “G..., Unipessoal, Lda.” foi declarada insolvente por douta sentença proferida em 10-07-2017, transitada em julgado, no âmbito do processo de insolvência de pessoa coletiva número 2636/17.1T8AVR, do Juiz 3 do Juízo de Comércio da ..., da Comarca de Aveiro.
11 - A autora viu reconhecido, no aludido processo de insolvência, um direito de crédito do valor global de 759.483.19€, correspondente ao valor, de capital, de 595.960,58€, acrescido dos inerentes juros, incluindo os vincendos após a prolação da declaração de insolvência.
12 - O direito de crédito reconhecido à autora deriva de fornecimentos de produtos (combustíveis) do seu comércio à sociedade declarada insolvente, vencidos e não pagos, expressos nas faturas vencidas, e não pagas, deduzidas as notas de crédito pelo rappel contratualizado,
13 - Tais fornecimentos de produtos (combustíveis) feitos pela autora à sociedade comercial “G..., Unipessoal, Lda.” e que não foram pagos correspondem a um período de tempo compreendido entre 29/12/2014, data da fatura mais antiga vencida, e 27/05/2015, data da fatura vencida mais recente, conforme reclamação de créditos apresentada em juízo.
14 - No âmbito do processo de insolvência da sociedade comercial “G..., Unipessoal, Lda., não houve lugar a liquidação dado o encerramento do processo por falta ou insuficiência de bens, de modo que nenhum credor foi ressarcido, ainda que parcialmente, dos seus créditos.
15 - Em virtude da falta de pagamento voluntário dos valores em dívida, a A. intentara acção judicial contra aquela sociedade comercial “G..., Unipessoal, Lda.”, peticionando-lhe a quantia inicial de 691.050,54€, acção distribuída em 6 de Fevereiro de 2017 e que correu termos no Juiz 3 do Juízo Central Cível de Aveiro
16 - Tal ação judicial, veio a ficar suspensa e, posteriormente, prejudicada na lide em função da declaração de insolvência da devedora.
17 – Mediante contrato de cessão de posição contratual datado de 15 de Março de 2017, a sociedade comercial “G..., Unipessoal, Lda.” cedeu à sociedade comercial “Alves Bandeira & Ca, Sa”, ora 1º ré, a sua posição contratual no âmbito do contrato de locação financeira imobiliária referido em 8.
18 - Contrato que teve por objeto os imóveis onde se encontra implementado o posto de combustível (estação de serviço) – que, com tal cessão, foi igualmente cedido.
19 - A sociedade comercial “Alves Bandeira & Ca, SA”, ora 1º ré, é uma conhecida revendedora de combustíveis que explora, por si ou outrem, postos de combustíveis, sendo uma das principais concorrentes da autora no sector.
20 - Celebrara com a sociedade comercial “G..., Lda.”, em 1 de Outubro de 2015, um contrato de fornecimento de combustíveis líquidos para veículos, em regime de exclusividade e mediante o fornecimento à consignação – com as responsabilidades daquela sociedade garantidas pessoal e solidariamente pelo sócio e gerente AA – nos demais termos, modos e condições nele melhor previstos.
21 - À data da cessão de exploração, a “G..., Lda.” devia àquela sociedade cedente, ora 1º ré, a quantia, de capital, de 39.049,20€, em conta corrente por combustíveis fornecidos em regime de consignação cuja sociedade fornecedora não reclamou no processo de insolvência daquela sociedade cessionária.
22 - A 28/04/2017 foi celebrado pela “Alves Bandeira &Ca, SA” um contrato denominado “Contrato de Prestação de Serviços” com a sociedade comercial “Magnetipluma, Lda.”.
23 - Tendo por objeto o posto de abastecimento de combustível, loja de conveniência, posto de venda de gás de garrafa e lavagem auto, implementado na fração A do prédio objeto da locação financeira imobiliária, referido nos pontos 8 e 17 dos factos provados.
24 - Os serviços acordados, encontram-se previstos nas cláusulas segunda e terceira desse contrato competindo à Magnetipluma:
- garantir o funcionamento diário do posto de combustível, fazendo-o com recurso a pessoal (trabalhadores) próprio, dotada de autonomia jurídica e técnica,
- conferir turnos, elaborar mapas de caixa e garantir a entrega de valores obtidos, efetuar inventários, lançar faturas, guias de remessa, entre outros documentos no sistema informático, conferir encomendas, implementar promoções coordenadas pela equipa de NON FUEL da Alves Bandeira, repor produtos, controlar a validade dos mesmos,
- limpar, zelar pelo bom funcionamento dos equipamentos, reparando-os se necessário, zelando pela imagem dos abastecedores de serviço e pela imagem do posto,
- Garantir o cumprimento de normas de segurança, providenciar a compra de produtos, participar às autoridades locais no que se revelar necessário,
25 - Como contrapartida ficou prevista uma comissão a ser devida em função dos m3 de combustíveis que são vendidos naquele estabelecimento comercial, acrescido de IVA.
26 – À 1º Ré compete determinar os preços de venda dos produtos comercializados, suportar os custos inerentes ao bom funcionamento do estabelecimento, nomeadamente eletricidade, água, comunicações, entre outros bem como suportar os custos relacionados com a manutenção das licenças do estabelecimento, incluindo as obras ou benfeitorias que forem necessárias para o efeito, bem como a obtenção de todas e quaisquer licenças administrativas ou outras que se mostrem necessárias para a realização das mesmas, e o pagamento das taxas que por elas sejam devidas
27 - Esta sociedade comercial denominada “Magnetipluma, Lda.” possui o capital social do valor de 500,00€, repartido em duas quotas sociais, sendo uma quota do valor nominal de 490,00€ e outra quota do valor nominal de 10,00€.
28 - Ambas as quotas sociais são tituladas por AA, o qual titula a quota principal e maioritária desde a sua constituição e, posteriormente, adquiriu a BB a quota social de menor valor nominal.
29 - O seu objeto social é a revenda ou comércio de combustíveis líquidos e gasosos, lubrificantes, lavagens de viaturas, mudança de óleos, manutenção e reparação de veículos, café e snack bar.
30 - A sua gerência encontra-se, desde a sua constituição, atribuída ao seu principal sócio, AA, obrigando-se com a intervenção deste.
31 – O negócio referido em 17 levou a que a sociedade comercial “G..., Unipessoal, Lda.” - com a dimensão da dívida à Autora - ficasse sem o seu único ativo e incapaz de prosseguir a sua atividade comercial.
32 – Os Réus Banco Invest SA e Magnetipluma tinham conhecimento, quer do crédito da autora sobre a referida G..., Lda., quer do facto de que se essa sociedade não tivesse mais o prédio aqui em causa e respetivo estabelecimento comercial não tinha meios para ressarcir qualquer montante à autora.
33 – O capital em dívida no contrato de locação financeira referido em 8 no seu início, isto, é em 26/04/2006, era de 601.750,00 mais juros, sendo que no momento referido no ponto 17 dos factos provados o capital em dívida era de 425.986,04 €.
34 - Em março de 2017, fruto das suas dificuldades económicas, a G..., Lda. tinha deixado de pagar rendas, encontrando-se em incumprimento 17 rendas mensais no valor global de 59.298,42 euros.
35 – Relativamente a esse valor, no contrato referido em 17 foi inserida cláusula com a seguinte redação:
“No seguimento de pedido da Cessionária, ter-lhe sido concedido pelo Banco um financiamento adicional no valor de 59.298,42 € (cinquenta e nove mil duzentos e noventa e oito euros e quarenta e dois cêntimos), o qual será integralmente utilizado, na presente data para regularização de responsabilidades vencidas da Cedente assumidas nesta data junto do Banco, passando em consequência as responsabilidades de capital a ser na presente data de 485.284,46 €”.
36 - Ao mesmo tempo em 12/03/2009, a Ré G..., Lda. tinha assumido perante o Banco Invest o pagamento de um empréstimo no valor global de 332.872,40 mais juros.
37 - Fruto das mesmas dificuldades económicas a G..., Lda. tinha deixado de pagar em março de 2017, esse empréstimo, estando em mora 17 dessas prestações mensais no valor global de €16.806,15.
38 - O gerente da Ré G..., Lda., AA, deu conta aos responsáveis da Ré Alves Bandeira, das suas dificuldades económicas e da situação de risco de despejo em que a sociedade se encontrava, em virtude do incumprimento do contrato de locação financeira o qual iria ser promovido através da denuncia do contrato de locação financeira que já lhe tinha sido anunciado pelo Banco Invest.
39 - Interessada que estava em manter aberto e em funcionamento o posto de combustíveis em causa neste processo, a Ré Alves Bandeira, perante a incapacidade da Ré G..., Lda. mas com a sua anuência, teve por bem tentar negociar com o Banco Invest a cessão da posição contratual de locatária no contrato de locação financeira imobiliária, assumindo as responsabilidades do pagamento das respetivas rendas, nomeadamente os montantes das mesmas já vencidas.
40 - O R. Banco Invest anuiu a essa pretensão mas colocou como condição a exigência de a Alves Bandeira, ao mesmo tempo, assumir também a obrigação de liquidar ao Banco a totalidade do empréstimo concedido à Ré G..., Lda., referido em 36 e 37..
41 - Perante este cenário e para atingir os seus objetivos de controlo do posto de abastecimento de combustíveis, a Ré Alves Bandeira assumiu perante o Banco Invest a totalidade das responsabilidades do contrato de locação financeira e assumiu a dívida da Ré G..., Lda., no empréstimo concedido a esta sociedade, referido em 36 e 37 e a qual se computava, em 21/3/2017, em €119.715,54.
42 - O empréstimo a que se refere o ponto 36 dos factos provados fora concedido através de escritura pública de mútuo com hipoteca celebra a 26 de Abril de 2006 e em que foram outorgantes:
- 1ºs outorgantes CC e mulher BB na qualidade de únicos sócios e gerentes em representação da sociedade comercial por quotas P..., Lda. 3º outorgante - Banco Invest SA
43 - Nessa escritura, foi dito que pela presente escritura o Banco e a sociedade mutuária representada pelos 1ºs outorgantes acordam em celebrar um empréstimo no montante de trezentos e cinquenta mil euros, quantia de que a sociedade mutuária, representada pelos primeiros outorgantes se confessa desde já devedora perante o banco, quantia acrescida dos juros contratuais e demais despesas que forem devidas.
44 - Nos termos da cláusula primeira do documento complementar ficou a constar que o empréstimo foi concedido para apoio de tesouraria da sociedade mutuária, mas não obstante, o empréstimo serviu interesses pessoais dos sócios daquela sociedade. (facto ora alterado).
45 - Em garantia do cumprimento dessa obrigação foi constituída hipoteca sobre os seguintes imóveis pertencentes aos 1ºs outorgantes:
a)- Prédio urbano destinado a habitação composto de casa de rés-do-chão, com entrada pelo n.º 308 da Rua ..., na freguesia de ..., concelho de ..., inscrito na respetiva matriz sob o art. 742º e descrito na Primeira Conservatória do Registo Predial de ...sob o número ...59 da referida freguesia de ..., encontrando-se registada a favor dos Primeiros Outorgantes pela inscrição G- três.
b) - Fração autónoma designada pela letra C, correspondente a rés-do-chão –estabelecimento comercial, com entrada pelo n.º 323 da Rua ..., a qual faz parte integrante do Prédio urbano sito na Rua ..., na freguesia de ..., concelho de ..., inscrito na respetiva matriz sob o art. ...94 –C e descrito na Primeira Conservatória do Registo Predial de ... sob o número 90 da referida freguesia de ..., encontrando-se registada a favor dos Primeiros Outorgantes pela inscrição G- UM
46 – Foi ainda constituída hipoteca sobre o seguinte imóvel pertencente à 2ºs outorgante DD:
Prédio Urbano – Pavilhão destinada a armazém e logradouro, sito na Rua ..., na freguesia de ..., Concelho de ..., inscrito na respetiva matriz sob o n.º ...36º e descrito na Segunda Conservatória do Registo Predial de ..., sob o n.º 473º da referida freguesia de ..., encontrando-se registada a favor da Segunda Outorgante pela inscrição G- Dois
47 – Por escritura de assunção de dívida de 12 de março de 2009, a sociedade G..., Unipessoal, Lda., representada por AA assumiu a obrigação de liquidar ao banco a quantia mutuada ainda em dívida, no montante de 332.872,40 €, respetivos juros e demais obrigações emergentes do citado empréstimo, mantendo-se a hipoteca dos prédios pertencentes a CC e mulher.
48 - O prédio urbano descrito em 44 a) foi adquirido por CC e BB, através de gestor de negócios (EE) por contrato de compra e venda, formalizado por escritura pública de 23 de Setembro de 1968, ainda como terreno para construção.
49 – A gestão de negócios foi ratificada pelo gestor FF, em 14 de março de 2006.
50 – A Alves e Bandeira encontra-se a pagar a dívida referida no ponto 41 dos factos provados.
3.1.2. Factos não provados.
A) O contrato referido de 22 a 25 tivesse por objeto o estabelecimento de restauração e bebidas (comércio/serviços) e oficina de reparação e manutenção de automóveis.
B) A Ré Alves Bandeira tivesse conhecimento do crédito da autora sobre a G..., Lda..
C) eliminado.
3.1.3. O Tribunal da Relaçáo, depois de apreciar a impugnação da decisão da matéria de facto objecto da ampliação do recurso da apelada:
a) Declarou provado o facto seguinte: – Os Réus Banco Invest SA, Magnetipluma e Alves Bandeira tinham conhecimento, quer do crédito da autora sobre a referida G..., Lda., quer do facto de que se essa sociedade não tivesse mais o prédio aqui em causa e respetivo estabelecimento comercial não tinha meios para ressarcir qualquer montante à autora;
b) Eliminou a alínea b) dos factos não provados.
3.1.3.1. O Tribunal da Relaçáo adiantou, para justificar o julgamento referido em 3.1.3., a motivação seguinte:
(…) Alega a Apelada que os depoimentos prestados em sede de audiência de julgamento, globalmente considerados, só poderão conduzir à conclusão do conhecimento do crédito da autora e da consciência do prejuízo causado à Autora TFREITAS.
Indicou os seguintes meios de prova, como impondo decisão diversa: o depoimento de parte de GG, que transcreveu parcialmente nas partes que entendeu relevantes; o depoimento de HH, ... do grupo Alves Bandeira, a testemunha II e JJ e KK, tendo procedido à transcrição parcial destes depoimentos na parte julgadas relevantes.
Vejamos.
Do depoimento de parte de GG, ... da recorrida “Alves Bandeira & Ca SA”, apesar de dizer desconhecer a situação financeira da G..., Lda., reconheceu, que a sua empresa, sempre que inicia relacionamento com um novo cliente procede a estudos da situação económica e financeira do cliente, tendo reconhecido saber da existência apenas dum posto de combustíveis a ser explorado pela G..., Lda..
Não logrou esclarecer porque é que, tendo-lhe sido entregue a exploração do posto, com a cessão da posição contratual no contrato de locação financeira, não pretendendo explorar o mesmo diretamente não tenha celebrado o contrato de prestação de serviços (com a finalidade de exploração do posto de combustíveis, da loja e da oficina) com a própria G..., Lda., mas sim com uma outra empresa do mesmo sócio AA, a Magnetipluma.
Também, do depoimento de HH, ... do grupo “Alves Bandeira”, com responsabilidade pelo departamento de área de investimentos e expansão resulta a confirmação que a empresa tem um departamento de análise de risco de crédito, que analisa os clientes para se fazer negócio, para fornecerem combustível para revenda no posto, dizendo mesmo que “os clientes são todos analisados um a um, quer seja um de cinco milhões ou um cinco euros”.
Reconheceu que sabiam que a G..., Lda. não tinha seguro de crédito e que por essa razão forneciam o combustível à G..., Lda., à consignação, com contagem diária ou semanal.
E disse mais, relativamente ao contrato de fornecimento de combustível celebrado com a G..., Lda.: “o negócio da compra foi diretamente comigo (…) o grupo Alves Bandeira nunca em caso algum antes de ter um contrato sequer terá fornecido um litro sem ao posto sem … sem … sem … perguntar às pessoas cuidado há algum tipo de contrato… também não gostamos que fizessem isso connosco logicamente.”
A testemunha II referiu por sua vez que, sendo o meio dos combustíveis um meio pequeno, em que as empresas se conhecem todas umas às outras, eram publicamente conhecidas as dificuldades financeiras da G..., Lda.
KK, referiu que, o gerente da G..., Lda., AA contou-lhe que entretanto tinha feito contrato com a ALVES BANDEIRA E que esta lhe tinha dito que o ajudava, a resolver as coisas, desde que ele não tivesse o contrato com a TFREITAS.
Afirmou: “Repare, a Alves Bandeira sabia da dívida pelo menos desde 2013 quando começou a fornecer a G..., Lda. no tal interregno em que lhes cortamos o crédito pela primeira vez (…) eles sabem da situação, eles não me dão mais crédito porque sabem da situação com vocês.”
Estes depoimentos tem de ser analisados no contexto global do negócio que veio a ser efetuado.
Aqui salientamos os seguintes factos que foram julgados provados (não impugnados no recurso):
38 - O gerente da Ré G..., Lda., AA, deu conta aos responsáveis da Ré Alves Bandeira, das suas dificuldades económicas e da situação de risco de despejo em que a sociedade se encontrava, em virtude do incumprimento do contrato de locação financeira o qual iria ser promovido através da denúncia do contrato de locação financeira que já lhe tinha sido anunciado pelo Banco Invest.
39 - Interessada que estava em manter aberto e em funcionamento o posto de combustíveis em causa neste processo, a Ré Alves Bandeira, perante a incapacidade da Ré G..., Lda. mas com a sua anuência, teve por bem tentar negociar com o Banco Invest a cessão da posição contratual de locatária no contrato de locação financeira imobiliária, assumindo as responsabilidades do pagamento das respetivas rendas, nomeadamente os montantes das mesmas já vencidas.
41 - Perante este cenário e para atingir os seus objetivos de controlo do posto de abastecimento de combustíveis, a Ré Alves Bandeira assumiu perante o Banco Invest a totalidade das responsabilidades do contrato de locação financeira e assumiu a dívida da Ré G..., Lda., no empréstimo concedido a esta sociedade, referido em 36 e 37 e a qual se computava, em 21/3/2017, em €119.715,54.
Ora, o negócio celebrado pela ALVES BANDEIRA com a G..., Lda., de cessão da posição contratual no contrato de locação financeira, foi seguido da celebração dum contrato de prestação de serviços pela ALVES BANDEIRA com uma empresa do mesmo sócio único da G..., Lda. (a Magnetipluma).
Isto permitiu que o sócio único da sociedade G..., Lda., sociedade que foi declarada insolvente em 10.7.2017, AA, fizesse subtrair do ativo daquela empresa G..., Lda., o único direito com expressão patrimonial – contrato de locação financeira celebrado com o Banco Invest, relativo aos imóveis onde explorava um posto de combustíveis, uma loja e uma oficina, cedendo a sua posição contratual de locatária à ora apelante ALVES BANDEIRA, e continuar a explorar o posto de abastecimento de combustíveis, a oficina e a loja, agora através duma nova empresa do mesmo AA, a sociedade MAGNETIPLUMA.
Como vimos, o legal representante da ALVES BANDEIRA não forneceu justificação cabal para o facto de ter afastado a G..., Lda. da exploração do posto (na altura ainda não declarada insolvente), mas ter permitido ao sócio único dessa sociedade continuar a exploração, sob a veste duma outra sociedade.
Ao afastar a G..., Lda. da exploração do posto – assumindo a sua posição contratual no contrato de locação financeira e ao colocar a exploração do mesmo nas mãos do mesmo sócio da G..., Lda., “encoberto” por uma outra sociedade comercial, afastou qualquer possibilidade da G..., Lda. pagar à credora TFREITAS ENERGIA, SA, a quantia de 595.960,00 na data em dívida.
Como escreve o Prof. A. Varela, é aqui essencial que o devedor e terceiro tenham consciência do prejuízo que a operação causa aos credores.
A consciência do prejuízo causado ao credor é uma conclusão que há-de basear-se em factos concretos alegados e provados.
Porém, a consciência do prejuízo não é em regra suscetível de prova direta.
Assim é que, no particular contexto de ação de impugnação pauliana, assume especial relevância a prova indireta mediante o recurso a presunções judiciais, previstas nos artigos 349º e 351º do Código Civil, isso é, a ilações que são extraídas de um determinado facto conhecido para afirmar-se um outro determinado facto, dando-o por presumido, fazendo uso das regras da experiência de vida, da lógica, da racionalidade, dos padrões habituais e da normalidade do comércio, das obrigações e dos aspetos gerais da vida.
Tal como refere LL, “a prova da consciência do prejuízo causado ao credor, constitui uma conclusão a extrair do factos que a patenteiam, respeitando á descoberta da real intenção ou estado de espirito das partes ao emitir a declaração negocial (animus contrahendi).Incumbe ao autor alegar a intenção ou consciência real dos contraentes de modo a apurar, perante a concreta fisionomia e enquadramento do negócio, designadamente se o adquirente representou, de um ponto de vista psicológico, o prejuízo causado ao credor.”
Tendo-se provado o conhecimento do prejuízo causado à credora, aqui Apelada, por parte da Mangnetipluma (sociedade do mesmo sócio da G..., Lda.) e do BANCO INVEST, estranhava-se que a ALVES BANDEIRA, ao contrário daqueles nada se tivesse apercebido, quanto ao prejuízo que a subtração do único bem/direito com valor patrimonial evidente da G..., Lda. – posição contratual na locação financeira – quando é a mesma quem, após assumir a posição contratual da G..., Lda., na locação financeira, interessada em manter aberto e em funcionamento o posto, como se provou (facto 38), entregou a exploração do mesmo não à G..., Lda., que o explorava desde 2009, mas a uma outra sociedade do mesmo sócio.
Para além dessa situação, que não deixa de ser reveladora da existência de “conluio” entre as partes envolvidas no negócio – a ALVES BANDEIRA interessada em manter aberto e em funcionamento o posto, para continuar a fornecer combustível; o BANCO INVEST, interessado em manter o contrato de locação financeira, para lhe permitir o retorno do investimento/financiamento feito e o interesse do sócio daG..., Lda., de continuar a explorar o posto e nada pagar aos credores, entendemos que existem ainda outros fortes indícios que apontam também para o conhecimento da Ré Alves Bandeira do prejuízo causado, com tais negócios.
Como resulta do facto 38, provou-se que, “o gerente da Ré G..., Lda., AA, deu conta aos responsáveis da Ré ALVES BANDEIRA, das suas dificuldades económicas e da situação de risco de despejo em que a sociedade se encontrava”, pelo que a mesma tinha conhecimento das dificuldades financeiras.
Está em causa um elevado valor da dívida da G..., Lda. à Autora, na data de cerca de 600.000,00 euros, que dificilmente seria desconhecido naquele meio.
Acresce que se trata de uma dívida com origem no fornecimento de combustíveis feito pela Autora à G..., Lda. relativa a fornecimentos que aquela lhe fez e que não foram pagos no período temporal de 29.12.2014 a 27.5.2015.
Ora, tendo sido a ALVES BANDEIRA, quem substituiu a Autora no fornecimento de combustível à G..., Lda., no posto de combustíveis dos autos, (mediante contrato de fornecimento celebrado em 1 de outubro de 2015), não é crível que desconhecesse a existência da dívida, para mais de valor tão elevado ao anterior fornecedor.
Tal como referido pelos administradores da ALEVES BANDEIRA, esta empresa antes de iniciar qualquer relacionamento comercial, procede a um exaustivo estudo da situação económica e financeira, do futuro cliente, que no caso passaria certamente pelo apuramento das razões por que cessou o contrato anterior de fornecimento, sendo a nosso ver significativo que a ALVES BANDEIRA tenha aceite apenas fornecer combustíveis à consignação, certamente com receio de lhe acontecer o que acontecera ao fornecedor anterior, a ora Autora que ficou com fornecimentos por pagar na ordem dos 600.000,00 euros.
Repare-se ainda que a ALVES BANDEIRA, aquando da celebração do negócio impugnado, sabia que estavam também por pagar 17 rendas do contrato de locação financeira ao banco, no valor de 52.298,00 euros.
Tal como se provou (facto 37), fruto das mesmas dificuldades, sabia que a G..., Lda. deixara igualmente de pagar as prestações do contrato de mútuo com o mesmo Banco INVEST, estando então em diva 17 prestações no valor de e 16.806,15 euros.
É neste contexto que são celebrados os contratos dos autos, que conduziram a que o processo de insolvência da G..., Lda. terminasse de modo a que nenhum credor fosse ressarcido, por insuficiência de bens, beneficiando a ALVES BANDEIRA, a qual, pela contrapartida de ter assumido uma dívida da G..., Lda. de €119.715,54, (mas com garantias prestadas por terceiros), lhe viu ser transmitida a posição contratual no contrato de locação de financeira, o único bem de indiscutível valor financeiro (não obstante a existência de rendas em dívida no valor de 59.298,42 euros), existente no património da G..., Lda., pois a mesma permitia a exploração do posto de combustíveis naquele local, permitindo-lhe ainda continuar a fornecer os combustíveis necessários ao funcionamento daquele posto, agora não através da G..., Lda., mas duma outra sociedade do mesmo sócio gerente.
Concordamos assim com a Apelada quando afirma que “é totalmente contrário às regras da lógica e da vida como poderiam ser conhecidas dificuldades financeiras económicas sem conhecer-se o crédito da recorrente, como poderia o gerente da devedora “G..., Lda.”, que agiu com notório conserto (e interesse) com a recorrida “Alves Bandeira”, dar a conhecer umas dificuldades mas não outras, como é contrário, ainda, proceder a uma negociação com a Banca ignorando tal crédito, tal situação financeira e sem que a informação, quer do crédito significativo da recorrente quer da ação judicial, de natureza pública, seja conhecida e partilhada entre os intervenientes.”
Estamos assim em crer, fazendo uso das regras da experiência de vida, da lógica, da racionalidade, dos padrões habituais e da normalidade do comércio, das obrigações e dos aspetos gerais da vida, que o negócio efetuado nos moldes em que foi, acabados de descrever, implicava o conhecimento da situação patrimonial extremamente deficitária da G..., Lda., por parte da Alves Bandeira e da dívida pré-existente à anterior fornecedora do combustível à G..., Lda., aqui Autora, sendo tal conhecimento reforçado pelo facto desta sociedade ter substituído a Autora no fornecimento dos combustíveis, o que implicou da sua parte que se inteirasse da situação financeira anterior, não podendo desconhecer uma divida na ordem dos 600 mil euros ao anterior fornecedor, o que se mostra ainda compatível com o facto de lhe fornecer combustível apenas à consignação.
Desta forma, entendemos que se mostra feita prova com o recurso a presunções judiciais, previstas nos artigos 349º e 351º do Código Civil, do facto impugnado pela apelada.
Desta forma, impõe-se a alteração do facto 32, que passará a ter a seguinte redação (…).
3.2. Fundamentos de direito.
3.2.1. Requisitos da impugnação pauliana.
De acordo com o princípio da responsabilidade patrimonial, o património do devedor é a garantia geral dos credores, pelo que, pelo cumprimento de uma obrigação respondem, em regra, todos os bens do devedor, susceptíveis de penhora (art.º 601.º do Código Civil).
Num sistema assente no princípio da responsabilidade patrimonial, em que o património do devedor é a garantia geral dos seus débitos, assumem particular importância os instrumentos de conservação da garantia patrimonial, que impeçam o devedor, movido pelo escopo de frustrar a garantia geral dos seus credores, de distrair do seu património, em combinação com terceiros que partilhem também desse propósito, determinados bens.
Um dos meios jurídicos específicos, finalisticamente ordenado à manutenção da integridade do património do devedor é justamente a acção pauliana, evidentemente aplicável também a créditos públicos, que permite ao credor a impugnação de determinados actos do devedor que ponham em perigo a garantia geral dos seus débitos.
São pressupostos deste instrumento de conservação da garantia patrimonial: um acto praticado pelo devedor que não seja de natureza pessoal; acto esse que provoque, para o credor, a impossibilidade de obter a satisfação integral do seu crédito ou o agravamento dessa impossibilidade; havendo má fé ou, simplesmente, um acto gratuito; desde que o crédito seja anterior ao acto, ou sendo posterior, quando o acto tenha sido efectuado dolosamente com o fim de impedir a satisfação do direito do futuro credor (art.ºs 610.º a 612.º do Código Civil)1. Estes pressupostos levantam problemas desiguais, mas têm em comum a característica de todos eles – com excepção do relativo à perda da garantia patrimonial - deverem ser provados por quem pretenda actuar a pauliana (art.ºs 342.º, n.º 1, e 611.º do Código Civil).
A acção pauliana tem por objectivo a manutenção da integridade do património do devedor, de modo que este desempenhe a sua função de garantia geral dos seus débitos.
Dada essa finalidade, o requisito primeiro e evidente da impugnação pauliana é a existência de um crédito (art.º 610.º do Código Civil). Esse crédito tanto pode ter por objecto uma prestação de coisa como uma prestação de facto - e pode ter como fonte qualquer acto ou facto a que se associe a eficácia constitutiva de uma obrigação. A única exigência relevante é de que se trate de uma obrigação civil, uma vez que a pauliana, por razões que se compreendem por si, não é facultada aos credores de obrigações naturais2. Esse crédito bem pode ser ilíquido, mas há-de tratar-se de um crédito puro, no sentido de que não deve estar subordinado a uma condição suspensiva. Em tal caso, ao credor não é disponibilizada a pauliana – mas apenas o direito potestativo de exigir ao devedor, na pendência da condição, a prestação de uma caução idónea que assegure a satisfação do direito de crédito, se e quando a condição se verificar (art.º 614.º, n.º 2, do Código Civil). Como o crédito submetido a uma qualquer condição suspensiva se não tem por certo, entendeu-se não ser razoável conceder ao credor o direito de interferir com a liberdade de actuação do devedor sobre o seu património. Todavia, o perigo da perda definitiva da garantia patrimonial do crédito já justifica que possa exigir ao devedor a prestação de caução idónea, que assegure a satisfação do crédito condicional3.
O crédito tanto pode ser anterior como posterior ao acto questionado (art.º 610.º, a), do Código Civil). No entanto, se o débito tiver sido contraído depois do acto objecto de impugnação, é necessário demonstrar que esse acto foi concretizado dolosamente, com o fim de impedir a satisfação do futuro credor (art.º 610.º, a), 2ª parte, do Código Civil). Para a impugnação do acto anterior ao crédito não é, portanto, suficiente, que se mostre que o acto tinha o fito de impedir a satisfação do direito de crédito do futuro credor, antes tem de provar-se que um tal acto foi iluminado por aquela finalidade dolosa, i.e., que o acto impugnado foi concluído com qualquer sugestão ou artifício, com a intenção de induzir ou manter em erro o credor, como sucederá, decerto, nos casos em que se faz crer ao credor que os bens ainda existem no património do devedor à data em que foi constituído o respectivo crédito (art.º 253.º, n.º 1, do Código Civil). Os actos anteriores ao crédito são, pois, impugnáveis. Mas só o são desde que se demonstre que, além de visarem impedir a satisfação do crédito, o acto foi praticado ardilosamente, com o propósito de fazer crer ao credor que os bens continuavam no património do devedor4.
O acto impugnável, além de finalisticamente destinado a prejudicar o credor, deve provocar a diminuição da garantia patrimonial do crédito e, por essa via, a impossibilidade de satisfação desse crédito ou o agravamento dessa impossibilidade (art.º 610.º, b), do Código Civil). Portanto, a diminuição da garantia patrimonial, i.e., dos valores patrimoniais que respondem pela satisfação da dívida, tanto pode resultar da diminuição do activo – v.g. por alienação ou oneração de bens ou direitos - como do aumento do passivo – por constituição de novas obrigações.
Requisito particularmente relevante da pauliana é a má fé, dado que a procedência da impugnação do acto oneroso do devedor depende da actuação de má fé, daquele e de terceiro, entendendo-se por má fé, neste contexto, a consciência do prejuízo que o acto causa ao credor (art.º 612.º, nºs 1 e 2, do Código Civil). A má fé, tanto do devedor como do terceiro, é apresentada, formalmente, por igual, e, portanto, não se trata apenas de uma fraude do devedor com conhecimento do terceiro: para que o acto seja impugnável através da acção pauliana, tanto o devedor como o terceiro devem ter atentado contra a boa fé. Note-se, porém, que é suficiente a concorrência, no devedor e no terceiro, da má fé não sendo necessária a verificação de um conluio ou concertação entre ambos5.
A má fé consiste, neste domínio, na consciência do prejuízo que o acto causa ao credor (art.º 612.º, nº 2, do Código Civil). A má fé resolve-se, portanto, na consciência de que o acto cria, para o credor, a impossibilidade de obter a satisfação integral do seu crédito ou, ao menos, o agravamento dessa impossibilidade.
A consciência do prejuízo – que deve existir no momento da prática do acto - é um processo psicológico, pertencente ao domínio da representação ou ideação, assumindo uma natureza intelectiva: o devedor e o terceiro devem ter a percepção, não apenas da situação patrimonial do primeiro e dos efeitos do acto que vão praticar, mas igualmente de que esse acto impossibilitará os credores do devedor de obter a satisfação dos seus créditos6.
A consciência do prejuízo – também conhecido como eventus damni - é compatível com qualquer forma de dolo – directo, necessário e eventual - e mesmo com a negligência consciente, i.e., com a actuação negligente, do devedor e do terceiro, que apesar de preverem aquele resultado, o não desejam. Discutível é se deve afirmar-se a má fé também nos casos de negligente inconsciente, i.e., também naqueles casos em que o devedor e o terceiro, não tendo previsto aquele resultado, não o quereriam se o tivessem conjecturado7. Importa, porém, reter este ponto: a má fé só é exigida no tocante aos actos onerosos: se o acto for gratuito, a impugnação procede, mesmo que o devedor e o terceiro tenham actuado de boa fé (art.º 612.º, nº 1, 2ª parte, do Código Civil). Esta solução explica-se por si: sendo o acto gratuito, há sempre prejuízo para o credor – e prejuízo injustificável, porque quem procura interesses deve ceder a quem procura evitar prejuízos. Este regime vincula, naturalmente, ao distinguo entre actos onerosos e actos gratuitos. O acto diz-se oneroso quando envolve para cada uma das partes uma atribuição patrimonial e um correlativo sacrifício patrimonial; é gratuito quando só para uma das partes há atribuição patrimonial e só para outra, sacrifício patrimonial. Dentro dos actos gratuitos avultam, como categoria primária, as liberalidades, i.e., os actos de que resulta intencionalmente para outrem um enriquecimento. O principal tipo de liberalidade, inter vivos, é, naturalmente, a doação (artº 940 e ss. do Código Civil)8.
A acção pauliana actua repressivamente visando destruir a diminuição da garantia patrimonial já ocorrida, de modo a reconstituir a garantia patrimonial de um crédito.
O acto impugnado com a pauliana é, em si, inteiramente válido. O devedor, por maior que seja o seu passivo, não perde a disponibilidade dos seus bens. A única coisa que lhe não é lícita é, com má fé, ou se for esse o caso, com dolo, prejudicar os seus credores. Isto explica que o acto impugnado, mesmo no caso de procedência da impugnação, se mantém válido e produz todos os seus efeitos. A procedência da impugnação apenas implica esta consequência particular: a de os bens ou direitos transmitidos responderem – ou, mais exactamente, continuarem a responder - pelas dívidas do alienante. É por esta razão que se fala em ineficácia em relação ao credor, ineficácia que traduz a natureza meramente relativa ou creditícia do direito à restituição (art.º 616.º, nº 1, do Código Civil)9.
O autor da pauliana está adstrito à demonstração da existência do crédito e do seu valor. Mas a pauliana não é uma acção de cumprimento, dado que não visa exigir judicialmente o cumprimento – mas um simples instrumento de conservação da garantia patrimonial do crédito (art.º 817.º do Código Civil). Neste sentido, e no tocante ao crédito cuja garantia patrimonial se visa preservar, a acção pauliana é uma acção de simples apreciação positiva: a sentença que a julgue procedente limita-se declarar a existência do crédito e o seu valor (art.º 10.º, n.º 2, a), do CPC). Julgada procedente a pauliana, a exigência do cumprimento e a realização coactiva da prestação ocorrerão em momento e em procedimento ulteriores e à custa do bem ou direito transmitido.
3.2.2.. Poderes de controlo da Relaçáo, no tocante à decisão da matéria de facto da 1.ª instância, e do Supremo relativamente às presunções judiciais utilizadas pelas instâncias.
O Supremo Tribunal de Justiça é um tribunal de revista e, portanto, não controla a decisão da questão de facto e não revoga por erro de facto, controlando apenas a decisão de direito e só revogando por erro de direito, limitação que é justificada pela função de harmonização jurisprudencial sobre a interpretação e aplicação da lei que é característica e própria dos tribunais supremos (art.ºs 46.º da LOSJ, aprovada pela Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto, e 682.º, n.º 1, do CPC). Por isso que o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não constitui objecto idóneo do recurso de revista, salvo os casos de ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova, i.e., exceptuados os casos de prova necessária, i.e., em que a lei exige certo meio de prova para se poder demonstrar o facto probando, ou de prova legal ou tarifada, quer dizer, em que a lei impõe ao juiz a conclusão que há-de tirar do meio de prova (art.º 674.º, n.º 3, do CPC).
O Supremo Tribunal de Justiça está, pois, vinculado aos factos fixados pelas instâncias e, como consequência dessa vinculação, está adstrito a uma obrigação negativa: a de não poder alterar, salvo em casos excepcionais, essa matéria (art.º 682.º, n.º 2, do CPC). Estas vinculações implicam que não pode controlar a apreciação da prova, porque uma vinculação à matéria de facto averiguada nas instâncias e a proibição de alterar, implicam, necessariamente, a impossibilidade – e mesmo a desnecessidade – de controlar a sua apreciação. Em especial, o Supremo não pode controlar a prudência ou a imprudência da convicção das instâncias sobre a prova produzida, sempre que se trate de provas submetidas ao princípio da liberdade de apreciação, i.e., que assenta na prudente convicção que o tribunal tenha adquirido das provas produzidas (art.º 607.º, n.º 5, 1.ª parte, do CPC). Trata-se de jurisprudência absolutamente firme ou acorde10. A valoração que a Relação faz destas provas – e a convicção autónoma que delas adquira – dado que não constitui um erro em matéria de direito probatório, está inteiramente subtraída à competência decisória ou funcional do Supremo. Numa palavra: está vedado ao Supremo o conhecimento do – eventual – erro na valoração das provas e na fixação dos factos materiais da causa, apenas dispondo de competência funcional ou decisória para controlar a actuação da Relação nos casos de prova vinculada ou tarifada, ou seja, quando está em causa um erro de direito.
Mas o Supremo dispõe, comprovadamente, de competências de controlo sobre o uso – ou uso incorrecto - ou não uso pela Relação dos seus poderes específicos sobre a matéria de facto: o poder de correcção da decisão recorrida, o poder de controlo sobre os meios de prova e o poder de anulação da decisão impugnada (art.º 662, n.ºs 1, a), e 2, a), c) e d), do CPC).
No caso do recurso de apelação que tenha por objecto, principal ou concorrente, a impugnação da decisão da matéria de facto da 1.ª instância, por erro em matéria de provas, o Tribunal da Relação deve proceder, no tocante a cada um dos enunciados de facto que o recorrente reputa de mal julgados, à reapreciação das provas que, segundo o impugnante, foram erroneamente valoradas ou apreciadas – reapreciação que pressupõe o conhecimento do seu conteúdo, a determinação da sua relevância e a sua valoração (art.ºs 640.º, n.º 1, a) a c), e 662.º, n.º 1, do CPC). No exercício dos seus poderes de correcção da decisão proferida sobre a matéria de facto, a Relação pode alterar aquela decisão se ela for incompatível com a prova produzida em 1.ª instância: esta incompatibilidade pode decorrer de um novo juízo formulado pela Relação dado que – considerando a remissão realizada pelo art.º 662.º, n.º 3 para o art.º 607.º do CPC, a Relação tem de realizar a análise crítica das provas produzidas na 1.ª instância, extrair, se for caso disso, ilações das presunções judiciais e das presunções legais e ainda formar, nas matérias submetidas à livre apreciação da prova, uma prudente convicção autónoma – e fundamentada - sobre essas provas (art.º 607.º, n.ºs 4 e 5, do CPC). Análise crítica das provas que respeita, por um lado, ás inferências probatórias e, por outro, á solução de uma situação de non liquet: se dos factos assentes ou da decisão sobre a matéria de facto constarem factos indiciários donde se possa concluir outros por presunção – de facto, de direito ou judicial – é lícito à Relação tirar essa conclusão; no caso de prova produzida não permitir resolver uma questão de facto no caso de dúvida insanável ou irredutível, ou questão insanável ou irredutivelmente incerta, o tribunal deve decidir contra parte a quem o facto aproveita (art.ºs 604.º, n.º 4, e 414.º do CPC)11.
Note-se que se a Relação tem o dever de proceder ao exame crítico das provas - novas ou mesmo só renovadas – que sejam produzidas perante ela e de formar, relativamente às provas submetidas à sua livre apreciação, uma convicção prudente sobre essas provas – não há razão bastante – legal ou sequer epistemológica - para que não proceda àquele exame e à formulação desta convicção - e à sua objectivação - no caso de reapreciação das provas já examinadas pela 1ª instância (art.º 607.º, nº 5, ex-vi art.º 663.º, nº 2, do CPC). O controlo da correcção da decisão da matéria de facto da 1ª instância exige, realmente, que a Relação construa – autonomamente, embora com os limites decorrentes da sua vinculação à impugnação do recorrente - não só a sua própria convicção sobre as provas produzidas, mas igualmente que a fundamente.
A Relação deve, pois, formar uma convicção verdadeira – e fundamentada - sobre a prova produzida na 1.ª instância, independente ou autónoma da convicção do juiz a quo, que pode ou não ser coincidente com a deste último – não se limitando a controlar a legalidade da produção da prova realizada naquela instância e a aceitar o resultado do exercício da prova - salvo casos em que esse julgamento seja ilógico, irracional, arbitrário, incongruente ou absurdo. A conclusão da correcção ou da incorrecção da decisão da questão de facto do tribunal da 1ª instância exige um juízo de relação ou de comparação entre a convicção que o decisor de facto daquela instância extrai dos elementos de prova que apreciou e a convicção que a Relação adquire da reapreciação dessas mesmas provas. Se a convicção do juiz da 1.ª instância e da Relação forem coincidentes, a decisão da matéria de facto daquele tribunal deve ter-se por correcta, com a consequente improcedência da impugnação deduzida contra ela; se a convicção do decisor da 1.ª instância e da Relação forem divergentes, a Relação deve fazer prevalecer a sua convicção sobre o convencimento do juiz da 1ª instância e, correspondentemente, revogar a decisão deste último e logo a substituir por outra conforme aquela mesma convicção.
O exame, ainda que leve, da evolução das atribuições da Relação de julgamento da matéria de facto inculca, indubitavelmente, um reforço dos seus poderes, nitidamente ordenado pela criação de um verdadeiro e efectivo segundo grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto, facultando às partes uma maior e real possibilidade de reacção contra eventuais erros de julgamento na livre apreciação das provas e na fixação da matéria de facto relevante para a solução jurídica do pleito. Apesar disso, não parece que seja errado dizer-se que não se visa instituir uma nova instância de julgamento da matéria de facto – mas, limitadamente, criar uma instância de controlo do julgamento daquela matéria feito pelo tribunal de 1ª instância: a Relação não é uma 2.ª 1.ª instância.
Simplesmente, esta constatação não autoriza uma concepção restritiva dos poderes de controlo da Relação relativamente à decisão da questão de facto, que, aliás, se considera definitivamente ultrapassada12, assente na falta de homogeneidade da assunção da prova pessoal pelo Tribunal da 1.ª instância e pela Relação, considerando que esta última exerce a actividade processual de controlo da decisão da questão de facto sem a presença dos participantes processuais e, portanto, sem o contacto vivo e imediato com esses participantes, i.e., sem intervenção do princípio da imediação. Mas se é indubitável que a diferença entre as condições em que a 1.ª instância e a Relação apreciam a prova produzida – no último caso sem imediação – não é irrelevante, também é irrecusável que não é impossibilitante da formação pela Relação de uma convicção autónoma – e fundamentada – sobre aquela prova. Crê-se, de resto, que o dever de renovar a prova deixa sem valor o argumento: sempre que a Relação tiver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente – e, portanto, suspeitar da falsidade do seu depoimento, e entenda que só com a presença do depoente lhe será possível, avaliar o mais correctamente possível da credibilidade, ou do sentido das declarações prestadas, tem na sua mão a possibilidade de obter uma percepção própria daquela prova: a renovação da sua produção (art.º 662.º, n.º 2, a), do CPC).
A prova em juízo nunca é fácil e pode ser especialmente difícil, desde logo por razões objectivas, i.e., em que a dificuldade resulta do carácter ou da natureza facto a provar, como sucede com os factos relativos a estados anímicos, como, por exemplo, o conhecimento ou a consciência, ou a intenção. Para ultrapassar esta dificuldade, justifica-se uma utilização intensiva de regras de experiência e de critérios sociais – do id quod plerumque accidit, daquilo que normalmente sucede - de uma prova prima facie, i.e. de uma prova em que a tipicidade da inferência probatória é de tal modo forte que só cede perante dúvidas fundadas, quer dizer, perante uma contraprova também ela prima facie ou perante a prova do contrário ou, em última extremidade, através da diminuição da medida da prova, i.e., na impossibilidade de a dificuldade probatória poder ser ultrapassada através de uma prova prima facie, julgar-se suficiente uma menor convicção sobre a realidade do facto13.
Na espécie do recurso, o acórdão recorrido foi claro e terminante em declarar que estabeleceu o facto relativo ao eventus damni no tocante à recorrente na prova por presunção judicial.
Indiscutivelmente, a prova é actividade destinada á formação da convicção do tribunal sobre a realidade de factos dos factos controvertidos, actividade que incumbe à parte onerada com o respectivo ónus que não obterá uma decisão favorável se o não satisfizer (art.ºs 341.º, 342.º e 346.º do Código Civil e 414.º do CPC). Para cumprir esse ónus, a parte de tem de utilizar um dos meios de prova, legal ou contratualmente admitidos ou não excluído por convenção das partes (art.º 345.º do Código Civil). Uma dessas provas é a prova por presunção que constitui uma prova complexa, dado que depois de adquirido o facto probatório – ou o facto base da presunção – incumbe ao juiz determinar a relação entre aquele facto e o facto probando, que constitui o objecto da prova (art.ºs 349.º a 351.º do Código Civil, e 607.º, n.º 4, do CPC).
Tal como sucede com a fundamentação da sentença, na fundamentação do acórdão a Relação pode extrair os factos presumidos com base nos factos probatórios (art.º 607.º. n.º 4, ex-vi art.º 663.º, n.º 2, in fine, do CPC). Em concreto: se dos factos assentes ou da fundamentação sobre a matéria de facto constarem factos probatórios donde se possa concluir outros por presunção – de facto, de direito ou judicial – os juízes devem tirar essa conclusão e considerar provado o facto ou o direito presumido. Portanto, nada obsta a que a Relação, no exercício dos seus poderes de correcção da decisão da matéria de facto da 1.ª instância, possa, através de presunções judiciais, baseadas nos factos apurados, tanto na 1.ª instância como na 2.ª, deduzir outros factos (art.ºs 349.º e 351.º do Código Civil).
As presunções judiciais, de facto ou hominis ou simples presunções são afinal o produto de regras de experiência: o juiz valendo-se de certo facto e de regras de experiência, conclui que aquele denuncia a existência de outro facto. Ao procurar formar a sua convicção acerca dos factos relevantes para a decisão, pode o juiz utilizar a experiência da vida, da qual resulta que um facto é a consequência típica de outro; procede, então, mediante presunção ou regra de experiência ou, se se quiser, vale-se de uma prova de primeira aparência14, prova prima facie, que – note-se - não é uma prova de carácter indiciário ou uma prova fraca, mas antes uma prova concludente e, por isso, uma prova forte. As regras de experiência são normas para a apreciação de factos e, com isso, para a aquisição deles, permitindo concluir de um facto pela existência de outro. E, na verdade, a cada passo, o juiz tem de socorrer-se de regras de experiência para a fixação dos factos ou da conexão causal entre dois eventos, sem as quais, portanto, lhe seria impossível decidir a questão de direito.
No seu funcionamento, a presunção produz um efeito materialmente idêntico à exclusão do ónus da prova, embora se não confunda com este. Na verdade, a presunção não fornece a demonstração do facto, mas dá por admitida a sua realidade antes de toda e qualquer demonstração, com base na experiência comum de como certos factos normalmente se verificam – quod plerumque accidit – sem esperar o exercício da prova. Justamente no valor de credibilidade que, de per se, apresenta a regra de experiência está o fundamento racional da presunção e na medida desse valor assenta o seu grau de rigor15. A presunção pode, assim, ser o único meio em que o juiz baseia a sua convicção, podendo até fazer prevalecer a presunção em detrimento de outras provas produzidas e mesmo recorrer a ela ainda que o facto questionado possa ser apurado por outro meio relativamente mais seguro. De outro aspecto, nada exclui que na base da presunção se situe um único facto: o que é necessário é que ele seja inequívoco, i.e., que faça aparecer como necessária a existência do facto desconhecido. No entanto, para que a presunção se aplique é indispensável a prova do facto que constitui a sua base. E a melhor maneira de justificar a conexão entre o facto probatório e o facto probando é através da inferência para a melhor explicação: o facto probando pode ser inferido do facto probatório quando o primeiro constituir a melhor explicação do segundo16, i.e., deve existir um enlace preciso e directo entre o facto adquirido e o desconhecido, uma conexão, coerência e congruência entre o primeiro e o segundo, de harmonia com a regra de experiência – mas não é necessário que entre o facto-base e o facto presumido exista um vínculo de absoluta e exclusiva necessidade causal, sendo suficiente uma relação de dependência lógica entre o facto conhecido e o desconhecido segundo.17
As presunções sejam judiciais ou de facto ou legais, não são, talvez, propriamente, meios de prova18 – mas somente meios lógicos19 ou mentais de descoberta de factos e firmam-se mediante regras ou máximas de experiência, que mais não que inferências extraídas de fenómenos de facto com base numa dada experiência, que tanto pode referir-se à experiência geral da vida, a conhecimentos científicos ou à observação e generalização de casos individuais. Rigorosamente são, portanto, operações probatórias, tendo por base as regras de experiência resultantes do curso normal dos factos20. Indispensável é, porém – repete-se - a existência de uma relação entre o facto probatório e o facto probando, de harmonia com a inferência para a melhor explicação, i.e., sempre que o primeiro constitui a melhor explicação do segundo.
Quaisquer que sejam as limitações do Supremo quanto à modificação da matéria de facto, essas restrições não são aplicáveis no tocante ao controlo das presunções judiciais utilizadas pelas instâncias, porque esse controlo toma como base a matéria de facto apurada pelas instâncias e não envolve qualquer modificação dessa matéria, embora a este propósito, este Supremo Tribunal, em face da competência alargada das Relações no tocante à reapreciação da decisão da matéria de facto no âmbito da qual lhes é lícito reequacionar a avaliação probatória feita pela 1.ª instância no domínio das presunções judiciais ou socorrer-se, ela mesma, ex-novo, dessas presunções – por força da remissão do art,º 663.º n.º 2 para o n.º 4 do art.º 607.º, ambos do CPC 21- se oriente, patentemente, no sentido de que o erro sobre a substância do juízo presuntivo, formado com apelo às regras de experiência, só seja sindicável, pelo tribunal de revista, em casos de manifesta ilogicidade22,23. Portanto, embora de harmonia com um standard mínimo quanto ao controlo das presunções, o Supremo pode verificar se a Relação usou adequadamente - ou deixou de usar – as suas competências no tocante à matéria de facto: se o uso das presunções era, no caso, admitido por lei se, sendo admitido, inferiu o facto presumido de factos não provados e se a presunção judicial é coerente com os factos apurados.
Simplesmente, essa verificação poderá de nada servir ao recorrente, sempre que as presunções judiciais não foram a única prova de que Relação se socorreu para julgar provado o facto controverso, como sucede quanto tenha utilizado, para formar a sua convicção sobre a realidade desse facto, também a prova testemunhal ou outra prova, pessoal ou não, submetida à sua liberdade de apreciação. Nesta hipótese o eventual erro na apreciação, v.g., da prova testemunhal, por se tratar de uma prova sujeita à livre, mas prudente, apreciação das instâncias, não é controlável por este Tribunal. Quer dizer: mesmo que se deva concluir pela evidente ilogicidade das presunções judiciais utilizadas pelas instâncias, maxime pela Relação, ainda assim este Tribunal Supremo continuará vinculado aos factos fixados por elas, sempre que para a sua demonstração tiver sido utilizada, ainda que de modo concorrente, uma prova cuja força persuasiva esteja subtraída ao seu controlo24.
Este viaticum habilita, com suficiência, à resolução da questão concreta controversa colocada no recurso – e a julgá-lo improcedente.
3.2.3. Concretização.
Em primeiro lugar – ao contrário do que inculca alegação da recorrente – sempre que a decisão da matéria de facto da 1.ª instância tenha sido adequadamente impugnada, com fundamento no error in iudicando em matéria de provas, a Relação deve actuar os seus poderes de correcção daquela decisão e modificá-la sempre que conclua pela verificação de um erro dessa espécie, ainda que não se trate de um erro notório, palmar, grosseiro, ostensivo ou evidente. Entendimento contrário, assenta numa concepção restritiva daqueles poderes de controlo, que, como se observou, deve considerar-se hoje definitivamente ultrapassada por não corresponder a uma leitura correcta das competências de controlo atribuídas à Relação relativamente à decisão da quaestio facti da 1ª instância e das finalidades dessa atribuição. Julga-se, assim, claro que por menos evidente que seja o error in iudicando da decisão da matéria de facto da 1.ª instância, por erro sobre provas, invocado pelo impugnante, a Relação deve actuar o seu poder-dever de correcção da decisão daquela decisão e, depois de contactar com as provas que o recorrente reputada de erroneamente avaliadas, e de as examinar criticamente, deve construir, de modo autónomo, uma convicção própria – e suficientemente fundamentada – sobre essas provas e revogar essa decisão, sempre que aquela convicção não seja coincidente com a exteriorizada pelo decisor da 1.ª instância. Neste plano, é indiscutível a correcção do acórdão impugnado.
Em segundo lugar, os factos probatórios, ou na primeira designação da lei, os factos complementares, i.e., os factos que constituem a base da presunção de que a Relação se socorreu para julgar demonstrado o facto indispensável à procedência da impugnação – o relativo à má fé também da recorrente – são inatingíveis para este Supremo dado que, indiscutivelmente, a sua realidade foi estabelecida pelas instâncias por recurso a meios de prova livre, v.g., a prova testemunhal, ou seja, prova que é livre - mas prudentemente – apreciada pelo tribunal (art.º 396.º do Código Civil). A valoração que a Relação fez destas provas – e a convicção autónoma que delas adquiriu – dado que não constitui um erro em matéria de direito probatório, está inteiramente subtraída à competência decisória ou funcional do Supremo. Estão nessas condições, desde logo, os factos relativos ao conhecimento, pelo Banco Invest, SA, e Magnetipluma, Lda., quer do crédito da autora sobre a G..., Lda., quer do facto de que se essa sociedade não tivesse mais o prédio aqui em causa e respetivo estabelecimento comercial não tinha meios para ressarcir qualquer montante à autora, e bem assim, os julgados provados, identificados com os números 38 - O gerente da Ré G..., Lda., AA, deu conta aos responsáveis da Ré Alves Bandeira, das suas dificuldades económicas e da situação de risco de despejo em que a sociedade se encontrava, em virtude do incumprimento do contrato de locação financeira o qual iria ser promovido através da denúncia do contrato de locação financeira que já lhe tinha sido anunciado pelo Banco Invest – 39 - Interessada que estava em manter aberto e em funcionamento o posto de combustíveis em causa neste processo, a Ré Alves Bandeira, perante a incapacidade da Ré G..., Lda. mas com a sua anuência, teve por bem tentar negociar com o Banco Invest a cessão da posição contratual de locatária no contrato de locação financeira imobiliária, assumindo as responsabilidades do pagamento das respetivas rendas, nomeadamente os montantes das mesmas já vencidas – e 41 - Perante este cenário e para atingir os seus objetivos de controlo do posto de abastecimento de combustíveis, a Ré Alves Bandeira assumiu perante o Banco Invest a totalidade das responsabilidades do contrato de locação financeira e assumiu a dívida da Ré G..., Lda., no empréstimo concedido a esta sociedade, referido em 36 e 37 e a qual se computava, em 21/3/2017, em €119.715,54.
Por último, em face destes enunciados, e embora a impugnação pauliana não exija a colusão ou o conluio entre o devedor e terceiro ou terceiros, é clara a concertação entre a recorrente, a devedora da recorrida, o Banco Invest, SA, Magnetipluma, Lda., e o gerente desta e daquela devedora, ordenada para a obtenção de um resultado favorável a todos os intervenientes do acto lesivo da garantia patrimonial, e dos actos jurídicos subsequentes, pelo que não é crível, de harmonia com regras de experiência, que a recorrente, à semelhança do que sucede com o Banco Invest, SA e com Magnetipluma, Lda., não soubesse, por um lado, que a cedente da posição contratual, era devedora da recorrida, e, por outro, que com a cessão da posição no contrato de locação financeira, aquela devedora, ficaria destituída, por completo, dos meios para ressarcir a autora. Tendo aquela devedora informado a recorrente das suas dificuldades económicas, não é razoável supor que a recorrente, operadora de um mercado extremamente competitivo e concorrencial, não se inteirasse da exacta situação económica daquela devedora e aceitasse, contra o dever de prudência de um comerciante criterioso e ordenado, investir uma quantia particularmente elevada, abstraindo das dificuldades económicas daquela, pelo que não se julga razoável que a recorrente não soubesse da existência do crédito, de valor particularmente, avultado da recorrida.
Aliás, a causa próxima do negócio de cessão, e dos contratos subsequentes, foi constituída pelo desequilíbrio económico grave da devedora da recorrida que não lhe permitia sequer cumprir a obrigação de pagamento das rendas convencionadas no contrato de locação financeira, facto que era do inteiro conhecimento da recorrente, por lhe ter sido comunicado por essa mesma devedora: se antes da cessão a devedora da recorrida já se mostrava economicamente impotente para satisfazer mesmo a obrigação periódica de pagamento das rendas contratualizadas no contrato de locação financeira, a recorrente, até, por uma simples razão de pura lógica, não poderia deixar de saber ou de consciencializar que, depois da transmissão da posição contratual, aquela menos ainda poderia solver qualquer outro débito, para mais um crédito de valor tão elevado como é aquele que a recorrida titula.
Assim, ao concluir que estamos assim em crer, fazendo uso das regras da experiência de vida, da lógica, da racionalidade, dos padrões habituais e da normalidade do comércio, das obrigações e dos aspetos gerais da vida, que o negócio efetuado nos moldes em que foi, acabados de descrever, implicava o conhecimento da situação patrimonial extremamente deficitária da G..., Lda., por parte da Alves Bandeira e da dívida pré-existente à anterior fornecedora do combustível à G..., Lda., aqui Autora, sendo tal conhecimento reforçado pelo facto desta sociedade ter substituído a Autora no fornecimento dos combustíveis, o que implicou da sua parte que se inteirasse da situação financeira anterior, não podendo desconhecer uma divida na ordem dos 600 mil euros ao anterior fornecedor, o que se mostra ainda compatível com o facto de lhe fornecer combustível apenas à consignação, a Relação, na inferência que realizou com base nos factos probatórios adquiridos para o processo usou uma adequada regra de experiência e, além disso, obteve um resultado compatível com essa regra, pelo que a prova do facto probando essencial – o eventus damni relativo à recorrente – não contraria a razoabilidade nem, muito menos, é arbitrária. Não há, deste modo, na presunção utilizada pelo acórdão recorrido qualquer ilogicidade na inferência presuntiva, i.e. na aquisição do facto probando através de um raciocínio inferencial: a regra de experiência que a Relação utilizou como standard da decisão é correcto – dado que é um critério objectivo de conhecimento geral – e a inferência do facto probando mostra-se vinculado a essa regra de experiência. Em qualquer caso, não se verificaria, na inferência presuntiva, uma ilogicidade evidente ou manifesta – única que, de harmonia com a orientação consistente deste Tribunal Supremo permitiria a sua sindicabilidade ou controlo por este mesmo Tribunal.
De resto, apesar da declaração de que se mostra feita prova com o recurso a presunções judiciais, previstas nos artigos 349º e 351º do Código Civil, do facto impugnado pela apelada, a verdade é que o acórdão, como linearmente decorre da motivação que exteriorizou para julgar provado aquele facto, não deixou de utilizar, ao menos concorrentemente, as provas pessoais produzidas oralmente na audiência, de que conheceu através do respectivo registo fonético. Portanto, na espécie sujeita, summo rigore, a presunção judicial não foi a única prova, sujeita à sua livre, mas prudente valoração, que a Relação utilizou para formar a sua convicção sobre a realidade ou veracidade daquele facto essencial, como, aliás a recorrente reconhece na conclusão 12.ª: o Acórdão de que se recorre pretende reverter aquele facto e dar como provado o conhecimento da divida da G..., Lda. para com os Transportes Freitas por parte da Alves Bandeira, reanalisando os mesmos depoimentos e fazendo recurso à aplicação das Presunções Judiciais previstas nos artºs 349º e 351º do Código Civil. E, nesta hipótese, dado que a Relação se fundamentou também numa outra prova sujeita à sua liberdade de apreciação – v.g. a prova testemunhal – suficiente, de per se, para formar aquela mesma convicção, o julgamento dos factos relativos ao eventus damni relativo à recorrente, sempre seria inatingível para este Tribunal dado que, como se sublinhou, o Supremo está impedido de controlar a decisão da questão de facto e não revoga por erro de facto, controlando apenas a decisão de direito e só revogando por erro de direito.
Não se verifica, portanto, qualquer erro da Relaçáo sobre presunções judiciais e, estando adquiridos para o processo, todos os pressupostos da pauliana, outra coisa não resta que julgar a revista improcedente.. E face a esta improcedência, fica evidentemente prejudicada a apreciação da pretensão da recorrida de ampliação do objecto da revista, deduzida, aliás, a título puramente subsidiário, i.e., para eventualidade da procedência do recurso (art.ºs 554,º n.º 1, 608.º n.º 2 e 636.º, n.º 1, do CPC).
Do percurso argumentativo percorrido, extraem-se como proposições conclusivas mais salientes as seguintes:
- A Relação deve exercer os seus poderes de controlo de correcção da decisão da matéria de facto da 1.ª instância sempre que conclua pelo erro de julgamento, por erro sobre provas, alegado pelo impugnante, e não apenas nos casos de erro grosseiro, evidente ou palmar, na avaliação dessas mesmas provas;
- Á Relação, no exercício dos seus poderes de correcção da decisão da matéria de facto da 1.ª instância, é lícito, através de presunções judiciais, baseadas nos factos apurados, deduzir outros factos;
- As restrições do Supremo quanto à modificação da matéria de facto não são aplicáveis no tocante ao controlo das presunções judiciais utilizadas pelas instâncias, embora, embora, de harmonia com jurisprudência consistente, o erro sobre a substância do juízo presuntivo, formado com apelo às regras de experiência, só seja sindicável, pelo tribunal de revista, em casos de manifesta ilogicidade;
- Embora o Supremo possa controlar, ainda que de harmonia com um standard mínimo, as presunções judiciais utilizadas pelas instâncias, esse controlo fica prejudicado se, para além da prova por presunção, as instâncias tiverem formado, concorrentemente, a sua convicção sobre a realidade do facto relevante por recurso a outra prova submetida à sua liberdade de apreciação, portanto, subtraída ao controlo do tribunal de revista.
A recorrente – e a aderente - sucumbem no recurso. Por força dessa sucumbência, são objectivamente responsáveis pela satisfação da respectivas custas (art.º 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC).
4. Decisão.
Pelos fundamentos expostos:
1. Nega-se a revista.
2. Declara-se prejudicada a apreciação da pretensão da recorrida, TFreitas, Energias, SA, de ampliação do objecto da revista.
Custas pela recorrente e pela aderente ao recurso.
2025.06.17
Henrique Antunes (Relator)
António Domingos Pires Robalo
Maria João Vaz Tomé
_____________________________________________
2. Maria do Patrocínio Baltazar Paz Ferreira, Impugnação Pauliana, Aspectos Gerais do seu Regime, Lisboa, 1987, pág. 40.↩︎
3. Vaz Serra, Responsabilidade patrimonial, BMJ n.º 75, pág. 211.↩︎
4. António Menezes Cordeiro, ROA, Ano 51, 1991, vol. II, pág. 558, Maria Paz Ferreira, Impugnação Pauliana, cit., pág. 38, e Ac.. do STJ de 15.02.2000, CJ, STJ, VIII, I, pág. 91.↩︎
5. Almeida Costa, RLJ Ano 127, pág. 277, e Acs. do STJ de 26.05.1994, 18.05.1999 e 07.11.2000, CJ, STJ, II, II, pág. 114, BMJ n.º 487, pág. 287, CJ, STJ, VIII, III, pág. 102, respectivamente↩︎
6. João Cura Mariano, Impugnação Pauliana, Almedina, Coimbra, 2004, pág. 191.↩︎
7. Em sentido negativo, João Cura Mariano, Impugnação Pauliana, cit., pág. 196 e Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, Direito das Obrigações, vol. II, Almedina, Coimbra, 2002, pág. 299, Almeida Costa, RLJ Ano 127, pág. 274.↩︎
8. Mota Pinto, “Onerosidade e gratuitidade das garantias de dívidas de terceiro na doutrina da falência e da impugnação pauliana”, RDES, Ano XXV, nº 3-4, págs. 236 e 237 e Castro Mendes, Teoria Geral do Direito Civil, Vol. II, Lisboa, AAFDL, 1995, págs. 481 e 482.↩︎
9. Romeu Martins Ribeiro Filho, Impugnação pauliana como meio de conservação da garantia patrimonial, Garantia das Obrigações, Almedina, Coimbra, 2007, págs. 483 e 484.↩︎
10. V.g., Acs. do STJ de 14.07.2023 (19645/18), 03.11.2021 (4096/18), 14.12.2016 (2604/13), 12.07.2018 (701/14) e 12.02.2019 (882/14).↩︎
11. João de Castro Mendes/Miguel Teixeira de Sousa, Manual de Processo Civil, AAFDL, 2022, Vol. II, pág. 111. O dever de examinar criticamente as provas não importa, porém, o dever de expor, na fundamentação da decisão da matéria de facto, o exame crítico de todas as provas produzidas; o que é indispensável é que o juiz indique a sua convicção sobre cada facto e especifique os fundamentos que foram decisivos para tal convicção: Ac. do STJ de 18.04.2024 (7963/21).↩︎
12. Acs. do STJ de 11.02.2016 (907/13), 07.09.2017 (959/09), 21.09.2017 (526/14), 16.12.2020 (4016/13) e 07.06.2022 (61387/18).↩︎
13. João de Castro Mendes/Miguel Teixeira de Sousa, Manual, cit.. pág. 527.↩︎
14. Vaz Serra, Provas, BMJ n.º 110, pág. 190.↩︎
15. Ac. do STJ de 20.22.2016 (2194/13).↩︎
16. João de Castro Mendes/Miguel Teixeira de Sousa, Manual de Processo Civil, cit., Vol. I, pág. 524.↩︎
17. Luís Filipe Pires de Sousa, Prova por Presunção no Direito Civil, Almedina, 2012, pág. 48.↩︎
18. Assim, v.g., os Acs. do STJ de 29.09. 2016 (286/10), 10.01.2017 (841/12), 11.04.2021 (8531/14) e 22.04.2021 (21140/16).↩︎
19. Ac. do STJ de 24.10.2019 (56/14).↩︎
20. João de Castro Mendes, Do Conceito de Prova, 1961, pág. 251. Duvidoso é também saber se a presunção é uma indução ou uma dedução. Sustentando que se trata de prova por indução, cfr. Manuel de Andrade Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra editora, 1976, pág. 215.↩︎
21. Ac. do STJ de 14.07.2016 (377/09) cuja orientação coincide designadamente com a dos acs. de 29.09.2016 (286/10), de 19.01.2017 (841/12), 13.11 2018 (9126/10) e de 28.03. 2019 (56/15).↩︎
22. Acs. do STJ de 17.10.2019 (1703/16), 29.01.2014 (208/06), 14.07.2016 (377/09), 29.09. 2016 (286/10), 24.11. 2016 (96/14) e de 24.11. 2019 (56/14).↩︎
23. Diferentemente, Miguel Teixeira de Sousa, “O controlo das presunções judiciais pelo Supremo Tribunal de Justiça”, in: A revista, n.º 1 — Janeiro / Junho de 2022, págs. 41-56, e “ Presunções judiciais e competência (decisória) do Supremo Tribunal de Justiça” (5 de Setembro de 2014), in: WWW: < https://blogippc.blogspot.com/2014/09/presuncoes-judiciais-e-competencia.html >. No sentido da inadmissibilidade do controlo pelo Supremo sobre a ligação entre os factos-base da presunção e os factos presumidos, José Lebre de Freitas, O ónus do recorrente que impugne a matéria de facto. Controlo pelo STJ do uso de presunções judiciais, disponível em https://portal.oa.pt »ano-68-vol-I » actualidade » José-le… pág. 154.↩︎
24. Ac. do STJ de 11.02.2025 (83/22).↩︎