RECONHECIMENTO DA EXISTÊNCIA DE CONTRATO DE TRABALHO
PLATAFORMA DIGITAL
“ESTAFETA”
PRESUNÇÃO DE CONTRATO DE TRABALHO
CONTRATO DE TRABALHO
Sumário


- No que respeita à relação entre estafeta e plataforma, o conceito de “subordinação” deve ser visto à luz da nova realidade, sendo de relevar a inserção do estafeta na estrutura económica da ré, na estrutura económica da ré, na organização produtiva encarnada pela plataforma, e a inexistência de uma estrutura organizada por parte do “estafeta” e a sua dependência dessa organização, quer quanto ao trabalho, quer económica.
- A ausência de certos indícios tradicionais, como os relativos a horário e assiduidade, não é incompatível com o reconhecimento do vínculo laboral, se o trabalho é desenvolvido no âmbito de uma organização, obedecendo a regras ditadas por esta, em vários aspetos relevantes da relação, designadamente no que respeita ao exercício das tarefas, e dependendo economicamente, ainda que apenas em parte, dos rendimentos auferidos.
- A norma do artigo 12-A do CT, relativa à presunção de contrato de trabalho no âmbito de plataforma digital, é aplicável às relações anteriormente constituídas, relativamente aos factos e situações que se mantenham a 1-5-2023, e com efeitos a partir dessa data.

Texto Integral


Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

O Ministério Público instaurou a presente ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho contra a ré EMP01..., Unipessoal, Ld.ª, pedindo a declaração da existência, desde ../../2021, de um contrato de trabalho sem termo, celebrado entre AA e a ré, na qualidade de trabalhador e entidade empregadora, respetivamente.
Para tanto, alega, em síntese, que a atividade realizada por aquele indicia a existência de subordinação jurídica e económica na relação entre o indicado estafeta e a ré, que gere uma plataforma digital, que fixa determinados aspetos da prestação da atividade: o pagamento é fixado pela plataforma, que determina os seus limites máximos e mínimos, sem negociação prévia; o pagamento é feito com periodicidade regular; definição da área geográfica de entregas; a plataforma é o principal instrumento de trabalho do prestador de atividade.

2. A ré, regularmente citada, apresentou contestação, na qual:
♦ invocou a inconstitucionalidade do processo por violação de direitos, liberdades e garantias da ré e violação dos seus direitos de defesa e a uma tutela jurisdicional efetiva;
♦ invocou a invalidade da participação efetuada pela ACT;
♦ invocou o abuso de direito;
e,
♦ em síntese, impugnou a factualidade articulada na petição inicial, alegando que inexiste qualquer relação de laboralidade com o prestador da atividade, que desenvolve a sua atividade de estafeta de forma autónoma, dado que o local de trabalho é livremente escolhido por este, bem como o respetivo horário, dias de férias, ausências, etc; que tem a possibilidade de se ligar e desligar livremente, de aceitar e recusar ofertas de entregas, sem quaisquer consequências; que o pagamento é variável em função dos serviços efetuados, sem que exista um limite mínimo ou máximo; que o prestador de atividade pode desenvolver serviço para outras entidades, incluindo concorrentes; que se pode fazer substituir por terceiros, etc., o que revela o elevado grau de autonomia do prestador da atividade, não se verificando, assim, quaisquer características de um contrato de trabalho, além de o estafeta não ser pago pela ré, mas pelo parceiro de frota, sendo a ré alheia à relação jurídica estabelecida entre ambos.
Conclui, pedindo a procedência das exceções e questões prévias suscitadas e, sem prescindir, a improcedência da ação.
O Ministério Público respondeu às questões suscitadas pela ré, pugnando pela sua improcedência.
Dado cumprimento ao disposto no artigo 186.º-L, n.º 4, do Código de Processo do Trabalho, AA não interveio nos autos.
A convite do Tribunal, foi suscitado o incidente de intervenção principal provocada de EMP02..., UNIPESSOAL, LD.ª e EMP03..., UNIPESSOAL, LD.ª, cuja intervenção foi admitida e, citadas, não apresentaram contestação.
Foi realizada a audiência de julgamento, decidindo-se:
Prosseguindo os autos, e após realização da audiência de julgamento, veio a proferir-se sentença com o seguinte diapositivo:
“A. ABSOLVER a ré, EMP01..., UNIPESSOAL, LD.ª, do pedido de reconhecimento da existência de um contrato de trabalho sem termo existente entre a ré e AA;
B. ABSOLVER a interveniente principal, EMP02..., UNIPESSOAL, LD.ª, do pedido de reconhecimento da existência de um contrato de trabalho sem termo existente entre a interveniente principal e AA;
C. ABSOLVER a interveniente principal, EMP03..., UNIPESSOAL, LD.ª, do pedido de reconhecimento da existência de um contrato de trabalho sem termo existente entre a interveniente principal e AA. (…)

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Inconformado o MºPº interpôs recurso apresentando as suas conclusões:

“1º. Os factos dados como provados em 2, 8, 11, 13, 13, 14, 15, 16, 18, 22, 23 e 24, por um lado, em 36 e 37, por outro, e finalmente em 10/iv/5, demonstram que AA se achava integrado numa organização produtiva encabeçada pela Ré EMP01... Unipessoal Ltda., que a aí prestava a sua atividade mediante retribuição e que o fazia sob a autoridade daquela.
2º. Tais factos importam a qualificação da relação jurídica existente entre AA e a Ré EMP01... Unipessoal Ltda. logo em face do conceito de contrato de trabalho fornecido pelo artigo 11º do Código de Trabalho, sem necessidade de recurso às presunções dos artigos 12º ou 12º-A do referido diploma.
3º. Não ajuizando a relação sub judice como laboral logo em face desses factos, a Mma. Juiz errou na respetiva qualificação à luz da noção de contrato de trabalho vertida no artigo 11º do Código do Trabalho.
4º. Sem prejuízo disso, devem achar-se por verificados não só os factos presuntivos a que se referem as alíneas e) e f) do nº1 do artigo 12º-A do Código do Trabalho, tal como decidiu a Mma. Juiz, mas ainda aquele a que se refere a alínea d) desse dispositivo, na parte em que se admite que a Ré, através da sua plataforma digital, restrinja a autonomia do estafeta quanto à possibilidade de este se fazer substituir por um terceiro.
5º. O efeito presuntivo desses factos não deve ser ilidido por via do nº4 do artigo 12º-A do Código do Trabalho porque, não obstante a existência de alguns indicadores em contrário, outros há – relacionados com o exercício do poder de direção através da padronização e centralização na ré EMP01... de todo o ciclo produtivo; com a detenção e gestão pela ré do instrumento essencial à atividade que é seu software; com o poder sancionatório evidenciado pela possibilidade de a Ré desligar o estafeta do acesso à App caso este viole as suas obrigações contratuais; com a mera aparência de possibilidade de o estafeta livremente se poder fazer substituir num terceiro; e com a aparência de liberdade negocial evidenciada na necessidade de aceitação automática de contratos de adesão padronizados – que apontam decisivamente no sentido de que a relação jurídica existente entre AA e a Ré EMP01... Unipessoal Ltda. é uma verdadeira e própria relação laboral.
6º. Ao decidir afastar o efeito presuntivo dos factos que deu como provados, a Mma. Juiz não pesou devidamente o valor dos referidos indicadores, os quais, como se disse, deveriam ter conduzido a que a relação jurídica ora em crise fosse qualificada como uma verdadeira relação laboral, nos termos do artigo 11º do Código do Trabalho.
7º. Termos em que, salvo melhor entendimento, se deverá revogar a douta sentença ora em crise e declarar procedente a intentada ação, reconhecendo-se a existência de um contrato de trabalho por tempo indeterminado entre a Ré EMP01... Unipessoal Ltda. e AA e fixando-se a data do seu início em fevereiro de 2021, assim se fazendo a acostumada JUSTIÇA.
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Em contra-alegações a ré sustenta a manutenção do julgado. Refere a não verificação das caraterísticas do artigo 12-a do CT.

A factualidade

A. Da discussão da causa e com relevo para a decisão, resultam provados os seguintes factos:
1. A ré é uma sociedade comercial por quotas que tem como objeto social a prestação de serviços de geração de potenciais clientes a pedido, gestão de pagamentos; catividades relacionadas com a organização e gestão de sites aplicações on-line e plataformas digitais, processamento de pagamentos e outros serviços relacionados com restauração; consultoria, conceção e produção de publicidade e marketing; aquisição de serviços de entrega a parceiros de entrega e venda de serviços de entrega a clientes finais.
2. A ré gere a plataforma da EMP01..., que permite a ligação entre comerciantes (os que fornecem bens e serviços) e clientes (os que adquirem esses bens e serviços), através de serviços de entregas das mercadorias, assegurados por estafetas, sendo tais serviços de entrega geridos e organizados pela ré, designadamente quanto à indicação de locais de
recolha e entrega de mercadorias, recebendo em contrapartida os estafetas um valor por cada entrega.
3. A interveniente principal EMP02... – Unipessoal, Ld.ª tem objeto social: catividades postais e de courier efetuadas em veículos ligeiros até 2500 kg; manutenção e reparação de veículos automóveis; manutenção e reparação de motociclos, ciclomotores, trotinetes, de suas peças e acessórios; aluguer de veículos automóveis ligeiros; aluguer de outras máquinas e equipamentos; comércio de veículos automóveis ligeiros; comércio de peças e acessórios para veículos automóveis; comércio por grosso e a retalho de motociclos, de suas peças e acessórios; aluguer de bens recreativos e desportivos; transporte ocasional de passageiros em veículos ligeiros; organização de catividades de animação turística; outras catividades auxiliares dos transportes terrestres; catividades de serviços de apoio prestados às empresas; restaurantes, restaurantes tipo tradicional; restaurantes com lugares ao balcão; restaurantes sem serviço de mesa; restaurantes típicos; confeção de refeições prontas a levar para casa; fornecimento de refeições para eventos e outras catividades de serviço de refeições; fornecimento de refeições para eventos; catividades de serviço de refeições; estabelecimentos de bebidas, cafés, bares, pastelarias e casas de chá, outros estabelecimentos de bebidas sem espetáculo.
4. A interveniente principal EMP03..., Unipessoal, Ld.ª tem como objeto social: transporte ocasional de passageiros em veículos ligeiros; recolha, tratamento, transporte e distribuição de entregas ao domicílio e serviços de estafetas urbanos; organização de eventos, congressos e outros eventos similares; aluguer (de curta e longa duração) de veículos ligeiros aprovados para o efeito, sem condutor, com ou sem serviços de manutenção; comércio por grosso e a retalho de veículos automóveis ligeiros e pesados, novos ou usados, para transporte de passageiros e mercadorias, mistos e veículos todo-o-terreno e comércio (grosso e a retalho) de motociclos e ciclomotores, suas peças e acessórios e respetiva manutenção e reparação de motociclos e ciclomotores, suas peças e acessórios.
5. No documento denominado «Contrato de Parceiro de Frota», celebrado entre a ré e a interveniente principal, consta, no que ora importa:
i. «Partes: “Parceiro de Frota” é um empresário independente no negócio de Serviços de Entrega; “Estafeta” ou “Parceiro de Entregas” refere-se a um trabalhador independente ou a um trabalhador do Parceiro de Frota que desenvolve a atividade de Serviços de Entrega que tenha celebrado o Contrato de Parceiro de Entregas do Parceiro de Frota; “Serviços de Entrega” refere-se ao ato de entrega de comida ou outros bens que tenham sido pedidos pelos Clientes aos Comerciantes através da App EMP01...; “Cliente” refere-se a qualquer indivíduo que tenha feito uma encomenda de refeição ou outros bens através da App EMP01...;
ii. 1. Geral: a. Como empresa tecnológica, a EMP01... opera uma plataforma que liga com Comerciantes e Clientes, entre outras coisas. Podem ser solicitados serviços de entrega em consequência disso mesmo, serviços que ficam de fora do âmbito do negócio e principais competências da EMP01.... Neste contexto, Você e os Seus Estafetas têm a oportunidade de prestar Serviços de Entrega aos Clientes. Ao concordar com as condições do presente Contrato, está a indicar-nos que tem capacidade para prestar Serviços de Entrega enquanto prestador de serviços;
iii. b. Para prestarem Serviços de Entrega, os Seus Estafetas devem acordar em termos separados para prestarem os Serviços de Entrega em nome do Parceiro de Frota (“Contrato de Parceiro de Entregas do Parceiro de Frota”);
iv. c. Este Contrato rege a prestação da nossa tecnologia e serviços e a utilização dos mesmos por parte do Parceiro de Frota e pelos Seus Estafetas - para que possa prestar Serviços de Entrega como prestador de serviços.
v. d. Ao concordar com o Contrato, a EMP04... fornecerá aos Seus Estafetas que tenham concordado com os Contrato de Parceiro de Entregas do Parceiro de Frota acesso à App EMP01... para os Parceiros de Entregas ("App"), ao nosso software, websites e vários serviços de suporte. Também lhe será fornecido acesso a ferramentas que lhe fornecem informações sobre a utilização da App pelos próprios;
vi. e. Ao utilizar a App, os Seus Estafetas poderão receber propostas da EMP01... para que prestem os Serviços de Entrega aos Clientes em Seu nome;
vii. 2. Serviços de Entrega: Se os Seus Estafetas aceitarem uma proposta de entrega da EMP01... em Seu nome, Você concorda em prestar serviços de entrega a pedido da EMP01... em troca do pagamento da taxa de entrega (conforme definido infra). As propostas de entrega para serviços de entrega podem ser aceites clicando na opção aceitar uma proposta na App. Os Seus Estafetas também podem recusar propostas de serviços de entrega em Seu nome clicando na cruz vermelha na proposta de serviços de entrega na App ou ignorar uma proposta de serviços de entrega. Para que fique claro, não há consequências para propostas recusadas ou ignoradas de Serviços de Entrega;
viii. 3. Estatuto: a. Este Contrato não é um contrato de trabalho, ou uma cedência de trabalhadores, e não cria uma relação de trabalho entre si e nós ou qualquer afiliada da EMP01..., ou os Seus Estafetas e nós, ou qualquer afiliada da EMP01.... Também não cria uma parceria legal, uma joint venture ou lhe dá a autoridade para nos vincular ou manter-se como nosso funcionário, trabalhador, agente, parceiro legal ou representante autorizado.
ix. b. O Parceiro de Frota é responsável pelos termos em que contrata com os Seus Estafetas, incluindo sobre se contrata como trabalhador por conta de outrem ou como trabalhador independente.
x. 4. Utilização da App: a. Iremos criar uma conta de Parceiro de Entregas para que cada um dos Seus Estafetas possa aceder e utilizar, após a aceitação do Contrato de Parceiro de Entregas do Parceiro de Frota. O Parceiro de Frota e os Seus Estafetas deverão manter a conta pessoal. Não podendo ser licenciada, partilhada ou modificada.
xi. b. O Parceiro de Frota compreende e aceita que o Seu Estafeta não tem obrigação de iniciar sessão ou utilizar a App. Eles podem iniciar sessão na App se, quando e onde pretenderem, ou conforme acordado consigo.
xii. c. O Parceiro de Frota e respetivos Estafetas não se encontram sujeitos a nenhuma forma de avaliação e são totalmente livres na forma como executam as suas tarefas.
xiii. d. A EMP01... e/ou a EMP04... não controlam o Parceiro de Frota, nem direcionam o Parceiro de Frota nem os Seus Estafetas, e não podem ser consideradas como controlando ou direcionando o Parceiro de Frota nem os Seus Estafetas, inclusive em conexão com a sua prestação dos Serviços de Entrega, as suas ações ou omissões.
xiv. e. O Parceiro de Frota decide sozinho (concorda com ou gere os Seus Estafetas) se, quando, onde e por quanto tempo pretende que utilizem a App e quando aceitar, recusar ou ignorar qualquer proposta de Serviços de Entrega.
xv. f. Se necessário por motivos de segurança pública, podem existir restrições geográficas sobre onde pode receber propostas de Serviços de Entrega.
xvi. g. Exceto se for acordado de forma diversa entre nós, o Parceiro de Frota é totalmente livre de escolher se contrata ou não com outras empresas para prestar Serviços de Entrega, incluindo concorrentes da EMP01.... O mesmo é aplicável aos Seus Estafetas. O Parceiro de Frota também é totalmente livre de prestar Serviços de Entrega a outros clientes que tenha ou ter a sua própria base de clientes.
xvii. h. Quando os Seus Parceiros de Entrega estiverem registados e online, as propostas de Serviços de Entrega podem aparecer na App.
xviii. i. Você e/ou Seus Estafetas podem decidir livremente a taxa/preço mínimo por quilómetro dos Serviços de Entrega que serão propostos ao usar a App. Você ou os Seus Estafetas podem alterar esta taxa/preço por quilómetro as vezes que desejarem e a qualquer momento, sem comunicação prévia à EMP01... ou autorização da EMP01..., nos termos da cláusula 6.b. infra.
xix. j. Se o Seu Estafeta aceitar uma proposta de Serviços de Entrega, os Comerciantes e Clientes receberão informações sobre a sua identificação, incluindo o Seu primeiro nome, foto, localização e informações sobre o Seu Meio de Transporte, de acordo com a Cláusula 12 (Privacidade);
xx. k. Exceto se o Parceiro de Frota e o Seu Estafeta tiverem acordado de forma diversa, o Estafeta será responsável por escolher a forma mais eficaz e segura de chegar ao destino. Uma vez aceite uma proposta de Serviços de Entrega, os Seus Estafetas ainda podem cancelar.
xxi. l. O Parceiro de Frota e respetivos Estafetas são livres para escolher o sistema de GPS de sua preferência na App (entre ..., ... ou EMP01... GPS) ou para usar qualquer outro sistema de GPS que não seja uma API integrada na aplicação EMP01..., ou não usar um sistema de GPS de forma alguma. Tal permite que o Parceiro de Frota ou os Seus estafetas escolham a rota livremente. Para que fique claro, não há consequências para escolher uma rota livremente.
xxii. m. Se não desejar prestar mais Serviços de Entrega a um Estabelecimento e/ou Cliente, poderá bloqueá-los mediante pedido ao departamento de suporte da Aplicação do Prestador para não receber mais propostas de Serviços de Entrega deles.
xxiii. n. Reconhece que as informações de localização do Seu Estafeta têm de ser fornecidas à EMP01... para prestar Serviços de Entrega. Reconhece e concorda que:
(a) as informações de geolocalização podem ser obtidas pela EMP01... enquanto a App está em funcionamento; e (b) a sua localização aproximada será exibida ao Comerciante e ao Cliente antes e durante a prestação de Serviços de Entrega. Além disso, a EMP01... e as suas afiliadas podem aceder e partilhar com terceiros as informações de localização obtidas pela App para efeitos de proteção, segurança e técnicos. O Parceiro de Frota concorda que diligenciará para assegurar que os Parceiros de Entrega conhecem, compreendem e concordam com a presente disposição.
xxiv. o. O Parceiro de Frota reconhece e concorda que: (a) é o único responsável por tomar as precauções razoáveis e apropriadas (incluindo a manutenção de um seguro adequado que cumpra os requisitos da legislação aplicável) em relação a quaisquer atos ou omissões de um Comerciante, Cliente e/ou terceiros; e (b) o EMP01... ou suas afiliadas podem fornecer suas informações de contato e/ou seguro a um Comerciante e/ou Cliente e/ou terceiro mediante solicitação razoável de tal Comerciante e/ou Cliente e/ou terceiro (por exemplo, em ligação com um acidente).
xxv. 6. Taxa de Entrega: a. O Parceiro de Frota ou os Seus Estafetas podem determinar livremente a sua taxa mínima por quilómetro, indicando na App o limite de taxa por quilómetro abaixo do qual o Parceiro de Frota ou os Seus Estafetas não desejam receber uma proposta de Serviços de Entrega (“Taxa Mínima por Quilómetro”). Ao indicar esse limite, o Parceiro de Frota e os Seus Estafetas receberão apenas propostas de Serviços de Entrega para as quais a tarifa por quilómetro seja igual ou superior à Taxa Mínima por Quilómetro que determinaram.
xxvi. b. Cada proposta de Serviços de Entrega exibida na App ao Seu Estafeta incluirá uma taxa proposta (incluindo qualquer IVA ou outro imposto sobre vendas (a “Taxa de Entrega”), que em caso algum deve considerar uma taxa de quilómetro inferior à sua Taxa Mínima por Quilómetro.
xxvii. c. A tarifa por quilómetro será calculada dividindo o valor da Taxa de Entrega pelo número de quilómetros a serem percorridos desde o ponto de levantamento do pedido até ao ponto de entrega do pedido, que será indicado na proposta de Serviços de Entrega, conforme determinado por serviços baseados na localização.
xxviii. d. A Taxa de Entrega será o resultado da tarifa proposta no momento do receção da proposta de Serviços de Entrega, considerando a respetiva Taxa Mínima por Quilómetro, vezes os quilómetros entre o ponto de levantamento e o ponto de entrega reportados na proposta de Serviços de Entrega (conforme determinado pela EMP01... usando serviços baseados em localização), além de quaisquer incentivos relacionados com deslocações que possam ser aplicáveis em dado momento e/ou local onde o Serviço de Entrega é prestado (o "Cálculo da Taxa de Serviço").
xxix. f. Receberá Taxas de Entrega e gratificações de forma agregada com uma periodicidade pelo menos semanal».
6. No dia 27.09.2023, pelas 19h45, junto ao ponto de recolha do restaurante EMP05... Company, sito na praça ... do Centro Comercial ..., em ..., no âmbito de uma ação inspetiva da Autoridade das Condições para o Trabalho, AA estava a exercer funções de estafeta pela app EMP01....
7. Nessas circunstâncias recebeu uma oferta de entrega, recolheu uma encomenda e colocou-a numa mochila térmica, após o que se ausentou daquele local.
8. AA encontra-se registado na plataforma da app EMP01... desde fevereiro de 2021.
9. Com a adesão à app EMP01..., AA declarou consentir nos termos apostos no documento denominado «Contrato de Parceiro de Entregas de Parceiro de Frota».
10. No documento aludido em 9 consta no que ora importa:
i. Princípios fundamentais: “(…) Você trabalha e/ou presta serviços para uma empresa (não para a EMP01...) para prestar Serviços de Entrega. A EMP01... não está envolvida no acordo celebrado entre si e a empresa (“Empresa de Parceiro de Frota”). O presente Contrato do Parceiro de Entregas do Parceiro de Frota rege o uso da App para a prestação de Serviços de Entrega. Se prestar o Seu consentimento ao presente Contrato de Parceiro de Entregas do Parceiro de Frota, pode usar a App para ter acesso às propostas de Serviço de Entrega da EMP01.... A não que tenha acordado em sentido diverso com a sua Empresa de Parceira de Frota, Você decide se, quando e onde usa a App, a Seu exclusivo critério. Você pode tomar esta decisão unilateralmente e em tempo real, através da seleção de um botão no Seu smartphone. Por uma questão de clareza a EMP01... não submete o Parceiro de Entregas a uma obrigação de exclusividade connosco. Exceto se acordado em sentido diferente com a sua Empresa de Parceiro de Frota, Você decide se pretende ou não aceitar um pedido. O Parceiro de Entregas não está obrigado a usar a App ou a prestar Serviços de Entrega, incluindo no momento em que está ligado à App. O Parceiro de Entregas pode aceitar ou rejeitar qualquer pedido. Se o Parceiro de Entregas aceitar uma proposta, irá prestar o Serviço de Entrega a clientes para a sua Empresa de Parceiro de Frota, o qual é um prestador de serviços da EMP01.... Por favor, leia este Contrato de Parceiro de Entregas do Parceiro de Frota atentamente. O Contrato de Parceiro de Entregas do Parceiro de Frota contém informação sobre a possibilidade de as partes modificarem ou terminarem o mesmo, sobre o modo de proceder se houver algum problema e outra informação importante, incluindo informação sobre seguros e responsabilidade. O Parceiro de Entregas tem o direito de terminar o presente contrato mediante notificação à EMP01..., nos termos aqui descritos.
ii. Partes: “(…) Somos a EMP01..., Unipessoal LDA (…) Em determinados casos, entidades relacionadas da EMP01... (tal como a EMP01... B.V.) irão desempenhar funções relacionadas com o presente Contrato, na qualidade de parte autorizada pela EMP01.... EMP04... B.V. (…) é uma sociedade registada nos termos da lei dos Países Baixos e é parte do presente Contrato para permitir ao Parceiro de Entregas o acesso à App, de forma gratuita. O Parceiro de Entregas Independente é um trabalhador independente no negócio de Serviços de Entrega, que mantém
atualmente uma relação contratual ou laboral com um Parceiro de Frota para prestar Serviços de Entrega (…)“
iii. Definições: “(…) “Parceiro de Entregas Independente” refere-se a um trabalhador independente ou a um trabalhador do Parceiro de Frota que desenvolve a atividade de Serviços de Entrega que tenha celebrado desde Contrato de Parceiro de Entregas do Parceiro de Frota. "Identificação do Parceiro de Entregas Independente" refere-se aos dados de identificação e palavra-passe que permitem ao Parceiro de Entregas usar e aceder à App. "Serviços de Entrega" refere-se ao ato de entrega de comida ou outros itens que tenham sido pedidos pelos Clientes aos Comerciantes através da App EMP01.... "Cliente" refere-se a qualquer indivíduo que tenha feito uma encomenda de refeição ou outros bens através da App EMP01.... (…) “Empresa de Parceiro de Frota” refere-se a um empresário independente ou empresa no negócio da prestação de Serviços de Entrega com quem o Parceiro de Entregas mantém um vínculo contratual ou laboral para prestar os Serviços de Entrega. "Comerciante" refere-se a um negócio cujos produtos (comida ou outros bens) sejam disponibilizados para venda através da App EMP01.... (…) “Meio de Transporte” refere-se a qualquer meio de transporte a ser usado para a prestação dos Serviços de Entrega. “Dados da EMP01...” refere-se a todos os dados relacionados com o acesso e utilização da App, incluindo todos os dados relacionados com os Utilizadores (incluindo a Informação do Utilizador) e todos os dados relacionados com a prestação dos Serviços de Entrega através a App e a Identificação dos Parceiros de Entregas Independentes. "Informação do Utilizador" refere-se a informação relativa a um Cliente ou Comerciante (em conjunto, “Utilizadores”) que seja disponibilizada ao Parceiro de Entregas relacionada com a proposta de Serviços de Entrega, que pode incluir local de recolha, local de entrega, nome ou firma do Utilizador, informação de contacto do Utilizador, assinatura do Utilizador e fotografia do Utilizador, assim como quaisquer outros detalhes específicos dos itens a ser entregues. (…)“;
iv. Termos:
1. Geral “(…) a. Como empresa tecnológica, a EMP01... opera uma plataforma que liga com Comerciantes e Clientes, entre outras coisas. Podem ser solicitados serviços de entrega em consequência disso mesmo, serviços que ficam fora do âmbito do negócio e principais competências da EMP01.... Ao assinar este Contrato, está a indicar-nos que tem capacidade para prestar Serviços de Entrega. b. A sua Empresa de Parceiro de Frota acordou separar os contratos para o Parceiro de Entregas e o Parceiro de Frotas acederem à App EMP01... e prestarem Serviços de Entrega (“Contrato de Parceiro de Entregas do Parceiro de Frota” ou “Contrato”). c. Este Contrato rege a prestação da nossa tecnologia e serviços e a sua utilização dos mesmos para a prestação de Serviços de Entrega para a sua Empresa de Parceiro de Frota. d. Ao concordar com o Contrato, a EMP04... fornecer-lhe-á acesso à EMP01... App ("App"), ao nosso software, websites e vários serviços de suporte. e. Ao utilizar a App, poderá receber propostas efetuadas por Clientes dos Comerciantes da EMP01... para que possa prestar os Serviços de Entrega aos Clientes em nome da sua Empresa de Parceiro de Frota. f. Este Contrato rege exclusivamente o uso da App EMP01... e não cobre a prestação de qualquer outro serviço através de aplicações de afiliados da EMP01... (como o fornecimento de transporte de passageiros) (…)”;
2.Serviços de entregas “(…) Você pode aceitar uma proposta de Serviços de Entrega selecionando a opção de aceitar uma proposta na App. Pode também recusar uma proposta de Serviços de Entrega selecionando a cruz vermelha na proposta de Serviços de Entrega na App ou ignorar uma proposta de Serviços de Entrega. Para que fique claro, não há consequências caso recuse ou ignore proposta de Serviços de Entrega. (…)”;
3. Estatuto “(…). a. Este Contrato de Parceiro de Entregas do Parceiro de Frota não é um contrato de trabalho, ou uma cedência de trabalhadores, e não cria uma relação de trabalho entre si e nós ou qualquer afiliada da EMP01.... Também não cria uma parceria legal, uma joint venture ou lhe dá a autoridade para nos vincular ou manter-se como nosso trabalhador, prestador de serviços, agente, parceiro legal ou representante autorizado. b. Ao aceitar este Contrato de Parceiro de Entregas de Parceiro de Negócio o Parceiro de Entregas aceita que a EMP01... não tem qualquer intervenção na relação contratual entre si e a sua Empresa de Parceiro de Frota. (…)”;
4. Utilização da app “(…) a. O Parceiro de Entregas aceita e compreende que: i. A EMP01... não controla, nem direciona a sua utilização da App;
ii. A EMP01... e/ou a EMP04... não controlam, nem direcionam o Parceiro de Entregas e não podem ser consideradas como controlando ou direcionando o Parceiro de Entregas, inclusive em conexão com a sua prestação dos Serviços de Entrega, as suas ações ou omissões, ou a sua operação e manutenção do Seu Meio de Transporte. b. Não obstante ser livre de acordar em sentido diverso com a sua Empresa de Parceiro de Frota, o Parceiro de Entregas aceita e reconhece que: i. O Parceiro de Entregas não tem obrigação de iniciar sessão ou utilizar a App. O Parceiro de Entregas pode iniciar sessão na App Parceiro de Entregas se, quando e onde pretender. ii. O Parceiro de Entregas não está sujeito a nenhuma forma de avaliação e é totalmente livre na forma como executa as suas tarefas. iii. O Parceiro de Entregas decide sozinho se, quando, onde e por quanto tempo pretende utilizar a App e quando aceitar, recusar ou ignorar qualquer proposta de Serviços de Entrega. iv. O Parceiro de Entregas é totalmente livre de escolher se contrata ou não com ou outras empresas para prestar Serviços de Entrega, incluindo concorrentes da EMP01.... Isto inclui fazê-lo ao mesmo tempo do que quando está a usar a App (conhecida como'multi-apping'). Também é totalmente livre de prestar Serviços de Entrega aos Seus próprios clientes e ter a sua própria base de clientes. c. Se tal for exigido por questões de segurança pública, poderão existir restrições geográficas sobre onde pode receber propostas de Serviços de Entrega. d. Quando estiver registado e online, as propostas de Serviços de Entrega podem aparecer na App. e. O Parceiro de Entregas pode decidir livremente a taxa/preço mínimo por quilómetro dos Serviços de Entrega que lhe são propostos. Pode alterar esta tarifa/preço por quilómetro as vezes que desejar e a qualquer momento, sem comunicação prévia à EMP01... ou autorização da EMP01..., nos termos da cláusula 6.c. infra. f. Se aceitar uma proposta de Serviços de Entrega, os Comerciantes e Clientes receberão informações sobre a sua identificação, incluindo o Seu primeiro nome, foto, localização e informações sobre o Seu Meio de Transporte, de acordo com a Cláusula 10 (Privacidade). g. O Parceiro de Entregas da será responsável por escolher a forma mais eficaz e segura de chegar ao destino. Uma vez aceite uma proposta de Serviços de Entrega, ainda pode cancelar. h. O Parceiro de Entregas é livre para escolher o sistema de GPS da sua preferência na App (entre ..., ... ou EMP01... GPS) ou usar qualquer outro sistema de GPS que não seja API integrado na App da EMP01..., ou não usar nenhum sistema de GPS. Tal permite que o Parceiro de Entregas escolha a sua rota livremente. Para que fique claro, não há consequências por escolher uma rota livremente. i. Se o Parceiro de Entregas não desejar continuar a prestar Serviços de Entrega a um Comerciante e/ou Cliente, poderá bloqueá-los mediante pedido ao departamento de suporte da App para não receber mais propostas de Serviços de Entrega dos mesmos. j. Reconhece que as suas informações de localização têm de ser fornecidas à EMP01... para prestar Serviços de Entrega. Reconhece e concorda que: (a) as suas informações de localização podem ser obtidas pela EMP01... enquanto a App está em execução; e (b) a sua localização aproximada será exibida ao Comerciante e ao Cliente antes e durante a prestação de Serviços de Entrega. Além disso, a EMP01... e as suas afiliadas podem aceder e partilhar com terceiros as informações de localização obtidas pela App para efeitos de proteção, segurança e técnicos. (…)”;
5. As suas obrigações “(…) a. Por forma a manter o acesso à App, deve (i) manter todas as licenças, permissões, autorizações alvarás ou outros títulos habilitantes, necessários para a prestação de Serviços de Entrega, e (ii) cumprir com todos os requisitos legais. b. Adicionalmente a qualquer obrigação exigível à sua Empresa de Parceiro de Frota, Você aceita completar todos os passos para o processo de registo (incluindo a prestação de toda a documentação exigida e verificações de idoneidade, quando exigível) para poder aceder à App. c. Deve cumprir e atingir os requisitos dos presentes Termos. Se deixar de cumprir ou atingir os requisitos destes Termos, a EMP01... reserva o direito, a qualquer momento restringir por qualquer forma o Seu acesso à App se não cumprir os deveres constantes destes Contrato. Se a EMP01... restringir o Seu acesso à App, serão aplicadas as Cláusulas 9 e 14 do presente Contrato d. Deve ter todos os equipamentos, ferramentas e outros materiais necessários (por conta própria ou por conta da Empresa de Parceiro de Frota). . e. Ao utilizar a App para prestar Serviços de Entregas, compromete-se a cumprir com todas as leis e regulamentos aplicáveis, assim como os costumes locais e as boas práticas, incluindo as relativas a segurança rodoviária e higiene, segurança alimentar e regulamentos de entrega de bebidas alcoólicas. f. Quando opte por usar a App, fá-lo-á de boa fé, fará uma boa utilização e abster-se-á de tentar defraudar a EMP01..., os Comerciantes, outros parceiros de entregas independentes e os Clientes. g. Não lhe é exigida a utilização de roupa ou sacos com a marca da EMP01... para prestar Serviços de Entrega. É livre para escolher o equipamento necessário para o Seu negócio, incluindo o uso de equipamentos de marcas concorrentes da EMP01..., quando apropriado. h. Deve apenas usar o Meio de Transporte identificado na sua conta. Para a prestação de Serviços de Entrega. O Meio de Transporte identificado deve ser adequado para utilização no âmbito da App (tal como determinado a cada momento). Quando aplicável, o Meio de Transporte identificado deve cumprir com a legislação aplicável do Território. i. Deverá entregar-nos toda a informação por nós exigida (incluindo renovações) que demonstre a observância do exposto acima, antes e durante o período de utilização da App, de forma a permitir-nos rever qualquer um desses documentos a qualquer momento e de forma contínua. j. Quaisquer taxas, impostos e contribuições à segurança social suportados em resultado da prestação de Serviços de Entrega serão da sua responsabilidade. k. A EMP01... compromete-se a reembolsar a sua Empresa de Parceiro de Frota de Portagens suportadas no decurso da prestação de Serviços de Entrega. l. Deverá ter em vigor durante todo o período de utilização da App todas as apólices de seguro obrigatórias aplicáveis ao Meio de Transporte que usa durante o período de vigência deste Contrato, ou outros seguros legalmente exigidos, com o nível de cobertura exigido por lei. m. Se aceitar uma proposta de Serviço de Entrega, ser-lhe-ão facultadas Informações do Utilizador ou instruções de Utilizador e informações dos Comerciantes ou instruções dos Comerciantes disponibilizados à EMP01... através da App,. Devido aos regulamentos em matéria de proteção de dados, compromete-se a não contactar qualquer Utilizador, ou por qualquer forma usar a informação relativa a qualquer Utilizador, para qualquer fim que não seja a prestação de Serviços de Entrega. n. Vai receber uma identificação de Parceiro de Entregas que permite o acesso a e uso da App de acordo com este Contrato. Deve manter essa identificação de Parceiro de Entregas confidencial e não a partilhar com terceiros não autorizados. Deve notificar a EMP01... de qualquer violação, divulgação ou uso indevido da sua identificação de Parceiro de Entregas ou da App. o. O Parceiro de Entregas é livre para substituir a sua atividade, o que significa que pode decidir livremente e chegar a acordo com outro Parceiro de Entrega Independente com uma conta ativa na App para que este último realize serviços de entrega em Seu interesse e sob o Seu controlo e responsabilidade. p. O Parceiro de Entregas cumprirá a lei aplicável em relação à sua situação fiscal e junto da Segurança Social. O Parceiro de Entregas é responsável por preencher e atualizar as suas informações fiscais. q. O Parceiro de Entregas é responsável pelos Seus próprios impostos, inclusive em sua própria declaração de imposto sobre rendimentos. r. Ao usar a App, deve cumprir este Contrato e todas as leis aplicáveis (…)”;
6. Taxa de entrega “(…) a. Quaisquer pagamentos associados à prestação de Serviços de Entrega serão efetuados pela sua Empresa de Parceiro de Frota. b. O Parceiro de Entregas reconhece e aceita que nós não temos qualquer intervenção nos pagamentos que lhe sejam efetuados pela sua Empresa de Parceiro de Frota, que são efetuados com base na relação contratual ou laboral existente entre si e a sua Empresa de Parceiro de Frota. c. Independentemente do acima exposto, o Parceiro de Entregas pode determinar livremente (ou apenas limitado ao acordo privado celebrado com a sua Empresa de Parceiro de Frota) determinar a sua taxa mínima por quilómetro, indicando na App o limite da taxa por quilómetro abaixo da qual o Parceiro de Entregas não deseja receber uma proposta de entrega Serviços (“Taxa Mínima por Quilómetro”). Ao indicar este limite, o Parceiro de Entregas receberá apenas propostas de Serviços de Entrega para as quais a taxa por quilómetro seja igual ou superior à Taxa Mínima por Quilómetro que o Parceiro de Entregas determinou. d. Cada proposta de Serviços de Entrega apresentada ao Parceiro de Entregas na App incluirá uma tarifa proposta (incluindo IVA ou outro imposto sobre vendas), que em nenhum caso deve considerar uma taxa por quilómetro inferior à sua Taxa Mínima por Quilómetro. e. A taxa por quilómetro será calculada dividindo o valor da Taxa de Entrega pelo número de quilómetros a serem percorridas desde o ponto de retirada do pedido até ao ponto de entrega do pedido, que será indicado na proposta de Serviços de Entrega, conforme determinado por serviços baseados em localização. f. Caso (i) haja evidências comprovadas de que o Parceiro de Entregas cometeu fraude; (ii) o Parceiro de Entregas cancelou um pedido após este ter sido aceite e, portanto, o Serviço de Entrega não foi prestado, a EMP01... tem o direito de reduzir a taxa de entrega. A decisão da EMP01... de reduzir ou cancelar a Taxa de Entrega desta forma, deve ser exercida de maneira razoável e com base em razões objetivas (…);
7. Dispositivo “(…) O Parceiro de Entregas deve usar o Seu próprio dispositivo para aceder à App. Sujeito às condições deste Contrato, a EMP04... concede uma licença pessoal, não exclusiva, intransmissível, revogável, sem a faculdade de sub-licenciar, para instalar a App no Seu dispositivo apenas para a finalidade de prestar os Serviços de Entrega. A EMP04... concede esta licença gratuitamente. Esta licença cessa com a resolução deste Contrato. Não pode partilhar o Seu dispositivo ou as credenciais da sua conta da EMP01... com ninguém.
(…)”;
9. Acesso à App “(…) a. O Parceiro de Entregas não tem qualquer obrigação de usar a App. Se optar por parar de usar a aplicação pode fazê-lo sem necessidade de nos notificar. b. No caso de uma alegada violação das obrigações da sua Empresa de Parceiro de Frota, ou das suas obrigações (Cláusula 5, supra), incluindo quando recebemos uma reclamação de segurança ou potencial incumprimento das leis e regulamentos aplicáveis, bem como dos costumes locais e boas práticas, ou sempre que necessário para a proteção de terceiros, ou cumprimento da legislação aplicável, ou decorrente de ordem judicial ou administrativa, temos o direito de restringir o Seu acesso à, e utilização da App. Se o fizermos, será notificado por escrito das razões para tal restrição. Podem existir circunstâncias em que não lhe poderemos facultar informação sobre denúncias no decurso de uma investigação (quer seja uma investigação nossa ou de terceiros, como as autoridades policiais).
(…)”;
13. Seguros
“(…) a. Antes de iniciar e durante a relação comercial com a EMP01..., o Parceiro de Entregas e/ou a sua Empresa de Parceiro de Frota comprometem-se a obter e manter em vigor uma apólice de seguro obrigatório para a prestação dos Serviços de Entrega no Território. b. Dependendo do Meio de Transporte por si escolhido, os seguros obrigatórios incluem um seguro automóvel contra riscos de danos corporais e materiais, próprios e de terceiros, em níveis de cobertura que satisfazem os requisitos mínimos para operar o veículo automóvel usado na prestação de Serviços de Entrega na via pública do Território. c. O Parceiro de Entregas e/ou a sua Empresa de Parceiro de Frota aceitam fornecer uma cópia da apólice de seguro, declarações do seguro, vinheta do seguro, e prova de pagamento do prémio de seguro sempre que solicitado. Adicionalmente, deve avisar a EMP01..., com a antecedência mínima de 30 (trinta) dias, do cancelamento de qualquer apólice de seguro exigida pela EMP01.... Nos termos exigidos pela Lei Portuguesa, deve ser a pessoa nomeada na apólice ou o condutor designado, em relação ao qual o prémio é cobrado, em qualquer apólice por nós exigida e a todo o tempo. d. O Parceiro de Entregas e/ou a sua Empresa de Parceiro de Frota aceitam manter, durante toda a vigência deste Contrato, seguro obrigatório de acidentes profissionais, nos termos exigidos pela lei do Território. Na medida em que o Parceiro de Entregas e/ou a sua Empresa de Parceiro de Frota cumpram com a legislação aplicável em matéria de Segurança Social, você estará protegido contra doenças profissionais. O Parceiro de Entregas e/ou a sua Empresa de Parceiro de Frota podem também, quando permitido por lei, optar por segurar-se contra acidentes pessoais. Adicionalmente, se permitido por lei, o Parceiro de Entregas e/ou a sua Empresa de Parceiro de Frota podem decidir não fazer seguro contra acidentes profissionais ou pessoais, mas nesse caso fá-lo-ão por sua conta e risco. e. O Parceiro de Entregas e/ou a sua Empresa de Parceiro de Frota compreendem e aceitam que o Seu seguro veículo pode não cobrir de forma completa os riscos de colisão, despesas médicas, danos próprios ou de terceiros, danos contra pessoas não seguradas ou outras coberturas relevantes para a prestação dos Serviços de Entrega prestados nos termos deste Contrato. Se tem dúvidas ou alguma preocupação relativa ao âmbito ou aplicabilidade da sua apólice de Seguro, é sua responsabilidade, e não da EMP01..., esclarecer essas dúvidas junto da sua companhia de seguros. f. O Parceiro de Entregas e/ou a sua Empresa de Parceiro de Frota podem também optar, se permitido por lei, segurar-se contra risco de responsabilidade civil por danos causados à EMP01..., Comerciante ou Clientes na prestação de Serviços de Entrega. Adicionalmente, se permitido por lei, o Parceiro de Entregas e/ou a sua Empresa de Parceiro de Frota podem não optar por não se segurar contra os riscos de responsabilidade civil, mas nesse caso fá-lo-ão por sua conta e risco. g. A EMP01... mantém um seguro relacionado com a prestação de Serviços de Entrega pelo Parceiro de Entregas, tal como venha a determinar em Seu próprio juízo razoável. Caso a EMP01... venha a contratar um seguro relativo à sua prestação de Serviços de Entrega, a EMP01... pode alterar os termos, ou cancelar, essa apólice, por sua única e exclusiva determinação e a qualquer momento. Se a EMP01... adquirir um seguro relacionado com a prestação de Serviços de Entrega por parte do Parceiro de Entregas e este desejar receber tal seguro, deverá cumprir os termos e condições aplicáveis ao mesmo. Se a EMP01... adquirir um seguro em conexão com a sua prestação de Serviços de Entrega, a EMP01..., a EMP04... e/ou as suas afiliadas não serão responsáveis, seja de que forma for, se o seguro recusar pagar por qualquer perda (…).
11. Para ter acesso às propostas de entregas através da app EMP01..., AA teve que instalar a app EMP01... no seu telemóvel, fazer um registo no website da ré, fornecer o seu endereço de correio eletrónico e criar uma conta.
12. Para ter acesso às ofertas de entregas disponibilizadas pela ré AA necessita ter a app EMP01... instalada no seu telemóvel.
13. Através da app EMP01..., AA recebe toda a informação relacionada com a oferta de serviços de entrega, valor a receber pela prestação do serviço, destinatário do produto e local de entrega.
14. Mediante a proposta de uma entrega efetuada pela app EMP01..., AA pode aceitar ou recusar tal pedido, podendo ainda recusar uma entrega após a ter aceite.
15. Os valores de referência a serem utilizados para o cálculo da contrapartida a pagar a AA pelos serviços de entrega estão pré-estabelecidos na app EMP01..., mas aquele pode definir o valor da taxa mínima por quilómetro para realizar entregas, que pode ser ajustada a qualquer momento por aquele.
16. AA tem acesso na app EMP01... às propostas de entrega por valores inferiores ao montante de taxa mínima por quilómetro que definiu, e pode decidir aceitá-las ou rejeitá-las.
17. AA recebe uma quantia variável por cada entrega e o valor a receber não depende do tempo de demora na sua realização ou do tempo de ligação à app EMP01....
18. Através da app EMP01..., AA:
i. recebe toda a informação relacionada com a oferta do serviço de entrega, remuneração a receber pela prestação do serviço, destinatário da entrega e local da entrega;
ii. acede ao histórico das entregas que fez por dia, semana e mês e quanto irá receber pelos serviços prestados.
19. AA desempenha as funções de estafeta, de recolha e entrega de bens e refeições, na zona de ....
20. AA pode:
i. decidir o local onde presta a sua atividade, desde que se trate de uma zona coberta pela app EMP01..., sendo livre de alterar a sua zona de atividade;
ii. escolher o local onde deve estar para receber propostas de entregas;
iii. aceitar ou recusar as propostas de entrega indicadas pela app EMP01...;
iv. bloquear comerciantes ou clientes com quem não deseje contactar;
v. decidir quais os dias e o horário de prestação de atividade, se fica inativo por alguns períodos, sem imposição de período mínimo ou máximo, nem horários pré-estabelecidos ou a turnos, nem indicação prévia dos seus horários, bastando para o efeito colocar-se online na app EMP01..., tendo um modelo de sessão livre, sem necessidade de reserva de turnos, ou de indicação de horários em que preferem prestar a atividade.
21. AA pode realizar entregas disponibilizadas por plataformas geridas por outras entidades que não a ré ou efetuar entregas diretamente por sua conta, sem necessidade de comunicação à ré.
22. A app EMP01... permite o acompanhamento do trajeto desenvolvido pelos estafetas entre a recolha e entrega, quer pela ré, quer pelo cliente.
23. A app EMP01... dispõe de um sistema integrado de navegação que pode não ser utilizado pelo estafeta, se este preferir usar outro sistema de navegação (v.g. .../.../sistema de navegação próprio do veículo), ou se não necessitar dessa ajuda.
24. O GPS permite:
i. apresentar propostas de entrega aos estafetas que estão mais bem posicionados para recolher a encomenda e entregá-las no melhor tempo possível;
ii. ajudar os estafetas a encontrar a rota mais eficiente até ao ponto de entrega;
iii. aos clientes consultarem onde se encontram as suas encomendas e poderem prever o tempo de entrega.
25. AA é livre de escolher as suas rotas para realizar as entregas e o respetivo sistema de navegação, se dele necessitar.
26. Inexistem penalizações pelo modo como AA realiza as suas entregas.
27. AA escolhe a roupa com que se apresenta nas entregas.
28. A ré não efetua a avaliação da qualidade da atividade de AA.
29. Para validar o seu registo na app EMP01... e incluí-los na oferta de entregas, a ré não efetua um escrutínio sobre a experiência e qualificações académicas, ou ausência delas, bem como sobre as características pessoais e técnicas dos estafetas.
30. AA pode substituir-se por outra pessoa na realização de entregas, desde que o terceiro tenha conta ativa na app EMP01..., sem necessidade de autorização da ré.
31. Para realizar as suas entregas AA utiliza o seu veículo, o seu telemóvel e uma mochila que adquiriu.
32. A mochila utilizada por AA é escolhida por este e não tem que ter o logotipo da ré, nem ser adquirida nesta, podendo ser utilizada uma mochila de qualquer marca.
33. A imposição de utilização de mochila, que não é necessário dispor do logotipo da ré, deve-se à necessidade de serem adotadas boas práticas de higiene e segurança alimentar, para além de permitirem que o estafeta passa transportar os produtos no veículo utilizado, que poderá ser uma bicicleta ou uma mota.
34. AA não exerceu qualquer função de chefia na ré.
35. AA desenvolve a sua atividade como estafeta na plataforma através de um parceiro de frota de identidade não apurada.
36. A ré paga ao parceiro de frota a taxa de entrega.
37. AA é pago pelo parceiro de frota pelas entregas que realiza.
38. A ré desconhece qual o valor que o parceiro de frota paga a AA.
39. Desde ../../2020 a ../../2023, AA manteve atividade aberta como empresário em nome individual.”
*
E foram considerados como factos não provados:
“i. A área de atuação de AA é definida pela ré ou pela interveniente principal.
ii. AA não informou a ré do montante mínimo pelo qual aceita receber propostas pelos serviços de entrega.
iii. As ofertas de entrega que AA recebe na app EMP01... já vêm com um valor fixo.
iv. É a ré quem paga, semanalmente e por transferência bancária, a AA os serviços de entrega que recebeu e efetuou pela app EMP01....
v. AA tem, na atividade associada à app EMP01... ou da interveniente principal, a sua única fonte de rendimento.
vi. AA encontra-se inscrito na app EMP01... desde ../../2021.
vii. As intervenientes principais são os parceiros de frota para os quais AA desenvolve a sua atividade.”
***
O Direito.

A questão colocada prende-se com saber se a relação contratual existente entre o estafeta indicado e a ré é de natureza laboral. Importa ainda verificar se ocorre a presunção estabelecida no CT.
A propósito da presunção do artigo 12º do CT, doutrina que é aplicável ao artº 12-A, consolidou-se jurisprudência no sentido de que tais presunções não têm aplicação a relações laborais anteriormente fixadas, a menos que resulte da factualidade que em data posterior à entrada em vigor da norma, tenham ocorrido alterações essenciais nos termos da relação – Por todas, STJ de 4-7-2018, processo nº 1272/16.4T8SNT.L1.S1.
Conquanto o entendimento possa ser questionado, já que a norma não altera a natureza e caraterísticas do que seja relação laboral, como se defendeu nesta relação, Ac. de 14-5-2015, processo nº 995/12.1TTVCT.G1, a propósito embora do artigo 12º do CT; temos aceitado tal entendimento.
No caso concreto, impõe-se repensar o entendimento. Na diretiva (UE) 2024/2831 Do Parlamento Europeu e do conselho, de 23 de outubro de 2024 relativa à melhoria das condições de trabalho em plataformas digitais, o artigo 5ª reporta-se à presunção legal de laboralidade, referindo-se no considerando 33 a propósito desta:
Por razões de segurança jurídica, a presunção legal não deverá produzir efeitos jurídicos retroativos, devendo, por conseguinte, aplicar-se apenas ao período com início em 2 de dezembro de 2026, inclusive para as relações contratuais concluídas anteriormente e ainda vigentes nessa data. Por conseguinte, as reclamações relativas à eventual existência de uma relação de trabalho anterior a essa data, bem como os direitos e obrigações decorrentes da relação até essa data, deverão ser apreciadas unicamente com base no direito da União e nacional aplicável antes dessa data, incluindo a Diretiva (UE) 2019/1152.
O prazo de transposição termina a 2-12-2026, após o qual e de acordo com o principio da interpretação conforme, aquele entendimento se imporá, por força da diretiva, nº 6 do artigo 5ª (no que diz respeito às relações contratuais que entraram em vigor antes de 2 de dezembro de 2026 e que estejam ainda em vigor nessa data, a presunção legal prevista no presente artigo só é aplicável ao período iniciado a partir dessa data) e considerando referido.
Veja-se, no entanto, o Ac TJ de 18-12-1997, Inter-Environnement Wallonie ASBL, Processo C-129/96, ECLI:EU:C:1997:628, que, conquanto em matéria diversa, refere, “que, durante o prazo de transposição fixado pela diretiva para a sua execução, o Estado-Membro destinatário se abstenha de adotar disposições suscetíveis de comprometer seriamente a realização do resultado nela prescrito.” Não vemos razões para não adotar desse já o referido entendimento, aplicando o raciocínio à norma do artigo 12-A do CT.
Consequentemente e a partir da data da entrada em vigor desta norma do CT, a mesma é aplicável a relações anteriormente constituídas, que respeitem a contratos com “plataforma digital”, embora para o período posterior.
Veja-se o recente Ac. STJ de 15.5.2025, processo nº 1980/23.3T8CTB.C2.S1.
Sem embargo, o período anterior pode ser analisado à luz do critério indiciário.
*
Vejamos quanto à natureza da relação:
A qualificação de uma relação como de contrato de trabalho não depende tanto do nome atribuído pelas partes, mas sim da sua efetiva realidade. Importa mais o modo como a relação de desenvolve, do que o que as partes nominaram.
Vejam-se os termos do nº 2 do artigo 4º da Diretiva (UE) 2024/2831 Do Parlamento Europeu e do Conselho:
“A determinação da existência de uma relação de trabalho deve basear-se primeiramente nos factos relativos à execução efetiva do trabalho, nomeadamente a utilização de sistemas automatizados de monitorização ou sistemas automatizados de tomada de decisões na organização do trabalho em plataformas digitais, independentemente da forma como a relação é designada em qualquer acordo contratual que possa ter sido concluído entre as partes envolvidas.”
A propósito do contrato de trabalho refere o artigo 11º do CT:
Noção de contrato de trabalho
Contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa singular se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua atividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e sob a autoridade destas.

O Artigo 10º do CT 2003 dispunha:
Noção
Contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua atividade a outra ou outras pessoas, sob a autoridade e direção destas.
E referia o artigo 12.º do CT 2003:
Presunção
Presume-se que existe um contrato de trabalho sempre que o prestador esteja na dependência e inserido na estrutura organizativa do beneficiário da atividade e realize a sua prestação sob as ordens, direção e fiscalização deste, mediante retribuição.
Esta norma apresenta alguma imperfeição, pois que estabelece como factos indicadores da presunção aqueles mesmos que caraterizam o contrato de trabalho, ou seja, declara como presumido o que já está demonstrado.
 O que importa ora é deixar referenciada a evolução a que se procedeu, pois, conquanto se entenda que uma das caraterísticas mais marcantes da relação laboral, que a distingue de outras figuras, como o contrato de prestação de serviços, é a subordinação jurídica do trabalhador em relação ao empregador; deslocou-se a pedra angular do conceito, desta subordinação para a “inserção no âmbito de uma organização e desenvolvimento da atividade sob autoridade dessa ou dessas organizações”.
A tal mudança não foi estranha a constatação das cada vez mais subtis formas de subordinação jurídica.
No artigo 12º do novo código, visando facilitar a prova da existência de uma relação laboral, estabelecerem-se factos-índice, provados os quais – pelo menos dois seguindo entendimento maioritário -, se presume a existência do contrato de trabalho.
Importa, no entanto, ter em linha de conta que não é pelo preenchimento dos factos índice que se prova o contrato, a norma visa antes estabelecer uma presunção, que dispensa o trabalhador do ónus de demonstrar a existência do contrato. Pode ocorrer não ser necessário socorrermo-nos do citado normativo.
Dito de outro modo, como refere Monteiro Fernandes, Uma jurisprudência consolidada : a presunção de laboralidade, http://hdl.handle.net/11067/5501, “assim, como qualquer presunção legal, ela não é utilizável para se atingir imediatamente essa qualificação jurídica, a partir dos dados de facto apurados.”
O artigo 12º prescreve os seguintes factos índice:
a) A atividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado;
b) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da atividade;
c) O prestador de atividade observe horas de início e de termo da prestação, determinadas pelo beneficiário da mesma;
d) Seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador de atividade, como contrapartida da mesma”
Resulta patente que estes factos-índice, sobretudo se interpretados mais junto à letra, se mostram ineficientes para responder aos desafios que as novas relações de trabalho decorrentes da “revolução digital” demandam.
A propósito o Ac. RG de 3-10-2024, processo nº 2838.23.1VRL.G1, referindo:
O caso de que nos ocupamos remete-nos para temáticas atuais, relacionadas com a revolução digital, a inteligência artificial, a automação, em especial a atividade prestada em plataforma digital, as quais transformaram o mercado e as relações de trabalho.
Áreas essas em que se vem identificando novas realidades na forma de prestar e organizar o trabalho e sinalizando a necessidade de uma abordagem diferente da tradicional ligada a um mundo em que prevalecia a fábrica, a loja, outros lugares físicos, o horário de trabalho, o equipamento físico de trabalho, as ordens evidentes e explicitas, a proximidade no relacionamento interpessoal, etc.
Exemplo desse alerta foi deixado pelo Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho 2021[https://www.portugal.gov.pt], que, contou, entre mais, com a colaboração de académicos e pensadores, ali se entrevendo importantes linhas de reflexão, mormente a ideia de que a ausência de certos indícios tradicionais não é incompatível com a existência de um contrato de trabalho. Aponta-se, ali, ainda, o objetivo de combater a dissimulação ilícita de relação de trabalho.”
*
Para a qualificação do contrato tem-se recorrido a indícios dos quais possa concluir-se pela existência de um contrato de trabalho. Os índices devem ser apreciados no seu todo, -Vd. STJ de 9/12/2000, processo nº 1155/07.9TTBRG.P1.S1, www.dgsi.pt, sopesando o peso relativo de cada um e o seu número, o modo como se articulam em concreto, surpreendendo o que é marcante na relação, independentemente de uma aparência artificialmente criada.
Como se refere no ac., desta relação de 3/10/2024, processo nº 2838/23.1T8VRL.G1, de que se transcreve o seguinte:
“para facilitar a tarefa de qualificação, pela jurisprudência foi sendo utilizado o denominado “método indiciário”, inventariando-se uma grelha de indícios. Entre eles: a realização da atividade em local determinado pelo empregador; a observância de horário de trabalho; o fornecimento dos instrumentos de trabalho pelo empregador; a exclusividade do trabalhador e o dever de não concorrência; a pessoalidade no relacionamento, que obsta a que trabalhador se faça substituir por um terceiro; a remuneração regular e certa; a emissão de ordens e instruções; o grau de inserção da estrutura organizativa decorrente da observância de instruções na prestação da atividade e regras de conduta; a sujeição a sanções; e outros indicadores secundários como a dependência económica, regime fiscal e de segurança social que o prestador da atividade observa.
Será, porém, de notar que, ainda antes da era do trabalho digital, a jurisprudência e doutrina já sublinhavam que o peso e a relevância dos indícios variavam em função do tipo de atividade exercida, podendo ser sopesados de maneira diferente em situações que, por díspares que eram, assim justificavam tratamento diferenciado. Em atividades do sector industrial poderão ter peso determinante as instalações da fábrica, a maquinaria, a matéria-prima e até a observância de horário no local para onde todos se dirigem, mas já o mesmo não sucederá em atividades do sector terciário, mormente em serviços de gestão, de informática, de consultadoria, de tradução, de limpeza, de vigilância, etc...”
*
Vejamos da verificação quanto a alguns indícios, á luz desta nova realidade:
Remuneração:
Resulta da factualidade que os valores de referência a serem utilizados para o cálculo da contrapartida a pagar ao estafeta pelos serviços de entrega estão pré-estabelecidos na app EMP01..., podendo, contudo, aquele definir o valor da taxa mínima por quilómetro para realizar entregas, que pode ser ajustada a qualquer momento por aquele. O estafeta tem acesso na app EMP01... às propostas de entrega por valores inferiores ao montante de taxa mínima por quilómetro que definiu, e pode decidir aceitá-las ou rejeitá-las. O estafeta recebe uma quantia variável por cada entrega e o valor a receber não depende do tempo de demora na sua realização ou do tempo de ligação à app EMP01....
O preço proposto por cada serviço é indicado pela ré, por aplicação das regras de cálculo por ela fixados. É que, o critério – pagamento por quilómetro – é por esta determinado, deixando ao “trabalhador”, não a possibilidade de dizer qualquer o preço da sua “prestação de serviços”; mas apenas a definição do valor mínimo por quilómetro a que está disposto a trabalhar, e como referência, já que ainda assim pode aceitar serviços abaixo do valor por si indicado. 
Por outro, não resulta da factualidade, que a possibilidade de fixar mínimos por quilómetro, tenha na pratica efetiva dos serviços uma real relevância. Importa não esquecer o “exército “de estafetas disponíveis e a concorrência num mercado atomizado, o que levará naturalmente e como regra a aceitar os valores mínimos propostos pela ré, ou muito próximos destes, sob pena de não ter ofertas de serviços e consequentemente de auferir rendimentos.
Conclui-se dos factos que o “trabalhador” de serviços não negociou nem negoceia em momento algum os critérios relativos à determinação da retribuição pelos seus serviços, tendo uma intervenção na fixação desta, de acordo com critério fixado pela ré, que resulta marginal no quadro em que a prestação se desenvolve.
Como se refere no Ac. desta relação, processo nº 2838.223.1T8VRL.G1, “o pensamento atual que acompanha as ditas novas forma de organização de trabalho, acentua que o mais importante é saber se os critérios de determinação da retribuição são ditados pelo beneficiário da atividade (no caso a taxa de encargo, por quilómetro), ou se são verdadeiramente negociados entre as partes, em pé de igualdade, o que, isso sim, é próprio do trabalho autónomo.”
Como se refere no Ac RL de 5-12-2024, processo nº 4306/23.2T8VFX.L1-4:
Transcrevendo fundamentação da sentença recorrida:
Não se pode considerar, que pelo facto do estafeta poder fixar o preço do km entre um limite e máximo que o mesmo acaba por participar na fixação o valor final do serviço prestado, mas apenas na sua indisponibilidade para trabalhar abaixo de um determinado valor de quilómetro, quando é a ré que unilateralmente fixa o valor da taxa de entrega para o trabalho a efetuar, sem qualquer negociação com o prestador de atividade, valor que irá determinar, por sua vez, o valor a receber pelo estafeta. O facto de o mesmo, depois de indicado o valor mínimo, poder visualizar as ofertas que não lhe são apresentadas, e eventualmente alterar, a sua determinação ou aceitar proposta de entrega contrária a esta, igualmente não se afigura que seja bastante para sustentar um qualquer poder negocial real do mesmo na determinação do valor do serviço, tanto mais que se desconhecem todos os termos em que o valor final apresentado é fixado.”
E referindo adiante:
“O estafeta não pode negociar quaisquer valores diversos, limitando-se, nos parâmetros contratualmente definidos a manifestar das suas preferências e a sua disponibilidade para executar esta ou aquela tarefa. A alteração de facto não tem qualquer relevância para afastar estas conclusões.”
Resulta daqui que não ocorre qualquer negociação quanto aos termos como a remuneração do estafeta é fixada, sendo da exclusiva responsabilidade da ré a determinação dos critérios, ainda na parte em que permite ao estafeta alguma manobra.
Este modo de fixação da retribuição aponta no sentido da laboralidade. Por outro preenche o índice da al. a) do artigo 12-A do CT.
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Meios de trabalho e inserção numa estrutura organizada:
Relativamente aos meios de trabalho decorre da factualidade que a estafeta utiliza telemóvel próprio para aceder à App, viatura e mochila própria, nada sendo fornecido pela ré, a não ser o que resulta da utilização da plataforma. Coloca-se a questão de saber se a aplicação informática disponibilizada constitui instrumento de trabalho.
A recorrida sustentou que a dita aplicação não é instrumento de trabalho. Referimos sobre esta questão no Ac. 2824/23.1T8VRL.G1, de 31-10-2024:
 “A questão deve ser colocada à luz da nova realidade. Sendo o telemóvel instrumento de trabalho, como refere a recorrida, tal não significa que a aplicação o não possa ser. Desta depende o “acesso” ao serviço solicitado pelo cliente e ao fornecedor (inscritos na plataforma), ao preço, e dela depende a aceitação ou não do mesmo.  Nessa medida pode ser considerado instrumento de trabalho, pois que o trabalho não é executável sem essa utilização – máxime, a necessidade de permitir a geolocalização para receber propostas de serviço, a utilização dessa geolocalização, ainda que o estafeta possa depois proceder ao desligamento, para o cliente e o fornecedor poderem acompanhar a execução do mesmo -.
A aplicação, implica o software, enquanto conjunto de dados usado pelo telemóvel, interagindo em linha com software da ré, ocorrendo uma mediação algorítmica na gestão do trabalho do estafeta (gerenciarão algorítmica a partir de determinados “dados”) – receção do pedido, fornecedor, localização de estafeta e oferta, e sequentes atos -  tratamento previsto quanto aos dados relativos a avaliação e faturação -.
O “trabalho” é mediado pelos algoritmos, com “implementação automatizada de normas e mecanismos que conformam as práticas de trabalho”, “Plataformização e trabalho algorítmico: contribuições dos Estudos de Plataforma para o fenômeno da uberização”, Fernanda da Costa Portugal Duarte e Ana Guerra, file:///C:/Users/mj01182.JUSTICA/Downloads/hmartins,+EPTIC_2020-02_
Plataformiza%C3%A7%C3%A3o.pdf..
Assim, a aplicação descarregada no telemóvel, no quadro deste tipo de trabalho surgido da “revolução digital”, constitui instrumento de trabalho. 
Já a plataforma propriamente dita (entendido como sistema online que possibilita interações, transações e partilha de informações entre usuários, -  software e recursos algorítmicos utilizados pela ré para a gestão do trabalho), não constitui instrumento de trabalho, mas antes parte de uma “estrutura organizada”, da qual recebe a “ordem” para efetuar determinado serviço – no caso uma entrega -… A relevância da aplicação, na execução do “trabalho, “sem a qual não” pode o mesmo ser executado, é elemento a ponderar no sentido da laboralidade. Já a posse pelo estafeta dos restantes elementos aponta no sentido contrário.”
No quadro desta nova realidade, e podendo o “trabalho” ser prestado quer por relação laboral quer por prestação de serviços, e sendo que quer num quer noutro será necessário o meio para aceder às “ofertas “de serviço, a consideração deste meio, nos termos acima definidos, como instrumento de trabalho disponibilizado pela ré, deve ser ponderada em contraponto com a propriedade dos restantes elementos por parte do “trabalhador”. Podendo ser indicio a considerar na apreciação de todos os factos apurados.
Importa ainda ter em consideração a forma como se dá a interação entre a aplicação descarregada e a plataforma, revelando toda a gestão do trabalho que resulta das operações algorítmicas, sobretudo na medida em, tal interação revele a “inserção” do estafeta na “organização produtiva” que a ré detém, em que aquela plataforma – considerando designadamente os softwares, bases de dados, e os conjuntos de algoritmos - constitui relevante elemento.
A relevância da aplicação, na execução do “trabalho, “sem a qual não” pode o mesmo ser executado, é elemento a ponderar no sentido da laboralidade. Já a posse pelo estafeta dos restantes elementos aponta no sentido contrário.
Relativamente à inserção do estafeta na organização produtiva da ré, nada vem demonstrado no sentido de que, tendo em conta o modo de funcionamento desta, e no sentido de garantir a prestação da sua atividade, como prestadora de serviços e não mera intermediária, não conte com a prestação do estafeta em causa.
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Modo de contratação e alteração das cláusulas:
O modo de contratação, por registo na plataforma, fornecendo determinados dados necessários para o exercício da atividade, mostra que não ocorre qualquer negociação. O estafeta adere aos termos oferecidos – contrato de adesão -, sujeitando-se designadamente a aceitar os termos de fixação da remuneração constantes das regras elaboradas pela ré, e a realizar o serviço nos termos que resultam das condições contratuais, da padronização que resulta do funcionamento da plataforma.
Por outro e não menos relevante, a ré dispõe do poder de em qualquer altura, sem negociação alterar tais condições, apenas restando ao estafeta aceitar a alteração ou deixar de prestar o “trabalho”. Alterações que vêm ocorrendo, em parte determinadas pela necessidade de adaptação a decisões que foram proferidas em vários países onde este tipo de plataformas atua. Sobre a questão, Teresa Coelho Moreira e Marco Carvalho Gonçalves, Presunção de Contrato de Trabalho no Âmbito de Plataforma Digital: Alguns Aspetos Materiais e Processuais, https://doi.org/10.21814/uminho.ed.151.21, pág. 386.
Concede-se, no entanto, que o modo de contratação não é por si decisiva, como indício, dependendo mais a caraterização da relação estabelecida do modo como na realidade é executada a relação, na linha do nº 2 do artigo 4º da Diretiva.
Constitui, o modo de contratação, um indicio a sopesar no conjunto de indícios, sendo de ressaltar a posição de domínio por banda da ré, que impõe a sua vontade através de um contrato de adesão.
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Poderes de direção e pode sancionatório:
Relativamente aos indícios atinentes a estes poderes, indicadores ou não, da subordinação jurídica do estafeta, importa tecer algumas considerações.
Com a denominada “revolução digital” surgiu esta nova forma de trabalho, com graus de flexibilização impossíveis no quadro das relações e do arquétipo vigente – ao nível dos horários, da assiduidade, da concorrência, do local de trabalho… -, e ao trabalho à chamada (à peça).
Esta nova realidade acarreta; como a doutrina vem referenciando, sobretudo em áreas de trabalho com pouca exigência ao nível da qualificação, e com tarefas rotineiras, como é o caso; riscos relativamente às condições em que este tipo de trabalho é desenvolvido, quer relativas a baixos níveis salariais (de rendimentos), e abaixamento de outros direitos, como férias, descansos, condições de trabalho ao nível da higiene e segurança, etc…
Quanto à necessidade de repensar o conceito de subordinação, veja-se Ricardo Lourenço da Silva, Se caminha como um pato, nada como um pato e grasna como um pato, provavelmente é um pato!: a subordinação jurídica aos algoritmos na 'on-demand economy', pág. 158, Questões Laborais, Ano XXVII, n.º 57, 2020, pp. 123-159.
Importa, no âmbito do quadro jurídico aplicável, e no que respeita à verificação da subordinação jurídica e poderes de direção, ter em conta a nova realidade, sob pena de a lei, petrificando-se, petrificar a realidade.
A realidade relacional deve ser apreciada inserida no seu contexto global, considerando-se os condicionantes e circunstanciações económicas, sociais, psicológicas, e culturais onde a mesma se desenvolve.
O “trabalhador” quer efetivamente ser trabalhador autónomo ou foi determinado pela necessidade e pelas circunstâncias? Têm dimensão relevante e parametrizadora, no quadro desses condicionalismos e circunstâncias, as liberdades de recusa do trabalho, intervenção na formação do preço, poder de subcontratação e outras, ou, em função da sua situação de dependência, não só económica como dependência da “organização” encarnada na plataforma para poder trabalhar, o relevo de tais liberdades é praticamente nulo, ou pouco relevante, sendo neutralizado ou grandemente cerceado por essas circunstâncias?
Importa surpreender a” posição de sujeição do trabalhador ante o empregador, correspetiva do poder que este último detém sobre aquele, de conformar o respetivo comportamento, dentro da esfera laboral”, Milena Rouxinol, Direito do Trabalho – Relação Individual”, 2020, Almedina, pág. 84.  Poder de conformação, que no quadro da nova realidade, pode não resultar de qualquer prerrogativa contratualmente fixada, até para “fugir “ao direito laboral, mas antes da realidade da vida, do modo real como a relação se desenvolve.
Importará saber da relevância ou não nesse desenvolver, da dependência do estafeta em relação à plataforma; quer do ponto de vista económico e “social”, num “mercado” de mão de obra não organizada, com oferta atomizada e ele própria em concorrência interna, sem organização nem acesso a negociação coletiva; quer do ponto de vista da subordinação, conquanto com os tons subtis desta nova forma de trabalho – quem determina na realidade o modo de prestar o serviço, quem organiza este, quem fixa o “custo” do serviço do Estafeta?
Quantos aos poderes importe ter em linha de conta o procedimento padronizado de entrega.
O recorrido refere que a atividade não é organizada pela ré.
Refere-se no Ac. RG de 3-10-2024, processo nº 2800/23.4T8VRL.G1 (embora a propósito da al. a do artigo 12-A):
 “Resulta que o serviço de entregas gerido pela recorrida impõe a observação de algumas regras designadamente o dever dos estafetas se inscreverem na App, a necessidade de ligação à App para poderem receber propostas de entregas e aceitá-las, recurso à geolocalização para poder ser aceite determinada proposta de entrega, sendo também obrigatório possuir mochila isotérmica para o transporte de refeições. Daqui resulta manifesto que existe um procedimento prévio padronizado que está definido para todos os interessados em exercer a atividade em causa e que estes têm de observar, para o acesso/inscrição na plataforma por parte dos estafetas. Trata-se de requisitos prévios ao início da atividade, razão pela qual não podemos falar de regras específicas conformadoras da atividade.
Contudo da referida factualidade também resultou apurado que após a observação do procedimento prévio o estafeta tem ainda que observar outros procedimentos referentes ao exercício concreto da sua atividade.
Assim o estafeta quando aceita o serviço de um cliente tem que cumprir o procedimento instituído pela recorrida, o que significa que tem que se dirigir à morada do estabelecimento, onde recolhe o produto e depois tem de se dirigir à morada do utilizador cliente onde efetua a entrega. Ao estafeta são fornecidos os dados relevantes para fazer a recolha e a entrega do produto, tais nome e morada do estabelecimento e do utilizador como a distância estimada os dados do pagamento, lista dos artigos do pedido e valor do mesmo. Estão também definidos pela recorrida, designadamente nos “Termos e Condições de Utilização da plataforma … para Estafetas” os procedimentos referentes à recusa de entregas, bem como as regras a observar quanto ao pagamento do preço. Ou seja, a Recorrida organiza e gere através da App, os serviços de entregas de mercadorias, assegurados por estafetas, designadamente quanto à indicação de locais de recolha e entrega dos produtos, recebendo em contrapartida os estafetas um valor por cada entrega, valor este que é determinado por critérios ditados pela Recorrida.
Daqui resulta inequívoco que a recorrida não definiu apenas regras especificas prévias ao início da atividade, mas definiu e regulou o próprio exercício da atividade dos estafetas, através de procedimento padronizado, ou seja, regulou todos os passos essenciais da conduta a observar por qualquer estafeta quer para aceder, quer para executar o serviço proposto pela plataforma gerida pela Recorrida.
Em suma, Ré atenta a atividade que desenvolve regulou no essencial todo o seu ciclo produtivo nele se incluindo as tarefas e a conduta que o estafeta tem de observar perante o utilizador/cliente, bem como a própria prestação da atividade em si, que é o que basta para podermos concluir pela verificação da alínea b) do n.º 2 do 12.º -A do CT. no segmento que prevê que a ré exerce o poder de direção ao ditar regras especificas quanto à conduta do estafeta perante o utilizador do serviço e quanto à prestação da atividade.”
Releva deste ponto de vista e quanto a nós, como acima deixamos assomado, a inserção numa “organização”, numa estrutura produtiva, geradora de mais-valia.
Sobre a importância desta inserção, a advogada-geral DE BOCK defendia a “definição de uma nova regra para avaliar o elemento de “controlo” por parte do empregador. Na sua opinião, a questão principal deveria ser a de saber se o trabalho estaria “incorporado organizacionalmente” na empresa. Isto resume-se a avaliar se o trabalho efetuado pelos trabalhadores em questão faz parte das atividades principais da empresa. Em caso afirmativo, o trabalho está integrado na organização da empresa e o critério do “controlo” estaria Preenchido”. - Referenciado por Leal Amado e Teresa Coelho, Qualificação do Contrato e Substituição de Estafetas: a “Bala de Prata”? Revista Internacional de Trabalho, Ano IV, Junho 2024, nº 6, WWW.RIDT.PT.
Importa ter em atenção, no que ao caso presente se refere, que só com muita condescendência se pode considerar que a estafeta tem a sua própria estrutura e organização – mais não precisa que ter instalada e usar a App, ter o veículo e a mochila, e as condições legais para exercer a atividade -. Prestado o trabalho, será a plataforma que tratará do seu pagamento, como tratou das cobranças, utilizando embora uma intermediária para pagamento.
Releva ainda ao caso a utilização da geolocalização, não só para poder receber propostas de entregas e aceitá-las, como para o cliente acompanhar o percurso de entrega. O estafeta depende da plataforma para exercer a sua atividade.
O exercício da atividade depende na realidade da manutenção de uma relação de interatividade com a plataforma, não assumindo especial relevo a previsão no sentido de que durante a prestação poderá desligar a geolocalização, o que normalmente e de acordo com as regras da experiencia comum, não ocorrerá.
Não obstante a previsão desta possibilidade, resulta que a plataforma faz a gestão de toda a atividade do estafeta, muito além de uma mera intermediação – colocação em contacto -  entre o solicitador da prestação e o seu prestador (como ocorre com outras plataformas). De tal forma que para o prestador, a figura do cliente e do fornecedor se tornam irrelevantes. Quanto à escolha do trajeto, tal possibilidade num cenário de opções racionais, tendo em vista a maximização do ganho, é mais teórica que real, o trajeto escolhido será naturalmente o que implicar mais ganho, considerando o custo do mesmo (tempo e espaço) para o estafeta, que normalmente, e de acordo com as regras da experiência comum, confiará na indicação fornecida pela aplicação, com uma ou outra correção que resulta de sua própria experiência, em trajetos e áreas por si bem conhecidas. Tenha-se ainda em conta o modo como é fixada a retribuição, considerando os quilómetros que resultam do sistema de geolocalização, portanto independente de trajeto diverso que possa ser escolhido.
Em termos práticos é a ré – através da plataforma – que organiza e dirige a prestação da estafeta.
O facto de poder exercer atividade para outros, incluindo a “concorrência”, não assume particular relevo tendo em conta as circunstâncias especificas desta forma de prestar trabalho, nem se demonstrou que tal ocorresse. A pluralidade de empregadores não é hoje coisa estranha ao direito laboral, tanto mais se a pluralidade se reportar a “empregadores” na mesma área. O que importa, parece-nos, é que o estafeta retire da sua atividade de estafeta rendimentos de que necessita para o seu sustento e da sua família.
Ressalta dos termos contratuais que a ré dispõe efetivamente de uma vasta gama de poderes, e possibilidades de desativar o estafeta, muitas delas além do que é aceitável numa mera relação de intermediação entre um prestador e um cliente deste, tendo em conta até os termos latos destas previsões. Como se refere no Ac. RG de 3-10-2024, processo nº 2838/23.1T8VRL.G1, “tal corresponde a um amplo poder de tutela que não se compagina com uma relação de trabalho autónomo, quer pela amplitude de razões que levam a “sanções” (utilizando-se clausulas abertas … )”.
O que tudo aponta no sentido da laboralidade.
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Quanto a horário, assiduidade, possibilidade de recusar tarefas, inexistência de dever de não concorrência, a faculdade de o estafeta se fazer substituir, apontam no sentido da inexistência de relação laboral, tendo em conta os padrões clássicos e os indícios considerados relevantes no quadro da relação laboral pré “digital”.
Importa, no entanto, considerar as especificidades deste tipo de trabalho.
O novo modelo e trabalho surgido da “revolução digital” não se encaixa nestes indícios clássicos da relação laboral. Disso dá nota a doutrina. Assim veja-se Teresa Coelho, Algumas Questões Sobre Trabalho 4.0, https://juslaboris.tst.jus.br/handle/20.500.12178/170751; Maria do Rosário Palma Ramalho,” Automação, subordinação jurídica e dependência económica no trabalho em plataformas digitais (breves reflexões)”, Estudos APODICT nº 9, pág. 317/8; João Leal Amado em “As plataformas digitais e o novo artigo 12º do Código do Trabalhando: empreendendo ou trabalhando?”, Colóquios do Supremo Tribunal de Justiça, 2023; Irene Gomes,  Direito do Trabalho e economia colaborativa – desafios de regulamentação, https://doi.org/10.21814/uminho.ed.100.16, pág. 403; António Monteiro Fernandes, “Emprego na era digital: um novo conceito de trabalhador”, Estudos APODICT 9, pág. 245.
As liberdades de que o “trabalhador” dispõe, são no essencial, e tendo em consideração a realidade económica e social em que a relação se desenvolve, ou sem relevo prático ou conferindo embora alguma autonomia sem desvirtuar e essencialidade da subordinação económica do estafeta e da sua dependência da “estrutura económica organizada” pertença da ré. 
No que respeita à escolha dos tempos de trabalho, circunstância que constitui uma das caraterísticas novas desta realidade de trabalho (à peça – on demand), importa não esquecer que a mesma constitui uma decorrência deste tipo de trabalho, não sendo desfavorável à ré, que assim não tem que custear os tempos “mortos”. Esta nova forma de fixação de tempos de trabalho, e do ponto de vista das “plataformas”, como que se centra, não na relação individual (com um concreto estafeta), mas no conjunto de estafetas disponíveis – e queremos significar que, do ponto de vista da ré (como prestadora da atividade através do estafeta), importa assegurar a execução do serviço, seja por qual deles for sabendo que tal ocorrerá, devido ao “exercito” de estafetas disponíveis, e à dependência económica destes.
A dependência económica do estafeta, fará com que ele esteja disponível, de outro modo não aufere rendimento. Volvem-se assim tais prerrogativas em alguma autonomia, que não põem em causa, considerando o quadro desta nova realidade, a dependência do estafeta em relação à ré.
O trabalhador vê-se compelido a prestar mais horas a manter-se conectado, sendo aparente a autonomia. Teresa Coelho, loc. referido, fala de “servidão voluntária”, pela interiorização das ideias pelo trabalhador, e uma “gestão realizada por objetivos”, que torna desnecessário o comando expresso do empregador. Pág. 162 e 163.
Como referido no Ac. RG de 3-10-2024, processo nº 2800/23.4T8VRL.G1:
“Importa salientar que perante as novas formas de trabalhar através das plataformas digitais alguns dos indícios clássicos de subordinação jurídica, não são de considerar operacionais, nem são de valorizar, pois só por si não afastam o novo tipo de dependência resultante de serviços prestados via plataforma digital. Entre os mencionados indícios estão os relativos ao local de trabalho, à propriedade dos instrumentos de trabalho e equipamentos, ao horário de trabalho determinado pelo beneficiário da atividade e o pagamento de retribuição certa, porque efetivamente não se adequam à atividade desempenhada por estes trabalhadores. Nesta nova era digital temos um trabalhador subordinado com contornos distintos dos tradicionais, mas ainda assim dependente e subordinado na forma como desenvolve a sua atividade, sendo certo que a ausência dos mencionados indícios é compensada por outros que são reveladores da subordinação perante a empresa que gere a plataforma, tais como o facto do estafeta estar inserido dentro da estrutura organizativa da empresa que gere a plataforma, recebendo ordens e instruções através do procedimento padronizado que se mostra instituído, estando também sujeito ao regime sancionatório por aquela implementado.”
Refere João Leal Amado em “As plataformas digitais e o novo artigo 12º do Código do Trabalhando: empreendendo ou trabalhando?”, Colóquios do Supremo Tribunal de Justiça, 2023, pág. 17, disponível no respetivo site:
”A circunstância de o prestador de serviço utilizar instrumentos de trabalho próprios, bem como de estar dispensado de cumprir deveres de assiduidade, pontualidade e de não concorrência, não é incompatível com a existência de uma relação de trabalho dependente entre o prestador e a plataforma eletrónica”.
Quanto a outros indícios, como enquadramento na segurança social e outros, em casos como o dos autos não assumem especial relevo, pois que constituem a consequência da “fuga” ao direito laboral, revestindo antes relevo positivo, quando apontarem no sentido da laboralidade.
No quadro geral da relação em análise,  os indícios apontam no sentido de que a estafeta está despojada de qualquer organização própria, desempenhando a atividade inserida na estrutura organizada pertença da ré, de acordo com os procedimentos padronizados que resultam das regras por esta fixados e da execução do serviço através e com (em) interação com a plataforma, a qual e relativamente a cada serviço concreto indica a remuneração, podendo a estafeta apenas recusar o serviço e assim não recebendo a remuneração, sendo que a fixação desta ocorre de acordo com critérios fixados pela ré. A plataforma faz a gestão da atividade, das faturações e pagamentos, no seu essencial. A estafeta interage com cliente e fornecedor apenas na sequência da oferta e aceitação do serviço, e na medida estrita da necessidade de realizar este, como um qualquer distribuidor de uma empresa tradicional.
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Relativamente ao período posterior a 1-5-2023, sempre seria aplicável o artigo 12-A, conforme acima referenciado, mostrando-se preenchidas as alíneas, a), c), e).
Relativamente às intermediarias, nada resulta que ponha em causa a essencialidade da ligação do estafeta com a ré.
Não resultou provada quem ela seja, nem que exerça qualquer controle ou supervisão sobre a atividade laboral do trabalhador.
Concluímos assim que a relação deve ser considerada de trabalho, a partir de 1-12-2021, com as consequências referenciadas no nº 9 do artigo 12-A, a partir da data de entrada em vigor desta.

DECISÃO:

Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar procedente a apelação, reconhecendo-se a existência de contrato individual de trabalho por tempo indeterminado, com início em 1-12-2021, entre a ré e AA.
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Custas pela apelada
22-5-2025
Antero Veiga
BB (vencido)
CC

"Voto vencido.
De acordo com o projecto que elaborei e não obteve vencimento, entendo que inexiste matéria de facto provada suficiente para se poder concluir, v.g. de acordo com o chamado método indiciário, que entre a ré e o prestador de actividade/estafeta identificado nos autos se estabeleceu uma relação laboral.
Com efeito, não sendo aplicável qualquer presunção de laboralidade, como temos vindo a considerar (e sem prejuízo de, numa renovada ponderação, mormente à luz da, a propósito, recentíssima jurisprudência do STJ, admitirmos poder vir a alterar a nossa posição), globalmente considerados os factos provados não permitem concluir pela subordinação jurídica na relação estabelecida entre o prestador da actividade/estafeta e a beneficiária da actividade/plataforma digital, mormente não se descortinando factualidade na qual se pudesse, com objectividade, afirmar o poder disciplinar desta sobre aquele, pelo que, a nosso ver e com todo o respeito pelo entendimento perfilhado no acórdão, não pode afirmar-se a existência de um contrato de trabalho."